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EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) JUIZ(ÍZA) FEDERAL DA ___ª VARA
FEDERAL DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DO MARANHÃO
(PAJ: 2014/012-00893)
EMENTA: SISTEMA ÚNICO DE
SAÚDE. INEXISTÊNCIA DE
EQUIPAMENTO PARA A
REALIZAÇÃO DE CIRURGIAS
ORTOPÉDICAS (MESA DE
TRAÇÃO ORTOPÉDICA / MESA
RETRÁTIL). EVIDENTE
PREJUÍZO AOS USUÁRIOS DO
SISTEMA. PEDIDO DE TUTELA
ANTECIPADA.
A DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO, por meio do Defensor Público
Federal ao final signatário, no exercício de suas atribuições constitucionais e legais,
atuando na defesa dos interesses coletivos da população dependente dos serviços
públicos de saúde, em especial aos pacientes do Setor de Trauma-Ortopedia do Hospital
Universitário da Universidade Federal do Maranhão (HUUFMA), vem, perante Vossa
Excelência, com fundamento no artigo 5º, II, da Lei nº. 7.347/85 (com redação dada
pela Lei nº. 11.448/07) e no artigo 4º, VII, da Lei Complementar nº. 80/1994 (com
redação dada pela Lei Complementar nº. 132/2009), propor a presente
AÇÃO CIVIL PÚBLICA
com pedido de antecipação dos efeitos da tutela
em face da UNIÃO FEDERAL, com endereço na Rua Oswaldo Cruz, nº 1618, Centro,
São Luís/MA; do ESTADO DO MARANHÃO, com endereço na Avenida Professor
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Carlos Cunha, s/nº, edifício Nagib Haickel, 3º andar, Calhau, São Luís/MA;
do MUNICÍPIO DE SÃO LUÍS, com endereço na Praça João Lisboa, nº 66, Centro,
São Luís; e do HOSPITAL UNIVERSITÁRIO DA UNIVERSIDADE FEDERAL
DO MARANHÃO (HUUFMA), representado pela FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE
FEDERAL DO MARANHÃO, fundação de Direito Público, com sede no Campus
Universitário do Bacanga, localizado na Av. dos Portugueses, s/n, São Luís/MA,
CEP:65085-580, a serem citados nas pessoas dos seus respectivos representantes legais,
com base nos argumentos fáticos e jurídicos adiante aduzidos.
1. DOS BENEFÍCIOS DA JUSTIÇA GRATUITA E DAS
PRERROGATIVAS DOS DEFENSORES PÚBLICOS FEDERAIS.
Inicialmente, requerem os autores os benefícios da Justiça Gratuita, por não
poderem arcar com as custas e despesas do presente processo sem prejuízo de seu
sustento próprio e de sua família, com esteio no artigo 4º da Lei nº. 1.060/50.
Ressalte-se, ademais, a necessidade de observância das prerrogativas dos
Defensores Públicos Federais previstas na Lei Complementar nº. 80/94 e demais
diplomas legais, especialmente no que tange à contagem em dobro dos prazos
processuais e à intimação pessoal, inclusive com carga dos autos, de todos os atos
do processo (LC 80/94, artigo 44, X).
2. DA LEGITIMIDADE ATIVA DA DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO
A Defensoria Pública tem por função institucional a orientação jurídica e a
defesa, em todos os graus, dos necessitados. É instituição essencial à função
jurisdicional do Estado justamente por garantir o direito fundamental à assistência
jurídica integral e gratuita aos necessitados, conforme assegura o art. 5º, LXXIV, da
Constituição Federal, umbilicalmente ligado ao direito fundamental do acesso à justiça,
consagrado no art. 5º, XXXV, da CF.
No intuito de abrigar a ideia inerente ao reconhecimento da
legitimidade para o ajuizamento de demandas coletivas pela Defensoria Pública, e
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harmonizar a aplicação do Código Consumerista, o legislador pátrio alterou a redação
do artigo 5º da Lei no 7.347, de 24 de julho de 1985, que disciplina a ação civil pública,
legitimando explicitamente a propositura da ação pela Defensoria Pública da União.
Cumpre observar que o posicionamento de reconhecer a legitimidade ativa
na propositura de Ações Civis Públicas vem sendo consolidado doutrinária
e jurisprudencialmente, inclusive no âmbito das Cortes Superiores, como demonstrado a
seguir:
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. LEGITIMIDADE DA
DEFENSORIA PÚBLICA PARA AJUIZAR AÇÃO CIVIL PÚBLICA.
ART. 134 DA CF. ACESSO À JUSTIÇA. DIREITO FUNDAMENTAL.
ART. 5º, XXXV, DA CF. ARTS. 21 DA LEI 7.347/85 E 90 DO
CDC. MICROSSISTEMA DE PROTEÇÃO AOS
DIREITOS TRANSINDIVIDUAIS. AÇÃO CIVIL PÚBLICA.
INSTRUMENTO POR EXCELÊNCIA. LEGITIMIDADE ATIVA DA
DEFENSORIA PÚBLICA PARA AJUIZAR AÇÃO CIVIL PÚBLICA
RECONHECIDA ANTES MESMO DO ADVENTO DA LEI 11.448/07.
RELEVÂNCIA SOCIAL E JURÍDICA DO DIREITO QUE SE
PRETENDE TUTELAR. RECURSO NÃO PROVIDO. 1. A
Constituição Federal estabelece no art. 134 que "A Defensoria
Pública é instituição essencial à função jurisdicional do Estado,
incumbindo-lhe a orientação jurídica e a defesa, em todos os graus,
dos necessitados, na forma do art. 5º, LXXIV". Estabelece, ademais,
como garantia fundamental, o acesso à justiça (art. 5º, XXXV, da
CF), que se materializa por meio da devida prestação jurisdicional
quando assegurado ao litigante, em tempo razoável (art. 5º,
LXXVIII, da CF), mudança efetiva na situação material do direito a
ser tutelado (princípio do acesso à ordem jurídica justa). 2. Os arts.
21 da Lei da Ação Civil Pública e 90 do CDC, como normas de envio,
possibilitaram o surgimento do denominado Microssistema ou
Minissistema de proteção dos interesses ou direitos coletivos amplo
senso, com o qual se comunicam outras normas, como os Estatutos do
Idoso e da Criança e do Adolescente, a Lei da Ação Popular, a Lei de
Improbidade Administrativa e outras que visam tutelar direitos dessa
natureza, de forma que os instrumentos e institutos podem ser
utilizados para "propiciar sua adequada e efetiva tutela" (art. 83 do
CDC). 3. Apesar do reconhecimento jurisprudencial e doutrinário de
que "A nova ordem constitucional erigiu um autêntico 'concurso de
ações' entre os instrumentos de tutela dos
interesses transindividuais" (REsp 700.206/MG, Rel. Min. LUIZ
FUX, Primeira Turma, DJe 19/3/10), a ação civil pública é o
instrumento processual por excelência para a sua defesa. 4. A Lei
11.448/07 alterou o art. 5º da Lei 7.347/85 para incluir a Defensoria
Pública como legitimada ativa para a propositura da ação civil
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pública. Essa e outras alterações processuais fazem parte de uma
série de mudanças no arcabouço jurídico-adjetivo com o objetivo de,
ampliando o acesso à tutela jurisdicional e tornando-a efetiva,
concretizar o direito fundamental disposto no art. 5º, XXXV, da CF.
5. In casu, para afirmar a legitimidade da Defensoria Pública
bastaria o comando constitucional estatuído no art. 5º, XXXV, da
CF. 6. É imperioso reiterar, conforme precedentes do Superior
Tribunal de Justiça, que a legitimatio ad causam da Defensoria
Pública para intentar ação civil pública na defesa de
interesses transindividuais de hipossuficientes é reconhecida antes
mesmo do advento da Lei 11.448/07, dada a relevância social (e
jurídica) do direito que se pretende tutelar e do próprio fim do
ordenamento jurídico brasileiro: assegurar a dignidade da pessoa
humana, entendida como núcleo central dos direitos fundamentais. 7.
Recurso especial não provido (REsp 1106515/MG, Rel. Ministro
ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA TURMA, julgado
em 16/12/2010, DJe 02/02/2011) (grifou-se).
Verifica-se, portanto, que longe de estar ligada apenas a uma
questão meramente formal da previsão legal expressa que reconheça a legitimidade para
propositura do presente instrumento jurídico pela Defensoria Pública, tal
reconhecimento ganha força na necessidade de plena atuação na garantia do direito
fundamental de acesso à justiça, função precípua da instituição, como posto
inicialmente.
Aduz-se, ainda, que a defesa que aqui se põe se dá em nome dos interesses
coletivos da população do Estado do Maranhão dependente dos serviços públicos de
saúde, em especial dos pacientes do Setor de Trauma-Ortopedia da HUUFMA (Hospital
Universitário Presidente Dutra), tendo em vista a carência do equipamento para a
realização de cirurgias ortopédicas, a qual requer a atenção específica por parte do
Estado, relativa a demandas de saúde do setor.
Destaque-se a visível pertinência temática entre a pretensão dos assistidos
pela DPU nesta Ação Civil Pública e o exercício das funções típicas da Instituição, qual
seja a defesa de hipossuficientes (art. 5º, LXXIV, CF), dada a vulnerabilidade tanto da
condição social quanto dos meios para emprego de defesa técnico-jurídica e dado o
caráter de direito difuso e coletivo do objeto desta ação.
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3. DA LEGITIMIDADE PASSIVA DOS ENTES FEDERATIVOS E DA
COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL
A Constituição Federal, em seu art. 196, atribui ao Estado, no
sentido genérico (União, Estados e Municípios), e não a uma esfera da Federação
específica, a obrigação de executar políticas econômicas e sociais destinadas à redução
dos riscos de doenças e outros agravos, bem como ao estabelecimento de condições que
permitam o acesso universal e igualitário às ações e serviços destinados à promoção, à
proteção e à recuperação da saúde1.
Demais disso, o Sistema Único de Saúde (SUS)1 constitui
uma rede hierarquizada de ações e serviços de saúde, que devem ser realizados pela
União, pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios, bem como por suas
autarquias e fundações (art. 198, CF/1988, e art. 4º., da Lei 8080/90). Desse modo, há
de se convir que omissões e negligências perpetradas por Entes “subalternos” dentro
da rede hierarquizada do SUS implicam necessariamente no descumprimento do
dever de fiscalização dos Entes colocados em patamar superior, gerando, assim, uma
espécie de culpa in vigilando destes últimos, a atrair a responsabilidade solidária de
todas as esferas da Federação, a saber União e Estado e Município envolvidos2 3.
1 “O Sistema Único de Saúde é financiado pela União, Estados-membros, Distrito Federal e Municípios,
sendo solidária a responsabilidade dos referidos entes no cumprimento dos serviços públicos de saúde
prestados à população”. TRF1, 5. T, AC 200635000154575/GO, Rel. Des. Federal Selene Maria de
Almeida, e-DJF1 28.03.2008, p. 306.
2 “O funcionamento do Sistema Único de Saúde - SUS é de responsabilidade solidária da União,
Estados-membros e Municípios, de modo que qualquer dessas entidades tem legitimidade ad causam para
figurar no pólo passivo de demanda que objetiva a garantia do acesso à medicação para pessoas
desprovidas de recursos financeiros”. STJ, 2. T, REsp 878.080/SC, Rel. Min. Eliana Calmon, DJ
20.11.2006, p. 296.
“A Carta Magna de 1988 erige a saúde como um direito de todos e dever do Estado (art. 196). Daí, a
seguinte conclusão: é obrigação do Estado, no sentido genérico (União, Estados, Distrito Federal e
Municípios), assegurar às pessoas desprovidas de recursos financeiros o acesso à medicação necessária
para a cura de suas mazelas, em especial, as mais graves. Sendo o SUS composto pela União, Estados e
Municípios, impõe-se a solidariedade dos três entes federativos no pólo passivo da demanda”. STJ, 1. T,
REsp 507205/PR, Rel. Min. José Delgado, DJ 17.11.2003, p. 213.
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Tendo por supedâneo todos esses fundamentos, resta impassível
de controversas que, no caso concreto, há a responsabilidade linear de todos os Entes
Políticos que compõem a Federação, tendo em vista tratar-se da aquisição de
equipamento indispensável para a realização de diversos tipos de cirurgias, voltadas a
procedimentos ortopédicos no quadril e também nos membros inferiores, tanto de
caráter degenerativo, quanto de caráter pós traumático (fraturas) e cuja ausência
obsta o tratamento adequado dos pacientes nessas circunstâncias.
Dessa feita, sendo os serviços e ações de saúde, conforme acima esboçado,
atribuições conjuntas da União, dos Estados e dos Municípios, devendo,
conseguintemente, o Ente Federal figurar como parte ré em ações que envolvam
matéria sanitária, patente a competência é da Justiça Federal, nos termos do art. 109,
I, da Constituição Federal.
Nesse sentido, iterativa diretriz jurisprudencial:
Agravo regimental no recurso extraordinário. Prestação de saúde.
Legitimidade passiva da União. Responsabilidade solidária dos
entes da Federação em matéria de saúde. Precedentes.
1. A jurisprudência da Corte pacificou entendimento no
sentido de que a responsabilidade dos entes da Federação, no que
tange ao dever fundamental de prestação de saúde, é solidária.
2. Agravo regimental não provido. (RE 575179 ES. DJ,
07.05.2013, Relator Min. Dias Toffoli, Primeira Turma) (grifou-se).
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. DIREITO À SAÚDE.
FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. UNIÃO FEDERAL.
LEGITIMIDADE PASSIVA. HEPATITE TIPO C. INTERFERON
PEGUILATO E RIBAVIRINA, INCLUÍDOS EM LISTA DE
MEDICAMENTOS EXCEPCIONAIS DE ALTO CUSTO.
3 “O Poder Público, qualquer que seja a esfera institucional de sua atuação no plano da organização
federativa brasileira, não pode mostrar-se indiferente ao problema da saúde da população, sob pena de
incidir, ainda que por censurável omissão, em grave comportamento inconstitucional”. STF,
2. T, AGRRE 271.286/RS, Rel. Min. Celso de Mello; “O Sistema Único de Saúde é financiado pela
União, Estados-membros, Distrito Federal e Municípios, sendo solidária a responsabilidade dos referidos
entes no cumprimento dos serviços públicos de saúde prestados à população”; STJ, 1. T, REsp
828140/MT, Rel. Min. Denise Arruda, DJ 23.04.2007, p. 235; “No tocante à responsabilidade estatal para
o fornecimento gratuito de medicamento referente à doença do agravado, é conjunta e solidária a União,
Estados, ao Distrito Federal e ao Município”. TRF4, 1. T. S, AG 2006.04.00.001739-7/PR, Rel. Des.
Federal Fernando Quadros da Silva, DJ 28.06.2006, p. 742.
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RESTRIÇÃO A PACIENTES JÁ TRATADOS COM INTERFERON
CONVENCIONAL. MEDICAMENTOS MAIS RECENTES E
AVANÇADOS. TRATAMENTO RECOMENDADO POR
PROFISSIONAL DA REDE PÚBLICA HOSPITALAR. AUSÊNCIA
DE JUSTIFICATIVA CIENTIFICAMENTE COMPROVADA
SOBRE EVENTUAL INEFICIÊNCIA DO TRATAMENTO.
PORTARIA Nº. 863/2002 DO MINISTÉRIO DA SAÚDE.
ILEGALIDADE. I - A União Federal, solidariamente com os Estados,
o Distrito Federal e os Municípios, está legitimada para as causas que
versem sobre o fornecimento de medicamento, em razão de, também,
compor o Sistema Único de Saúde - SUS. Precedentes do STJ. [...]
III - Apelação e remessa oficial desprovidas. (AMS
200434000176129, DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA
PRUDENTE, TRF1 - SEXTA TURMA, 04/06/2007).
Esmiuçadas as questões preliminares atinentes à legitimidade passiva e
à competência, passemos às razões de mérito que assentam a presente demanda.
4. SINÓPSE FÁTICA. CASO PARADIGMA
Trata-se de Procedimento de Assistência Jurídica (PAJ no 2014/012-893) de
natureza coletiva, instaurado a partir do procedimento individual PAJ n0 2014/012-594
(ANEXOS I e II), no bojo do qual a assistida ANA RITA DOS SANTOS GOUVEIA,
que sofre de Osteocondromatose Sinovial, busca a realização de cirurgia
de artroscopia do quadril esquerdo. Ocorre que a assistida foi informada pelo Setor de
Ortopedia Hospital Universitário Presidente Dutra (HUUFMA), na pessoa do médico
que a atende, Dr. Raul Almeida (CRM 5702) e da coordenadora do Setor, Sra. Mary,
que a instituição não dispõe de equipamento imprescindível para a realização do
procedimento cirúrgico, qual seja, mesa de tração ortopédica / mesa retrátil.
Com o intuito de sanar dúvidas acerca do fato, o Setor de Serviço Social
deste núcleo da DPU/MA contatou o Setor de Ortopedia do HUUFMA, o qual
confirmou a indisponibilidade do equipamento e informou que o Hospital “já o
solicitou”, mas ainda não obteve sucesso, de maneira que não havia previsão para a
disponibilidade do equipamento para a realização de cirurgias (ANEXO III).
Ademais, dado o quadro clínico da assistida, sugeriram que ela realizasse a cirurgia em
outro hospital. Entretanto, a Secretaria de Estado de Saúde do Maranhão — SES/MA
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informou à assistida, quando orientada por este Núcleo a protocolar pedido de TFD —
Tratamento Fora de Domicílio, de que não poderia fazê-lo porque “existe o referido
tratamento no Estado do Maranhão”.
No entanto, como já fora citado, o HUUFMA, único hospital do Estado
onde o procedimento, em tese, pode ser realizado, por ser de alta complexidade,
não dispõe do equipamento indispensável, conforme já fora relatado.
Tendo em vista que a carência do equipamento para a realização das
cirurgias ortopédica não atinge apenas a assistida em tela, mas a um número
potencialmente expressivo de pessoas na mesma condição, que necessitam de
tratamento médico célere sob pena de violação ao seu direito à saúde, este núcleo da
DPU instaurou o PAJ no 2014/012-893 (coletivo) já citado.
Ainda na busca de esclarecimentos sobre o referido equipamento, bem como
das medidas adotadas para a aquisição do mesmo, esta Defensoria enviou o ofício de nº
847/2014, seguido do ofício de reiteração nº 1090/2014 (ofícios anexos), ao Hospital
Universitário Presidente Dutra (HUUFMA) (ANEXO IV).
Em resposta aos citados expedientes o HUUFMA reiterou, por meio do
ofício de nº 962/2014/SUPERINTENDÊNCIA, a indisponibilidade de Mesa de
Tração Retrátil e, reafirmando a imprescindibilidade do equipamento e a alta
demanda de cirurgias ortopédicas, também informou a abertura de Requisição de
Compra.
No expediente do HUUFMA referido, a pedido desta Defensoria, o
equipamento foi especificado da seguinte forma pelo Setor de Engenharia Clínica:
“MESA CIRÚRGICA ORTOPÉDICA QUE ASSEGURE
CONDIÇÕES IDEAIS PARA REALIZAÇÃO DE VÁRIOS
PROCEDIMENTOS CIRÚRGICOS ORTOPÉDICOS TAIS
COMO: CIRURGIA DE MEMBRO INFERIOR POR TRAÇÅO,
CIRURGIA DE COLO DO FÉMUR, BRAÇO, JOELHO,
COLUNA, OMBRO, QUADRIS, TÍBIA, MÃO, ETC. POSSUI
TAMPO EM FIBRA DE CARBONO RADIO-TRANSPARENTE
E MOVIMENTOS SUAVES E PRECISOS, QUE INTERAGEM
COM OS MOVIMENTOS DO ARCO CIRÚRGICO, EM
TODAS AS POSIÇÕES. MESA CIRÚRGICA
MULTIFUNCIONAL ELETROHIDRÁULICA OU
TOTALMENTE ELETRÖNICA PARA PEQUENAS, MÉDIAS E
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GRANDES CIRURGIAS. DEVE POSSUIR KIT DE TRAÇAO
ORTOPÉDICO FABRICADOS EM AÇO INOX ASI
304COMPOSTO DE NO MINIMO DUAS BARRAS DE
EXTENSORES DE PERNAS COM REGULAGEM DE
DISTÂNCIA ACIONADAS POR MANIVELAS OU
DISPOSITIVOS. MESA COM ACIONAMENTO DOS
COMANDOS REALIZADO POR CONTROLE REMOTO
INFRAVERMELHO E NO PAINEL LOCALIZADO NA
PRÓPRIA ESTRUTURA; DOTADA DE SISTEMA DE
FIXAÇÃO E LIBERAÇÃO COM GARANTIA DE
ESTABILIDADE NA IMOBILIZAÇÃO; COM CAPACIDADE
DE ELEVAÇÃO DE NO MÍNIMO 250KG, DEVE
POSSIBILITAR A UTILIZAÇÃO DE EXTENSORES
LATERAIS QUE AMPLIEM O LEITO, PERMITINDO SUA
UTILIZAÇÃO EM PROCEDIMENTOS COM PACIENTES DE
OBESIDADE; COM SISTEMA DE EMERGÊNCIA QUE
PERMITA A CONTINUIDADE DOS PROCEDIMENTOS EM
CASO DE FALTA DE ENERGIA; TAMPO RÁDIO
TRANSPARENTE PARA A UTILIZAÇÃO DE RAIOS-X E DO
ARCO CIRÚRGICO SEM A NECESSIDADE DE
REPOSICIONAR O PACIENTE; POSSIBILIDADE DE
INVERSÃO DA CABECEIRA PELA PERNEIRA O QUE
PERMITE VERSATILIDADE NO POSICIONAMENTO
DO PACIENTE; DIVIDIDO EM, NO MINIMO AS SEÇÕES:
CABECEIRA, DORSO, ASSENTO, PROLONGADOR DE
PERNAS E SEÇÃO DE PERNAS; RODAS COMPATIVEIS
COM O PESO PARA MOVIMENTAÇÃO DA MESA E
IMOBILIZAÇÃO DA MESMA NO SOLO; MOVIMENTOS
ATRAVÉS DE SISTEMA SEGURO, SEM MOVIMENTOS
BRUSCOS E QUE SUSTENTE O PESO DA CABEÇA, DORSO
E SUPORTE DA PERNA, MOVIMENTOS DE ELEVAÇÃO,
LATERAL ESQUERDO E DIREITO, TRENDELEMBURG,
REVERSO TRENDELEMBURG, LONGITUDINAL E
ACIONAMENTO DO MECANISMO DE IMOBILIZAÇÃO NO
SOLO; BASE E COLUNA CONSTRUIDAS EM CHAPA DE
AÇO EM CHAPA DE INOX AISI 304; ACESSÓRIOS: ARCO
DE KU NARCOSE EM AÇO INOXIDÁVEL; PAR DE
OMBREIRAS EM AÇO INOXIDÁVEL REVESTIDO
EM POLIURETANO; PAR DE PORTA-COXAS COM
MOVIMENTOS CIRCULARES REVESTIDOS
EM POLIURETANO COM HASTE DE FIXAÇÃO EM AÇO
INOXIDÁVEL; PAR DE SUPORTES PARA
BRAÇO; JOGO DE ESTOFADO PARA O TAMPO EM
POLIURETANO MOLDADO; 5 FIXADORES RADIAIS EM
AÇO INOXIDÁVEL; ACESSÓRIOS RENAIS REVESTIDO EM
POLIURETANO; BANDEJA PORTA CASSETE DE RAIOS-X
EM AÇO INOXIDÁVEL; PAR DE SUPORTES LATERAL
HEPÁTICO EM AÇO INOXIDÁVEL REVESTIDO EM
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POLIURETANO; SUPORTE ILIACO COM 01 PAR DE
FIXADORES RADIAIS EM AÇO INOXIDÁVEL REVESTIDO
EM POLIURETANO; SUPORTE DE JOELHOS COM 01 PAR
DE FIXADORES RADIAIS EM AÇO INOXIDÁVEL
REVESTIDO EM POLIURETANO; SUPORTE PARA
CIRURGIA DE MENISCO EM AÇO INOXIDÁVEL
REVESTIDO EM POLIURETANO; SUPORTE PARA
BANDEJA DE INSTRUMENTAIS EM AÇO INOXIDÁVEL;
CORREIA PARA FIXAÇÃO DO PACIENTE EM NYLON COM
VELCRO; PROLONGADOR PARA CIRURGIA DE OBESO
EM AÇO INOXIDÁVEL REVESTIDO EM POLIURETANO;
PROLONGADOR PÉLVICO PARA MESA EM AÇO
INOXIDÁVEL REVESTIDO EM POLIURETANO.
DIMENSÕES. COMPRIMENTO DO LEITO: 2000 ± 10 0h;
LARGURA DO LEITO: 490 ± 10 0h; LARGURA MÁXIMA: 650
± 10 0/6; ALTURA MÁXIMA: 1000 ± 10 0/6; ALTURA MÍNIMA:
800 ± 10 0/0', MOVIMENTO LONGITUDINAL: 190 ± 10 0/0 OU
CONFIGURAÇÃO QUE PERMITA ARCO C SEM
NECESSIDADE DE REPOSICIONAR O PACIENTE;
ANGULOS:LATERAL DIREITA: MÍNIMO 180 E LATERAL
ESQUERDA: MINIMO 180, TRENDELEMBURG MINIMO
300;REVERSO DO TRENDELEMBURG MINIMO 300; DORSO
+550 MINIMO -100 NOMINAL; PERNA +300 NOMINAL, -
900 MINIMO; CABEÇA +450 MINIMO, -400 NOMINAL;
ALIMENTAÇÃO: 127/220 VOLTS - 60 HZ, REDE ELÉTRICA
MONOFÁSICA; EQUIPAMENTO DEVERÁ ESTAR EM
CONFORMIDADE COM A NBR IEC 60601.2.46 E GRAU DE
PROTEÇÄO DE LIQUIDOS IPX4 MANUAIS, GARANTIA DE
1 ANO PARA PECAS E SERVICOS, INSTALAÇÃO E
TREINAMENTO, REGISTRO NO MINISTÉRIO DA SAUDE,
CERTIFICADO DE BOAS PRATICAS DE FABRICAÇÃO.
LAUDO OU COMPROVANTE DA LIGA ASI DO AÇO
INOXIDÁVEL. EXIGÊNCIAS ADICIONAIS: TODOS OS
DISPOSITIVOS E ACESSÓRIOS NECESSÁRIOS AO
FUNCIONAMENTO DO EQUIPAMENTO; MANUAL DE
OPERAÇÃO EM PORTUGUÊS; MANUAL DE SERVIÇO COM
TODOS OS DIAGRAMAS CONSTRUTIVOS E ESQUEMAS
ELÉTRICOS E FUNCIONAIS E RELAÇÃO DE PEÇAS DO
EQUIPAMENTO OFERTADO. GARANTIA MINIMA DE 12
MESES PARA PEÇAS E SERVIÇOS; INSTALAÇÃO E
TREINAMENTO OPERACIONAL. ASSISTÊNCIA TÉCNICA
AUTORIZADA NO ESTADO”.
Quanto ao pedido formulado administrativamente de aquisição da mesa,
imperioso registrar que, ainda em 11 de agosto de 2014, o setor de Engenharia Clínica
do HUUFMA recebeu encaminhamento da Gerencia de Administração referente ao
AVENIDA GUAXENDUBA, 1.490, BAIRRO DE FÁTIMA, SÃO LUÍS/MA – CEP 65.015-560
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memorando 166/2014 do Serviço de Traumato Ortopedia/ HUUFMA para análise
quanto à solicitação de aquisição de uma mesa cirúrgica de tração ortopédica.
Feito isso, segundo o expediente, foi aberta a Requisição de Compra
no RC:EG-0035/20145 em 11/08/2014 e terminada a fase de análise e adequação
técnica da especificação do equipamento em 18/08/2014, iniciando-se o processo de
aquisição através de solicitação à Unidade de Compras de pesquisa de valores, do
referido equipamento, praticados no mercado, para posterior envio à Unidade de
Licitação com previsão de conclusão do certame em 120 (cento e vinte) dias.
Entretanto, em resposta à nova provocação da DPU, ofício nº 1745/2014,
que questionou acerca de realização da licitação e disponibilidade dos serviços à
população, o HUUFMA informou por meio do Ofício de nº 12/2015, de 6 de janeiro
de 2015, que não houve a conclusão da licitação e que o processo de compra ainda
se encontra em fase de aceite, conforme docs. anexados. Pelo exposto vê-se que o
prazo assegurado pelo referido hospital (120 dias) foi absolutamente descumprido,
a demonstrar a INVIABILIDADE DA RESOLUÇÃO DO PROBLEMA NA
SEARA ADMINISTRATIVA e, em consequência, restando prejudicada a
prestação do serviço que, repise-se, só é realizado no HUUFMA, nosocômio que
conta com alta demanda de cirurgias ortopédicas.
5. DO DIREITO
5.1 DIREITO À SAÚDE COMO COROLÁRIO DO DIREITO À VIDA.
PROTEÇÃO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA
O direito à vida, assegurado no art. 5°, caput, da Constituição Federal,
aos brasileiros e estrangeiros residentes no país, está umbilicalmente ligado ao direito à
saúde, resguardado no art. 6°, bem como no art. 196 da Carta.
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A norma do art. 1964 da Constituição Federal enuncia direito público
subjetivo5 do cidadão, correspondente a um dever jurídico estatal. É, na classificação da
doutrina constitucionalista, norma de eficácia plena e aplicabilidade imediata, conforme
o disposto no art. 5º, §1º, da Constituição, não dependendo de qualquer ato legislativo
para que seja efetivada pela Administração Pública6.
O direito à saúde é, portanto, um direito fundamental7, de cunho social8,
e exigível perante o poder público, pois não se trata de mera norma programática, de
modo que merece efetividade por parte do Poder Judiciário, eis que malferido, no caso
vertente, pelo Poder Executivo.
4 “O caráter programático da regra inscrita no art. 196 da Carta Política - que tem por
destinatários todos os entes políticos que compõem, no plano institucional, a organização federativa do
Estado brasileiro - não pode converter-se em promessa constitucional inconseqüente, sob pena de o Poder
Público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela coletividade, substituir, de maneira ilegítima,
o cumprimento de seu impostergável dever, por um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao
que determina a própria Lei Fundamental do Estado”. STF, 2. T, RE-AgR 271286/RS, Rel. Min. Celso de
Mello, DJ 24.11.2000, p. 00101.
5 “O direito público subjetivo à saúde representa prerrogativa jurídica indisponível assegurada à
generalidade das pessoas pela própria Constituição da República (art. 196). Traduz bem jurídico
constitucionalmente tutelado, por cuja integridade deve velar, de maneira responsável, o Poder Público, a
quem incumbe formular - e implementar - políticas sociais e econômicas idôneas que visem a garantir,
aos cidadãos, o acesso universal e igualitário à assistência farmacêutica e médico-hospitalar. - O direito à
saúde - além de qualificar-se como direito fundamental que assiste a todas as pessoas - representa
conseqüência constitucional indissociável do direito à vida. O Poder Público, qualquer que seja a esfera
institucional de sua atuação no plano da organização federativa brasileira, não pode mostrar-se indiferente
ao problema da saúde da população, sob pena de incidir, ainda que por censurável omissão, em grave
comportamento inconstitucional”. STF, 2. T, RE-AgR 393175/RS, Rel. Min. Celso de Mello, DJ
02.02.2007, p. 00140.
6 O legislador infraconstitucional, por meio do art. 2°, da Lei nº 8.080/1990, consignou que “a
saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao
seu pleno exercício”.
7 “Os direitos fundamentais à vida e à saúde são direitos subjetivos inalienáveis,
constitucionalmente consagrados, cujo primado, em um Estado Democrático de Direito como o nosso,
que reserva especial proteção à dignidade da pessoa humana, há de superar quaisquer espécies de
restrições legais”. STJ, 1. T, REsp 836913/RS, Rel. Min. Luiz Fux, DJ 31.05.2007, p. 371.
8 “Os direito sociais são prestações positivas proporcionadas pelo Estado direta ou indiretamente,
enunciadas em normas constitucionais, que possibilitam melhores condições de vida aos mais fracos,
direitos que tendem a realizar a igualização de situações sociais desiguais.” SILVA, José Afonso da.
Curso de Direito Constitucional Positivo. 20. d. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 285.
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Os direitos fundamentais à vida e à saúde são direitos subjetivos
inalienáveis, constitucionalmente consagrados, cujo primado, num Estado Democrático
de Direito como o nosso, que reserva especial proteção à dignidade da pessoa humana,
há de superar quaisquer espécies de restrições legais9.
No plano internacional, por seu relevo, cumpre destacar a Declaração
Universal dos Direitos Humanos10, em seu art. 25, §1º, o qual insere o direito à saúde
como um dos elementos que integram o piso mínimo existencial aquém do qual se torna
inimaginável o exercício de uma vida digna, e o Pacto Internacional dos Direitos
Econômicos, Sociais e Culturais11, art. 12, que estabelece, como dever dos Estados-
Parte, o reconhecimento do direito de todo cidadão a usufruir dos mais elevados níveis
de saúde física e mental.
Cite-se, ainda, no elenco de normas de direito internacional de fulcral
relevância para regulamentação do direito à saúde, a Constituição da Organização
Mundial de Saúde (OMS), que, em seu Preâmbulo, estabelece, como um de seus
princípios basilares, a concepção de saúde não como uma mera ausência de doenças e
enfermidades, mas, sim, como um estado completo de bem estar físico, mental e social,
e o Protocolo Adicional da Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de São
José da Costa Rica), o qual, no art. 10, define a saúde como um bem público que deve
ser resguardado por todos os Estados membros.
Em face de todos esses fundamentos normativos, que confirmam a
fundamentalidade material do direito à saúde e o dotam de fundamentalidade formal,
não há como se negar que, no ordenamento jurídico pátrio, tem ele natureza jurídica
de direito público subjetivo a uma prestação positiva do Estado. Trata-se de
prerrogativa político constitucional do cidadão de exigir do Poder Público o implemento
9 STJ, 1. T, AgRg no REsp 1002335/RS, Rel. Min. Luiz Fux, DJe 22/09/2008.
10 Adotada e proclamada pela Resolução nº 217 A (III) da Assembléia Geral das Nações Unidas
em 10 de dezembro de 1948. Assinada pelo Brasil na mesma data.
11 Adotado pela Resolução n.2.200-A (XXI) da Assembléia Geral das Nações Unidas, em 16 de
dezembro de 1966 e ratificada pelo Brasil em 24 de janeiro de 1992.
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de políticas que materializem, através de medidas preventivas e curativas, o postulado
maior da dignidade da pessoa humana.
5.2 CONSIDERAÇÕES A RESPEITO DA RESERVA DO POSSÍVEL.
PREVALÊNCIA DO MÍNIMO EXISTENCIAL DO CIDADÃO
No que tange à necessidade de imediata compra do equipamento pelo poder
público, com a antecipação dos efeitos da tutela, é bom alvitre mencionar que não pode
haver limitação orçamentária que justifique o atraso na aquisição. Pois, em matéria do
mínimo existencial, a prioridade é sempre a satisfação do direito do cidadão, não
havendo espaço para ponderações acerca de restrições orçamentárias dos entes públicos
no âmbito de políticas públicas. Por isso, juridicamente irrelevante seria, neste caso, a
invocação da reserva do possível.
Assim, numa dogmática constitucionalmente adequada dos direitos
fundamentais, não cabe ao julgador avaliar as condições financeiras do Estado, se, no
caso concreto, configurada está a eficácia de índole positiva ou prestacional do direito
social fundamental. A dogmática jurídica atual dispõe de farto arsenal teórico para
verificar a concretude e definitividade de determinada posição jurídica no caso concreto.
Escolhemos, para tanto, as lições trazidas por Robert Alexy, quanto ao caráter prima
facie ou definitivo de direito fundamental à prestação material.
A princípio, cabe explicitar que, se “uma regra é uma razão para um
determinado juízo concreto – o que ocorre quando ela é válida, aplicável e infensa a
exceções -, então ela é uma razão definitiva” se o juízo concreto de dever-ser tem como
conteúdo a definição de que alguém tem determinado direito, então, esse direito é um
direito definitivo”. Por outro lado, “princípios, ao contrário, são sempre razões prima
facie”, até que, por meio de um juízo da ponderação, seja ele expressado como uma
razão definitiva para um juízo concreto de dever-ser, ganhando estrutura de regra.
Isso significa que os princípios, de início, não encerram definitividade (“a
prestação pode ser devida, dependendo das circunstâncias”) no comando que enunciam.
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No entanto, após o cotejo com os elementos concretos do caso, tomam ares de regra,
encerrando comando definitivo (“a prestação é devida”).
Ademais, conforme a lição de Alexy, “a cláusula de reserva do possível,
como aquilo que o indivíduo pode razoavelmente exigir da sociedade” - não pode levar
a um esvaziamento do direito, servindo a referida cláusula ao necessário sopesamento
desse direito.
O que se quer com isto dizer é: a relevância dos elementos do caso pode ou
não conferir a determinado direito prestacional o caráter de definitividade, tendo em
vista especialmente os princípios constitucionais colidentes, como o princípio formal de
vinculação às escolhas do Legislador, para delineamento legal de determinada prestação
jurídica, ou da Administração, para implemento fático de determinado direito social.
Nesse esteio, a tais princípios formais se contrapõe o princípio da liberdade
fática, que é a possibilidade fática de escolhas do indivíduo na vida prática, protegida
por garantias jurídicas (liberdade jurídica), as quais, por outro lado, não fariam sentido
se extirpada a condição mínima de possibilidades (destruída a existência fisiológica,
com a morte). Deveras, esse é o motivo pelo qual se fala com frequência que a vida é o
bem jurídico mais precioso: trata-se da condição mínima das possibilidade fáticas de
escolha do indivíduo.
Portanto, conforme a lição do jusfilósofo, há que se ponderar, entre a
liberdade fática do indivíduo, aqui refletida em seu direito à saúde e à vida, e outros
princípios de interesse da Administração e da coletividade, sendo certo que in casu, o
mínimo existencial do indivíduo deve prevalecer sobre os demais interesses.
Seguindo tal linha principiológica, adaptando as lições alexyanas ao
ordenamento brasileiro, a Professora Ana Paula de Barcellos identifica um mínimo
existencial extraível da própria Carta Magna, por meio uma interpretação sistemática
garantidora da unidade da Constituição. A este respeito, leciona12:
“Ao lado do campo meramente político, uma fração do princípio da
dignidade da pessoa humana, seu conteúdo mais essencial, está
12 BARCELLOS, Ana Paula de. A eficácia jurídica dos princípios constitucionais: o princípio da
dignidade da pessoa humana. 2 ed. Rio de Janeiro: Renovar, p. 282.
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contida naquela esfera do consenso mínimo assegurada pela
Constituição e transformada em matéria jurídica. É precisamente aqui
que reside a eficácia jurídica positiva ou simétrica e o caráter de regra
do princípio constitucional. Ou seja: a não realização dos efeitos
compreendidos nesse mínimo constitui uma violação ao princípio
constitucional, no tradicional “tudo ou nada”, podendo-se exigir
judicialmente a prestação equivalente. Não é possível ponderar um
princípio, especialmente a dignidade da pessoa humana, de forma
irrestrita, ao ponto de não sobrar coisa alguma que lhe confira
substância: também a ponderação tem limites”.
Esse mínimo existencial, de acordo com a mesmo autora, tem quatro eixos:
a educação fundamental, a saúde básica e urgente, a assistência aos desamparados e o
Acesso à Justiça (art. 5º, XXXVI). Tratando-se desse núcleo, não há que se falar em
ponderação ou princípios, mas em definitividade da prestação, que assume o caráter de
regra, não sendo a ela oponível o argumento da reserva do possível.
Nesses casos, fala-se em eficácia positiva ou simétrica das posições
jurídicas positivas decorrentes do mínimo existencial, segundo lição de Ana Paula de
Barcellos:
“Compete ao Judiciário, portanto, determinar o fornecimento do
mínimo existencial independentemente de qualquer outra coisa, como
decorrência de normas constitucionais sobre a dignidade humana e
sobre a saúde – eficácia positiva ou simétrica”.
A Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal endossa tais ensinamentos
doutrinários, conforme expõe o Ministro Celso de Mello, na decisão proferida na
Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 45, a qual tratou da relação
entre “reserva do possível” e a da implementação judicial do mínimo existencial:
“[…] Não se mostrará lícito, no entanto, ao Poder Público, em tal
hipótese – mediante indevida manipulação de sua atividade financeira
e/ou político-administrativa – criar obstáculo artificial que revele o
ilegítimo, arbitrário e censurável propósito de fraudar, de frustrar e de
inviabilizar o estabelecimento e a preservação, em favor da pessoa e
dos cidadãos, de condições materiais mínimas de existência. Cumpre
advertir, desse modo, que a cláusula da “reserva do possível” –
ressalvada a ocorrência de justo motivo objetivamente aferível – não
pode ser invocada, pelo Estado, com a finalidade de exonerar-se do
cumprimento de suas obrigações constitucionais, notadamente
quando, dessa conduta governamental negativa, puder resultar
nulificação ou, até mesmo, aniquilação de direitos constitucionais
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impregnados de um sentido de essencial fundamentalidade. Daí a
correta ponderação de ANA PAULA DE BARCELLOS (“A Eficácia
Jurídica dos Princípios Constitucionais”, p. 245-246, 2002, Renovar):
“(...) A meta central das Constituições modernas, e da Carta de 1988
em particular, pode ser resumida, como já exposto, na promoção do
bem-estar do homem, cujo ponto de partida está em assegurar as
condições de sua própria dignidade, que inclui, além da proteção dos
direitos individuais, condições materiais mínimas de existência. Ao
apurar os elementos fundamentais dessa dignidade (o mínimo
existencial), estar-se-ão estabelecendo exatamente os alvos prioritários
dos gastos públicos. Apenas depois de atingi-los é que se poderá
discutir, relativamente aos recursos remanescentes, em que outros
projetos se deverá investir. O mínimo existencial, como se vê,
associado ao estabelecimento de prioridades orçamentárias, é capaz de
conviver produtivamente com a reserva do possível.”
Cabe ressaltar que como decorrência causal de uma injustificável inércia
estatal ou de um abusivo comportamento governamental, aquele núcleo intangível
consubstanciador de um conjunto irredutível de condições mínimas necessárias a uma
existência digna e essenciais à própria sobrevivência do indivíduo, aí, então, justificar-
se-á, como precedentemente já enfatizado – e até mesmo por razões fundadas em um
imperativo ético-jurídico –, a possibilidade de intervenção do Poder Judiciário, em
ordem a viabilizar, a todos, o acesso aos bens cuja fruição lhes haja sido injustamente
recusada pelo Estado.
No caso em tela, presentes estão as condições elencadas por Alexy, a fim
de que se verifique o caráter definitivo do direito prestacional da parte autora. Citemos:
(i) a necessidade emergencial da aquisição do equipamento MESA
TRAÇÃO ORTOPÉDICA/ MESA RETRÁTIL, e o imediato início
de sua utilização para a prestação dos serviços pleiteados, tendo em
vista a alta demanda e a crescente fila de espera que a falta do
equipamento causou;
(ii) a inexistência de concorrência com os princípios da
discricionariedade administrativa ou legislativa (princípios formais),
pois não se está desafiando as determinações da Administração ou do
Legislador, e sim se está pleiteando tratamento médico adequado e
essencial, cuja prestação é de obrigatoriedade do Poder Público,
conforme as disposições mesmas do Poder Legislativo; no caso
vertente, o que se verifica é a prestação deficitária do serviço; e
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(iii) a inexistência de lesão às finanças da seguridade social (princípio
do equilíbrio orçamentário da seguridade social), pois assegurada a
cada um dos entes a utilização de meios judiciais e administrativos
para eventuais compensações financeiras, conforme a distribuição de
competência no âmbito do SUS.
Definitivo é, pois, o direito prestacional da parte autora.
6. DA ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA: NECESSIDADE DA
AQUISIÇÃO DO EQUIPAMENTO COM A MÁXIMA URGÊNCIA
A situação de que cuida o presente petitório mostra-se induvidosamente
adaptada à moldura normativa do artigo 273 do CPC, porquanto presentes os seus
pressupostos autorizadores genéricos: a prova inequívoca da verossimilhança da
alegação e o periculum in mora.
A prova inequívoca da plausibilidade do direito vindicado encontra-se
consubstanciada no acervo documental reunido da assistida cujo caso foi aqui
apresentado como paradigma, que demonstra a necessidade de urgente realização da
cirurgia e da própria declaração do HUUFMA que comprova o alto índice de procura,
conforme descrito no ofício HUUFMA NO 962/2014/SUPERINTENDÊNCIA. In verbis:
“É de inquestionável conhecimento público que, pacientes vítimas de
acidente de trânsito, constitui-se em verdade problema de Saúde
Pública, com aumento assustadoramente crescente do número de
acidentados e da complexidade das fraturas associadas. Portanto, em
virtude desta realidade das filas do serviço pleiteado, restou
evidenciado a necessidade do uso do equipamento indicado e
defendido pelo profissional deste HU, proporcionado para a
realização de osteossíntese das fraturas do fêmur proximal,
proporcionando abordagem mais segura e efetiva. O uso do
aludido equipamento, implica em menor tempo cirúrgico, menor
tempo de internação hospitalar, reabilitação funcional precoce e
diminuição do número de recuperação por falha
de osteossíntese. (grifo nosso).
Em face do todo exposto, o dano de difícil reparação se apresenta cristalino.
Não está apenas no plano do perigo abstrato, encontrando concretude na própria
natureza da necessidade do equipamento e na sobrecarga decorrente do
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comprometimento cada vez maior da saúde das pessoas que necessitam se submeter a
procedimentos cirúrgicos, mas são impedidos pela falta do instrumento elementar.
Demais disso, os danos causados pela falta do referido equipamento,
somados as sua condições socioeconômicas dos usuários da rede pública de saúde,
conduzem à tranquila conclusão de que há extrema necessidade de adquiri-lo com o
máximo de urgência, circunstância que garante o direito da concessão imediata do
mesmo, pois o contrário colaboraria com a ineficácia da prestação de saúde pública.
Desta forma, a antecipação dos efeitos da tutela é medida de rigor, uma
vez comprovadas as condições necessárias, bem como devidamente circunstanciado
o periculum in mora.
7. DOS PEDIDOS:
Por todo o exposto, a DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO requer:
1. O benefício da gratuidade de justiça, consoante a Lei nº
1.060/50, e a observância das prerrogativas dos Defensores Públicos
Federais, como as intimações pessoais e a contagem em dobro de
todos os prazos, à luz do disposto no parágrafo 5º, do artigo 5º, da
Lei nº 1.060/50 e no artigo 44 da Lei Complementar nº 80/94;
2. A citação, na pessoa de seus respectivos representantes legais, da
UNIÃO FEDERAL, do ESTADO DO MARANHÃO, do
MUNICÍPIO DE SÃO LUÍS e da FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE
FEDERAL DO MARANHÃO (HUUFMA), para, querendo,
apresentarem defesa no prazo legal, sob as penas da lei;
3. Intimação do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, para
acompanhar o presente feito como fiscal da lei, conforme art. 5º,
parágrafo 1º, da Lei 7.347/1985;
4. A antecipação dos efeitos da tutela pretendida, consistente na
imputação da obrigação aos réus de comprar, instalar e garantir a
operacionalidade e a manutenção do equipamento MESA DE
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TRAÇÃO ORTOPÉDICA / MESA RETRÁTIL tecnicamente
descrito nas fls. 9 a 11 desta peça, com todas as especificações
necessárias, no prazo de até 30 (trinta) dias, ou em outro reputado
mais adequado por Vossa Excelência, fixando-se, ainda, multa diária,
para a hipótese de descumprimento total ou parcial do provimento
liminar, no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), a ser depositada em
conta bancária aberta por este MM. Juízo (art. 13, parágrafo único, da
LACP), e mantendo-se os efeitos da medida de urgência até o trânsito
em julgado da decisão final de mérito;
5. Sejam, ao fim, julgados totalmente procedentes os pedidos ora
deduzidos, confirmando-se a condenação dos réus na obrigação de
comprar, instalar e garantir a operacionalidade e a manutenção
do equipamento MESA DE TRAÇÃO ORTOPÉDICA / MESA
RETRÁTIL tecnicamente descrito nas fls. 9 a 11 desta peça, com
todas as especificações necessárias, no prazo de até 30 (trinta) dias,
ou em outro reputado mais adequado por Vossa Excelência, fixando-
se, ainda, multa diária, para a hipótese de descumprimento total ou
parcial da sentença, no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), a ser
depositada em conta bancária aberta por este MM. Juízo (art. 13,
parágrafo único, da LACP); e
6. A condenação dos réus ao pagamento das custas processuais e
dos honorários de sucumbência a favor da DPU;
Protesta provar o alegado por todos os meios de prova em direito admitidos.
Dá-se valor à causa de 150.000,00 (cem e cinquenta mil reais)
Termos em que pede e aguarda deferimento.
São Luís, 28 de janeiro de 2015.
YURI COSTA
Defensor Público Federal
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