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ALBERTINI, S. E. Metamorfoses do fórum popular de saúde FOPS:
participação política de saúde CuritibaPR, 1991/2001. São Paulo: Programa de
Pós Graduação em Serviço Social / Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,
Dissertação de Mestrado, 2002.
INTRODUÇÃO
O objeto desta pesquisa é o estudo da trajetória histórica do Fórum Popular de
Saúde de Curitiba FOPS na luta pela defesa de uma política pública no Município de
Curitiba, no período de 1991 a 2001.
O interesse que nos levou a realizar a presente pesquisa está diretamente
relacionada a nossa inserção no FOPS desde sua criação e, em determinado período,
na sua coordenação.
O FOPS foi criado em 1991 com o objetivo de intervir na política municipal de
saúde de Curitiba e mobilizar a sociedade civil na defesa da saúde pública e da
cidadania. O FOPS é composto por representantes de entidades e movimentos sociais
que envolvem movimentos de bairros, sindical e de saúde, bem como por profissionais
de saúde e conselheiros de saúde, locais e municipal.
A participação da comunidade na gestão do Sistema Único de Saúde SUS
foi regulamentada pela Lei n.º 8142/90, que estabelece duas instâncias de controle
social: Conferências de Saúde e Conselho Municipal de Saúde. O Conselho de Saúde é
composto por 50% de usuários, 25% trabalhadores de saúde e 25% prestadores de
serviços de saúde e gestores.
Em Curitiba, a lei criada pelo executivo municipal em 1991 feria os dispositivos
legais estabelecidos na Constituição Federal e na Lei n.º 8142/90, pois não respeitava a
composição paritária entre usuários e demais segmentos, bem como o princípio de
autonomia dos segmentes escolherem seus representantes.
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O FOPS nasceu contestando o autoritarismo do executivo municipal em nomear
as entidades que integrariam o Conselho e denunciando sua concepção de participação
da comunidade no controle e fiscalização da política de saúde.
Na trajetória histórica do FOPS durante os anos de 1991 a 2001, vários foram
os embates travados entre esse Movimento e a Secretaria Municipal de Saúde em torno
da defesa da saúde pública e da democratização do Estado.
Destacamos a atuação sempre combativa do FOPS nas Conferências e no
Conselho Municipal de Saúde, acompanhando, fiscalizando e propondo ações para
melhorar o acesso e a qualidade dos serviços de saúde.
Para este estudo formulamos como hipótese central: o FOPS é uma expressão
das novas configurações do movimento social urbano e, ao longo dos diferentes
momentos de sua trajetória histórica, constituiuse num espaço de luta na defesa da
saúde pública e na construção da democratização da política de saúde em Curitiba
PR.
Visamos como objetivo geral, a sistematizar a trajetória histórica do FOPS e a
analisar a luta por ele travada nas Conferências e no Conselho Municipal de Saúde,
bem como as ações desenvolvidas junto à população na defesa da saúde pública no
município de Curitiba, no período de 1991 a 2001.
Do mesmo modo, objetivamos analisar a dinâmica interna do FOPS, seus
limites e possibilidades na construção de um movimento social na área da saúde.
Como referenciais para essa análise, concentramonos principalmente, nos
conceitos de movimento social, participação, controle social e Estado, desenvolvidos
por autores como Maria da Gloria Gohn, William Castilho Pereira e outros, que muito
contribuíram para iluminar o processo de constituição, de relações externas e internas
e das ações e lutas empreendidas durante dez anos pelo FOPS, em face dos
questionamentos de ordem identidária, política, organizativa etc. que fazem sobre os
movimentos sociais na atual conjuntura brasileira.
Definimos como abordagem metodológica para este estudo a pesquisa
qualitativa, em razão desta privilegiar e trabalhar com o "universo dos significados,
2
motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes o que corresponde a um espaço mais
profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser resumidos
aos dados quantitativos, embora não haja nenhuma oposição entre as dimensões
qualitativas e quantitativas" (MINAYO, 1994, p. 21).
A opção pelo modo de investigação, estudo de caso, justificase pela sua
adequação ao objeto em estudo. Esse método possibilitará uma investigação mais
completa do Fórum Popular de Saúde de Curitiba, propiciando uma compreensão mais
profunda sobre determinados momentos de sua trajetória histórica na defesa da saúde
pública de Curitiba.
"O estudo de caso reúne informações tão numerosas quanto possível com vistas
a compreender a totalidade de uma situação "( BRUYNE, 1977, p.225).
Segundo CONTANDRIOPOULOS o estudo de caso é uma estratégia pela qual
o pesquisador decide trabalhar sobre uma unidade de análise (ou sobre um pequeno
número de unidades). A observação do caso se faz pelo interior. O potencial
explicativo desta estratégia provém da coerência da estrutura das relações entre os
componentes do caso, e da coerência das variações dessas relações no tempo. O
potencial explicativo decorre, então, da profundidade da análise do caso e não do
número de unidades de análise estudadas. (CONTANDRIOPOULOS, 1994, p.41)
A metodologia da pesquisa compreendeu dois momentos complementares, a
coleta de dados e a elaboração da análise propriamente dita.
Para a coleta de dados utilizouse o levantamento bibliográfico referente ao
tema em estudo, bem como toda a documentação existente no FOPS, do Conselho
Municipal de Saúde, entre os quais: leis, atas, relatórios, boletins informativos,
material divulgado pela imprensa, além de entrevistas semiestruturadas. Para a
realização das entrevistas foram previamente definidos critérios para a seleção da
amostra dos sujeitos significativos.
Na pesquisa qualitativa, o critério de representatividade numérico não é o mais
importante. "Podemos considerar que uma amostra ideal é aquela capaz de refletir a
totalidade nas suas múltiplas dimensões" (MINAYO, 1996, p.103).
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Dentre esses critérios destacouse a necessidade de todos os entrevistados serem
representantes e participantes de movimentos sociais. Neste sentido, a coleta de dados
foi realizada com dois grupos de sujeitos significantes.
O primeiro grupo foi com 5 pessoas que participaram de movimento popular de
saúde nos finais da década de 70 e 80. Foram militantes e dirigentes de associações de
moradores, movimento dos médicos e militantes das comissões de saúde. O objetivo
de realizar as entrevistas com esses sujeitos foi no sentido de construir a história do
movimento social da saúde anterior ao FOPS que, posteriormente, a ele se integrou.
Objetivando a construir a trajetória histórica do FOPS na luta pela defesa da
saúde pública em Curitiba, o segundo grupo pesquisado constituise de dois
trabalhadores da saúde e três usuários. Entre estes, quatro fizeram parte desde sua
criação, como também foram conselheiros de saúde. O perfil dos entrevistados
encontrase em anexo.
Foi necessário também fazer uma entrevista com a Diretora do Departamento
de Informação em Saúde da Secretaria Municipal de Saúde de Curitiba, afim de obter
informações a respeito da Política Municipal de Saúde.
Quanto ao momento de elaboração da análise dos dados coletados, à luz dos
conceitos referenciais, utilizamos principalmente a análise histórica da trajetória do
FOPS.
A dissertação apresenta como estrutura redacional 3 capítulos seqüenciais
O primeiro capítulo, intitulado "Movimentos Sociais na Realidade Brasileira:
Uma Aproximação Histórica," aborda um breve histórico dos movimentos sociais
contexto brasileiro nas décadas 70, 80, 90, bem como as referências conceituais
presentes na constituição desses sujeitos coletivos. O capítulo aborda ainda os
Movimentos Sociais na Saúde com ênfase naqueles que têm por objetivo a defesa da
saúde pública no Brasil: o Movimento da Reforma Sanitária e o Movimento Popular
de Saúde MOPS.
No segundo capítulo, "Curitiba PR Aspectos Históricos do Setor de Saúde,
abrange a caracterização do município de Curitiba, a construção da política municipal
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de saúde na esfera do executivo municipal e a organização e mobilização do
movimento popular de saúde de Curitiba que se configurou nas comissões de saúde na
década de 80.
O terceiro capítulo, "O Fórum Popular de Saúde de Curitiba FOPS Um
Movimento na Saúde" trata da trajetória histórica do FOPS desde seus antecedentes,
em 1990, até o ano de 2001. Inclui ainda os desafios e perspectivas no processo de
reafirmação como movimento social de defesa da saúde e da cidadania.
Nas considerações finais pontuamos as principais metamorfoses do FOPS na
sua diversificada experiência de lutas como um sujeito coletivo na realidade municipal
de Curitiba, tendo em vista a concretização da política de saúde, como direito básico
de cidadania.
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I MOVIMENTOS SOCIAIS NA REALIDADE BRASILEIRA: UMA APROXIMAÇÃO HISTÓRICA
1 PRINCIPAIS REFERÊNCIAS CONCEITUAIS SOBRE MOVIMENTOS SOCIAIS
A intenção inicial é apresentar um breve histórico dos estudos sobre
Movimentos Sociais, ou melhor as principais categorias teóricas presentes na produção
brasileira nas décadas de 70, 80 e 90.
O Fórum Popular de Saúde, tema desta pesquisa, configurase como uma
expressão dos movimentos sociais, construído a partir de uma problemática social, de
uma necessidade coletiva, que é a luta pela saúde pública.
A temática dos Movimentos Sociais é uma área clássica do estudo da
Sociologia e da Política, tendo lugar de destaque nas ciências sociais. Atualmente,
outras áreas do conhecimento vêm realizando pesquisas, estudos, como a Psicologia
Social, Antropologia, Educação e Serviço Social.
"O termo Movimentos Sociais surgiu com Lorenz Von Stein, por volta de 1840,
na Alemanha, ao evidenciar a necessidade de um ramo da ciência social que se
voltasse para o estudo dos MS da época, como o movimento operário e o socialismo
emergente" (SILVA, p.15, 2001).
A partir de 1940 cresce o interesse de pesquisadores nesta área, especialmente
Touraine, que defende uma Sociologia dos movimentos sociais. Na década de 50, a
Sociologia acadêmica incorpora as contribuições do marxismo à análise dos
movimentos sociais, compreendendoos como auxiliares na transformação social.
Os movimentos sociais urbanos foram objeto de estudos e pesquisa por muitos
cientistas sociais brasileiros1 que adotaram na época como principais referências
analíticas, autores europeus, entre os quais: M. Castells, Touraine, Jean Lojkine etc.
Neste trabalho fundamentamonos principalmente na obra da Maria da Glória Gohn,
1 Destacamse Maria da Glória Gohn, José Álvaro Moisés, Silvio Caccia Bava, Vera Telles, Ruth Cardoso, Lúcio Kovarick e outros
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uma renomada estudiosa dos Movimentos Sociais do Brasil, para apresentar as
referências conceituais dos movimentos sociais dos anos 70 até presentemente.
Manuel Castells concentrou seus estudos na concepção estrutural de análise
marxista da realidade social, relacionando o movimento social com a problemática
econômica e política do capitalismo, assim como relacionandoo com a questão
urbana.
"A problemática dos Movimentos Sociais situase, para Castells, num plano
duplo, a saber, de um lado, na análise dos processos sociais de mudança e dos modos
de consumo coletivo; de outro, nas articulações entre as novas contradições sociais que
emergem na sociedade capitalista e as contradições econômicas e políticas que se
encontram na base de sua estrutura social " (GOHN, 2000, p.191).
A conjuntura dos anos 80 contribuiu para a revisão do referencial teórico
marxista em sua vertente estrutural adotado por Castells para explicar os movimentos
sociais. "O autor ressalta que os MS possuem limites políticos e técnicos. Estão
sujeitos ao jogo do clientelismo político, em troca do atendimento de demandas
imediatas. No entanto, em termos de possibilidades, os MS são fundamentais para uma
gestão democrática da cidade e um processo de reforma urbana democrática, porque
são os que detectam as reais necessidades coletivas" (SILVA, 2001, p.27).
BORJA define movimentos urbanos reivindicatórios como as ações coletivas da
população enquanto usuária da cidade, quer dizer, de habitações e serviços, ações
destinadas a evitar a degradação de suas condições de vida, a obter a adequação destas
às novas necessidades ou a perseguir um maior nível de equipamento. Estas ações dão
lugar a efeitos urbanos (modificação da relação da população com o poder no sistema
urbano) específicos, que podem chegar a modificar a lógica do desenvolvimentos
urbano (BORJA2 Apud GOHN,2000, p.196).
BORJA distingue três tipos de conflitos que geram os movimentos sociais
urbanos. O primeiro envolve o Estado e a população que reivindica os equipamentos
coletivos e moradia. O segundo é o conflito entre o Estado e os capitalistas privados
2 BORJA, Jordi. 1975. Movimentos sociales urbanos. Buenos Aires, Ed.SIAP
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em relação à reprodução dos meios de produção da força de trabalho, uso da terra
urbana, políticas urbanas etc. O terceiro tipo de conflito relacionase com a
competição entre os capitalistas, entre o grande e o pequeno capital, entre os setores
rentistas e os diretamente produtivos.
Jean Lojkine compreendia os movimentos sociais como o lugar de
decomposição da hegemonia dominante, aparecendo no lugar uma nova hegemonia.
"Portanto, os movimentos sociais são vistos como o mais alto grau de expressão da
luta de classes, com poderes não apenas de oporse à classe dominante, mas também, e
fundamentalmente, de elaborar uma contrahegemonia" (GOHN, 2000, p.198). Os
movimentos sociais, enquanto expressão as luta de classes, necessitariam de um
partido político capaz de representar os interesses das classes dominadas.
O que predominou nos anos 70 e no início dos anos 80 foram as análises de
cunho marxista para os movimentos sociais, influenciadas por Castells, Borja e
Lojkine. Nos anos 80 Castells se aproxima das idéias de Touraine que no final da
década de 70 deixa de priorizar seus estudos sobre a classe operária, passando a
analisar a ação social de outros grupos. Para o autor, os movimentos sociais são frutos
de uma ação coletiva. O paradigma teórico alicerçase na teoria da ação social.
Os movimentos sociais são frutos de uma relação de produção e organização
social, uma relação dupla de identidade e oposição e não se dirigem fundamentalmente
contra o Estado, pois não são lutas por conquistas do poder.
A concepção de Estado do autor é aquela que não se reduz a ser o monólito da
violência e da busca da legitimação, mas uma força social de mudança histórica.
Nesse sentido, o Estado, ao responder as demandas colocadas pelos
movimentos sociais, "estaria abrindo caminhos para a mudança pela
institucionalização de novas formas de relações. Os movimentos têm o papel mais de
agentes de pressões sociais do que de atores principais de transformações sociais
propriamente ditas" (GOHN, 2000, p.147).
Touraine ainda concentra sua atenção na sociedade civil, como um "locus"
potencialmente privilegiado de transformação. Para o autor, a sociedade civil, não tem
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como único objetivo contraporse ao Estado, o mais importante é a transformação da
sociedade civil via movimentos sociais. É no interior da sociedade civil que os
movimentos sociais, prioritariamente, buscam formas de questionamento e de
transformação através de significantes culturais, étnicos, etários, ecológico, de gênero
etc.
O ano de 1980 marcará, segundo GOHN algumas mudanças nas análises sobre
movimentos sociais urbanos. Segundo a autora, as causas estão na conjuntura
sociopolítica explosiva dos anos 78/79, no surgimento de inúmeros movimentos e
formas organizativas populares e na publicação de textos importantes, que serviram de
subsídio às análises da realidade urbana, como as de Lucio Kovarik, sobre espoliação
urbana. O referencial teórico predominante continua a ser o marxista com enfoque na
análise das contradições sociais, embora já se iniciasse um processo de crítica a este
esquema (GOHN, 2001, p.276).
Produções teóricas sobre as classes populares, novas abordagens se incorporam,
vindas vindo de conceitos e noções utilizadas na Antropologia e na Educação Popular.
Alguns pesquisadores brasileiros fazem críticas a concepção de Castell e
Lojkine e estudaram a linha de abordagem da institucionalização, retomando as
análises de comportamento de grupos e estudos de organizações, baseadas em teorias
com campo maior de desenvolvimento nos Estados Unidos.
Frente à conjuntura política na década de 80, começouse a questionar o caráter
dos movimentos sociais e a despertar nos pesquisadores brasileiros o interesse de
investigar outros movimentos sociais, entre eles mulheres, índios, ecológicos, negros.
Esses movimentos reivindicavam igualdade e liberdade em termos de raça, gênero e
sexo.
No anos 80, as análises sobre os MS serão influenciadas por Foucault (1981),
Guattari (1985) ou Castoriadis, Cohn Bendict (1981), Melucci (1989) etc. "O novo
movimento europeu adivinha basicamente de camadas sociais que não se encontravam
em condições de miserabilidade, se organizavam em torno das problemáticas das
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mulheres, dos estudantes e contrapunham aos movimentos clássicos, dos operários"
(GOHN, 2000, p. 284).
O denominador comum nas análises dos novos movimentos sociais no Brasil
foi a abordagem culturalista em contraposição à marxista, presente com mais força na
análise dos movimentos populares.
Aos poucos, as análises passam a priorizar a construção da identidade coletiva
dos grupos e a deixar de lado as questões das contradições urbanas e dos meios
coletivos de consumo.
A corrente de pensamento sobre os "Novos Movimentos Sociais" surgiu na
Europa a partir dos anos 60 e, no Brasil, na década de 70.
Os autores que contribuíram para este pensamento foram: Alain Touraine, Félix
Guattari, Michel Foucaut, Alberto Melucci, Cornelius Castoriadis, Jürgen Habermas,
Tilamn Evers.
Nas obras dos autores citados, há elementos em comum na análise dos movimentos coletivos, tais como: a existência de tensões na sociedade de classe, a identificação de promissoras mudanças sociais oriundas desses movimentos, a constatação de estágios nas transformações de valores, do sistema social, e de novos delineamentos políticos e culturais. É diversa a concepção por eles atribuída aos grandes temas como: Estado, sociedade civil, indivíduo e coletividade, de classe social, relações de trabalho, instituições sociais, ideologia, anomia etc. (PEREIRA, 2001 p.92).
Félix Guatari enfatiza a importância do elemento subjetividade para
compreender o grau de reprodução dos valores da sociedade capitalista que vão sendo
introjetados nos indivíduos, caracterizandose por um individualismo exacerbado,
infantilização, atomização das relações e desqualificação da solidariedade.
Guatari, entende que o grau de penetrabilidade da máquina capitalista é grande,
inserindose em todos os espaços sociais e institucionais, enfatizando que até mesmo
os espaços de luta revolucionária, como partidos políticos e sindicatos, aderiram às
formas fascistas do controle do poder em seus organismos. Afirma ele: "O que se faz
necessário é criar revoluções moleculares no âmbito das lutas de interesse político e
social, visando a reconstruir os outros movimentos tradicionais e reinventando
territórios no cotidiano coletivo" (PEREIRA, 2001, p.98).
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A partir dessa concepção o autor considera que um processo de transformação
revolucionário exige um processo de revolução cultural.
Castoriadis concorda com o pensamento de Touraine e Guattari quanto à
necessidade do fortalecimento da sociedade civil, "passando pela criação de
movimentos sociais autônomos, o que possibilitaria à sociedade contemporânea
romper com os esquemas de opressão e alienação humanas decorrentes do capitalismo
e construir uma nova sociedade" (PEREIRA, 2001, p.100).
Habermas, por sua vez, vê os movimentos sociais como atores fundamentais na
defesa do fortalecimento da sociedade civil. Os movimentos representariam a
tentativa de conquista, pela sociedade civil, de um papel ativo na produção das suas
próprias formas de vida, de instalação de novos elos institucionais, de adoção de
diferentes meios culturais.
Nos anos 90, com a alteração nas pesquisas e estudos sobre MS, os citados
estudiosos acima passam a se preocupar predominantemente com os problemas de
violência, exclusão social ou com novas práticas civis. A centralidade da maioria dos
estudos passa a ser a rede de ONGs e os mecanismos institucionais da democracia
participativa.
Outro fato na conjuntura que também alterou a relação Movimentos sociais e
Estado é a vitória eleitoral dos partidos de esquerda na década de 90. Os movimentos
sociais que na década de 70 se colocavam como adversários do Estado, nesta
conjuntura passam a ser seu principal interlocutor. As categorias básicas de estudo são:
a cidadania coletiva e a exclusão social.
"Em relação às influências teóricas e aos paradigmas adotados, a crise das
esquerdas, do movimento, dos modelos socialistas do Leste Europeu deixam como
saldo um certo abandono das teorias macroestruturais, que enfatizavam a
problemática das contradições sociais e viam nas lutas e movimentos um dos fatores
de acirramento daquelas contradições" (GOHN, 2000, p. 288).
Segundo DAHRENDORF, o conflito social moderno já não se dá mais em
torno da eliminação das diferenças, porque o único "status" legalmente impositivo é a
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cidadania. Esse conflito "diz respeito ao ataque às desigualdades que restringem a
participação cívica integral por meios políticos, econômicos ou sociais e ao
estabelecimento de prerrogativas que constituam um "status" rico e integral de
cidadania" (DAHRENDORF3, apud GOHN, 2001 p. 289)
Os autores, em especial os considerados adeptos da teoria dos "novos
movimentos sociais", afirmam que os movimentos sociais são atores fundamentais
para o fortalecimento da sociedade civil.
É mister ainda explicitar alguns conceitoschave presentes em todas as
abordagens relacionadas aos movimentos sociais.
Estado e Movimentos Sociais
A relação entre Estado e Movimentos Sociais é um tema abordado por
estudiosos em toda a trajetória histórica dos movimentos sociais, mas é na década de
90, com o movimento de democratização das políticas sociais, que se vem ampliando
o debate em torno das questões da gestão de políticas públicas, participação, controle
social, sociedade civil e tantas outras que transitam no processo de luta pela
democratização do Estado.
Potyara (2001), ao tratar do tema Sociedade Civil e Estado, aponta três
questões para reflexão:
1) a de que o Estado não é um fenômeno unívoco, isto é, igual ou idêntico
em todos os momentos históricos e em todos os contextos sócioculturais e, por isso,
não expressa um conceito universal e absoluto;
2) a de que o Estado não é o criador da sociedade, mas, ao contrário, é
criatura desta;
3) a de que existem diferentes e competitivas doutrinas, teorias ou
concepções sobre o Estado e suas relações com a sociedade, bem como sobre a sua
índole e função social.
A partir dessas considerações, a autora faz uma síntese do Estado: Este não é
um fenômeno dado, aistórico, neutro, pacífico, mas um conjunto de relações criado e
3 DAHRENDORF, Ralf. O conflito social moderno. São Paulo: EDUSP, 2001
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recriado num processo histórico tenso e conflituoso, em que os grupos, classes ou
frações de classe se confrontam e se digladiam em defesa de seus interesses
particulares.
O conceito de Estado e sociedade civil, que adotamos complementares às
reflexões de Potyara, está baseado no contexto da tradição gramsciana da teoria
ampliada do Estado. Para Gramsci, o Estado comporta duas esferas: a sociedade
política, ou o Estado, no sentido estrito da coerção, a sociedade civil, constituída pelo
conjunto de organizações responsáveis pela elaboração e/ou difusão das ideologias,
como sindicatos, partidos políticos, Igrejas, sistema escolar, organização material da
cultura (imprensa, meios de comunicação de massa) e organizações profissionais. São
estas duas esferas que formam em conjunto o Estado no sentido amplo, nos termos de
Gramsci, sociedade política mais sociedade civil, vale dizer, hegemonia revestida de
coerção (GRAMSCI4 apud RAICHELIS, 2000, p.27).
Essas concepções contribuem para se entender que é no âmbito da sociedade
política e da sociedade civil que os diversos interesses se expressam, são confrontados
e negociados, revelando os projetos políticos postos nestas esferas de poder.
Participação social
O tema participação vem sendo muito utilizado na sociedade brasileira pelas
classes populares, governo e empresariado, embora tenha sentidos e significados
diferentes.
Atualmente, os empresários vêm adotando estratégias de integração dos
trabalhadores no processo de administração e planejamento das empresas,
incentivando a participação dos mesmos no processo de trabalho. Essa participação é
limitada e controlada na medida em que não altera a lógica do mercado capitalista, a
acumulação do capital.
Carvalho (2000) analisa a participação social no contexto político econômico e
social brasileiro:
4 GRAMSCI, A. Obras escolhidas. São Paulo: Marins Fontes, 1978
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- primeiro, caracteriza o modelo econômico como concentrador de renda e
riqueza em favor dos interesses da burguesia nacional e internacional,
gerando exclusão econômica e social da população brasileira;
- segundo, as políticas públicas brasileiras desempenham economicamente
um papel de manutenção da reprodução física ao nível do limiar de
sobrevivência, da maioria da população excluída dos interesses da economia
central.
A sua crítica da participação social na gestão das políticas públicas é que esta
não tem interferido na distribuição da renda e da riqueza nacional, enfim, não provoca
mudanças estruturais.
O autor caracteriza a participação nos conselhos de políticas públicas como
participação constrangida, seja porque essa não tem influência nas políticas
macroeconômicas, seja porque elas próprias têm verbas escassas comparando com
outras políticas governamentais.
Essa concepção tem sentido no momento em que a população participa dos
conselhos das políticas públicas e a pauta fica limitada àquela determinada política
setorial, não estabelecendo relação com outras políticas governamentais no âmbito das
esferas de governo. Concordamos com CARVALHO ao comentar que:
(...) as classes ou frações das classes populares quando conseguem, pelas suas mobilizações e lutas colocar como pauta na agenda política nacional temas de seus interesses de classe o governo tem agido de duas formas: ou ensaia cooptar as lideranças ou intelectuais orgânicos desses movimentos e ou organizações em luta, para que conciliem em negociações, favorecendo a classe dominante, ou impõe a repressão policialmilitar contra as manifestações, movimentos e organizações das classes populares em nome da democracia.(CARVALHO,2000, p.8)
A participação da população no espaço institucional para definir, acompanhar e
fiscalizar as políticas públicas é recente em nosso país.
Os representantes dos segmentos, principalmente os usuários, estão num
processo de conhecimento e decodificação de instrumentos fundamentais para o
exercício do acompanhamento e fiscalização da política pública, como o orçamento
público, planejamento, leis que regulamentam a política social etc.
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A informação é fundamental nesse processo para garantir a participação real.
SILVA acrescenta que: "...a questão não é só informar os cidadãos, mas tornar
transparentes e abertos os canais de participação. A informação aos cidadãos é
necessária, mas deve comportar a possibilidade de comunicação, diálogo e
interpretação como parte de um movimento permanente de interação entre Estado e
cidadãos usuários dos serviços públicos. (SILVA, 1.996, p.26)
Para se ter uma participação da sociedade na direção da democratização do
Estado, além da informação, que é um instrumento, importante é ter consciência
crítica, capaz de se contrapor, de dizer não as estratégias de manipulação imposta pelas
elites.
A participação de representantes de movimentos sociais de forma crítica nos
espaços de controle social no aparelho do Estado tem feito a diferença no sentido de
fiscalizar, denunciar, de articular a política setorial com a econômica. Essa forma de
atuar contraria os interesses de muitos governantes que impõe limites à população no
controle da política pública.
Uma das principais estratégias dos governantes é a cooptação dos
representantes dos usuários nos conselhos. "A participação de natureza cooptativa, é
uma das faces da forma de participação autoritária, é uma tática muito adotada nos
regimes democráticos visando a diluição dos conflitos sociais" (GOHN, 2001, p.17).
A concepção de participação política é tratada por Dalmo Dalari ao afirmar que:
"entre as mais eficientes formas de participação política estão os trabalhos de
conscientização e organização" (DALARI5, apud GOHN, 2001, p.26).
Este autor citado distingue, ainda, a participação em real e formal. Esta última
limitase aos aspectos secundários do processo político. A participação real é aquela
que influi nas decisões políticas fundamentais.
Os movimentos sociais intervém no espaço governamental com o intuito de
participar de forma real; nesse momento acontecem os embates, confrontos,
expressando as diferentes concepções de participação entre governantes e movimentos
5 DALLARI, D. A. O que é a participação política. São Paulo: Brasiliense, 1984.
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sociais. Nesse sentido, (...) "o controle social do Estado é um mecanismo de
participação dos cidadãos que, para ser efetivo, deve ter como alvos não apenas seus
centros periféricos, mas sobretudo aqueles que se destinam às decisões estratégicas e
ao próprio sistema econômico" (TEIXEIRA, 2001, p. 39).
As práticas dos movimentos sociais vão se expressando de diferentes formas,
ficando evidente na década de 90 uma expressiva participação dos movimentos sociais
no aparelho do Estado. O momento é propício para analisar a efetiva participação
desses sujeitos coletivos para ampliação da democracia do Estado Brasileiro.
2 ASPECTOS SIGNIFICATIVOS DA TRAJETÓRIA DOS MOVIMENTOS SOCIAIS NO BRASIL
A trajetória histórica dos movimentos sociais, nas décadas de 70, 80 e 90,
configurou suas características, estratégias de ação, alianças estabelecidas na
sociedade, as formas de reivindicar políticas públicas, direitos sociais, e as
transformações que foram ocorrendo diante da conjuntura econômica, política e social
do país.
Na década de 70 vivenciouse a retomada das lutas sociais que foram
interrompidas em 1964 com o golpe militar, período em que muitos líderes dos
movimentos sociais, dirigentes sindicais e políticos foram presos e entidades de defesa
de direitos coletivos, reprimidas e extintas. As Comunidades Eclesiais de Base, na
época, se constituíram num espaço possível para discutir os problemas das
comunidades e traçar alternativas frente ao Estado autoritário.
A população naquela década, reivindicava melhorias de infraestrutura nos
bairros, uma vez que o país se encontrava em franco processo de urbanização.
Reivindicavam água, luz, transportes, creches e outras necessidades de consumo
coletivo.
As péssimas condições de vida geradas pelo arrocho salarial e a pauperização
dos recém formados bairros foram os germes iniciais para aglutinação das camadas
populares.
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Diante dessa conjuntura, a população se organizou no Movimento do Custo de
Vida em São Paulo e outras capitais brasileiras, considerado um dos principais
movimentos da década de 70, ligado às ações da Igreja Católica, ala da Teologia da
Libertação. Fizeram diversas atividades, entre elas um abaixo assinado pedindo
congelamento dos gêneros alimentícios.
Frente à expansão das áreas periféricas e à falta de regularização dos
loteamentos, os moradores, em 1972, se organizam em torno da legalização dos lotes.
De início tentaram resolver este problema individualmente, mas o aumento dos casos
levou à constituição de uma ação coletiva, deflagrando um movimento social de
amplitude nacional.
A conjuntura política e econômica naquela década, além do desgaste político
dos militares, ocasiona um agravamento das condições de vida da população brasileira,
gerando insatisfação popular e provocando o surgimento de vários movimentos
populares de base.
O Estado Brasileiro, para abafar os conflitos sociais, implementa políticas
sociais, insuficientes frente à grave crise econômica. A população reage, ocupando
terras, promovendo saques, denunciando, dessa forma, as precárias condições da vida
urbana, principalmente em São Paulo e Rio de Janeiro.
Segundo FALEIROS (2000), a política social implantada no país no período da
ditadura militar se caracterizou como um "modelo repressor, centralizado, autoritário e
desigual". Implantaramse políticas que beneficiaram os grupos privados,
impulsionaram setores economicamente influentes, contribuindo para a expansão da
previdência privada e os planos de saúde privados. (FALEIROS, 2000, p. 48)
O momento político e econômico favoreceu a organização dos trabalhadores
quando, nos finais da década de 70 e início dos anos 80, levou várias categorias a
deflagrarem greves em função da perda do poder aquisitivo, das extensas jornadas de
trabalho e da falta de reajuste salarial que não acompanhava a inflação.
As greves realizadas pelos trabalhadores do ABC Paulista em 1978, 1979 e
1980 revelam uma organização dos trabalhadores combativa, independente do Estado
17
e comprometida com as reais necessidades dos trabalhadores. Em 1980 os
trabalhadores do campo também se organizam e criaram o Movimento dos Sem Terra
(MST).
Podemos dizer que a década de 70 foi marcada por lutas urbanas, exigindo do
Estado melhorias de infraestrutura, frente à precarização que havia nos bairros
periféricos, nas favelas, gerados pela especulação imobiliária, pelo surgimento de uma
nova prática sindical baseada nos princípios democráticos e classista, por um
movimento amplo em defesa da democratização do país, exigindo o fim da ditadura,
anistia política e direitos humanos, além dos movimentos feministas e estudantil que
também tiveram uma atuação importante na defesa da democracia do país.
A relação do Estado com os movimentos sociais na década de 70 era vista em
termos de oposição e antagonismo. A autonomia dos movimentos frente ao Estado era
um dos princípios enfatizados pelos movimentos sociais da época.
A década de 80 para os movimentos sociais pode ser considerada significativa,
seja do ponto de vista do surgimento de novos movimentos sociais, como negros,
índios, ecológicos, entre outros, seja pelo conteúdo das suas bandeiras de luta.
A luta dos setores populares por seus direitos nessa conjuntura se expressa de
várias formas. Uma novidade foi a articulação de vários movimentos sociais que saem
de suas reivindicações isoladas e se unem nas centrais, como a prócentral de
movimentos populares, a Confederação Nacional de Moradores CONAM e a Central
Única dos trabalhadores CUT. Esta última, criada com o propósito de se contrapor à
estrutura sindical oficial, verticalista e atrelada ao governo, tinha como princípios a
liberdade e autonomia sindical e a luta classista e democrática.
Em fevereiro de 1980, militantes do movimento sindical e de organizações de
esquerda fundam o Partido dos Trabalhadores, que tem como um dos seus princípios o
socialismo.
Gohn aponta que a década de 80, foi analisada por alguns autores que a
consideraram do ponto de vista econômico, como "década perdida", dado o modelo
implantado no Brasil pelos militares depois de 1964: "O modelo de concentração de
18
renda, excludente está voltado para o mercado externo. A incapacidade de manutenção
dos índices de crescimento econômico dos anos 70, a crise gerada pela sucção das
reservas nacionais para o pagamento da dívida externa e a falta de legitimidade
política dos governantes levaram à crise, à recessão econômica e ao desemprego no
início dos anos 80" (GOHN, 1991, p.10).
De meados da década de 80 até os dias atuais, há uma mudança na atuação dos
movimentos sociais, da fase reivindicativa e contestatória da década de 70 para a fase
propositiva e vinculada às instituições.
Os movimentos sociais não deixaram de se manifestar publicamente, de
contestar, mas passam a estabelecer uma relação com o Estado, fase esta em que os
movimentos sociais se preparem para elaboração de propostas de projetos de lei.
A sociedade civil organizada passa a querer interferir diretamente na sociedade
política, nas regras e mecanismos de funcionamento da sociedade e do Estado.
Segundo GOHN: "a sociedade organizada em associações e movimentos deixou
de ser marginal ou alternativo; perdeu seu potencial exclusivamente contestador para
ganhar um caráter legalista, ordenador e participante das novas regras estabelecidas
para o convívio social" (GOHN,1991, p. 15).
Do período que se inicia em 1985, destacamos dois movimentos importantes no
país: o movimento pelas Diretas Já, e o movimento amplo que ocorreu em decorrência
da Assembléia Nacional Constituinte.
O Movimento pela Constituinte constituiuse de setores organizados da
sociedade civil e política, que se mobilizaram para construir propostas para a nova
constituição do país. A partir do processo de discussão da Constituição de 1988, foi
ocorrendo uma aproximação dos movimentos sociais com Estado. Estabeleceuse um
processo de negociação permanente entre as entidades da sociedade civil, organizadas
nacionalmente, e o poder legislativo, que tinha a responsabilidade de elaborar a nova
carta magna brasileira.
A participação da população organizada no momento de elaboração da nova
Constituição brasileira conquistou vários direitos, entre eles a participação da
19
comunidade na elaboração, deliberação e fiscalização das políticas públicas, pela sua
inserção nos conselhos de políticas sociais.
No âmbito da saúde, a contribuição do movimento sanitário e do movimento
popular de saúde foi fundamental para a incorporação das suas propostas no capítulo
da saúde na Constituição Federal Brasileira.
PEREIRA, registra que:
(...) com o surgimento da "Nova República", entre os anos 1985 90, novos paradigmas sóciopolíticos entram em cena: recuperação do Estado Nação, novos canais de pluripartidarismo partidário, substituição da pedagogia popular por propostas relacionadas a democracia, cidadania, fortalecimento da sociedade civil, a atuação de ONGS com trabalhos de parceira junto ao Estado e a projetos na esfera pública, como os conselhos da criança e do adolescente, da educação, da saúde, da habitação e dos movimentos culturais (PEREIRA, 2001, p.133).
Nessa "nova fase", os movimentos sociais passaram a enfrentar efetivamente a
permanente tensão entre a inovação e a institucionalização, como aponta Jacobi: "O
aspecto inovador pode ser visto quanto a sua relativa autonomia face do Estado,
partidos políticos e os políticos propriamente ditos. A institucionalização representa
basicamente a perspectiva de negociar e interagir com o Estado, o que freqüentemente
tem provocado interpretações contraditórias sobre o caráter dos movimentos e o seu
potencial de transformação" (JACOBI, 1987, p. 13).
Se, nos finais da década de 70 e até meados da década de 80, as manifestações
populares em defesa da saúde, creche, saneamento e outras reivindicações aconteciam
nas praças e ruas; após a constituição há um novo espaço de participação popular para
exigir os direitos garantidos constitucionalmente.
A década de 80 foi marcada pela expansão dos movimentos sociais, pela
democratização do país, como as eleições diretas para governadores em 1982, a luta
pelas Diretas Já em 1984, a criação de centrais sindicais e de entidades nacionais de
movimentos populares, bem como o surgimento de inúmeros movimentos sociais
abrangendo diferentes temáticas e problemáticas.
Já a década de 90 é um período de grandes transformações na sociedade
brasileira, que influenciaram os rumos dos movimentos sociais.
20
O fato marcante e importante em 1992 foi o movimento pela Ética na Política,
tendo como conseqüência o "impeachment" do presidente da República, Fernando
Collor. Foi um movimento que envolveu a população brasileira na discussão dos
problemas do país, ganhando força para influenciar os parlamentares na votação
favorável ao impedimento do presidente.
Uma crítica e avaliação possíveis desse momento foram que, na opinião desta
pesquisadora, os movimentos sociais tiveram a sua importância, porém, não debateram
suficientemente o viés ideológico neoliberal do projeto político e econômico do
governo que se estava implantando no País, como bem se verificou nos anos seguintes.
Há que se lembrar que a grande mídia jogou um importante papel, quer na eleição de
Collor de Mello, quer no seu "impeachment". O debate concentrado na questão ética
na política e contra a corrupção deixaram o caminho livre para a continuidade da
política do governo impedido.
A classe dominante do país indicou Fernando Henrique Cardoso, do PSDB
Partido da Social Democracia Brasileira em aliança com o PFL Partido da Frente
Liberal para concorrer às eleições de 1994. O propósito era se contrapor ao projeto
democrático e popular, liderado por Luiz Inácio da Silva. A elite brasileira vitoriosa
aprofundou seu projeto, dentro dos parâmetros do Fundo Monetário Internacional,
implantado no país com mais força a partir da década de 90.
A década de 90 ficou marcada pela privatização das empresas nacionais,
repressão à organização dos trabalhadores e implantação de uma política de ajuste
fiscal em detrimento às reais necessidades dos trabalhadores.
A reforma administrativa, da previdência e tantas outras medidas vieram
provocar o aumento das desigualdades sociais e influenciaram diretamente na
organização da classe trabalhadora.
O alto grau de desemprego no país, a desregulamentação dos direitos
trabalhistas, precarização das relações de trabalho, exerceram um peso importante para
o refluxo do movimento sindical brasileiro, comparado com a década de 80, na qual
21
aconteceram greves de categorias importantes, criação de confederações de
trabalhadores e centrais sindicais.
Os dados de emprego e renda na década de 19902000 expressaram uma
retração de postos de trabalho, decorrentes de condições estruturais relacionadas às
mudanças tecnológicas dos processos produtivos, mas, sobretudo, de fatores
recessivos associados às políticas de ajuste econômico.
Dados da concentração de renda no Brasil e na América Latina revelam a
injustiça social praticada contra a população de baixa renda. De acordo com o
relatório Progresso Econômico e Social do Banco Interamericano de Desenvolvimento
BID), 10% da população mais rica do Brasil detém 47% da renda nacional, enquanto
os 50% mais pobres participam em menos de 10% da riqueza. Comparando com os
Estados Unidos, os 10% mais ricos têm renda média per capita 60% mais alta que o
segmento da população imediatamente mais baixo, enquanto na América Latina,
incluindo o Brasil, esta diferença chega a 160%.
As greves do setor público da saúde e educação aconteceram principalmente no
período de 1990 a 1995 que, além de reivindicarem reajuste salarial, melhores
condições de trabalho, manifestaramse contra os projetos de terceirização no serviço
público, as reformas administrativa e previdenciária que nesse período foram
realizadas.
A violência assumiu uma importância como nunca na sociedade atual. Dados
recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) demonstram que a
violência aumentou em todo o país, especialmente na região sudeste, onde o volume
de assassinatos resultou na redução de 3,5 anos na média de vida da população
masculina.
Frente à questão do crescimento da miséria e da violência, dois movimentos se
desenvolveram na perspectiva de sua redução, o movimento da ação da Cidadania
contra a Fome e a Miséria pela Vida, liderada pelo Betinho, e o Viva Rio, ambos
centrados mais em questões éticas ou de revalorização da vida.
22
Outro fenômeno importante da década de 90 foi a explosão de Organizações
Não Governamentais (ONGs) no Brasil.
Existem ONGs que foram criadas ou incentivadas, apoiadas pelo próprio
governo, com a finalidade de repassar recursos públicos para essas organizações
realizarem funções que são próprias do Estado. Esse vem sendo um mecanismo
adotado por governos neoliberais para se livrarem do cumprimento da legislação que
rege a administração pública, como: concurso público, licitação pública, controle
social etc.
Gohn faz o seguinte comentário sobre a década de 90:
Duas outras tendências se fortaleceram no cenário social brasileiro nos anos 90, com relações diretas com a temática dos movimentos sociais: o crescimento das ONGs e as políticas de parcerias implementadas pelo poder público, particularmente no âmbito do poder local. Estas tendências são faces complementares das novas ênfases das políticas sociais contemporâneas, particularmente nos países industrializados do terceiro Mundo. Tratase de novas orientações voltadas para a desregulamentação do papel do estado na economia, e na sociedade como um todo, transferindo responsabilidades do Estado para as comunidades organizadas, com a intermediação das ONGs, em trabalhos de parceria entre o público estatal e o público nãoestatal e, às vezes, também com a iniciativa privada (GOHN6 apud PEREIRA, 2001, p.133).
Os governos neoliberais têm convidado a sociedade civil e organizações não
governamentais para participarem como colaboradores, no sentido de "ajudar" na
execução dos serviços públicos.
A responsabilidade estatal passa para a sociedade. Entidades comunitárias
espalhadas pelo país têm realizado convênios com as prefeituras e governos estaduais,
contratando pessoal para executar as políticas públicas.
Uma primeira conseqüência que se observa é a diminuição dos espaços de luta e
desarticulação entre os vários segmentos populares. Outra é a perda da combatividade
das organizações, que antes reivindicavam e cobravam serviços públicos, mas que
agora executam e são cobradas.
Na década de 90 foram elaboradas as leis orgânicas que regulamentam a Saúde,
a Assistência Social, e promulgado o Estatuto da Criança e do Adolescente, e,
6 GOHN, M. G. Movimentos e lutas sociais na história do Brasil. São Paulo: Loyola,1995.
23
consequentemente, instalandose no Brasil os conselhos de políticas públicas com a
participação da população.
Em síntese, podemos observar, na trajetória histórica dos movimentos sociais
que, durante as décadas de 70 e 80, foi relevante e intensa a participação da população
brasileira, configurando em "movimentos de massa" bem como nos chamados "novos
movimentos sociais", que lutaram contra a ditadura militar, lutas por melhores
condições de vida (saneamento básico, políticas públicas, contra carestia etc),
melhores salários e por direitos sociais.
Na década de 80, o surgimento de um movimento sindical classista e
independente do Estado, luta pela redemocratização do país, por uma nova
constituição, eleições diretas para presidente, exigiram, além de suas pautas
específicas, a democratização do Estado.
Foi, portanto, na década de 90 que lideranças dos movimentos sociais se
inseriram nos espaços institucionais, estabelecendo uma relação com Estado num
sentido propositivo por meio dos diversos conselhos de políticas públicas criados a
partir de 1990.
Passados 10 anos de participação de representantes dos movimentos sociais e
sindicais nos conselhos de políticas públicas, muitos são os questionamentos sobre
essa participação, tais como: onde estão os movimentos sociais? Será que o
movimento social, no processo, se institucionalizou e perdeu seus objetivos? Como
participar dos espaços institucionais mantendo autonomia e evitando a cooptação pelo
Estado? Qual a atuação dos movimentos sociais na atual conjuntura?
Sobre os questionamentos com relação à crise dos movimentos sociais, Gohn
(1.999) avalia que a crise é parcial e relembra as várias conquistas que aconteceram na
década de 80, como:
(...) estruturação de várias lutas isoladas, organização de vários movimentos sociais em redes amplas, conquistaram espaços institucionais de participação popular, os quais foram demarcados em leis; grupos diversos constituíramse como sujeitos coletivos com legitimidade em face da sociedade e do Estado, passando a participar de processos de negociações sobre a distribuição dos bens públicos coletivos" (GOHN, 1.999, p. 102).
24
A questão que se coloca é a seguinte: O que se passa na década de 90? Quais os
fatores que contribuíram para a desmobilização dos movimentos sociais?
Gohn (1999) escreve sobre as avaliações que as lideranças e assessorias dos
movimentos vem apontando como causas básicas da atual crise. Esses atores têm
atribuído como principais fatores para a crise, as causas de ordem externa ao
movimento, como a crise econômica do país, o desemprego, as políticas neoliberais, a
descrença na política e na ação do Estado etc.
A autora enfatiza que é dentro do próprio movimento social que se encontram
explicações para a crise. Os movimentos sociais tiveram sua autonomia atingida em
razão da forte influência de assessores externos no direcionamento de seus projetos de
luta. Após a elaboração da Constituição Federal, os movimentos sociais se
desmobilizaram, lideranças foram militar nos partidos políticos ou assumiram cargos
nas administrações públicas populares; houve retrocesso da ala progressista da igreja
católica, falta de verbas internacionais para financiar projetos dos movimentos sociais
e as ONGs ocuparam espaços dos próprios movimentos.
Além destes elementos internos ao movimento, GOHN destaca:
(...) o fenômeno da juridização do social, que se instalou na sociedade brasileira atual, criou canais específicos para o acolhimento das demandas populares, atribuiu ao judiciário o papel de catalisador das ações que buscam resolver os conflitos sociais e conferiu às assessorias especializadas dos movimentos o papel de encaminhadoras, tradutoras e intérpretes das demandas populares (GOHN,1999, p.105).Além dessa análise interna, é indispensável reconhecer a influência da
conjuntura política e econômica no refluxo dos movimentos sociais, particularmente
no movimento sindical.
Uma questão fundamental a ser analisada são as estratégias que os movimentos
sociais vêm adotando contra os governos neoliberais afim de garantir os direitos
constitucionais e os conquistados durante o processo de sua elaboração.
Stédile, dirigente do Movimento Sem Terra MST, teceu considerações no 10.º
Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais, realizado em 2001, que ajudam na
compreensão da crise que atinge os movimentos sociais e aponta possibilidade de
superação. Uma questão abordada na sua palestra trata do preconceito difundido pelos
25
aparatos da burguesia que, tentando "vender" uma imagem distorcida do povo
brasileiro, como sendo apático e preguiçoso, quando, pelo contrário, a história do
Brasil é de luta, rebeldia.
Lembrando a história da luta do povo brasileiro, Stédile destacou primeiramente
que as mobilizações aconteceram juntamente com a mudança do modelo econômico.
A segunda questão, que a consciência das pessoas não se comporta de forma linear.
Ao longo da história, a luta de classes não acontece em forma de "escada", mas em
movimento espiral.
Percebese que mesmo na década de 90, em que se fala do esvaziamento dos
movimentos sociais, aconteceram várias manifestações no País, seja contra as
privatizações, pelo ensino público, por melhores salários, pela saúde pública e tantas
outras que ocorreram nessa década.
A discussão, principalmente entre lideranças e assessores dos movimentos
sociais, é sobre como garantir a continuidade do movimento após conquistar a
reivindicação. Exemplificando, se a população consegue o Posto de Saúde que
reivindicava, não está garantido que esta terá acesso, qualidade e profissionais
suficientes para prestar um bom atendimento, que o conceito amplo de saúde, baseado
na promoção a saúde, será incorporado por aquele Governo.
Para transformálos em movimentos perenes Stédile apresenta alguns aspectos:
primeiro, é fazer luta social, pois nenhum movimento social sobrevive sem luta social,
só ela forja novas lideranças; segundo, é preciso passar de geração a geração o
aprendizado da luta e por último, a formação política permanente.
Esses aspectos levantados por Stédile são fundamentais, aos quais podese
acrescentar ainda um outro elemento, que é a necessidade da articulação entre os
movimentos sociais para romper com a fragmentação das lutas e construírem um
projeto de sociedade democrática e comprometida com a classe dominada.
3 MOVIMENTOS SOCIAIS NA SAÚDE
3.1 Movimento da Reforma Sanitária
26
A história dos movimentos sociais populares, na área de saúde, constituiuse de
diferentes formas, mas foram dois os movimentos nacionais fundamentais para a
elaboração das diretrizes e princípios da saúde pública no Brasil: o Movimento da
Reforma Sanitária e o Movimento Popular de Saúde.
O Movimento da Reforma Sanitária, constituído por um grupo de intelectuais,
técnicos da área de saúde coletiva, lideranças sindicais do setor saúde, partidos
políticos, o Centro Brasileiro de Estudos da Saúde e a Associação Brasileira de Pós
Graduação em Saúde Coletiva, exerceu um papel destacado de oposição ao regime
militar e foi fundamental para implantação de um sistema público de saúde no Brasil.
Segundo NETO, o Movimento da Reforma Sanitária teve como características
fundamentais:
(...) por um lado, a inserção da luta pela saúde no movimento mais global de democratização da sociedade brasileira, ainda sob a ditadura militar, e por outro, uma estratégia de atuação diversificada, em várias frentes, decorrentes tanto do conceito "ampliado" de saúde que lhe servia de base, inspirado pelo movimento da medicina social dos anos 60 e 70, quanto da visão políticoideológico que predominava entre seus militantes, a maioria oriunda de partidos políticos na clandestinidade, em particular o então Partido Comunista Brasileiro (NETO, 1977, p.63).
FLEURY conceitua reforma sanitária como:
(...) um processo de transformação da norma legal e do aparelho institucional que regulamenta e responsabilizase pela proteção da saúde dos cidadão, o que corresponde a um efetivo deslocamento de poder político em direção às camadas populares. Este deslocamento concretizase na busca do direito universal à saúde e na criação de um sistema único de serviços sob a égide do Estado (FLEURY, 1991, p.8).
A luta por um Sistema Público de Saúde é antiga no nosso País. A idéia de
fixação de um plano nacional de saúde e de municipalização de serviços de saúde
foram temas discutidos na 3.ª Conferência Nacional de Saúde, realizada em 1963,
embora essa discussão estivesse centralizada mais no nível técnico, sem participação
popular e não teve continuidade devido ao golpe militar em 1964.
Na política privatizante nos governos ditatoriais, a medicina, além do alto custo,
não era eficiente e atendia interesses privados dentro do aparelho do Estado. Para
enfrentar essa política, emerge um movimento de profissionais nos Departamentos de
27
Medicina Preventiva das Universidades. Este movimento, como afirma FLEURY
começou a questionar o modelo existente e a buscar novo parâmetro teórico para o
entendimento do processo saúde/doença, através de categorias como a de
determinação social deste processo e a organização social da prática médica.
(FLEURY, 1991, p.9)
A partir de 1979, com o início de abertura política, a ascensão dos movimentos
populares, sindicais, eleição de novos parlamentares identificados com o movimento
sanitário e também a ocupação de lideranças deste movimento no Ministério da Saúde,
Previdência, e na Organização Panamericana de Saúde, avança a discussão do projeto
da Reforma Sanitária.
O movimento ganha espaço junto à Câmara dos Deputados e começam a
acontecer os primeiros debates abertos e organizados oficialmente sobre a saúde.
Em 1979 acontece o 1.º Simpósio, promovido pela Comissão de Saúde da
Câmara com assessoria do CEBES, no qual foi lançado o Projeto do Sistema Único de
Saúde SUS. A discussão centrouse em torno do documento "A questão Democrática
na Saúde". Segundo NETO (1977), "esse documento, além de fazer um ampla análise
de conjuntura nacional e das políticas de saúde, assumia um caráter propositivo ao
apresentar o projeto de reorientação do sistema de saúde brasileiro, com base na
descentralização, na integração institucional, na regionalização e hierarquização da
rede assistencial e na participação popular, com ênfase nas ações básicas de saúde".
(NETO, 1997, p.66)
Nesse período há uma série de produções teóricas seja pelo CEBES, seja pelos
Centros de PósGraduação em Saúde Coletiva, no sentido de estudar a crise do setor
saúde e das suas determinações, fornecendo embasamento para as lutas políticas de
entidades na área de saúde e para formulação de propostas alternativas, visando à
reorganização dos serviços de saúde e redefinição das políticas do setor.
Um marco importante e fundamental para a definição de diretrizes e princípios
do Sistema Único de Saúde foi a realização da VIII Conferência Nacional de Saúde.
Discussões regionais precederam a realização desta Conferência, discutindo o direito à
28
saúde, ao sistema de saúde e ao seu financiamento, procurando descentralizar
informações e conhecimentos de modo que o saber técnico fosse disponibilizado à
população, criando uma consciência sanitária, visando à construção de um sistema de
saúde público e de qualidade.
AROUCA se refere à 8.ª Conferência Nacional de Saúde como um momento de
síntese:
Não havia nenhuma proposta de continuidade, mas de ruptura. A saúde enquanto projeto pode ser demarcada entre antes e depois da oitava, onde novamente discutimos o valor da participação da população, o valor do controle social, o valor da democracia direta e da luta pela redemocratização do País. Mostrávamos que tão fundamental quanto democracia representativa era a democracia direta. (AROUCA 7apud NASCIMENTO, 2001, p.5)
O período préConstituinte é marcado por negociações permanentes com a
Subcomissão de Saúde, Seguridade e Meio Ambiente na Câmara Federal, com o
objetivo de criar base jurídicoinstitucional para a saúde, garantindo o projeto da
reforma sanitária.
A Associação Brasileira de Pós Graduação em Saúde Coletiva ABRASCO
realizou em 1986, o I Congresso Brasileiro de Saúde Coletiva para discutir pela
primeira vez a questão da Constituinte. No final do Congresso foi apresentada e
aprovada uma proposta de texto para subsidiar a formulação do capítulo da saúde na
Constituição Brasileira, mantendo as deliberações da VIII Conferência Nacional de
Saúde.
Depois de um longo processo de negociação entre setor privado, governo e
sociedade civil foi incluído na Constituição Federal, no capítulo da saúde, os
princípios e diretrizes do SUS, a saber: a universalização, a descentralização, a
integralidade e a participação da comunidade no controle e fiscalização da política de
saúde, além de constar o dever do Estado em garantir o acesso igualitário e universal
às ações de saúde e serviços para promoção, proteção e recuperação para toda
população brasileira.
7 AROUCA, S. Avanços e Retrocessos da Reforma Sanitária Brasileira. In: 11ª Conferência Nacional de Saúde, SUS: Revendo a Trajetória, 2001, Brasília.
29
O conceito de saúde, debatido na VIII Conferência, também foi incorporado,
posteriormente, na Lei Orgânica da Saúde, n.º 8080/90, ficando com a seguinte
redação: "saúde tem como fatores determinantes e condicionantes, entre outros, a
alimentação, a moradia, o saneamento básico, o meio ambiente, o trabalho, a renda, a
educação, o transporte, o lazer e o acesso aos bens e serviços essenciais; os níveis de
saúde da população expressam a organização social e econômica do país." (Lei n.º
8080/90, 2000, p.22).
Após vencida essa batalha, o movimento da reforma sanitária e outros atores
sociais enfrentaram novos desafios para elaboração da lei orgânica da saúde.
A conjuntura política de 1990 é desfavorável para as classes populares, para
aqueles que defendiam as políticas públicas. A eleição de Fernando Collor significou
um retrocesso para implementação da Constituição Brasileira aprovada em 1988.
Enquanto consta na Constituição Federal que "saúde é um direito de todos e dever do
estado" (CF, 1988, p. 133), o governo neoliberal de Collor direcionava suas ações de
governo no sentido de reduzir as funções próprias do Estado.
O governo Collor, numa atitude autoritária e centralizadora, vetou artigos
importantes da Lei Orgânica da Saúde que diziam respeito ao controle social no SUS,
à criação do Fundo de Saúde em cada esfera de Governo para transferência de recursos
federais fundo a fundo com a fiscalização dos conselhos de saúde, e a criação de uma
comissão para elaboração de plano de cargos e salários dos funcionários públicos.
A Lei n.º 8142/90, que dispõe sobre a participação da comunidade na gestão do
Sistema Único de Saúde (SUS) e as condições para repasse de recursos para Estados e
Municípios, foi aprovada após muitas negociações e pressão popular, pois os artigos
vetados na Lei Orgânica eram fundamentos para o processo de implantação do SUS.
Segundo a referida Lei, o SUS conta com duas instâncias de controle social:
I Conferência de Saúde
II Conselho de Saúde
No seu parágrafo primeiro, a Lei define quando deve se realizar A Conferência
de Saúde e os objetivos: "A Conferência de Saúde reunirseá a cada quatro anos com
30
a representação dos vários segmentos sociais, para avaliar a situação de saúde e propor
diretrizes para a formulação da política de saúde nos níveis correspondentes,
convocada pelo Poder Executivo ou, extraordinariamente, por esta ou pelo Conselho
de Saúde." (Lei n.º 8142/90).
Quanto ao Conselho de Saúde, diz a Lei em questão:
O Conselho de Saúde, em caráter permanente e deliberativo, órgão colegiado composto por representantes do governo, prestadores de Serviço, profissionais de saúde e usuários, atua na formulação de estratégias e controle da execução da política de saúde na instância correspondente, inclusive nos aspectos econômicos e financeiros, cujas decisões serão homologadas pelo chefe do poder legalmente constituído em cada esfera de governo (Lei 8142/90).
FLEURY avalia algumas dificuldades do movimento sanitário no processo de
elaboração da constituinte, afirmando:
(...) os pontos do projeto de reforma que foram vetados na Constituinte forma aqueles que instituíam algum tipo de controle sobre as indústrias de medicamentos e insumos, especialmente no setor multinacional (...) Também não conseguimos nenhum tipo de controle maior em relação à saúde do trabalhador e ao ambiente de trabalho. Nesses dois casos nós perdemos exatamente porque a base da reforma sanitária carece de uma presença maior da classe trabalhadora. (FLEURY, 1991. p.10)
Nessa retrospectiva histórica do movimento da reforma sanitária, percebese
uma influência muito grande dos intelectuais e militantes do Centro Brasileiro de
Estudos da Saúde e de lideranças do partido comunista. A sua estratégia centrouse em
intensas negociações no espaço institucional. Já o MOPS começou participar
tardiamente no processo de mobilização da população para elaboração de propostas
para Constituição. A falta de articulação entre esses dois movimentos constituiu um
problema, no ponto de vista da pesquisadora, para uma intervenção unitária da classe
trabalhadora na discussão da saúde nesse período.
Outro elemento importante a ser considerado foi a estratégia de luta adotada
pelo Movimento da Reforma Sanitária, houve um grande investimento por parte do
movimento sanitário nas negociações junto ao parlamento, configurando uma luta
maior dentro do espaço institucional.
A saúde pública no Brasil, para ser implantada, conforme prevê a legislação
brasileira, tem ainda muitos desafios a enfrentar.
31
Nesses doze anos de neoliberalismo no Brasil, o Governo vem sistematicamente
promovendo o desfinanciamento das políticas públicas, inclusive no setor da saúde,
em cumprimento aos acordos firmados com o Fundo Monetário Internacional.
A transferência de ações públicas para a sociedade civil vem se constituindo
uma relação de dependência econômica e política entre os administradores das
entidades de prestação de serviços e o Estado, descaracterizando o papel dessas
organizações, muitas vezes populares, que antes reivindicavam os direitos sociais,
passando hoje a executar os serviços, com poucos recursos financeiros e sem
profissionais qualificados para atender à demanda.
A organização e mobilização dos diversos atores envolvidos na elaboração do
Sistema Único de Saúde continuam. As plenárias nacionais de saúde, que vêm se
realizando desde a década de 80, o movimento popular de saúde, os fóruns populares
espalhados pelo país, os conselhos de saúde, estão de uma forma ou de outra
acompanhando, fiscalizando, propondo melhorias no Sistema de Saúde e lutando pela
implementação do SUS.
As mobilizações, conferências e outras formas de organização existentes na
saúde têm refreado alterações no texto constitucional, relacionadas ao dever do Estado
em garantir o direito universal e igualitário à saúde.
O desafio do movimento social na saúde é estabelecer ações articuladas às lutas
mais gerais da sociedade, pois à medida que o Estado está a serviço do capital
financeiro e às regras impostas pelo Fundo Monetário Internacional, a implantação
das políticas públicas nessa conjuntura atenderá às reais necessidades da população
brasileira e o SUS Sistema Único de Saúde continua sendo um sonho para muitos
que ainda não se concretizou.
3.2 Movimento Popular de Saúde MOPS/ Nacional
O Movimento Popular de Saúde MOPS nasceu a partir dos Encontros
Nacionais de Experiências em Medicina Comunitária ENEMEC.
32
O primeiro Encontro aconteceu em 1979, em LinsSP, reunindo representantes
de 18 Estados e 1 Território, totalizando 322 delegados, em sua maioria técnicos
ligados às Universidades ou às Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde. Os
objetivos desses encontros era para trocar experiências e para desenvolver um trabalho
de conscientização e politização das camadas populares através da saúde. Em 1981
esses encontros se definem como MOPS Movimento Popular de Saúde.
O MOPS nasceu das experiências vivenciadas por grupos ligados à igreja
católica, que discutiam práticas culturais e populares de saúde, como o uso de ervas
medicinais. Compunhase de médicos sanitaristas, estudantes, religiosos, militantes
católicos, integrantes de partidos políticos e das populações carentes residentes nas
periferias urbanas e favelas. Esse movimento iniciou suas atividades nos Estados do
Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo, expandindose na década de 80 por todo o
Brasil.
O MOPS tem como objetivo articular e fortalecer grupos de base que lutam pela
reforma sanitária e em defesa da saúde pública e pela implantação do SUS. Ao mesmo
tempo, procura articular experiências de práticas culturais e populares de saúde, em
torno de um conceito amplo de saúde que vê o Homem como um todo, resgatando
valores, costumes e sabedoria do povo.
Os Departamentos de Medicina Comunitária das Universidades tiveram grande
influência na construção de outra forma de pensar saúde, baseada na medicina
comunitária. Essa proposta de modelo alternativo contestava o modelo centrado
hegemonicamente no médico e na sofisticação tecnológica, que apresentava baixa
resolutividade e caráter privativista. "Naquele momento a medicina comunitária
colocase como alternativa ao Sistema de Saúde, na medida em que o setor público se
deteriorava como resultado da crescente privatização da assistência médica"
(GERSCHMAN, 1995, p.71).
A problemática da política de saúde do Governo na esfera federal não se
constituía como eixo de atuação do MOPS, mantinhase a independência por entender
33
que a participação nas instâncias governamentais colocaria em perigo a autonomia do
movimento.
Na trajetória histórica do MOPS aconteceram sete Encontros Nacionais.
No segundo ENEMEC houve uma mudança na composição dos delegados,
aumentando a participação de representantes dos movimentos populares já articulados
organicamente em federações, Associações de Moradores, Comissões de Saúde.
Algumas regiões do país propuseram transformar o ENEMEC em encontros nacionais
de movimentos populares em saúde, mas a proposta não foi aprovada.
Segundo GERSCHMAN, a novidade neste encontro foi a preocupação dos
movimentos populares de discutir e acompanhar as propostas institucionais.
O movimento defendeu que o sistema saúde deveria ser universal, de
responsabilidade do Estado, dando tratamento igual aos trabalhadores urbanos e rurais
e com a participação dos trabalhadores na elaboração da Política Nacional de Saúde.
Nesse encontro foi eleito um representante de cada Estado para compor a coordenação
nacional.
É importante destacar nessa trajetória histórica os conflitos que se manifestaram
entre o saber técnico e o popular, situação esta vivenciada pelos militantes dos
movimentos populares.
O relacionamento entre os técnicos, profissionais de saúde e população foi tema
do 3.º Encontro do MOPS, realizado em 1983, onde havia um interesse do
desvincilhamento das lideranças religiosas e técnicos, passando a uma articulação
sustentada pelas lideranças de associações de moradores de bairros e favelas.
A partir desse encontro é que foram transformados os ENEMEC em Encontros
Nacionais de Movimentos Populares em Saúde.
No 4.º encontro, com a nova denominação IV Encontro do Movimento
Popular de Saúde, a medicina comunitária deixou ser o tema central e os participantes
discutiram: Controle dos Serviços de Saúde pelo Povo, Movimentos Populares em
Saúde e Movimentos Populares no Momento Atual, Avaliação, Diretrizes e
Organização do Novo Movimento.
34
O MOPS foi se consolidando no país. Formouse a coordenação nacional, com
dois representantes de cada estado brasileiro.
A pesquisa realizada por GERSCHMAN (1995) mostrou as disputas de
posições no interior do MOPS, com relação à autonomia do movimento frente ao
Estado, isto é, que atitudes e práticas poderiam atrelar ou não o movimento ao Estado.
Na defesa da independência do movimento por um longo período não se discutiu a
política governamental, bem como não houve concordância da transformação do
MOPS em personalidade jurídica, considerando que essa proposta trazia o risco de sua
institucionalização.
Somente a partir do 5.º Encontro é que o tema política nacional de saúde foi
pautado como tópico de destaque. As diretrizes aprovadas no Encontro foram:
participação do povo na elaboração, execução e organização de conselhos populares de
saúde para fiscalização dos serviços, mudança e controle da previdência social pelos
trabalhadores; fim de convênios com empresas particulares e medicina de grupo; uma
central de medicamentos CEME, controlada pelo povo e com incentivo e
financiamento; pesquisas em medicina popular; formação de profissionais de saúde
voltados para medicina preventiva e para as práticas de medicina popular; igualdade,
nos serviços de saúde, para o homem do campo e da cidade; serviços públicos
gratuitos em todos os níveis de atendimento ambulatorial e hospitalar e prioridade à
medicina preventiva.
O 6.º Encontro Nacional do MOPS, realizado em fevereiro de 1986, anterior à
VIII Conferência Nacional de Saúde, elegeu delegados para participarem dessa
Conferência, assumindo uma posição de interferir no espaço institucional. Nesse
Encontro foi aprovado um documento, que sistematizava as propostas para a política
nacional de saúde, encaminhado à discussão pela Assembléia Nacional Constituinte.
A preparação deste documento resultou em transformações, tanto na concepção do movimento pelo fato de participar de uma instância de decisão nacional da política de saúde quanto pelo exercício de explicação das propostas e estratégias do movimento popular em relação à questão da saúde. (GERSCHMAN, 1995, p. 78)
35
Depois da participação do MOPS na Conferência Nacional de Saúde, o
Movimento constituiuse em força política no cenário da política nacional de saúde, e
suas propostas foram integradas ao projeto mais amplo de mudança no setor de saúde
que estava sendo formulado pelas entidades que compunham o movimento sanitário.
O MOPS fez parte da Plenária Nacional de Saúde na Constituinte, apresentando
suas teses; também foram encaminhadas como emenda popular para o setor de saúde.
Em fevereiro de 1987 aconteceu o 7.º e último Encontro Nacional do MOPS.
A trajetória do movimento popular adquiriu outras caraterísticas devido à proposta em que a Reforma Sanitária avançou com as questões principais da reformulação do sistema de saúde: a existência de um sistema único e descentralizado de saúde nos Estados e Municípios (GERSCHMAN, 1995, p. 80)
O MOPS passou a se organizar em nível estadual e municipal e os encontros
foram substituídos pela Plenária Nacional de Saúde.
Percebese, na história do MOPS mudanças na sua forma de organização, na
pauta dos Encontros, nas formas de lutas, enfim mudanças na sua dinâmica interna e
externa, conforme análise de GERSCHMAN: "Enquanto as origens foram marcadas
pela Medicina Comunitária como modo de dar conta das carências de saúde das
populações pobres das grandes cidades e do interior neste segundo momento, ligado
à realização da VIII Conferência, passouse a enfatizar a política de saúde."
(GERSCHMAN, 1995, p.80).
Antes da Constituição, os movimentos populares se organizavam em torno de
melhores condições de vida (habitação, saúde, contra a carestia, creches, etc) e o
embate se dava com o Estado, adversário visível no tratamento discriminativo quanto
à oferta de serviços públicos no âmbito da cidade.
Após a Constituição Federal e todo o Movimento pela Redemocratização da
Sociedade Brasileira, o Movimento Popular passou a ter uma relação mais próxima
com o Estado e se estabeleceu um processo de negociação, buscando a conquista de
direitos, políticas públicas, etc.
36
Essa relação não deixou de ser conflituosa, porque as forças sociais que
compõem esse espaço apresentam projetos diferentes. O espaço institucional vem se
constituindo, na atualidade, o principal lugar das discussões e deliberações das
políticas sociais.
O desafio consiste em avançar no acesso às políticas públicas, no controle
social e democratização do Estado.
37
II CURITIBA PR: ASPECTOS HISTÓRICOS DO SETOR SAÚDE
1 CARACTERIZAÇÃO DO MUNICÍPIO DE CURITIBA
A capital do Paraná, Curitiba, tem 309 anos e está localizada no sul do Brasil,
com uma área de 432,17 Km2.
A população do município é de 1,6 milhão de habitantes, com um PIB de U$
12,1 bilhões/ano e renda per capita de aproximadamente U$ 8 mil/ano. A maior parte
de sua população é descendente de imigrantes italianos, poloneses, alemães,
ucranianos, japoneses, sírios e libaneses.
As principais atividades econômicas são: Indústria (9,50%), Construção Civil
(5,46%), Comércio (36,86%), Serviços (47,43%) e outros 0,75%.
A cidade de Curitiba possui seis Ruas da Cidadania que são sedes das oito
Administrações Regionais. Nelas estão núcleos das Secretarias Municipais, distritos
rodoviários, posto bancário, agências estaduais e federais, juizados especiais entre
outros. Na mesma estrutura a comunidade encontra comércio variado, biblioteca,
auditório, ginásio coberto e quadra poliesportivas. São oferecidos cursos
profissionalizantes para a população.
O município conta com 342 estabelecimentos de préescola e 380 no ensino
fundamental. Possui 27 conselhos municipais, 247 associações de moradores, 373
parcerias com Entidades Sociais Cadastradas e 134 Associações de pais, professores e
funcionários.
2 A POLÍTICA MUNICIPAL DE SAÚDE
A municipalização da saúde se constituiu na estratégia da descentralização da
política de saúde preconizada na proposta de reforma sanitária e consolidada
legalmente na Constituição Federal (1988) e na Lei Orgânica de Saúde (1999). O
princípio da descentralização objetiva tornar o SUS mais eficiente, facilitando à
38
população a resolução dos problemas de saúde quando as soluções podem ser tomadas
no próprio local onde o problema é identificado.
O processo de descentralização no Brasil começou na década de 80 com o
Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde SUDS pelo qual a maioria das
unidades do INAMPS foi transferida para as Administrações Estaduais, na primeira
etapa.
A descentralização prevê um comando único em cada esfera de governo,
estabelecendo uma relação entre elas, cada uma com atribuições definidas na Lei
Orgânica de Saúde e nas Normas Operacionais Básicas NOBs 8.
Durante o período de 1991 a 2001 foram editadas quatro normas operacionais
básicas que estabeleciam uma série de requisitos e critérios de financiamento para
cada nível de gestão assumido pelo Município ou Estado.
O município Curitiba encontrase, hoje, na gestão plena do sistema de saúde,
sendo responsável pela gestão do SUS em todos os seus níveis de complexidade. Para
se chegar a esse nível de gestão foi um processo que durou dez anos e a legislação foi
um instrumento importante para direcionar e reestruturar o Sistema de Saúde.
O debate que ocorria na década de 80 era em torno de um modelo assistencial
que contemplasse os conceitos de "território"9 ou área de abrangência, a participação
da comunidade e a facilitação do acesso e a prática integral da saúde.
A organização dos serviços de saúde passava pelos níveis primário, secundário
e terciário, os serviços de maior complexidade eram encaminhados, na época, para os
postos do INAMPS.
Em 1986, as Ações Integradas de Saúde foram referendadas na VIII
Conferência Nacional de Saúde como estratégia para uma efetiva reforma sanitária
com vistas ao Sistema Único de Saúde.
8 A NOB é um instrumento jurídico institucional, editado periodicamente pelo Ministério da Saúde, após um processo de discussão com os demais gestores e outros segmentos da sociedade, negociado e pactuado na tripartide e aprovado no Conselho Municipal de Saúde.9 Entendido como território processo. Nesta concepção o espaço social é organizado conforme uma construção dinâmica, que leva em conta a cultura, participação política da sociedade organizada, o perfil epidemiológico da saúde/doença, a realidade sócioeconômica, a existência de equipamentos para prestação do serviços de saúde, demografia e a geografia, etc.
39
Na gestão do Prefeito Roberto Requião (1986 a 1989) foi criada a Secretaria
Municipal de Saúde no lugar da Diretoria de Saúde. A necessidade da mudança foi
justificada pela complexidade e extensão das ações de saúde desenvolvidas por 42
Centros Médicos e de Enfermagem e 20 Clínicas Odontológicas.
As Prefeituras, nesse período, estruturaram a rede básica de atendimento,
criando principalmente a vigilância epidemiológica e sanitária, contratando
profissionais de saúde para atender as necessidades básicas da população.
O processo de municipalização dos serviços de saúde no Brasil não foi
uniforme, em virtude da vontade política e compromisso político dos governantes com
o serviço público, e também pelo nível de organização e mobilização da população em
torno da questão saúde.
A Lei Orgânica da Saúde aprovada em setembro de 1990, veio subsidiar e
legalizar uma prática de saúde iniciada na década de 80, em Curitiba, visando a
construção do Sistema Único de Saúde.
Quando se estabeleceu a Lei Orgânica de Saúde, houve necessidade de
reformulação do sistema municipal de saúde. Nessa época, a Secretaria Municipal de
Saúde cuidava basicamente da atenção básica; havia em torno de 40 a 50 Unidades de
Saúde com uma área de abrangência e com dificuldades para estabelecer uma ligação
com os demais níveis de atenção da área especializada ambulatorial e hospitalar, como
explica uma diretora da Secretaria Municipal de Saúde:
"Nessa época, já trabalhava com a noção de promoção à saúde, mas passou a
ser bastante importante o problema da assistência à saúde da população que era
dividida entre o governo federal, estadual e municipal, passou legalmente a ser uma
responsabilidade do município resolver" (M.G.S, 16/02/02).
É no período de 1989 a 1992, 3.ª gestão de Jaime Lerner no Município de
Curitiba, que aconteceu uma ampliação das estratégias apontadas pelo Movimento de
Atenção Primária em Saúde da década de 80.
Como explica PEDOTTI: "É deste período que emerge a noção de integração
territorial nos Sistemas Locais de Saúde (SILOS) com a visão germinal de vigilância à
40
saúde sobre um espaçopopulação (...) e a Saúde ganha em qualidade com a percepção
de sua relação com Qualidade de Vida educação, trabalho, renda, lazer, moradia,
alimentação, transporte, dentre outras dimensões." ( PEDOTTI, 2000, p. 6).
A proposta da regionalização dos serviços na Secretaria Municipal de Saúde de
Curitiba teve como um dos princípios a distritalização.
Segundo o Secretário Municipal de Saúde, "a distritalização é uma estratégia
que se assenta sobre os conceitos de cidadania e territorialidade. Os serviços se
organizam em bases territoriais criteriosamente definidas para atender a população
que, nestes territórios, estabelecem complexos processos sociais e organizam as bases
de sua reprodução e existência." ( RAGGIO,1992, p. 57).
Para dar concretude a esta proposta de regionalização, foi aprovada a Lei
Municipal n.º 7671/91, que reorganiza administrativamente a Prefeitura de Curitiba,
criando sete Regionais de Saúde.
Em setembro de 1991 aconteceu a 1.ª Conferência Municipal de Saúde,
envolvendo grande participação da sociedade civil, em que foi constituído o Conselho
Municipal de Saúde.
A sociedade participou ativamente do processo de criação do Conselho
Municipal de Saúde, pois o decreto municipal que nomeava o Conselho não respeitava
a legislação, não garantia a participação de 50% dos usuários; houve, então, uma
mobilização das entidades que compunham o Fórum Popular de Saúde para alterar a
lei.
Em 1991, também o município de Curitiba assina o convênio "PróSaúde" com
o Ministério da Saúde, visando à ampliação, reforma e construção de novas Unidades,
incluindo a primeira Unidade de Saúde 24 horas, compra de ambulâncias e
equipamentos para o Laboratório Público Municipal.
A Secretaria Municipal de Saúde, em parceria com a Organização Pan
Americana da Saúde OPAS, realizou vários cursos de territorização, de
planejamento/gerência, de informação e de desenvolvimento de recursos humanos,
41
dentre outras. Foram constituídas as Gerências dos Distritos Sanitários e nomeadas as
autoridades sanitárias locais para gerenciar uma Unidade de Saúde.
O processo de regionalização seguiu a estrutura organizacional da Prefeitura do
Município de Curitiba, mas, como analisa a Diretora do Departamento de informação
em saúde:
"(...) a distritalização para a saúde não é simplesmente uma reforma
administrativa, é o reconhecimento realmente do território, daquela população que
adoece, morre e que tem necessidade então de uma aproximação da questão do
território de forma diferente, da saúde, do resto da prefeitura (M.G.S.,16/02/02).
A concepção que norteou o movimento de territorização segundo a Diretora de
Planejamento e Informação da atual gestão da Secretaria Municipal de Saúde, veio
juntamente com uma noção de pertinência de responsabilização pela saúde de um
determinado grupo populacional.
O controle social também foi se construindo nesse processo de territorização,
através da criação dos Conselhos Locais de Saúde.
A gestão seguinte 1993/1996 do prefeito Rafael Grega, apoiado por Jaime
Lerner avançou no processo de municipalização, incorporando mais 10 Unidades de
Saúde, originárias da Secretaria de Estado e do INAMPS, bem como a vigilância
sanitária, central de ambulâncias e o laboratório municipal.
Nesse período, a rede passou a ser constituída por 85 Unidades de Saúde, cinco
delas sendo Unidades 24 horas alocadas nos Distritos Sanitários.
Esse período foi marcado pela necessidade e obrigação dos municípios de criar
mecanismos integrados de gestão do SUS no nível federal, estadual e municipal, sendo
publicado pelo Ministério da Saúde um documentos intitulado "Descentralização das
Ações e Serviços de Saúde A Ousadia de Cumprir e Fazer Cumprir a Lei".
Além desse documento, foi também elaborada a NOB/93, que previa os níveis
de gestão, levando em consideração a rede de serviços implantada e o quadro de
pessoal, classificando em: incipiente, parcial e semiplena.
42
Nos municípios habilitados na gestão semiplena, os recursos financeiros são
transferidos da esfera federal para a esfera municipal, de fundo a fundo, e habilita
municípios como gestores e não mais prestadores, isto é, cabendo ao município a
responsabilidade de comandar o sistema de saúde, exercendo todas funções de
coordenação, articulação, negociação, planejamento, acompanhamento, controle,
avaliação e auditoria.
O município de Curitiba foi habilitado na gestão semiplena, em 1996,
possibilitando um maior controle social dos recursos advindos do Ministério da Saúde,
uma vez que os recursos federais eram depositados no Fundo Municipal de Saúde e
fiscalizados pelo Conselho Municipal de Saúde. "Nesse período iniciase em Curitiba
a regulação global das ações de saúde nas áreas ambulatorial e hospitalar, com a
gerência dos convênios e contratos de prestadores da rede básica, a criação de Central
de Leitos, o Controle e Avaliação de Autorizações de Internamento Hospitalar (AIHs),
e a criação da Central de Marcação de Consultas Especializadas." (PEDOTTI, 2000, p.
6).
Vários Programas de Saúde são implantados na área da saúde maternoinfantil,
como: Programa Nascer em Curitiba Vale a Vida e a criação do Comitê de
Mortalidade Infantil, além da Carteira de Saúde da Criança e de ambulância
especialmente aparelhada para o transporte de recémnascidos de risco. É constituído o
Comitê de Mortalidade Materna, cujo objetivo é analisar as causas da mortalidade,
para estabelecer medidas de prevenção. Também se inicia a avaliação sanitárias das
maternidades de Curitiba.
Durante essa gestão foi ainda realizado treinamento com alguns profissionais da
rede municipal sobre o tema Saúde Mental Comunitária com técnicos canadenses,
mas somente em 2000 foi criado um Programa Municipal, estabelecendo convênio
com clínicas e hospitais psiquiátricos para prestar atendimento nesse setor.
O Programa de Saúde da Família PSF, implantado em Curitiba nessa gestão,
foi tema polêmico no Conselho Municipal de Saúde. Parte dos conselheiros avaliaram
que havia uma rede de serviços criada no Município e que não seria o nome PSF que
43
alteraria a prática dos profissionais, principalmente dos médicos. Somente a proposta
do PSF não garantiria uma mudança no processo de trabalho nas Unidades de Saúde,
isto é, centrar a ação numa perspectiva mais coletiva do que individual.
A contratação dos agentes Comunitários de Saúde foi também tema polêmico
no Conselho Municipal de Saúde. A Associação Brasileira de Enfermagem e outras
entidades que compunham Conselho Municipal de Saúde questionavam a contratação
destes novos profissionais de saúde. A preocupação era com as atribuições e forma de
contratação dos Agentes comunitários que não previa os direitos trabalhistas.
Após muita discussão na comissão criada para estudar o tema, e no Conselho
Municipal de Saúde, foi aprovada a contratação dos agentes comunitários com alguns
votos contrários. Essa contratação ocorreu por meio de uma empresa terceirizada da
Prefeitura, utilizada para este fim.
A atual Diretora de Planejamento e Informação da Secretaria Municipal de
Saúde considera que o PSF é uma forma aprimorada dos princípios da atenção
primária da saúde, mas tem ferramentas próprias, sendo necessário capacitar todos os
profissionais envolvido com este Programa e aponta, como desafio, melhorar a
formação médica, a habilidade clínica do médico generalista .
Na gestão 1997 2000, assumiu a Prefeitura Municipal de Curitiba Cássio
Taniguchi, apoiado também por Jaime Lerner, fechando três décadas com a mesma
direção política na saúde e dando continuidade em 2001 com a reeleição de Cássio
Taniguchi à Prefeitura de Curitiba.
Segundo a NOB/96 a condição de gestão nos municípios se constitui em gestão
plena da atenção básica e gestão plena do sistema municipal. Curitiba se enquadra
nesta última definindo e assumindo o pagamento dos serviços contratados, prestação
direta dos cuidados à saúde, através da expansão e diversificação própria, assumindo a
responsabilidade pela gestão do SUS no âmbito do município de Curitiba.
A diretora de Planejamento e Informação da Secretaria Municipal de Saúde
considera, na sua avaliação, que a gestão plena faz diferença na gestão do SUS,
proporcionando maior autonomia no seu gerenciamento. Desde 1991 que a secretaria
44
vem se preparando para assumir a gestão plena do Sistema. Em 1993 e 1994 foram
municipalizadas as autorizações de internamento hospitalar AIHs, e criada a central
de marcação de consultas e leitos. Em 1996 o município assumiu a gestão semiplena,
criando o Serviço de Controle e Avaliação e a Central de Atendimento ao Usuário e
em 1998 assume a gestão plena do Sistema (M.G.S., 16/02/02).
A luta dos movimentos de mulheres por uma atenção integral a saúde da mulher
vem de muitos anos. O Programa de Atenção Integral a Saúde da Mulher PAISM
discutido a nível nacional desde a década de 80 nunca de fato foi implantado. Alguns
municípios implantaram ações isoladas, não contemplando a atenção à saúde em todas
as fases da vida da mulher.
No município de Curitiba a Comissão da Saúde da Mulher, apresentava nas
reuniões do Conselho Municipal de Saúde vários problemas, nesta área, entre eles a
falta de leitos obstétricos nos hospitais da cidade, falta de qualidade no prénatal e no
momento do parto. A atuação da comissão contribuiu para a criação em 1999 do
Programa Mãe Curitibana que garante a realização de exames, consultas de prénatal
e vincula a gestante a um hospital da rede conveniada com o SUS.
Nesta mesma gestão foi implantado o programa Cidadão Saudável no Bairro
que envolve a participação de praticamente todas as Secretarias do governo Municipal
e trabalham o tema "vida saudável e coresponsabilidade na promoção e preservação
da saúde", incluindo novas abordagens para a educação em saúde.
O Programa de Saúde Mental Comunitária foi implantado em 2000 com
atendimento ambulatorial, e descentralização das ações. Algumas Unidades de Saúde
assumiram a realização de experiências locais em desintoxicação para alcoolistas e
quase a totalidade acompanha os egressos de internação psiquiátrica, visando sua
integração na família e na comunidade.
A Secretaria Municipal de Saúde, a partir do ano 2001, vem reorientando o
modelo de atenção à saúde dentro de uma concepção teórica elaborada pelo Dr.
Eugênio Villaça, que se constitui no Sistema Integrado de Serviços de Saúde SISS.
45
Esta proposta, segundo os gestores da S.M.S., avança na consolidação do SUS
através da integração dos vários pontos de atenção (Unidades de saúde, ambulatórios
de consultas especializadas, hospitais, laboratórios de análises clínicas, entre outros),
nos quais o usuário será acompanhado durante o período de utilização dos serviços de
saúde, verificando desta forma a evolução dos procedimentos.
A Unidade de Saúde é considerada a porta de entrada do sistema, constituindo
se na principal estratégia para que ocorra o SISS.
"A gente trabalha com uma lógica, a Unidade de Saúde tem que ser a porta de
entrada, isso quer dizer que você tem que dar condições para que o paciente entrando
pela porta de entrada, ele permaneça nesse nível de atenção a maior parte da vida
dele" (M.G.S.,16/02/02).
O Plano Municipal de Saúde foi construído na perspectiva do SISS e aprovado
na 6.ª Conferência Municipal de Saúde, realizada em setembro de 2001.
O FOPS questionou a forma como a discussão do SISS aconteceu nas
conferências distritais e na 6.ª Conferência Municipal, alegando que as entidades de
trabalhadores e de usuários não conheciam o teor da proposta e que havia necessidade
de maiores estudos e debates para esclarecimento deste novo Sistema proposto pela
administração pública.
A proposta deste Sistema foi aprovada na 6.ª Conferência de Saúde e tem sido o
novo paradigma da Secretaria Municipal de Saúde no processo de implementação do
SUS em Curitiba.
Apontaremos, diante deste histórico, algumas considerações a respeito da
política municipal de saúde no Município, que entendemos importantes.
Identificamos que a linha política de gestão do SUS, em Curitiba, tem sido a
mesma, embora tenham se alternado vários Secretários Municipais de Saúde ao longo
dos últimos 12 anos. Sendo que, vários gestores municipais da saúde tiveram
participação no movimento da reforma sanitária, no Centro Brasileiro de Estudos da
Saúde, defendendo a saúde pública, ora no exercício de funções técnicas, ora em
fóruns, que defendiam a tese da saúde pública.
46
Historicamente, o processo de implantação do SUS, em Curitiba, contou com a
participação da população, através das Conferências Municipais e do Conselho
Municipal de Saúde, principalmente as quatro primeiras conferências, com forte
presença do FOPS que apresentava os problemas de saúde e propostas, visando o
acesso e melhoria do Sistema de Saúde.
Atualmente, a Secretaria Municipal de Saúde tem uma rede regionalizada,
hierarquizada dos serviços com uma administração descentralizada nas Unidades de
Saúde e nos Distritos Sanitários, sendo responsável pela gestão de todo o Sistema de
Saúde, desde as ações básicas até as de maior complexidade. Curitiba é uma das
cidades brasileiras, que se destaca nacionalmente pelo modelo de gestão programas,
tais como o "Mãe Curitibana" nos cuidados da saúde maternoinfantil, e outros da
Administração Municipal.
A rede de saúde pública no município de Curitiba é constituída por cento e
quatro Unidades de Saúde, (quarenta e duas Unidades com Programa Saúde da
Família, oito Unidades com Especialidades, cinco unidades 24 horas), um Centro
Médico Comunitário (Hospital Geral e Maternidade) com sessenta leitos no extremo
sul da cidade e um laboratório de análises e clínicas.
Pelo histórico e considerações feitas da política municipal de saúde não
podemos desconsiderar todo o processo de organização da rede de serviços de saúde
em Curitiba, porém, existem problemas nessa política, que foram detectados pelo
FOPS e Sindsaúde e pela população quando se dirige à imprensa para reclamar do
SUS em Curitiba.
Os principais problemas apontados pelo FOPS se referem à falta de consultas
especializadas e dos serviços de apoio e diagnóstico, como aponta um médico da rede
municipal :
"Não dá para fazer muita coisa na Unidade de Saúde, como internamento,
qualidade de internamento, principalmente exames complementares, tem gente que
morre esperando cateterismo, teve um caso nosso que o paciente teve infarto
esperando teste de esforço e outros casos que precisam de especialistas, aí que está o
47
estrangulamento do sistema" (...) alguns tipos de medicamentos que a rede básica
não tem, atendimento secundário, você não vê avançar, isso faz anos e o tal do
intersetorial, segurança, saneamento básico, desemprego que influenciam na saúde,
não acontece". (S.M., 05/07/01)
A população vem participando do Conselho e discutindo as diretrizes e modelos
de gestão, mas os problemas da falta de assistência parecem que foram absorvidos pela
discussão mais geral. Os conselhos locais, que poderiam cobrar o acesso e qualidade
da assistência, acabam limitados à resolução de problemas individualizados e poucos
resultados de melhoria podemos observar nas Unidades de Saúde.
A lição que fica é que o processo de implantação do SUS passa pela concepção
de administração pública e projeto de sociedade que se esta construindo no município.
Não dá para discutir saúde isolada das demais políticas públicas, como a educação,
assistência social, criança, trabalho, financiamento, pois será difícil ter acesso aos
serviços de saúde se lógica da administração é privada.
Os avanços no SUS não dependem somente de uma reorganização do Sistema
de Saúde. Não será estabelecendo somente um fluxo de atendimento para o paciente
não fugir do "radar do sistema" que a população terá acesso as consultas
especialidades, leitos hospitalares, qualidade no atendimento, medicação enfim todo o
atendimento necessário para a concretização da saúde como um direito de todos e
dever do Estado.
A implementação de fato do SUS passa pela articulação entre as políticas
públicas, como emprego, educação, criança, assistência social, cultura, lazer e uma
política de financiamento que privilegie a construção de um Município, Estado e
União independente dos interesses do capital.
3 MOVIMENTO POPULAR DE SAÚDE / COMISSÕES DE SAÚDE EM
CURITIBA
48
A luta pela saúde em Curitiba nos finais da década de 70 tinha como principais
protagonistas as Associações de Moradores, as Comunidades Eclesiais de Base e as
Comissões de Saúde .
Na década de 80 existia um movimento forte das associações de moradores em
Curitiba, como relata a militante do movimento de saúde: "havia uma preocupação em
discutir não só os problemas locais, mas de toda a cidade. O Movimento de
Associações de Bairro MAB se reunia em alguns momentos e discutia os problemas
comuns e reivindicam em conjunto"(D.C.G.,04/07/01).
As comissões de saúde na década de 80 se constituíram formas de organização
das classes populares de lutar pela implementação da saúde pública no município de
Curitiba.
As comissões de saúde se reuniam para discutir os problemas das Unidades de
Saúde e os problemas dos bairros, que de alguma forma interferiam na saúde da
população, como: a falta de saneamento básico, o desemprego etc. Também era pauta
das reuniões as formas alternativas de cuidar da saúde, através da utilização das ervas
medicinais.
A participação da população na comissões de saúde era intensa, em alguns
bairros reuniam cem pessoas, com forte presença das associações de moradores que
reivindicavam a construção de Unidades de Saúde, contratação de médicos e a
melhoria no atendimento das Unidades de Saúde e no Sistema Municipal de Saúde.
"Na comissão de saúde participava a comunidade e a Associação de Pais e
Filhos. Tinha uma boa participação, a gente sempre fazia embate com o Posto de
Saúde e fiscalizava a atuação do médico, quando a gente tinha algum problema se
reunia e discutia com o pessoal da Unidade de Saúde". (S.G. 13/1201)
As reivindicações das comunidades em 1980 estavam ligadas principalmente
aos problemas relacionados a falta de saneamento básico, pois não havia canalização
para água potável, muito alagamento, não tinham ruas e as valetas eram a céu aberto.
Como explica o Presidente da Associação de Moradores daquela época:
49
"A água era do poço que se misturava com a da privada, que se misturava com
a água do Rio Belém que quando chovia transbordava, então as doenças aqui eram
inúmeras, o índice da mortalidade infantil era pior que o do nordeste, as crianças
aqui morriam devido a contaminação, diarréia , desidratação". (E.S.F. 05/07/01)
Em 1.979 a Comunidade Santo Inácio de Loiola localizada no Bairro Boqueirão
região sul de Curitiba, através da sua Associação de Moradores realizou um convênio
com a Prefeitura para viabilizar o funcionamento da Unidade de Saúde.
A Prefeitura contratou um médico e três auxiliares e a comunidade cedeu o
espaço físico. O Posto de saúde foi pensado junto com a comunidade através da
comissão de saúde que discutia o seu funcionamento. "A população dizia como devia
ser o atendimento médico, tem que ver o homem como um todo, no seu físico,
psíquico, cabeça e corpo, não é só examinar o efeito, mas ver a causa, para combatê
la" (E.S.F.05/07/01).
Após o rompimento do convênio com a prefeitura, a comunidade conseguiu
recursos da Holanda, através da Igreja Católica e construiu um Posto de Saúde e a
comunidade escolheu os médicos e auxiliares de saúde. Enquanto nas outras Unidades
de Saúde a Comissão de Saúde tinha o papel de fiscalizar a política local de saúde,
nesse bairro a comissão gerenciava a Unidade de Saúde, ela que escolhia os
funcionários, treinava, comprava medicamentos e material permanente.
Na Vila São Pedro a história da organização da população em torno da questão
da saúde acontece em 1.979 através das Comunidades Eclesiais de Base CEBs. Este
setor da Igreja aproveitou o tema central da campanha da fraternidade, que era saúde e
procurou ampliar a discussão nas missas, sendo um meio de atingir as pessoas que não
participavam de grupos organizados.
No processo de discussão dos problemas de saúde no bairro, a comunidade
decidiu encaminhar um abaixo assinado reivindicando um hospital, o qual foi entregue
para o Prefeito Municipal em visita no bairro.
Na mesma época a Secretaria Municipal de Saúde contratou alguns médicos
vindos do Município de Campinas que defendiam a atenção primária de saúde e sua
50
descentralização, coincidindo com as reivindicações da Comunidade da Vila São
Pedro. Dessa união de esforços foi criada a Unidade de Saúde nessa Vila, sendo essa a
segunda Unidade de Saúde vinculada à Prefeitura Municipal de Curitiba.
A primeira Unidade de Saúde vinculada a prefeitura foi a do bairro Santa
Amélia, que possibilitou um processo de debate em torno da saúde, ocorrendo uma
intensa participação da população no processo de seleção e capacitação dos
profissionais, priorizando as pessoas residentes na comunidade para contratação.
Na Vila Acordes houve o mesmo processo um ano após da Vila São Pedro, em
1980. A população reivindicava uma Unidade de Saúde e se estabeleceu a mesma
dinâmica de seleção de pessoal. O espaço para funcionamento dessa Unidade
inicialmente foi cedido pela comunidade.
É interessante destacar as diferentes formas participação e organização da
comunidade na luta pela saúde pública. Na Vila São Pedro a discussão sobre os
problemas da saúde e controle social da política local de saúde não se restringia a
comissão de saúde, envolvia também a Associação de Moradores. A articulação dessas
organizações contribuiu para a continuidade do controle social quando a Unidade de
Saúde foi transferida para o prédio da Prefeitura e passou a ser gerenciada pela
Secretaria Municipal de Saúde.
O mesmo não aconteceu na Vila Acordes, como aponta o militante do
movimento de saúde: “quando a Unidade de Saúde saiu da casinha cedida pela
comunidade para ir para o prédio da prefeitura o pessoal se perdeu" (A. B.,10/07/01)
Uma diferença identificada na luta da população destes bairros pela construção
de Unidades de Saúde, foi o envolvimento maior da população da Vila São Pedro que
procurava ampliar a discussão sobre saúde, indo além da comissão de saúde, questão
essa não identificada na Vila Acordes onde o controle social se restringia a comissão
de saúde.
As Comunidades Eclesiais de Base constituíramse, naquele momento, num
mecanismo facilitador para estabelecer o debate sobre saúde e a organização das
comissões de saúde e das associações de moradores que estavam emergindo na década
51
de 80. A discussão sobre ervas medicinais era, também, uma forma de envolver a
população no debate sobre saúde.
O momento de encontro dessas experiências de organização popular na saúde
foi o dia 7 de abril, considerado nacionalmente "Dia de Luta pela Saúde". "Havia um
grande encontro das comissões de saúde neste dia para debater as questões sobre
saúde e alguns encontros esporádicos durante o ano, que se começou a denominar
esse processo "Movimento Popular de Saúde" (A. B.,10/07/01).
A vinculação do Movimento Popular de Saúde de Curitiba com o MOPS
Nacional aconteceu mediante a participação de lideranças locais do movimento nos
Encontros Nacionais do MOPS. Esses líderes começaram a coordenar o processo de
organização nacional do movimento em Curitiba e Região Metropolitana.
Uma das importantes lutas que aconteceram em dezembro de 1984, reunindo
em torno de mil pessoas, foi a manifestação em frente do INAMPS no centro de
Curitiba, reivindicando remédio, como informa o médico da Unidade de Saúde da Vila
Santo Inácio:
"Nas Unidades de Saúde da Vila São Pedro, Santa Amélia e a nossa não estava
vindo medicamento do INAMPS, principalmente para hipertensão. Começou uma
articulação entre os grupos de hipertensos dessas comunidades com as comissões de
saúde e daí foi programado uma manifestação em frente do INAMPS no centro da
cidade para reivindicar mais remédios" (S.M., 05/07/01).
Essa manifestação repercutiu na cidade, fortalecendo o movimento. Houve
uma segunda manifestação em frente à Prefeitura, que reivindicava mais postos de
saúde e medicamentos.
Outro importante movimento do final da década de 80 reivindicou, do prefeito
Jaime Lerner, o não fechamento das Unidades de Saúde no período noturno. O
Prefeito justificava seu ato alegando a falta de funcionários e equipamentos. As
Associações de Moradores do Xapinhal (organização que envolve os bairros: Xaxim,
Pinheirinho e Alto Boqueirão) mobilizaram e organizaram um ato público no dia 16 de
52
janeiro de 1989, em frente à prefeitura, como protesto ao fechamento do 3º turno e a
falta de recursos para a saúde.
A mobilização foi vitoriosa e o Prefeito não fechou as Unidades de Saúde no
período noturno.
Em 1990, aconteceu um surto de meningite e a população se organizou para
discutir o problema e cobrar ações do poder público, como relata um participante do
movimento:
"Na época da meningite estivemos no Salão da Igreja Bom Jesus, muitas
pessoas participaram, tinham cento e poucas pessoas. Nós conseguimos trazer 37
pessoas que eram do conselho de saúde do Itatiaia e, então, foi uma discussão muito
forte naquela época, e ajudou muito a comunidade, nós fechamos até o colégio para
as autoridades se mobilizarem a respeito desse assunto" ( S. G., 13/12/02).
Foi no processo de embate e discussão sobre o tema que a população se
apropriou do conhecimento técnico sobre a doença e avaliou sua importância para a
comunidade, exigindo dos governantes solução para o problema.
Essas manifestações foram importantes para unificar a população em torno dos
problemas comuns, refletindo a respeito da problemática da saúde de forma mais
geral, indo além dos problemas locais. A respeito disso, relata um militante do
movimento de saúde:
"A saúde passou a ser marcada como algo da política pública, acredito que
isso possibilitou a participação do movimento popular de saúde no debate, mais para
frente, da entrada no SUS com força" (A .B., 10/07/01).
No resgate histórico dos movimentos de saúde, destacase nos anos 78 e 79 a
atuação dos profissionais de saúde junto às associações de moradores que discutiam
saúde e direitos sociais.
Alguns desses profissionais fizeram parte do Centro Brasileiro de Estudos de
Saúde CEBES, espaço no qual se faziam os debates sobre saúde pública.
53
Os médicos que participavam do CEBES lideraram, também, o Movimento de
Renovação Médica REME, e, posteriormente, ganharam as eleições para a diretoria
do Sindicato dos Médicos no Paraná.
No ano de 1980, parte desse grupo foi contratado pela Prefeitura Municipal de
Curitiba e passou a atuar junto à população, discutindo os problemas e contribuindo
com uma grande mobilização nos bairros Boqueirão, Vila São Pedro e Jardim Santa
Amélia, que reivindicavam postos de saúde, como relata o médico, militante do
movimento REME:
"A maioria desses postos de saúde eram originários desses movimentos, que
tiveram seu auge em 1989, depois o movimento começou a definhar, no sentido da
cooptação, porque entraram prefeitos cooptando lideranças" (F.F., dia 16/07/01).
Os governantes, aproveitando a falta de politização e crítica dos líderes dos
movimentos, adotaram políticas clientelistas com o intuito de cooptação. O governo
também utilizou os técnicos para exercerem o controle sobre a população, como relata
o médico:
"Algumas das lideranças assumiram cargos no governo e também havia
profissionais que achavam que o movimento de saúde não tinha nada que ver com
política ideológica" (F.F., 16/07/01).
A teoria de Gramsci explica o papel dos intelectuais junto aos movimentos
sociais e ao Estado.
O critério utilizado por Gramsci para falar de intelectual é a função que um
grupo desempenha na sociedade, no complexo geral das relações sociais. Segundo o
autor "todos os homens são intelectuais, mas nem todos os homens desempenham na
sociedade a função de intelectuais". (GRAMSCI10, apud AMMANN, 1991, p.146).
Na sociedade encontramos os intelectuais que são os empregados, os
comissários do grupo dominante, os funcionários da administração pública que podem
legitimar as decisões da classe burguesa, assegurando legalmente a disciplina dos
grupos que não estão de acordo com esta direção.
10 GRAMSCI, A. Os intelectuais e a organização da cultura. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1968.
54
Nessa mesma sociedade também encontramos aqueles intelectuais que
estabelecem um vínculo com a classe subalterna , "passando a determinar e organizar a
reforma moral e intelectual" (GRAMSCI11, apud AMMANN, 1991, p. 147).
O vínculo orgânico defendido por Gramsci, consiste num compromisso, na
adesão sem restrições, é a fusão total de interesses. Na relação intelectual orgânico e
classe trabalhadora devese "superar o caráter mero especialista e tornarse um
dirigente, o que eqüivale a especialista mais político" (AMMANN, 1991, p. 148).
Coutinho (1996) faz uma distinção importante entre "intelectuais tradicionais" e
"intelectuais orgânicos". Para Gramsci, segundo COUTINHO, o intelectual orgânico:
(...) é aquele elaborado pela classe em seu desenvolvimento histórico, podendo ser tanto ligado à burguesia quanto às classes trabalhadoras. O Intelectual tradicional é aquele ligado a um aparelho de hegemonia que não está necessariamente vinculado a uma classe; são tradicionais, portanto os intelectuais que atuam em organismos como Universidade ou a Igrejas, que são organizações classistas stricto sensu, mas que podem comportar em seu interior diferentes propostas de sociedade, diferentes visões de mundo, podendo haver intelectuais tradicionais (professores, escritores, sacerdotes etc) tanto conservadores quanto revolucionários. (GRAMSCI12, apud COUTINHO, 1996, p. 115)
Essa definição de termos vêm esclarecer, principalmente, que o "tradicional"
não é sinônimo de intelectual conservador ou descompromissado. No aparelho do
Estado encontramos profissionais que adotam uma posição política mais avançada e
um compromisso com as classes populares, contribuindo para desmistificar do papel
das autoridades aos olhos da população.
Nesse sentido, JACOBI afirma que: "certos setores do aparelho do Estado
passam a assumir um papel de democratizadores das relações entre o poder estatal e a
população, colocando em pauta a questão da institucionalização e da capacidade dos
movimentos sociais superarem a dicotomia cooptação/autonomia por práticas que
configuram um processo onde ambos os pólos fortalecemse na interação." (JACOBI,
1978, p. 18).
A aliança entre os técnicos e classes populares é possível na medida em que
haja uma troca de saberes entre ambos, que o "basismo" e a dominação do saber
11 GRAMSCI, A. Cultura y literatura. Barcelona: Península, 1972.12 ___________ . Os intelectuais e a organização da cultura. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1968.
55
técnico sejam superados por uma relação democrática, e o conhecimento seja uma
ferramenta na luta por transformação da realidade social.
Analisando a história do movimento de saúde em Curitiba identificamos, na
pesquisa documental e com os atores envolvidos nos movimentos sociais na década de
80 a 90, que as lutas aconteceram a partir das associações de moradores e comissões
de saúde, e que tiveram influência da Igreja Católica.
Há de se registrar, também, a atuação dos profissionais de saúde, que atuavam
em conjunto com as associações de moradores e que participavam de outros
movimentos na defesa da saúde pública e da sua categoria profissional.
Em 1992, com a criação dos Conselhos Locais de Saúde, as pessoas que
integravam essas comissões foram participar dos Conselhos Locais de Saúde, espaço
de controle social criado legalmente, cuja composição é paritária entre os usuários,
trabalhadores de saúde e gestor.
As Comissões de Saúde, em Curitiba, foram criadas anteriormente à
Constituição Federal. Eram organizações populares, vinculadas ou não às Associações
de Moradores, tinham autonomia e independência em relação aos organismos
governamentais. Essas comissões não se constituíram como organizações oficiais do
sistema de saúde, detinham maior capacidade de fiscalizar, pressionar e mobilizar a
população na defesa dos direitos à saúde.
Os limites do Conselho Local de Saúde são apontados pela militante do
movimento de Saúde e integrante do Conselho Local de Saúde: "Hoje, através dos
Conselhos Locais de saúde discutimos a pauta do dia a dia da Unidade de Saúde e
não conseguimos discutir os problemas de saúde do bairro e antigamente fazíamos as
duas coisas". (D.C.G., 04/07/01)
Identificamos nas falas dos entrevistados o poder maior das comissões de
saúde, enquanto uma participação mais reivindicativa do que homologatória como
alguns relataram sobre os Conselhos Locais de Saúde. Percebemos durante a pesquisa
que as pessoas foram se inserindo no Conselho Local de Saúde e as Comissões foram
se extinguindo, como diz esse ex conselheiro local de saúde: "a comissão hoje está
56
praticamente parada e principalmente depois que criou o conselho de saúde, as ações
estão centralizadas no conselho, na comissão discutese muito pouco." (S.G.,
13/12/01)
A proposta da criação dos Conselhos Locais de Saúde nas Unidades de Saúde
no município de Curitiba foi defendida e aprovada 1ª Conferência Municipal de Saúde
de Curitiba em 1991.
O período de 1990 a 2000, a luta na defesa da saúde pública muda de cenário.
Enquanto na década de 70 e metade da década de 80, a população se organizava nos
espaços das associações de moradores, comissões de saúde, movimento popular de
saúde, no período pósconstituinte o perfil das lutas muda, agora menos populares e
com expressiva participação nos espaços institucionais.
No próximo capítulo analisaremos a trajetória histórica do FOPS, apontaremos
sua atuação junto aos espaços de controle social Conferências e Conselhos de Saúde,
bem como sua atuação na defesa da saúde pública no município de Curitiba PR.
57
III FÓRUM POPULAR DE SAÚDE DE CURITIBA UM
MOVIMENTO NA SAÚDE
1 TRAJETÓRIA HISTÓRICA E ATUAÇÃO POLÍTICA NA DEFESA DA SAÚDE
PÚBLICA NO MUNICÍPIO DE CURITIBA NO PERÍODO 1990 2001
1.1 Antecedentes Históricos 1990
Na década de 80, as comissões de saúde dos bairros da região sul de Curitiba
discutiam os problemas neles vivenciados, tendo pouca participação no debate da
elaboração da Constituição Federal e da Lei Orgânica de Saúde, como o Assessor dos
Movimentos de Saúde informa:
"a gente acompanhou à distância, não era para a grande maioria um problema
a ser enfrentado" (A.B., 10/07/01).
Na medida em que as lideranças do Movimento de Saúde e Associações de
Moradores vão percebendo a importância desse momento político, de elaboração de
leis que tratam dos direitos sociais, o Movimento das Associações de Moradores
MAB promove uma reunião com a participação daquelas lideranças, a fim de discutir
as propostas para elaboração da Constituição Federal.
A participação da população na política de saúde é assegurada, embora muito
restritamente, a partir da implantação das Ações Integradas de Saúde – AIS, em 1985,
modelo de saúde que previa principalmente a descentralização das ações básicas de
saúde do nível federal e estadual para o município.
Como mecanismo de controle social deveria ser criada nos municípios
brasileiros a Comissão Interinstitucional Municipal de Saúde CIMS. Essa comissão
previa a participação das três esferas de Governo (Federal, Estadual e Municipal),
prestadores de serviços de saúde e apenas 2 representantes de usuários, 1 dos
trabalhadores da área urbana e 1 da área rural.
Havia, por parte do assessor do Secretário Municipal de Saúde de Curitiba, na
época, resistência na criação de tal comissão, como diz o militante do Movimento de
58
Saúde: "Representantes dos bairros da região sul, que tinham experiência com as
comissões de saúde e tinham uma certa facilidade para dialogar com representantes
da Secretaria Municipal de Saúde, reivindicaram a participação de representantes
das comissões de saúde na CIMS "(A.B.,10/07/01).
O Secretário Municipal de Saúde de Curitiba discordava da proposta, alegando
que as comissões de saúde da região sul de Curitiba não representavam o Município. O
militante do Movimento de Saúde comenta:
"Continuamos pressionando e conseguimos colocar um representante na
comissão, mas que funcionou muito mal. Não conseguimos acompanhar a dinâmica
desse representante que estava lá dentro e se perdeu (...); então foi o primeiro
embrião de uma busca de participação (A.B., 10/07/01).
Essa participação possibilitou que a população organizada nas comissões de
saúde, bem como outros atores envolvidos no debate sobre saúde tomassem
conhecimento da lei do governo municipal que tratava das Conferências de Saúde e da
criação do Conselho Municipal de Saúde.
No dia 7 de abril de 1991, Dia Nacional de Luta pela Saúde, aconteceu o
Encontro Popular de Saúde. Participaram desse evento várias entidades populares,
sindicais, Movimento Popular de Saúde e Associações de Bairros de Curitiba, cuja
pauta era o Sistema Único de Saúde e a lei municipal que previa a realização das
Conferências e criação do Conselho de Saúde de Curitiba.
A lei que criava o Conselho Municipal de Saúde era inconstitucional, não
garantia a paridade entre os usuários e demais segmentos no Conselho Municipal de
Saúde.
Segundo a Lei Federal n.º 8.142/90, que regulamenta a forma de a população
participar do controle da política de saúde, prevê que o Conselho de Saúde seja
composto por 50% de usuários e 50% dos demais segmentos trabalhadores de saúde,
prestadores de serviços de saúde e gestores.
Em 1993, o Conselho Nacional de Saúde aprovou a Resolução n.º 33, que
especificou o percentual de participação dos trabalhadores de saúde em 25%, gestores
59
e prestadores em 25% e usuários em 50%. Os Conselheiros devem ser eleitos nas
Conferências de Saúde e cada segmento elege seus representantes.
A Lei Municipal de Curitiba n.º 7631 feria os dispositivos legais estabelecidos
na Constituição Federal e lei n.º 8.142/90. Tal lei não respeitava a composição
paritária, nem o princípio da autonomia dos usuários e trabalhadores para escolherem
seus representantes.
No Encontro Popular de Saúde do dia 07 de abril de 1991, com a participação
de 120 pessoas, deliberouse que as entidades e os presentes deveriam intervir nesse
processo. Setores participantes do Encontro avaliaram que somente o setor popular era
frágil, sendo necessária uma articulação com o movimento sindical geral e o
movimento sindical vinculado à saúde para pressionar o governo e solicitar a alteração
da lei municipal.
A mesma avaliação foi realizada pelo Movimento Popular de Mulheres que, na
época, se reunia no interior do Estado e na Capital, para discutir tanto medicina
alternativa como política de saúde. Uma militante deste movimento relata:
"(...) não podemos levar isso sozinhos com o MOPS. Acho que é uma hora de
todos que defendem o Sistema Único de Saúde e o Controle social estarem juntos"
(L.M., dia 20/11/01).
No Encontro, ficou evidente a importância de as entidades presentes somarem
esforços para intervir junto ao Governo Municipal, tendo em vista alterar a lei e
garantir a participação popular no controle social da saúde.
É nesse momento, a partir da avaliação de que o MOPS não integrava os setores
presentes no Encontro, que foi criado o Fórum Popular de Saúde FOPS, entendendo
que ele ampliava a participação, envolvendo e integrando os profissionais de saúde e
sindicatos, na discussão da saúde.
No início essa união gerou uma certa desconfiança dos setores populares
presentes no MOPS com os trabalhadores de saúde, por estes serem funcionários do
Estado.
60
Uma profissional de saúde fez a seguinte avaliação sobre esta questão: "O
FOPS conseguiu fazer essa "costura" de mostrar que nós, profissionais, às vezes
ocupando cargo em comissão ou de confiança técnica, a nossa militância política, a
nossa lealdade política era com o pólo popular" (L.M., 20/11/01).
No primeiro ano (1991) de existência do FOPS, houve uma grande participação
de entidades organizadas nos bairros de Curitiba, como Associação de Moradores,
Comissões de Saúde, Comunidades Eclesiais de Base CEBs, representantes de
Paróquias da Igreja Católica, Movimentos de Mulheres, Movimento Popular de
Mulheres, Pastoral da Saúde, Movimento de Reintegração de Pessoas Atingidas pela
Hanseníase MORHAN e Grupo pela Vida.
Era também expressiva a participação de entidades sindicais e conselhos
representantes dos trabalhadores de saúde, embora em número menor do que as
entidades do campo popular.
Os integrantes do Movimento Popular de Curitiba MOPS avaliaram naquele
momento, que o FOPS ampliava as possibilidades de interferência na política
municipal de saúde, e portanto passam a integrar o FOPS.
Um dos militantes do MOPS explica essa fusão: "A maioria das pessoas
entendeu que o FOPS ampliou o MOPS. Na verdade, o MOPS desapareceu, paramos
de falar MOPS e passamos a falar FOPS, como se tivéssemos ampliando o MOPS e
dando outro nome a ele" (A.C., dia 14/12/01).
No decorrer dos anos foram se identificando objetivos diferentes entre o FOPS
e o MOPS. Este último, criado no final da década de 70, trabalhava práticas populares
de saúde com medicina alternativa e o FOPS não incorporou está prática como relata
um integrante do MOPS: "O MOPS mesmo acabou, porque paramos de discutir os
assuntos que o MOPS trazia. Essas práticas culturais e populares de saúde deixaram
de fazer parte da construção do FOPS" (A.C., dia 14/12/02).
Em 1994 tentouse retomar o MOPS. Alguns militantes desse movimento
entendiam que eles poderiam aglutinar lideranças dos bairros e discutir problemas de
saúde existentes, porque o FOPS discutia as questões mais gerais da saúde pública e
61
era difícil às pessoas dos bairros acompanharem a discussão. Mas não se rearticulou,
como relata um militante do MOPS: "Várias pessoas investiram tanto na organização
do MOPS, como na do FOPS. O MOPS não prosseguiu porque não houve uma
coordenação que garantisse sua continuidade, mas o FOPS continuou existindo e se
ampliando" (A.C., dia 14/12/01).
A importância do FOPS foi constituirse num espaço de discussão onde,
independente de categoria profissional ou movimento social, pudesse reunir pessoas,
entidades que queriam construir o Sistema Único de Saúde estabelecido
constitucionalmente.
1.2 Criação e Consolidação do FOPS 1991 a 1996
No dia 05 de maio de 1.991, em reunião ampliada com a participação de várias
entidades populares e sindicais, realizouse a instalação do FOPS, que se definiu, na
época, como uma articulação de entidades sindicais e populares unidas na defesa do
Sistema Único de Saúde SUS e do seu controle social. O objetivo principal do
FOPS é estar organizado para interferir nas Políticas Públicas de Saúde, pela
articulação das entidades em torno dos Conselhos e Conferências de Saúde e da
realização de mobilizações da sociedade civil em defesa da saúde pública e da
cidadania.
O FOPS, em 1991, centralizou sua atuação na defesa da implantação do
controle social no SUS e se capacitou, tecnicamente, com elaboração de propostas
para a 1.ª Conferência Municipal de Saúde, precedida de várias reuniões com os
segmentos dos usuários e trabalhadores de saúde.
Na primeira reunião do FOPS foi discutido o Projeto do Governo Municipal
que criava o Conselho Municipal de Saúde e não atendia à legislação, não garantindo a
paridade dos usuários e, também, encaminhamentos necessários à alteração da lei.
O FOPS contestou o autoritarismo do Prefeito e solicitou por meio de ofício
assinado por 47 entidades, a revogação da lei municipal n.º 7631, de 17 de abril de
62
1.991, que criava o Conselho de Saúde. Solicitou também que o Conselho nomeado
funcionasse em caráter provisório até a realização da Conferência de Saúde.
Frente à pressão popular, o poder público municipal, mesmo sem mudar a lei,
redefiniu a composição do Conselho. Aumentou a representação de usuários, não
deixando ainda claros os critérios de indicação das entidades participantes, nem o
caráter de provisoriedade do Conselho e, pelo Decreto n.º 362, de 21 de junho de
1.991, o governo municipal indicou às entidades indicadas pelo mesmo, para compor a
direção do 1.º Conselho Municipal de Saúde.
As entidades que congregavam o FOPS e que foram contempladas na lei, após
um processo de discussão intensa, decidiram participar do Conselho, como forma de
denunciar e apresentar propostas que fossem ao encontro das necessidades dos
usuários.
Seis entidades do FOPS entraram no Conselho: Central Única dos
Trabalhadores CUT, Movimento Popular de Saúde MOPS, PróCentral de
Movimentos Populares e Movimento de Reintegração de Pessoas Atingidas pela
Hanseníase MORHAN, Sindicato dos Enfermeiros e Sindicato dos Empregados em
Estabelecimentos de Saúde.
Essa posição foi oficialmente comunicada ao Prefeito, especificando que
aquelas entidades faziam parte do FOPS, e estariam dentro do Conselho lutando pela
democratização desse órgão e sustentando que sua composição e seu papel deviam ser
definidos na Conferência Municipal.
O militante do Movimento de Saúde avalia esse processo da seguinte forma:
"O FOPS se consolida por duas dinâmicas. Uma, pelo envolvimento das
entidades que entraram no conselho, que na lei previa a participação apenas do
MOPS; com a reformulação da lei, o segmento dos usuários passou a ter 4
representações. A segunda atuação importante foi a elaboração do regimento interno,
sobretudo na realização da 1.ª Conferência Municipal de Saúde, onde o FOPS se
destacou por sua organização". (A.B.,10/07/01).
63
No primeiro ano de existência do FOPS houve uma grande participação da
população na discussão da saúde e do controle social, em Curitiba.
Segundo documentação do FOPS∗, de 1991, aconteceram dez reuniões e um
seminário popular de saúde que reuniu 120 pessoas. Os objetivos do Seminário foram
analisar a conjuntura econômica e política e articular as entidades populares e
sindicais para pressionar o poder executivo com vistas a alterar a lei que criava o
Conselho Municipal de Saúde, que era inconstitucional.
Foram elaborados dois boletins: o primeiro esclareceu a população sobre o
FOPS, informando sobre a participação popular no SUS e sobre a realização da 1.ª
Conferência Municipal de Saúde de Curitiba. O segundo boletim do FOPS foi dirigido
à população paranaense, chamando sua atenção para a realização da 1.ª Conferência
Estadual de Saúde e convidando as entidades populares e sindicais para a plenária em
que se iniciaria a discussão do temário, critérios e outros procedimentos da
Conferência.
O FOPS teve uma participação importante na 1.ª Conferência Municipal de
Saúde em setembro de 1991, pois foi a única organização que apresentou teses nesse
evento. Os temas que fizeram parte das teses eram: Sociedade, Governo e Saúde;
Diretrizes para a Política Municipal de Saúde; Saúde do Trabalhador; Recursos
Humanos; Atendimento Hospitalar; Diagnóstico e Propostas para Organização dos
Serviços Ambulatoriais em Curitiba; Saúde Mental; Controle Social; Fundo Municipal
de Saúde; Práticas Alternativas de Saúde; Atendimento Odontológico e Vigilância
Sanitária.
Na tese "Sociedade, Governo e Saúde", o FOPS apresentou uma análise do
atual modelo econômicosocial, o neoliberalismo, apontando críticas a este modelo,
afirmando que: "O objetivo deste Estado é salvar o capitalismo da crise à qualquer
custo, eliminando todos os direitos econômicos, políticos e sociais que os
trabalhadores conquistaram, transformando o Estado num órgão exclusivamente
As reuniões realizadas em 1991 envolveram 206 usuários e 189 trabalhadores. Destas, duas não constavam o número de participantes.
64
garantidor da ordem e das regras da livre competição capitalista, da acumulação do
capital, da lei do mais forte" (Tese do FOPS, na 1ª Conferência Municipal de Saúde,
1991).
A discussão sobre saúde que o FOPS fez na Conferência partiu do conceito
mais amplo de saúde, defendido na Reforma Sanitária e na Lei Orgânica de Saúde,
sendo essa determinada por políticas públicas amplas, levando em consideração a
distribuição de renda, da terra, de acesso ao trabalho, a saneamento básico e outras
políticas que garantissem os direitos sociais.
O governo municipal reagiu, censurando, como relata uma profissional de
saúde: "Tivemos que brigar no plenário para que não fossem retiradas do texto final
da Conferência questões relacionadas à saúde" (L.M., 20/11/01).
Em relação aos temas mais gerais que interferem na saúde da população, como
habitação, saneamento básico, emprego, reforma agrária, os representantes do
Governo Municipal alegavam que era uma discussão econômica ou de outra Secretaria
do Governo e que na cabia à Conferência aprovar resoluções ou moções sobre esses
temas. "Nem todo mundo percebia a importância disso, porque tentavam sempre
restringir saúde numa visão de assistência e não a uma questão de promoção da
saúde" (L. M., 20/11/01).
Nessa primeira Conferência Municipal de Saúde o FOPS tinha maioria de
delegados, o que lhe permitiu aprovar grande parte das propostas apresentadas e
escolher um grande número de delegados para a Conferência Estadual de Saúde.
O FOPS também reivindicou, na Conferência Municipal de Saúde, a definição
da composição do Conselho, bem como a eleição do Presidente pelos conselheiros.
O primeiro Conselho Municipal de Saúde, gestão 1991/1993, foi criado por
decreto municipal e definidas pelo Prefeito as entidades que o comporiam. Dos 32
participantes apenas 6 entidades pertenciam ao FOPS.
O FOPS, desde sua existência, sempre no dia 07 de abril, "Dia Nacional de Luta
pela Saúde Pública", organizou atividades políticas e seminários enfocando os
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princípios do SUS e a necessidade de envolver a população na deliberação e
fiscalização da política pública de saúde.
No dia 07 de abril de 1992 o FOPS promoveu uma Conferência Popular de
Saúde que discutiu a participação popular nos Conselhos Locais de Saúde.
Durante os dez anos da participação do FOPS nas Conferências e Conselho de
Saúde no Município de Curitiba identificouse, na pesquisa, vários embates entre a
Secretaria Municipal de Saúde e o FOPS.
Na gestão 1991/1993 do Conselho Municipal alguns temas foram polêmicos e
debatidos no Conselho Municipal de Saúde, sendo um sobre Consórcios de Saúde.
O então Governador do Estado do Paraná, Roberto Requião, em 1992 criou
uma lei transferindo os Centros Regionais de Especialidade do Estado para os
Consórcios Intermunicipais de Saúde. Toda a estrutura física, equipamentos e recursos
humanos públicos foram cedidos para essa nova modalidade. O consórcio é de caráter
privado e não segue as orientações e normas de uma entidade pública, mesmo
recebendo recursos públicos das 3 esferas de governo: federal, estadual e municipal.
As contratações são pelo regime da CLT Consolidação das Leis Trabalhistas, sem
realização de concurso público e sem nenhum controle social.
Há várias denúncias que chegam ao FOPS e ao Sindicato dos Trabalhadores e
Servidores em Serviços de Saúde Públicos, Conveniados, Contratados ou
Consorciados ao SUS e Previdência do Estado do Paraná SINDSAÚDE de
cobrança "por fora" nesses consórcios, isto é, a população paga impostos e quando
necessita dos serviços de saúde é obrigada a pagar novamente.
A idéia de consórcios defendida pelo movimento sanitário não é a mesma
implantada no Estado do Paraná. Os consórcios devem promover a integração de
municípios de uma determinada região do Estado para garantir o acesso à população
no nível secundário. Deve ser parte do SUS e seguir todas as regras de uma
organização pública, pois as fontes de financiamento são públicas.
66
Os representantes do FOPS avaliaram também que essa forma de organização
dos serviços de saúde consistia num boicote à organização do SUS, era uma instância
paralela ao Sistema de Saúde Público e sem controle social.
A posição da maioria dos conselheiros foi pela não aprovação e, mesmo assim,
houve grande manipulação do poder executivo para que fosse aprovado. O Secretário
de Saúde utilizou o "voto minerva".∗
Até hoje Curitiba não tem consórcio de saúde, e há restrição ao atendimento nas
Unidades de Saúde de Curitiba às pessoas residentes nos municípios da região
metropolitana.
Outro tema que fez parte da pauta do Conselho, por iniciativa do FOPS, foi a
necessidade de implantação de um política de comunicação. Desde a primeira gestão
do Conselho já se cobrava da Secretaria Municipal de Saúde a elaboração de boletins,
cartilhas, folhetos para divulgação das resoluções aprovadas nas Conferências e no
Conselho, como relata a integrante do FOPS: "O material das conquistas que
obtínhamos era um parto difícil de sair" (L.M., 20/11/01).
A divergência com os representantes do governo era com o conteúdo dos
materiais, pois o FOPS queria colocar os problemas do SUS, locais para denunciar,
enfim, expressar a realidade e subsidiar a população na busca de seus direitos.
Frente a essa dificuldade, em 1993 foi publicada a primeira cartilha do FOPS,
com recursos próprios, que abordava sobre a participação da sociedade na política de
saúde. A cartilha continha matérias que incentivava população à participar dos
conselhos locais de saúde, esclarecia a diferença entre comissões e conselhos locais de
saúde. Informava também a criação e conquistas do FOPS, os telefones para reclamar
das irregularidades no atendimento do SUS e a relação dos representantes dos usuários
e dos trabalhadores no Conselho Municipal de Saúde.
"Eu me lembro da reação dos conselheiros dos prestadores de serviço ao ver
em nossa cartilha, feita muito simples, mas dizendo o que queríamos" (L.M.,
20/11/01).
Presidente tem o direito de votar duas vezes.
67
Os representantes do FOPS no Conselho não se acomodaram, lutaram no
espaço institucional para ter boletins, jornais, em suma, uma política de comunicação
no SUS; mas também se organizaram fora desse espaço para expressar seu
pensamento, suas concepções de forma independente, como diz uma conselheira:
"Não podíamos ficar satisfeitos com o espaço do Conselho, mesmo com
maioria, porque a qualquer momento poderíamos perder esse espaço. A existência do
FOPS é uma coisa preciosa, porque ele pode se contrapor ou complementar aquilo
que o governo municipal nos impede de publicar" (L.M., 20/11/01).
No dia 03 de abril de 1993, em comemoração ao Dia Nacional de Luta pela
Saúde Pública, o FOPS, em parceria com o Deputado Estadual Florisvaldo Fier,
promoveu o I Encontro Estadual Popular, reunindo 108 pessoas de 32 municípios do
Paraná. Foi o momento inicial de avaliar os primeiros passos do SUS em Curitiba e no
Paraná.
Em julho de 1993, o FOPS começou a mobilizar as entidades populares e
sindicais para participarem da discussão das teses e preparar sua intervenção na 2.ª
Conferência Municipal de Saúde que se realizaria naquele ano.
Nessa Conferência os delegados estavam mais qualificados para fazer
intervenção e defender as propostas elaboradas pelo FOPS. O relatório final aprovado
contemplou a maioria das propostas do FOPS, especialmente a eleição do Conselho
Municipal nas Conferências e eleição do presidente do conselho entre seus
representantes. A lei previa que o Presidente do Conselho Municipal de Saúde era
cargo nato do Secretário de Saúde.
Dos 32 membros do Conselho Municipal de Saúde eleitos naquela conferência,
13 eram integrantes do FOPS, evidenciando uma ampliação de mais de cem por cento
em relação à gestão anterior.
Na reunião do Conselho Municipal de Saúde para eleição da mesa diretora do
conselho, composta por presidente, vicepresidente, 1.º e 2.º secretários, o
representante do Movimento Popular de Saúde, integrante do FOPS, concorreu à vice
presidência e foi eleito. A avaliação do FOPS naquele momento era de não concorrer à
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presidência do conselho por falta de condições políticas e técnicas para assumir tal
cargo.
O vicepresidente do FOPS, na época, era assessor liberado do FOPS e passou
a desenvolver as tarefas do cargo que assumiu no Conselho Municipal de Saúde;
também executava as atividades que lhe competiam, definidas nas reuniões do FOPS.
O Fórum, nesse período, intensificou suas ações, estimulando a criação dos
Conselhos Locais de Saúde, totalizando 56 conselhos em 93, avaliando ser essa uma
das suas principais conquistas.
Em fevereiro de 1994 o FOPS promoveu um Seminário de Formação e
Planejamento para orientar a sua atuação do FOPS no espaço institucional, bem como
na sociedade.
No final daquele mesmo ano o FOPS organizou um abaixo assinado com 2000
assinaturas e o encaminhou ao Presidente da Comissão de Orçamento da Câmara
Municipal de Curitiba, solicitando aos vereadores o aumento dos recursos orçados
pelo Prefeito para o setor de saúde. A previsão para o ano de 1995 era de 6,2% e o que
havia sido deliberado na Conferência e no Conselho de Saúde era de, no mínimo, 10%
do orçamento próprio do Município. Cumpre esclarecer que uma das principais
atribuições do Conselho de Saúde é a fiscalização dos recursos financeiros. Cabe ao
Conselho aprovar os relatórios de gestão, de prestação de contas financeiras, além de
discutir e deliberar sobre a proposta de orçamento para saúde. Desde a 1.ª Conferência
Municipal de Saúde, deliberouse que o município deveria investir no mínimo 10% do
seu orçamento para a saúde, mas a deliberação nunca foi implantada.
O poder do Conselho foi limitado: "Sempre tivemos o entendimento de que
havia necessidade de maior controle, maior fiscalização, e o Conselho não tinha as
condições necessárias para tal. As discussões sempre foram no sentido de prestação
de contas e não de definição de critérios para aplicação dos recursos financeiros. Isso
sempre foi uma dificuldade, um problema" (A.C., 14/12/01).
Antes da aprovação da Emenda Constitucional n.º 29, de dezembro de 2000,
que prevê recursos fixos do orçamento, em todas as esferas de governo para o
69
financiamento das ações e serviços públicos de saúde, o que valia era a deliberação do
Conselho que, contudo não era respeitada pelo Prefeito, como fala o exconselheiro:
"Num desses embates, nós não concordamos com o orçamento e não aprovamos a
proposta de orçamento e ela foi encaminhada à Câmara de Vereadores sem
concordância do Conselho" (A.C., 14/12/01).
Aos Conselhos cabe, portanto, em cada instância de Governo, fiscalizar a
aplicação dos recursos estabelecidos legalmente.
"O conselho é um espaço onde a sociedade continua sendo manipulada, e
queremos ter mais controle para organizar de forma diferente o Conselho. Mas, na
realidade, nós não avançamos muito neste aspecto" (A.C., 14/12/01).
Esse depoimento mostra que a participação, na concepção de muitos
governantes, é a "participação controlada", isto é, o Governo tem hegemonia para dar
direção. O espaço de negociação se reduz e o Governo cede na medida em que se sente
ameaçado pelas classes populares.
"Sempre, no Conselho, prevaleceu uma postura autoritária do gestor
municipal; às vezes, a pessoa do gestor aparentemente não era autoritária, mas a
posição que ocupava no Governo exigia esse tipo de posição" (A.C., 14/12/01).
Esse fato explica a rede de poder dentro do aparelho do Estado, mostrando que,
embora gestores municipais da saúde de Curitiba tenham uma história pessoal de
militância no movimento sanitário brasileiro, no Centro Brasileiro de Estudos de
Saúde CEBES, quando engajados no governo costumam se subordinar ao projeto
neoliberal que vem sendo implementado no Município de Curitiba.
A falta de financiamento na política de saúde das três esferas de Governo e a
"via sacra" que o usuário do SUS percorre para conseguir atendimento foram
denunciadas no Boletim Informativo do FOPS, em 1994.
Nas Conferências de Saúde, um tema bastante polêmico, e sobre o qual não
havia consenso nem entre os usuários, era a carga horária de trabalho dos funcionários
públicos da saúde.
70
Havia uma reivindicação nacional da Federação dos Trabalhadores da
Seguridade Social de estabelecer legalmente a jornada de 30 horas semanais,
justificada pelo tipo de trabalho desenvolvido pelos profissionais de saúde. O
funcionário lida diariamente com a vida das pessoas, com a tristeza, a dor, a morte,
necessitando, portanto de um bom preparo físico e psicológico.
A jornada de 30 horas para os funcionários da Secretaria Municipal de Saúde
foi aprovada nas primeiras Conferências, mas nunca foi implantada no município de
Curitiba.
A administração municipal manifestava sua posição de ter pleno conhecimento
do trabalho árduo e desgastante executado pelos profissionais da área de saúde, mas
justificava a impossibilidade da redução da carga horária: "o conjunto referente aos
recursos humanos, financeiros e materiais não suportaria o acréscimo de,
aproximadamente, mais 1200 funcionários, número necessário para diminuir a jornada
de trabalho. Isso aumentaria a folha de pagamento em cerca de R$ 10 milhões ao ano"
(Jornal do Conselho Municipal de Saúde de Curitiba, n.º 01, junho/julho 96, p. 08).
Na segunda gestão do Conselho, em 1994, foi instalada a Mesa Municipal de
Negociação do SUS, espaço que reunia o Sindicato dos Trabalhadores, dos
Empregadores e Gestores com a finalidade de estabelecer um fórum permanente de
discussão sobre os problemas existentes nessa área de recursos humanos.
A Mesa Municipal de Negociação de Recursos Humanos funcionou por um
período, até que gestores e prestadores de serviços de saúde deixaram de participar e
não mais defenderam a sua existência, principalmente os gestores.
A dificuldade de estabelecer um canal de negociação entre o Sindicato dos
Servidores Municipais e a Secretaria Municipal de Saúde permaneceu nos anos
seguintes.
O FOPS inicia o ano de 1995 planejando suas ações, definindo estratégias para
intervir na política de saúde. Esse planejamento constituiuse de 4 momentos.
O primeiro, foi discutir a importância do planejamento; no segundo momento
analisouse a composição do FOPS, sua organização, as atividades desenvolvidas, os
71
recursos disponíveis e suas limitações, apontadas pelos participantes do FOPS, quais
sejam: as entidades que integram o FOPS têm suas atividades específicas,
contribuindo pouco para a sua organização; dificuldade de manter a periodicidade do
jornal; falta de qualificação dos integrantes do FOPS para entender as questões
técnicas do SUS, como, por exemplo, o orçamento municipal de saúde.
No terceiro momento do planejamento analisaramse os recursos e limitações
dos atores que se relacionam com o FOPS e o que esperam desse movimento. Os
atores citados foram: Secretaria Municipal de Saúde, Conselho Municipal de Saúde,
Câmara Municipal de Vereadores, Autoridade Sanitária, Empresários da Saúde e
Poder Executivo Municipal.
No relatório do planejamento, os integrantes do FOPS apontam, entre as
limitações da Secretaria Municipal de Saúde, a falta de autonomia desse órgão em
relação ao executivo municipal, não gerência do Fundo Municipal de Saúde,
programação do SUS elaborada pela Secretaria de Saúde do Estado∗, pouca autonomia
em relação aos recursos humanos, desconhecimento real ou "voluntário" do SUS por
parte de outros setores da Prefeitura Municipal de Curitiba.
O último momento do planejamento constituiuse na definição dos objetivos,
atividades, prazos e responsáveis pelas ações.
Para atingir o principal objetivo, que era interferir na política de saúde,
elegeram 4 projetos: Mobilização, Articulação e Participação; Capacitação e
Planejamento; Melhorar e Ter mais Comunicação e Finanças.
As atividades programadas constituíramse em: mapear, visitar e organizar
encontros com lideranças dos movimentos sociais, participar das conferências de
saúde e congressos de conselheiros; relacionar temas de interesse para encontros e
reuniões ampliadas com outros conselhos de políticas públicas; realizar cursos básicos
sobre funções dos Conselhos; organizar debates sobre o SUS (terceirização e
privatização na saúde); enviar matérias do FOPS para publicação em jornais de
sindicatos e de outras organizações populares; buscar apoio financeiro junto às
Foi somente em 1996 que o Município assumiu a gestão plena do sistema de saúde, com maior autonomia.
72
entidades do campo popular, sindical e bancada dos vereadores e deputados do Partido
dos Trabalhadores.
As ações propostas foram audaciosas e não foram analisadas as possibilidades
de execução pelos atores envolvidos no planejamento.
Em agosto de 1995 aconteceu a 3.ª Conferência Municipal de Saúde de
Curitiba, cujo tema foi “Qualidade de Vida e Saúde”, que enfocou a necessidade da
articulação das políticas públicas que tem interface com a saúde.
O representante da Central de Movimentos Populares CMP, representante dos
usuários, na sua apresentação na 3.ª Conferência denuncia os problemas relacionados
ao meio ambiente existentes no município de Curitiba, com objetivo de desmistificar a
concepção que Curitiba é uma cidade com características do 1.º mundo. Reivindica, na
Conferência Municipal de Saúde uma política de saneamento e habitação que atenda
as necessidades da população que vive nas áreas urbanas com precárias condições de
vida.
Nesta Conferência garantiuse a eleição de 16 conselheiros, ou seja, 50% de
conselheiros ligados ao FOPS para a gestão 95/97 e intensificou a participação dos
conselheiros nas comissões de trabalho do Conselho. Priorizaramse as Comissões:
Orçamento, Imprensa e Divulgação, Saúde Mental, Agente Comunitário e Infra
estrutura do Conselho.
A luta da Comissão de Imprensa e Divulgação do Conselho foi intensa, um
tema sempre polêmico no Conselho. Por insistência de representantes do FOPS, no
início de 1995 a Comissão apresentou uma proposta que previa a implantação de um
jornal mensal do Conselho Municipal de Saúde e dois programas denominados Rede
Saúde e Sala de Espera, tendo como principal objetivo melhorar o processo de
informação junto aos conselheiros e usuários do SUS em Curitiba.
Em 1996 foi publicado o primeiro Boletim Informativo do Conselho Municipal
de Saúde, sob a responsabilidade da Secretaria Executiva e com a colaboração da
Comissão de Imprensa e Divulgação do Conselho. As outras propostas não foram
implantadas.
73
Em reunião do FOPS, realizada em 1996, constatouse a pequena participação
dos Conselhos Locais de Saúde nas suas reuniões e frágil atuação nos conselhos
locais.
Nesse sentido, representantes do FOPS indicaram o nome de uma funcionária
da Secretaria Municipal de Saúde ligada a este movimento para assessorar a criação e
a formação dos Conselhos Locais e capacitar os conselheiros para exercerem o
controle social. A indicação foi aceita pelo gestor municipal.
Acontece também nesse período a estruturação da Secretaria Executiva do
Conselho. A Secretaria Municipal de Saúde disponibilizou 3 funcionários para
desenvolver as tarefas do Conselho; uma assistente social, que assumiria a função de
secretaria executiva do conselho; uma enfermeira, que assessoraria a criação dos
conselhos locais, ambas indicadas pelo FOPS, e um auxiliar administrativo.
Os limites colocados em 1996 pelo FOPS para exercer o controle social foram:
dificuldade de acesso anterior às informações, às reuniões do Conselho Municipal de
Saúde, dificuldades dos conselheiros interpretarem a apresentação do prestação de
contas do Fundo Municipal de Saúde e pouca experiência deles nesse processo de
fiscalização dos recursos públicos.
1.3 Problemas, Resistência e Significados 1997 a 2001
O ano de 1997 para o FOPS foi muito importante, tanto pela reflexão que
ocorreu quanto à sua forma de organização e desafios na defesa na saúde pública,
como nos embates travados na gestão do Conselho Municipal de Saúde 95/97 com a
Secretaria Municipal de Saúde na discussão do modelo de gestão do SUS.
Depois de 6 anos de existência do FOPS, foi necessário fazer uma análise da
sua atuação na defesa da saúde pública, principalmente o seu papel frente à atuação no
Conselho Municipal de Saúde e Conferências, bem como sua inserção no meio
popular.
74
Em abril de 1997 o FOPS, por meio do seu Jornal, divulgou e convidou os
militantes da saúde para participarem do Seminário em Defesa da Saúde e pela
Implementação do SUS, que iria acontecer nos dias 02 e 03 de maio de 1997,
lembrando o Dia Nacional de Luta pela Saúde. O jornal trouxe uma matéria que
avaliava o SUS no Paraná, orientações de locais para denunciar os problemas do
Sistema de Saúde e ainda uma análise de conjuntura do SUS.
O momento mais polêmico que se identificou na trajetória histórica do FOPS
foi o debate em torno de dois problemas: o primeiro relacionavase com sua própria
identidade, seu papel, caráter, funcionamento e objetivos; o segundo, com a falta de
participação popular no FOPS.
O problema da falta de estruturação do FOPS é comentado por uma militante:
''Fiquei afastada do FOPS por ter ido embora para União da Vitória. Em 97,
fizemos várias reuniões de avaliação e a sensação era de que não estávamos
avançando, pois não havia organização interna, isto é, inexistência de cadastro dos
militantes, falta de relatórios das reuniões etc." (L.M., 21/11/01).
O FOPS, até 1997, não teve coordenação; havia um militante "liberado" que
dedicava vinte horas semanais às atividades de mobilização e organização do FOPS.
Na concepção de alguns integrantes, a falta de coordenação e de uma maior
organização burocrática e política diminuía o poder do FOPS para implementar as
ações definidas nos planejamentos.
Por outro lado, no interior do FOPS havia quem fizesse a seguinte avaliação:
"O FOPS, para mim, é exatamente o tipo de organização que resiste a uma
sistematização, a uma institucionalização (...). O FOPS é uma coisa selvagem no bom
sentido, é uma coisa que nada na liberdade, que algumas organizações têm que ter,
para serem portadoras da originalidade das propostas, das análises, das contestações
que vêm de todos os lados" (P.P., 23/11/01).
O problema da falta de entidades para assumir as tarefas deliberadas nos
planejamentos do FOPS é relatado pelo militante liberado para trabalhar no FOPS:
75
"As pessoas que participavam do FOPS não davam tanta prioridade à
execução do planejamento; então, íamos a uma reunião, discutíamos, mas os
encaminhamentos eram muito difíceis, o envolvimento das pessoas era somente
participar naquela reunião (...). Todos que participavam do FOPS tinham também
funções a desempenhar em outras entidades ou movimentos populares, sindicais" (A.
C., 14/12/01).
O debate em torno do seu funcionamento levaram os integrantes do FOPS, após
muitas discussões, a aprovarem o regimento interno sob o título "Organização e
Normas Regimentais do FOPS" e contemplou os seguintes temas: composição,
objetivos, estrutura, funcionamento, coordenação do FOPS (composição, funções da
coordenação, funções do liberado, eleição da coordenação), funções dos conselheiros
de saúde que participam do FOPS (ver anexo).
Segundo regimento interno aprovado, o FOPS tem como objetivos:
- discutir e propor políticas de saúde e mecanismos para sua implantação;
- intervir com qualidade nas conferências de saúde;
- contribuir com a organização e mobilização popular;
- capacitar a população para compreender os problemas de saúde e suas causas e das
dificuldades de implementação do SUS;
- assessorar os Conselheiros locais, municipais e estaduais;
- Propiciar espaço debate de construção de alianças entre trabalhadores de saúde e
lideranças populares.
O FOPS passou a ter uma coordenação com 4 membros, sendo um deles liberado.
A coordenação é eleita em reunião plenária específica para este fim, com um mandato
de 1 ano, prorrogável por decisão da plenária.
O segundo problema identificado e que necessitava urgentemente de ação para
resolução foi a falta de participação popular no FOPS. Os participantes apontaram
como principais causas: o conteúdo muito técnico das reuniões do FOPS, dificultando
a compreensão ao movimento popular; reuniões realizadas no centro de Curitiba,
76
dificultando a participação de lideranças que residem nos bairros; discussões
realizadas no FOPS vinculadas principalmente às pautas do Conselho Municipal de
Saúde; falta de encaminhamentos concretos aos problemas do Sistema Único de Saúde
trazidos nas reuniões do FOPS.
Com relação às dificuldades apontadas na reunião, o FOPS propôs a retomada
da participação popular no FOPS para: estabelecer um canal de comunicação com os
conselheiros locais a fim de conhecer os problemas e assessorálos nas resolução dos
deles; realizar plenárias regionais na cidade de Curitiba, visando à descentralização do
FOPS; sistematizar as denúncias que chegam ao FOPS; fazer cartilha divulgando os
direitos no SUS; preparar atos públicos, manifestações para divulgar os problemas de
mau atendimento, negligência e cobrança no SUS.
Muitas tarefas estavam previstas para o FOPS no ano de 1997, entre elas
implementar sua descentralização, ampliar a participação popular, atuar no Conselho
de Saúde e mobilizar os setores populares para a 4.ª Conferência Municipal de Saúde
que aconteceria no mês de agosto.
Os integrantes do FOPS discutiram, ainda em 1997∗, sua participação nas
Conferências Distritais. Os militantes do FOPS que estavam na comissão
organizadora informaram que nessas conferências a pauta era o perfil epidemiológico
dos Distritos Sanitários e que não havia interesse da gestão municipal em discutir
controle social, além da política de cooptação do gestor aos movimentos (Relatório do
FOPS, reunião dia 02/07/97).
No ano de 1997 há registro de 8 reuniões com a participação de 46 usuários e 39 trabalhadores, totalizando 85 pessoas. Somente 3 reuniões não constam o número de participantes
77
Houve um processo de discussão dos problemas de saúde nos 8 distritos
sanitários e os mesmos foram sistematizados e debatidos naquela Conferência,
definindo, dessa forma, as diretrizes para o plano de saúde – gestão 97/2000. Na
oportunidade, foram eleitas 12 entidades ligadas ao FOPS para participarem do
Conselho.
Na 4.ª gestão do Conselho (1997/1999) o FOPS apresentou um nome para
concorrer à presidência do Conselho, um usuário que representava a Central de
Movimentos Populares. Os representantes do FOPS fizeram a defesa desse usuário
para avançar na efetivação do controle social e na luta por maior autonomia frente ao
governo municipal e maior poder de fiscalização da política de saúde.
A disputa foi acirrada, o conselheiro representante dos usuários obteve 14 votos
e o Secretário Municipal de Saúde, 18; portanto, a diferença foi de 4 votos.
Essa gestão foi marcada pela qualificação maior dos conselheiros questionando
a política de saúde, a terceirização da saúde, bem como a execução orçamentária.
Os Conselheiros, ligados ao FOPS, tiveram uma atuação importante nas
comissões: saúde da mulher, meio ambiente, orçamento, imprensa e divulgação,
interferindo nos programas implantados pela Secretaria de Saúde.
Na gestão 95/97 do Conselho Municipal de Saúde a contratação dos Agentes
Comunitários em Saúde foi um ponto que gerou discussão vários anos.
"Lembrome a luta desde o início, quando nós, inclusive, conseguimos que o
conselho não aprovasse a contratação dos agentes comunitários da saúde. Isso foi no
início do FOPS, porém, a partir de 97, houve um embate grande e aprovamos a
contratação desses agentes comunitários de saúde, mesmo divergindo sobre quem
deveria contratar. Acreditávamos que deveria ser a própria Prefeitura, enquanto o
Governo fez opção por contratar através Instituto da Cidadania"∗ (M.R.,10/12/01).
A discussão do Programa de Agentes Comunitários foi um tema que gerou
polêmica, não só no Conselho de Saúde, mas também nas Conferências Nacionais de
Saúde . A 10.ª Conferência Nacional de Saúde deliberou que a contratação deveria ser
Instituto de Cidadania é uma organização social utilizada para prestar serviços à Prefeitura de Curitiba.
78
por concurso público, pela necessidade de qualificação, de pertencer ao quadro de
funcionários da Prefeitura, dentro de um plano de cargos e carreira, considerado
funcionário público com direitos trabalhistas garantidos.
A maioria dos municípios vem contratando os Agentes Comunitários de Saúde
por meio de ONGs ou entidades terceirizadas do município, sem garantia dos direitos
trabalhistas. Aconteceram denúncias no município de Curitiba de utilização desses
trabalhadores para realização de campanha política em horário de trabalho.
Na gestão 9799 do Conselho Municipal de Saúde havia uma participação
crítica, atuante, dos conselheiros do FOPS, atentos às questões de saúde. Houve um
embate político onde ficou expressa as concepções de Estado entre os representantes
do FOPS e Governo Municipal.
Antes da publicação da Lei Federal n.º 9637, que dispõe sobre as entidades
qualificadas, como Organizações Sociais e Agencias Executivas, o prefeito Cássio
Taniguchi PFL, enviou à Câmara Municipal de Curitiba, em dezembro de 1997, um
projeto que visava a instituir no município as Organizações Sociais.
No artigo 1.º do Projeto de Lei, o poder executivo ficava autorizado a qualificar
como Organizações Sociais as entidades constituídas sob a forma de fundação,
associação ou sociedade civil, com personalidade jurídica de direito privado, sem fins
lucrativos, cujas atividades fossem relacionadas com as áreas social, educacional,
ambiental, de desenvolvimento científico e tecnológico, cultural, esportiva e de saúde,
atendidas as condições estabelecidas na lei.
No dia 09 de dezembro de 1997 entrou em discussão o referido projeto de lei.
Cerca de 100 pessoas dos movimentos populares e sindicais protestaram contra ele,
alegando que transferia responsabilidades, que são hoje do Estado, para a população,
além de serem dispensadas as licitações, o que dificultaria a fiscalização, uma vez que
as Organizações Sociais receberiam recursos financeiros públicos.
O projeto foi aprovado por 29 votos, contra cinco (3 votos do PT, 1 do PMDB
e 1 do PDT). A publicação da lei se deu no dia 23 de dezembro de 1997.
79
No período da discussão do projeto de lei das Organizações Sociais, o
Movimento de Defesa do Serviço Público realizou várias ações para impedir a
aprovação. Mas logo após a aprovação encaminharam correspondência ao Procurador
de Justiça solicitando que fosse ajuizada ação de inconstitucionalidade da referida lei.
O FOPS publicou um jornal específico tratando do tema, organizou um ato
político na Assembléia Legislativa do Paraná no dia 16 de outubro e um abaixo
assinado para impetrar ação civil pública contra as Organizações Sociais.
Logo que o FOPS tomou conhecimento do projeto de lei sobre as Organizações
Sociais e que estava tramitando, solicitou pauta no Conselho Municipal de Saúde para
discutir e deliberar sobre o tema.
O debate no Conselho aconteceu dia 22 de outubro de 1997. O Secretário
Municipal de Saúde apresentou a proposta, defendendo as Organizações Sociais, que
encontrou posição contrária o Deputado Estadual Florisvaldo Fier e o vereador Tadeu
Veneri, ambos do Partido dos Trabalhadores.
Nessa reunião do Conselho Municipal de Saúde, representantes do FOPS
apresentaram uma resolução com os seguintes pontos:
a) manifestação contrária pelo Conselho ao projeto de lei que dispunha
sobre as entidades qualificadas como Organizações Sociais e sobre a criação do
Programa Municipal de Publicização;
b) solicitação ao Prefeito Municipal de Curitiba para que retirasse da
Câmara Municipal o referido projeto;
c) publicação da resolução na imprensa oficial e nos principais veículos de
comunicação da cidade, bem como encaminhamento ao Legislativo Municipal;
d) anexação, na íntegra, do documento que tratava da posição do Conselho
Nacional de Saúde sobre a proposta de criação das Organizações Sociais.
Essa resolução foi ponto de pauta em três reuniões do Conselho Municipal de
Saúde. Nas duas primeiras reuniões, os representantes da Secretaria Municipal de
Saúde se retiraram do recinto, inviabilizando a votação por falta de "quorum".
80
Na terceira tentativa de votação da resolução contrária à criação das
Organizações Sociais, a mesma foi aprovada com 14 votos a favor e 8 contra. Antes da
votação, o Superintendente da Secretaria Municipal de Saúde comunicou aos
Conselheiros que se a resolução fosse aprovada, a mesma não seria homologada pelo
Presidente do Conselho Municipal de Saúde, que era o Secretário Municipal de Saúde.
A posição do Presidente e Secretário Municipal de Saúde revelou uma
concepção de participação, enquanto adesão, e não aquela que avançava na construção
da cidadania.
O movimento realizado na época, na área da saúde, foi fundamental para que a
bancada governista da Câmara Municipal aprovasse a emenda ao projeto de lei que
retirou a saúde enquanto política setorial a ser transferida para gerenciamento das
Organizações Sociais.
Esse embate provocou uma discussão em torno de concepção de Estado e
gestão da política pública. Os representantes do FOPS se posicionaram contrários à
proposta de criação das Organizações Sociais e conseguiram o veto da maioria dos
conselheiros a tal forma de gestão na saúde; por outro lado, o Secretário de Saúde não
homologou a resolução aprovada pelo conselho contra às Organizações Sociais.
O FOPS iniciou o ano de 1998∗ enviando correspondência às entidades
populares, sindicais e parlamentares, agradecendo a contribuição financeira,
divulgando as atividades realizadas e afirmando a necessidade da continuidade da
contribuição para manter a liberação de uma pessoa para articular, mobilizar entidades
e pessoas para o engajamento nas várias lutas em defesa da saúde pública.
A insistência da Secretaria Municipal de Saúde em fazer parceria com
organizações comunitárias, repassando funções próprias para a sociedade, continuou
em 1998.
Logo após a aprovação da Lei n.º 9226 de dezembro de 1997 que criou o
Programa Municipal de Publicização, a Secretaria Municipal de Saúde elabora um
*Segundo documentação do FOPS no ano de 1998 aconteceram 9 reuniões com a participação de 74 usuários e 38 trabalhadores; somente de uma reunião não consta o número de participantes
81
regimento interno das "Associações Comunitárias Distritais ACDs", denominando de
Programa de Revitalização dos Equipamentos da Secretaria Municipal de Saúde de
Curitiba, que tem como objetivos:
Promover o entrosamento entre a Comunidade e a Unidade de Saúde, estabelecendo coresponsabilidade entre Trabalhadores de Saúde, Comunidade e Administração Pública, buscando ações conjuntas para a melhoria das condições de saúde da população; possibilitar aos Distritos Sanitários (oito) e consequentemente às Unidades de Saúde autonomia financeira, contribuindo para as adequações necessárias para a melhoria do atendimento; simplificar os procedimentos administrativos, possibilitando às ACDs adquirir recursos e serviços com mais agilidade, mais qualidade e menor custo; conservação e manutenção do prédio, equipamentos e instalações com aquisição de materiais e serviços com prontidão (Programa de Revitalização dos Equipamentos da Secretaria Municipal de Saúde de Curitiba).
Essas Associações foram a forma encontrada pelas Prefeituras para terceirizar
serviços de responsabilidade da Administração Pública.
A primeira reunião do Conselho onde ocorreu a discussão sobre as ACDs foi
no dia 8 de julho de 1998. O Conselheiro e Superintendente da Secretaria Municipal
de Saúde defendeu a criação da Associação como necessidade da existência de um
instrumento legal e eficaz para dar respostas às questões que atualmente são difíceis e
demoradas devido ao processo burocrático próprio dos órgãos públicos, mesmo
quando para atender solicitações de pequenos reparos de equipamentos da rede (Ata da
113ª reunião ordinária do Conselho Municipal de Saúde).
Após sua fala, vários conselheiros se pronunciaram na defesa da continuidade
do debate antes de votar o repasse de recursos financeiros às ACDs.
Um conselheiro argumentou que essa discussão já estava acontecendo nos
Distritos Sanitários e Conselhos de Saúde Locais sem passar pelo Conselho Municipal
de Saúde, que tem como atribuição aprovar qualquer repasse de recursos para
entidades privadas.
No mês de julho de 1998 houve mudança do Secretário Municipal de Saúde,
mas a proposta da criação das Associações foi mantida pelo novo Secretário.
Foram aproximadamente seis meses de discussão e no final do ano de 1998, no
Encontro de Conselheiros Locais de Saúde de Curitiba, foi aprovada a criação de
Associações Comunitárias Distritais ACDs.
82
Nesse Encontro de Conselheiros Locais houve pouca participação das entidades
ligadas ao FOPS. O tema fez parte da pauta do FOPS, mas esse não teve influência
junto aos Conselheiros Locais, pois que a maioria concordou com a proposta da
criação dessas associações pelo mesmo motivo defendido pela Secretaria Municipal de
Saúde: agilizar as reformas de infraestrutura básica necessárias na Unidade de Saúde.
O repasse do recurso financeiro pela Prefeitura seria até 2.000, 00 (dois mil reais) para
cada ACD.
No dia 09 de dezembro de 1998 foi votado no Conselho Municipal de Saúde e
obtevese o seguinte resultado: votos favoráveis ao repasse de recursos públicos para
as Associações Comunitárias Distritais: 15 contrários, 12 favoráveis e 6 abstenções.
Essa discussão também gerou debate em torno de concepção de Estado e gestão
pública. Percebeuse, nesse embate, um distanciamento do pensamento do FOPS em
relação aos conselheiros locais. O contato direto dos conselhos locais acontece com a
Autoridade Sanitária (chefe da Unidade de Saúde), que exerceu forte influência na
criação dessas Associações.
Os conselheiros alegavam que poderiam resolver os problemas de infra
estrutura das Unidades de Saúde, deixando de abordar os graves problemas, seja de
estrutura das Unidades de Saúde, pouco espaço, falta de profissionais etc, seja quanto
à falta de acesso e qualidade em alguns serviços do SUS.
O Fórum publicou, em 1988, dois boletins informativos. No primeiro boletim
o FOPS denunciava a falta de cumprimento, por parte do gestor municipal, do
Regimento Interno do Conselho Municipal de Saúde. Com a mudança do Secretário
Municipal, quem deveria assumir a presidência do Conselho seria a VicePresidente,
que era uma trabalhadora de saúde representante do Conselho Regional de Psicologia.
A proposta de nova eleição para a Presidência do Conselho foi colocada em
votação e aprovada por 18 votos contra 14. Os governistas alegaram que a lei que
criara o Conselho garantia ao Secretário o cargo de Presidente do Conselho Municipal
de Saúde. Só que a lei em questão não era utilizada desde a eleição da 2.ª gestão do
83
Conselho, como explica um conselheiro "infelizmente, tratase de um retrocesso, pois
quem indica o presidente é o prefeito" (Informa FOPS, setembro de 1998).
As atividades desenvolvidas pelo Fórum no ano de 1998 foram relatadas como
importantes na luta pela qualidade da saúde pública, como as atividades de formação
realizadas para a capacitação dos integrantes do FOPS, que trataram destes temas:
terceirização da saúde, Normas Operacionais Básicas (regulamentação do SUS),
Programa de Agentes Comunitários, além da discussão sobre a qualidade da
assistência prestada pela Secretaria Municipal de Saúde.
O FOPS avaliou como ponto positivo a luta travada contra as Organizações
Sociais e, por pressão do Fórum Popular de Saúde, a Prefeitura retirou o setor saúde da
lei que criou as Organizações Sociais.
Os desafios colocados foram apontados no relatório, como a falta de clareza
dos Conselheiros de Saúde no momento da votação de alguns temas pautados no
Conselho Municipal de Saúde, necessitando leitura e estudo de todos os documentos
recebidos anteriormente à reunião do conselho.
Outro problema identificado foi a falta de acesso à documentação dos
convênios realizados entre a Secretaria de Saúde e as entidades prestadores de serviços
de saúde, dificultando a fiscalização dos recursos públicos.
O FOPS avaliou o I Encontro de Conselheiros Locais de Saúde, realizado em
novembro de 1998, considerando não ter havido avanço na discussão da saúde,
ficando evidente a manipulação da Secretaria de Saúde e a desarticulação do FOPS
em suas bases.
A descentralização do FOPS, por meio de reuniões nas regiões da cidade, foi
tema no início de 1999∗:
Desde o início de 99 o FOPS vem trabalhando a idéia das plenárias regionais de saúde, as quais têm por objetivos discutir a saúde pública, os conselhos locais e regionais e a implantação das discussões do FOPS nos 8 Distritos Sanitários de Curitiba, com a intenção de
Identificamos no material pesquisado que foram realizadas 18 reuniões, além das que aconteceram nos bairros, envolvendo 298 pessoas; destas 205 eram usuários e 93 trabalhadores de saúde. Foram elaborados 3 boletins informativos e um jornal do FOPS.
84
descentralizar as discussões do SUS, porque as reuniões do FOPS têm pouca participação da base ( Relatório da reunião do FOPS dos dia 28/05/99).
No dia 07 de abril Dia Nacional de Luta pela Saúde o FOPS organizou
manifestação pública, entregando material informativo sobre os direitos dos cidadãos à
saúde pública.
Também em abril foi eleita a nova coordenação do Fórum, com representantes
dos sindicatos: dos Servidores Municipais, dos Empregados dos Estabelecimentos de
Saúde Privados, Sindicato dos Bancários e uma assessora parlamentar.
Com a realização da 5.ª Conferência Municipal de Saúde em 1999, o FOPS
discutiu teses e traçou estratégias para intervenção na Conferência de Saúde. O tema
escolhido foi "SUS no III Milênio em Defesa da Vida", contando com a participação
de mais de 700 pessoas.
Houve um grande investimento político do Gestor Municipal na escolha dos
representantes dos usuários para delegados e conselheiros de saúde.
O FOPS denunciou, no seu Boletim de setembro de 99, o uso da máquina
administrativa para inscrições dos delegados para as Conferências Distritais.
Segundo o Fórum, em alguns Distritos Sanitários foram realizadas inscrições
fora do prazo estabelecido pela comissão organizadora, favorecendo candidatos a
delegados à Conferência ligados à administração municipal. "Em vários Distritos, o
Supervisor visitava as Unidades de Saúde ou organizava reuniões para indicar seu
candidato à eleição dos usuários, comprometendo a autonomia e a independência dos
usuários frente ao poder público e comprometendo, principalmente, o exercício do
controle social do SUS" (Informativo do FOPS, setembro de 1999, edição especial da
5ª C.M.S.).
Os delegados do FOPS eram minoria e só conseguiram eleger 5 entidades
integrantes do Fórum: Sindicato dos Trabalhadores e Servidores em Serviços de Saúde
Públicos, Conveniados, Contratados e ou Consorciados ao SUS e Previdência do
Estado do Paraná SINDSAÚDE, Sindicato dos Servidores Municipais de Curitiba,
SISMUC, União de Mulheres, Conselho Regional de Serviço Social CRESS, e uma
85
usuária representando a Paróquia Profeta Elias da Comunidade Santa Isabel do Distrito
Sanitário do Bairro Novo.
Um dos motivos alegados pelo FOPS pela baixa participação das entidades que
o integram na Conferência deveuse a que alguns sindicatos cutistas se inscreveram,
mas não participaram das conferências distritais para homologarem seus nomes para a
5.ª Conferência.
O FOPS fez uma autocrítica: "temos que aprender a fazer denúncias, falar a
linguagem do povo, a liderança é aquela que está com o povo todos dia" (relatório da
reunião do Fórum realizada dia 06/10/99).
No final da gestão do conselho 97/99, o FOPS fez um balanço das propostas
que apresentou no Conselho Municipal de Saúde: verificouse que a proposta de
investir 10% do orçamento próprio do município, aprovada nas conferências de saúde,
não se efetivou, além da proposta orçamentária do governo municipal para a saúde não
ter sido discutida no Conselho Municipal de Saúde antes de ser votada na Câmara de
Vereadores.
A prestação de contas dos convênios com os prestadores de serviços de saúde
da rede privada também não foi feita. Os contratos e convênios não passaram pela
aprovação do Conselho, conforme compromisso assumido pela Secretaria Municipal
de Saúde.
Não foi realizado o seminário para discutir fontes de financiamento, bem como
aplicação dos recursos.
Com relação ao controle social, não houve por parte da Secretaria Municipal de
Saúde divulgação da Central de Atendimento ao Usuário por meio de cartazes e
"foulders". Essa é uma reivindicação antiga dos membros do FOPS, enfatizando a
necessidade de todos os cidadãos serem informados sobre a existência daquela
Central, para que pudessem denunciar os problemas que enfrentavam para ter acesso e
qualidade aos serviços públicos de saúde.
Os programas criados pelo Gestor eram apresentados nas comissões do
Conselho sem muita possibilidade de alteração.
86
O poder de fiscalização, relativo aos recursos e à avaliação dos programas,
medicamentos é ainda insuficiente. Essa avaliação revela os limites da participação no
controle social do SUS e a necessidade de cobrar a implementação dessas
deliberações.
No final do ano de 1999, o FOPS convocou as entidades e pessoas que integram
o movimento para participarem do planejamento que seria realizado em fevereiro de
2000.
Na correspondência enviada, o FOPS fez uma avaliação da sua atuação nas
Conferências locais, distritais e na 5.ª Conferência Municipal de Saúde: "chegamos à
conclusão de que nossa organização, enquanto FOPS, mostrou fragilidade e pouca
inserção na comunidade. Grande parte do público presente nas Conferências que
deveria estar defendo o SUS ficou ao lado da Secretaria de Saúde, independentemente
do conteúdo das propostas apresentadas" (FOPS, 1999).
O FOPS assumiu para si a responsabilidade de conscientizar os usuários que
participam das Conferências. Na sua avaliação, a consciência dos direitos e a
politização do movimento daria um grande diferencial de qualidade aos debates nas
conferências de saúde e na luta pela saúde pública, atendendo às necessidades da
população.
O ano 2000∗ foi marcado por manifestação pelo Dia Nacional de Luta pela
Saúde Pública, no dia 07 de abril, cursos de formação nos bairros dos distritos
sanitários, manifestação pela defesa da emenda constitucional 29, que define um
percentual fixo do orçamento para a saúde, seminários sobre genéricos e Encontro
Popular de Saúde, além das reuniões realizadas e publicações dos boletins
informativos.
No início de fevereiro de 2000, o Fórum realizou seu planejamento, levantou os
problemas, soluções e atividades a serem desenvolvidos nesse período.
No ano 2000 foram realizadas 11 reuniões, 1 planejamento, 3 boletins informativos, 1 seminário, 1 curso para conselheiro e 2 manifestações públicas. Participaram das atividades 133 usuários e 61 trabalhadores.
87
Os problemas identificados pelos participantes do Fórum foram falta de:
comunicação com os usuários do SUS, de unidade entre os militantes dos movimentos
sociais, autonomia dos conselheiros locais e de consciência dos conselheiros. Para
solução desses problemas propuseram:
- investir na elaboração de mais informativos do FOPS e ampliar a distribuição
deles;
- formação para os conselheiros de forma regionalizada;
- retomada dos movimentos populares nas regiões do município.
O FOPS também propõe retomar o Movimento Popular de Saúde e realizar um
cadastramento dos militantes por região, bem como fazer seu planejamento; porém, as
dificuldades para implantação pouco eram observadas. O tempo restrito dos militantes
do FOPS para executar atividades definidas nos planejamentos foi um fator que pesou
muito para que as tarefas deliberadas não fossem cumpridas.
A reivindicação dos movimentos na área da saúde por um orçamento fixo para a
saúde tem seu ápice em 2000. O FOPS participou de mobilizações que aconteceram
em Curitiba e em Brasília pela aprovação da Emenda Constitucional PEC 169. Essa
proposta previa a destinação de 30% da verba da seguridade social para a saúde.
Depois de muitas negociações na Câmara Federal, foi aprovada a Emenda
Constitucional EC 29, que não contempla o montante de recursos que a PEC 169
previa, mas não deixa de ter sua importância, pois define recursos mínimos para o
financiamento das ações e serviços públicos de saúde .
O FOPS propôs que o Conselho Municipal de Saúde de Curitiba se
posicionasse na defesa da PEC 169, e que elaborasse material para ser distribuído na
cidade a fim de mobilizar a população em torno da proposta e que houvesse pressão
sobre os deputados federais para aprovação da emenda constitucional.
No final de 2000, o FOPS fez um avaliação com o objetivo de propor
encaminhamentos que fortalecessem a sua organização para os enfrentamentos do
próximo período.
88
Os integrantes do FOPS avaliaram que ele perdeu espaço político com a
redução de sua representação no Conselho Municipal de Saúde, agravada pela
dificuldade de articulação junto aos usuários dos Conselhos Locais de Saúde e maior
dispersão das entidades, movimentos e militantes que o integram.
Segundo o FOPS, a cooptação de lideranças comunitárias e conselheiros locais
pelos órgãos governamentais nas conferências e a criação de entidades no período pré
conferências para garantir a maioria, vem fragilizando os conselhos de saúde para que
de fato sejam instâncias de fiscalização e deliberação das políticas de saúde.
Um outro ponto colocado na avaliação se referese às dificuldades de articular e
instrumentalizar as entidades do movimento popular e sindical para atuarem nos
espaços de controle social e fortalecerem o movimento popular na área da saúde.
Quando da definição de sua tática para 2001, ocorreram duas posições no
FOPS: uma, defendendo a priorização da 6.ª Conferência Municipal de Saúde a ser
realizada em 2001; outra, sustentando a necessidade de ter uma intervenção mais
ampla.
Estabeleceuse, naquele momento, como eixos prioritários para o planejamento
da ação: mapeamento das entidades, movimentos e militantes que se referenciam ou
que poderão integrar ao FOPS, estabelecimento de políticas de formação e informação
dos militantes e conselheiros de saúde e implantação de uma políticas de finanças que
desse conta de sustentar a ação do Fórum.
O FOPS, em 2001∗, completou 10 anos de existência, anos estes de
enfrentamento com a Secretaria Municipal de Saúde, de intensa participação nas
Conferências e Conselho de Saúde, organizando manifestações públicas, cursos de
formação, publicando seus boletins, enfim, lutando por uma saúde pública e de
qualidade.
Em fevereiro de 2001, o FOPS fez seu planejamento procurando, inicialmente,
fazer uma avaliação da XI Conferência Nacional, realizada em dezembro de 2000,
No ano de 2001 foram realizadas 13 reuniões, 1 plenária de conselheiros, 1 boletim informativo
89
análise de conjuntura municipal, avaliação do planejamento realizado em 2000 e, por
último, o planejamento das ações para o ano 2001.
O FOPS apontou alguns desafios para serem vencidos em 2001, dentre eles:
mobilizar a população na defesa da saúde pública; avançar no controle social; fazer
formação para exercício do controle social; aumentar a participação popular no FOPS;
descentralizar as atividades do Fórum; identificar os pontos críticos da política
municipal;
Um dos pontos privilegiados no planejamento foi a descentralização do FOPS,
os seus militantes ficaram responsáveis por organizar cadastramento, formação e
criação de núcleos nos 8 distritos sanitários.
Nessa atividade de planejamento foi eleita a nova do coordenação do Fórum,
sendo 3 trabalhadores de saúde representando as entidades: Sindsaúde, PT e CRESS e
a liberada do Fórum que representa o segmento dos usuários.
Fazendo a retrospectiva dos embates entre o FOPS e representantes da
Secretaria Municipal de Saúde, observouse que o mesmo embate ocorrido em 1991,
na 1.ª Conferência Municipal de Saúde aconteceu também na 6.ª Conferência
Municipal de Saúde em 2001.
Em abril desse mesmo ano, vereadores ligados à base do governo municipal,
prevendo a realização da 6ª Conferência Municipal de Saúde, elaboraram um projeto
de lei alterando a Lei n.º 7631, de 17 de abril de 1991, que dispõe sobre a Conferência
e o Conselho Municipal de Saúde de Curitiba.
A alteração tinha como objetivo conceder vagas no Conselho para categorias
médica e de enfermagem, independentemente de sua participação nas conferências de
saúde.
O FOPS entendia que o projeto feria o direito constitucional na medida em que
não garantia o direito da igualdade para todos os profissionais de saúde.
O FOPS procurou o Secretário Municipal de Saúde para negociar o projeto de
lei, ocupou a tribuna na Câmara de Vereadores, enviou correspondência assinada por
50 entidades aos vereadores, solicitando a suspensão da tramitação do projeto de lei.
90
Propunha que esse assunto fosse discutido na 6.ª Conferência Municipal de Saúde, a
realizarse em setembro de 2001, sendo este o espaço privilegiado para discutir e
deliberar sobre o assunto. O governo não acatou as propostas do FOPS e o projeto foi
aprovado.
O representante dos trabalhadores, delegado da 6.ª Conferência, comenta sobre
o fato:
"Um embate bastante concreto, expressivo, foi o movimento da administração
pública para reformular, modificar a lei que instituía o Conselho Municipal Saúde e
aí, contando com essa cooptação, que nos últimos anos, a Prefeitura vem fazendo,
levou várias pessoas à Câmara de Vereadores e conseguiram aprovar a mudança da
lei do Conselho Municipal de Saúde. Para mim foi uma mudança funesta que
desconfigura o caráter do conselho" (P.P., 23/11/01).
A proposta do FOPS era manter a eleição dos membros do Conselho nas
Conferências. Os segmentos dos trabalhadores, usuários, prestadores de saúde se
reuniam e votavam nos seus respectivos pares. Essa forma garantia um maior
envolvimento e participação de todos os delegados na discussão dos critérios para ser
conselheiro.
Com essa alteração, algumas entidades nem precisam participar, como analisa
este trabalhador de saúde: "Isso significa que algumas categorias não precisam se
mobilizar, porque tem a sua vaga garantida. Não estou dizendo com isso que elas não
vão sentar e não vão discutir, mas a possibilidade está dada" (P.P., 23/11/02).
O Conselho Municipal é uma instância onde todos devem ter a mesma
possibilidade de participação e para isso precisa se organizar. No momento da votação
na Câmara de Vereadores, o FOPS procurou mobilizar as entidades, como relata um
militante: "Fomos à Câmara e nos enfrentamos. Vimos que ali havia muita gente
instrumentalizada para agitar, gritar, uivar. Até vaias houve contra os participantes
do FOPS, que exigiam a manutenção da lei como ela era. Isso é para dar mais um
exemplo de como retrocedemos" (P.P.,23/11/01).
91
A avaliação da 6.ª Conferência Municipal de Saúde, realizada em setembro de
2001, foi analisada por um delegado do segmento dos trabalhadores:
"Não dá para deixar de falar da forma como foi organizada a 6.ª Conferência
Municipal de Saúde, toda ela impondo uma temática que foi pouquíssimo discutida
nos segmentos, inclusive no Conselho Municipal de Saúde. Então elegeuse um novo
slogan para substituir, para melhorar o SUS, que está muito usado, esse SISS, na
verdade, não é apenas uma intenção de colocar algumas novas estratégias para
retomar o SUS, não me parece do jeito que veio, orientada, é um pacote de idéias"
(P.P., 23/11/01).
A crítica dos participantes do FOPS e delegados da 6.ª Conferência Municipal
de Saúde é que o Sistema Integrado de Serviços de Saúde SISS foi discutido de
forma superficial nas conferências distritais. "O segmento dos usuários e dos
trabalhadores sequer teve conhecimento do teor da discussão do SISS" (Pau e Prosa,
Boletim Informativo do Fórum Popular de Saúde Edição Especial setembro 2001).
Para o FOPS, o SISS precisa de melhor avaliação com base em dados das
doenças que prevalecem e, a partir dessa análise, podese saber se o modelo proposto
dá conta de atender a demanda.
Outra crítica do FOPS, foi com relação ao temário da Conferência, que na sua
que teve seu caráter desrespeitado à medida que traz para o temário a discussão do
Plano Municipal de Saúde. "Essa discussão, dentro da Conferência, contraria o
disposto na Lei n.º 8142, artigo 1º, parágrafo 1º, que afirma: "O objetivo da
Conferência é avaliar a situação de saúde e propor as diretrizes para formulação das
políticas". (Pau e Prosa, Boletim Informativo do Fórum Popular de Saúde Edição
Especial setembro 2001).
As conferências se constituem num momento em que a população conhece os
problemas do município, tem oportunidade de levantar problemas e apresentar
propostas para melhorar o sistema de saúde. O Plano de Saúde é elaborado após a
Conferência e discutido e aprovado no Conselho Municipal de Saúde.
92
A participação do FOPS naquela conferência foi denunciar o veto feito pela
Comissão Organizadora da Conferência da sua participação e do Fórum Popular de
Mulheres enquanto entidades que congregam várias organizações da sociedade civil. A
justificativa era porque estas organizações não tinham estatuto. O FOPS, desde 1991,
participa das Conferências de Saúde, apresentando teses, além de produzir boletins,
relatórios de reuniões e outros documentos que comprovam sua existência.
O FOPS também protocolou denúncias por escrito à promotoria pública sobre o
processo de realização das conferências locais e distritais, bem como sobre a recusa da
sua inscrição.
O Ministério Público enviou correspondência à Comissão Organizadora,
relatando os problemas identificados pelo Fórum no processo da realização da 6.ª
Conferência, culminando numa reunião entre representantes do FOPS, Promotora
Pública, Secretário de Saúde. Na reunião o Sr. Secretário Municipal de Saúde propôs
que fosse ampliado o número de delegados, respeitando a paridade, possibilitando,
assim, o ingresso das entidades excluídas.
Para tanto, seria necessário submeter a proposta à mesa diretora do Conselho
Municipal de Saúde e Comissão Organizadora da 6.ª Conferência. A proposta foi
rechaçada pelos conselheiros e mantida a proposta inicial do regimento interno da
conferência.
Somente duas entidades ligadas ao Fórum foram eleitas para a gestão do
Conselho 2001/2003: o Sindicato dos Servidores Municipais e a representante do
segmento dos usuários do Distrito Bairro Novo, indicada pela Paróquia Profeta Elias
da Comunidade Santa Isabel.
O refluxo da participação das entidades ligadas ao FOPS na últimas
Conferências e, por conseqüência, no Conselho Municipal de Saúde foram e estão
sendo analisadas por esse movimento na tentativa de retomar a participação popular,
de atuar na defesa da política pública, garantindo acesso e qualidade de saúde a todos
os cidadãos curitibanos.
93
2 DESAFIOS E PERSPECTIVAS DO FOPS: REAFIRMANDOSE COMO
MOVIMENTO SOCIAL DE DEFESA DA SAÚDE E DA CIDADANIA
O FOPS foi criado em 1991 com os objetivos de intervir na política de saúde do
município de Curitiba e mobilizar a sociedade civil na defesa da saúde pública e da
cidadania.
O FOPS, no decorrer de dez anos, 1991 a 2001, discutiu a política municipal de
saúde, levantou problemas e apresentou propostas nas Conferências e Conselho de
Saúde, participou das mobilizações em defesa da democracia e da saúde, lutou contra
as terceirizações e privatizações na saúde, realizou seminários, cursos de formação e
vários planejamentos para orientar suas ações.
O FOPS desempenhou um papel fundamental na articulação dos movimentos
sociais, entidades da sociedade civil: sindicatos, associações de moradores, comissões
de saúde, e pessoas, que desejavam lutar por um sistema de saúde pública, de
qualidade, universal, integral e com controle social.
Podemos afirmar que o FOPS é uma nova configuração do movimento social.
Ele é expressão da luta desenvolvida em Curitiba na área da saúde. Tem em suas
raízes o caráter contestatório dos movimentos sociais da década de 70, se contrapondo
desde sua constituição à concepção de Estado autoritário e subordinado aos interesses
da classe dominante.
Por outro lado, assume, também, na atual conjuntura, uma postura propositiva
frente aos espaços conquistados a partir da Constituição Federal, no qual a população
vem participando com o intuito de exercer o controle social sobre o Estado.
A Constituição Federal estabeleceu os conselhos de gestão setorial das políticas
sociais na perspectiva de romper com a prática clientelista, patrimonialista e autoritária
do Estado Brasileiro.
Apesar dos avanços do texto constitucional há um forte ataque por parte do
grande capital, aliado aos grupos dirigentes do País aos direitos sociais desde a década
de 90.
94
Podemos afirmar que, nesse período, avançou no Brasil o modelo de Estado
neoliberal que através das reformas administrativa e previdenciária, entre outras
medidas, vem provocando a redução dos direitos sociais e trabalhistas, desemprego,
precarização do trabalho, desmonte da previdência pública, sucateamento da saúde e
da educação.
Os embates ocorridos nesses dez anos, entre a Secretaria Municipal de Saúde de
Curitiba e o FOPS, aconteceram em torno de diferentes concepções de Estado e gestão
pública, e suas conseqüências para o setor saúde.
O propósito do Governo Municipal foi transferir as ações de responsabilidades
do Estado para a Sociedade Civil, política combatida veementemente pelo FOPS no
Conselho Municipal de Saúde. Além do que, realizou denúncias da falta de acesso e
qualidade dos serviços de saúde, principalmente na área de especialidades, e a falta de
medicamentos no Município de Curitiba.
O modelo de gestão, denominado "modelo gerencial", pensado pelo economista
Bresser Pereira, considerava o esgotamento da estratégia "estatizante" e a necessidade
de superação de um estilo de administração pública burocrática, a favor de um modelo
gerencial que tem como principais características a descentralização, a eficiência, o
controle dos resultados, a redução dos custos e a produtividade. "O Estado deve deixar
de ser o responsável direto pelo desenvolvimento econômico e social para se tornar o
promotor e regulador, transferindo para o setor privado as atividades que antes eram
suas." (PEREIRA13 apud BRAVO, 2000, p.112)
O posicionamento do FOPS frente à forma de gestão do SUS em Curitiba foi
crítica e de resistência, as consideradas "inovações" promovidas pelo Governo
Municipal na direção da terceirização dos serviços de saúde. Esta experiência foi
implantada no Estado do Paraná nos Consórcios de Saúde, e os resultados revelaram a
piora na qualidade dos serviços, bem como a realização de cobrança nos
procedimentos (consultas, exames, etc) realizados no SUS.
13 PEREIRA, L.C.B. A reforma do Aparelho do Estado e a Constituição Brasileira. Brasília: MARE/ENAP, 1995
95
Segundo Bravo, vivese hoje uma disputa de projetos na sociedade brasileira.
Um construído durante a década de 80, o projeto da reforma sanitária inscrito na
Constituição Brasileira e, o outro projeto de saúde, articulado ao mercado ou
privatista, hegemônico na segunda metade de 90 (BRAVO, 1999 p. 113).
A primeira ação política do FOPS foi a luta contra a lei criada pelo Governo
Municipal, que estabeleceu uma composição antidemocrática e inconstitucional no
futuro Conselho Municipal de Saúde. Esta ação resultou na ampliação da participação
dos usuários no controle da política de saúde em Curitiba.
O FOPS, no espaço institucional Conferências e Conselho de Saúde
reivindicava transparência dos gastos públicos com saúde; a decodificação dos termos
técnicos para facilitar a compreensão dos setores populares e profissionais de saúde; a
definição de metas e recursos para os projetos governamentais; a divulgação dos
canais de denúncia como o Ministério Público, Central de Atendimento ao Usuário; a
prestação de contas dos convênios realizados com os prestadores de serviços de saúde
privados.
Essa forma de intervenção e participação do FOPS acontecia no contexto de sua
concepção de exercício pleno da cidadania; do entendimento que esse espaço de
participação popular, garantido constitucionalmente, deve ser efetivo, crítico e avançar
na democratização e publicização∗do Estado.
A produção de teses para as Conferências Municipais de Saúde, boletins
informativos, jornais, bem como as ações em defesa da saúde pública no município
revelam seu caráter democrático e defensor intransigente dos direitos sociais.
O investimento do FOPS na qualificação dos seus integrantes deuse, para
intervir nas Conferências e Conselho de Saúde, em reuniões preparatórias a esses
eventos, e na realização de planejamentos. Essa foi uma estratégia permanente do
movimento.
Esse conceito fundamentase numa visão ampliada de democracia, tanto do Estado quanto da sociedade civil, e na implementação de novos mecanismos e formas de atuação, dentro e fora do estado, que dinamizem a participação social para que ela seja cada vez mais representativa da sociedade, especialmente das classes dominadas. (DEGENNSZAJH, 2000, p. 63)
96
"O FOPS preparava a intervenção dos conselheiros para atuar nos conselhos
municipais, conselhos locais, e também junto às conferências. Nesse sentido definiu
estratégias de intervenção na defesa da saúde pública" (M.R., 10/12/01).
O Governo Municipal, frente a forma de atuação do FOPS, investiu na criação
de entidades, como a Central de Movimentos Sociais, no sentido de ampliar o número
de conselheiros de saúde do seu campo político e facilitar a implementação do seu
projeto político.
VALLA ao analisar a participação popular no espaço institucional considera:
(...) que o Estado e as entidades da sociedade civil que defendem os interesses das classes dominantes buscarão sempre bloquear, desviar, impedir esse desenvolvimento do movimento popular, seja restringindo o acesso às informações, fragmentando a participação, limitando o campo das atribuições, retardando decisões ou remetendoas para instâncias superiores, seja através da cooptação das lideranças do movimento popular para aceitarem esses procedimentos em troca de benefícios pessoais ou políticos. (VALLA, 1989, p. 13)
O processo de cooptação da Secretaria Municipal de Saúde de Curitiba junto às
lideranças comunitárias foi registrado nas reuniões do FOPS e denunciado nos seus
boletins informativos e jornais e analisado por este militante:
"Houve cooptação de muitas lideranças de base para defender projetos da
Prefeitura dentro do Conselho Municipal e dentro das Conferências. Neste sentido, eu
acredito que a Secretaria Municipal de Saúde teve sucesso razoável nesses últimos
anos, porque o FOPS vem diminuindo o número de conselheiros e os representantes
de usuários e trabalhadores ligados à administração municipal vem crescendo
razoavelmente" (M. R.,10/12/01).
O Conselho de Saúde é um espaço de conflitos, negociações, no qual os
interesses são disputados. Cada grupo traça estratégias, visando a direção do processo
e, assim, atingir seus objetivos.
DEGENNSZAJH, ao considerar a publicização como mediação entre Estado e
Sociedade civil, coloca o conflito social como inerente ao movimento de publicização,
pois é direcionado pela correlação de forças políticas presentes na sociedade. "(...) A
publicização é um processo construído por sujeitos sociais que passam a disputar lugar
97
de reconhecimento social e político e adquire assim um caráter de estratégia política"
(DEGENNSZAJH, 2000, p.64).
O FOPS nesse processo de disputa de projetos de sociedade, de concepção de
saúde, estabelecidos no espaço institucional, enfrentou muitos debates com vitórias, ou
seja, viu suas posições avançarem e, também, derrotas, quando as posições do campo
contrário prevaleceram.
O FOPS, entre avanços e recuos da sua participação no Conselho Municipal de
Saúde de Curitiba, perdeu espaço, isto é, houve uma redução da sua representação no
referido Conselho.
A redução da representação do FOPS no espaço de controle social do SUS
Conferências e Conselho Municipal de Saúde e a falta de participação popular no
FOPS foi analisada, principalmente à partir de 1999, quando estes problemas
tornaramse mais evidentes.
Para analisar o refluxo da participação das entidades populares e dos
movimentos sociais no FOPS, levamos em consideração alguns aspectos de ordem
externa, tais como: o processo de cooptação do Estado em relação às organizações
comunitárias ; como também, as novas configurações dos movimentos sociais urbanos
frente a atual conjuntura brasileira. E, questões de ordem interna, como: a forma de
organização, composição e estruturação do FOPS.
A conjuntura era favorável como contexto da criação do FOPS.
O FOPS nasceu juntamente com a criação do Conselho Municipal de Saúde.
Nele se integraram núcleos das CEBs, de Paróquias de Igrejas Católicas, Associações
de Moradores, Comissões de Saúde, Pastorais, Movimento Popular de Saúde e
Movimento Popular de Mulheres. Enfim, movimentos sociais que na sua trajetória
lutaram na defesa da saúde pública.
O primeiro ano de funcionamento do FOPS foi o ápice, momento que, a
sociedade civil organizada reivindicou intensamente sua participação no controle da
política de saúde, consolidado na Constituição Brasileira de 1988.
98
A população já estava organizada nas comissões de saúde, no movimento
popular de saúde, já havia atuado no movimento pela reforma sanitária, refletindo em
consonância à conjuntura da época que favorecia uma maior participação.
Os sindicatos e conselhos regionais dos trabalhadores da saúde e sindicatos dos
demais trabalhadores tiveram também uma atuação importante no FOPS, nesta etapa.
No início da década de 90 havia uma presença significativa da Igreja Católica
nos movimentos sociais. Na realidade atual é restrita a influência da teologia da
libertação, reduzindo também a atuação da Igreja como um todo junto às classes
populares.
Com a criação dos Conselhos Locais de Saúde, a partir de 1992, os militantes
das comissões de saúde se integraram nos Conselhos Locais. A falta de uma análise
mais aprofundada a respeito de como deveriam intervir nos espaços institucionais,
ocasionou a desmobilização das comissões de saúde, construídas dentro de uma
concepção de participação popular.
As autoridades sanitárias das Unidades de Saúde vem conduzindo as discussões
nos Conselhos Locais, a partir, muitas vezes, de uma pauta determinada pela
Secretaria Municipal de Saúde. Enquanto as reuniões das comissões de saúde, que
envolviam grande número de moradores, deixaram de existir, reduzindo a discussão
dos problemas da política de saúde aos conselheiros locais.
Até 1994 as associações de moradores se fizeram presentes nas atividades do
FOPS. Atualmente, elas assumiram um papel mais burocrático, utilizando os
parlamentares para intermediar as reivindicações e tendo uma prática de cooperação
com o Estado. A metodologia da participação comunitária, baseada na mobilização,
não tem sido valorizada pela maioria das atuais Associações de Moradores de Curitiba,
uma vez que o clientelismo foi adotado como meio legitimação perante a
comunidade.
Em 1997, após seis anos de funcionamento do FOPS, percebeuse uma
alteração da participação, com forte presença de entidades ligadas aos trabalhadores de
saúde e entidades e movimentos sociais de âmbito municipal, não mais dos bairros.
99
As entidades e os movimentos sociais deixaram de participar no FOPS muito
em função de sua participação no Conselho Municipal de Saúde. Havia interesse de
participação do FOPS para se capacitarem, visando intervir naquele espaço de forma
mais qualificada. À medida que deixaram de fazer parte do Conselho de Saúde, se
afastaram também do FOPS.
Identificamos ainda que lideranças antigas, com experiências de militância nos
movimentos sociais na saúde, se afastaram do FOPS, deixando de contribuir com sua
experiência de participação popular.
O FOPS foi o grande articulador das entidades populares, sindicais,
Universidade, Movimentos Sociais e pessoas que desejavam construir o Sistema Único
de Saúde em Curitiba naquele momento. O momento inicial da união dos setores
democráticos na época de sua criação, foi a inconstitucionalidade da lei que definia a
composição do Conselho Municipal de Saúde, motivando as entidades populares e
sindicais e os movimentos sociais a lutar pela alteração da lei.
Nesses 10 anos, a Secretaria Municipal de Saúde implantou uma rede
organizada e hierarquizada de assistência à Saúde, possuindo atualmente 101 Unidades
de Saúde, 8 Distritos Sanitários e vários programas na área da saúde da criança, da
mulher, do trabalhador, Programa Saúde da Família entre outros. Há, nesse fato, uma
tese empírica de explicação sobre a questão do refluxo da participação das entidades
populares e movimentos sociais no FOPS, como se refere um dos seus integrantes:
"Eu tenho uma avaliação de que houve também uma certa época de refluxo do
FOPS não porque ele tenha perdido a sua força, mas porque as perspectivas de
construção do sistema público de saúde na direção que o FOPS vinha defendendo nos
primeiros anos de implantação do SUS, foram atendidas pelo gestor" (P.P.,
23/11/01).
Essa avaliação reforça a tese que o movimento popular acontece a partir de uma
necessidade concreta da população e quando ela é atendida a tendência é o seu refluxo.
Jacobi avalia que:
100
A maioria dos movimentos segue um determinado ciclo de vida, configurado pela obtenção de resultados positivos ou negativos face as demandas e pelo nível de organização e mobilização conseguido. Geralmente a obtenção dos serviços reivindicados representa o fim do movimento e somente certas situações as lideranças conseguem manter a população mobilizada visando reivindicar pela solução de outras carências. (JACOBI, 1987, p. 20)
A continuidade ou não de um Movimento Social dependerá do nível de
politização e consciência crítica da população envolvida. Sendo que o papel dos
dirigentes dos movimentos sociais consistirá em compreender a realidade, em politizar
a luta travada na sociedade por direitos sociais para que os movimentos avancem na
consciência de classe e exerçam a tarefa de agente de transformação social.
O processo de desmobilização do FOPS não pode ser analisado de forma
isolada dos outros movimentos, que passaram também por este problema.
Identificamos que a falta de participação popular no FOPS e o refluxo de algumas
entidades e movimentos sociais foram objeto dos planejamentos do FOPS realizados a
partir de 1997, mas que ainda continua sendo um desafio a ser vencido.
Quanto à questão interna de explicação da pouca participação dos movimentos
sociais no FOPS está relacionada a sua forma centralizada de organização.
Nesses 10 anos de existência do FOPS e do Sistema Único de Saúde em
Curitiba, existem Conselhos Locais na maioria das Unidades de Saúde, enquanto o
FOPS, somente a partir de 1999, investiu na formação de seus núcleos nas regiões de
Curitiba.
A forma de organização do FOPS foi analisada por um dos seus integrantes.
Este reforçou a necessidade da continuidade das reuniões no centro da cidade com a
participação dos representantes dos oito Distritos de Saúde, que formariam o núcleo
dirigente do FOPS e a população residentes nos bairros, onde se localizam os Distritos,
seria a base do FOPS:
"A direção do FOPS precisa ir mais nos Distritos, assim como os
representantes dos Distritos, dos Conselhos Locais precisam vir mais vezes nas
reuniões no centro, estas reuniões poderiam se caracterizar como da direção do
101
FOPS e as reuniões de bairro, seriam a base social do FOPS. Uma rede de
organizações de base que daria sustentação ao FOPS" (M.R.10/12/01).
Estas explicações sobre o problema da falta de participação da população,
principalmente dos bairros, também foi apontada por integrante do FOPS:
"Sempre foi uma característica do FOPS fazer uma discussão mais qualificada
e mesmo tentando trazer o pessoal dos bairros, a gente não conseguia discutir nas
reuniões do FOPS aquilo que a liderança do bairro queria discutir, que era a falta
de consulta, a falta de medicamento, problema da assistência à saúde, a falta de
estrutura do SUS" (A.C.,14/12/01).
As reuniões do FOPS acabavam privilegiando a discussão pautada no Conselho
que exigiam de seus integrantes domínio do conteúdo dos temas agendados, tendo em
vista realizar uma votação consciente, clara e crítica.
Além da precária descentralização do FOPS, a metodologia das reuniões foi
avaliada no planejamento realizado em 1977 e apontou como desafio, conciliar a
discussão dos problemas de saúde demandados pela população nos bairros e as
discussões mais gerais de organização dos serviços de saúde, como: normas
operacionais básicas, legislação, orçamento da saúde e plano municipal de saúde.
As propostas do FOPS para defender os direitos na política de saúde tem
centrado suas ações no espaço institucional, a prioridade foi qualificar lideranças para
intervir no nível institucional e, atualmente, esta posição vem sendo questionada:
"Eu acho que o embate tem que ser feito de outra forma, através da
mobilização popular (...) o FOPS está perdendo espaço porque o nível institucional
está meio saturado, hoje o gestor ganhou mais espaço institucional, no Conselho de
Saúde, o FOPS não consegue mais o que ele conseguia no início da sua organização,
ele surpreendia com as propostas, o que vai fazer que o SUS avance é a pressão
popular" (A.C., 14/12/01).
O não privilegiamento das ações dos movimentos sociais na luta institucional
foi tema debatido na IX Conferência Nacional de Saúde realizada em 1992. Os
movimentos representados posicionaramse a favor de participarem dos espaços de
102
controle social do SUS porém reforçam a necessidade de continuarem organizados
fora do espaço institucional para garantir sua autonomia e por entenderem que esse
não era o único espaço de controle social. Decidiuse, então que:
A prática do controle social sobre políticas e atividades com a Seguridade Social e promoção da qualidade de vida da população é um componente intrínseco da democratização da sociedade e do exercício da cidadania. Para que se concretize, é importante que os movimentos sociais criem e mantenham seus foros independentes e autônomos, buscando as discussões dos problemas e as soluções para as questões da saúde, numa perspectiva transformadora. A participação, independente de sua forma, deve se dar como uma prática que busque a transformação da estrutura social. Nesse sentido, é inegável a importância da participação dos sindicatos, partidos políticos e demais organizações populares na luta por essas transformações. A preservação da autonomia e independência dos movimentos sociais é fundamental para evitar a sua instrumentalização. O controle social não deve ser traduzido apenas em mecanismos formais, e sim no real poder da população em modificar planos e políticas, não só no campo da saúde. (Relatório da IX Conferência Nacional de Saúde)
A ampliação das entidades populares, sindicais e dos movimentos sociais no
FOPS acontecerá a partir da sua descentralização, da consolidação dos seus núcleos
nos bairros. Discutir a realidade local e intervir neste espaço, buscando soluções dos
problemas de saúde enfrentados pela população, deve ser uma estratégia do FOPS para
fortalecer sua política na defesa da saúde pública.
A sua descentralização não se limita ao município de Curitiba, atualmente o
FOPS está assessorando e incentivando os municípios paranaenses na criação de
Fóruns Populares de Saúde. Esta ação caminha no sentido de fortalecer a sociedade
civil em torno da luta pela saúde pública, visando a consolidação da democracia e da
cidadania.
A questão fundamental nesse processo é analisar em que medida a participação
nos Conselhos tem conquistado direitos sociais e contribuído para a democratização do
Estado.
Quando analisamos a trajetória do FOPS na luta pela saúde pública no espaço
institucional, identificamos ações concretas na direção de tornar o Estado mais
democrático e transparente, seja na fiscalização da gestão dos recursos financeiros,
como também contribuindo na elaboração dos planejamentos e programas de saúde.
103
Essa atuação, porém, enquanto resultados na melhoria no sistema de saúde de
Curitiba se constitui ainda como um desafio, pois problemas identificados na década
de 80 como falta de medicamento, falta de qualidade no atendimento no SUS, falta de
consultas e exames especializados persistem na realidade atual. Um dos limites do
FOPS, na atual conjuntura, é a dificuldade em reunir pessoas, entidades sindicais e
populares para alterar essa realidade e lutar por uma saúde pública de forma integral e
universal.
A contribuição do FOPS na defesa da saúde pública e na democratização do
Estado teve como uma de suas estratégias, a política de comunicação, possibilitando
uma outra versão e contrapondo as concepções de saúde e de sociedade oficiais.
Desde sua criação o FOPS publicou boletins e jornais. Os materiais
informativos tiveram como objetivos: analisar a conjuntura política econômica e
principalmente a da saúde, expressar sua concepção de saúde, informar à população
seus direitos e os canais de denúncias sobre falta de acesso, qualidade e cobrança dos
atendimentos realizados no SUS.
No período próximo à realização das Conferências de Saúde o FOPS publicou
boletins e jornais, apresentou os principais problemas de saúde e apontou propostas a
serem defendidas nas Conferências de Saúde para melhorar a saúde no município.
Na campanha eleitoral para prefeito em 2000, o FOPS publicou seu jornal
tecendo críticas aos Programas de Saúde de Curitiba e as suas razões para não apoiar o
Prefeito à reeleição. O executivo municipal e candidato a reeleição, solicitou à justiça
eleitoral prender o jornal. A democratização do conhecimento e da informação é um
instrumento importante na libertação do Homem. A falta de oportunidade e acesso à
informação limita às pessoas fazerem uma leitura crítica da realidade em que estão
inseridas.
A atuação do FOPS na comissão de imprensa do Conselho Municipal de Saúde
foi fundamental para garantir a liberdade de expressão e a publicação de artigos
críticos à linha política da administração municipal. A partir do momento que o FOPS
começou a perder representação no Conselho e na Comissão, o jornal veicula
104
realizações da Secretaria Municipal, tornandoo mais um veículo de propaganda da
administração municipal.
"O FOPS foi um interlocutor muito respeitado pela própria Secretaria
Municipal de Saúde, porque sabia que a gente denunciava, então eles tomavam
cuidado (...) eles sabiam do poder da palavra que a gente tinha, e o poder de informar
a população".( L.M., 20/11/01 )
O conhecimento e a informação exercem uma influência muito grande, na
medida em que a discussão entre o segmento dos trabalhadores e usuários acontece no
mesmo nível que o dos representantes da administração pública. Isto implica que todos
se encontram no mesmo plano de possibilidades de negociação e participação.
O FOPS se constituiu num canal de denúncia dos problemas de saúde
enfrentados pela população e também dos servidores públicos da área de saúde.
O FOPS muitas vezes foi o porta voz dos servidores do SUS, como explica a
trabalhadora da saúde se dirigindo aos integrantes do FOPS:
"Vocês do FOPS falem o que nós não podemos falar, que nós vamos ser
perseguidos, então muitas vezes o FOPS foi porta voz de pessoas que às vezes não
podiam ir nas reuniões (....) mas com certeza o FOPS ainda é um lugar que recebe
denúncias" (L.M.20/11/01).
O FOPS e os Sindicatos dos Trabalhadores de Saúde reivindicaram nas reuniões
e conferências uma política de recursos humanos que contemplasse o concurso
público, plano de carreira, cargos e salários, relações democráticas, regime jurídico
único de contratação, acesso de todos os trabalhadores e trabalhadoras a um processo
de educação permanente, saúde ocupacional entre outras reivindicações
Com a política de ajuste fiscal e com o projeto neoliberal implantado no país, os
trabalhadores da saúde vêm em parte arcando com as responsabilidades dos problemas
não resolvidos no SUS.
A população mal informada das causas do não acesso ou da má qualidade dos
serviços de saúde prestados, acrescidos da forte campanha de desqualificação dos
105
servidores públicos, acaba culpabilizando os profissionais de saúde e
desresponsabilizando o governo pela prestação desse serviço público.
A integralidade, a universalidade e o controle social no SUS foram princípios
que nortearam a atuação do FOPS no Conselho Municipal de Saúde de Curitiba e no
Conselho Estadual do Paraná.
A contribuição do FOPS se deu também no âmbito Estadual, elaborando teses
para as Conferências e articulando a criação de Fóruns Municipais e o Fórum Estadual
Popular de Saúde, como lembra exintegrante do Conselho Estadual de Saúde: "No
próprio Estado a gente tem discutido formas e mecanismos para avançar em relação
ao SUS, campanhas que foram feitas pelo não pagamento por fora quando as pessoas
forem atendidas no SUS, exigência de mecanismos de denúncia que hoje todos os
municípios tem de ter, propostas que foram discutidas a partir das pessoas que
participaram do FOPS"(A.C. 14/12/01)
A presença atuante do movimento social impulsiona a implantação de políticas
sociais, o Estado cede na medida em que a correlação de forças esteja favorável às
classes populares. Exemplo disso é a definição da política nacional de saúde que teve a
participação e contribuição direta do movimento pela reforma sanitária e do
movimento popular de saúde.
A contribuição do FOPS no município de Curitiba e no Estado do Paraná
também foi e continua sendo relevante para o avanço do SUS nestas instâncias de
governo.
"O Estado do Paraná, a nível nacional, tem sido considerado como Estado em
que o SUS está avançando, muitas vezes as pessoas vêem na figura do Secretario
Estadual de Saúde como um secretário que faz muita coisa, para que as coisas
avancem, na realidade eu diria que a sociedade organizada no Estado do Paraná
principalmente o FOPS teve uma participação muito importante para que o sistema
de saúde no Estado avançasse, mas não o tanto quanto nós gostaríamos"( A.C.
14/12/01)
106
A realidade atual coloca para o conjunto dos movimentos sociais uma tarefa
imensa, na medida em que há um desfinanciamento das políticas sociais numa
intenção clara da redução do papel do Estado, gerando conseqüências gravíssimas para
a sociedade brasileira, como o crescimento da violência, o aumento da pobreza, da
concentração de renda e da falta de perspectiva de mudança dessa realidade.
Construir alternativas e esperança de mudança social passa também pela
atuação do movimentos sociais, principalmente de suas direções numa perspectiva de
compreender a realidade social, de estabelecer uma relação próxima com a população
e formular um projeto político que busque a transformação da sociedade
A participação da sociedade no espaço institucional, vem sendo conquistada
com muita dificuldade pela própria história do país, de conservadorismo, da falta de
exercício democrático, da concentração de poder das classes dominantes,
transformando os canais de participação da população, num mero espaço de
legitimação da vontade dos governantes.
A perspectiva do FOPS na atualidade está centrada no nosso ponto de vista em
dois eixos. O primeiro é a formação política, entendoa como instrumento
fundamental para a população conhecer seus direitos e ao mesmo lutar para obtenção
deles e ter maior capacidade técnica e política no acompanhamento e fiscalização da
política municipal de saúde.
A apropriação da informação é necessária para subsidiar os enfrentamentos que
movimentos sociais estabelecem com Estado nas lutas por direitos sociais e serviços
públicos de qualidade e que de fato possam influenciar na elaboração das políticas
sociais.
O segundo eixo considerado necessário e urgente a ser implementado é a sua
reafirmação enquanto movimento social na saúde. Essa é uma tarefa necessária na
atual conjuntura política em que o Executivo Municipal de Curitiba encaminhou
projeto de lei à Câmara Municipal terceirizando as Unidades de Saúde 24 horas.
Acreditamos que será somente com a mobilização da sociedade que este processo será
interrompido.
107
108
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O FOPS em sua trajetória histórica, foi um movimento social que desde sua
criação atuou intensamente na luta pela defesa da saúde pública e na implementação
do SUS em Curitiba. Ele é expressão e síntese de várias organizações populares,
sindicais, movimentos sociais que num determinado momento histórico se uniram para
lutar na defesa da saúde pública e na implantação do Sistema Único de Saúde no
município de Curitiba.
Na década de 90 que o SUS começa a ser implantado no país e que podemos
dizer que ainda encontrase em processo de implementação, com muitos obstáculos
pela concepção de Estado Brasileiro, fundada na ideologia neoliberal, onde a
perspectiva é a redução do seu papel na área das políticas públicas, na regulação do
mercado, etc. A conseqüência deste modelo é o crescimento do desemprego,
precarização nas relações de trabalho, desfinanciamento das políticas sociais e
aumento das desigualdades sociais.
Os problemas conjunturais e estruturais tem relação direta com a saúde, na
medida que os problemas como o desemprego, baixa remuneração dos trabalhadores,
as condições de trabalho, a desigualdade social, a miséria, o crescimento da violência
urbana e rural, a falta de política de saneamento, as agressões ao meio ambiente
afetam diretamente a saúde, à vida da população brasileira.
É nessa conjuntura adversa aos trabalhadores que o FOPS é criado em 1991, e
uma das suas estratégias desde sua criação foi intervir na esfera institucional com o
objetivo de ampliar as possibilidades de acesso aos setores populares no
fortalecimentos dos mecanismos democráticos visando a definição e a fiscalização da
política de saúde.
O FOPS integrou uma variedade de organizações populares, sindicais,
movimentos sociais, e pessoas que tinham como objetivo lutar pela consolidação do
SUS e defender a saúde pública. Estes sujeitos coletivos trazem para o FOPS as suas
109
experiências de luta na área da saúde, do trabalho, da moradia, etc. se constituindo
espaço importante na luta pela saúde.
É também neste ano que acontece o processo de municipalização dos serviços
de saúde em Curitiba, estruturação das Regionais de Saúde, ampliação das Unidades
de Saúde, realização da 1ª Conferência Municipal de Saúde e criação do Conselho
Municipal de Saúde.
O FOPS teve uma intervenção qualificada na 1ª Conferência de saúde,
mostrando sua capacidade organizativa, política e propositiva, através das teses que
elaborou sobre diversos temas sendo incorporadas nas diretrizes da política municipal
de saúde.
Os embates entre a Secretaria Municipal de Saúde e o FOPS relatados e
analisados na pesquisa revelam concepções de modelo de gestão, de saúde divergentes
e uma relação conflituosa no processo de discussão e deliberação da política municipal
de saúde.
Nos dez anos de participação do FOPS no conselho de saúde várias decisões
importantes foram deliberadas relacionadas com a organização e com a
implementação do SUS e de seus princípios fundamentais, como a democratização das
ações de saúde, o acesso e qualidade dos serviços prestados e o controle social no setor
de saúde.
Essa experiência no Conselho Municipal de Curitiba possibilitou ao FOPS uma
visão crítica sobre este espaço de gestão participativa. O modo de funcionamento, a
burocracia instituída limita a espontaneidade dos movimentos sociais para apresentar
os problemas vivenciados. Outro problema é a lentidão do gestor às demandas trazidas
pelos conselheiros, gerando o descrédito neste mecanismo de controle social da
política da saúde.
O papel desempenhado pelos profissionais de saúde na democratização da
informação, do conhecimento técnico aos participantes dos movimentos sociais foi
importante como foi destacado por líderes de movimentos sociais entrevistados, porém
110
há também críticas ao número de reuniões que tratavam de conteúdo técnico com
pouco tempo para discutir os problemas de saúde mais localizados nos bairros.
Por um lado a necessidade de capacitação era necessária para o conselheiro
exercer de fato o controle social, dominar o conteúdo em pauta, atuar de forma crítica
e responsável. Por outro lado há ainda que se desenvolver uma relação entre o técnico
e população na qual a educação em saúde seja um campo de prática e conhecimento
que se ocupa com a ligação entre a ação de saúde e o pensar e fazer do dia a dia da
população
111
A participação dos movimentos sociais nos espaços institucionais tem uma
tarefa importante a desempenhar, mas isso não significa que a ação política
desenvolvida junto aos movimentos sociais deva ser interrompida em detrimento da
luta institucional.
Nesse sentido, Bógus (1998) considera o espaço da política e dos movimentos
sociais como canais complementares da ação política, porém são distintos entre si: "a
diferença que deve ser mantida entre os movimentos sociais e seu espaço de atuação e
o espaço da participação popular institucionalizada, significa que o primeiro deve
alimentar o segundo, mas não pode ser identificado ou se confundir com este".
(BÓGUS, 1998 p. 36)
Nesse sentido o FOPS atualmente vem implementando seu projeto de
descentralização das suas ações políticas nos bairros de Curitiba, bem como nos
municípios do Estado do Paraná.
O FOPS na atual conjuntura avalia a necessidade de implementar seu projeto de
descentralização pensado em 1997, criando novas estratégias e metodologias que
aproxime a população do FOPS.
A redução da participação do FOPS no espaço institucional vem propiciando
seu redirecionamento nas ações, no sentido de reestruturar o movimento social na
saúde tendo em vista os desafios colocados para os setores democráticos e populares
que lutam pela saúde pública, pela cidadania e por uma sociedade verdadeiramente
democrática e justa.
O FOPS precisa, sobretudo, ampliar a participação popular nas suas atividades
e na sua direção para cumprir com sua função política, ou seja, organizar, mobilizar
os setores excluídos das políticas públicas para conquistar os direitos sociais, e uma
sociedade verdadeiramente democrática como consta nos seus princípios.
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APÊNDICE 1 DEPOIMENTOS CITADOS EM ENTREVISTAS REALIZADAS NOS ANOS 2001 E 2002
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DEPOIMENTOS CITADOS EM ENTREVISTAS REALIZADAS NOS ANOS
DE 2001 E 2002.
(A. B.) Militou no Movimento Popular de Saúde e Comissões de Saúde, no final da
década de 70 e na década de 80, atuando na paróquia da Vila São Pedro, no bairro
Xaxim em Curitiba. Atualmente, trabalha no Departamento de Estudos Sócio
Econômicos Rurais DESER. Foi um dos fundadores do FOPS.
(A. C.) Psicólogo de formação. Iniciou sua militância no movimento popular de luta
pela moradia e na organização de associações de moradores, prosseguindo no MOPS e
FOPS. Foi liberado do FOPS, conselheiro de saúde municipal e estadual. Atualmente,
trabalha na Prefeitura Municipal de Maringá, atuando diretamente na organização dos
conselhos locais e na reestruturação do controle social nesse município.
(D. C. G.) Auxiliar de enfermagem, servidora pública licenciada da Secretaria
Municipal de Saúde de Curitiba. Fundadora do FOPS, foi militante da Comissões de
Saúde na década de 80. Atualmente, é militante do FOPS, assessora parlamentar e
conselheira local de saúde.
(E. S. F.) Militante em movimentos comunitários desde 1972, foi presidente da
Associação de Moradores da Comunidade Santo Inácio de Loiola, no bairro Boqueirão
em Curitiba por três gestões. Participou do II Encontro Nacional de Experiências em
Medicina Comunitária ENEMEC.
(F. F.) Médico pediatra e especialista em saúde pública, lotado na Secretaria
Municipal de Saúde de Curitiba da qual está licenciado para exercer o cargo de
Deputado Federal (PT). Militou, na década de 80, no Movimento de Renovação
Médica REME, e nos movimentos sindical e popular de saúde. Foi fundador do
FOPS.
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(L. M.) Socióloga, fundadora do FOPS, trabalhou na Secretaria Estadual de Saúde
desde 1981, aposentandose em 1998. Representou o Sindsaúde, no FOPS e nos
Conselhos Municipal de Curitiba e no Estadual de Saúde. Atualmente, é dirigente
sindical e militante do FOPS e do Movimento Popular de Mulheres.
(M.G.S.) Médica pediatra, especialista em saúde pública e mestrado em saúde
materno infantil. É diretora da área de Planejamento e Informação da SMS/Curitiba.
(M.R.S.) Militante dos movimentos populares, foi coordenador geral da Central de
Movimentos Populares no Paraná e do FOPS. Foi conselheiro Municipal e Estadual de
Saúde em várias gestões. Atualmente, é assessor parlamentar.
(P. P.) Enfermeiro, mestre em enfermagem e professor da UFPR. Integrou o FOPS
desde seu início, ocasião em que representava a Associação dos Professores da UFPR.
Atualmente é militante sindical e do FOPS.
(S.G.) Iniciou a militância comunitária na comissão de saúde da paróquia Sagrado
Coração de Jesus, na década de 80. Integrou o FOPS desde sua criação, buscando fazer
a ligação entre o Fórum e a comunidade. Participou do Conselho Municipal de Saúde
(S.M.) Médico da rede municipal de saúde de Curitiba, atuando na Unidade de Saúde
Irmã Tereza de Araújo, desde 1979. Foi militante do Movimento Popular de Saúde, do
FOPS e vereador em Curitiba.
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ANEXO 1 ORGANIZAÇÃO E NORMAS REGIMENTAIS DO FÓRUM POPULAR DE SAÚDE FOPS
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