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Anais do V Simpósio Internacional Lutas Sociais na América Latina “Revoluções nas Américas: passado, presente e futuro”
ISSN 2177-9503 10 a 13/09/2013
GT 4. Imperialismo, nacionalismo e militarismo na América Latina 78
GT 4. Imperialismo, nacionalismo e militarismo na América
Latina
A integração na América do Sul e o Consenso de Washington: a política externa dos Estados Unidos para a região no final do século XX e início do século XXI
Sandro Heleno Morais Zarpelão
Resumo: A partir do século XIX e principalmente ao longo do século XX, os Estados Unidos passaram a influenciar decisivamente, os destinos dos países da América Latina e por consequência, da América do Sul. Assim, a proposta de trabalho pretende demonstrar como o Consenso de Washington teve, em linhas gerais, uma forte aceitação por parte dos Estados sul-americanos, na década de 1990. Ao mesmo tempo, verificar-se-á como o processo de integração sul-americana, com destaque ao MERCOSUL (Mercado Comum do Sul) e a Comunidade Andina, tiveram um papel importante dentro do aludido processo, tanto de expansão das premissas do Consenso de Washington, como de resistência as suas ideias básicas. Por fim, será mostrado como a integração sul-americana pode ser encarada como uma forma de resistência e de construção de um diálogo com os Estados Unidos e a sua política externa para a América do Sul, no final do século XX e início do século XXI. Palavras-chave: Estados Unidos; integração; América do Sul; Consenso de Washington.
Introdução
A partir do século XIX e principalmente ao longo do século XX, os Estados Unidos
passaram a influenciar decisivamente, os destinos dos países da América Latina e por
conseqüência, da América do Sul. Nesse sentido, o Consenso de Washington teve, em linhas
gerais, uma forte aceitação por parte dos Estados sul-americanos, na década de 1990. Ao
mesmo tempo, notar-se-á no desenvolver do trabalho como o processo de integração sul-
Mestre em História Política, pela Universidade Estadual de Maringá (UEM) e doutorando em História Social,
pela Universidade de São Paulo (USP), e-mail: shmzarpelao@usp.br ; sandrohmzarpelao@hotmail.com .
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americana, com destaque para o MERCOSUL (Mercado Comum do Sul) e a Comunidade
Andina (CAN), teve um papel destacado e duplo, pois assimilou as premissas do Consenso de
Washington bem como constitui uma forma de resistência e de construção de um diálogo com
os Estados Unidos e a sua política externa, no final do século XX e início do século XXI.
Desde que ocorreu o processo de independência das antigas colônias da América Latina, com
destaque para a América do Sul, entre as décadas de 1810 e 1830, os novos países nascidos de
tal processo tiveram um caminho bastante difícil a trilhar.
O ideal do pan-anamericanismo nasceu com a independência das antigas colônias espanholas
na América Latina. Mais especificamente na América do Sul, seu grande representante foi
Simon Bolívar.
Bolívar sonhava criar uma América Hispânica unida em um mesmo país. A forma de governo
seria a República, claramente inspirada nos Estados Unidos e em sua independência, ocorrida
em 1776. Contudo, Bolívar queria colocar em prática seus ideais pan-americanos. Várias
tentativas foram feitas, mas infelizmente não alcançaram o objetivo pan-americano.
Bolívar foi o primeiro pensador autônomo latino-americano. Seu objetivo era acabar com os
privilégios de uma classe e trabalhar pela liberdade e igualdade com as classes menos
abastadas. Isso vai gerar um conflito com os criollos (PRADO, 1981, p.26).
As divisões da América Latina foram bastante incentivadas pelo Reino Unido e pelos Estados
Unidos. Ambos tinham receio de que a formação de uma América Hispânica unificada
poderia prejudicar seus interesses comerciais e econômicos na citada região. O
enfraquecimento do ideal pan-americano também foi ajudado pela atuação da elite criolla
presente na região. Seus interesses políticos e econômicos foram fundamentais para a criação
de novos países na América Latina.
Maria Lígia Prado argumenta sobre a existência na América Latina, de duas vertentes do
pensamento sobre tal região. Suas raízes históricas se encontram presentes no século XIX. A
primeira vertente e baseada pela negação da realidade latino-americana, busca copiar modelos
fora do universo latino-americano, como o europeu e estadunidense. Trata-se de um
pensamento tradicional e conservador, que deu origem a uma postura modernizadora, em que
as elites se adequaram ao sistema capitalista.
Já a segunda vertente é menos conservadora e mais crítica e progressista, por trabalhar com a
aceitação da realidade da América Latina, almejando soluções como, por exemplo, o ideal de
unidade e integração latino-americano. A corrente crítica, como ficou conhecida tal vertente,
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deu origem a uma postura identitária, baseada na análise da realidade da América Latina
(PRADO, 1981).
Essas duas vertentes permeiam o pensamento político da América Latina até os dias atuais.
Em alguns momentos ocorreu a hegemonia do pensamento progressista e em outros o
predomínio do pensamento progressista.
Conhecer a existência dessas duas vertentes irá ajudar como os Estados Unidos agem na
região e como o Consenso de Washington encontrou apoio, na década de 1990, por parte das
elites dos Estados da América do Sul.
Ao longo do século XIX, a região da América do Sul conheceu duramente o peso da
influência de países como o Reino Unido. Durante o século XX, os Estados Unidos foram
aumentando sua ingerência na região. Vale ressaltar que o governo do presidente James
Monroe1, em 1823, devido a sua política externa, elaborou a chamada Doutrina Monroe. Sua
principal idéia era evitar e repudiar qualquer intervenção européia nos países do continente
Americano.
Os Estados Unidos desejavam, com tal doutrina, expandir sua influência econômica e
internacional sobre a América Latina, incluíndo a América do Sul, conquistando, com o
passar do tempo, a condição de mediador e orientador das políticas externas dos países latino-
americanos. O objetivo era criar uma área de influência estadunidense sobre a aludida região.
A frase “A América para os americanos”, consubstancia bem a Doutrina Monroe.
Assim, em vários momentos, Washington fez valer seus interesses econômicos, geopolíticos e
comerciais. Até mesmo por causa de empresas, os Estados Unidos, já no século XX, interveio
duramente na região, principalmente na América Central.
Não se pode esquecer também de outro elemento importante da política externa estadunidense
no século XIX, de certa forma muito presente até hoje nas ações dos Estados Unidos. Trata-se
do chamado Destino Manifesto.
O Destino Manifesto era basicamente a idéia de que os Estados Unidos tinham a missão de
levar seus valores, o cristianismo protestante, a liberdade e o progresso científico para os
povos indígenas da região oeste aos Estados Unidos e depois o mundo. Os imigrantes que
chegaram a América e fundaram as 13 colônias, acreditavam que era a sua missão fundar a
Nova Jerusalém. Daí nasceu a idéia de Destino Manifesto, como sendo os eleitos de Deus,
1 O presidente James Monroe lutou durante a Independência dos Estados Unidos da América, em 1776. Formou-
se em Direito e tinha como seu mentor político Thomas Jefferson. Foi governador do Estado da Virgínia por
duas vezes, secretário de Estado e também da Defesa. Em 1817 assumiu o poder como o 5º presidente da
História dos Estados Unidos tendo governado até 1825.
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únicos detentores de moral para levarem os valores cristãos para o mundo. Isso justificará as
ações militares dos Estados Unidos pelo mundo. Depois tal prerrogativa foi bastante usada
por Washington em sua política externa para a América Latina e depois, no século XX, para
suas ações no mundo.
A Doutrina Monroe e a teoria do Destino Manifesto, já citados, serviram de base ideológica
para que os Estados Unidos assumissem a tutela de toda a América, principalmente a América
Central. A América do Sul ressalta-se, não fugiu dessa situação.
Também não pode ser esquecido a famosa Política do “Big Stick” (grande porrete), que partiu
das premissas ideológicas contidas na Doutrina Monroe e no Destino Manifesto. A Política do
“Big Stick” foi erigida pelo então presidente dos Estados Unidos, Theodore Roosevelt2. Tal
política concedia a liberdade para Washington usar a força, através de intervenções militares
nos países americanos, apresentando-se como “defensores e salvadores” da América. Em
outras palavras, quando um interesse estadunidense estivesse ameaçado em qualquer região
do continente americano, os Estados Unidos deveriam agir em sua política externa com
diplomacia, mas também com o uso de um “grande porrete”.
A partir da Segunda Grande Guerra Mundial (1939-1945) o mundo viu acontecer grandes
transformações econômicas, políticas e geopolíticas. Isso atingiu duramente a América
Latina, incluindo a América do Sul.
O nascimento da Guerra Fria (1947-1991), fase marcada pela geopolítica, econômica e
ideológica entre Estados Unidos e seu bloco capitalista contra a União Soviética e o seu bloco
socialista, reordenou as relações internacionais e o tabuleiro de xadrez do jogo internacional
(MUNHOZ, 2004).
A adesão dos Estados da América do Sul ao bloco capitalista liderado pelos Estados Unidos
ocorreu durante a Guerra Fria. Perseguições aos Partidos Socialistas e Comunistas, ditaduras
militares, golpes de Estado, investimentos de multinacionais e abertura, em termos gerais, das
economias dos países para os capitais dos Estados Unidos foi visto na América do Sul.
Durante o citado período histórico, foram assinados e elaborados vários acordos
internacionais como a criação da Organização dos Estados Americanos (OEA), em maio de
1948. Um ano antes, em 1947, foi elaborado e assinado o primeiro acordo de proteção
regional no pós-Segunda Guerra Mundial, dentro do bloco estadunidense, que foi o Tratado
2 O presidente Theodore Roosevelt foi o vigésimo sexto presidente da história dos Estados Unidos. Governou o
país entre 1901 e 1909, tendo recebido o título de Corolário Roosevelt. Foi bastante incisivo em sua política
exterior para a América Latina.
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Interamericano de Assistência Recíproca (TIAR), no governo estadunidense do presidente
Harry Truman (1945-1953) (MUNHOZ, 2004, p. 280-281).
Inclusive, como afirma Sidnei Munhoz, em um texto original de sua autoria, o TIAR como
instrumento de política de defesa, foi de fundamental importância, não só para garantir a
manutenção da hegemonia dos Estados Unidos na América, bem como serviu como matriz
para a criação do pacto militar para o Atlântico Norte, no caso a Organização do Tratado do
Atlântico Norte (OTAN) (MUNHOZ, texto original de sua autoria).
Contudo, com a crise e depois com o fim da Guerra Fria, o comunismo e a União Soviética
deixaram de ser inimigos dos Estados Unidos. De forma simultânea, nasceu no início da
década de 1990, através do G-73, o Consenso de Washington, defensor da existência de um
Estado mínimo, com a privatização de várias empresas estatais, baseadas em idéias
neoliberais e democráticas. Segundo o Consenso de Washington, uma Nova Ordem Mundial
estaria nascendo, sob a égide do capitalismo que teria vencido o comunismo da União
Soviética, em que haveria uma redução de gastos militares, com uma longa era de paz e
prosperidade tecnológica, científica e material.
Assim, as relações comerciais deveriam ser intensificadas entre os países, as fronteiras e o
protecionismo deveriam ser reduzidos ou até eliminados.
Foi nessa euforia capitalista que foi assinado o Tratado de Assunção, em 1991, que deu
origem ao Mercado Comum do Sul (MERCOSUL). Também não se pode esquecer que a
Comunidade Andina, nascida em 1969, com o Acordo de Cartagena, cujo tratado foi revisado
e atualizado, a luz das necessidades e acontecimentos regionais e mundiais, em 1997.
Entretanto, tanto a criação da Comunidade Andina quanto do MERCOSUL foi parte de uma
iniciativa integracionista, em que as raízes se encontram presentes desde o processo de
independência da América do Sul, na primeira metade do século XIX, através da luta do líder
Simon Bolívar.
Outrossim, os rumos que a Comunidade Andina e o Mercosul tomaram a partir da década de
1990, mostram que se por um lado, foram influenciados pelos ditames liberais do Consenso
de Washington, por outro, passaram a se caracterizar como formas de resistência ao próprio
Consenso de Washington e à política externa dos Estados Unidos para a América do Sul.
3 O G-7 é o Grupo dos sete países mais ricos do mundo. Atualmente ele passou a ser o G-8, com a entrada da
Rússia. São seus países-membros: Estados Unidos, Japão, Alemanha, Reino Unido, França, Itália, Canadá e a
Rússia. Cabe ao G-8 elaborar e dar os rumos da política para a economia mundial e estabelecer diretrizes e
encontrar soluções para os problemas e crises financeiras mundiais, como as que vêm ocorrendo no capitalismo
internacional, principalmente a partir da década de 1990.
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O Consenso de Washington, o Processo de Integração da América do Sul e a Política
Externa dos Estados Unidos para a região
Quando foi elaborado o Consenso de Washington pelo Grupo dos sete países mais ricos do
mundo, no início da década de 1990, havia um frenesi provocado pela Queda do Muro de
Berlim, em 1989, pela crise do socialismo real e pela decadência da própria União Soviética.
Em 1991, esse país saiu do cenário internacional e deixou de existir.
As diretrizes do Consenso de Washington foram sendo assimiladas por órgãos internacionais
como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Internacional para a Reconstrução e
o Desenvolvimento, o BIRD (Banco Mundial). Suas idéias passaram a compor receituários de
desenvolvimento e de ações que os países do Terceiro Mundo deveriam seguir a risca, para
crescerem e superarem seus graus de subdesenvolvimento, inclusive na América do Sul.
O processo de integração na América do Sul ganhou um novo fôlego, com o
redimensionamento da Comunidade Andina e, principalmente, com a criação do Mercado
Comum do Sul (MERCOSUL). Ao mesmo tempo em que assimilava as diretrizes do
Consenso de Washington e da política externa dos Estados Unidos, os países sul-americanos
passaram viram nas citadas iniciativas integracionistas, a oportunidade de constituírem uma
resistência.
Não se pode esquecer que o centro elaborador da política externa dos Estados Unidos é em
linhas gerais, o Departamento de Estado. Obviamente, outros setores do Estado estadunidense
têm importância nisso, como o Pentágono, por exemplo.
Para os estrategistas mais conservadores dos Estados Unidos, um dos grandes problemas para
a sociedade estadunidense é o multiculturalismo e a revolta e ressentimento das elites
nacionais, de regiões como a América do Sul, contra os Estados Unidos, culpando-o pelos
seus problemas econômicos e sociais. Para tanto, o governo dos Estados Unidos deveria atraí-
las para o apoio ao Consenso de Washington e a política externa estadunidense (AYERBE,
2002, p. 26-28).
Tal revolta e ressentimento poderiam minar a cultura que é uma das bases da hegemonia dos
Estados Unidos no mundo e na América do Sul também. Hegemonia é a capacidade de
atração e de exercer poder, já que os “dominados” o vêem assim.
Notoriamente, há um receio da terceiro-mundialização da sociedade dos Estados Unidos. A
América Latina, inclusa a América do Sul, não é vista como uma ameaça, mas no futuro
poderá causar muitos problemas. O problema da América Latina, para a elite cultural e
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intelectual conservadora dos Estados Unidos, é que possui uma herança cultural não ligada ao
trabalho. Também haveria um ressentimento por parte da América Latina contra o
imperialismo de Washington. Ela veria o imperialismo estrangeiro, como o estadunidense,
sendo o causador da sua pobreza. Tudo isso, segundo os conservadores, impediria o
desenvolvimento da América Latina. Regiões como a América do Sul, ficariam mais sensíveis
e suscetíveis ao populismo e idéias ditatoriais (AYERBE, 2002, p. 23-25).
O próprio Francis Fukuyama defende que a economia de livre mercado e a democracia liberal
sustentariam países democráticos, pacíficos, prósperos e progressistas (FUKUYAMA, 1993).
Todavia, tal afirmação de Fukuyama é questionável. Nem sempre o desenvolvimento
econômico leva à democracia e a superação da pobreza.
Fukuyama, com o fim da Guerra Fria foi um defensor intransigente do provável fim da
História. Afirmava que a história, como conflito de ideologias, teria chegado ao seu fim com a
derrocada do comunismo e a uniformização das formas de pensamento e ação. Assim, nascia
a “Nova Ordem Mundial”, traduzida pela situação de consenso e cooperação internacional
durante a Guerra do Golfo (1991), via Nações Unidas (ONU). A supremacia do capitalismo e
da ordem democrática liberal possibilitaria acabar com os conflitos internos e externos dos
países. Nasceria, então, uma nova era de prosperidade, paz e desenvolvimento
(FUKUYAMA, 1993).
Algo bastante questionável a afirmação de Francis Fukuyama. Os acontecimentos hodiernos e
recentes como as guerras civis na África Subsaariana; o avanço da criminalidade internacional
e da violência nas áreas urbanas; as tensões no sul da Ásia, envolvendo Paquistão e Índia; os
conflitos no Oriente Médio; as guerras balcânicas na década de 1990; a guerra civil na
Colômbia; as tensões na região do Chifre da África; os Atentados de 11 de setembro de 2001,
em New York e Washington; o terrorismo internacional, e; a invasão do Iraque, em 2003 são
alguns exemplos que desmentem a teoria de Francis Fukuyama.
Aqui se insere o Consenso de Washington. Quando foi gestado, pelo antigo G-7, a idéia era
elaborar novas diretrizes para o mundo capitalista, principalmente novos caminhos para os
países do Terceiro Mundo e para as antigas economias planificadas do bloco soviético, então
em crise, no início da década de 1990.
Já o autor Samuel Huntington e a sua teoria do “Choque de Civilizações” defendem que
existem novas formas de conflito, sendo o mundo dividido em linhas culturais (identidades
étnicas, religiosas e culturais). Partindo dessa premissa, a civilização ocidental estaria sendo
ameaçada por outras forças civilizatórias, como a muçulmana e a chinesa, colocando em risco
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o equilíbrio de poder mundial. Tal pensamento tem sido base da atual política externa
estadunidense para o Oriente Médio, em especial para o Iraque, sob a presidência de George
Walker Bush. Entretanto, tal visão não explica por completo os conflitos e as questões
contemporâneas atuais (HUNTINGTON, 1997).
A idéia da existência de um possível choque de civilizações já estava presente no governo dos
Estados Unidos, no final da década de 1980 e início da década de 1990. Huntington tem uma
grande importância na formulação dessa teoria, inclusive auxiliou vários governos dos
Estados Unidos na formulação da política externa estadunidense, como o do atual presidente
George Walker Bush.
Não se pode esquecer que parte das elites da América do Sul, com base em um pensamento
tradicional e conservador, de caráter modernizador, aderiram ao Consenso de Washington e
foram muito importantes na aplicação das políticas neoliberais para os países sul-americanos,
na década de 1990. Foi nessa época que houve um período de predominância do pensamento
conservador e tradicional na região (PRADO, 1981).
O Consenso de Washington defendia arduamente que os países da América do Sul, por
exemplo, deveriam adotar em suas políticas econômicas, princípios neoliberais. Isso quer
dizer, que os Estados sul-americanos deveriam privatizar estatais, abrir seus mercados
internos para as importações, receber investimentos estrangeiros, sanear as instituições
estatais e estabelecer metas de produtividades para os governos e suas empresas.
De forma sincrônica, também defendia, na seara política, a adoção da democracia de cunho
liberal como forma de garantir e expandir as conquistas econômicas e sociais. Trata-se de um
casamento entre a democracia e o capitalismo neoliberal. O pressuposto presente é o de que
os valores ocidentais são melhores, de acordo com os próprios ocidentais.
Entretanto, é muito questionável sob o ponto de vista histórico, a afirmação de que a
democracia liberal e o capitalismo seriam a melhor maneira de administrar conflitos. Em
algumas sociedades houve até uma recusa disso. Nota-se que o capitalismo neoliberal e a
democracia liberal, ambos valores ocidentais, são colocados como universalizantes. Uma
saída para desenvolver a América do Sul seria aperfeiçoar o seu capitalismo e a sua
democracia, de acordo com Lars Schoultz. Contudo, penso que isso não é tão simples assim,
pois o capitalismo e a democracia não trouxeram a conquista da superação do
subdesenvolvimento por parte da América Latina. Existem outros elementos importantes
nessa questão.
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Não se pode esquecer que desde o fim da Guerra Fria, os Estados Unidos da América estavam
atentos aos conflitos étnicos e civis por representarem uma ameaça ao Estado-Nação. Isso
permitiu a ocorrência de várias intervenções estadunidenses em diversos lugares do mundo,
inclusive na América Latina. Ocorre que tais conflitos podem ocorrer no interior da sociedade
dos Estados Unidos, sendo que os hispânicos são os mais preocupantes, já que existe o
multiculturalismo, tão ameaçador a identidade branca, protestante e anglo-saxã desse país.
Com a globalização o papel dos Estados está mudando e novos atores, no caso corporações,
estão entrando no cenário internacional. A idéia é a de que os Estados Unidos como única
superpotência do mundo, estariam percebendo que a era dos Estados-Nações poderia estar
chegando ao fim, já que alguns dos seus elementos, como a soberania, foram bastante
relativizados pelos processos de integração regionais.
A criação de blocos econômicos como o MERCOSUL (Mercado Comum do Sul)4, na
América do Sul, seguiu a idéia de que o livre comércio poderia levar os países sul-americanos
para um efetivo desenvolvimento econômico e depois social. Era o que preconizava o
Consenso de Washington.
Durante a Guerra Fria, os Estados capitalistas liberais gastaram vultosas somas em recursos
militares para frear o avanço de Moscou e do comunismo no mundo. Com o seu fim, seria
possível, segundo essa perspectiva, sob a liderança dos Estados Unidos da América, um
período de grande desenvolvimento com paz e prosperidade.
As relações internacionais deveriam ser intensificadas, as fronteiras e os protecionismos
seriam reduzidos ao máximo. As fronteiras deveriam ser abertas ao capitalismo internacional.
Foi o que ocorreu no Brasil, durante os governos do presidente Fernando Afonso Collor de
Melo (1990-1992) e de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002). Também aconteceu isso na
Argentina durante o governo do presidente Carlos Saul Menem (1989-1999), que era do
Partido Justicialista, mais conhecido como peronista.
Uma euforia capitalista e democrática atingiu os países sul-americanos na década de 1980 e
principalmente na década de 1990. Privatizações, concessões, Estado mínimo, Estado máximo
passaram a fazer parte dos vernáculos presentes nos discursos dos governos de países como
Chile, Peru, Argentina e Brasil.
4 Mercosul (Mercado Comum do Sul) é um bloco econômico formado pelo Brasil, Argentina, Paraguai e
Uruguai. A Venezuela está em processo de adesão ao bloco. A idéia é criar uma área de livre comércio e de
trânsito de pessoas, mercadorias, capitais e serviços, ou seja, um mercado comum. Trata-se de um bloco
econômico em crise devido às rivalidades regionais, problemas econômicos, ausência de entidades
supranacionais e desigualdade nas economias e nos estágios de desenvolvimento dos seus países-membros.
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O Consenso de Washington possibilitou a quebra das reservas de mercado nas economias sul-
americanas, causando uma euforia sem precedentes do mercado. A expectativa era a de que
em longo prazo, os resultados seriam bastante produtivos, mas para tanto, seria necessário se
passar por uma transição dolorosa com desemprego, combate à inflação e recessão.
O país da América do Sul, região sob tradicional influência dos Estados Unidos, que ousasse
a se opor ao Consenso de Washington, seria chamado de retrógrado. Estaria se opondo ao
sentido inevitável da história, ou seja, a democracia e o capitalismo. A esquerda passou a ser
chamada de conservadora, por ser contrária a tais idéias. Já os liberais foram chamados de
progressistas pela imprensa.
Na segunda metade da década de 1990, a crise mexicana conhecida como “efeito tequila”, em
1995, a escalada de conflitos no mundo, a retomada dos gastos militares estadunidenses e as
crises dos Tigres Asiáticos, em 1997, da Rússia, em 1998 e do Brasil, em 1999, demonstraram
o início da crise das diretivas do Consenso de Washington.
Todavia, é assaz necessário saber como os Estados Unidos se relacionavam com a América
Latina durante a Guerra Fria. Com o final da Segunda Guerra Mundial, em 1945, os Estados
Unidos adotaram uma postura definitivamente internacionalista e se transformaram em um
grande império.
Durante a Segunda Guerra Mundial, Washington garantiu proteção dos Estados Latino-
Americanos e o fornecimento de matéria-prima para a sua indústria bélica. A maioria dos
países da América Latina apoiou o governo estadunidense no citado conflito. Os países eram
dominados por ditadores como Getúlio Dorneles Vargas (1930-1945), no Brasil.
Com o início da Guerra Fria, os países latino-americanos clamaram através dos seus líderes,
um Plano Marshall para a região. No entanto, Washington negou essa ajuda econômica e
ofereceu aos países latino-americanos empréstimos de dólares do setor privado, com juros de
mercado e um processo de redemocratização (SCHOULTZ, p. 353).
No final da década de 1940, com a ascensão do socialismo em várias regiões do mundo, a
democracia passou por um revés na América do Sul. Ocorreu que as suas elites passaram a
apoiar a volta de uma ditadura, pressionadas pelos Estados Unidos.
Para os Estados Unidos deveria haver ditaduras na periferia e democracia no centro do seu
bloco de poder. Essa percepção se tornou ainda mais forte a partir da Revolução Cubana, em
1959 e a guinada que Havana tomou em direção a Moscou.
Como Cuba era vista como uma ameaça aos interesses dos Estados Unidos no continente
latino-americano, as idéias golpistas e ditatoriais passaram a constituir a base de projetos de
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poder construídos pelas elites nacionais e patrocinados pelos Estados Unidos. Foi o que
aconteceu no Brasil, em 1964, quando ocorreu o golpe de estado, contra o então presidente
João Goulart (1961-1964).
Assim, durante a Guerra Fria, os Estados Unidos distribuíram recursos econômicos, na forma
de empréstimos desproporcionais, de acordo com os seus interesses de longa ou menor
duração na América Latina, o que inclui a América do Sul.
Ao longo de toda a Guerra Fria, o governo dos Estados Unidos teve uma relação com os
governos da América Latina, baseada no antagonismo democracia/ditadura. Tal relação
variou de acordo com o contexto histórico e os interesses de Washington e das elites
nacionais latino-americanas. Sem dúvida, a pobreza era vista pela Casa Branca como causa
potencial para o crescimento do socialismo na região.
Voltando ao final da Guerra Fria, a região da América do Sul estava passando pelo fim de
vários regimes ditatoriais. O Brasil encerrou sua ditadura, em 1985, a Argentina, em 1983, o
Paraguai, em 1989 e o Chile, em 1990.
Como o Consenso de Washington defendia a democracia liberal como forma de alavancar o
desenvolvimento da América do Sul, projetos de integração como a ALALC (Associação
Latino-Americana de Livre Comércio) depois substituída pela ALADI (Associação Latino-
Americana de Desenvolvimento e Integração), em 1980, emergiram com grande força. Não se
pode esquecer que o período do pós-guerra foi caracterizado pelo nascimento de vários blocos
econômicos como a Comunidade Econômica Européia, atual União Européia (UE), em 1957,
pelo Tratado de Roma.
Por conseqüência, a criação da Associação Latino-Americana de Livre Comércio (ALALC) e
da Associação Latino-Americana de Desenvolvimento e Integração possibilitou o surgimento
de novas experiências de integração como o Pacto Andino, atual Comunidade Andina, e o
Mercado Comum do Sul (MERCOSUL) (VESENTINI, 1998).
A década de 1990, então, foi caracterizada pelo surgimento do Mercado Comum do Sul, o
MERCOSUL, com o Tratado de Assunção, em 1991 e que entrou em vigor, a partir de 1995.
Entretanto, começou a ser negociado antes, a partir da segunda metade da década de 1980,
entre o Brasil, do então presidente José Sarney, e a Argentina, do presidente Raul Alfonsin.
A idéia é criar uma área de livre comércio, ter uma tarifa externa comum para países de fora
do bloco, ampliar o bloco para toda a América do Sul e depois a América Latina e criar uma
área de livre trânsito para mercadorias, capitais, pessoas e serviços. Não se pode esquecer que
um dos requisitos para adentrar ao MERCOSUL é ser um país democrático.
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Já a Comunidade Andina foi criada em 1969, pela Venezuela, Bolívia, Chile, Equador,
Colômbia e Peru com o nome de Pacto Andino. Na década de 1990 o citado bloco procurou
se fortalecer como elemento fundamental para a inserção no comércio internacional dos seus
países-membros. No ensejo do Consenso de Washington, os seus Estados aplicaram políticas
de liberalização econômica visando à diminuição da atuação do Estado na economia. Assim,
foi assinada, em 1991, a Ata de Barahona, que criou uma área de livre comércio na região. Já
em 1996, com o Protocolo de Trujillo, foi criada a Comunidade Andina e estabelecido o
objetivo de se criar um mercado comum até 2005, fato ainda não consumado (MEIRELLES,
p.5-6).
Nos dias hodiernos, apenas Colômbia, Peru, Equador e Bolívia continuam fazendo parte da
Comunidade Andina que busca tornar mais competitiva as economias de seus países-
membros.
Nota-se que tanto o MERCOSUL como a Comunidade Andina são projetos de integração que
ganharam estrutura e velocidade após o fim da Guerra Fria, com o Consenso de Washington
tendo um papel importante. Todavia, tais blocos têm se constituído também em projetos de
resistência ao próprio Consenso de Washington e a política externa dos Estados Unidos para a
América Latina.
Ocorreu que ao longo da década de 1990, o MERCOSUL e a Comunidade Andina se
fortaleceram e se inseriram no mercado internacional. A inserção, porém, não foi fácil e tem
encontrado muitos empecilhos. Mesmo com a criação da Organização Mundial do Comércio
(OMC), oriunda do GATT (Acordo Geral de Comércio e Tarifas), em 1995, as promessas de
livre comércio em escala mundial continuaram mais sendo promessas do que realidade. A
recusa dos Estados Unidos e da União Européia em cortar os seus subsídios dados para o setor
agrícola prejudicou duramente as aspirações dos países sul-americanos, notoriamente grandes
exportadores de matéria-prima. O impasse da Rodada de Doha, sobre o setor da agricultura,
iniciada em 2001, na Organização Mundial do Comércio, só reforçou essa posição.
É sabido que os Estados Unidos construíram um sistema de relações internacionais conforme
os seus interesses, no pós-guerra. Exemplos disso são: a Organização dos Estados Americanos
(OEA), a Organização das Nações Unidas (ONU), o Fundo Monetário Internacional (FMI), o
Acordo Geral de Comércio e Tarifas (GATT) e o Banco Internacional para a Reconstrução e o
Desenvolvimento (Bird) (MUNHOZ, 2004).
Vale ressaltar também que o lançamento da idéia, pelo então presidente dos Estados Unidos,
no início da década de 1990, George Bush, da criação de uma Área de Livre Comércio para as
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Américas, foi encampada pelo presidente que o sucedeu, o democrata Bill Clinton (1993-
2001), a partir de 1994, com a Conferência de Miami.
Nasceu o projeto da ALCA (Acordo de Livre Comércio das Américas) que deveria ser
implementado até 2005 e que foi muito defendido pelos governos estadunidenses de Bill
Clinton e de George Walker Bush (2001). Esse projeto, no entanto, concedia a abertura dos
mercados, principalmente na América do Sul, em setores que os Estados Unidos são bastante
competitivos, como tecnologia, indústrias de tecnologia de ponta, por exemplo, para os
produtos estadunidenses. A contrapartida não seria válida. Os Estados Unidos se recusavam a
abrir o setor agrícola para a importação de produtos agrícolas oriundos de países como o
Brasil, Argentina e Uruguai.
A atuação da Comunidade Andina e principalmente do Mercosul, através do Brasil, foi
decisiva para frear a instauração da ALCA nos moldes desejados por Washington.
Tratou-se de uma notória resistência dos países sul-americanos, em geral, contra a política
externa dos Estados Unidos, de caráter expansionista e imperial.
Isso não quer dizer que os projetos de integração sul-americanos estejam funcionando
perfeitamente, mas percebe-se a existência da percepção de que os países só poderão competir
e enfrentar o mercado internacional através de blocos como o Mercosul e a Comunidade
Andina.
Torna-se imperativo, para os governos dos seus países-membros, principalmente os do
Mercosul, como Brasil e Argentina, fortalecerem e ousarem no processo de integração. Esse
não pode só se restringir ao aspecto econômico, mas deve avançar em outras searas como a
social, por exemplo. É imprescindível que os países consigam se unir, superando suas
rivalidades históricas, econômicas e mútuas desconfianças geopolíticas para que possam
pensar em termos únicos, aproximando-se do ideal pan-americano sonhado por Simon
Bolívar.
Ao fazerem isso, conseguirão negociar em condições melhores nos fóruns de decisões
mundiais, principalmente na Organização Mundial do Comércio e nas Nações Unidas.
Faz-se necessário salientar que a integração sul-americana não significa um rompimento com
os Estados Unidos, mas uma reordenação de forças para colocar os países da América do Sul
e posteriormente da América Latina, em melhores condições de igualdade nas negociações
com Washington, principalmente na área econômica.
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Infelizmente, os Estados Unidos, cientes dessa questão, adotaram a postura de costurar
acordos de livre comércio bilaterais com os países da América do Sul, como o Chile e o
Uruguai, o que ameaça os projetos de integração.
Para a consecução dos objetivos dos países da região, as negociações deveriam ser feitas
pelos blocos, no caso a Comunidade Andina e o Mercosul, e não pelos países de forma
individualizada.
Considerações Finais
O presente ensaio pode ser considerado uma análise sobre o impacto que o Consenso de
Washington teve no processo de integração sul-americana. Também verificou como tal
processo assimilou e também resistiu às diretrizes do Consenso de Washington e a política
externa dos Estados Unidos para a região.
É conhecido que a América do Sul, no interior da América Latina, é uma região considerada e
tratada como o “quintal” dos Estados Unidos, desde o século XIX.
Contudo, isso não significa que os países sul-americanos sempre concordaram com as
políticas e intenções emanadas da Casa Branca. Houve em diversas oportunidades a
convergência dos interesses estadunidenses com os das elites nacionais daqueles países.
Mesmo assim, em diversas oportunidades, os países da América do Sul seguiram os passos
dos Estados Unidos e de suas políticas para a região, como foi o caso do Consenso de
Washington.
Tal consenso ajudou inegavelmente na aceleração dos projetos integracionistas sul-
americanos, como a Comunidade Andina e principalmente o Mercosul.
Ao mesmo tempo, é inegável que os blocos, como o Mercado Comum do Sul, passaram a
construir um pensamento e objetivos mais adequados as suas próprias realidades e por
conseqüência, a resistirem ao projeto de liberalização comercial total, defendido pelo
Consenso de Washington, para a região, através da agressiva política externa dos Estados
Unidos na área comercial.
Trata-se de um paradoxo. Enquanto os países construíam seus blocos econômicos e
assimilavam as idéias de democracia liberal e princípios econômicos neoliberais,
concomitante a isso, percebiam as falhas do Consenso de Washington e os problemas
decorrentes na construção de uma economia realmente liberalizada.
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Então, passaram a ver, de certa forma, nos processo de integração uma forma de atuarem em
bloco, objetivando a defesa de seus interesses econômicos e internacionais, principalmente
frente à política externa dos Estados Unidos para a América do Sul.
É inocente pensar que as rivalidades regionais, as desconfianças e as disputas econômicas e
políticas entre os países sul-americanos se encerraram. É só lembrar-se das disputas entre
Brasil, Argentina e agora a Venezuela, pela liderança regional na América do Sul.
Entretanto, se os países sul-americanos e em maior escala, a América Latina, ambicionarem
um papel de destaque no cenário internacional do século XXI, precisarão defender e
consolidar seus projetos de integração, superando os problemas, para que consigam dialogar
em condições mais justas e equânimes com os grandes países, principalmente com os Estados
Unidos.
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