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Acórdãos STJ Acórdão do Supremo Tribunal de JustiçaProcesso: 02A3446
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: RIBEIRO COELHO
Nº do Documento: SJ200212050034461
Data do Acordão: 05-12-2002
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: T REL LISBOA
Processo no Tribunal
Recurso:
719/02
Data: 21-03-2002
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA.
Sumário :
Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:
"A" pediu em acção declarativa proposta no Tribunal Judicial de Benavente a
condenação de B - SOCIEDADE DE DESENVOLVIMENTO E
INVESTIMENTO, S. A. a pagar-lhe 9.700.000$00 a título de indemnização
por danos patrimoniais por lucros cessantes e mais 20.000.000$00 a título deindemnização por danos não patrimoniais, tudo porque a ré tem procedido à
venda em Portugal de produtos de uso veterinário que a autora comercializa em
Portugal depois de ter obtido autorização da Direcção-Geral de Veterinária.
A ré contestou no sentido da improcedência da acção, seguindo-se réplica,
saneamento, condensação e audiência de julgamento, após a qual foi proferidasentença que absolveu a ré do pedido de indemnização por danos patrimoniais
e, quanto aos não patrimoniais, a condenou a pagar o que em liquidação
preliminar à execução de sentença viesse a ser apurado.
Ambas as partes apelaram, vindo a Relação de Lisboa a proferir acórdão em
que alterou a sentença no sentido de condenar também a ré a pagar à autora,
como indemnização por danos patrimoniais, a quantia que em liquidação
preliminar à execução de sentença viesse a ser apurada, no mais mantendo o
decidido.Daqui trouxe a ré este recurso de revista em que, pugnando pela sua absolvição
do pedido, formula as seguintes conclusões ao alegar:
1. Atenta a matéria de facto assente, a autora não logrou cumprir o ónus de
provar que, por qualquer acto imputável à ré, ora recorrente, a sua credibilidade
comercial tenha ficado abalada.
2. A resposta "não provado" ao quesito 9º condensa de modo decisivo,
imutável e incontornável, a clara demonstração de que a autora não logrou
evidenciar a ocorrência de quaisquer factos em que se pudesse fundar uma
condenação da ré em danos morais.
3. Ao assim não ter entendido, o douto acórdão recorrido violou o disposto nos
arts. 668º nº 1 al. c) do CPC e 496 do CC.4. Por tal razão deve ser substituído por outro que absolva a ré quanto à
condenação em danos morais.
5. Por outro lado, a autora não dispunha de qualquer direito que pudesse
invocar contra a ré relativo à exclusividade da comercialização dos produtos emquestão.
6. A prática de eventuais contra-ordenações por parte da ré é irrelevante para a
apreciação do litígio dos autos entre a autora e a ré.
7. O tribunal comum é incompetente em razão da matéria para apreciar a
existência de eventuais contra-ordenações, sendo certo até que nos autos não
está feita a demonstração de confirmação por decisão transitada em julgado,
emanada de autoridade administrativa ou jurisdicional competente, da dita
prática.
8. O que a ré fez foi vender nas suas lojas um produto livremente importado,
vendido directamente pelo fabricante/exportador, e ignorando se entre este e a
autora havia ou não algum contrato ou exclusivo de comercialização.9. Além do mais não foi feita qualquer demonstração do nexo de causalidade
entre as quebras de vendas da autora e a actuação da recorrente.
10. O comportamento da ré não é subsumível à previsão normativa do art. 260º
do CPI, o qual constitui assim a norma substantiva violada pelo douto acórdãode que se recorre.
Houve resposta em que a recorrida defendeu a improcedência do recurso.Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
Não sendo questionados os factos que vêm dados como apurados, e visto que
os mesmos não levantam problemas que devam ser oficiosamente abordados,remete-se, quanto à sua enunciação, para a sentença da 1ª instância, nos termos
dos arts. 713º, nº 6 e 726º do CPC - diploma do qual serão os preceitos quedoravante referirmos sem outra identificação -, já que de igual faculdade usou o
acórdão recorrido.Consistem, no essencial, no seguinte:1. A autora comercializa desde 1993 produtos de uso veterinário da marca
Canitex - anti-parasitários de uso externo para cães e gatos - que registou naDirecção-Geral de Veterinária, a qual só à autora concedeu autorização, única
no mercado português, para a respectiva venda; 2. Os clientes da autora sabiam que só esta é titular de autorização para
introdução dos produtos em causa no mercado português;3. Entre Abril de 1996 e Junho de 1997 a ré vendeu os mesmos produtos,
importados directamente da Bélgica;4. Por causa desta prática foram instaurados à ré pelo menos dois processos de
contra-ordenação;5. A ré obteve daquela Direcção-Geral informação sobre o número eidentificação do proprietário da autorização de venda desses produtos no
mercado português, apondo essas mesmas indicações nas embalagens;6. Os produtos em causa surgiram nos estabelecimentos da ré na altura em que
os clientes fazem habitualmente as encomendas destes produtos, que sãosazonais, com utilização nas épocas mais quentes;
7. Em consequência directa da actuação da ré vários clientes da autora, em1996 e 1997, cancelaram encomendas já feitas;
8. Nesses anos diminuíram as receitas da autora, que por isso deixou de ganharquantia que não foi possível apurar;
9. Relativamente ao champô anti-parasitário, a ré pô-lo à venda para cães e
gatos com o rótulo dizendo que a autora é a responsável pela sua introdução nomercado, sendo certo que a autora apenas detém, quanto a ele, autorização
para cães.
Não se fez constar acima, a propósito da autorização concedida à autora pelaDirecção-Geral de Veterinária, uma asserção feita nas instâncias, segundo a
qual sem essa autorização não poderia ser feita a venda dos produtos em causa.Na verdade, esta afirmação corresponde a uma questão de direito, por isso
devendo ser tida como não escrita; só os factos está este STJ obrigado arespeitar e considerar, sendo livre quanto à selecção, interpretação e aplicaçãodo direito.
Como é orientação constante e pacífica, em sede de recurso o tribunal "adquem" apenas tem que tratar das questões que esgotam a delimitação objectiva
feita pelas partes quanto ao âmbito do recurso, expressa, seja nas matérias queo recorrente leva às conclusões, seja nas que o recorrido aborde ao abrigo do
art. 684º-A, nº 1 e 2.Só as questões assim enunciadas poderão levar a que em recurso se revogue ou
altere a decisão recorrida, ressalvada, porém, a possibilidade de tal ter aindalugar por virtude da apreciação de outras questões que, não tendo sido
suscitadas pelas partes, o tribunal "ad quem" possa abordar oficiosamente.Assim, temos que apreciar a objecção que contra a condenação emindemnização por danos não patrimoniais vem levantada com base na falta de
verificação de abalo na credibilidade comercial da recorrida - conclusões 1ª a4ª - e, quanto à condenação em indemnização por danos patrimoniais, quatro
objecções: a inexistência de qualquer direito exclusivo da recorrida àcomercialização dos produtos em causa, a irrelevância de eventuais contra-
ordenações, a incompetência do tribunal para afirmar a existência destas e afalta de nexo de causalidade entre as quebras de vendas que sofreu e a conduta
da recorrente - conclusões 5ª a 10ª.Nas conclusões 1ª a 4ª a recorrente sustenta não estar provado que a recorridatenha visto a sua credibilidade comercial abalada por virtude do comportamento
da recorrente, designadamente por força da resposta negativa dada ao quesito
9º, daí extraindo impor-se a sua absolvição quanto ao pedido de indemnizaçãopor danos não patrimoniais.
Refere, a este propósito, ter sido violado o disposto nos arts. 496º do CC e
668º, nº 1, al. c).
Na base instrutória foi incluído um quesito - o 9º - onde se perguntou se emconsequência da actividade da ré a credibilidade da autora no mercado ficou
fortemente abalada.
Teve este quesito a resposta de "não provado"; como fundamentação, no
despacho respectivo disse-se que "... do depoimento dos clientes da A. resultouque a actividade da A. não pôs em causa a sua credibilidade, apenas porque as
condições de mercado não eram vantajosas deixaram de lhe adquirir os
produtos". Esta resposta foi já no acórdão recorrido rectificada no sentido derespeitar à "actividade da R." a referência por evidente lapso material nela feita à
"actividade da A.".
Na sentença disse-se, a propósito dos danos não patrimoniais, que a ré usara
abusivamente o nome da A., responsabilizando-a pela comercialização de umproduto para o qual a A. não dispunha de autorização e criando confusão junto
produto para o qual a A. não dispunha de autorização e criando confusão junto
da clientela desta, que viu abalada, assim, a sua credibilidade comercial.E, perante a objecção levantada contra isso na apelação da ora recorrente, o
acórdão recorrido entendeu que "... a normatividade impõe discriminar os factos
«provados e indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes»,simultaneamente na «fundamentação da sentença, o juiz tomará em conta os
factos admitidos por acordo, provados por documento e os que o tribunal
colectivo deu como provados, fazendo o exame crítico das provas de que lhe
cumpre conhecer ... . ... Sendo, pois, notório que se a credibilidade não foiabalada perante as testemunhas «clientes da A.», como se expõe na motivação,
ela foi mesmo abalada em termos de mercado e de prejuízo sofrido, como é
convicção postulada pelo exame crítico a respeito".
A este respeito há que fazer duas ordens de considerações.Fazendo uma clara distinção entre sentença injusta e sentença nula, José Alberto
dos Reis escreveu em Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, pg. 122, que
aquela "... enferma de erro de julgamento ..." e que esta "... enferma de erro deactividade (erro de construção ou formação)".
As nulidades previstas no art. 668º, excepção feita à falta de assinatura, são
vícios que afectam de modo intolerável a clareza e o rigor lógico do raciocínio
do julgador, ou que o levam a não cumprir aquilo que é seu dever face aoprincípio do dispositivo, que é dominante no nosso direito processual: decidir
tudo aquilo que, e também apenas aquilo que, lhe é pedido pelas partes.
Por isso, o eventual desacerto do julgador que se não integre numa das
nulidades que a lei taxativamente indica pode determinar um erro de julgamentomas não é enquadrável em termos de teoria das nulidades.
O acórdão recorrido aceitou a afirmação, constante da sentença, segundo a
qual a credibilidade comercial da ora recorrida fora abalada pela conduta da orarecorrente. E por isso, coerentemente, pôde partir desse abalo para dar como
verificados danos não patrimoniais merecedores de indemnização.
Este raciocínio mostra, com toda a evidência, que se não vislumbra no mesmo
acórdão qualquer contradição entre os fundamentos e a decisão; o que sucede,diversamente, é que a recorrente entende que um dos fundamentos - a
existência real daquele abalo da credibilidade da recorrida - se não verifica e
que, por isso mesmo, a decisão é contrária ao que, na sua perspectiva, devia
ser. Mas os fundamentos, designadamente os de facto, a considerar na ópticada nulidade por contradição de uma decisão final de mérito são os que nela são
feitos constar, e não os que figuram numa outra decisão de onde possam provir
- nomeadamente o despacho proferido na 1ª instância com as respostas à baseinstrutória.
Se o acórdão recorrido teve como assente aquele abalo na credibilidade da
recorrida - no que seguiu o que foi dito na sentença - e assim se distanciou do
que fora consagrado nas respostas à base instrutória, pode ter cometido comisso um erro de julgamento, mas não a nulidade que vem arguida.
Mas a regularidade processual assim por nós afirmada nesta perspectiva não
resolve, por si, o outro enquadramento que importa analisar.
O acórdão recorrido aceitou que a afirmação da realidade do abalo dacredibilidade da recorrida tivesse sido resultante do exame crítico das provas a
que na sentença se teria procedido.
Saliente-se que no texto da sentença nada revela que tal se tenha feito, já que asobredita afirmação não surge na sequência de considerações feitas sobre o
sobredita afirmação não surge na sequência de considerações feitas sobre o
conteúdo de quaisquer provas.Nem seria, a nosso ver, correcto que a este propósito tivesse operado nesta
fase um exame crítico de provas produzidas em audiência.
Como se assinalou no acórdão recorrido, em dois momentos processuais
diversos a lei de processo manda que o juiz proceda ao exame crítico dasprovas.
O primeiro é o previsto no art. 653º, nº 2, que se refere ao exame crítico das
provas que tem lugar quando, finda a produção de prova em audiência, seprocede à sua valoração para daí se partir para a decisão sobre o que está ou
não está provado; este exame não deverá, porém, recair sobre provas que
tenham força plena, já que, de acordo com o art. 646º, nº 4, se terão por não
escritas as respostas dadas sobre factos que estejam plenamente provados.O segundo é o previsto no art. 659º, nº 3; na fundamentação da sentença,
fazendo o exame crítico das provas de que lhe cumpra conhecer, o juiz tomará
em consideração, além dos factos admitidos por acordo e dos provados por
documentos ou por confissão reduzida a escrito, também aqueles que foramdados como provados em sede de respostas à base instrutória.
Assim, estes dois exames críticos divergem quanto ao seu objecto; por um lado,
naquele primeiro momento esse exame incide sobre as provas sujeitas à livreapreciação do juiz; por outro lado, no segundo momento tal exame incide
apenas sobre as provas de valor imperativamente fixado - alguns documentos e
confissão reduzida a escrito -, já que só estas estão por apreciar e o podem ser
com pleno conhecimento do seu teor.Afasta-se, pois, da realidade o acórdão recorrido quando considerou que a
afirmação daquele abalo na credibilidade da recorrida proviera de um exame
crítico de provas feito na sentença; nem desta se vê que tal exame tenha sido
feito com esse resultado, nem o poderia ter sido, dada a circunstância de nãoestarem então presentes perante o juiz as provas que em audiência haviam sido
produzidas.
E também nunca esse exame crítico poderia ter incidido sobre as provas que noproferimento da sentença podem ser sopesadas, dada a sua inexistência.
De tudo isto importa concluir que, não tendo esse facto sido regularmente
adquirido no processo, é legítima a reacção da recorrente quando diz que se
trata de facto a respeito do qual a recorrida não satisfez o ónus de prova quesobre ela recaía, como resulta do art. 342º, nº 1 do CC.
Não estando, assim, comprovado esse facto, desaparece a base em que
assentou a condenação proferida nas instâncias em indemnização por danos não
patrimoniais, que importa revogar.A propósito dos danos patrimoniais defende a recorrente, em primeiro lugar,
que a recorrida não era titular do exclusivo da comercialização dos produtos em
causa.E, na verdade, não era.
A ideia de exclusivo para a distribuição de determinado produto no mercado
envolve a existência de um acordo pelo qual ao distribuidor foi garantida essa
exclusividade por quem estava em condições de o fazer, nomeadamente o seufabricante, que assim fica obrigado a, no âmbito geográfico acordado, os não
facultar a outra entidade.
Nada disto foi alegado pela recorrida.
O que se passa é diferente, consistindo em a recorrida ser a única entidade que
O que se passa é diferente, consistindo em a recorrida ser a única entidade que
da Direcção-Geral de Veterinária obteve autorização para vender tais produtosno mercado português.
E nada mostra que a recorrente a não pudesse também ter obtido dessa
entidade.
Ao tornar-se o único operador a conseguir tal autorização a recorrida nãoobteve um exclusivo comercial; apenas terá sido a única entidade a habilitar-se a
desenvolver dentro da legalidade uma determinada actividade comercial.
Quanto às contra-ordenações - segunda e terceira questões levantadas quanto à
condenação por danos patrimoniais -, apenas se sabe que a recorrente foi alvode dois processos, mas ignora-se a que conduziram.
E, embora ao tribunal se não pudesse negar competência para aqui apreciar o
cometimento dessa contra-ordenações - já que tal seria permitido porque se
situaria apenas na óptica da averiguação de factos com interesse para um juízo
sobre os direitos subjectivos aqui discutidos, e não da sua punição -, a verdadeé que se torna irrelevante e sem interesse essa perspectiva.
Está em causa saber se a recorrida é titular de um direito de crédito sobre a
recorrente advindo de responsabilidade civil em que esta teria incorrido por
violação de norma tuteladora de interesses alheios, e não por violação de um
direito absoluto daquela.
A proibição de venda de produtos de uso veterinário sem autorização da
Direcção-Geral de Veterinária consta de normas de perigo abstracto - cfr. art.18º do DL nº 62/91, de 1/2, e art. 26º do Regulamento do Fabrico,
Importação, Comercialização e Utilização de Produtos Biológicos para Uso
Veterinário, aprovado pelo DL nº 76/87, de 13//2, tendentes, como se vê do
preâmbulo do primeiro, a garantir a defesa do consumidor e a assegurar a
qualidade de vida das populações -, que visam a tutela de interesses gerais da
colectividade.
Nada tem que ver com a salvaguarda dos interesses dos comerciantes que
hajam obtido a autorização eventualmente necessária para a comercializarprodutos de venda legalmente condicionada, pelo que os interesses daqueles
comerciantes, prejudicados pela actuação concorrencial assim desenvolvida,
não podem ser tidos como directamente prejudicados pela sua violação.
A haver esses prejuízos, os mesmos não se registam no círculo de interesses
privados que a lei condicionadora visa tutelar - cfr. Antunes Varela, Das
Obrigações em Geral, Vol. I, 10ª edição, pgs. 540-542 -; a sua causa
juridicamente relevante é aquela actuação concorrencial, e não a infracção aesta lei.
A quarta questão levantada a respeito dos danos patrimoniais - a da não
demonstração de nexo de causalidade - apresenta-se como infundada.
Na verdade, se por efeito directo da conduta da recorrente alguns clientes seus
cancelaram encomendas já feitas, é evidente que a recorrida deixou de alcançar
as receitas que a esses fornecimentos corresponderiam.
Em função dos valores reais dos montantes dos ganhos a que estes dariam lugare das quebras registadas em 1996 e 1997 - cujos valores se não conhecem
ainda -, a não ocorrência de tais cancelamentos sempre teria minorado ou, até,
impedido essas quebras.
O que patenteia um prejuízo adveniente da conduta da recorrente e que, se não
fora esta, se não teria registado.
Não pode negar-se, pois, aquele nexo de causalidade.
Não pode negar-se, pois, aquele nexo de causalidade.
O que se disse acima quanto à questão da titularidade de um direito exclusivo
por parte da recorrida não resolve, porém, definitivamente as coisas no sentido
da procedência do presente recurso.
Veja-se, em esboço sintético, o que no acórdão recorrido se pensou apropósito da indemnização por danos patrimoniais:
- a autora vende produtos para uso veterinário, para o que tem autorização da
Direcção-Geral de Veterinária;
- só a autora tem, em relação a eles, essa autorização e o exclusivo da sua
comercialização;
- a ré passou a vender os mesmos produtos sem controlo veterinário,
importando-os directamente da Bélgica, e neles fez referência não autorizada àautora;
- esta actuação integra o conceito de concorrência desleal;
- dela resultou o cancelamento de encomendas já feitas à autora e a quebra das
suas receitas.
Como se viu, a argumentação da recorrente, tal como as suas conclusões a
resumem, não toca num ponto determinante do acórdão recorrido, que é o de arecorrente ter feito referência não autorizada à recorrida - numa manifesta
alusão ao facto de aquela ter aposto nas embalagens dos produtos a indicação
do número e identificação da autora - e de isso traduzir concorrência desleal.
A afirmação genérica, feita pela recorrente na conclusão 10ª, de que a sua
conduta não integra o conceito de concorrência desleal deve, pela sua
vaguidade, ser entendida como corolário do que se disse nas conclusões
anteriores; assim, não exprime nem explica uma discordância, por razões aindanão expostas, em relação ao referido ponto do acórdão recorrido; na verdade,
este ponto não é contrariado ou rebatido por nada do que nas conclusões - ou
no arrazoado que as antecede - da recorrente consta.
Assim, o raciocínio do acórdão recorrido nesta parte não pode, pois, ser aqui
criticado - nem haveria, de resto, razão para o ser, dada a confusão que assim
se estabeleceu com os produtos comercializados pela recorrida, cuja imagem
ficou, deste modo, associada a outros que com ela nada tinham que ver, e dada
a existência de uma menção ostensiva do nome da recorrida; relevaria aqui,também, a desnecessidade de no ilícito civil de concorrência desleal ser
dispensável a intenção de causar prejuízo ou alcançar benefício ilegítimo, como
diz Oliveira Ascensão, Concorrência Desleal, pgs. 181-182 e 215.
Assim se considera insusceptível de crítica a afirmação, pelo acórdão recorrido,
de que houve concorrência desleal, nos termos do art. 260º, al. a) e c) do CPI.
As práticas concorrenciais desleais são ilícitas, tendo dado lugar, no caso, a que
a recorrida tivesse sofrido prejuízos nos termos acima descritos.O que leva a concluir que o acórdão recorrido, nesta parte, é de confirmar pelas
razões apontadas.
Por tudo o que fica exposto, concedendo-se em parte a revista, decide-se:
A) revogar o acórdão recorrido e a sentença na parte em que condenaram a
recorrente a pagar à recorrida uma indemnização por danos não patrimoniais,
absolvendo-se a recorrente desse pedido;
B) confirmar o mesmo acórdão no tocante à condenação da recorrente a pagarà recorrida uma indemnização por danos patrimoniais.
As custas desta revista serão suportadas, quanto a dois terços do seu montante,
As custas desta revista serão suportadas, quanto a dois terços do seu montante,
pela recorrida, que igualmente suportará nessa proporção as custas do
processamento das instâncias.
Quanto ao terço restante, e atenta a condenação proferida, quanto aos danos
patrimoniais, no que se liquidar em fase preliminar da execução, vão as partes
condenadas provisoriamente em metade para cada uma, com acerto final a fazer
após aquela liquidação e em função do vencimento que aí se verificar.
Lisboa, 5 de Dezembro de 2002Ribeiro Coelho
Garcia Marques
Ferreira Ramos