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A ANGÚSTIA DE DECIDIR E O JUIZ DAS GARANTIAS NO PROJETO DE
REFORMA DO CPP: UMA IMPORTANTE CONTRIBUIÇÃO DA PSICANÁLISE
PARA O DIREITO1
Denise Luz
Mestre em Ciências Criminais (PUCRS)
Especialista em Direito do Estado (UFRGS)
Advogada
dnluz@terra.co
Leon Murelli Silveira
Mestrando em Ciências Criminais (PUCRS)
Psicólogo
murelli.s.leon@gmail.com
RESUMO
O presente artigo tem como objetivo analisar o instituto do juiz das garantias previsto no projeto
de reforma do Código de Processo Penal, expresso no Projeto de Lei nº 156/2009, aprovado no
Senado Federal em dezembro de 2010, e encaminhado para a Câmara dos Deputados para revisão,
onde tramita sob nº 8.045/2010. O trabalho possui caráter multidisciplinar, concebido pela
interface dos saberes do Direito e da Psicanálise. Analisa-se como a atuação do juiz durante a
investigação criminal pode comprometer sua imparcialidade para julgar o caso penal, em razão da
ação inconsciente de mecanismos psíquicos. Abordam-se decisões paradigmáticas do Tribunal
Europeu de Direitos Humanos que inspiraram o projeto do novo código, investigando as razões da
escolha por um juiz de garantias similar ao modelo italiano e não por um juiz de instrução como
adotado na Espanha e na França. Ao final, conclui-se que os fatores psicológicos se colocam na
decisão judicial como seus elementos constitutivos, mesmo que não expressos em argumentos da
fundamentação, independentes de qualquer controle racional. O juiz das garantias, então, colabora
para um resultado mais justo do processo, porque reduz os danos gerados pela influência de
conteúdos introjetados pelo julgador durante a fase pré-processual, baseado no conhecimento
gerado na inquisição. Esse critério de exclusão da competência pela prevenção mostra-se como um
mecanismo idôneo e eficaz para equilibrar as forças entre as partes, nivelando melhor suas chances
de alcançar o convencimento do juiz no processo, além de tornar a decisão final menos
angustiante.
Palavras-Chave: Juiz das Garantias; Psicanálise. Imparcialidade; Inconsciente; Reforma do
Código de Processo Penal
1 Este artigo foi publicado na Revista Magister de Direito Penal e Processo Penal. Citação: LUZ, Denise.;
SILVEIRA, Leon Murelli . A angústia de decidir e o 'juiz das garantias' no Projeto de Reforma do CPP: uma
importante contribuição da Psicanálise para o Direito. Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal,
v. 51, p. 15-41, 2013.
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1 Introdução
O presente trabalho objetiva abordar o instituto do Juiz de Garantias, referindo-se à
figura do Juiz posicionada, no âmbito do direito processual penal, na fase de investigação pré-
processual, como garante dos direitos fundamentais do investigado tal qual previsto no artigo
14 do Projeto de Lei nº 156/2009 do Senado Federal, aprovado em dezembro de 2010, e
encaminhado à Câmara dos Deputados para revisão, onde tramita sob nº 8.045/2010.
A análise feita no presente trabalho centra-se em dois focos de discussão distintos,
mas totalmente interpenetráveis e complementares: sob o ponto de vista jurídico-processual e
sob a ótica da psicanálise.
A opção por esse conteúdo de abordagem deve-se ao fato de a instituição do Juiz de
garantias mostrar-se como um mecanismo processual que pretende reduzir os danos
promovidos pelos pré juízos2 gerados pelas valorações promovidas pelo magistrado antes do
contraditório. Os mecanismos psíquicos que geram esses pré-juízos e as consequências que
deles advém, são explicados pela Psicologia e não pelo Direito. A este cabe aceitar sua
existência e criar mecanismos para minimizar seus efeitos que podem minar a estrutura de
garantias processuais do sistema acusatório.
A Psicanálise explica que o envolvimento na investigação implica em um
investimento psíquico na tarefa inquisitiva. Isso acarreta em construções racionais e
atribuições de valores e afetos na tomada de decisão. Todas essas representações são
internalizadas e negadas ao se tentar exercitar a neutralidade em um esforço consciente, mas
podem emergir como conteúdos inconscientes deslocados e engatilhar mecanismos de defesa
que tornam o juiz predisposto a continuar a linha de afetos, pensamentos e investimentos
pulsionais que traz da investigação: a tese da acusação criada na inquisição. Por isso, inicia-se
a abordagem sobre o perfil do juiz das garantias proposto no Projeto de Reforma do Código
de Processo Penal (CPP), expondo sua distinção do juiz de instrução adotado em alguns
países europeus, as razões que justificam sua criação e os principais argumentos contra sua
instituição.
Depois, faz-se uma breve análise psicanalítica, mostrando como a atuação do juiz na
investigação pode comprometer sua imparcialidade para o julgamento do processo em razão
de mecanismos psíquicos inconscientes, os quais ele não pode controlar. Nessa parte, mostra-
se por que a adoção do juiz das garantias pode funcionar como um eficiente redutor de danos
causados pelo envolvimento do juiz com o caso penal.
2 No sentido de juízo pré processual, de convicção formada inaudita altera pars, baseada em uma única versão
possível – e, talvez, até provável, mas apenas uma dentre tantas que podem existir, igualmente possíveis.
3
Por último, analisam-se decisões do Tribunal Europeu de Direitos Humanos (TEDH)
que constataram a perda da imparcialidade objetiva do magistrado que participa da
investigação para julgar o processo, buscando identificar qual o legado que tais precedentes
deixaram para o direito processual penal brasileiro.
Encerra-se com a apresentação de breves considerações finais sem qualquer
pretensão de esgotamento do tema, mas com a sensação de gozo3 por participar, ainda que de
modo incipiente, desse debate tão importante para a democratização do processo penal
brasileiro que se quer de estrutura, verdadeiramente, acusatória.
2 O Juiz das Garantias no Projeto de Reforma do Código de Processo Penal
O projeto de reforma do CPP prevê, no Artigo 14, Capítulo II, Título II – Da
Investigação Criminal, Livro I – Da Persecução Penal, a figura do Juiz das Garantias com
competência para atuar, no controle da legalidade da investigação criminal e na salvaguarda
dos direitos do investigado, invioláveis se não por decisão judicial. De acordo com o Projeto,
apresentada a denúncia criminal pelo Ministério Público, cessa a competência do juiz das
garantias, sendo que todas as medidas processuais posteriores competem ao juiz do processo,
um juiz distinto daquele que atuou na investigação.
A proposta contida no Projeto rompe com a tradição do direito processual brasileiro
de fixação da competência com base na prevenção, conforme artigo 83 do CPP em vigor
desde 1941. O Projeto de reforma prevê, ao contrário, a prevenção como fator de exclusão da
competência. Assim, o juiz que atuar durante a investigação fica impedido de atuar no
processo.4 A adoção de tal instituto não se aplica aos crimes de menor potencial ofensivo
5, já
que, nesses casos, não se instaura investigação pré-processual.
A Exposição de Motivos do Projeto de Lei, feita pela Comissão de Juristas
responsável pela elaboração do anteprojeto apresentado ao Senado Federal, esclarece que a
proposta da instituição de um juiz de garantias pretende, como objetivo geral, consolidar o
modelo processual acusatório, único compatível com um Estado Democrático.
Especificamente, a proposta objetiva otimizar a atuação jurisdicional criminal, viabilizando
maior especialização dos órgãos encarregados da matéria e melhor gerenciamento
operacional, além de “manter o distanciamento do juiz do processo, responsável pela decisão
3 O termo gozo aqui empregado é no sentido psicanalítico. Vide nota nº 34.
4 Art. 16 do PL nº 156/2009
5 Art. 15 do PL nº 156/2009
4
de mérito, em relação aos elementos de convicção produzidos e dirigidos ao órgão da
Acusação.”6
Note-se que o critério da exclusão da competência pela prevenção, nos termos
contidos no Projeto, afasta a jurisdição do juiz de primeiro grau que atuou na investigação,
mas não dos magistrados de segundo grau que tenham decidido algum recurso interposto
ainda na fase pré-processual. Como o fundamento da exclusão da competência pela prevenção
está em manter o julgador eqüidistante do caso, havendo menor risco de contaminação de sua
imparcialidade pelos elementos informativos da investigação, o mesmo critério de fixação e
exclusão da competência por prevenção deve ser aplicado também aos tribunais de segunda
instância.7 Entretanto, não persiste a mesma necessidade em relação aos tribunais superiores,
porque não têm competência constitucional para revisão da matéria probatória. Assim, seus
ministros não têm a convicção, diretamente, contaminada pelos elementos da inquisição.
Segundo Nereu Giacomolli, a proposta do PL nº 156/2009 se aproxima do Giudice
per le indagini preliminari do sistema italiano.8 Marzia Ferraioli explica que, na Itália, a
presença do giudice na indagini preliminari não é essencial: a investigação pode iniciar e se
desenvolver mesmo sem intervenção do juiz, desde que não se configurem os requisitos para
sua presença, ou seja, desde que não precisem ser praticados atos de intervenção sujeitos à
autorização prévia do Poder Judiciário.9
A autora coloca essa característica como um diferencial do giudice per le indagini
preliminari do giudice istruttore do sistema italiano anterior, o qual consistia, na generalidade
dos casos, um passagio obbligato, desde a notícia do fato até o início da fase
processual.10 Segunda a doutrinadora italiana, havia uma ambigüidade no sistema anterior que
não permanece no atual, uma vez que a fase del dibattimento voltava-se para as provas
colhidas no juízo de instrução.
Ela explica que o giudice per le indagini preliminari não herdou as funções do
giudice istruttore e isso é perceptível nos casos taxativamente previstos dell’ incidente
probatorio, no qual o juiz da investigação preliminar segue a forma prevista para o processo
6 Percebe-se que já existe experiência no Brasil quanto ao estabelecimento de um juizado para atuação
exclusiva durante o inquérito policial, como o DIPO - Departamento de Inquéritos Policiais e Polícia Judiciária -
de São Paulo, previsto na estrutura do Poder Judiciário, por norma estadual. Não se trata, portanto, de uma figura
absolutamente desconhecida no nosso ordenamento ou de resultado duvidoso.
7 GIACOMOLLI, Nereu José. A Fase Preliminar do Processo Penal: Crises, misérias e novas metodologias
investigatórias. Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2011, p. 69.
8 GIACOMOLLI, Nereu José. A Fase Preliminar do Processo Penal: Crises, misérias e novas metodologias
investigatórias. Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2011, p. 68.
9 FERRAIOLI, Marzia. Il Ruolo di “Garante” Del Giudice per le indagini preliminare. Padova: Cedam,
1993, p. 12/13. (Tradução Livre)
10 Ibidem, p. 13. (Tradução Livre)
5
em contraditório, quase que como um órgão delegado do juiz do processo.11 Essa comparação
permite verificar, além de tantas outras, a semelhança do instituto italiano com o previsto no
artigo 14, VII, do PL nº 156/2009 que prevê competência do juiz das garantias para decidir
sobre a produção antecipada de provas.
Percebe-se, por outro lado, que as funções do juiz das garantias estão, claramente,
definidas no Projeto de reforma, ao passo que não estariam tão evidentes na legislação italiana
em relação ao giudice per le indagni preliminari. Mesmo assim, ausente maior clareza na
legislação italiana, lá não há dúvida de que o giudice per le indagni preliminari não deve ser,
nem deve se assemelhar ao juiz instrutor, como afirma Marzia Ferraioli.12
O projeto de reforma brasileiro torna claro quais são as função do juiz das garantias:
o controle da legalidade da investigação criminal e a salvaguarda dos direitos individuais cuja
franquia tenha sido reservada à autorização prévia do Poder Judiciário. Essa função de
controle da legalidade da investigação faz com que, no Brasil, exija-se que toda investigação
aberta seja comunicada ao juiz das garantias nos termos do artigo 14, IV, e não somente
aquelas que requeiram restrição de garantias submetidas à prévia atuação judicial, diferindo,
neste ponto, s.m.j, do Código Italiano, onde a investigação pode se desenvolver integralmente
por procedimento meramente administrativo.
No entanto, em termos gerais, a proposta brasileira se assemelha ao modelo do
giudice per le indagni preliminari italiano, sobretudo em razão do fato de que esse juiz não
tem função de juiz instrutor, não podendo exercer atividades que cabem ao investigador como
se dá com o juiz de instrução na Espanha. O juiz das garantias não pode atuar na colheita da
prova, nem determinar medidas de ofício. Entende-se que, se o fizer, estar-se-á diante de
nulidade absoluta por violação do sistema acusatório (art. 4º).
Em que pese o Projeto de reforma preveja a obrigatoriedade da participação do juiz
na fase pré-processual como se dá com o juez instructor previsto na Ley de Enjuiciamiento
Criminal espanhola, como ocorria com o giudice istruttore do sistema italiano revogado, e
como operam os juízes de instrução francês e belga, o juiz das garantias proposto no Brasil
tem funções muito distintas daqueles. É que no sistema espanhol e nos demais referidos a
direção da investigação criminal fica a cargo da autoridade judicial, “a quem compete a
colheita de todo o material probatório e indiciário acerca do fato delituoso”.13 Nesses sistemas
11 Ibidem, p. 13. (Tradução Livre)
12 Ibidem, p.33. (Tradução livre)
13MAYA, André Machado.; GIACOMOLLI, Nereu José. Do Juiz de Instrução ao Juiz das Garantias:
perspectivas de reforma do Código de Processo Penal. In Anais do XIX Congresso Nacional do CONPEDI -
Florianópolis. Disponível em: < http://www.conpedi.org.br/conteudo.php?id=2>. Acesso em: 31/08/2011.
6
o juiz de instrução pode praticar todos os atos de investigação; é ele quem coordena as
investigações da polícia ou do ministério público; e é ele quem colhe a prova e a reproduz.14
Sem dúvida, a proposta pertinente ao juiz das garantias é um dos pontos mais
polêmicos do Projeto, o qual recebe fortes críticas, principalmente de entidades
representativas do Poder Judiciário e dos magistrados. O principal argumento contra a
proposta consiste em carências orçamentário-financeiras para aparelhar, principalmente, as
varas estaduais com a estrutura necessária.
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ), por exemplo, emitiu a Nota Técnica nº 10,
posicionando-se contra a criação do instituto, por entender que exigiria custo elevado,
sobretudo, porque 40% das comarcas estaduais são dotadas de vara única, tendo um único
magistrado encarregado da jurisdição. A Nota afirma também que a atuação de mais de um
juiz no caso poderia retardar os processos, violando a garantia à razoável duração do
processo, podendo acarretar, inclusive, a prescrição de muitas ações penais.15
Esses argumentos, no entanto, não podem ser usados para que se deixe de instituir o
juiz das garantias, tão salutar para um sistema acusatório autêntico e comprometido com um
processo justo.
Várias estratégias e métodos podem ser pensados para viabilizar e organizar sua
implementação. No que tange à Justiça Federal, praticamente, todas as seções judiciárias já
estão usando o sistema de processo eletrônico – E-Proc. Por esse sistema não faz sentido que
se exija a presença física do juiz, permanentemente para analisar o inquérito e decidir. A
Justiça Estadual deve caminhar para o mesmo rumo, o da modernização dos procedimentos.
Destaca-se, nesse sentido, que o Ministério Público Federal da 4ª Região autorizou,
recentemente, que um de seus membros, um Procurador da República, pudesse continuar
exercendo suas funções de Roma, na Itália, durante o período do seu doutoramento. A
Justificativa foi de que o sistema eletrônico de processos não exige a presença física do
Procurador, podendo, perfeitamente, exercer suas funções aqui no Brasil, instalado na
Europa.16
14 LOPES JR. Aury. Sistemas de Investigação Preliminar no Processo Penal. 4 ed. Rio de Janeiro: Lumen
Juris, 2006.
15 Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/atos-administrativos/atos-da-presidencia/317-notas-tecnicas/11221-
nota-tecnica-no-102010a>. Acessado em 21/03/2011.
16 Notícia E-Proc permite que procurador da República siga atuando de Roma. Publicada em 17/06/2011
na página oficial do Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Disponível em:<
http://www.trf4.jus.br/trf4/noticias/noticia_detalhes.php?id=7428>. Acesso em: 19/06/2011. O Conselho de
Administração do Tribunal Regional Federal da 4ª Região também autorizou uma servidora, Analista Judiciária,
a trabalhar à distância, de Los Angeles, para que pudesse acompanhar o cônjuge durante seu pós-doutorado na
Universidade da Califórnia. Segundo o relator do pedido formulado pela servidora, os avanços tecnológicos
disponíveis permitem a prestação de serviços à distância. Cf. Notícia TRF-4 autoriza servidora a trabalhar a
partir dos EUA. Publicada em 23/12/2011 no Consultor Jurídico. Disponível em: <
http://www.conjur.com.br/2011-dez-23/servidora-vara-federal-rs-trabalhar-partir-eua>. Acesso em 11/09/2012.
7
Se o Ministério Público pode atuar de Roma, não parece razoável que o juiz não
possa atuar de uma cidade próxima, valendo-se do sistema de processo eletrônico. Não
haveria nenhum prejuízo nesse sentido. Para a Justiça Federal, então, esta questão estaria
superada. E, ao que parece, o Conselho Nacional de Justiça trabalha pela informatização total
do Poder Judiciário, sendo que, de qualquer modo, sua implementação na Justiça dos Estados
parece irreversível e só uma questão de tempo.
Há várias alternativas que podem ser pensadas, trabalhadas e implementadas. Basta
que exista vontade política. Poder-se-ia, por exemplo, implementar varas regionalizadas com
um juiz das garantias atendendo várias comarcas próximas; a implementação dos juizados
poderia se dar em etapas com metas definidas, iniciando-se pelas capitais até abranger todo o
território nacional.17
Vale lembrar, também, a experiência consolidada na Justiça Federal das
varas especializadas em lavagem de dinheiro instaladas somente nas capitais e competentes
para atender toda a seção judiciária.
Evidência de que o argumento contido na Nota Técnica nº 10 do CNJ não serve para
impedir a adoção do instituto do juiz das garantias está estampada no texto da Lei 12.694, de
24 de julho de 2012, que dispõe sobre o processo e julgamento colegiado, em primeiro grau
de jurisdição, de crimes praticados por organizações criminosas. O § 5o do artigo 1º permite
que um colegiado de três juízes de primeiro grau reúna-se (e decida) pela via eletrônica, ou
seja, fazendo uso de tecnologias de comunicação, como a internet, por exemplo, quando os
juízes dele integrantes estiverem em cidades distintas.18
Em outras palavras: mesmo que a
maioria das comarcas tenha apenas um juiz, é possível que juízes atuantes em outras comarcas
atuem durante a fase de investigação, como juiz das garantias (Vide também o § 2º da mesma
Lei, o qual reforça a viabilidade prática da proposta aqui apresentada). Não há, portanto,
17 Os exemplos são trazidos por André Machado Maya em Outra Vez Sobre o Juiz das Garantias: Entre o Ideal
Democrático e os Empecilhos de Ordem Estrutural. In Boletim IBCCRIM. n. 215, out./2010, São Paulo, p. 14. 18
Art. 1o Em processos ou procedimentos que tenham por objeto crimes praticados por organizações criminosas,
o juiz poderá decidir pela formação de colegiado para a prática de qualquer ato processual, especialmente: I -
decretação de prisão ou de medidas assecuratórias; II - concessão de liberdade provisória ou revogação de
prisão; III - sentença; IV - progressão ou regressão de regime de cumprimento de pena; V - concessão de
liberdade condicional; VI - transferência de preso para estabelecimento prisional de segurança máxima; e VII -
inclusão do preso no regime disciplinar diferenciado. § 1o O juiz poderá instaurar o colegiado, indicando os
motivos e as circunstâncias que acarretam risco à sua integridade física em decisão fundamentada, da qual será
dado conhecimento ao órgão correicional. § 2o O colegiado será formado pelo juiz do processo e por 2 (dois)
outros juízes escolhidos por sorteio eletrônico dentre aqueles de competência criminal em exercício no primeiro
grau de jurisdição. § 3o A competência do colegiado limita-se ao ato para o qual foi convocado. § 4
o As reuniões
poderão ser sigilosas sempre que houver risco de que a publicidade resulte em prejuízo à eficácia da decisão
judicial. § 5o A reunião do colegiado composto por juízes domiciliados em cidades diversas poderá ser feita pela
via eletrônica. § 6o As decisões do colegiado, devidamente fundamentadas e firmadas, sem exceção, por todos os
seus integrantes, serão publicadas sem qualquer referência a voto divergente de qualquer membro. § 7o Os
tribunais, no âmbito de suas competências, expedirão normas regulamentando a composição do colegiado e os
procedimentos a serem adotados para o seu funcionamento.
8
impedimento operacional que justifique a manutenção da posição do CNJ contra o juiz das
garantias após a entrada em vigor da Lei 12.694/2012.
O argumento de que os processos sofreriam retardo, podendo violar a razoável
duração do processo, inclusive acarretando prescrições também não se sustenta pelo mesmo
fundamento acima exposto no que toca ao § 5o
do art. 1º da Lei 12.694/2012. Além disso, é
importante ter claro que, contrariamente à solução adotada nessa Lei, a criação do juiz das
garantias não implicará no aumento de atos processuais. Não haverá acréscimo à sobrecarga
de trabalho do Poder Judiciário, o que poderia causar delonga não razoável. O que o projeto
de reforma propõe é, simplesmente, dividir o trabalho já realizado por um único juiz no
sistema do Código vigente entre dois magistrados distintos, sendo que um atuaria na fase da
investigação e outro na fase processual.
Não bastasse isso, a razoável duração do processo é uma garantia, prevista no artigo
5º, LXXVIII, da Constituição, ou seja, onde o constituinte mais depositou força nos direitos e
garantias fundamentais, no Livro I, Título II – Direitos e Garantias. Não se pode interpretar o
dispositivo constitucional em favor do poder punitivo estatal, já que, por opção do
constituinte derivado, trata-se de uma garantia e como tal deve ser tratada. Essa é única
interpretação possível de ser feita em conformidade com a Constituição. Assim, não cabe
invocá-la como fundamento contrário à criação do juiz das garantias.
A magistratura em geral, com algumas exceções, sustenta que o juiz não se torna
parcial por ter tomado conhecimento da investigação e ter proferido decisão na fase pré-
processual. A falha desse argumento está no seu fundamento inicial. É que a idéia de
parcialidade do juiz sempre foi tratada, no Brasil, pela própria magistratura, como algo
relacionado à falta de probidade do julgador na condução do processo. Considera-se algo
grave afastar o juiz do processo por constatar parcialidade e isso, raramente, acontece. É tido
como má-conduta do juiz que tem algum interesse direto ou indireto no processo para
beneficiar uma das partes.
É por isso que a jurisprudência insiste em dizer que o CPP vigente prevê hipóteses
taxativas de impedimento e suspeição (artigos 251 a 256). O que o projeto de reforma total
pretende é derrubar esse mito. Note-se, inclusive, que o artigo 55, §1º, do Projeto de Lei nº
156/2009 deixa claro que as previsões para afastamento do magistrado são apenas
exemplificativas, podendo a parcialidade do juiz ser verificada de modo casuístico e por
critérios não previamente definidos. Dentre os motivos não elencados no artigo 55 do Projeto
9
para fins de afastamento do magistrado, mas que podem ser perfeitamente invocados está o
envolvimento do juiz com o caso penal e o seu interesse moral no resultado da causa.19
A perda da capacidade de decidir o caso penal com isenção por parte do juiz que
atuou na investigação, nela proferindo decisões, já foi manifestada pelo TEDH como será
abordado adiante. A constatação e aceitação dessa falibilidade humana tão normal e que nada
tem a ver com a honestidade do magistrado mostra uma sociedade democrática madura. Tem-
se, de fato, a impressão que todos os argumentos levantados pela própria magistratura contra a
adoção do juiz das garantias refletem apenas uma espécie de ferida narcísica institucional.
3 Uma Breve Explicação Psicanalítica
Alexandre Morais da Rosa20
, em uma extensa revisão da psicanálise lacaniana,
ressalta a condição humana do juiz que, como toda pessoa, vivencia e interpreta o mundo
através de uma dinâmica psíquica não apenas consciente e racional. O inconsciente é
inexpugnável de qualquer procedimento mental complexo e, por isso, a compreensão da
realidade objetiva é permeada por fantasias, desejos, emoções e o que mais habitar o
inconsciente de quem a interpreta.
Por mais que o sujeito, intérprete da realidade, policie seus pensamentos e
deliberações, os aspectos inconscientes não estão sujeitos ao controle racional do ego21
e,
inevitavelmente, emergem. Por isso, não há como esperar do juiz neutralidade total em
relação ao caso penal, como se suas conclusões pudessem ser obtidas, unicamente, por
critérios racionais e controláveis pela inteligência. Toda e qualquer interpretação que se faça
da realidade não fica isenta da interferência do inconsciente. É impossível que o juiz expulse
de si todos os afetos gerados pelo caso penal e consiga, com base, unicamente em critérios
pré-determinados pelo Direito, dizer o essencial: “condeno” ou “absolvo”. Isso já está
provado pela psicanálise.
19 Cf. PONTES DE MIRANDA, Francisco C. Comentários ao Código de Processo Civil, t. II. 3 ed., Forense,
Rio, 1988, p. 429: “O interesse moral pode ser o interesse na repercussão meramente ética, não somente porque a
tal interesse pode corresponder direito, pretensão, ação ou exceção. O interesse moral pode consistir em pressão
psíquica sobre o juiz, como o interesse material. A lei não distinguiu. São de repelir-se os julgados que o
eliminam como causa de suspeição”
20 MORAIS DA ROSA, Alexandre. Decisão no Processo Penal como Bricolage de Significantes. Tese de
doutoramento apresentada na UFPR em 2004. Disponível em:
<http://tjsc25.tj.sc.gov.br/academia/cejur/arquivos/decisao_processo_penal_alexandre_rosa.pdf>. Acessado em:
07/09/2010.
21 LAPLANCHE, Jean. Vocabulário da psicanálise: Laplanche e Pontalis. 4 ed. São Paulo: Martins Fontes,
2001, pg. 124: “Instância do aparelho psíquico definido por Freud como o mediador entre os desejos do id, as
imposições do superego e as exigências da realidade. É responsável pela defesa da personalidade contra a
angústia e pela adaptação do sujeito.”
10
O conhecimento desse fenômeno derruba a pretensão dos juristas de atingir a
chamada “verdade real” e impõe a responsabilidade por lidar, de forma madura e
consequente, com essa realidade elementar do Ser Humano, como é o Juiz, e seu impacto no
processo penal e na vida social.
A inacessibilidade da verdade, entendida como a exata correspondência do resultado
da interpretação do historiador ou do juiz com a realidade material dos fatos e eventos da
vida, é um fato para todo ser humano, logo, para todo juiz. Como, então, o advento do juiz de
garantias interferiria nisso? É o se pretende responder.
A idéia da instituição do juiz de garantias é, além de permitir a especialização de
órgãos do Judiciário, essencialmente, possibilitar que o primeiro contato do juiz com o caso
penal seja, originalmente, mediante um processo em contraditório. Desse modo, sua
interpretação da realidade será influenciada, tanto pelo argumento da defesa, quanto pelo
argumento da acusação.
Exclui-se, assim, a influência de conteúdos inconscientes diretamente relacionados
ao caso, introjetados (internalizados) durante a investigação e trazidos somente pelos
argumentos da acusação, embora não seja possível livrar-se de outros tipos de influência
inconsciente que podem surgir no processo independente da atuação do juiz na investigação.
Ocorre que os conteúdos inconscientes que surgiriam, de qualquer modo, durante o processo
podem ser influenciados tanto pelos argumentos da defesa quanto da acusação, sem a
internalização prévia da hipótese da acusação.
Vários são os conteúdos que se enquadrariam nessa última gama de processos
inconscientes diretamente ligados ao caso, em si, que podem ser evitados pela atuação
estritamente processual do juiz.
Explica-se: Não é possível evitar, mesmo com a instituição do juiz de garantias, que
o magistrado coloque elementos inconscientes seus como fatores relevantes para a (e na)
decisão. Isso sempre acontecerá com maior ou menor intensidade, independente da instituição
do juiz das garantias. No entanto, o julgador que atua na fase investigatória, concedendo
medidas restritivas de direitos fundamentais dos investigados, como a quebra de sigilos de
correspondência, bancário, fiscal, telefônico, indisponibilidade de bens, cautelar de busca e
apreensão ou até mesmo de prisão processual introjeta (internaliza) sua percepção sobre o
caso trazido ao seu conhecimento e sobre o envolvimento e responsabilidade das pessoas com
ele relacionadas.
Isso porque o juiz tem de tomar uma decisão, ainda que em grau de cognição
sumária, sobre a necessidade da medida. Essa decisão faz com que ele obtenha um
entendimento sobre o caso e os envolvidos, o que é feito com base, exclusivamente, na versão
11
do acusador, obtida pelo método inquisitivo. Para decretar as medidas que lhe são
demandadas na fase de investigação, o juiz precisa crer, ainda que “superficialmente”, na
hipótese da acusação. Fazendo isso, ele introjeta, inconscientemente, essa versão, transferindo
para o réu o ônus de convencê-lo do contrário. São idéias que ficam pré-concebidas e
modificá-las, posteriormente, exige do juiz muito mais do que senso de justiça.
A cargo de exemplo, dentre os processos psíquicos que podem influenciar na
interpretação que o juiz dá aos fatos já durante o processo, se ele atuou na fase pré-processual,
tem-se o deslocamento para o argumento da acusação.
Freud22
descreve esse mecanismo inconsciente ao analisar as disparidades entre os
conteúdos manifestos e as idéias latentes nos sonhos e como um está ligado ao outro. O
deslocamento foi resumido da teoria freudiana por Laplanche23
como:
Fato de a importância, o interesse, a intensidade de uma representação ser
suscetível de se destacar dela para passar a outras representações
originariamente pouco intensas, ligadas à primeira por uma idéia
associativa.
Através desse fenômeno, o peso valorativo atribuído pelo juiz às decisões por ele
tomadas na fase investigativa, que invariavelmente são de natureza inquisitória, tende a se
destacar da sua imagem mnemônica que o juiz, agora, força ao inconsciente. No esforço de se
livrar de prejulgamentos o juiz força-se a reprimir o afeto atribuído às suas decisões anteriores
que lhe conferia a convicção necessária para tomá-las (o “estar certo de” é um afeto atribuído
a uma decisão racional). Durante o processo, a importância e o interesse que esse afeto
reprimido possui tende a passar para o argumento que mais intimamente se associa à decisão
com a qual está ligado: a decisão de restringir direitos do acusado durante a investigação.
Assim, o argumento da acusação recebe um interesse e relevância que não lhe são
próprios, mas deslocados pelo juiz devido a sua semelhança com as representações que havia
feito anteriormente ao julgar a aplicação de qualquer medida pré-processual a que, espera-se,
tenha sido atribuído certo grau (ainda que em menor proporção do que na sentença) de
convicção.
Assim, explica-se, por exemplo, o fato de o juiz colocar grande interesse no
depoimento de uma testemunha, ressaltando sua importância quando, objetivamente, não seria
relevante para o caso. Essa prova só ganha destaque porque, segundo a interpretação do juiz,
22 FREUD, Sigmund. (1900) Interpretação dos sonhos. In: FREUD, Sigmund. Obras completas de Sigmund
Freud. Rio de Janeiro: Delta,1958. Vol. VII.
23 LAPLANCHE, Jean. Vocabulário da psicanálise: Laplanche e Pontalis. 4 ed. São Paulo: Martins Fontes,
2001, p. 116.
12
ela “explica” uma informação levantada na fase inquisitória ou “corrobora”24
algo nela já
verificado, mas não confirmado sob o crivo do contraditório.
Como o magistrado tem introjetada a versão do acusador por ele acolhida quando da
concessão de medidas pré-processuais (que, sob uma análise consciente, acredita ser apenas
perfunctória) ele desloca a importância que ele mesmo deu para tal informação na fase
inquisitória (a ponto de, com base nela, restringir direitos fundamentais do acusado), para o
depoimento da testemunha. Com isso, a importância, o interesse, a intensidade da
representação da informação adquirida durante a investigação se destaca dela mesma e passa
para outra representação - o depoimento testemunhal em juízo – que, originalmente, não teria
tanta intensidade e importância. Isso acontece porque o juiz faz uma “ligação”, um
“cotejamento”, entre esse depoimento e a primeira informação, obtida durante a inquisição,
por uma idéia associativa (mas sem que essa associação confira, necessariamente, com o real).
Segundo a teoria psicanalítica, o ego adota os mecanismos de defesa, como é o
deslocamento, para que o sujeito possa suportar afetivamente, no plano consciente, as
consequências dos atos por ele praticados ou sentimentos experimentados. Seria muito
angustiante para um juiz devotado ao seu trabalho e com desejo genuíno de fazer justiça,
conscientizar, por exemplo, que, por decisão sua, um (possível) inocente foi mantido preso
preventivamente.
Para proteger o aparelho psíquico desse sofrimento insuportável, o ego lança mão do
mecanismo de defesa que age inconscientemente, livrando o sujeito da angústia. Então, ele
desloca a importância da representação para confirmar a correção da medida anterior, a prisão
no exemplo dado, permitindo ao sujeito-juiz se auto-absolver, mediante a convicção de ter
adotado a medida correta e de ter sido justo. Com isso não concede o benefício da dúvida ao
acusado, e, sem saber, faz talho da presunção de inocência.
Outros fenômenos inconscientes podem e, provavelmente, vão emergir durante o
processo, como, por exemplo, as projeções25
. Mas não há, com isso, necessariamente uma
predisposição à condenação já que, durante o processo, pode ocorrer ligada tanto ao réu
quanto à vítima.
O uso do mecanismo de defesa do ego projeção pode ocorrer independente da
existência do juiz das garantias. Essa identificação do juiz com o réu ou com a vítima pode
24
LOPES JR., Aury. Direito Processual Penal e sua conformidade Constitucional. Vol I. 3 ed. Rio de
Janeiro:Lumen Juris, 2008, p. 69. O autor faz uso das expressões “cotejando” e “corrobora” para se referir aos
termos, usualmente, empregados nas sentenças condenatórias para “complementar” a prova produzida em juízo
com a “prova” colhida no inquérito.
25“Operação pela qual o sujeito expulsa de si e localiza no outro – pessoa ou coisa – qualidades, sentimentos,
desejos e mesmo “objetos” que ele desconhece ou recusa nele.” LAPLANCHE, Jean. Vocabulário da
psicanálise: Laplanche e Pontalis. 4 ed. São Paulo: Martins Fontes, 2001 p. 374.
13
ocorrer ao longo do processo e o Direito não tem mecanismos para evitá-la. No entanto, a
ação de outros mecanismos inconscientes pode ser evitada ou ter seus efeitos minimizados,
como os do envolvimento do juiz com o caso, reduzindo a probabilidade de danos gerados
por decisão injusta. E é para isso que o juiz das garantias poderá contribuir: para reduzir os
efeitos do envolvimento afetivo do juiz com o caso penal.
Se o juiz atuar durante o inquérito, além de tantos mecanismos de interferência
inconsciente na decisão que existiriam de qualquer modo, haverá, ainda, o envolvimento
afetivo do juiz com o caso, em si, lastreado em crenças previamente introjetadas. Se o juiz
tomar contato com o caso penal, originariamente, na fase processual, guiada pelo
contraditório, ele não estará livre da ação do inconsciente, mas, nesse caso, haverá maior
equilíbrio entre as partes, equalizando-se as chances de ambas obterem a captura psíquica do
julgador, ou seja, o seu convencimento.
Um juiz experiente e com um elevado nível de autoconhecimento poderia notar a
emergência destes afetos e conscientemente tentar controlá-los, mas isso implica um gasto de
energia considerável para tamanho trabalho psíquico26
que poderia ser evitado se as memórias
sobre a investigação simplesmente não existissem. Energia essa que será indispensável ao
trabalho reflexivo de ponderar os argumentos das partes em contraditório.
No tocante ao uso de energia psíquica faz-se relevante conhecer dois outros conceitos
básicos da psicanálise que podem influir fortemente na decisão do juiz: a libido e o
narcisismo.
Novamente tomando por empréstimo o estudo de Laplanche, pode-se tentar entender
a libido através das relações físicas de força e energia. Considera-se a libido como a energia
das pulsões sexuais (força que exerce pressão no aparelho psíquico).
Contrário a Freud, que concebia a libido como uma energia, primordialmente, sexual
e infantil, JUNG27
a descreveu como a energia vital do psiquismo, atribuindo-lhe todas as
pulsões, não só as sexuais. FREUD mais tarde coloca a libido como origem das pulsões de
vida também atribuindo-lhe todo investimento e contra-investimento que não envolvam as
pulsões de morte.
Já o narcisismo é, de forma simples, “o amor pela imagem de si mesmo”. Proposto
por Freud ao analisar o caso Schreber28
(ironicamente sobre o adoecimento de um juiz) o
26 “Trabalho”, aqui no sentido de perlaboração, consiste em libertar-se dos mecanismos de defesa através do
conhecimento e aceitação dos conteúdos recalcados. Base do tratamento psicoterápico. LAPLANCHE, Jean.
Vocabulário da psicanálise: Laplanche e Pontalis. 4 ed. São Paulo: Martins Fontes, 2001.
27 JUNG, Carl. G. A Energia Psíquica. v. VII/I .Petrópolis: Vozes, 2002.
28 FREUD, Sigmund. (1911). O caso Schreber. In: FREUD, Sigmund. Edição standard brasileira das obras
psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1976. Vol. XII.
14
narcisismo seria o estágio intermediário entre o auto-erotismo e o amor objetal29
. Freud30
atrela o conceito de narcisismo à economia libidinal: a criança ao sair do auto-erotismo
infantil (narcisismo primário) precisa aprender a investir a libido, voltada anteriormente para
diferentes aspectos do corpo em cada fase da evolução, em outros objetos externos a si
próprio.
Antes de começar a investir em diferentes objetos (uma tarefa mais complexa), ela
investe, por primeiro, no ego, o qual passa a ser um reservatório de libido (energia vital),
regulando seu investimento nos objetos externos (narcisismo secundário).
A base da economia da libido, então, diz respeito à manutenção do equilíbrio entre a
libido (energia vital) no ego, alimentando o narcisismo (auto-estima), e a libido investida nos
objetos externos, impulsionando o indivíduo à vida fora de si mesmo. Para se entender a
dinâmica do juiz que participa da investigação é importante analisar esse equilíbrio.
Segundo as últimas construções de Freud31
, a libido e, consequentemente, a pulsão
sexual32
são frequentemente voltadas para objetos da pulsão do ego33
para que com a
satisfação dessas pulsões possa também haver o gozo.34
Isso quer dizer que as pessoas podem investir libido em objetos aparentemente
alheios a sua sexualidade, obtendo, por esse modo, a satisfação parcial desta através daqueles
(chegando a uma grande semelhança com a libido de JUNG sem abrir mão da abordagem
sexual).
Assim, é possível a um juiz (como, normalmente acontece com os profissionais
dedicados ao seu trabalho e comprometidos com seu mister), nessa ótica, investir libido em
seu trabalho para receber, ao final de um julgamento, a sensação gratificante de “missão
cumprida” (gozo). Esse mecanismo é saudável, porque mantém o equilíbrio da libido.
29 LAPLANCHE, Jean. Vocabulário da psicanálise: Laplanche e Pontalis. 4 ed. São Paulo: Martins Fontes,
2001.
30 FREUD, Sigmund.(1914) Sobre o Narcisismo: uma introdução. In: FREUD, Sigmund. Edição Standard
Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1969. Vol. XIV, pp.
75-108.
31 FREUD, Sigmund.(1920) Além do Princípio de Prazer. In: FREUD, Sigmund. : Edição Standard Brasileira
das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1969. Vol. XVIII, pp. 17-85.
32 Inspirado pela física, Freud entende as pulsões como forças que movem o aparelho psíquico. A pulsão sexual
é a força que movimenta o indivíduo no sentido da obtenção de prazer, e utiliza a libido como energia.
LAPLANCHE, Jean. Vocabulário da psicanálise: Laplanche e Pontalis. 4 ed. São Paulo: Martins Fontes, 2001.
33 As pulsões do ego ou pulsões de vida, são os chamados instintos. São as forças que movem o psiquismo no
sentido de auto-preservação. FREUD, Sigmund.(1920) Além do Princípio de Prazer. In: FREUD, Sigmund. :
Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1969.
Vol. XVIII, pp. 17-85.
34 Entendendo o princípio do prazer (um dos princípios básicos do funcionamento psicológico) como uma
evitação do desprazer (aumento de tensão) e busca do prazer (redução da tensão), o gozo seria o momento exato
em que se dá a redução de tensão no aparelho psíquico. LAPLANCHE, Jean. Vocabulário da psicanálise:
Laplanche e Pontalis. 4 ed. São Paulo: Martins Fontes, 2001.
15
O policial, por exemplo, que investe sua libido no trabalho investigativo complexo,
gastando energia na construção do inquérito, buscando comprovar a materialidade de um
crime e identificar sua autoria, muitas vezes, só obtém o gozo mediante a confirmação do
acerto de suas hipóteses, do valor do seu labor, o que só é obtido com a condenação, coroando
seu investimento de libido no trabalho.
Do mesmo modo que o policial, o juiz que se envolve no inquérito não está imune a
esse fenômeno, precisando empregar um esforço psíquico em negar-se esse gozo para
oferecer, substancialmente e não como mera formalidade, igual oportunidade de defesa ao
réu.
Volta-se ao exemplo dado anteriormente, em que um juiz decreta a prisão preventiva
de um acusado, o qual permanece preso por longo tempo: Se ao encerrar o processo, o juiz
puder confirmar que a decisão de prender e manter preso foi acertada e justa, ele tende a obter
o gozo, a sensação prazerosa de satisfação pelo “dever cumprido”. Ao contrário, a constatação
de que a decisão de mandar prender possa ter sido equivocada e injusta, exige do aparelho
psíquico que negue o gozo a si mesmo, que se auto-imponha o desprazer, a frustração.
Reconhecer, então, como verdadeira a hipótese da acusação e corretas e necessárias
as decisões pré-processuais diminui a ansiedade da pessoa do juiz, permitindo-lhe reduzir a
tensão de seu aparelho psíquico e obter o gozo. A propensão natural do aparelho psíquico é
buscar o gozo. Frustrar essa expectativa de gozo pode quebrar o equilíbrio imposto pelo
princípio da realidade35
impondo sofrimento insuportável. Negar-se o gozo implica em
angústia, tensão e ansiedade.
O ego, então, faz uso dos seus mecanismos de defesa para proteger o aparelho
psíquico desse desprazer, dessa dor, levando o agente a, inconscientemente, “bloquear” a
aceitação para teses opostas, ou seja, às teses que podem impedir o preenchimento de sua
expectativa de gozo. O indivíduo “se fecha”, não se permite “abertura” para aceitar situações
que possam representar ameaça de tensão. Como reconhecer o equívoco causar-lhe-ia
sofrimento psíquico, ele fica psiquicamente bloqueado para aceitar a versão defensiva.
Além do mais, esse gasto de energia (equilíbrio prazer/desprazer) para controlar um
aspecto inconsciente (que não estaria lá se o juiz não participasse da investigação), esse
investimento de libido, implica outro problema: ao terminar uma investigação na qual o juiz
se engajou, ele se vê obrigado a reprimir as representações advindas desta etapa para iniciar o
35 É a combinação do princípio do prazer (direção do aparelho psíquico para a obtenção do prazer e evitação do
desprazer) com as exigências da realidade. O indivíduo tolera certa quantidade de tensão para adiar ou renunciar
a obtenção de um prazer, pois a sua realização resultaria em um desprazer ainda maior que a sua renúncia devido
a interferências externas. O sujeito passa a viver num equilíbrio entre sofrimentos impostos por restrições sociais
e obtenções de prazeres permitidos. Cf. ALEXANDER, Franz; STAUB, Hugo. Psicologia Judiciária: o
criminoso e seus juízes. Rio de Janeiro: Ed. Guanabara, 1934.
16
processo sem pré-juízos. Com isso é necessário desinvestir a energia associada a esse trabalho
que volta para o ego causando uma excitação frustrada. O indivíduo fica tenso, em conflito
interior.
Esse desequilíbrio, segundo Freud36
, provoca tensão pela libido deslocada que seria a
causa mais comum da angústia37
. A simples ameaça desta angústia pode levar o ego a
reproduzir uma reação que a atenue e, com isso, engatilhar mecanismos de defesa38
a fim de
evitá-la. É como se a pessoa precisasse se proteger desse estresse. Freud se referiu a isso
como sinal de angústia, o que coloca o juiz em uma posição de guarda inconsciente contra
qualquer coisa que venha a provocar esse desinvestimento da investigação (como o argumento
da defesa do réu).
O desequilíbrio criado, com a retirada da expectativa de obtenção de prazer gerada
por um objeto externo de investimento (a convicção do juiz criada durante a investigação),
vira a “balança da libido” para o lado do ego. Isso pode significar um reinvestimento dessa
libido livre no próprio ego, aumentando as defesas narcísicas.
Com isso há a possibilidade de, após proferir medidas pré-processuais que requeiram
um certo grau de certeza em relação a existência de crime e da autoria deste, a absolvição do
réu seja interpretada pelo julgador como “prova” de sua falibilidade. (Essa “prova” é do
sujeito perante ele mesmo).
Para quem, eventualmente, já se encontra em um estado temporário de narcisismo
desequilibrado (o que acontece bastante com pessoas com elevado grau de auto-exigência,
aquelas que “não se permitem errar”), uma prova de sua falibilidade pode ser introjetada
como um ataque à imagem de si, representando uma ferida narcísica39
cuja angústia pode
engatilhar os mesmos mecanismos de defesa já citados. JUNG40
descreve essa tendência ao
dizer que:
...quando se trata de algo que ultrapassa nossas forças, de algo que poderia
facilmente não dar certo... ...as forças emocionais profundas são liberadas, a
convicção se torna cega autosugestão e o campo psíquico da visão se estreita
em torno de um único ponto fixo sobre o qual está concentrado todo o peso
das forças inconscientes.
36 FREUD, Sigmund. (1932) A angústia e a vida instintiva (Novas Contribuições à Psicanálise). In: FREUD,
Sigmund. Obras completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Delta,1956. Vol. XVII, p. 87-118.
37 A angústia é o resultado de um descontrole de excitações, caracterizada por um estado de intenso desprazer.
FREUD, Sigmund. (1932) A angústia e a vida instintiva (Novas Contribuições à Psicanálise). In: FREUD,
Sigmund. Obras completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Delta,1956. Vol. XVII, pp. 87-118.
38 Gama de mecanismos a disposição do ego utilizados para manter a integridade do aparelho psíquico contra
tudo que pode suscitar o desenvolvimento de angústia. LAPLANCHE, Jean. Vocabulário da psicanálise:
Laplanche e Pontalis. 4 ed. São Paulo: Martins Fontes, 2001.
39 Sentimento de fracasso e incompetência resultantes de um ataque à auto-imagem que normalmente carrega
resquícios da onipotência infantil. Cada ponto no desenvolvimento psíquico em que há uma descoberta que
quebre o sentimento de onipotência infantil é entendido como uma ferida narcísica.
40 JUNG, Carl. G. (2002) A Energia Psíquica. Petrópolis: Vozes, Vol. VII/I.
17
Essas são apenas algumas dinâmicas comuns a todas as pessoas que interfeririam no
devido processo legal, sabotando o contraditório e a aspiração de um processo justo. Esses
mecanismos podem ser trabalhados pelo próprio juiz, mediante um esforço reflexivo e de
autoconhecimento (obtido pela via da psicanálise), mas como se tratam de dinâmicas
inconscientes, o controle nunca é total e nem sempre possível.
Vários outros aspectos psicológicos podem afetar a decisão processual (como as
várias psicopatologias e traços de personalidade, objetos dos psicotécnicos), mas os abordados
neste trabalho são importantes e podem ser controlados, pelo menos em parte, com a simples
isenção da participação do juiz na investigação.
O juiz que não toma decisões durante a investigação não faz esses investimentos
psíquicos, por isso não precisa despender energia para desfazê-los, reduzindo sua angústia de
decidir na sentença. Assim, a convicção judicial torna-se mais imparcial, calcada nos
argumentos das partes que encontram a chance de se enfrentar com igualdade de
oportunidades de convencimento, contrariamente à auto-sugestão de que falou Jung.
Além disso, a redução do investimento libidinal na resolução do caso reduz a
importância de uma possível frustração. O julgamento se torna, assim, uma decisão
potencialmente menos angustiante em geral. Com isso o sinal de angústia estaria reduzido,
diminuindo as chances de engatilhar mecanismos de defesa, mesmo os que se apresentam
exclusivamente no processo. Quanto menor a angústia, menor a possibilidade de disparo dos
mecanismos de defesa do ego. Assim, menores as chances de que a decisão judicial esteja
motivada em fatores inconscientes, apenas deslocados para o argumento usado na
fundamentação sentencial.
Os juristas precisam aceitar a presença do inconsciente estudado pela psicanálise, o
qual, provavelmente, mais do que qualquer critério de razão, já que desconhecido e
incontrolável, seja determinante no convencimento do Juiz. Não é mais admissível manter a
crença na dualidade do Ser-Humano, divido em emoção e razão, baluarte da superada
filosofia da consciência. E para quem concede pouca credibilidade à psicanálise, preferindo
os critérios da medicina tradicional, o avanço da neurociência também já permitiu comprovar,
por outros métodos e sob outros critérios de avaliação, que a emoção desempenha vários
papéis no processo de raciocínio. Verificou-se que a “emoção pode dar mais relevo a
determinada premissa e, assim, influenciar a conclusão em favor dessa premissa.”41
António Damásio, expondo a respeito da obrigatoriedade da presença da emoção no
processo decisório, demonstra que emoções distintas podem levar a conclusões diferentes,
41
Cf. DAMÁSIO, António. O Erro de Descartes: Emoção, Razão e o Cérebro Humano. Tradução de Dora
Vicente e Georgina Segurado. 2 ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1996, p. 7.
18
ainda que se aplicando métodos e critérios científicos amplamente difundidos e aceitos. O
autor demonstra essa conclusão teórica, empiricamente, com um exemplo experimentado
pelos curadores do Museu Getty. Esses curadores possuíam o grande desejo de adicionar uma
escultura grega ao acervo do museu e, ao avaliá-la, concluíram ser a peça original e
verdadeira.
No entanto, vários peritos internacionais periciaram a mesma peça e julgaram se
tratar de uma falsificação. Segundo António Damásio, o segundo julgamento foi resultado de
emoções de incredulidade anteriores à aplicação dos métodos científicos de aferição. Havia
um sentimento de rejeição instintivo em acreditar na originalidade daquela peça ao verem-na
pela primeira vez. “Emoções de tipos diferentes participaram dessas avaliações díspares em
etapas distintas do processo de raciocínio”.42
É que os técnicos que a julgaram como sendo
original tinham “o desejo gratificante e difuso de avaliar o objeto”.43
Já os que a julgaram
falsa, partiram “do palpite imediatamente punitivo de que havia algo errado. Mas em nenhum
dos casos a razão atuou sozinha.”44
Rui Cunha Martins, citando Fernando Gil, sob o aspecto filosófico, fala em “caráter
alucinatório da evidência”, o que parece, salvo melhor juízo, ter o mesmo sentido
psicanalítico do mecanismo de defesa do ego deslocamento.45
A evidência a que o professor
da Universidade de Coimbra se refere pode ser vista, para fins deste estudo, como os
elementos de “prova” colhidos durante o inquérito e as decisões judiciais nele tomadas que
contaminam a convicção judicial a ser manifestada na sentença.
Vê-se que, independente da área de estudo e da linha de pesquisa adotada dentro de
cada área científica, as ciências que investigam o processo cognitivo, a capacidade decisória e
o comportamento humano não admitem mais a possibilidade de separar o sujeito de modo
dual, em um ser parcialmente racional e parcialmente emocional, como se esses aspectos
fossem incomunicáveis. Por que os juristas continuariam a acreditar nisso? Por que continuar
a dizer que o juiz, por critérios unicamente racionais, continua sendo capaz de despir-se das
experiências e circunstâncias vividas durante o inquérito e realizar um julgamento sem
contaminações no processo? Essa conclusão é muito ingênua. Afinal, ninguém consegue
passar imune a si mesmo, nem o juiz!
42 Ibidem, p. 7/8.
43 Ibidem
44 Ibidem
45 Fernando Gil, no Tratado da Evidência, apud MARTINS, Rui Cunha. O Ponto Cego do Direito: The
Brazilian Lessons. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 16, afirma que “a evidência representa uma alucinação,
mas não no sentido de um percepto do irreal em vez da percepção do existente: antes significa a transposição da
percepção para outra coisa que não ela mesma. É uma operação alucinatória que, com a força irrecusável do real,
converte em verdade a percepção e a significação.”
19
4 Os precedentes do Tribunal Europeu de Direitos Humanos (TEDH)
A posição do TEDH, desde meados de 1980, tem sido no sentido de que o juiz que
participa da investigação não pode participar do processo destinado ao julgamento da causa
penal, porque, se assim fosse, estaria violada a imparcialidade objetiva.46
As primeiras
decisões do TEDH que balizaram as seguintes foram proferidas nos casos De Cubber v.
Bélgica e Piersak v. Bélgica (1982/1984).
O Caso Piersak tratou da participação de um Membro do Ministério Púbico que
havia atuado na fase de investigação como membro do Tribunal Del Jurado, presidindo-o, e
que julgou o mérito do caso penal. O TEDH, pela primeira vez, posicionou-se a respeito da
garantia do réu a um julgamento imparcial, tanto subjetivo, como objetivo.47
Em 1984, o TEDH julgou o caso De Cubber o qual discutia a possibilidade de um
juiz que teria participado da investigação como juiz instrutor, tendo, nessa oportunidade,
decretado a prisão preventiva do suspeito, atuar também como juiz do processo junto ao
Tribunal de primeira instância. Nesse caso, o TEDH também entendeu pela parcialidade
objetiva do juiz, em que pese tenha registrado que a imparcialidade se presume, cabendo à
parte provar o contrário.48
Aury Lopes Jr., comentando a respeito da decisão do TEDH no caso Piersack afirma:
a imparcialidade objetiva diz respeito a se tal juiz se encontra em uma
situação dotada de garantias bastantes para dissipar qualquer dúvida razoável
acerca de sua imparcialidade. Em ambos os casos, a parcialidade cria a
desconfiança e a incerteza na comunidade e nas suas instituições. Não basta
estar subjetivamente protegido; é importante que se encontre em uma
situação jurídica objetivamente imparcial (visibilidade).49
Maya destaca que o entendimento versado nos casos Piersack e De Cubber, sofreu
oscilações durante as décadas de 1980 e 1990, tendo o TEDH julgado muitos casos
semelhantes, envolvendo a questão em torno da imparcialidade do juiz.50
46 Ver LOPES JR. Aury. Direito Processual Penal e sua conformidade Constitucional. Vol I. 3 ed. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2008.
47 MAYA, André Machado. A prevenção como regra de fixação ou de exclusão da competência no processo
penal? Uma (re)leitura do artigo 83 do Código de Processo Penal a partir da jurisprudência do Tribunal Europeu
de Direitos Humanos. In: GIACOMOLLI, Nereu José; MAYA, André Machado (Org.). Processo Penal
Contemporâneo. Porto Alegre: Nuria Fabris, 2010, p. 50
48 Ibidem, p. 51.
49 Ver LOPES JR. Aury. Direito Processual Penal e sua conformidade Constitucional. Vol I. 3 ed. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 126.
50 MAYA, André Machado. A prevenção como regra de fixação ou de exclusão da competência no processo
penal? Uma (re)leitura do artigo 83 do Código de Processo Penal a partir da jurisprudência do Tribunal Europeu
20
No caso Hauschild v. Dinamarca (1989), o TEDH manifestou-se pela violação da
imparcialidade objetiva, porque o juiz do caso havia proferido inúmeras decisões de
prorrogação de prisão cautelar, expedido mandados de busca e apreensão e presidido o
julgamento final condenatório. Também os mesmos juízes da corte de apelação que negaram
provimento aos recursos do réu contra decisões que lhe negaram liberdade provisória,
proferiram decisão final condenatória.
No caso Oberschlick v. Áustria, os membros da Corte de Apelação julgaram recurso
contra a decisão condenatória, mantendo-a depois de já ter julgado recurso do autor contra a
suspensão do processo e lhe dado provimento. O TEDH, baseado na legislação interna da
Áustria, que determina que juízes que atuaram nas fases anteriores ao processo ficam
impedidos de julgá-los, decidiu pela violação da garantia da imparcialidade.51
No caso Pfeifer and Plankl v. Áustria, dois juízes que participaram do julgamento já
haviam participado na fase de investigação, tendo um deles, inclusive, determinado a prisão
preventiva do suspeito, interrogado-lhe e o mantido preso. O TEDH reconheceu violação da
garantia da imparcialidade com base nos mesmos fundamentos do caso Oberschlick.
No caso Castillo-Algar v. Espanha (1998), o TEDH analisou uma situação em que
dois juízes da Corte Militar que haviam participado do julgamento de recurso relativo ao auto
de processamiento interposto pelo réu, negando-lhe provimento e, posteriormente, integraram
a sessão de julgamento que lhe condenou, confirmando o juízo de culpabilidade feito pelo
juiz de instrução.
Segundo o TEDH, os juízes haviam julgado quanto aos indícios apontados pelo Juiz
de instrução e haviam firmado sua convicção quanto ao fato sob julgamento, “o que é
suficiente para ensejar um temor pela perda da imparcialidade, sendo pertinentes as dúvidas
relevantes quanto à imparcialidade deles, a qual pode ser justificada objetivamente.”
Oliva Santos afirma que a imparcialidade é afetada pelo pre-juízo e não pela
investigação em si mesma. Por isso, não importa se os atos de investigação contaram com a
participação do juiz, mas, sim, se o julgador, tendo em conta os atos que ele pratica ou o
conteúdo do que ele tem de examinar, precisa realizar operações intelectuais e volitivas, ou
necessariamente se haverá de se ver envolvido em processos psicológicos, que impliquem em
um pre-juízo sobre condutas e/ou sobre pessoas.52
reunir el material o estar en contacto con las fuentes del mismo no es lo
relevante: lo relevante son los prejuicios o prevenciones y si bien es verdad
de Direitos Humanos. In: GIACOMOLLI, Nereu José; MAYA, André Machado (Org.). Processo Penal
Contemporâneo. Porto Alegre: Nuria Fabris, 2010, p. 54.
51 Ibidem, p. 55.
52 OLIVA SANTOS, Andrés de la. Jueces Imparciales, Fiscales “Investigadores” y Nueva Reforma Para La
Vieja Crisis De La Justicia Penal. Barcelona: PPU, 1988, p. 30 (Tradução livre).
21
lo que afirma el TC y cabe que esas operaciones engendren el prejuicio o
prevención que quiebra la imparcialidad, hay que atender más, como
elemento de muy superior importancia, a las resoluciones, por modestas que
parezcan, que el Juez de Instrucción haya de adoptar en vista del material
reunido (por quien sea), enjuiciándolo, valorándolo y comparándolo con
preceptos legales y máximas de la experiencia. Porque respecto de esas
resoluciones, no es que pueda quizá o que tal vez quepa el prejuicio: es que
las resoluciones lo entrañan, lo presuponen.53
A parcialidade se origina quando o conteúdo da decisão que se destina a resolver
uma questão incidental da investigação, como pode ser a manutenção ou levantamento de
medidas cautelares, é substancialmente idêntico ao que integra o juízo de culpabilidade. É,
portanto, a emissão antecipada de um veredicto de culpabilidade, ou de um juízo de
imputação, que converte em fundada a dúvida acerca da imparcialidade do julgador.54
Nota-se a necessidade de o Brasil incorporar as decisões dos tribunais internacionais
ao seu Ordenamento interno, sobretudo no que toca à necessária imparcialidade objetiva e
subjetiva do julgador para sustentação da estrutura acusatória, agora expressa no Projeto de
Reforma do CPP.
Não admitindo que as decisões do TEDH sirvam de argumento idôneo para justificar
a instituição do juiz das garantias, manifesta-se Mauro Fonseca Andrade, afirmando que as
referidas decisões do TEDH não servem de referencial para o Brasil. Para ele, trata-se de uma
fundamentação equivocada para justificar opções ideológicas. Segundo ele, “nada teria o
TEDH a nos ensinar quanto à forma de preservarmos a imparcialidade do juiz nacional.” 55
De acordo com o Promotor de Justiça, o Caso Piersack vs. Bélgica seria resolvido no
processo penal brasileiro com a aplicação do artigo 252 do CPP, não sendo necessário, e nem
correto, sustentar a instituição do juiz das garantias para seguir orientações do TEDH. Já o
Caso De Cubber vs. Bélgica, segundo Fonseca Andrade, não se aplicaria ao caso brasileiro,
porque não temos o juizado de instrução.
53 OLIVA SANTOS, Andrés de la. Jueces Imparciales, Fiscales “Investigadores” y Nueva Reforma Para La
Vieja Crisis De La Justicia Penal. Barcelona: PPU, 1988, p. 35/36.
54 Tradução livre de parte da Sentença nº 14/1999 do TC – Tribunal Constitucional da Espanha, transcrita em
espanhol por André Machado Maya em A prevenção como regra de fixação ou de exclusão da competência no
processo penal? Uma (re)leitura do artigo 83 do Código de Processo Penal a partir da jurisprudência do Tribunal
Europeu de Direitos Humanos. In: GIACOMOLLI, Nereu José; MAYA, André Machado. (Org.). Processo Penal
Contemporâneo. Porto Alegre: Nuria Fabris, 2010, p. 54.
55 ANDRADE, Mauro Fonseca. O Juiz das Garantias na interpretação do Tribunal Europeu dos Direitos do
Homem. Revista de Doutrina da 4ª Região, Porto Alegre, n. 40, fev. 2011. Disponível em:<
http://www.revistadoutrina.trf4.jus.br/artigos/edicao040/Mauro_andrade.html>Acesso em: 24 mar. 2011.
22
O promotor de justiça acerta quando diz que, no processo penal brasileiro, o caso
Piersack vs. Bélgica se resolveria pela aplicação do art. 252 do CPP. Ele também está certo
quando diz que no Brasil (felizmente) não existe juiz de instrução.56
O equívoco do argumento de Fonseca Andrade está em dizer que as decisões do
TEDH não têm nada a ensinar ao Brasil. Elas têm, sim, e muito. A importância das decisões
do TEDH para o processo penal brasileiro não está na fundamentação jurídico-dogmática.
Não é relevante se um dos casos poderia ser resolvido, no Brasil, com a aplicação do artigo
252 do CPP. Tampouco se lá a decisão foi pertinente ao juiz de instrução, figura estranha ao
Direito pátrio. O grande valor dessas decisões está no reconhecimento da parcialidade
objetiva. Isso, sim, é o que o TEDH tem a ensinar.
Os fundamentos das decisões do TEDH é que interessam. Como dito por Oliva
Santos,57
o problema não está (só) no fato de o juiz ter recolhido o material probatório como
faz o juiz de instrução, mas no tipo de decisões que precisa tomar, as quais exigem um juízo
antecipado, logo um pre-juízo, sobre os fatos e pessoas. E as decisões que exigem um pre-
juízo estão previstas no nosso ordenamento processual também, como as medidas cautelares
proferidas durante a investigação criminal pelo juiz.
O reconhecimento de que o juiz perde a necessária imparcialidade objetivamente
quando atua na fase de investigação é o que interessa. E essa constatação do TEDH permite
entender o instituto e aplicá-lo, independente de qualquer avaliação quanto à conduta pessoal
do juiz – a sua probidade processual. É o reconhecimento jurídico do que a psicanálise e a
experiência de quem milita já sabem. Essa é a importância das decisões do TEDH e não é
pouco o que elas podem ensinar.
O ponto crucial do entendimento do TEDH é que visa garantir a posição de terzietá
del giudice, no sentido de terceiro alheio ao processo e sem qualquer tipo de interesse nele,
como referido pelos italianos, ou seja, que o julgador chegue ao momento culminante do
processo, o momento de sentenciar, o tanto quanto possível livre de pre-juízos, de qualquer
convencimento obtido antes do momento oportuno.58
Não há como negar que essa
constatação é também válida para o processo penal brasileiro, independente de não contar
com a figura do juiz de instrução.
56 Aliás, quando houve tentativa recente de instituir algo semelhante, por meio do artigo 3º, da Lei 9034/95, o
Supremo Tribunal Federal julgou pela inconstitucionalidade do dispositivo na ADI nº 570-2, de Relatoria do
Ministro Maurício Correa, Julgada em 02/12/2004. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em: 20/06/2011.
57 Cf. OLIVA SANTOS, Andrés de la. Jueces Imparciales, Fiscales “Investigadores” y Nueva Reforma Para
La Vieja Crisis De La Justicia Penal. Barcelona: PPU, 1988, p. 35/36. (Tradução Livre)
58 Cf. FERRAIOLI, Marzia. Il Ruolo di “Garante” Del Giudice per le indagini preliminare. Padova: Cedam,
1993, p. 41: “a far sì che il giudice arrivi al momento culminante del processo, quello decisionale, il più
possibilie impregiudicato”. Na mesma obra, nota da pg. 76: “Il giudice del dibattimento deve avere la mente
sgombra dalla conoscenza del fatto e da preoconcetti da essa indotti, perché deve poter genuinamente esaminare
le richieste probatorie delle parti, alle quali é riconosciuto il diritto alla prova.”
23
Montero Aroca considera que os casos analisados pelo TEDH seriam de
incompatibilidade e não de imparcialidade, porque o envolvimento do juiz seria com o objeto
do processo e não em favor de uma das partes.59
Percebe-se que a incompatibilidade
defendida pelo magistrado espanhol difere da imparcialidade objetiva a que se refere o TEDH
somente na terminologia, porque, substancialmente, ambas reconhecem o envolvimento do
juiz que atua na investigação como causa de perda, ou pelo menos geração de dúvida razoável
a respeito, de sua imparcialidade, justificando sua não admissão na fase processual.
A vantagem de se adotar o conceito de Montero Aroca, de impedimento e não de
imparcialidade objetiva, é estratégica frente ao seu potencial de afastar um pouco a
abordagem da temática do prisma da probidade do magistrado. Já que o tema da
(im)parcialidade do magistrado, como dito, sempre foi tratado como conduta inescrupulosa de
quem se valeria do processo para beneficiar uma das partes. Isso explica, talvez, a resistência
dos magistrados em aceitar a justificativa de que o juiz das garantias visa garantir a
imparcialidade do juiz do processo, porque tem sua compreensão relacionada à honestidade
do juiz, compreensão que foi introjetada durante o exercício da atividade desde o início da
carreira.
Assim, apesar de o termo impedimento também ser usado para se referir à perda da
imparcialidade pelo envolvimento psíquico do juiz com o caso, pelo interesse moral que passa
a ter no resultado da demanda, ainda que inconsciente, ele não traz consigo a concepção
pessoalizada introjetada e, por isso, tenderia a ser mais aceito, em que pese não tenha
nenhuma diferença da parcialidade objetiva em termos de fundamento, eficácia e âmbito de
aplicação.
5 Considerações Finais
Existem aspectos psicológicos do julgador, conscientes e inconscientes, que se
colocam na decisão judicial dentre seus elementos constitutivos, independente de qualquer
controle por critérios racionais conforme verificado pela psicanálise. Embora isso sempre vá
ocorrer, em maior ou menor grau, a instituição do juiz das garantias tende a viabilizar um
julgamento mais justo, porque reduz os danos gerados pela influência de conteúdos
introjetados pelo julgador durante a investigação e criados unilateralmente pelo acusador.
59 MONTERO AROCA, Juan. Derecho A La Imparcialidad Judicial: Comentario al artículo II-107 del Tratado
por el que se establece una Constitución para Europa y al artículo 6.1 del Convenio Europeo de Derechos
Humanos. Revista Europea de Derechos Fundamentales, nº 7, 2006, páginas 69 a 111. Disponível em:
<http://www.derechoprocesal.es/articulos/91.doc>. Acesso em: 31/01/2011.
24
O juiz das garantias não irá resolver todos os problemas do processo penal, nem
poderá impedir o envolvimento de outros aspectos inconscientes que contaminam a convicção
do julgador, afetando sua imparcialidade subjetiva, mas se mostra como um meio idôneo e
eficaz para reduzir os danos que o envolvimento do juiz com o caso penal pode acarretar para
a defesa do réu.
É que, quando o mesmo juiz do processo atua na investigação, concedendo medidas
cautelares requeridas pela acusação, ele forma um juízo prévio sobre o caso, um pré-juízo,
que acarreta em prejuízo para o réu, porque ele precisa crer, ainda que de modo incipiente, na
versão da acusação. Então, o juiz introjeta essa crença e tende a buscar no processo,
inconscientemente, confirmar o acerto de suas decisões tomadas durante a investigação,
fazendo com que o réu fique em posição de extrema desigualdade em relação à acusação.
Se o juiz do processo não for o mesmo que atuou na investigação, a decisão a ser
proferida na sentença será menos angustiante, porque ele não terá feito investimentos
psíquicos anteriores e não precisará despender energia para desfazê-los a fim de conceder o
contraditório substancial ao réu. Assim, a probabilidade de que a decisão final esteja motivada
em fatores inconscientes deslocados é bem menor, tornando mais equilibradas as forças entre
as partes.
A imparcialidade do juiz fica comprometida se ele tiver que tomar decisões durante a
investigação que, de algum modo, precisem avaliar a culpabilidade do acusado. É que o
conteúdo substancial da decisão cautelar não difere do conteúdo da decisão manifestada na
sentença no que toca à culpabilidade. Nesse aspecto, o juiz antecipa sua decisão, tornando
muito difícil revertê-la no processo, porque ele não terá a mesma disponibilidade psíquica
para ouvir ambas as versões e valorar equilibradamente a prova.
É com a identificação e aceitação dessa realidade concernente a toda pessoa que as
decisões do TEDH contribuem para o fortalecimento do sistema acusatório, ao identificar a
categoria jurídica da (im)parcialidade objetiva. Esse legado do TEDH é inegável.
O reconhecimento da imparcialidade objetiva, como requisito essencial da prestação
jurisdicional, permite (e exige) o afastamento do juiz pelo simples fato de que ele não
aparente (no sentido de não dar visibilidade) possuir a imparcialidade necessária, tornando
fundado o temor do réu na perda da capacidade de o juiz manter-se eqüidistante.
A verificação da perda da imparcialidade objetiva independe de qualquer conduta
pessoal ou da análise da probidade do julgador, afastando a idéia de que o reconhecimento da
parcialidade seja desabonatório à conduta do magistrado, tornando o enfrentamento do tema
impessoal e mais realista.
25
Nessa linha, o Projeto de Reforma teria avançado mais se mantivesse o mesmo
critério de exclusão da competência por prevenção dos juízes que atuaram na investigação
para os órgãos colegiados de segundo grau de jurisdição. No entanto, esse critério de exclusão
da competência pode ser definido nos regimentos internos dos tribunais, em que pese
recomendar-se constar do próprio código processual, já que pertinente à garantia da
imparcialidade.
Entende-se que a decisão quanto ao recebimento da denúncia também deveria ficar a
cargo do juiz das garantias para que o juiz do processo ingressasse no caso livre de qualquer
pré-juízo que possa minar o valor do contraditório e do sistema acusatório.
Evidente que existem dificuldades de ordem orçamentário-financeiras para a criação
imediata do instituto em todas as comarcas, mas alternativas podem ser buscadas para redução
dos custos e do seu impacto no orçamento do Poder Judiciário como a modernização dos
procedimentos, informatização, criação de varas especializadas, juizados regionais e tantas
outras.
O foco da discussão em torno de dificuldades estruturais parece apenas servir para
encobrir uma escolha de natureza política: por um processo penal democrático ou intolerante.
O fato é que existe o risco de contaminação subjetiva do juiz se ele conhecer os elementos da
acusação, durante a fase pré-processual, e sobre eles tiver que decidir. Esse risco, embora
inevitável, não pode ser aceito. Por isso, o Direito deve buscar meios de reduzi-lo, sendo o
juiz das garantias uma opção viável para assegurar limites à contaminação da convicção
gerada na investigação, dissipando (não toda, mas, pelo menos) dúvida razoável sobre a
imparcialidade objetiva do julgador.
26
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