Post on 10-Nov-2018
A FORMAÇÃO CONTINUADA DOCENTE NA ESCOLA CLASSE
“ARVORCER”– DESAFIOS PARA SE CONSTITUIR NOVAS PRÁTICAS
PEDAGÓGICAS
Josimara Xavier – SEEDF
josi.bx@gmail.com
Resumo
O presente trabalho tem por objetivo analisar os impactos que a formação continuada
docente desenvolvida dentro da escola oferece para a implementação de novas práticas
pedagógicas. Trazemos dados empíricos de uma pesquisa realizada em uma escola da
Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal. Considerando a complexidade das
situações que enfrentamos hoje nas escolas com a fragmentação dos processos de
trabalho, de ensino, de formação, compreendemos a importância de fundamentar
teoricamente nosso trabalho em autores que discutem a formação continuada docente
como propulsora de mudanças na prática e como possibilidade de transformação social
por meio de uma educação emancipadora. Para isso nos apoiamos em Mundim (2011),
Nóvoa (2009), Placco (2013), Saviani (2012), Tacca (2012), Veiga e Quixadá Viana
(2012). O percurso metodológico deste trabalho está pautado na Epistemologia
Qualitativa que defende o caráter construtivo-interpretativo do conhecimento,
enfatizando-o como produção e não como apropriação linear do objeto de pesquisa. Como
instrumentos metodológicos facilitadores das expressões dos professores utilizamos o
questionário aberto e a conversação. A compreensão dos aspectos envolvidos na
formação continuada docente se configura num desafio metodológico, para tanto, tornou-
se necessário alicerçar o desenvolvimento desta pesquisa tendo como base uma postura
crítico-reflexiva, adotando os princípios contidos na Epistemologia Qualitativa.
Esperamos que as reflexões suscitadas a partir desse trabalho venham contribuir para a
constituição de uma formação continuada docente que transcenda o fazer irrefletido e
fragmentado preconizado pela ordem social vigente, possibilitando ao professor lançar
mão de novas práticas pedagógicas em função da aprendizagem dos alunos e da sua
emancipação.
Palavras-chave: Formação continuada, Escola, Novas Práticas.
Introdução
O fortalecimento da formação continuada docente que acontece dentro do espaço
escolar é um ponto que tem sido discutido por vários pesquisadores, dentre eles, Nóvoa
(2011), Placco (2013), Veiga (2012). Esse fato a tem tornado expressiva na esfera
educacional e, as várias indagações que pairam sobre essa formação propiciam a
ampliação da visão sobre a sua importância, as suas possibilidades e as suas limitações.
No nosso entendimento, a formação acontecendo no próprio espaço escolar
possibilita aos professores a reflexão sobre o próprio trabalho, sua valorização, a
identificação das teorias que o embasam, a análise e a crítica de suas próprias práticas
levando-os à busca pela transformação da realidade na qual atuam.
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EdUECE - Livro 300331
Mas será que ela tem acontecido a partir das questões que surgem do rico e
dinâmico cotidiano escolar ou permanece vindo de fora para dentro? Partindo dessa
preocupação buscaremos destacar a necessidade de conhecer os caminhos que tem
tomado a formação continuada docente na contemporaneidade e refletir sobre as possíveis
contribuições que essa formação por dentro da escola traz para a instituição de novas
práticas por parte dos professores.
As novas demandas educacionais exigem uma formação docente que vise a
reestruturação dos saberes dos professores e a sua prática no meio no qual atua. O que
implica afirmar que há que se ter clara a intencionalidade da formação que se quer
realizar. Nesse sentido, compreender que a escola é um espaço para disseminação do
conhecimento construído social e historicamente de forma sistematizada se torna
fundamental.
Em linhas gerais, organizamos nosso artigo utilizando como eixos orientadores do
percurso: a escola e o seu papel social; a formação continuada docente por dentro da
escola e a nossa experiência no Observatório de educação.
Na primeira parte, trazemos o sentido social da escola e o trabalho pedagógico
nela desenvolvido como base do fazer docente e a possibilidade dela se constituir como
forte colaboradora para a emancipação humana a partir da transmissão sistematizada do
vasto patrimônio histórico produzido pela humanidade: o conhecimento.
Em seguida trazemos a formação continuada docente por dentro da escola, e as
possibilidades dessa formação se dar numa perspectiva emancipatória, mesmo em um
contexto de contradições protagonizadas pela ideologia dominante.
Depois falamos sobre o Projeto Observatório de Educação, trazendo um pouco da
nossa experiência onde suscitamos a possibilidade de implementar novas práticas no
trabalho do professor, apresentando o cenário no qual desenvolvemos nossa pesquisa e as
reflexões a respeito da formação continuada preconizada por nós.
Por fim, fechamos o trabalho trazendo algumas considerações sobre os desafios
de se instituir a formação continuada docente a partir das demandas que surgem do
próprio cotidiano escolar, relacionando-a as práticas pedagógicas dos professores, aos
objetivos da pesquisa e à discussão teórica fundamentada.
A Escola e seu papel social
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Diante de tantas certezas incertas nos deparamos com muitas e novas demandas
da e para a escola, mas percebemos um esvaziamento da sua função precípua de produzir
e disseminar o saber sistematizado e constituído historicamente.
A escola tem, ou pelo menos deveria ter, a função educativa ligada às questões do
conhecimento, do saber, não se tratando, pois,
[...] de qualquer tipo de saber. Portanto, a escola diz respeito ao conhecimento
elaborado e não ao conhecimento espontâneo; ao saber sistematizado e não ao
saber fragmentado; à cultura erudita e não à cultura popular. Em suma, a escola
tem a ver com o problema da ciência. Com efeito, ciência é exatamente o saber
metódico, sistematizado (SAVIANI, 2012, p. 14).
Eis aí a contradição discutida por Saviani (2012), onde ele alerta para a
necessidade do resgate da razão de ser da escola que é de sistematizar o conhecimento e
transmiti-lo a todos de forma não discriminatória, transcendendo a imagem deturpada de
que tem que atender às demandas do Estado e do mercado, produzindo e transmitindo
uma cultura escolar que fortalece a cultura de dominação e de reprodução do capital.
Dessa maneira, a escola, com base na organização do trabalho pedagógico pode
colocar o saber a serviço da manutenção ou da transformação das relações sociais,
servindo de ferramenta para alienar ou emancipar o homem.
Da mesma maneira, o trabalho pedagógico deve ser organizado para superar o
processo de proletarização da profissão docente facilitando o acesso e a participação do
professor na organização da gestão, tanto no âmbito pedagógico como no âmbito
administrativo, colocando-o em condição de ver as contradições do mundo moderno e
questioná-las buscando a sua superação.
Apesar de vermos nitidamente o aumento nas atribuições, mas o esvaziamento da
função da escola compreendemos que a formação docente dentro da escola é fundamental
para sistematizar o trabalho pedagógico, para suscitar momentos de reflexão crítica e
também para o desenvolvimento de novas práticas que contribuirão para a aprendizagem
dos alunos.
Nesse movimento, o professor vai refletindo sobre a função da escola, a sua
função, vai tomando consciência da sua profissionalidade, da sua responsabilidade ética
e de modo intencional e sistematizado, vai lançar mão de novas estratégias de ensino que
favorecem a aprendizagem dos alunos e suas constituições como sujeitos.
Todavia diante da realidade que vivemos, constatamos que para os professores, a
escola muitas das vezes se configura como sua segunda casa, como um lugar de
possibilidade de bons relacionamentos, trocas entre os pares, e “[...] não aparece uma
crítica ao modelo de escola instituído socialmente, assim como não aparece uma
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exigência por novas formas de pensar o espaço escolar, introduzindo-lhe mudanças
significativas” (TACCA, 2012).
Entendemos então que essa falta de consciência do papel social da escola, a
ausência da formação continuada a partir das necessidades que surgem do cotidiano
escolar e a falta de reflexão sobre a organização do trabalho pedagógico para nortear o
fazer docente ou ainda, a provisoriedade de ações pautadas em atender demandas
imediatistas do dia-a-dia escolar poderão ser fatores que dificultarão a concretização do
processo de afirmação profissional bem como o processo ensino/aprendizagem numa
perspectiva emancipatória.
A nosso ver, apenas com a constituição da consciência a respeito da função social
da escola associada à formação continuada que leve à reconstrução da práxis docente,
novas práticas educativas poderão ser geradas e por consequência a aprendizagem
significativa dos alunos.
A formação por dentro da escola
Quando pensamos no que vem a ser formar nos deparamos com uma infinidade
de termos que fazem parte do vocabulário da formação docente de onde nascem várias
interpretações e defesas ideológicas. Para nós, apoiados em Veiga e Quixadá Viana
(2012), formar é o meio de desenvolvimento profissional contínuo e singular que leva o
professorado a estabelecer uma nova relação com o conhecimento e com a sua prática.
A formação docente que preconizamos, é compreendida em seu aspecto
fundamental para a concretização de uma educação cada vez mais preocupada com o
político, o histórico e o social. Deverá proporcionar aos docentes o desenvolvimento de
habilidades críticas e de investigação da própria realidade.
Estando bem fundamentada teoricamente deve objetivar o desenvolvimento do
fazer pedagógico buscando atender as necessidades educacionais e sociais dos envolvidos
no processo educativo levando-os à condição de sujeitos de suas histórias.
No nosso entendimento, a formação continuada deve estar a serviço da
aprendizagem do aluno, ou seja, deve trazer em si, o objetivo de levar o professor a
reconhecer as singularidades dos alunos e a partir daí elaborar estratégias de ação que
favoreçam a aprendizagem.
Nesse sentido, Tacca (2012) afirma que as estratégias pedagógicas são recursos
externos dos quais o professor utiliza e terão a função de manter a motivação dos alunos
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despertando neles a vontade de aprender. Porém, não se restringe à busca do
conhecimento, mas deverá possibilitar o desenvolvimento do ato de pensar, processo no
qual o aluno tenha a possibilidade de reelaborar o conhecimento.
Considerando a possibilidade de elaboração e reelaboração de conhecimentos
tanto por parte dos professores como pelos alunos, entendemos que a formação que vem
de fora da escola dificilmente irá atender as reais necessidades que surgem do contexto
escolar com suas especificidades. Ela poderá apenas se constituir em uma formação
reprodutora que não trará grandes impactos na prática, nem no modo de pensar dos
professores e nem tão pouco no modo de aprender dos alunos.
Pensando na formação que venha efetivamente possibilitar a geração de novas
práticas docentes, Nóvoa (2009, p. 06) afirma que “[...] é preciso passar a formação de
professores para dentro da profissão” e acrescenta dizendo que “não haverá nenhuma
mudança significativa se a ‘comunidade dos formadores de professores’ e a ‘comunidade
dos professores’ não se tornarem mais permeáveis e imbricadas”.
É partindo dessa ótica que defendemos a formação dentro do espaço escolar, a
partir das questões que brotam do chão da escola, numa perspectiva crítico-reflexiva
fortalecendo o trabalho coletivo e mobilizando conhecimentos que se constituirão não só
em um importante salto no processo pedagógico, mas também em um exemplo de
responsabilidade e de compromisso com a comunidade escolar e a sociedade de modo
geral.
Nesse sentido, a reflexão partilhada coletivamente não será apenas uma mera
palavra escrita no Projeto Político Pedagógico, será concreta. Nenhum professor se
resignará com o fracasso dos alunos, ao contrário, iniciará um movimento real no sentido
de efetivar a melhoria da qualidade do ensino e a mudança da prática docente na busca
pela efetivação da aprendizagem e da transformação da realidade social.
Ao defendermos a formação continuada nessa perspectiva não estamos afirmando
categoricamente que esse é o modo de se formar professor, mas umi modo de formação
que pode gerar a reflexão dos professores sobre o próprio trabalho, conscientização crítica
a respeito da sua condição de agente socialii e favorecer ainda, a criação de novas
estratégias de ensino que possibilitem a aprendizagem dos alunos numa perspectiva
emancipatória.
O Projeto de Pesquisa, a formação continuada docente e a possibilidade de
implementação de novas práticas pedagógicas.
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O Observatório de Educação – CAPES – é um projeto de pesquisa interventiva
iniciado em 2010 e atua em seis escolas de três Coordenações Regionais de Ensino da
Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal. Tem por objetivo investigar as
bases epistemológicas das concepções e as práticas de alfabetização e letramento e de
desenvolvimento humano presentes na escola e sua implicação nos resultados escolares,
tendo como referência os dados da Provinha Brasil e do IDEB.
De maneira mais ampla procura investigar as concepções de alfabetização e de
desenvolvimento humano que subjazem às práticas pedagógicas e à cultura escolar que
envolvem crianças que são reconhecidas com dificuldades de aprendizagem.
Ele está organizado em dois momentos distintos, mas que se interligam e
complementam, um momento de intervenção nas escolas e um momento de estudo e
discussão das ações, tensões e avanços nos processos interventivos e formativos
impulsionados pela pesquisa.
A Escola Pesquisada
A Escola Classe Arvorecer pertence à rede pública de ensino do Distrito Federal,
localiza-se em área urbana, possui uma boa estrutura física, tem uma equipe gestora
bastante atuante, que viabiliza recursos e materiais para a implantação e implementação
de projetos.
As turmas nas quais realizamos a pesquisa estão compostas por uma média de 28
alunos do segundo ano do ensino fundamental que apresentam dificuldade de
aprendizagem no processo de alfabetização, e são indicados pelas professoras.
Uma das turmas iniciou o ano letivo sem professor e teve no decorrer do primeiro
bimestre um revezamento de professores. Ora assumia uma professora do turno contrário,
ora uma das coordenadoras, ora os alunos eram dispensados, esse fato dificultou em
princípio nosso trabalho, pois não conseguimos sistematizar as intervenções. A outra
turma tem como regente uma professora que participa do projeto de pesquisa desde o
princípio, fato que possibilita o planejamento de acordo com as necessidades apontadas
por ela.
Considerando que todo início de ano letivo há o processo de escolha de turmas no
qual o professor tem a possibilidade de escolher a turma em que vai atuar, foram várias
as professoras que fizeram parte da nossa pesquisa. Apenas uma das professoras está
conosco desde o princípio. Vamos chamá-la aqui de professora “Rosa”.
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Os encontros
Durante dois anos e meio do projeto sendo desenvolvido na escola percebemos a
necessidade de realizar um trabalho junto às professoras, pois como pesquisar práticas de
alfabetização e letramento apenas atendendo os alunos com dificuldade de aprendizagem?
A prática e a formação docente seriam para nós alvo da nossa pesquisa e geradoras de formação
por sua própria demanda.
Assim, em 2013, propusemos momentos reflexivos para as duas professoras que
participavam do projeto. Nos nossos encontros falávamos da nossa intenção em fortalecer
nossos laços, na intenção de compreender a dinâmica pedagógica da escola e contribuir
na implementação de novas práticas pedagógicas que viessem a favorecer o processo de
alfabetização e letramento dos alunos e não apenas os atendidos por nós.
Sempre relembrávamos os objetivos do Projeto e reforçávamos a interrelação
entre eles, o currículo e os descritores da Provinha Brasil e a importância de um
redimensionamento constante das práticas pedagógicas para ajustar o ensino às
necessidades de aprendizagem dos alunos.
Também ouvíamos os relatos das professoras em relação às suas impressões
quanto ao desenvolvimento do projeto, o avanço dos alunos atendidos e sobre as
necessidades dos mesmos para daí planejarmos nossas atividades interventivas.
A professora “Rosa” que está conosco desde o início do projeto em todos os
momentos foi a mais interativa e propositiva, inclusive abrindo espaço para realizarmos
um trabalho interventivo com toda a turma propondo atividades de produção textual
coletiva com temas também determinados por ela, de acordo com o trabalho que estava
desenvolvendo com os alunos.
Rosa sempre se posicionou de forma pró-ativa, em momento algum se colocou na
condição de vítima da clientela com a qual trabalhava, reconhecendo-se responsável para
também pensar em estratégias e ações que favoreceriam avanços qualitativos dos alunos.
Nessa perspectiva, Tacca (2012) chama atenção a importância do professor tomar
postura similar á de Rosa, não esperando as condições ideais e criando possibilidades para
a aprendizagem dos alunos, pois considerando o professor como profissional ativo, ele
deve ser capaz de gerar alternativas frente a uma atuação intencional e crítica na busca
pela concretização do processo ensino-aprendizagem.
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A partir das falas, ações e posicionamentos das professoras, voltamos nosso olhar
para os possíveis impactos que a formação continuada por dentro da escola poderiam
trazer para a inovação de concepções e de suas práticas.
Com o olhar mais atento às ações docentes compreendemos definitivamente que
deveríamos investir em momentos de formação continuada naquela escola, tendo como
objetivo o desenvolvimento de novas estratégias de ensino, junto com as professoras e a
partir das necessidades dos alunos visando uma ação crítica consciente.
A professora “Rosa” sempre se mostrou aberta às nossas proposições trocando
ideias e dialogando sobre seu planejamento, estratégias e congruências com o nosso
trabalho enquanto que as outras permaneceram praticamente alheias às nossas
proposições deixando-nos a tarefa de planejar e intervir junto aos alunos por elas
indicados.
Em 2013, fomos conhecendo o pensamento de cada uma das professoras
participantes da pesquisa, as concepções que traziam de escola, de educação, de aluno, de
sujeito, passamos a compreender suas práticas e perceber o quanto elas impactavam a
aprendizagem dos alunos, no sentido de favorecer ou dificultar o processo de
alfabetização e letramento deles. Compreendemos também que a trajetória de cada uma
inclusive a formativa, influenciava fortemente a busca por novas práticas que viessem a
favorecer o avanço qualitativo dos alunos.
Nesse período em que focamos no trabalho das professoras, conseguimos
enxergar a necessidade de se fortalecer os momentos de formação continuada dentro da
escola, para que houvesse a implementação de novas práticas pedagógicas que estivessem
de fato a serviço da aprendizagem dos alunos e da sua constituição enquanto sujeitos.
Nas palavras da Rosa
Traremos a partir daqui um pouco das conversas sobre formação que tivemos com
as professoras nos nossos encontros focando nosso olhar nas expressões da professora
Rosa:
Em um dos diálogos, ao perguntarmos se existiam barreiras na escola, nos alunos
e no trabalho pedagógico que impediam o trabalho na perspectiva do letramento, foi
unânime a resposta de que um dos fatores que não impedia, mas que o dificultava era a
falta de apoio pedagógico.
É importante lembrar que desde o início do ano letivo havia a figura do
coordenador e do supervisor pedagógico na escola. Todavia, percebemos pela fala da
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professora que não houve a sistematização do trabalho pedagógico no sentido de dar
suporte técnico/pedagógico aos professores.
Segundo Rosa, essa falta de momentos para planejar no coletivo a levou a se reunir
com outra professora de segundo ano para planejar, mas ainda assim, sentia a necessidade
de apoio pedagógico como podemos constatar no trecho que segue,
“A gente, assim, no segundo ano tem uma certa facilidade porque a gente, por
estar há cinco anos com segundo ano, tem uma troca muito boa uma com a
outra. Eu entro na sala dela, ela entra na minha sala, vê o que pode melhorar,
mas o que falta mesmo é a família e o pedagógico.”
A fala da professora indica que na Escola Classe “Arvorecer” os professores tem
buscado solitariamente soluções e estratégias de ação em sala de aula para superação dos
problemas que lá se apresentam e a formação continuada ainda não tem acontecido de
forma sistematizada com objetivos e estratégias bem delineadas.
Segundo Placco (2013), a rotina escolar deve servir como instrumento de
planejamento para o coordenador pedagógico se orientar e definir objetivos e metas para
a formação continuada docente, não deixando que sua atuação fique à mercê de
imprevistos.
Nessa perspectiva, Mundim (2011, p.48) afirma que “quando os coordenadores
pedagógicos adotam um caráter reflexivo e são capazes de produzir novas alternativas
frente às demandas que vão surgindo, passam a atuar como sujeitos”. Logo, podemos
afirmar que é imprescindível que os coordenadores pedagógicos da Escola Classe
“Arvorecer” se vejam e se reconheçam como sujeitos e sejam atuantes naquele espaço
dando esse suporte aos professores por meio dos momentos planejados intencionalmente
de formação continuada.
Em outro momento, refletindo sobre a formação externa e seus impactos na sua
prática pedagógica, Rosa, citando o Pró-letramento e o PNAICiii disse:
Eu fiz o Pró-letramento, agora estou fazendo o PNAIC, ele me fez pensar no
meu fazer [...] Diferenciar minha prática pedagógica. [...] Acredito que mudei
minha postura e a forma de ensinar ficaram mais fáceis e tornaram mais
atrativas para meu aluno. Saí um pouco do tradicional!.
Com o objetivo de compreendermos se havia a exploração na escola dos
conteúdos desses cursos externos, perguntamos se havia a ligação dessa formação externa
com a formação interna e seus impactos sobre a mudança de concepções e práticas no
grupo, onde Rosa respondeu:
Apesar da maioria das pessoas que trabalham comigo terem feito o curso, não
vejo ainda essa conexão, trabalhamos sozinhas ou em duplas. E se realmente
acontecesse essa conexão haveria uma maior aproximação entre os
professores, o trabalho seria mais fácil e até menos cansativo.
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Como podemos constatar a partir da fala da professora, essa falta de ligação da
formação externa às demandas do cotidiano, torna o trabalho docente solitário e mais
penoso. Segundo Placco (2013), cabe ao coordenador pedagógico o papel de se posicionar
ao lado do professor numa parceria colaborativa, conectando a formação externa, ampla
e descontextualizada à formação que acontece dentro da escola, contextualizando-a, para
que venha a favorecer a reflexão, a crítica e a inovação das práticas pedagógicas.
Para que a formação continuada na escola se constitua nessa rede colaborativa,
coordenadores, professores e gestores têm que reconhecer o espaço escolar como um
espaço de formação tendo como propulsor dessa formação as necessidades que surgem
do cotidiano.
Partindo para a reflexão sobre a formação continuada dentro da escola e sua
importância, Rosa afirmou:
Ano passado fizemos um curso dentro da coordenação pedagógica e foi uma
oportunidade para troca de experiência com nossos colegas, e impulsionaram
também uma maior aproximação e favoreceu uma reflexão sobre nosso fazer
pedagógico. Buscamos estratégias para melhorar a aprendizagem dos discentes
e esse ano percebemos o crescimento dos mesmos. Acredito muito quando as
pessoas envolvidas buscam melhorar o seu trabalho em prol do outro.
Analisando a fala da professora, percebemos que apesar dela considerar a
importância da formação dentro da escola para a troca entre os pares, há o entendimento
de que a formação continuada se dá apenas nos momentos de cursos oferecidos na escola
e não em todos os momentos planejados e organizados pelos coordenadores pedagógicos.
Nesse sentido, Placco (2013) aponta que para que as escolas se constituam como
espaço significativo de formação continuada, os professores devem ser considerados
profissionais e não alunos, ou seja, “profissionais com uma responsabilidade social
definida por sua profissão, que é ensinar” (p. 73).
Os coordenadores pedagógicos devem estar cientes da sua função formadora e sua
responsabilidade de impulsionar tal processo e ambos, coordenador e professor devem
compreender que a escola é lócus privilegiado para a formação continuada e que essa
deve vir com o objetivo de impulsionar a reflexão, a crítica, novas concepções e novas
práticas pedagógicas.
Refletindo a respeito da formação continuada dentro da Escola Classe
“Arvorecer”, a professora Rosa acredita que ela só acontecerá quando houver a
“valorização da coordenação, pois muitos professores ainda não valorizam como deveria
ser... espaço de trocas, crescimento, reflexão...”.
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Na esteira das reflexões feitas até aqui fica claro que para que a formação
continuada aconteça dentro da Escola Classe “Arvorecer” favoreça a inovação de
concepções, de práticas pedagógicas e a transformação da sociedade, ela deve ser pensada
coletivamente, organizada pelos coordenadores tendo como matéria prima as
necessidades e as possibilidades que brotam do cotidiano da escola.
Considerações Finais
No contexto da Escola Classe “Arvorecer”, por meio da nossa observação e interação
com as professoras participantes da pesquisa, percebemos que há muitos desafios a serem
transpostos para que se concretize a formação continuada docente naquele espaço à partir
das questões que dele surgem.
Vencer esses desafios implica em transcender a concepção de escola numa
perspectiva apenas reprodutora, de que formação continuada ainda é aquela que é
instituída de fora para dentro transmitida por técnicos e que a construção de novas práticas
se darão naturalmente a partir de cursos externos à escola.
A formação continuada dentro da escola deve ser compreendida nos momentos
coletivos de troca de experiência, de planejamento e de estudos organizados e
implementados pelos coordenadores pedagógicos sendo valorizada por todo o coletivo.
Sentimos que os professores da Escola Classe “Arvorecer” estão no caminho de
compreender a importância de ver a escola como espaço de produção e disseminação de
conhecimento elaborado. Local onde a formação é construída a partir do diagnóstico das
suas necessidades e possibilita o agir profissional, oportunizando a inovação das práticas
pedagógicas com o intuito de atender as necessidades reais da sociedade, indo ao encontro
do ensino e da formação de sujeitos capazes de se posicionarem criticamente diante de
situações que socialmente se impõem.
Compreendemos que a formação que é pensada em nível macro pode contribuir
com a inovação na prática do professor, mas ela tem sido pouco impactante justamente
por não considerar as especificidades do ambiente, do coletivo docente, do grupo de
alunos e da comunidade na qual a escola está inserida. Dessa maneira, tem se configurado
na maior parte das vezes em ações mecanicistas e lineares, não trazendo os conhecimentos
à contextualização.
Com esse trabalho, nossa intenção enquanto pesquisadores é justamente tentar
despertar no grupo, a necessidade de contextualizar conhecimentos, é suscitar
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questionamentos a respeito da formação continuada docente que “recebemos” e
confrontá-la com a formação continuada por dentro da escola, suas perspectivas, suas
possibilidades e suas limitações. Além de favorecer a clareza na visão da importância de
se constituir momentos de formação no espaço no próprio espaço escolar, repensando-o,
reconfigurando-o em função da aprendizagem dos alunos e da transformação da realidade
que hoje vivemos.
Referências bibliográficas
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PPGE/UnB, 2011. Dissertação de Mestrado.
NÓVOA, António. Professores: imagens do futuro presente. Lisboa: Educa, 2009.
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pedagógico e a rede colaborativa. In.: O coordenador pedagógico e a formação
centrada na escola. Orgs. ALMEIDA, Laurinda Ramalho de; PLACCO, Vera Maria
Nigro de Souza. São Paulo: Edições Loyola, 2013.
SAVIANI, Dermeval. Pedagogia histórico-crítica. Campinas, SP: Autores Associados,
2012.
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das concepções do mundo da escola e dos alunos. In: SILVA, F. de C. T. & KASSAR M.
de C.M, Escrita da Pesquisa em Educação no Centro-Oeste. Campo Grande-MS, Ed.
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VEIGA, Ilma Passos Alencastro; QUIXADÁ VIANA, Cleide M. Q. Formação de
professores: um campo de possibilidades inovadoras. In: VEIGA, Ilma Passos
Alencastro; SILVA, Edileuza Fernandes da (Orgs.). A escola mudou. Que mude a
formação de professores! Campinas, SP: Papirus, 2012. p. 13-34.
i Grifo nosso. ii Segundo Veiga (2012), o professor “agente social” é aquele consciente da necessidade de articular dialeticamente, as
diferentes dimensões da sua profissão: a científica, a técnica, a político-social, a psicopedagógica, a ética, a estética e
a cultural, afim de atender às necessidades dos alunos provenientes das camadas mais pobres da população (p.21). iii Pró-Letramento é um programa de formação continuada de professores para a melhoria da qualidade de aprendizagem
da leitura/escrita e matemática nos anos/séries iniciais do ensino fundamental.
PNAIC - Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa é de iniciativa federal assumindo o compromisso de
assegurar que todas as crianças estejam alfabetizadas até os oito anos de idade, ao final do 3º ano do ensino fundamental.
Para isso tem oferecido formação e bolsa para os professores alfabetizadores.
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