Post on 16-Dec-2018
A TRAJETÓRIA POLÍTICA DE JEFFERSON CARDIM DE ALENCAR
OSÓRIO: BRASIL-URUGUAI (1960-1970)
Bruno Marinho Trindade
Mestrando do PPG em História/UFSM
brunomt10@gmail.com
Cristiane Medianeira Ávila Dias
Doutoranda do PPG em História/UFRGS
cristiane-historia@hotmail.com
RESUMO: O artigo tem como objetivo apontar algumas considerações sobre a
trajetória política do ex-coronel do Exército, Jefferson Cardim de Alencar Osório1, entre
os anos de 1960 e 1970. Os destaques foram a participação de Cardim na Campanha da
Legalidade (1961), na Guerrilha de Três Passos (1965) e sua prisão em Buenos Aires
(1970), numa ação conjunta entre os serviços secretos do Brasil e da Argentina. As
fontes utilizadas para compor essa trajetória foram documentos produzidos por órgãos
de segurança brasileiros e depoimentos. Com base nesses dados pretende-se utilizar
como referencial teórico os aportes do Terrorismo de Estado (TDE), vinculado a um
num processo mais amplo – o de implantação de ditaduras civis-militares de segurança
nacional nos países do Cone Sul, nas décadas de 1960 e 1970.
PALAVRAS – CHAVES: Jefferson Cardim; Ditadura Civil-Militar; Exílio;
Terrorismo de Estado.
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
O presente trabalho tem o objetivo de apresentar uma breve análise sobre as
ações políticas de Jefferson Cardim, principalmente na Campanha da Legalidade em
1961 e na Guerrilha de Três Passos – um movimento de oposição à ditadura civil-
militar de SN brasileira, estruturado no Uruguai e colocado em andamento no Brasil –
no ano de 1965. A participação do ex-coronel do Exército nesses eventos chamou a
atenção dos órgãos de segurança brasileiros, que passaram a vigiar as suas atividades
em território nacional e no exterior. Dessa forma, Cardim foi preso em duas ocasiões; a
primeira, no Paraná em 1965, depois que a Guerrilha de Três Passos foi desmantelada
1 No restante do artigo, o ex-coronel irá ser chamado de Jefferson Cardim.
2
pelas Forças Armadas, e a segunda, na Argentina em 1970, quando ele tentou atravessar
o país com o objetivo de alcançar o Chile, onde pretendia se exilar com a família.
A perseguição a Jefferson Cardim ocorreu porque a ditadura de SN brasileira,
baseada nas diretrizes teóricas da Doutrina de Segurança Nacional2 (DSN), entendia as
ações políticas do ex-coronel como subversivas e perigosas à manutenção da ordem e da
estabilidade política interna. Por supostamente atentar contra os valores “democráticos,
cristãos e ocidentais” da sociedade brasileira, Cardim foi enquadrado no conceito de
“inimigo interno”, agravado pelo fato dele ter pertencido ao Exército que, na visão das
Forças Armadas, o qualificava como um traidor da pátria.
Nessa perspectiva, para a DSN, o cidadão só se realizava como tal ao tomar
consciência do seu pertencimento à nação, uma comunidade coesa e harmônica, sem
conflitos sociais, capacitada a atender e satisfazer todas as duas demandas. O sujeito que
discordava publicamente dessa concepção, como Jefferson Cardim, passava a ser
considerado um “mau brasileiro”, propagador de “ideologias estranhas”, que precisava
ser combatido pelo aparato estatal. Essa repressão poderia ocorrer tanto em âmbito
interno como externo, pois o conceito de “fronteiras ideológicas”, gerado pela mesma
doutrina, salientava a necessidade do inimigo interno ser perseguido onde ele se
encontrasse. Por essa razão Cardim foi preso na Argentina e encaminhado de volta ao
Brasil, no final de 1970.
As fontes históricas utilizadas para compor esse artigo foram o depoimento de
Jefferson Lopetegui de Alencar Osório3, filho do ex-coronel, prestado aos consultores
da Comissão Nacional da Verdade4 (CNV), em 2013. Cabe destacar que a CNV foi
instaurada no Brasil no ano de 2012, com o objetivo de apurar as violações de direitos
humanos praticadas por agentes do Estado, entre os anos de 1946 e 1988. Em seu
relatório final, publicado no final de 2014, a comissão trouxe uma série de informações
2 “A Doutrina de Segurança Nacional (DSN) era uma espécie de “esqueleto teórico”, que baseava suas
prerrogativas na Guerra Fria e na existência de um conflito permanente entre dois mundos inimigos:
mundo comunista e bárbaro, representado pela União Soviética, em oposição ao mundo livre, ocidental e
capitalista, representado pelos Estados Unidos” (PADRÓS, 2005, p. 185). 3 No restante do artigo, o filho do ex-coronel será chamado de Jefferson Osório. 4 Comissão Nacional da Verdade (CNV). Disponível em: <http://www.cnv.gov.br/>. Acesso em: 03 mai.
2018.
3
a respeito da ação conjunta que reuniu agentes do serviço secreto brasileiro e argentino,
com o objetivo de efetuar a prisão de Jefferson Cardim no país vizinho5.
A outra fonte usada são documentos produzidos pelo Centro de Informações do
Exterior (CIEX). O acervo do CIEX tornou-se conhecido em 2007, quando o Correio
Braziliense publicou uma série de reportagens expondo detalhes sobre o órgão de
segurança, que seria formado por diplomatas de vários escalões, funcionando como uma
espécie de serviço de Inteligência do Itamaraty. Nesse sentido, o CIEX teria atuado
entre 1966 e 1985, período no qual reuniu um acervo com mais de 20 mil páginas de
documentos contendo detalhes sobre as atividades dos brasileiros em países da América
Latina, Europa, ex-União Soviética e África6.
2. AS FORÇAS ARMADAS BRASILEIRAS ANTES E APÓS O GOLPE CIVIL-
MILITAR DE 1964
Vale destacar que o início da década de 1960 foi um período particularmente
conturbado na história do Brasil e da América Latina, em razão dos desdobramentos da
Guerra Fria. Dessa forma, o governo dos Estados Unidos, temendo um alinhamento
político-ideológico dos países latino-americanos a União das Repúblicas Socialistas
Soviéticas (URSS), a exemplo do que ocorreu com Cuba após a Revolução de 1959,
passou a intervir com mais intensidade junto as Forças Armadas dessa região,
propagandeando, por intermédio da DSN, o perigo que o comunismo poderia
representar para a estabilidade de todo o continente.
O general Golbery do Couto e Silva, principal teórico da DSN no Brasil,
defendia que diante da nova tática utilizada pelo comunismo para a conquista do mundo
ocidental, – a “guerra limitada” ou “subversiva” –, o país devia se alinhar aos Estados
Unidos para combater o regime soviético. Para Golbery, nesse tipo de conflito a tarefa
da União Soviética consistia em incitar os descontentamentos sociais e a formação de
5 OSÓRIO, Jefferson Lopetegui de Alencar. Depoimento prestado a CNV em 16 de janeiro de 2013, no
Rio de Janeiro. 6 SEQUEIRA, Cláudio Dantas. O serviço secreto do Itamaraty. Correio Braziliense (DF). 22/07/2007.
Disponível em: <http://www.deunojornal.org.br/materia.php?mat=173506&pl=Jucelino>. Acesso em: 23
jun. de 2018.
4
movimentos de oposição nos países da América Latina que, mais tarde, desencadeariam
a guerra subversiva em seus territórios nacionais. Assim, na medida em que a miséria
aumentava na região, também aumentava o perigo insurrecional e a possibilidade de
instauração de “um governo favorável à ideologia comunista” (SILVA, 1981, p. 193).
O setor das Forças Armadas influenciado pela DSN estava concentrado
principalmente na Escola Superior de Guerra (ESG), criada em 1949 com o apoio do
governo dos Estados Unidos. Tal aproximação ocorreu durante a Segunda Guerra
Mundial (1939-1945), quando oficiais brasileiros alinharam-se ideologicamente aos
estadunidenses, encantado com a máquina de guerra estruturada por aquele país. Os
oficiais formados nessa escola integravam os grupos que, reunidos no Instituto de
Pesquisas e Estudos Sociais (IPES) e no Instituto Brasileiro de Ação Democrática
(IBAD), se organizaram para derrubar o presidente João Goulart com o golpe civil-
militar, no início de 1964 (COMBLIN, 1978).
Deve-se destacar que a DSN foi crucial para se entender as motivações que
levaram alguns ex-militares, entre os quais Jefferson Cardim, a serem perseguidos pelas
Forças Armadas após o golpe 1964 e a instauração da ditadura no Brasil. Isto porque,
apesar de ser preponderante dentro das Forças Armadas, a DSN não contava com uma
total adesão dentro dos quartéis que desde meados da década de 1940, especialmente
sobre os militares subalternos7 e, em menor grau, sobre os oficiais8, sofriam a influência
da corrente nacionalista. Um de seus adeptos, o ex-tenente do Exército José Wilson da
Silva, relata em seu livro de memórias intitulado O tenente vermelho, a presença das
ideias nacionalistas entre os militares brasileiros:
O Movimento Nacionalista passou a defender os minérios estratégicos e
todas as riquezas do subsolo como propriedades da Nação e não susceptíveis
de ser explorado por empresas estrangeiras. [...]. O oficial ou sargento que se
posicionasse defendendo as teses nacionalistas era afastado de comandos,
transferido para unidades longínquas, criando dificuldades para sua carreira
(DA SILVA, 2011, p. 205).
7 Deste grupo fazem parte os militares graduados ou praças, o que corresponde a soldados, marinheiros,
cabos, sargentos e subtenentes. 8 Deste grupo fazem parte os militares com os postos de tenentes, capitães, coronéis, almirantes, generais
e marechais. O coronel Cardim fazia parte deste grupo minoritário de oficiais nacionalistas.
5
Não se deve desconsiderar também a penetração que o Partido Comunista
Brasileiro (PCB) e a chamada esquerda pecebista teve, mesmo que em menor escala do
que o nacionalismo, dentro das Forças Armadas. No começo da década de 1960, esse
partido defendia durante essa fase, o desencadeamento de uma revolução dividida em
duas etapas, da qual a primeira correspondia a uma fase democrático-burguesa, e a
segunda, a implantação definitiva do socialismo. Esse posicionamento aproximou o
PCB da esquerda trabalhista, representada pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB).
Observa-se que Jefferson Cardim manteve ligações políticas com o PCB, apesar de não
ter se filiado oficialmente ao partido.
Nesse período, o Brasil sofria os efeitos de uma grave crise econômica que
afetou a conjuntura política nacional, provocando a renúncia de Jânio Quadros ao cargo
de presidente da República, em 1961. Diante desse quadro, um grupo de militares se
uniu na tentativa impedir a posse do vice-presidente João Goulart, que naquele
momento realizava uma viagem oficial a China, enquanto outro, constituído
principalmente de militares do III Exército, sediado no Rio Grande do Sul, se contrapôs
a esses setores, aderindo a um movimento radiofônico organizado pelo ex-governador
Leonel Brizola, com o objetivo de garantir a posse de Jango.
A Campanha da Legalidade, como ficou conhecida essa mobilização, garantiu a
posse de João Goulart na presidência, ao mesmo tempo em que projetou a figura de
Leonel Brizola no cenário político nacional. Assim, Brizola se tornou a principal
liderança política da chamada esquerda nacionalista, que possuía propostas mais
avançadas em relação à realidade brasileira do que aquelas defendidas pela esquerda
pecebista e trabalhista. Por essa razão, enquanto o PTB e o PCB defendiam o projeto
das Reformas de Base, que previam ajustes no sistema educacional, financeiro, agrário e
estudantil brasileiro, os nacionalistas adotavam posições anti-imperialistas defendendo,
por exemplo, a nacionalização de vários recursos existentes no Brasil.
O movimento também tornou mais visível, as divergências ideológicas
existentes dentro das Forças Armadas. Nesse sentido, parte dos militares, alinhados as
ideias da esquerda – pecebista, petebista ou nacionalista – defenderam a posse de João
Goulart, como determinava a Constituição brasileira. Tal grupo era constituído
6
majoritariamente por militares que integravam os setores subalternos das Forças
Armadas, em sua maioria sargentos e por um número reduzido de oficiais, entre os
quais se encontrava o então coronel do Exército, Jefferson Cardim. Para José Wilson da
Silva, “em esmagadora maioria os sargentos e uns poucos oficiais ficaram com os
dispositivos constitucionais, enquanto um forte contingente de oficiais tentou jogar suas
tropas para o lado dos ministros golpistas. Os oficiais nacionalistas e democratas
ficaram ao lado da constitucionalidade” (2011, p. 33).
Diante dessa divisão interna, vários militares que participaram da Campanha da
Legalidade foram acusados de quebrar a hierarquia e a disciplina interna das Forças
Armadas brasileiras. Por essa razão, esses militares passaram a ser perseguidos, presos
e, posteriormente, transferidos para unidades militares existentes em outras regiões do
Brasil. Essas punições começaram durante o movimento e se estenderam após a posse
de João Goulart. Entre os militares punidos se encontrava Jefferson Cardim, detido em
1961, acusado de participar desse evento.
A partir dessa fase, os setores das Forças Armadas alinhados ideologicamente
com a DSN, passaram a arquitetar o golpe que resultou na deposição de João Goulart,
em 1964. Após a instauração da ditadura civil-militar de SN, os militares utilizaram as
premissas dessa doutrina para criar leis que permitiam atuar de forma clandestina no
sentido de perseguir e punir com violência os setores de oposição, que em muitos casos
não estavam vinculados a partidos ou organizações de esquerda. Nesse sentido, todas
aquelas pessoas que não concordavam de alguma maneira com a ditadura i eram
consideradas, de forma genérica como, “subversivas” ou “comunistas”. Sobre isso,
acrescenta-se que:
A identificação de um “inimigo interno” que visava desestabilizar as relações
do seu país com os EUA, produzindo mudanças, ratificou a necessidade de
sua eliminação, enquanto foco de tensão. Tal situação implicou em introjetar,
nos marcos nacionais, a realidade conflitiva da Guerra Fria. A defesa dos
interesses estadunidenses na América Latina – sua zona de influência abalada
desde 1959 – levou a superpotência capitalista a considerar a política interna
de cada país da região como extensão da sua política externa, ou seja, os
assuntos de segurança interna desses países passaram a ser entendidos como
sendo da sua segurança. Sendo assim, apoiando-se nos setores confiáveis da
classe dominante, os EUA estimularam a adoção da ideia de que havia uma
“guerra interna” a ser enfrentada (PADRÓS, 2005, p. 55).
7
Na fase pós-golpe, os militares identificados com as ideias de esquerda foram
presos, expulsos ou desertaram das Forças Armadas. Vários desses militares,
juntamente com o presidente deposto, João Goulart e o ex-governador do Rio Grande
do Sul, Leonel Brizola, ao lado de outras lideranças políticas e sindicais, se exilaram no
Uruguai. Esse foi o caso também de Jefferson Cardim que, na época, já residia em
Montevidéu, em função dos serviços que prestava ao governo Jango, como diretor-
técnico do Lloyd Brasileiro9. Após o fracasso dos planos para uma resistência imediata
ao golpe, Brizola se uniu a outras lideranças políticas, sindicais e militares, que também
se encontravam exiladas em território uruguaio, para articular um novo movimento de
oposição à ditadura no Brasil. O desenvolvimento desse projeto, porém, gerou
divergências nesse grupo de exilados, conforme relatou José Wilson da Silva:
Paulo Schiling, coronel Jefferson, até nosso amigo coronel Alvarez não se
conformavam em não saber o que estávamos fazendo àquela altura. Ficaram
fora desse núcleo valorosos e decididos amigos que ao longo do tempo
passaram a duvidar do que procurávamos fazer, mas havia uma realidade: se
fôssemos contar a cada um tudo que planejávamos, então era melhor fazer
comício, com a quebra total da reserva dos assuntos. Então estaríamos
entregando companheiros que se encontravam debaixo do tacão da ditadura
para serem presos e torturados (DA SILVA, 2011, p. 138).
O afastamento do ex-coronel Jefferson Cardim do grupo de Leonel Brizola, no
que se refere aos novos planos de luta contra a ditadura brasileira, articulados no
Uruguai, é ainda um ponto controverso. A dúvida recai quanto ao apoio dado pelo ex-
governador a tais ações. De acordo com José Wilson da Silva (2011), as movimentações
do grupo de Cardim teriam ocorrido de forma independente, devido ao crescente
descontentamento do ex-coronel com Brizola. Por essa razão, o dinheiro que financiou o
grupo de Cardim teria vindo de outras lideranças políticas, entre as quais, João Goulart.
O depoimento de Paulo Schilling10, presente no livro do jornalista José da Costa, sobre
a Guerrilha do Caparaó11, corrobora com os argumentos do ex-tenente, quando diz que:
9 Esta era uma companhia estatal brasileira de navegação. 10 Foi um dos líderes ligados a Brizola durante o exílio no Uruguai e participou das articulações para
ações armadas no Brasil durante a ditadura. Nos anos anteriores ao golpe civil-militar, chefiou a
assessoria agrária do governo de Brizola, quando este era governador do Rio Grande do Sul. 11 Campo de treinamento montado na serra do Caparaó, entre os anos de 1966 e 1967, na divisa entre os
estados de Minas Gerais e Espírito Santo, da qual foi montada pelo Movimento Nacionalista
Revolucionário (MNR). Esta organização foi criada no Uruguai, por Brizola e outras lideranças políticas
e militares exiladas no país, após o fracasso das tentativas de levante com o golpe de 1964.
8
Foi essa gente que fez aquela loucura [...]. Pegaram um caminhão, encheram
de gente e resolveram fazer a revolução [...]. O Jefferson ficou com ódio total
de nós e resolveu se vingar. Foi logo preso e disse, em seu depoimento, que
eu, o Brizola e o Dagoberto é que o havíamos mandado fazer aquilo. Fomos
julgados à revelia, eu peguei minha maior pena: condenados a nove anos de
prisão, eu, o Brizola e o Dagoberto (COSTA, 2007, p. 311).
No diário de Jefferson Cardim, em meio às suas anotações sobre a travessia que
fez na fronteira do Uruguai em direção ao Brasil fica subentendido que Brizola teria
participado da elaboração das ações armadas organizadas por seu grupo12. Tal
movimento, liderado por Cardim e o ex-sargento da Brigada Militar, Alberi Vieira dos
Santos, ficou conhecido como a Guerrilha de Três Passos ou Guerrilha do Alto Uruguai,
devido ao fato de ter partido das cidades de Três Passos e de Tenente Portela, situadas
no interior do Rio Grande do Sul. Sob o comando do ex-coronel, o grupo armado de
vinte e três pessoas, entre civis e ex-militares (estes também vindos do Uruguai), partiu
em direção ao estado do Mato Grosso, onde, de acordo com Maciel, planejavam “tomar
a Base Aérea de Campo Grande para se juntar às forças sob o comando do ex-coronel
da Aeronáutica, Emanuel Nicoll, e acreditava que ainda haveria adesões ao longo do
percurso” (2013, p. 79).
O grupo guerrilheiro, no entanto foi surpreendido pelas tropas do Exército no
estado do Paraná, próximo ao município de Capitão Leônidas Marques e acabou
desarticulado, com a prisão de vários integrantes, entre os quais os líderes da Guerrilha
de Três Passos, Jefferson Cardim e Alberi Vieira dos Santos. Na prisão, Cardim, sofreu
uma série de torturas físicas e psicológicas. Posteriormente, o ex-coronel foi condenado
pelo Superior Tribunal Militar (STM) a dez anos de prisão e permaneceu, segundo o seu
filho, Jefferson Osório, “incomunicável durante muitos anos13”.
No ano de 1968, Jefferson Cardim, que se encontrava preso em Curitiba, no 5º
Regimento de Obuses (5º RO), estabeleceu contato com um militar da ativa que se
posicionava contra a ditadura. Conforme Jefferson Osório, na época com 15 anos de
idade, ao entrar em contato com seu pai, foi informado que o mesmo “estava tendo um
12 Diário do Coronel Jefferson Cardin. Documentos Revelados. Disponível em:
<https://www.documentosrevelados.com.br/repressao/finalmente-revelado-o-diario-do-coronel-jefferson-
cardin-lider-da-guerrilha-dos-dentes-de-ouro/> Acesso em: 15 jun. 2018. 13 OSÓRIO, Jefferson Lopetegui de Alencar. Depoimento prestado a CNV em 16 de janeiro de 2013, no
Rio de Janeiro.
9
relacionamento muito bom com um cabo desse quartel, chamado Victor e que esse cabo
tinha tendências socialistas e que estava querendo ajudá-lo”14. Com o apoio desse cabo,
de seu filho e do ex-major do Exército, Joaquim Pires Cerveira, Cardim conseguiu
articular um plano e fugir da prisão.
Após a fuga, Jefferson Cardim e o filho foram para o Rio de Janeiro. Em
seguida, o ex-coronel procurou a embaixada do México e solicitou asilo político. Sua
solicitação foi atendida e Cardim partiu para o exílio em território mexicano, ficando
afastado da família até retornar ao Uruguai, em 1970. Observa-se que a esposa do ex-
coronel era uruguaia e os seus filhos possuíam dupla cidadania, fato que auxiliou o
estabelecimento da família no país vizinho. O exílio, porém, não evitou que os órgãos
de segurança brasileiros vigiassem as atividades de Cardim e de seus familiares, fato
que resultou na sua prisão, no final desse ano, durante a travessia pela Argentina.
3. A PRISÃO DE JEFFERSON CARDIM NA ARGENTINA
No final de 1968, quando Jefferson Cardim já se encontrava exilado no México,
a ditadura de SN brasileira decretou o Ato Institucional n.º 5, AI-5. Para Alves (2005), o
processo de institucionalização da repressão estatal que teve início após o golpe e a
criação do Serviço Nacional de Informações (SNI), em 1964, atingiu o ápice com esse
ato, ao permitir a abolição do habeas corpus para crimes políticos. Tal medida forneceu
o respaldo que os órgãos de segurança necessitavam para agir deliberadamente contra
cidadãos supostamente vinculados a ações de caráter “subversivo”, atingindo
organizações de esquerda, adeptas ou não da luta armada, como também parte da
população não envolvida diretamente em atividades políticas.
Padrós (2005) enfatiza que o AI-5 permitiu a instauração do Terrorismo de
Estado (TDE) no Brasil, ao conceder os subsídios institucionais que os órgãos de
segurança precisavam para fazer uso da violência indiscriminada, com o objetivo de
acabar com as ações de todos os sujeitos que se enquadravam no conceito de inimigo
14 OSÓRIO, Jefferson Lopetegui de Alencar. Depoimento prestado a CNV em 16 de janeiro de 2013, no
Rio de Janeiro.
10
interno. Nesse sentido, em 1969, a ditadura funda a Operação Bandeirante (OBAN), em
São Paulo, integrando as operações da polícia e das Forças Armadas, que passam a
monitorar, perseguir, prender, torturar, assassinar e desaparecer, um número cada vez
mais elevado de opositores políticos.
Os efeitos da aplicação sistemática de violência estatal não tardaram a aparecer,
pois um ano após a criação da OBAN, a maioria das organizações de luta armada se
encontrava praticamente desestruturadas no Brasil, com a maior parte de seus
integrantes sendo torturados em prisões espalhadas pelo país. Os militantes que
conseguiram deixar a prisão e os que temiam se tornarem as próximas vitimas do
aparato repressivo estatal, resolveram deixar o país e seguir em direção ao exílio.
O Uruguai, porém, não era mais o território seguro e livre que os brasileiros
encontraram na fase posterior a decretação do golpe civil-militar de 1964 no Brasil. O
país que havia servido de pano de fundo para a montagem da Guerrilha de Três Passos,
a partir da chegada de Pacheco Areco a presidência, em 1967, se aproximou da ditadura
brasileira e passou a compartilhar com seus órgãos de repressão, informações sobre a
comunidade de exilados residentes no país. Posteriormente, vários brasileiros se
tornaram vítimas de operações repressivas, estruturadas em conjunto pelos serviços
secretos dos dois países.
Diante desse panorama, a maior parte dos brasileiros optou por se exilar no
Chile que, diferentemente do Uruguai, vivia um clima de abertura política, com a vitória
do candidato socialista, Salvador Allende, para a presidência nas eleições de 1970. O
programa da Unidade Popular15 (UP), coalização de partidos e organizações de esquerda
que dava sustentação ao governo Allende, previa a transformação do sistema capitalista
sem romper os limites institucionais vigentes no país. Tal projeto, inédito a nível
mundial, atraiu a atenção de militantes de esquerda, não apenas brasileiros, como latino-
americanos, que foram para o país interessados em acompanhar, apoiar ou mesmo
integrar, a experiência chilena de implantação do socialismo.
15 PROGRAMA DE LA UNIDAD POPULAR, 1969. Disponível em:
<http://www.archivochile.com/entrada.html>. Acesso em: 05 jul. 2012.
11
Entre esses ativistas encontrava-se Jefferson Cardim que, após deixar o México
em 1969 e realizar uma série de viagens a países da América Latina, Europa e África,
resolveu se exilar no Chile com a família, no final de 1970. O objetivo do ex-coronel era
estabelecer contato com a comunidade de brasileiros, que a cada dia, aumentava no país.
Além disso, em seu depoimento a CNV, Jefferson Osório salientou que Cardim tomou
essa decisão depois que Salvador Allende lhe ofereceu o cargo de assessor da
presidência em assuntos que envolviam questões militares e fronteiriças com os demais
países do Cone Sul16.
No momento em que realizava a travessia para o Chile, no entanto, Jefferson
Cardim foi preso juntamente com o filho e o sobrinho em Buenos Aires, numa operação
que reuniu órgãos de segurança brasileiros e argentinos. Uma série de documentos,
localizados no arquivo do CIEX em Brasília, evidenciam que as atividades do ex-
coronel do Exército, nas ocasiões em que ele realizou viagens para o Uruguai ou a
Argentina, estavam sendo monitoradas desde o início de 1970:
1.JEFFERSON CARDIM DE ALENCAR OSÓRIO estaria atualmente
tentando estruturar no Uruguai movimento com a colaboração do deputado
comunista (castrista) uruguaio ARIELL COLLAZO e buscando contatos com
a organização terrorista “TUPAMAROS”, através do cidadão uruguaio
RUBEM MONTES DE OCA, proprietário de uma editora em Montevidéu de
nome “SANDINO”. 2. JEFFERSON já teria se entrevistado com COLLAZO
por duas vezes, havendo o deputado uruguaio financiado viagem efetuada por
JEFFERSON ao Chile. 3. Em 21/JAN/70, o filho mais velho de JEFFERSON
teria viajado da ROU para o Brasil, em ônibus da companhia “EVES”. 4.
Durante a estada em Buenos Aires, JEFFERSON teria comparecido à
Embaixada da Argélia naquela capital, solicitando prorrogação do passaporte
argelino de que é portador17.
Partindo de uma das premissas do TDE, que prevê a irradiação da violência para
além do inimigo interno, atingindo também as pessoas de seu entorno social, como
amigos, familiares e colegas de trabalho, o aparato repressivo estatal brasileiro
monitorou também as atividades da família de Jefferson Cardim no exterior. Nesse
sentido, um informe produzido pelo CIEX em abril de 1970, fornecia dados a respeito
da viagem realizada pela esposa e o filho do ex-coronel ao Uruguai: “1. Em fevereiro de
16 OSÓRIO, Jefferson Lopetegui de Alencar. Depoimento prestado à Comissão Nacional da Verdade
(CNV), no dia 16 de janeiro de 2013, no Rio de Janeiro. 17 Arquivo Nacional Brasília DF/Acervo dos Órgãos de Informações do Regime Militar/Centro de
Informações do Exterior (CIEX)/BR AN, BSB IE.05.2, p. 26/42. Asilados brasileiros no Uruguai.
Jefferson Cardim de Alencar Osório. Ligações com “Tupamaros”. 05 de fevereiro de 1970.
12
1970, viajaram a Montevidéu, no Uruguai, com destino a Porto Alegre, no RS, em
ônibus da “Cia Eves”, JEFFERSON LOPETEGUI DE ALENCAR OSÓRIO e
CORINA CARDIM DE ALENCAR OSÓRIO, filhos do ex-coronel brasileiro,
JEFFERSON DE ALENCAR OSÓRIO”18.
Um dos responsáveis pelo repasse dessas informações ao CIEX era Alberto
Conrado, filho de um ex-diplomata brasileiro, que atuaria como agente infiltrado desse
órgão de segurança junto à comunidade de brasileiros exilados no Uruguai e,
posteriormente, no Chile. Entre outras atribuições, Conrado teria recebido a missão de
vigiar as atividades de Jefferson Cardim e de sua família, em outros países. A
proximidade entre o agente e o ex-coronel, foi confirmada no depoimento de Jefferson
Osório a CNV, onde ele relatou o seguinte:
Então fomos ao Chile, papai se encontrou com o Dr. Almino Afonso, com
várias pessoas lá, depois voltamos para Montevidéu com o Alberto, ai não
saia de casa e ai o papai já havia sido convidado pelo presidente Salvador
Allende para trabalhar junto com ele, assessorar ele em assuntos militares,
países do Conesul e de fronteiras e isso ai que assustou e isso ai que assustou
o governo brasileiro e o Alberto [Conrado] deve ter dado essa informação
para o Exército [...]. [Alberto Conrado] era próximo de várias casas, de vários
exilados, ele tomava chá com todo mundo19.
Dessa forma, o jornalista uruguaio Alberto Conrado, utilizando os pseudônimos
de “Altair”, “Zuleica”, “Johnson” e “Carlos Silveira”, atuaria com um dos agentes do
CIEX infiltrado entre os brasileiros e suas respectivas organizações de esquerda, em
envolvidas em ações políticas no Uruguai e no Chile20. Um relatório de oitocentas e
doze páginas21, produzidos por esse órgão de segurança, demonstra que Conrado
monitorou as atividades de vários brasileiros exilados, além de ter trocado informações
com agentes de outros serviços secretos em atividade nos países do Cone Sul.
Tal relatório demonstra que Alberto Conrado teve envolvimento direto com a
prisão de Jefferson Cardim na Argentina, enviando informações a agentes locados em
18 Arquivo Nacional Brasília DF/Acervo dos Órgãos de Informações do Regime Militar/Centro de
Informações do Exterior (CIEX)/BR AN, BSB IE.05.3, p.06/82. Uruguai. Familiares de JEFFERSON
OSORIO viajam ao Brasil. 15 de abril de 1970. 19 OSÓRIO, Jefferson Lopetegui de Alencar. Depoimento prestado à Comissão Nacional da Verdade
(CNV), no dia 16 de janeiro de 2013, no Rio de Janeiro. 20 Comissão Nacional da Verdade (CNV). Disponível em: <http://www.cnv.gov.br/>. Acesso em: 03 mai.
2018. 21 Arquivo Nacional-Brasília-DF/ Acervo dos Órgãos de Informações do Regime Militar/Centro de
Informações do Exterior (CIEX)/ BR AN, BSB IE.25.1. Alberto Octavio Conrado Avegno. 812 páginas.
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Buenos Aires sobre o carro do ex-coronel, as pessoas que o acompanhavam na
travessia, entre outras. Após a prisão, Conrado relata os dados que os policiais
argentinos teriam obtido durante os interrogatórios do sobrinho, do filho e do próprio
Cardim, em suas dependências, bem como o retorno desse grupo ao Brasil,
acompanhados de agentes do aparato repressivo estatal brasileiro. Ao final, Conrado
alerta para o fato de que essa prisão pode gerar suspeitas na comunidade de brasileiros
residentes no Uruguai, pois o agente foi a última pessoa a estabelecer contato com o ex-
coronel, antes dele e seus familiares deixarem o Uruguai22. O filho do ex-coronel
confirma a montagem de uma operação para prendê-los durante o desembarque na
Argentina.23
Nesse contexto, a prisão de Jefferson Cardim e de seus familiares na Argentina,
não foi uma operação aleatória, pois suas atividades no exterior foram sistematicamente
monitoradas por agentes do CIEX. Uma das razões que motivou tal vigilância foi o fato
dele ter sido um integrante das Forças Armadas que, no decorrer de sua carreira, se
afastou dessa instituição para liderar uma ação de guerrilha contra um governo, que na
interpretação da maior parte dos militares brasileiros, havia salvado o país da influência
comunista. Assim, Cardim não era apenas mais um subversivo, mas um inimigo
perigoso, com treinamento militar que o capacitou a participar da estruturação de um
movimento de oposição à ditadura como a Guerrilha de Três Passos.
De acordo com Padrós (2005), a ênfase na manutenção da disciplina e da
hierarquia institucional foram compromissos que se fizeram presentes não apenas nas
Forças Armadas do Brasil, como dos demais países do Cone Sul, nas décadas de 1960 e
1970. Esses foram utilizados, na medida em que transcorriam as ditaduras de SN na
região, para “diluir” as responsabilidades pelos atos arbitrários praticados no período
entre a corporação e evitar futuras deserções. Os militares que não aderiram ou se
posicionaram contra essas diretrizes, tornaram-se alvos do aparato repressivo, fato que
culminou, em alguns casos, na chamada “queima de arquivo”, pois “a quebra do
22Arquivo Nacional-Brasília-DF/ Acervo dos Órgãos de Informações do Regime Militar/Centro de
Informações do Exterior (CIEX)/ BR AN, BSB IE.25.1. Alberto Octavio Conrado Avegno. 812 páginas. 23 OSÓRIO, Jefferson Lopetegui de Alencar. Depoimento prestado à Comissão Nacional da Verdade
(CNV), no dia 16 de janeiro de 2013, no Rio de Janeiro.
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compromisso corporativo condena os desertores à condição de traidores, antipatriotas;
pior, traidores entre camaradas de armas, fato imperdoável (p.96)”.
Soma-se a isso o fato de Jefferson Cardim poderia, ao se exilar no Chile,
estabelecer contato e formar uma rede de solidariedade, não apenas com os brasileiros
exilados no país, como com os partidos e organizações de esquerda chilenas, já que o
seu filho apontou a aproximação existente entre o ex-coronel e o presidente Salvador
Allende. Tais relações poderiam auxiliar na formação de outros movimentos de
oposição a ditadura, que teriam como base o Chile.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir dessas considerações, entende-se que Jefferson Cardim, ao participar da
Campanha da Legalidade em 1961 e, principalmente, ao liderar a Guerrilha de Três
Passos, tornou-se um dos alvos do aparato repressivo estatal brasileiro, em território
nacional e no exterior. O ex-coronel do Exército e seus familiares, conseguiram
sobreviver à operação clandestina montada pelos serviços secretos do Brasil e da
Argentina no final de 1970. Outros brasileiros exilados, no entanto, foram presos em
situações semelhantes e encontram-se desaparecidos; Edmur Péricles Camargo, em
1971, Joaquim Pires Cerveira e João Batista Rita, em 1973, e Onofre Pinto, Joel José de
Carvalho, Gilberto Faria Lima, José Lavecchia, Daniel de Carvalho, Enrique Ruggia e
Victor Ramos, em 1974.
Nessa perspectiva, mesmo que a troca de informações e a montagem de
operações em conjunto entre as ditaduras de SN do Cone Sul tenha se oficializado
somente em 1975, com a Operação Condor, desde o início da década de 1970, os
serviços secretos mantinham relações de colaboração no sentido de atingir seus
opositores políticos exilados em outros territórios. Nesse cenário, destaca-se o papel do
CIEX, um órgão de segurança fundado em 1966, com o objetivo de monitorar a
comunidade de brasileiros exilados no Uruguai, que mais tarde ampliou suas atividades
para o Chile, além de outros países da América Latina, África e Europa.
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5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Petrópolis: Vozes, 2005.
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América Latina. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978.
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Boitempo, 2007.
DA SILVA, José Wilson. O tenente vermelho. 4. ed. Porto Alegre: Age, 2011.
MACIEL, Wilma Antunes. Militares de esquerda: participação política e engajamento
na luta armada. Perseu: História, Memória e Política, v. 8, p. 64-91, 2013.
PADRÓS, Enrique Serra. Como el Uruguay no hay...:Terror de Estado e Segurança
Nacional. Uruguai (1968-1985): do Pachecato à ditadura civil-militar. Porto Alegre:
UFRGS, 2005. Tese (Doutorado História) – Programa de Pós-Graduação em História,
Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal do Rio Grande do Sul,
Porto Alegre, 2005. 2 t.
SILVA, Golbery do Couto e. Conjuntura política nacional: o Poder Executivo &
Geopolítica do Brasil. 3. ed. Rio de Janeiro: J. Olympio, 1981.