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LIVRO DIDÁTICO DE LÍNGUA PORTUGUESA: UMA FERRAMENTA PARA A AMPLIAÇÃO DA EDUCAÇÃO LITERÁRIA?
Leonardo Capeletti Ferreira (LETRAS-UEL)
Cláudia Lopes Nascimento Saito (orientadora) RESUMO: O lugar do texto literário no ensino, na educação, diz respeito a valores culturais, identitários e patrimoniais que devem permear o imaginário simbólico das novas gerações. As suas representações guardam uma especificidade, pois criam um mundo sobreposto ao mundo ordinário e, por isso, permitem a emergência de conteúdos vividos que não encontrariam meios de realização nas atividades cotidianas. Sendo assim, um dos objetivos principais da escola deveria ser o de possibilitar que os alunos participassem de práticas sociais que se utilizam da leitura de maneira crítica, ética e democrática, de forma que fomentassem a iniciação e ampliação da educação literária. Para avaliar de que forma a leitura literária vem sendo trabalhada no LD Ensino Médio, analisamos uma coleção de livro didático que passou pelo crivo do PNLD 2012 e que foi adotada pela maioria das escolas do município de Londrina/PR, Nosso intuito foi também o de estudar de que forma o enfoque didático dado contribuiu para que o aluno fosse protagonista na sua interação com o autor e o texto literário. Palavras-chave: leitura literária; livro didático; ensino médio
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Introdução
Com base nos documentos oficiais prescritivos para o ensino de língua
portuguesa no Ensino Médio - Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNEM) e
Orientações Curriculares para o Ensino Médio (OCEM) – percebe-se que há pontos em
comum, porém um deve ser ressaltado: a atribuição do caráter sócio-histórico
(BAKHTIN, 2003 [1929]) à literatura. No entanto, pouco disso efetiva-se de fato em
sala de aula, muitas vezes pelo conteúdo mal engendrado dos livros didáticos de Língua
Portuguesa (doravante, LDP) e/ou a insuficiente orientação que vise possibilitar ao
professor a melhor utilização desse instrumento em suas aulas.
Segundo Bakhtin, a leitura literária requer uma “responsividade ativa”
do leitor, dessa forma não estaria ele apenas recebendo passivamente as informações,
mas realizando uma leitura crítica do texto: apropriando-se dos gêneros específicos
dessa interação, para que se faça bom uso deles.
Indo de encontro com as palavras do filósofo russo, Kleiman ( apud
BUZZEN e MENDONÇA, 2007) sugere que as práticas pedagógicas devem utilizar o
texto como objeto de estudo, já que é campo natural para a análise de todos os
fenômenos da comunicação humana , sem, no entanto, fragmentá-lo para o
preenchimento de questões e atividades históricas ou gramaticais.
1. Revisitando o conceito de leitura literária
Aponta-se como meta do Ensino Médio, o olhar sobre as ações que
articulam os conhecimentos à vida dos estudantes, a seus contextos e realidades; com a
finalidade de atender suas necessidades e expectativas. O foco na leitura e letramento,
como elementos de interpretação e de ampliação da visão de mundo, é segundo
prescreve-se basilar para todas as áreas do conhecimento (BRASIL/MEC, 2006).
É também de interesse, como indica as Orientações Curriculares para
o Ensino Médio (OCEM), a atribuição dada à literatura de proporcionar, ao aluno,
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reflexões sobre seu papel social, cujo contato entre aluno-texto levará a um estado de
humanização. Utiliza-se, portanto, tal documento, de uma passagem de Candido (1995),
que diz:
entendo aqui por humanização [...] o processo que confirma no homem
aqueles traços que reputamos essenciais, como o exercício da reflexão, a
aquisição do saber, a boa disposição para com o próximo, o afinamento das
emoções, a capacidade de penetrar nos problemas da vida, o senso da
beleza, a percepção da complexidade do mundo e dos seres, o cultivo do
humor. A literatura desenvolve em nós a quota de humanidade na medida em
que nos torna mais compreensivos e abertos para a natureza, a sociedade, o
semelhante. (CANDIDO, 1995, p. 249).
O que prova ser indiscutível esse enfoque seja aquele dado ao texto
literário em sala de aula. Entretanto, para Martins (apud BUZZEN e MENDONÇA,
2007), o que limita esse aspecto é justamente a utilização do texto literário no
aperfeiçoamento curricular, buscando o escrever bem, falar bem, ter bom vocabulário e,
enfaticamente, alcançar bom desempenho em provas como ENEM e PISA.
A autora busca, em seu texto “A literatura no Ensino Médio: quais os
desafios do professor?”, desmitificar esses paradigmas que tanto afastam o alunado dos
demais objetivos que seriam concernentes à leitura. Expõe ainda que, o texto não deve
ser visto como exemplo máximo de beleza, cujo fenômeno decorativo serviria de base
para que o estudante possa escrever bons textos, num ato que beira ao pastiche.
Sendo assim, de acordo com ela, o professor deveria se atentar a esses
aspectos para que não seja realizado um trabalho que valorize apenas o cânone literário,
em detrimento ao que se vem produzindo atualmente e, nem mesmo, esteja preso a
questões diacrônicas que impeçam, de certa forma, o contato do aluno com o texto
literário por ser este demasiado distante de sua realidade, impossibilitando o dialógico
entre autor/texto/aluno. Para isso, a autora reconhece que o profissional da educação
precisa ter à sua disposição um bom instrumento para que, em efetiva mediação, possam
servir os LDP como ferramentas didáticas adjetivadas com o caráter
sóciodiscursivo/interacionista.
2. O livro didático: o que diz o PNLD?
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O Programa Nacional do Livro Didático, o PNLD, analisa sete
componentes (divididos em vários itens) dentro de um LD, entre eles, a natureza do
material textual; as atividades de leitura e compreensão de textos escritos e a produção
desses; propostas para a produção e compreensão de textos orais, trabalhos e reflexões
sobre os conhecimentos linguísticos, o manual do professor, os aspectos gráfico-
editoriais (BATISTA; ROJO; 2004).
Nessa análise, busca-se verificar se as propostas pedagógicas para o
ensino de língua portuguesa no Ensino Médio se propõem a (PNLD/2012): 1º) ampliar
e aprofundar a convivência do aluno com a diversidade e a complexidade da LP, em
diferentes esferas de uso, propiciando-lhe um acesso qualificado à cultura escrita
disponível para jovens e adultos; 2º) desenvolver sua proficiência, seja em usos
públicos da oralidade, em leitura, em literatura, em produção de gêneros textuais
relevantes para a formação escolar, para o ingresso no mundo do trabalho e para o
pleno exercício da cidadania; 3º) propiciar-lhe tanto uma reflexão sistemática quanto a
construção progressiva de conhecimentos, não só sobre a LP, mas também sobre
linguagens; 4º) aumentar sua autonomia relativa nos estudos, favorecendo, assim, o
desempenho escolar e o acesso aos estudos de nível superior.
Essas características buscadas devem dialogar com duas metodologias
entendidas pelo GUIA/PNLD como essenciais para o bom trabalho em sala de aula. A
primeira delas refere-se à metodologia “transmissiva”:
A metodologia se mostra transmissiva quando a proposta de ensino assume
que a aprendizagem de um determinado conteúdo deve se dar como
assimilação, pelo aluno, de informações, noções e conceitos, organizados
logicamente pelo professor e/ou pelo próprio material didático. Bons
resultados, nesse tipo de abordagem, exigem, antes de mais nada, uma
organização rigorosamente lógica da matéria, respeitando-se, entre outras
coisas, a cronologia dos fatos examinados na história da literatura (
PNLD/2012, p.15)
Nessa perspectiva, a literatura e a leitura literária, assim como os
demais eixos de ensino de língua portuguesa no EM, seguiriam uma rigorosa
organização que, utilizando-se de dados concretos e lógicos, se limitaria a questões
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historiográficas e biográficas. Ponto esse que, como aponta Martins ((apud BUZZEN e
MENDONÇA, 2007),), não permite ao aluno aproximar-se realmente da obra e fazer
dela a sua própria leitura.
Outra metodologia, de caráter construtivo-reflexivo, tem como base
permitir que o aluno realize suas próprias interpretações, baseando-se em análises
devidamente conduzidas pelo professor e/ou livro didático, vistos, pelos documentos,
como mediadores desse processo.
Faz-se, então, imprescindível uma organização que reproduza o
movimento “natural” da aprendizagem, e não a “lógica da matéria”, portanto, para isso,
é preciso considerar cada atividade isoladamente e dentro da sequência proposta. Desta
forma, considera-se que aprendizagem procede da apreensão das funções sociais e do
plano sequencial de um gênero.
No que concerne especificamente à literatura, o PNLD assinala, como
nítida evidência, duas tendências metodológicas polares: 1ª) a literatura tratada ou como
um eixo de ensino próprio; 2ª) tratada como um objeto de conhecimento particular, que
se constrói por meio da leitura de textos culturalmente considerados como “literários”.
Para elucidar questões acerca dos textos tidos como culturalmente
“literários” e o seu respectivo papel dentro da sala de aula, nos PNLD consta que:
a cultura socialmente legitimada, de que a escola é porta-voz, e na qual a
literatura erudita é uma peça central, não deve se impor pelo silenciamento
das culturas juvenis, populares e regionais que dão identidade social ao
alunado do EM, mas como resultado de um diálogo intenso e constante, em
que seus valores e sua pertinência para a vida do jovem como futuro cidadão
se evidenciem para o próprio jovem.(PNLD/2012, p. 9)
Para o programa, a leitura literária é o objeto específico do
componente curricular, e não os conhecimentos sobre a literatura. Em consequência, a
formação de um leitor particular e diferenciado é apontada como o objetivo principal
desse ensino, apoiada na construção paralela de um corpo próprio de conhecimentos
históricos e linguísticos/literários. Esse corpo ligado à história e à linguística pode
parecer, porém, justamente o que se busca evitar no que se vincula à leitura literária.
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De acordo com Jurado e Rojo ( apud BUZZEN e MENDONÇA,
2007), um. fator preocupante, todavia, é o modo como as prescrições encontradas nos
documentos oficiais acabam, em muitos aspectos, sendo ignoradas na elaboração do
LDP Ainda segundo as autoras, o que ocorre, por vezes, é uma simulada visão sócio-
histórica/sócio-discursiva para que o livro produzido passe no crivo do Programa
Nacional do Livro Didático (PNLD/2012).
No “Manual do Professor”, na “Carta ao aluno” ou no embasamento
teórico apresentado ao órgão responsável pela aceitação ou recusa do LDP, encontram-
se explicitamente vinculadas as relações entre o que é prescrito e o que, supostamente,
serviu de base para a elaboração do livro em questão; entretanto, quando analisado seu
material interno (as atividades, textos de base, projetos pedagógicos), é possível
verificar que muito pouco resta daquilo que se almeja para o ensino, principalmente no
que corresponde à literatura.
O quadro geral do tratamento que cada coleção dá ao ensino da
literatura e à formação do leitor são apontados, pelo PNLD, como focos de análises
relevantes e indissociáveis. Dessa forma, analisar o corpus, ou seja, o LDP, sob essas
perspectivas, é de suma importância.
3. Análise do corpus
Sobre o livro didático da coleção “Língua Portuguesa: linguagem e
interação”, desenvolvida por Faraco, Moura e Maruxo Júnior., considera, o Guia de
Livros Didáticos/PNLD-EM/2012, como ponto forte, a abordagem dos conhecimentos
linguísticos por destacar as dimensões textual e discursiva da língua, da mesma forma
como indica, negativamente, a ausência de textos teóricos sobre a produção de literatura
no Manual do Professor.
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Destaca-se, ainda, segundo o programa nacional, a articulação entre os
eixos de ensino, favorecida por projetos didáticos ao final de cada unidade. Esses
aspectos fazem parte da resenha de cada coleção disponibilizada ao professor.
Depois desse quadro diminuto, segue-se um exame pouco mais
aprofundado. Dentro desse, destaca-se o trecho: “No ensino de literatura, os textos
escolhidos são relevantes para a formação do leitor, considerando-se a
representatividade de autores das correntes estético-literárias” (FARACO, MOURA;
MARUXO, 2010).
Esses elementos podem ser observados no decorrer da coleção, em
cujos volumes, podem ser encontrados autores que não pertencem completamente ao
cânone literário, ou do cânone de literaturas estrangeiras.
Há, dentro de cada capítulo, um texto inicial e, subsequente a ele, um
conjunto de atividades intituladas: “Para entender o texto”. As questões propostas
mostram caráter interpretativo-reflexivo, isto é, a partir do enunciado, o aluno refletirá
frente ao texto sob essas atividades dialógicas.
Um quadro que demonstra alguns problemas é o denominado
“Gramática textual”. Mesmo fazendo uso de igual texto, aqui se encontram
questionamentos estanques, de solução meramente decodificáveis. É comum, nesse
quadro, indagações acerca dos tempos, passado, presente e futuro; primeira ou terceira
pessoas; classificações adverbiais e verbais; dentre outros fatores. Esses casos não
permitem ao aluno dialogar com o texto lido, apenas recortar informações já prontas.
A abordagem histórica, apesar de dispersada em todo o livro,
concentra-se no que se chamou de “Literatura: teoria e história”. Ainda que, trazendo
apontamentos interessantes sobre teorias e alguns fragmentos que podem chamar a
atenção do alunado, muitas vezes restringem-se a explicações que, desassociadas dos
textos anteriores, aparece apenas como informações historiográficas e monológicas.
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Desta forma, o texto literário, diferente do que é apontado como
essencial, não é visto nesta coleção como um enunciado prenhe de significados, de onde
se emanam muitas vozes e discursos. Nessa coleção, na maioria das vezes, serve apenas
de objetos de análises descontextualizadas, abandonando as características do gênero
dentro de sua esfera real, fator esse apontado por Martins (apud BUZZEN e
MENDONÇA, 2007) como imprescindível para que o alunado realize boa valoração
sobre a literatura.
4. Considerações finais
Como se pôde constatar a partir dos documentos oficiais (PCNEM e
OCEM) que mesmo havendo pontos em comum entre eles, pouca coisa do que é
prescrito é apresentado efetivamente no livro didático que tem sido, na maioria dos
casos, a única e exclusiva ferramenta de ensino utilizada pelo professor de língua
portuguesa do EM. As proposições encontradas nos documentos oficiais, como se
buscou evidenciar nesse trabalho, não se mostram evidentes na formulação do LDP.
Outra constatação é que, ao verificar o discurso que perpassa pelo
“Manual do Professor”, “Carta ao aluno”, como também as propostas metodológicas,
encontrou-se que comprovam o caráter dialógico, visado pelo Programa Nacional do
Livro Didático, mas que não se refletem na elaboração das atividades, muitas vezes
insipientes, não havendo abertura para debates, reflexões, uma vez que as leituras,
especificamente, do texto literário faz-se por meio de decodificação ou verificação
gráfica, criando o distanciamento do aluno com a leitura, dificultando, quando não
impossibilitando, o processo de humanização que somente a leitura literária permite.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BAKHTIN, M.. Estética da criação verbal. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2003 [1929]. BATISTA, A. A. G.; ROJO, R. Livro didático de língua portuguesa, letramento e
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Ensino Médio. Brasília: MEC/SEF, 2007. CANDIDO, A. O direito à literatura. São Paulo: Duas cidades, 1995. FARACO, C. E.; MOURA, F. M de; MARUXO, J. H. J. Língua portuguesa: linguagem e interação. São Paulo: Ática, 2010. JURADO, S.; ROJO, R.. A leitura no ensino médio: o que dizem os documentos oficiais e o que se faz. In: BUNZEN, Clécio; MENDONÇA, Márcia [orgs.]. Português no
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