Post on 09-Mar-2016
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Aprendizados da Formação em Terapia Comunitária
Narcizo de Souza Chagas
O Centro Dialogu é uma organização voltada para a formação humana, com a missão de
contribuir para a justiça social e a democracia. A experiência formativa vivida ao longo de
cinco anos com educadores, lideranças sociais, jovens e profissionais da saúde nos têm
colocado questões ético-políticas profundas, principalmente no que concerne ao
comportamento social.
A sociedade mundial vive uma crise profunda de valores. Nossas ações institucionais e
nossas articulações em redes e fóruns de ONG´s e nas políticas públicas têm pautado a
necessidade de criar as condições de diálogo em torno de princípios norteadores de um agir
qualificado tanto na esfera pessoal quanto na coletiva, para a construção de um outro
mundo possível.
Em todo o mundo experiências sólidas de vida comunitária têm se constituído laboratórios
humanos coletivos de valores, em nossa prática temos encontrado na Terapia Comunitária a
fonte para a propagação da solidariedade, do amor, da justiça como elementos bases para a
autodeterminação.
Em cinco anos de trabalho formamos 120 Terapeutas Comunitários que mudaram a sua
própria leitura do mundo e estão sem dúvida mudando o mundo. Em 2004, apresentamos ao
Programa Nacional de DST/AIDS do Ministério da Saúde, o Projeto TIC – Terapias Integradas
na Comunidade – Prevenção e Acompanhamento em DST/HIV/AIDS, objetivando a formação
de 80 Terapeutas Comunitários para atuarem em organizações da sociedade civil que
trabalham com populações em situações de vulnerabilidade psicossocial, além de
proporcionar o cuidando do cuidador para os profissionais e voluntários dessas
organizações.
Com a aprovação do projeto pudemos mobilizar uma rede de organizações da sociedade civil
que atuam em frentes diversas: prevenção e acompanhamento às pessoas vivendo e
convivendo com DST/HIV/Aids, meninos e meninas em situação de rua, dependentes
químicos, taxistas, gays, lésbicas, travestis, católicos, espíritas, evangélicos dentre outros.
Uma rica diversidade de organizações e de sujeitos sociais na luta pelo reconhecimento e
pela efetivação da diversidade e dos direitos humanos.
Uma diversidade rica em sua complexidade e difícil na sua operacionalidade, tendo como
pontos críticos à relação com os espaços de atuação pela situação de rotatividade de
agentes, pela dinâmica de sustentabilidade das pessoas e a própria realidade social de lidar
com os conflitos inerentes a vida individual e coletiva.
Nos deparamos com a necessidade de pactuar e fazer acordos nem sempre compreensíveis
para todos, mas ao mesmo tempo possibilitadores da construção de processos individuais e
coletivos de aprendizagens. Vivenciar a Terapia Comunitária nesse grupo diverso, sem
dúvida tem sido um desafio imensurável, que proporciona oportunidades de estabelecer
conexões com as representações sociais construídas pelos excluídos. Percebemos no
processo formativo as contradições dos que dialogam com a exclusão e lutam pela sua
superação, em muitas situações e circunstancias são reprodutores desse modelo,
conseqüência de suas experiências histórico-sociais.
Compreendemos no decorrer do projeto TIC, que somente com a mudança de atitude das
pessoas, é possível mudar o mundo. A mudança não pode ser meramente estrutural, antes
de tudo deve ser fundamentalmente humana. A Terapia Comunitária com a sua pedagogia
da escuta possibilita ao sujeito da TC uma oportunidade de mergulhar em si, de
compreender e ter uma atitude solidária com o seu sofrimento e o do outro, de forma
sinergética e altruísta.
A dinâmica do projeto nos possibilitou o aprendizado de que a TC é uma ferramenta
privilegiada para a promoção da diversidade e da solidariedade. Na TC estamos todos numa
relação de eqüidade, nos colocamos como sujeitos coletivos na dinâmica da reciprocidade,
valores inerentes às comunidades humanas.
A constituição de uma comunidade de valores humanos somente é possível quando de fato
mergulharmos no universo de vida das pessoas; compreendemos o seu lugar na história, e a
sua capacidade de promover transformações possíveis individuais e coletivas.
A riqueza da diversidade das organizações integrantes do projeto e particularmente das
pessoas em formação nos fez perceber que nossas ações precisam focar os resultados nas
pessoas, nas suas transformações, nas suas competências, e que a promoção da vida
pressupõe uma resignificação permanente da identidade e dos valores humanos.
A ação preventiva e de acompanhamento em DST/HIV/AIDS tem uma lacuna que precisa ser
equacionada, e a vivência do projeto apontou significativamente para isso; precisamos
cuidar das pessoas, ajudá-las no encontro com o seu Ser profundo. Não basta campanhas
publicitárias, que parecem marketing de camisinhas, nem mesmo palestras que parecem
comícios políticos, mas antes um encontro consigo mesmo e com outro, proporcionado
através de iniciativas educativas, que sejam afirmativas e corroborem com a dimensão
sensível do humano.
O projeto possibilitou o acesso há descoberta de caminhos para esse mergulho profundo e o
empoderamento por meio do conhecimento popular e cientifico, aprimorando o diálogo, o
cuidado e a atitude frente à vida com as suas adversidades.
A Terapia Comunitária é o recurso político-pedagógico estratégico para a formação de
pessoas solidárias e comprometidas com as transformações necessárias para um mundo
melhor. O Ministério da Saúde tem possibilitado esse aprendizado institucional com o apoio
ao projeto TIC, ao passo que colaborou para as condições de replicação dessa metodologia
com populações em situação de vulnerabilidade social, através dos Terapeutas Comunitários
formados pelo projeto.