Post on 24-Oct-2020
UNIVERSIDADE DE LISBOA FACULDADE DE BELAS-ARTES
TER O MUSEU NA MÃO A Tecnologia Beacon no Museu Nacional dos
Coches
André Rosado Guedes
Dissertação
Mestrado em Museologia e Museografia
Dissertação orientada pelo Prof. Doutor Fernando António Baptista Pereira
2018
1
DECLARAÇÃO DE AUTORIA Eu, André Rosado Guedes, declaro que a presente dissertação de mestrado intitulada “Ter
o Museu na mão: A tecnologia beacon no Museu Nacional dos Coches”, é o resultado da
minha investigação pessoal e independente. O conteúdo é original e todas as fontes
consultadas estão devidamente mencionadas na bibliografia ou outras listagens de fontes
documentais, tal como todas as citações diretas ou indiretas têm devida indicação ao longo
do trabalho segundo as normas académicas.
O Candidato Lisboa, 31 de outubro de 2018
2
RESUMO
Ter o museu na mão significa duas coisas: servir e ser-se servido. Primeiro, por
poder proporcionar ao visitante uma experiência mais enriquecedora e interativa, onde para
além de lhe serem transmitidos todo o tipo de informações – em todos os formatos – acerca
da obra que está a ver, é também possível imergi-lo na obra, fazendo com que este interaja
com a mesma. Em segundo, por ser possível conseguir, através da aplicação desta
tecnologia, estudar a reação deste para com as obras, assim como o seu comportamento
dentro do museu, dados que se podem tornar interessantíssimos para o estudo de
exposições.
A presente dissertação tem como objetivo mostrar a potencialidade que a tecnologia
beacon pode ter em variadíssimos espaços museológicos, bem como clarificar que nem
sempre a tecnologia é parte desviante da obra, pois aqui procura-se que esta seja
complemento da obra e não que a obra seja complemento desta.
Antes de serem apresentados vários exemplos de museus onde esta tecnologia já
foi aplicada, é feita uma caracterização do que são os beacons, de forma a que se entenda
também como é que eles funcionam, como é que comunicam com os nossos smartphones, e
quais as suas funcionalidades.
É também apresentado um estudo sobre o Museu Nacional dos Coches e a sua
coleção, bem como a recolha de informação em bruto coletada pelos beacons no interior
do museu durante um período de 14 meses.
Para que se entenda como tudo surgiu e como é que a tecnologia foi aplicada no
museu, foi feita uma investigação mais aprofundada, a par de algumas entrevistas aos
principais intervenientes do projeto.
Por fim, após a conversão dos números em informação concreta, é feita uma análise
mais detalhada, com o objetivo de perceber qual o sucesso do projeto e qual o
comportamento (interesse pelas viaturas e manifestação de agrado) dos visitantes dentro
do museu, de forma a percecionar quais os aspetos a melhorar, sempre com o objetivo de
servir cada vez melhor o público.
Palavras-Chave: Museu; Beacon; Novas Tecnologias; Estudo de Exposições; Coches
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ABSTRACT
“Have the Museum in hand” has two meanings, serving and being served. First
because it provides the visitor a much more enriching and interactive experience, once it
grants him access to a vast range of information on multiple formats, about the artwork
itself, and emerges the visitor into a whole new captivating and interactive acknowledging
process. Secondly because the implementation of this technology gives us the chance to
study and examine the visitors’ reactions towards the artwork, as well as its overall
behavior within the museum premises. This kind of data can be of extremely interesting
importance for exhibition studies purposes.
This dissertation aims to show the real potential that beacon technology can bring
to various museums, as well as to clarify that technology should not always be considered
as a deviant part of the artwork, on the contrary, it is meant to serve as a complement of
the artwork and not the other way around.
Before presenting several examples of museums where this technology has already
been implemented, it will be provided a brief description of how it works, how it
communicates with our smartphones and which features this technology can contain.
A study is carried out on the National Coach Museum and its collection, and the
information that beacons were able to gather within the museum for a period of 14 months
is collected.
Trying to reach full understanding on when these changes took place and how this
technology was implemented, interviews were conducted with key project participants.
Finally, after processing all data, a more detailed analysis is presented. This will allow us
to measure the project’s success rate, the visitor’s behavior when interacting with beacons
pointing out the necessary improvements which will provide tools to offer a better service
to the public.
Keywords – Museum; Beacon; New Technologies; Exhibitions Study; Coaches
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Agradecimentos Ao Professor Doutor Fernando António Baptista Pereira, por ter acreditado desde o início
neste projeto e por me ter dado todo o apoio em relação a isso.
Ao Hugo Farinha, por toda a ajuda incansável que me deu desde o princípio ao fim.
A toda a equipa do Museu Nacional dos Coches, pela forma como me receberam e me
ajudaram.
À Mãe,
À Ti Lina, Ao Ti Chico, À Ti Belina, Ao Gabi
À Ana. Ao meu amigo de infância Fábio Pita, por todo o apoio inicial, pois sem ele provavelmente
não teria descoberto os beacons.
Aos amigos que fiz na Universidade de Coimbra, em especial aos ‘hermanos’ Hélder
Brandão e António Pizarro Madureira, duas peças importantíssimas na elaboração desta
dissertação.
À Sarita, por todo o apoio dado desde que cheguei à FBAUL.
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Índice
Introdução....................................................................................................................... 8
1 – As Novas TIC’s nos Museus – uma panorâmica global e sugestão de exemplos .......15
1.1 – Introdução sobre o uso das novas tecnologias no museu e sugestão de exemplos a
aplicar ...................................................................................................................................... 15
1.2 – Os beacons .................................................................................................................... 20
1.2.1 – O que são e como funcionam .................................................................................... 20
1.2.2 – A história dos beacons – como e onde surgiram ..................................................... 24
1.3 – Os beacons na museologia mundial ............................................................................ 27
2 – O Museu Nacional dos Coches .................................................................................32
2.1 – História e caracterização ........................................................................................32
2.2 – Caracterização do espaço e das obras.....................................................................36
2.3 – Experiências do uso dos beacons: da disponibilização de conteúdos à interpretação
da aplicação para o estudo do público ............................................................................53
3 – Os resultados do uso da tecnologia beacon no Museu Nacional dos Coches .............59
3.1 – O estudo do comportamento do público no museu a partir da aplicação .................59
3.2 – Limitações encontradas e sugestões de melhoramento ...........................................77
Conclusão e Perspetivas Futuras.....................................................................................83
Referências Bibliográficas .............................................................................................88
Anexo 1 – Aplicação ......................................................................................................94
Anexo 2 – Gráficos ........................................................................................................99
Anexo 3 – Tecnologia .................................................................................................. 106
Anexo 4 – Museu ......................................................................................................... 107
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Figura 1 - Coche de Filipe II ......................................................................................... 39
Figura 2 - Retrato de D. João V e a Batalha do Cabo Matapão, 1717, de Giorgio
Domenico Duprà (1689- 1770) ..................................................................................... 41
Figura 3 - Coche do Embaixador ................................................................................... 42
Figura 4 - Coche da Coroação de Lisboa ....................................................................... 43
Figura 5 - Coche dos Oceanos ....................................................................................... 44
Figura 6 - Coche da Mesa ............................................................................................. 46
Figura 7 - Sege dos Óculos ........................................................................................... 48
Figura 8 - Automóvel .................................................................................................... 49
Figura 9 - Mala-Posta .................................................................................................... 50
Figura 10 - Landau do Regicídio ................................................................................... 51
Figura 11 - A designação que aparece de Coches 4, corresponde aos coches 7 e 9 ......... 54
Figura 12 - A designação que aparece de Coches 5 corresponde aos coches 6 e 8 .......... 55
Figura 13 - Exemplo de calibração da distância das notificações para dispositivos IOS e
Android ......................................................................................................................... 56
Figura 14 - Downloads por Android .............................................................................. 60
Figura 15 - Downloads por IOS .................................................................................... 60
Figura 16 - Nº de Visitantes em 2017 no MNC ............................................................. 62
Figura 17 - Nº de Visitantes em 2018 no MNC ............................................................. 62
Figura 18 - Logins na Aplicação.................................................................................... 64
Figura 19 - Planta da exposição aquando a instalação dos beacons ................................ 66
Figura 20 - Número de Pedidos de Informação por Ilha................................................. 67
Figura 21 - Viaturas com mais likes .............................................................................. 70
Figura 22 - Viaturas que foram partilhadas mais vezes .................................................. 71
Figura 23 - Exemplo de informação em bruto alojada na base de dados......................... 72
Figura 24 - Viaturas não expostas com mais likes - Ilha 22 ............................................ 73
Figura 25 - Viaturas não expostas que foram mais vezes partilhadas - Ilha 22 ............... 73
Figura 26 - Os nomes dos visitantes foram rasurados de forma a respeitar a sua
privacidade e a não violar a lei ...................................................................................... 74
Figura 27 - Mapa de manchas, segundo o comportamento do público .......................... 76
Figura 28 - Planta da exposição atual ............................................................................ 81
Figura 29 - Proposta de alteração à planta da exposição atual, com base na análise feita
anteriormente ................................................................................................................ 82
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Lista de Siglas APOM – Associação Portuguesa de Museologia
AWDC – Apple Worldwide Development Center
BLE – Bluetooth Low Energy
CEO – Chief Executive Officer ou, em língua portuguesa, Diretor Executivo
CMS – Content Management System ou, em língua portuguesa, “Sistema de Gestão de
Conteúdos”
DB – Data Base ou, em língua portuguesa, “Base de Dados”
DGPC – Direção-Geral do Património Cultural
GPS – Global Positioning System
HDMI – High-Definition Multimedia Interface
HTML – Hyper Text Markup Language
ICT – Information and Communications Technology
ID’s – Identificador(es)
IOS – Iphone Operating System
MAAT – Museu de Arte, Arquitetura e Tecnologia
MNC – Museu Nacional dos Coches
MOSMS – Mobile Operating System Market Share
MVMS – Mobile Vendor Market Share
NFC – Near Field Communication
OSS – Open-source Software
RA – Realidade Aumentada
RSSI – Received Signal Strength Indication
RV – Realidade Virtual
TI – Tecnologia de Informação
TIC’s – Tecnologia(s) de Informação e Comunicação
TLM – Telemetry
UID – Unique Identifier
URL – Uniform Resource Locator
USB – Universal Serial Bus
UUID – Universally Unique Identifier
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Introdução
Esta dissertação tem como objeto de estudo a tecnologia beacon aplicada no Museu
Nacional dos Coches. De forma muito sucinta e simples, os beacons são dispositivos mais
pequenos que o tamanho da palma da nossa mão, que se podem colocar literalmente em
todo o lado, servindo para comunicar com o nosso smartphone, com o intuito de [o beacon]
nos proporcionar a informação sobre o que estamos a ver sempre que nos aproximamos
deste. Ao mesmo tempo que isto acontece, o utilizador pode recolher informações muito
interessantes através dele, particularidades que abordarei de forma mais explícita ao longo
da tese.
A ideia de desenvolver um projeto de cariz tecnológico surgiu após a realização de
um trabalho para uma cadeira do 1º ano de mestrado, lecionada pelo agora orientador desta
dissertação, o Professor Doutor Fernando António Baptista Pereira. O objetivo do trabalho
era escolher um museu, identificar os seus problemas e procurar resolvê-los. Foi então que
decidi optar por um museu que conheço desde criança, o Museu-Biblioteca da Casa de
Bragança, também comummente conhecido como o Paço Ducal de Vila Viçosa. A escolha
foi automática, pois é um espaço sobre o qual já tinha refletido várias vezes e onde já
identificara vários problemas, sobretudo respeitantes à estagnação.
Sem muito a apontar sobre a coleção do museu, mas com muito a apontar em
relação ao seu funcionamento, decidi propor a criação de uma aplicação de forma a
colmatar os problemas existentes. Sem me querer alargar, e de forma a contextualizar o
leitor, os problemas referidos recaíam sobre vários fatores: a visita ao museu ter que ser
obrigatoriamente guiada, sem possibilidade de regressar atrás; a barreira linguística, não
existindo um leque de opções de idiomas permanente para a visita do museu; a ausência
total de folha de sala ou legendagem sobre as obras e a questão do tempo na exposição,
que por ser guiada e em grupo é feita a alta velocidade. Isto são os principais problemas
de onde ramificam tantos outros, como a falta de inovação, não existindo qualquer
preocupação com a geração de conteúdos, assim como o papel do serviço educativo, que
deixa muito a desejar por não propor nada de realmente cativante, entre muitos outros.
Identificados os problemas, decidi elaborar um projeto que melhorasse ou debelasse todas
as problemáticas existentes ao nível do funcionamento. Sem me querer alargar, vou apenas
tocar naquela que fez com que a ideia da implementação dos beacons surgisse.
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O facto de o visitante só poder percorrer o museu de forma guiada, levou-me a pensar
que isso poderia ser resolvido com a ativação da localização GPS e a inserção de um mapa
museológico na aplicação, sabendo o visitante exatamente onde estava e o que tinha ainda
para conhecer, visualizando as obras expostas em cada sala do palácio. Foi logo aqui surgiu
a maior barreira, pois a localização via GPS, dentro de espaços, torna-se bastante
complicada, sobretudo no Paço Ducal de Vila Viçosa, onde a sua arquitetura robusta tende
a dificultar qualquer entrada de sinal ou onda.
Posto isto, surgiu ainda antes dos beacons a introdução de códigos QR, tecnologia
que já tinha sido abordada e desenvolvida na tese “Um projeto de novas tecnologias
aplicado na Casa-Museu Dr. Anastácio Gonçalves”, redigida pela Dra. Mariana Mesquita1,
na altura mestranda do meu orientador, o Professor Doutor Fernando António Baptista
Pereira. Por sua vez esta tecnologia não se mostrou viável para os responsáveis do Museu-
Biblioteca da Casa de Bragança por ser necessário rede wi-fi, serviço que o museu não
disponibiliza aos visitantes. Mostrou-se indisponível, também, porque os códigos QR, para
além de ficarem esteticamente impróprios no museu, têm a particularidade de ter que ser
procurados para serem acionados, coisa que muitas vezes no museu não resultaria devido
à proteção existente em redor de muitas peças – há até salas em que a visita é feita no
corredor das mesmas – onde nem se consegue observar bem o que está exposto.
Foi então que, após o término do semestre e consequente escolha do tema e do
orientador, e em conversa sobre esta quantidade de problemas resultantes no
desenvolvimento do projeto, abordei um grande amigo de infância, o Fábio Pita, –
engenheiro informático e pessoa atualizada sobre as novas tendências tecnológicas no
mercado – o qual me falou de forma muito breve sobre os beacons. Passámos dias imersos
numa pesquisa avançada sobre a tecnologia em questão, de forma a perceber se realmente
colmatava estes problemas ou não. Ao início pareceu-nos “ouro sobre azul”, e confesso
que chegámos até a estar extasiados ao ponto de querermos avançar com um projeto em
nome próprio.
Nas várias investigações que fomos fazendo, entendemos que a tecnologia já tinha
sido utilizada em vários museus por todo o mundo e que tinha sido um autêntico sucesso.
Isso levou-nos a ficar ainda mais motivados e a investir ainda mais tempo. O único problema
que poderia não ser colmatado seria o da existência de wi-fi gratuito no museu, pois era
1 MESQUITA, Mariana Mendes - Um projeto de Novas Tecnologias Aplicado na Casa-Museu Dr. Anastácio Gonçalves. Lisboa: Universidade de Lisboa, 2013. Dissertação de mestrado.
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necessário descarregar uma aplicação. Ainda assim, percebemos que havia uma maneira
de utilizar os beacons sem ter que haver uma app, conceito que explicarei mais à frente de
forma detalhada.
Decidimos então apresentar o projeto tecnológico à direção do Museu-Biblioteca
da Casa de Bragança, que logo nos colocou “mil” entraves, demonstrando-se muito pouco
interessada na aplicação da tecnologia, o que nos desmotivou, pois sentimos que não houve
qualquer empenho em entender do que se tratava.
Momentos após reportar isto ao meu orientador, este encaminhou-me para o Museu
da Farmácia, em Lisboa, onde me reuni com o seu diretor. Apresentei-lhe o projeto
exatamente da mesma forma como tinha apresentado no museu de Vila Viçosa. Este, ao
contrário da diretora do Museu-Biblioteca da Casa de Bragança, ficou bastante interessado,
o que reativou a minha motivação.
Visitas sobre visitas ao Museu da Farmácia, de forma a investigar o espaço e a
estudar a coleção, assim como reuniões recorrentes com o diretor sobre a aplicação do
projeto, resultaram em que este me dissesse que para executar o projeto em Lisboa, teria
também de ser executado no Museu da Farmácia do Porto, interligando-os. Não havia
qualquer problema, o investimento é que teria de ser maior. Foi com esta barreira que o
projeto teve quase para se desmoronar, pois não havia possibilidade de libertação de
qualquer tipo de fundo monetário para o seu desenvolvimento, propondo-me assim arranjar
um mecenas para o mesmo.
Levei meses entre contactos com empresas nacionais e internacionais que
forneciam a tecnologia beacon, de forma a angariar um investimento no museu por parte
destas, e a verdade é que acabei por conseguir.
Inicialmente, consegui falar com o CEO da empresa algarvia Local Beacon, o Dr.
Lourenço Ribeiro, que se mostrou sempre disponível em ajudar. No entanto, não tinha
ainda capacidade financeira para se aventurar num projeto destes, tendo-me facultado três
beacons, de modo a realizar um teste piloto no Museu da Farmácia, e cedendo-me o acesso
ao seu backoffice. Assim o fiz, e os beacons resultaram na perfeição. Voltei a tentar para
que houvesse algum investimento por parte do museu, onde apresentei também os
resultados já obtidos. Infelizmente não havia mesmo possibilidade.
Voltei aos contactos, e surgiu a empresa iBeacon, neste caso iBeacon Portugal,
uma extensão da empresa internacional no nosso país, representada pela Dra. Cecile
Castan, que se mostrou bastante interessada pelo projeto.
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Após conversações, marcámos uma reunião a três, eu, o diretor do Museu da
Farmácia e a Dra. Cecile Castan, onde no final da reunião ficou bem explícito que o museu
não tinha qualquer hipótese de investir. Ou seja, teria que ser um projeto pro bono, ao qual
a Dra. Cecile Castan nos disse que isso seria impossível, pois teria que haver um
investimento, nem que fosse mínimo, argumentando com os elevados custos do projeto.
Sem qualquer tipo de orçamento apresentado, e por termos visto na iBeacon uma
empresa emergente em Portugal, achámos que seria um ótimo negócio para ambos. Para o
museu, porque usufruiria de um serviço totalmente inovador, e para a empresa, pois teria ali
uma ótima oportunidade de lançar o seu produto e ter visibilidade no panorama cultural
português.
Foi a equacionar todas estas questões que a Dra. Cecile Castan decidiu informar o
CEO da empresa sobre o ponto da situação, ao qual o Dr. Kibo Nakamura deu uma
oportunidade de negócio, prolongando assim a viagem que estava a fazer pela Europa até
Lisboa. Acordámos reunir-nos novamente, desta vez já com o CEO da empresa, evento ao
qual o diretor do museu não pôde marcar presença. Sem aviso prévio sobre o que viria a
suceder, escusado será dizer que as relações entre nós e a iBeacon foram totalmente
cortadas, morrendo totalmente o projeto tecnológico no Museu da Farmácia.
Após tudo isto, não posso esconder que fiquei um pouco desmotivado, pois tinha
perdido um ano só à volta destas questões. No entanto, nunca me arrependi por ter tentado
fazer algo diferente e que me desafiasse a todos os níveis, sabia bem todos os problemas
que poderiam surgir, sabia que não iria ser fácil, pois para além de ser uma coisa totalmente
nova em Portugal também acarretava alguns custos. Alimentou-me sempre a ideia de
querer ser pioneiro deste tema, quis em muitos momentos replicar o projeto em mais e mais
museus, sempre com os olhos postos no futuro da museologia em Portugal, que tanto tem
a espremer deste “fruto” chamado beacon.
Dias após isto acontecer, o Professor Doutor Fernando António Baptista Pereira,
aconselhou-me a ir ter com a Dra. Silvana Bessone ao Museu Nacional dos Coches, pois
teriam aplicado a tecnologia beacon há muito pouco tempo.
Fiquei obviamente muito contente, apesar da questão de a implementação ficar
anulada. Contudo, havia ainda um tratamento enorme de dados para fazer, assim como o
melhoramento do projeto, pois ali todos eram pioneiros, tanto a empresa como o museu.
Já nas imediações do museu, recebeu-me a Dra. Ana Paula, que me apresentou todo
o projeto aplicado pela empresa RPGSI (agora ROOX), onde ia colocando algumas
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questões mais técnicas, e que em minutos foram respondidas pelo representante da empresa
e responsável pelo projeto, o Dr. Hugo Farinha, que foi sempre incansável em ajudar-me,
assim como a Dra. Ana Paula.
Posto isto, só faltava começar a investigar aprofundadamente e perceber como tudo
estava a funcionar, bem como a recolher as amostras, que na altura ainda eram muito
pequenas, não podendo fazer nada de especial com as mesmas. De forma a estar totalmente
inserido, fui continuando a estudar a tecnologia, assim como a sua aplicação, e claro, a
coleção do Museu Nacional dos Coches.
Acontece que por ser um tema sobre uma tecnologia muito recente em Portugal, o
repositório em português não é o mais vasto, recorrendo assim muitas vezes a artigos,
trabalhos, vídeos e dissertações internacionais. No entanto, em português destaco a
dissertação “Desenvolvimento de uma APP Android e Plataforma Web para comunicação
com Beacons”, do Dr. Nuno Alexandre Lemos de Paiva2, e a já referida anteriormente,
redigida pela Dra. Mariana Mesquita3. Esta primeira, apesar de não abordar a aplicação de
beacons em museus, toca em aspetos técnicos e informáticos muito importantes para a
compreensão de como a tecnologia funciona e comunica.
Existem teses em Portugal que tratam as simulações de implementação de beacons
em museus4, contudo, após a leitura das mesmas e investigação aprofundada e, claro,
experiência real sobre a aplicação dos mesmos, decidi não as utilizar como ferramentas,
pois têm algumas lacunas, tanto na parte técnica e informática. Também apresentam
debilidades de conceção, o que em certa parte é compreensível, pois existe um défice de
estudo e informação acerca deste tema, levando à leitura de muitos artigos, que muitas das
vezes são complicados ou não são consensuais. Tudo isto leva à criação de confusões em
relação aos dispositivos, por isso nada melhor do que experimentá-los no terreno.
Felizmente, devido ao projeto estar em aplicação, tive a oportunidade de saber
concretamente o que são os beacons, o que fazem e como fazem. Para isso tive que ter uma
pequena formação, para entender o básico da comunicação através da programação, para o
qual muito contribuiu o Dr. Hugo Farinha, que se mostrou sempre disponível em ajudar-
me, tanto na parte interna como externa, ou seja, tanto no tratamento de dados como na
2 PAIVA, Nuno Alexandre Lemos de - Desenvolvimento de uma APP Android e Plataforma Web para comunicação com Beacons. Coimbra: Universidade de Coimbra, 2016. Dissertação de mestrado. 3 MESQUITA, Mariana Mendes - Um projeto de Novas Tecnologias Aplicado na Casa-Museu Dr. Anastácio Gonçalves. Lisboa: Universidade de Lisboa, 2013. Dissertação de mestrado. 4 Como por exemplo: RAMOS, Inês Maria Saraiva - Versatilidade da Tecnologia Beacon: As suas potencialidades num Museu de Portugal. Coimbra: Instituto Politécnico de Coimbra, 2017. Dissertação de mestrado.
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aplicação do projeto. Foi uma peça essencial para perceber como tudo funciona, e por vezes
debater com ele certas situações, pois como referi, éramos e somos todos pioneiros.
É também um prazer enorme ser, até à data, o único a estudar, desta forma, a
aplicação de beacons num museu português, assim como a extrair deles dados concretos
que servirão para perceber alguns comportamentos do visitante no museu. Ao longo de
toda a dissertação, procurarei sempre contextualizar o leitor, tentando não entrar por
aspetos muito específicos, pois acho que a simplificação de um tema destes num projeto
de museologia e museografia, é essencial para que todos consigam compreender como tudo
funciona.
Com esta dissertação procuro cativar o leitor para o benefício que é ter a tecnologia
beacon em espaços museológicos, bem como a qualquer outro espaço ligado à cultura,
esperando que no final o seu veredito seja abonatório da mesma, compreendendo, assim, a
necessidade desta tecnologia em museus e exposições, onde fará realmente toda a
diferença.
Quero, de forma incessante, que esta seja uma porta cheia de luz no que toca a
Portugal e às novas tecnologias nos museus. É essencial cativar novos públicos e mostrar-
lhes que as “armas” com que eles cresceram podem ser utilizadas de forma educacional,
saciando-lhes assim aquela sede de informação em formatos interativos, sempre com o
papel bem delineado do que é a obra e do que é o objeto, de forma a que a obra não seja
complemento do objeto, mas sim que o objeto seja complemento da obra.
Para tal, decidimos conferir a esta dissertação uma estrutura que leve o leitor a
entender tudo de forma gradual, compreendendo-lhe um corpo dividido em três partes: 1)
A tecnologia beacon 2) O Museu e a aplicação 3) A análise do projeto.
Na primeira parte do primeiro capítulo abordarei a introdução da tecnologia nas
nossas vidas, e a forma como a vemos e vivemos, de modo a explicar o que se pretende
com esta inovação. Também se explicará as evoluções das novas TIC’s nos museus, como
a realidade aumentada ou a realidade virtual. Na segunda parte do mesmo, tentarei expor
de forma simples e objetiva o que são os beacons, como surgiram e onde é que já foram
aplicados, exemplificando, assim, com alguns casos onde a tecnologia é ou foi
diferenciadora.
14
A primeira parte do segundo capítulo é totalmente dedicada ao museu, onde começo
por contar a sua história, analisando ao mesmo tempo a sua arquitetura ou organização, e
posterior transferência do Picadeiro Real para o atual Museu Nacional dos Coches. Na
segunda parte, explico como surgiu o projeto da aplicação dos beacons no museu – apoiado
em entrevistas feitas aos intervenientes – assim como as funcionalidades que lhes foram
concebidas.
Na terceira e última parte, farei a análise dos dados referentes às amostras
recolhidas, o número de downloads, género dos visitantes, preferência de login, percurso
feito por estes, e ainda saber quais foram as peças museológicas pelas quais eles
manifestaram maior agrado. Tudo com base na análise de dados que os beacons nos
conseguem fornecer e que, depois de analisados, em jeito reflexivo, tocarei nos pontos que
deveriam ser melhorados.
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1 – As Novas TIC’s nos Museus – uma panorâmica global e sugestão de exemplos
1.1 – Introdução sobre o uso das novas tecnologias no museu e sugestão de exemplos a aplicar
Se há coisa que nos rodeia todos os dias são as novas tecnologias, habituamo-nos a elas
de tal maneira que muitas entram na nossa vida de forma a que quase fiquemos dependentes
delas. Desde o simples gadget, que queremos utilizar durante o dia-a-dia, ao aparelho que
nos faz ter uma vida com uma saúde mais controlada, são imensos os exemplos das novas
tecnologias presentes nas nossas vidas, algumas já nem damos conta que lá estão, mas a
verdade é que estão e são diferenciadoras.
O mundo da tecnologia é um mundo muito vasto, a velocidade e a forma como evolui
poderá até chegar a ser assustadora (como a Inteligência Artificial), e aí poderia tocar em
variadíssimas questões que são bastante pertinentes e interessantes. Está à vista de todos
nós o poder que a inovação tecnológica tem. Ela será sempre diferenciadora na nossa
sociedade, agora cabe-nos a nós saber o quão diferenciadora pode ser e em que situações é
que nos é vantajosa ser.
“Every aspect of our lives will be transformed, in short, success in creating effective AI could be
the biggest event in the history of our civilization, or the worst. We just don’t know. So, we cannot
know if we will be infinitely helped by AI, or ignored by it and side-lined, or conceivably
destroyed by it.”5
Primeiramente, é necessário referir que se deduz de tecnologia toda aquela
ferramenta que leva o Homem a evoluir, a melhorar ou a simplificar processos. Desde o
fogo e da roda até à internet e aos beacons, tudo são tecnologias, todas elas foram e são
inovações no seu tempo, todas elas permitiram e permitem que o Homem fosse e vá
5 “Cada aspeto das nossas vidas será transformado, brevemente, na criação efetiva de um Inteligência Artificial (IA) que significará o maior evento da história da civilização, ou o pior. Simplesmente não sabemos. Desta forma, não podemos sabes se seremos infinitamente ajudados pela IA, ignorados por ela ou concebivelmente destruídos por ela” [Tradução livre]. Disponível em: https://www.evolving-science.com/intelligent-machines-artificial-intelligence/stephen-hawking-web-summit-will-artificial-intelligence-help-us-or-destroy-us-00472.
16
progredindo. É necessário também compreender que a tecnologia tem muitas ramificações,
é como uma árvore que vai desenvolvendo os seus galhos, umas antecedem as outras, umas
complementam-se e formam outra e assim sucessivamente. Ou seja, existem muitos tipos
de tecnologia, no entanto, vou começar pela questão que é sempre levantada e que a
confronta o Homem.
A questão de o Homem estar a ser substituído pela tecnologia é uma interrogação
que se coloca constantemente, e de forma pouca sustentada. É necessário compreender que
a tecnologia traz, há milhares de anos, invenções, inovações ou adaptações, que foram e
são essenciais para a evolução da sociedade e, em tempo algum, o Homem foi substituído
por ela. O Homem reinventou-se, sobretudo, através dela, contribuindo e muito para
evolução das suas capacidades. Se recuarmos até ao século XVIII, podemos ver como a
Revolução Industrial foi importante, não só para economia como consequentemente para
o Homem, e como as seguintes fases foram essenciais para sermos quem somos hoje.
Perceba-se que ela é parte essencial da nossa evolução enquanto ser humano.
É certo que vivemos numa era em que a inovação tecnológica se processa mais
rapidamente do que nunca, mas também é certo que isso será sempre assim, ou pelo menos
será essa a tendência, cabendo-nos a nós, enquanto agentes no mercado, saber o que
queremos e o que não queremos para as nossas vidas.
É inegável que o Homem, enquanto capitalista, já anulou muitos empregos com a
introdução de novas tecnologias, somos espectadores disso a toda a hora e nem nos
apercebemos. Por exemplo, basta-nos ir à bomba de gasolina, passar na portagem e ir ao
supermercado, para ver que em muitos deles a forma de pagar foi alterada, as pessoas a
quem pagávamos agora foram substituídas por sistemas de pagamento automático, assim
como também os robots que utilizamos em casa, desde aqueles que limpam a habitação até
aqueles que já fazem grande parte das nossas refeições, entre muitos outros exemplos.
A questão é – segundo estes exemplos – a tecnologia substitui alguém ou
complementou de melhor forma a vida do Homem? A tecnologia fez com que houvesse
uma dupla evolução (do sistema e do Homem)? Quantos empregos ‘morreram’ aqui? É
certo que as respostas em relação à realidade não podem ser assim tão leves, no entanto,
concordo que os postos de trabalho ‘morreram’, mas que o emprego pode não ter morrido.
Antes destas pessoas serem dispensadas, pode primeiro tentar fazer-se uma adaptação das
mesmas noutras funções laborais, de forma a não perderem o emprego, potenciando o
desenvolvimento de outras capacidades, atribuindo-lhes valor e dando-lhes formação para
tal, mas infelizmente a realidade muitas vezes não é assim. Aqui, a introdução da tecnologia
17
pelo empregador pode originar vários despedimentos e, se eles ocorreram de forma
massiva e direta, são catalogadas por tecnologias de substituição. Denomina-se de
substituição porque o empregador não quis ou não teve possibilidade de contornar esse
aspeto, uma vez que essas também podem ser tecnologias auxiliares.
Isto vai contra todas as normas e procedimentos que eu aqui defendo. A introdução
de novas tecnologias nos museus deve efetuar-se, mas de forma complementar e gradual.
Não me querendo estender muito mais, passo a exemplificar como o Homem
poderia ser substituído pela introdução de uma tecnologia (atualmente básica) – o áudio-
guia – no seu posto de trabalho, mas em que também pode não o ser, sustentando-me,
assim, no caso de Vila Viçosa, já referenciado na introdução. Existe, aqui, de forma notória,
uma necessidade urgente de inovação. Refiro-me apenas àquela que abordarei, a
tecnológica. A primeira reação esperada, ao ser introduzido o áudio-guia no museu, será a
de que os guias irão perder o emprego, argumentando, como eu já ouvi: “(..) eles só sabem
fazer isto, foi o que fizeram a vida inteira”. Isto está errado. Esses guias só perdem o
emprego se a entidade empregadora assim o entender. Pode achar que já não precisa mais
deles, pois foi o que eles fizeram durante 20 anos e agora com a introdução do áudio-guia já
não são necessários, e até reduzem a despesa anual do museu. No entanto, cabe ao
empregador apostar ou descobrir outras capacidades nos seus funcionários, oferecendo-
lhes as mais variadíssimas formações em diferentes áreas – desde a área da conservação e
do restauro à área do serviço educativo – de forma a que estes se tornem o mais polivalentes
possível dentro do museu6.
Após ter exemplificado, de forma sucinta e simples, a possível introdução de uma
nova tecnologia que à primeira vista é tida por ser uma tecnologia de substituição e que
pode não o ser, passo a dar o exemplo de um tipo de instrumento tecnológico que, para
além de complementar, é único, ou seja, o que ele oferece o Homem não pode oferecer nas
mesmas condições. Refiro-me às novas TIC’s.
Neste caso vou abordar duas evoluções das novas TIC’s, a realidade aumentada e a
realidade virtual, mas primeiro, para que se entenda o que é isto das novas TIC’s, e antes de
partir para exemplos onde estas tecnologias tiveram ou poderiam ter sucesso, é essencial
fazer uma pequena explicação sobre o que são e de onde advêm.
A expressão “tecnologia de informação e comunicação” começou a aparecer na
década de 80 por parte de alguns investigadores académicos. No entanto, só em 1997 é que
6 MESQUITA, Mariana Mendes - Um Projeto de Novas Tecnologias Aplicado na Casa-Museu Dr. Anastácio Gonçalves. Lisboa: Universidade de Lisboa, 2013, p. 14. Dissertação de mestrado.
18
se tornou popular após ter sido utilizada em forma de sigla ICT (Information and
Communications Technology) num relatório apresentado ao Governo do Reino Unido,
intitulado Information and Communications Technology in UK Schools: an independent
inquiry, redigido por Dennis Stevenson7.
Na verdade, acrescentou-se a palavra comunicação ao conceito já existente de
“tecnologia de informação” (TI), tecnologia esta que já existe há milhares de anos, desde
que o Homem começou a esculpir gravuras em pedra até aos dias de hoje. Tudo isso, pode-
se dizer, que faz parte da tecnologia de informação, termo este que foi evoluindo cada vez
mais, dando-se-lhe maior enfâse na década de 708. Contudo, e apesar dos conceitos serem
recentes, estes não tendem a diferenciar-se, explicando que TIC é uma prolongação de TI.
De forma mais explícita, a TI comporta os equipamentos para gerar informação, como as
redes, softwares, computadores, etc., que assim as armazenam, protegem e processam
através da parte da comunicação. Assim sendo, TIC só existe se houver TI, é preciso criar
informação para a poder comunicar, que neste caso pode ser através do que é criado nas
redes e para as redes, como o smartphone, os chats, o e-mail, etc.
É sabido que a educação é uma das áreas onde as TIC’s têm mais importância9, por
tudo o que envolvem, hoje em dia, os programas educacionais, seja pela possibilidade do
ensino à distância, como pelas múltiplas comunicações via imagem, vídeo, áudio, ou pelo
acesso a uma informação quase infinita, assim como a criação de ambientes virtuais e
interativos. Tudo isto pode proporcionar uma evolução bastante significativa, tornando-se,
assim, um recurso bastante potencializador no que toca ao ensino-aprendizagem. É
sobretudo nesta área que vou dar os exemplos seguintes, pois acho que o serviço educacional
de um museu pode ver nas novas TIC’s umas aliadas bastantes fiéis.
Como já referi anteriormente, o que vou abordar agora são duas novas tecnologias
que já foram aplicadas em vários museus por todo o mundo. São elas a realidade virtual e
a realidade aumentada. Ambas já são apostas de alguns espaços museológicos
portugueses, como por exemplo o Museu da RTP10, que fez questão de apostar em ambas,
7 STEVENSON, D. – Information and communications technology in UK Schools: an independent inquiry [Em linha]. London: Independent ICT in Schools Comission, 1997. [Consult. em 2018-04-11]. Disponível na Internet:
19
ou o Museu das Comunicações, que apostou apenas na realidade aumentada11. Podia
continuar a fornecer exemplos de museus, por todo o mundo12, que já adotaram estas novas
ferramentas, no entanto, vou explicar apenas como é que ambas funcionam.
Há quem confunda a realidade aumentada com a realidade virtual, por serem
bastante semelhantes e pertencerem ao mesmo tipo de tecnologia, contudo, têm alguns
aspetos que as diferenciam e que passo a explicar de forma sucinta. De modo a não entrar
em termos técnicos de informática, no que diz respeito à forma como os aparelhos
processam estas tecnologias, e simplificando, estas podem ser utilizadas através de óculos
próprios (que geralmente contêm um smartphone lá dentro), smartphones ou tablets.
A realidade virtual permite a total imersão do utilizador num ambiente 3D,
provocando uma experiência multissensorial e com interação em tempo real, pois ela está
numa interface tridimensional, podendo simular ações e movimentos. Já a realidade
aumentada traz elementos do mundo virtual para o mundo real13. Para se tornar mais
simples, vou exemplificar novamente com o Paço Ducal de Vila Viçosa e com o Museu
Nacional dos Coches. Por exemplo, com a realidade virtual presente no Museu Nacional
dos Coches, seria possível ter sempre o Landau do Regicídio no museu, inclusive por
exemplo conduzi-lo em pleno Terreiro do Paço e experienciar o assassinato do rei D.
Carlos e do seu filho e príncipe herdeiro, D. Luís Filipe de Bragança, que ocorreu no dia 1
de fevereiro de 1908. Mais, até poderia ser possível ligar os dois museus através desta
tecnologia, se o Landau estivesse em Vila Viçosa. A tecnologia podia estar presente em
Lisboa para os visitantes poderem experienciar toda a história envolvente e ir até mais
longe, como por exemplo, acompanhar a saída da família real do Paço Ducal de Vila Viçosa
em direção ao comboio e posterior chegada a Lisboa. Caso o landau estivesse em Lisboa,
os óculos de RV estariam em Vila Viçosa para a experiência se repetir.
Com a realidade aumentada a interação é outra, pois esta, ao contrário da realidade
virtual (que interage num mundo 3D), mergulha mesmo na realidade. Neste caso, o
visitante pode abdicar dos óculos e utilizar apenas o seu smartphone, no entanto, para
realidade-aumentada-na-rea-lidade-virtual/. 11 FPC - Museu das Comunicações tem a primeira sala de Realidade Aumentada do país [Em linha]. 2018 [Consult. em 2018-06-23]. Disponível em Internet:
20
utilizar a realidade aumentada necessita que o landau esteja à sua frente para que possa
existir interação. Por exemplo, a realidade aumentada pode colocar em tempo real, ou seja,
na sala onde o landau se encontra, a família real a entrar para o coche e serem eles próprios
a contar a história do regicídio, ao mesmo tempo que vão morrendo, com a interação dos
tiros de Manuel Buiça, do sangue ou do bouquet de flores da rainha, acabando assim com
Dona Amélia e D. Manuel II a terminar a história.
1.2 – Os beacons
1.2.1 – O que são e como funcionam
Os beacons são dispositivos de pequena dimensão que são colocados nos mais
variadíssimos materiais. Geralmente, têm uma película na parte traseira, o que nos permite
colá-los em qualquer tipo de objeto ou parede. São vistos como dispositivos que combatem
as limitações do GPS indoor, pois como o nome indica (beacon significa farol em
português), são autênticos faróis, ou seja, eles transmitem a informação que está
armazenada numa cloud, desde texto, imagem, som a vídeo. Para que se entenda, e por
agora de forma muito simples, é necessário saber que os beacons estão munidos de ID’s
únicos14 que são transmitidos em códigos. Por exemplo, a transmissão do código 1758204
comunicará imediatamente com os dispositivos conectados (smartphones, tablets,
smartwatches, etc.) que possuam BLE (Bluetooth Low Energy), mais conhecida por
Bluetooth 4.0, que apesar de ter sido oficialmente introduzida no mercado tecnológico no
ano de 2010, já vinha a ser desenvolvida pela Nokia desde 2006 com o nome Wibree,
acabando a tecnologia Bluetooth e BLE por se congregarem, tornando a ‘Bluetooth Low
Energy’15 a versão mais eficiente da energia Bluetooth, que como o nome indica é uma
energia de baixo consumo. No caso dos beacons, a BLE desenvolve um papel fundamental
no seu funcionamento, pois faz com que o aparelho consiga ter uma durabilidade muito
maior, alimentando-se com pequenas baterias de lítio que, comparativamente às pilhas AA,
14 Particularidade que abordarei de forma mais aprofundada no ponto 3, exemplificando com o modelo aplicado no MNC. 15 HUGHES, C. F. Bluetooth Low Energy for Use with MEM Sensors [Em linha]. Arizona: Arizona State University, 2015. Dissertação de mestrado. [Consult. em 2017-11-17]. Disponível em Internet:
21
são baterias que têm uma vitalidade e potência muito maior, podendo durar entre 2 a 5
anos, dependendo obviamente do uso e qualidade das mesmas. Porém, existem beacons
que se conseguem alimentar através de corrente elétrica com recurso a entrada de USB,
que apesar de terem uma durabilidade quase infinita, em que só dependem da existência de
energia de outro dispositivo com a mesma entrada, podem tornar-se bastante limitantes,
pois têm um poder de alcance muito menor em relação aos outros devido à sua composição.
No entanto, são interessantes para conexões via wi-fi ou HDMI.
Na verdade, a composição dos beacons é mais simples do que aparenta, e apesar da
forma como se alimentam poder ser diferente, a verdade é que todos eles são constituídos
por um rádio, CPU e baterias, sendo estas as componentes necessárias para se fabricar o
beacon mais simples. No entanto, com o avanço da tecnologia, os beacons vão possuindo
cada vez mais complementos, daí o interior deles ir diferindo mais frequentemente, uns
com acelerómetros, outros com sensores de temperatura, sensores de movimento, e alguns
mesmo com complementos únicos como os magnetómetros e os sensores de luz. É isto que
faz com que haja cada vez mais uma oferta diferenciada entre os fabricantes, na verdade, é
essa a concorrência deles, tornar o seu beacon cada vez mais dinâmico em relação a todos
os outros existentes no mercado.
Tipologias
Se a tecnologia beacon é uma coisa nova para nós, para as empresas que os
fabricam são uma ferramenta de ultrapassagem constante, pois como se sabe a tecnologia
é algo que nunca para de evoluir, surpreendendo-nos cada vez mais, dia após dia,
principalmente com algumas “armadilhas” que passo a explicar.
O beacon é sempre um beacon, quero dizer com isto que muitas das vezes essas
empresas acrescentam outro tipo de valências (como foi referido no parágrafo anterior) aos
dispositivos, que na verdade não são necessárias para o efeito, pois um beacon dos mais
simples que exista consegue, na maior parte das vezes, fazer o que qualquer outro faz.
Assim sendo, a promoção dos beacons é, como qualquer outro aparelho tecnológico,
decorrente do marketing que é feito. Neste âmbito, o maior exemplo disso são os nossos
smartphones ou computadores, que ano após ano nos são vendidos como um modelo muito
superior ao anterior, quando na verdade não são assim tão superiores, são mais questões de
detalhe e melhoramento do que propriamente de acrescento, e assim nos vão fazendo crer
que os nossos já estão desatualizados. Se neste ramo tecnológico as coisas ficam mais
22
transparentes em relação a isso, imagine-se com os beacons, que são dispositivos onde não
lhe podem ser acrescentadas muito mais valências do que aquelas que já têm, ao contrário
até mesmo dos smartphones que podem e têm algumas, como a qualidade da câmara,
processador ou ecrã.
Para que se entenda mais um pouco sobre o tema, vou tocar brevemente – e
aprofundar mais à frente – na questão de como os beacons nos são vendidos. Nas várias
tipologias desta tecnologia, os beacons que são mais comercializados pelas empresas são os
“Proximity Beacons” e os “Location Beacons”. Ressalvo que vou explicar como estes dois
tipos de beacons nos são vendidos e depois explicar como eles realmente funcionam.
Pois bem, os primeiros são-nos vendidos como dispositivos que só funcionam com
a aproximação do utilizador e podem atingir um raio até 70 metros, notificando sempre o
utilizador assim que este se aproxime de um dos aparelhos. Os últimos, os beacons de
localização, são aqueles que detetam a localização do utilizador num raio até 200 metros,
permitindo saber que percurso fez e onde permaneceu mais tempo. São estes que possuem
componentes únicas como os sensores de movimento, de luz, ambiente e de temperatura,
e também magnetómetro.
Na verdade, não existem diferenças quase nenhumas entre eles, no entanto fazem-
nos crer que para armazenarmos a informação do percurso do utilizador ou sabermos a
localização do mesmo, teremos que comprar os beacons de localização, que, por sua vez,
são mais caros do que aqueles que nos são vendidos como beacons de proximidade. Mas,
na verdade, tanto a notificação por proximidade como o percurso ou localização do
utilizador, são informações que nos são possíveis conceber com o beacon mais simples que
exista, basta que a composição deste seja aquela que referi anteriormente, ter baterias, CPU
e rádio. A forma como eles vão desempenhar esse tipo de funções parte de quem os
configura e os instala. Cabe a cada entidade que quer os seus beacons instalados saber o
que pretende com os mesmos, pois estes podem ser interessantes das duas formas, de forma
ativa e de forma passiva.
A ativa ocorre quando a comunicação desencadeia uma atividade no dispositivo do
utilizador, como por exemplo a receção de uma notificação informativa no seu smartphone
em relação ao Coche dos Oceanos. Por outro lado, a passiva consiste em apenas armazenar
os dados que o utilizador nos fornece aquando de uma conexão entre o seu smartphone e o
beacon. Por exemplo, permite-nos guardar a informação da passagem do utilizador pelo
Coche dos Oceanos no dia 18 de novembro de 2017. Este modo operativo é mais utilizado
para fazer estudos de público e marketing em lojas, no entanto, também o utilizarei aqui
23
para a obtenção de outro tipo de dados. No caso do marketing, ao ser armazenada aquela
informação que se pode tornar recorrente, conseguirá mais tarde saber-se as preferências do
utilizador, informando-o, de forma ativa, por notificação, sobre algumas particularidades,
por exemplo os produtos que estão em promoção. No caso dos estudos de público, é ótimo
para saber dados pessoais que o utilizador queira fornecer, assim como saber o percurso
que fez ou faz num determinado espaço.
A comunicação entre o beacon e o utilizador
Para que esta comunicação entre o beacon e o utilizador tenha o seu aproveitamento
máximo e seja totalmente eficaz, é essencial criar uma aplicação móvel por parte de quem
configura os beacons. No entanto, se a entidade que requer a tecnologia já possuir uma
aplicação própria, poderá ser feita uma reconfiguração da mesma, de modo a que a
tecnologia beacon possa ser integrada nesta e programada através de um servidor que é
composto pelo CMS e uma DB16. O CMS (Content Management System) é o local onde são
geridos os conteúdos, ou seja, uma plataforma web que controla e aciona tudo o que é
inserido nos beacons, toda a informação que é transmitida e recolhida pelos mesmos é
tratada nesta parte. Uma DB (database) é uma base dados onde se encontra toda a
informação armazenada e transmitida pelo beacon através da aplicação ao CMS. No
entanto, também existe uma alternativa – a Eddystone na vertente URL – criada pela
Google, que permite a interação dos beacons com o utilizador através de comunicação via
web, em que não é necessário a existência de uma aplicação, conceito que eu explicarei no
ponto seguinte de forma mais explicita.
Por questões de melhor aproveitamento e de privacidade, esta tecnologia designa-
se por ser uma “Opt-in Technology”, ou seja, é necessário haver uma aprovação do
utilizador para o usufruto da tecnologia em questão.
Após o utilizador descarregar e instalar a aplicação e lhe serem fornecidas as
condições, ou até mesmo lhe serem colocadas algumas questões em relação à experiência
que irá ter, este pode usufruir e navegar através da mesma sem qualquer problema que
condicione a sua privacidade, pois após essa experiência, tanto os beacons como a
aplicação não têm qualquer hipótese de localizar o utilizador. Estes servem única e
exclusivamente para aquele propósito naquele local.
16 PAIVA, Nuno Alexandre Lemos de - Desenvolvimento de uma APP Android e Plataforma Web para comunicação com Beacons. Coimbra: Universidade de Coimbra, 2016, p. 60. Dissertação de mestrado.
24
1.2.2 – A história dos beacons – como e onde surgiram
Para que se entenda o aparecimento dos beacons e a forma como eles se
implementaram no mercado, é necessário entender alguns conceitos – como NFC, RFID,
Ibeacon, beacon e Eddystone – que passo a explicar de forma evolutiva e contextualizada.
Este dispositivo surge com o intuito de dar resposta à tecnologia já existente NFC
(Near Field Communication), tecnologia que funciona via wireless17, através da qual se
desencadeia a aproximação de dois dispositivos, um Initiator e um Target (o 1º inicia a
comunicação e controla a troca de informações, o 2º responde às solicitações do 1º) e que
começou a ser desenvolvida pela Philips e pela Sony no ano de 2002. Porém, só dois anos
depois começou a ter relevância devido à criação do NFC Forum, onde participam
empresas como a Samsung, Apple, Nokia, Visa, PayPal, etc. Esta tecnologia assenta em
muito nas bases do RFID (Radio-Frequency Identifcation), que como o nome indica, trata-
se de uma tecnologia baseada na comunicação via radiofrequência, que no caso da NFC
comunica a partir da faixa de 13,56 MHz e consegue uma variação de velocidade na
transmissão de dados entre os 106, 212 e 424 Kb/s18, o que corresponde a uma comunicação
de aproximação muito mais curta que a do beacon. De forma mais explícita, enquanto que
esta consegue atingir um sinal a um máximo de 20 cm de distância, o beacon consegue
alcançar um sinal a várias dezenas de metros.
O nome beacon, associado a uma tecnologia, surgiu pela primeira vez pela Apple,
em 2013, com a apresentação do Ibeacon na Apple Worldwide Developers Conference. É
crucial que se entenda que foi a Apple a designar o nome do dispositivo com a criação do
Ibeacon, porque atualmente todos os aparelhos de hardware denominados de beacons são
fruto dessa designação. No entanto, apesar de ter desenvolvido tanto o aparelho (com bases
nas tecnologias já existentes NFC e RFID) como o protocolo de utilização, há quem ainda
pense que todos os aparelhos existentes no mercado estão associados à marca, pois esta
também não fez nada por desassociá-los, designando todos os beacons de Ibeacons, quando
na verdade a Apple atualmente nem fabrica esses aparelhos, apenas detém o protocolo da
sua utilização, o Ibeacon.
Todo este desenvolvimento criou uma confusão generalizada que ainda hoje
permanece, onde uma das questões que é colocada é a de que se os beacons que utilizam o
protocolo Ibeacon só podem ser utilizados por dispositivos equipados com o sistema
17 Wireless consiste na designação de uma rede sem fios. Possibilita a transmissão e conexão entre pontos distantes sem recorrer à utilização de fios. 18 O que é NFC (Near Field Communication)? [Em linha]. 2012. [Consult. em 2018-04-12]. Disponível em Internet:
25
operativo IOS, como por exemplo os Iphones. É preciso deixar bem claro que não, que
todos os dispositivos com os sistemas operativos IOS, Android e Windows podem
comunicar com os beacons desde que compactuem com o protocolo que utilizam.
É claro que isto foi agitando o mercado e quem não melhor que a Google, gigante
multinacional da área do serviço online e do software para entrar nele, que logo dois anos
depois da Ibeacon ser apresentada lança a Eddystone. A Eddystone surgiu, mais
concretamente, em julho de 2015, de forma OSS (Open Source Software) e com o intuito
de combater as limitações encontradas na tecnologia Ibeacon, com maior incisão para
aquela que causa mais barreiras, ou seja, o uso obrigatório de uma aplicação por parte do
utilizador. De forma a colmatá-la, desenvolveu o conceito Physical Web, que está mais
patente numa das três componentes que lançou, a URL19.
De forma sucinta e simples, vou explicar as três componentes que foram lançadas
pela Eddystone com o intuito de melhorar o protocolo já existente no mercado. A primeira,
designada por UID, que sem querer entrar em pormenores informáticos, consiste no
encurtamento do código identificador (UUID no protocolo Ibeacon), equiparando, mas de
uma forma ainda melhor, o sistema de comunicação do Ibeacon. No entanto, esta não
combate a principal limitação existente, pois também é necessário a instalação de uma
aplicação por parte do utilizador. De seguida, a TLM, serve única e exclusivamente o
proprietário dos beacons, pois auxilia apenas para informar o estado em que os beacons se
encontram, ou seja, há quanto tempo é que o beacon está ligado, o estado da sua bateria ou
até mesmo a temperatura do dispositivo, sendo que também não é possível fazer qualquer
alteração, pois não existe veículo condutor (uma aplicação) que envie a informação para
uma cloud. Porém, esta componente torna-se mais interessante caso exista uma aplicação
instalada pelo utilizador, pois quando este se aproximar de um beacon e lhe for emitido o
sinal TLM, este para além de ser informado sobre, por exemplo, a história do Coche de D.
Filipe II, é, ao mesmo tempo, de forma despercebida aos seus olhos, emitida uma
informação sobre o estado do dispositivo, podendo fazer-se a gestão do mesmo à distância,
assim como das outras informações referentes a este.
Por fim, o URL, aquela que visa combater a necessidade de haver uma aplicação
para o usufruto da experiência, no entanto, a experiência é bastante diferente por não se
suportar numa aplicação. Aqui o que acontece é algo semelhante ao uso dos QR-Codes, ou
19 PAIVA, Nuno Alexandre Lemos de - Desenvolvimento de uma APP Android e Plataforma Web para comunicação com Beacons. Coimbra: Universidade de Coimbra, 2016, pp. 40-42.
26
seja, o redireccionamento para uma página web, mas neste caso sem que exista ação por
parte do utilizador. Enquanto que este necessita de emparelhar o seu smartphone com o
QR-Code para que se desencadeie uma informação, com o beacon, num sistema de
Eddystone URL, isso deixa de ser necessário. O utilizador é automaticamente notificado
com uma informação que seja relevante para o mesmo, porém, para aceder à mesma é
sempre necessário ter acesso à internet, assim como o que acontece com os QR-Codes.
Não há dúvida que a Google teve uma grande iniciativa no combate às limitações
da Ibeacon, contudo, os fabricantes de beacons ainda não conseguiram dar uma resposta
totalmente eficiente a este tipo de operação. A única fabricante conhecida a nível mundial
que até agora conseguiu operar com a Eddystone, nas suas três componentes, foi a Estimote
(marca dos beacons que foram experimentados no teste piloto do Museu da Farmácia).
Como pioneira da tecnologia, a Apple foi a primeira a implementar os seus Ibeacons.
Dias após a apresentação na AWDC, os dispositivos já se encontravam nos EUA,
primeiramente nas suas lojas, expandindo-se meses depois e, já em 2014, até grandes
empresas da área do retalho, como a InMarket, ShopKick e até mesmo a McDonalds, tendo
sido um caso de grande sucesso em todos estes exemplos20.
Após o sucesso da Ibeacon nestas grandes empresas, a tecnologia foi-se expandindo
de forma exponencial, tendo-se focado inicialmente na área do retalho com o seu marketing
de aproximação. Como era de esperar, esta tecnologia teve um impacto tão significativo
que começou a ser implementada em todo o lado, desde centros comerciais a aeroportos, e
até mesmo em hospitais e estádios, tendo o seu grande ‘boom’ num dos eventos mais
famosos do mundo, aquele que é provavelmente o evento que gera a publicidade mais cara
do planeta: o SuperBowl.
Tendo em conta o sucesso obtido após toda esta exposição mediática, como era de
esperar, a tecnologia começou a ser implementada em vários países, como é o nosso caso.
Portugal foi um dos primeiros países a ter contacto com a tecnologia Ibeacon, sendo
justamente no Estádio da Luz que os primeiros passos foram dados. Em forma de
homenagem ao já falecido jogador do Sport Lisboa e Benfica, de seu nome Eusébio, foi
criada uma aplicação que fazia jus à sua contribuição para o clube e que, em jeito de
dedicatória, adotou o nome de “Eusébio Sempre”. Esta aplicação permitia aos adeptos
saberem um pouco mais sobre aquele que foi a sua grande referência durante tantos anos,
desde a sua biografia, a imagens, vídeos e até mesmo ao facto de poderem fazer
comentários em forma de homenagem.
20 Idem, Ibidem, p. 34
27
O objetivo do clube da Luz passava também por implementar a tecnologia por toda
a sua “casa”, inclusive no seu Museu Cosme Damião, museu que já ganhou vários prémios
e que, nesse mesmo ano, venceu – apesar de não ter procedido com a implementação da
tecnologia Ibeacon – o Prémio Museu Português 2014, atribuído pela APOM (Associação
Portuguesa de Museologia)21.
Até aqui, Portugal dizia mais uma vez ao mundo, e principalmente ao resto da
Europa, que estava longe de ser um dos países europeus mais atrasados no concerne à
inovação e implementação tecnológica. Porém, apesar de ter dado um passo bastante
importante em relação ao mundo tecnológico, não foi suficientemente grande para que lhe
fosse criado uma ponte sustentável. Esta ponte de que refiro é, claro, a ponte
comunicacional entre os portugueses e a tecnologia Ibeacon. Este é um exemplo entre
muitos em que as coisas realmente acontecem no nosso país, onde inovações das mais
variadíssimas áreas nos chegam, mas que no fim acabam por não ser aproveitadas, não
conseguido ter um peso significativo que as faça perdurar.
1.3 – Os beacons na museologia mundial
Se Portugal, em 2014, não conseguiu ver o futuro da comunicação e da informação
por proximidade na tecnologia Ibeacon, outros países europeus a par dos EUA rapidamente
conseguiram.
Do ‘boom’ na área do retalho à implementação dos beacons nos museus foi um salto
quase instantâneo. O primeiro museu a utilizar a tecnologia Ibeacon foi o Brooklyn
Museum, no início de 201422. Com um propósito bem inovador, o museu começou por
colocar através da sua aplicação ASK (que significa ‘pergunte’ em português) um género
de um especialista em arte sempre presente, que, no entanto, se encontrava a responder
através da aplicação às perguntas do visitante, com o objetivo de tornar a experiência deste
muito mais clara e interessante. Para além da visita se tornar muito mais dinâmica, o
visitante acaba a visita sentindo-se muito mais culto e interessado e, prova disso, foram os
resultados bastante positivos obtidos com esta experiência, sendo que “the average ‘depth
21 RODRIGUES, Bruno - Benfica implementa Apple iBeacon pela primeira vez em Portugal [Em linha]. 2014. [Consult. em 2017-11-17]. Disponível em Internet:
28
of conversation’ is 14 message exchanges between visitor and expert, and the percentage
of ‘power users’ (those who visit three or more galleries) is a robust 18%”23. Com isto, não
é só o utilizador que está a usufruir da experiência, pois existe aqui uma troca de
informação que se torna essencial para o museu. Ao mesmo tempo que este proporciona
uma experiência inovadora ao visitante, recolhe também dados que anteriormente não
recolheria – e se recolhia era através de questionários e métodos mais tradicionais, que
implicam outra logística e por vezes recursos humanos exteriores – como as dúvidas que
os visitantes têm ao longo da visita, as peças que mais lhe despertaram a atenção, o seu
percurso no museu e também a sua satisfação final.
Este foi o primeiro exemplo do funcionamento dos beacons num museu, um
exemplo de sucesso que rapidamente despoletou outros tantos exemplos. Um deles ainda
no mesmo ano e no mesmo país, com um objetivo ainda mais ousado e que viria a ser
marcante na utilização dos beacons no museu. Refiro-me ao Tech Museum of Innovation,
localizado no coração de Silicon Valley, mesmo no centro da cidade de San Jose, na
Califórnia. A implementação de Ibeacons por parte destes na sua exposição permanente
“Body Metrics: Exploring the Digital You” foi obviamente revolucionária. Se há local
onde as coisas podem tomar proporções gigantescas é em Silicon Valley, onde se
concentram alguns dos melhores empreendedores e investidores do mundo da tecnologia e
não só. Foi exatamente isso que aconteceu com a exposição “Body Metrics: Exploring the
Digital You”, cofinanciada por uma das maiores empresas mundiais da área da saúde, a
Kaiser Permanente, tinha como objetivo mostras às pessoas como elas podem melhorar o
seu bem-estar mental e físico através de modificações no seu comportamento.
Com o maior e o mais complexo investimento tecnológico de sempre (à volta de 3
milhões de dólares) até à data num museu de ciências, aliando a tecnologia Ibeacon a uma
‘biowearable tech’, – tecnologia que permite medir a frequência cardíaca, a tensão
muscular e as ondas cerebrais do visitante – esta exposição tinha tudo para marcar com o
seu cunho a história da museologia aliada à tecnologia, e foi isso que fez.
Para se iniciar a visita a esta exposição, o visitante tem de amarrar à volta do seu
corpo um kit de sensores, composto por três peças de hardware que medem, gravam e
mostram seis métricas corporais em tempo real: nível de atividade, tensão, foco mental,
capacidade de diálogo, atitude e o número de pessoas na sua proximidade. Para além disto,
o kit ainda inclui um fone de ouvido sem fio, que converte os sinais do cérebro do visitante
23 Idem, Ibidem. “A ‘profundidade de conversa’ média é de 14 trocas de mensagens entre o visitante e o especialista, e a percentagem de ‘utilizadores avançados’ (aqueles que visitam três ou mais galerias) são uns robustos 18%” [Tradução livre].
29
em informações digitais; um monitor de tensão muscular e de frequência cardíaca; um
microfone externo e um género de um iPod à volta do pescoço que grava o ambiente do
visitante através da sua câmara, portando também as componentes que vão comunicar com
os Ibeacons, como o acelerómetro, chip de identificação de radiofrequência e o sensor BLE.
Após o visitante realizar uma série de atividades relacionadas no âmbito da saúde
mental e física nesta exposição, ele é imediatamente aliciado a visitar o resto do museu, e é
aqui que as coisas se tornam ainda mais interessantes, pois o visitante continua equipado
com o kit da visita, o que permitirá saber como é que o corpo dele reagirá a certo tipo de
circunstâncias que irão acontecendo ao longo da sua estadia pelo museu, como por
exemplo, qual a exposição ou peça que lhe despertou mais interesse, onde esteve mais
desconcentrado, sobre qual o filme que mais o entusiasmou, ou até mesmo saber se
enquanto estava a construir um robot o seu ritmo cardíaco aumentara. No final da visita, o
visitante pode consultar, através de um ecrã táctil, quais os resultados do seu
comportamento físico e mental durante toda a visita.
“The more the data pool grows, the more we learn about ourselves.” Liu is confident that
wiring museums to mind data is the future, and also pretty cool: “We immortalize
ourselves in this big data exhibit. It’s an intriguing dance of human-machine
interaction.”24
No final desta experiência ficam todos a ganhar, o visitante porque teve uma
experiência única e especial, e o museu porque teve o prazer de fazer tão bem aquele que é
um dos seus principais papéis, o de servir o público, ao mesmo tempo que usufrui da
experiência do mesmo, recolhendo dados importantíssimos que contribuirão bastante para
o melhoramento do museu e das suas exposições.
Exemplos como estes, da tecnologia beacon associada à museologia, existem
muitos por todo o mundo, assim como posteriormente novas tecnologias associadas à
tecnologia beacon, que a vai tornando cada vez mais polivalente. Paradigma desse facto é o
que acontece no “Young Museum”, em São Francisco. De forma a tornar a experiência no
museu ainda mais interessante e interativa, a empresa de software GuidiGo juntou a
tecnologia beacon da empresa Kontakt à já famosa “Google Glass”. O objetivo por parte
24 Idem, Ibidem. “’Quanto mais cresce a pool de dados, maior é o conhecimento sobre nós próprios’. Liu está confiante de que conectar os museus aos dados da mente é o futuro e também bastante divertido: ‘Nós imortalizamo-nos nesta exibição de big data. É uma dança intrigante da interação entre homem-máquina’” [Tradução livre].
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do “Young Museum” ao oferecer o melhor das duas tecnologias na sua exposição Keith
Haring’s era torná-la cada vez mais interativa e menos intrusiva, sem que a aplicação
destas novas tecnologias interferisse na experiência do visitante25.
Para que se perceba, de forma muito sucinta, a “Google Glass” é uma tecnologia
desenvolvida pela Google, que consiste basicamente nuns óculos de realidade aumentada,
que possuem, para além da câmara, um conjunto de softwares que nos permite fazer todo
o tipo de comunicações e ser informado, tudo em tempo real, como num smartphone, mas
em formato de óculos, que vai sendo acionando pela voz ou pelo toque.
Muito sucintamente, o que o museu pretendeu com a conjugação destas duas
novas tecnologias foi afastar o smartphone das mãos dos visitantes, pois coloca os
beacons a comunicar através de BLE diretamente com o visitante e desta vez por
intermédio dos óculos, sem que este necessite de olhar para outro lado se não para a obra
exposta.
Casos como este último existem muitos, com outros hardwares e softwares a
serem interligados à tecnologia beacon. Porém, situações como estas são sempre muito
mais dispendiosas financeiramente, e há museus que não querem entrar por um caminho
tão luxuoso, apesar de terem capacidades para isso, como é o caso do Guggenheim
Museum em Nova Iorque.
No caso do Guggenheim Museum, o ‘luxo’ foi colocado de parte e deu-se
importância sim à necessidade de a experiência chegar a todos. Como, infelizmente, ainda
nem toda a população consegue ter um smartphone que lhe permita usufruir da
experiência, o museu disponibiliza tanto os fones, como o dispositivo já equipado com
todo o tipo de software, para que todos os visitantes possam usufruir. Apesar dos beacons
utilizados serem de marcas diferentes, neste caso, a empresa fornecedora é a Estimote. A
experiência no Guggenheim Museum é muito semelhante àquela que acontece no Museu
Nacional dos Coches – que abordarei mais à frente – onde o visitante tem ao seu dispor todo
o tipo de informação acerca das obras em vários idiomas tanto em forma de texto, como
em áudio, vídeo ou imagem.
Com isto, o serviço torna-se totalmente multifuncional, substituindo outros como o
áudio-guia, as folhas de sala, os mapas, e por aí fora. Neste caso, os museus conseguem
oferecer com uma só tecnologia todos os outros serviços que antes eram utilizados, sendo
que alguns até cobrados eram e, para além de oferecerem de uma melhor forma o que já
25 Beacon-Enabled Google Glass at Museums: “It’s Not Some Distant Future. It’s Already Happening,” [Em linha]. [Consult. em -2017-11-17] Disponível em Internet:
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tinham, ainda conseguem oferecer muito mais serviços, alguns deles indispensáveis para o
aproveitamento da experiência por parte dos visitantes.
Até agora, fiz apenas alusão só a exemplos da tecnologia beacon em museus norte-
americanos, mas a tecnologia está pelo mundo todo. Apenas achei estes exemplos muito
interessantes por serem bastante diferentes, tanto nas empresas que os forneceram como
na implementação e no objetivo da aplicação dos mesmos.
A Europa está cheia de exemplos que aderiram aos beacons por todo o lado e
muitos deles são museus, como o “Groninger Museum”, primeiro museu holandês a
utilizar os beacons, o “Rubens Art Museum” na Bélgica, o “National Slate Museum” no
País de Gales, o “Bristol Museum” em Inglaterra, o “Museo Nazionale della Scienza e
della Tecnologia Leonardo da Vinci” em Itália, o “Museo del Prado”, em Espanha, o
“Museum of Contemporany Art in Krakow”, na Polónia, e muitos mais por toda a Europa.
Para finalizar, e ao contrário dos exemplos anteriores, vou abordar muito
brevemente uma implementação muito simples dos beacons num museu islandês, mais
concretamente no “Eldheimar Museum”.
De forma a colocar o visitante totalmente inserido e focado na narrativa do espaço
museológico, a Locatify, empresa que trabalha em aplicações que estejam relacionadas com
os beacons, criou uma aplicação bastante simples, em que o seu funcionamento não ia
muito além do que guiar o visitante e mostrar-lhe o conteúdo que havia exposto em cada
parte do museu, onde o ia informando sempre que se aproximava de um beacon. Toda a
narrativa textual do museu encontrava-se reproduzida via áudio em vários idiomas, para
isso o museu disponibilizava o equipamento necessário a quem não o tinha na hora de
comprar bilhete. O objetivo de usar a proximidade para contar a história foi conseguido, e
o resultado superou totalmente as expetativas, pois conseguiu que cerca de 95% dos
visitantes tenha percebido a narrativa do “Eldheimar Museum” durante os 45 minutos de
visita26.
26 Proximity: It’s Addictive! – 95% of Eldheimar Museum’s Visitors Can’t Stop Using Its App [Em linha]. [Consult. em 2018-01-12] Disponível em Internet:
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2 – O Museu Nacional dos Coches 2.1 – História e caracterização
O Museu Nacional dos Coches encontrou-se sempre naquela zona de Belém, mas
nem sempre no edifício atual. É preciso ressalvar que passou por várias fases até ser o museu
que conhecemos hoje. Posto isto, vou abordar de forma sucinta o seu percurso, pois acho
bastante interessante explicar um pouco da sua história, desde o lugar onde se formou no
século XVIII até aos dias de hoje.
A “Quinta de Baixo”, nome usual pelo qual era conhecida a zona onde o museu se
veio a instalar anos mais tarde, foi comprada em 1726, pelo rei D. João V a D. João da
Silveira Telo e Meneses, 3º conde de Aveiras. Nela integravam-se algumas casas nobres,
o Palácio de Belém e um Picadeiro. É no local deste último que o museu se vem instalar
anos depois, não no mesmo edifício, pois este foi mandado destruir após quarenta anos da
sua aquisição, obra esta que teve a iniciativa do infante D. João, futuro rei D. João VI, filho
de D. Maria I e de D. Pedro III, grande apaixonado pela Arte Equestre.
Após a destruição do antigo picadeiro, foi chamado para desenhar o projeto para o
novo picadeiro, o tal que conhecemos hoje, o italiano Giacomo Azzolini, arquiteto este que
já tinha dado provas da sua competência aquando da destruição de espaços emblemáticos
provocados pelo terramoto de 1755. A obra iniciou-se bem assente no projeto do italiano,
que, apoiado no estilo neoclássico, ergueu um amplo salão com 50 metros de comprimento
e 17 metros de largura, completando-o com dois pisos magníficos, apresentado nos topos
do andar superior, tribunas ligadas por duas estreitas galerias com colunata, de forma a
permitir que a Família Real e a Corte pudessem assistir aos jogos equestres27. Porém, apesar
da estrutura do edifício estar pronta um ano após o seu início, a sua decoração interior e
exterior só terminou no século seguinte, no ano de 1828. Desde pintores, que para além de
outras intervenções, deram ao teto do picadeiro, em tela pintada, três grandes medalhões
ovais alusivos à arte equestre, a entalhadores que para além de outros trabalhos, conceberam
a belíssima balaustrada interior que envolve aquele salão, todos eles contribuíram nesse
período para a decoração de excelência do Picadeiro. Ainda assim, a obra foi resistindo
cada vez menos e é então que passados uns anos, já no início do século seguinte, que por
ordem do rei D. Carlos, são chamados a intervir nomes como Rosenda Carvalheira,
27 Missão [Em linha]. [Consult. em 2018-01-12]. Disponível em Internet:
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arquiteto dos Palácios Reais, e para o restauro das pinturas, os pintores José Malhoa e
António Conceição e Silva, tudo isto já com os olhos postos num futuro museu.
É neste curto período do início do século XX que o museu passa do desejo à obra,
sempre com a iniciativa incansável da rainha Dona Amélia, casada com o rei D. Carlos,
que, com algumas ‘batalhas’, o conseguiu convencer – poucos anos depois – a avançar com
o projeto que ela tanto queria.
Pensa-se que a rainha Dona Amélia tenha tido esta ideia aquando da visita à
Exposição Universal de Paris, onde pela primeira vez viu coches expostos como peças de
museu. Automaticamente terá pensado nos viajantes ilustres que iam para Jerusalém,
parando muitas vezes em Lisboa, altura que aproveitavam para irem bater à sua porta, com
o intuito de verem os coches velhos que a família real tinha deixado no picadeiro após a
partida para o Brasil.
A conjugar a tudo isto, não lhe fazia sentido ver o picadeiro transformado num
armazém de coches velhos. Foi então que conseguiu convencer o rei D. Carlos a mandar
restaurar tanto as viaturas como o edifício, com o intuito de trazer um conceito totalmente
novo, o primeiro museu de transportes do mundo.
Após todas estas intervenções terem sido concluídas com sucesso, tanto no espaço
como nas viaturas, o museu estava pronto para ser aberto ao público. Foram então
endereçados os convites para inauguração por parte da rainha Dona Amélia, que viu, no dia
23 de maio de 1905, a obra que tanto desejava ser inaugurada, chamando-lhe assim “Museu
dos Coches Reaes”.
Os louros pela ideia e pela obra iam lisonjeando a rainha ao mesmo tempo que eram
feitas críticas construtivas em relação ao espaço, pois este era realmente muito pequeno
para a quantidade de viaturas que se ia perspetivando colocar. A rainha Dona Amélia
rapidamente percebeu que isso era uma necessidade, e pressupõe-se que era do seu intuito
mandar construir o mais rápido possível um segundo salão. No entanto, o clima político
que se viveu nos anos seguintes leva a crer que essa urgência tenha passado para um futuro
um pouco longínquo. Refiro-me ao clima de alta tensão vivido nos dois anos subsequentes,
que culminaram com o assassinato do seu marido e do seu filho mais velho, D. Luís Filipe,
no dia 1 de fevereiro de 1908, golpe este que a rainha presenciou bem de perto, pois também
ia a bordo do landau (viatura onde ocorreu o crime) juntamente com o outro seu filho, D.
Manuel II, futuro e último rei de Portugal.
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Certamente muito abalada pelo sucedido e com o seu filho de tenra idade no
comando do país, ter-se-á desmembrado do museu, como é compreensível. Posto isto,
implanta-se a República, no dia 5 de outubro de 1910, e a rainha parte juntamente com o
seu filho D. Manuel II para Inglaterra e a Casa Real fica extinta, o que fez com que a coleção
de viaturas no museu aumentasse, pois com a Casa Real extinta, chegou, a par de um
conjunto de coches, também um conjunto de berlindas e, inclusive, viaturas provenientes
dos bens da igreja.
Se até aqui o museu já era pequeno para albergar tanta viatura, agora tornava-se
ainda mais pequeno com a chegada destas novas. Foi então que na década de 40 se construiu
um anexo na zona onde costumavam estar os cavalos, denominado por salão lateral, o tal
segundo salão já desejado pela rainha. Acontece que, mesmo com a criação deste salão, o
espaço continuava reduzido e, nesta altura, perspetivou-se a elaboração de um projeto para
ampliar o museu, que iria conceder, de forma simétrica, outro salão ao espaço. No entanto,
com o passar dos anos, nada avançou e mesmo quando estava prestes a avançar deu-se o 25
de abril de 1974, acabando por fin