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“As polícias políticas, os governos e os movimentos sociais em “Ligas” entre 1945-
1964”
Por Fabíola Camargo•
Introdução:
O presente artigo objetiva analisar de que forma as instituições policiais se
organizaram e se ampliaram, aumentando a atuação contra os movimentos sociais entre
os anos 1945-1964, período este, considerado democrático. Ao buscar analisar de que
forma as instituições se organizaram durante este período, por um lado, questiono esta
democracia com a documentação das próprias polícias e de que forma os governos de
então se instrumentalizavam com as polícias políticas. Por outro lado, identifico como
foi possível perceber a atuação das mesmas em relação aos movimentos sociais a partir
das apreensões, relatórios e boletins. Neste sentido as “Ligas” fizeram parte deste
processo tanto como forma de resistir a repressão no campo neste período, quanto na
possibilidade de perceber a anterioridade da organização em ligas antes da década de
1950, se movimentando na trincheira das instituições e dos governos, com sua
existência no campo e no Estado do Rio de Janeiro.
Ao trabalhar com os arquivos das polícias políticas, presentes no APERJ-
Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro - esta possibilidade se tornou fundamental
por tirar episódios fundamentais da História do Brasil pouco conhecidos ou ainda
desconhecidos, dos porões onde se guardam documentos das ações dos movimentos
sociais, que fizeram e ainda fazem, parte importante da História das maiorias no Brasil
que conhecemos pouco ou ainda desconhecemos.
As hipóteses:
• Mestranda do Programa de Pós-Graduação em História Social na Faculdade de Formação de Professores da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
Para aferir a hipótese de ampliação da criminalização dos movimentos sociais no
período compreendido como “democrático”, trabalho as questões que levaram o
aumento do controle destes movimentos, utilizando as fontes institucionais e a
bibliografia especializada e observando as atribuições e estrutura das polícias políticas
neste período. Para isso, foi preciso ainda, remeter-me as ações das mesmas, nas quais
recorri a documentação das próprias polícias políticas, escritas entre os que atuavam
diretamente na ponta dos movimentos sociais, nas ruas. Estas fontes estão disponíveis
no APERJ - Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro.
Já a hipótese de que a polícia política conspirava contra o governo João Goulart
entre 1961 e 1964, instrumentalizada pelo Governador Carlos Lacerda vem à tona ao se
conjugar com o aumento do efetivo policial, da organização mais apurada e centralizada
das polícias políticas até 1960, com a criação da DPS e da DFSP desde 1944 e
finalmente com o DOPS - Departamento de Ordem Política e Social entre 1962 e 1964,
que dedicou-se ao aumento da organização e trouxe da DPS - Divisão de Polícia
Política e Social instrumentos de atuação e repressão policial cada vez mais fortes no
Estado da Guanabara.
Com a compreensão e explicação mais ampla sobre a estrutura e a ligação entre
os governos e como os aparatos institucionais de repressão aumentaram neste período,
trabalho aqui também a hipótese de que os movimentos sociais organizados em “Ligas”
atuavam como trincheira neste contexto. Muito se tem escrito sobre o papel das Ligas
camponesas: nos depoimentos dos seus militantes, de intelectuais, através de
publicações diversas, arquivos pessoais. No entanto, através dos organismos de
repressão foi possível percorrer outros caminhos pelos quais passaram os militantes
organizados em “Ligas” que a bibliografia até os dias de hoje não referendou.
As polícias políticas
O processo de centralização das polícias políticas aliado ao anticomunismo das
elites dirigentes diante da movimentação da classe trabalhadora e com a criação do
MUT – Movimento de Unificação dos Trabalhadores, pôs em xeque o regime
democrático recém implantado a partir de 1946, já que a perseguição aos militantes se
acirrou daí em diante em função da conjuntura mais ampla de guerra fria que
contemplava, a nível internacional, o pleno funcionamento dos aparelhos repressivos no
país.
O papel da polícia entre 1945-1964 vinha seguido de transformações na própria
Legislação. Observando-a como parte de um determinado aumento da segurança, a
reedição da LSN - Lei de Segurança Nacional - em 1953, objetivava impedir ações dos
movimentos sociais em ascensão. Esta lei reeditada de 1935 com objetivo de frear o
“perigo” comunista, faz parte de uma conjuntura maior do contexto das guerras
mundiais, e que no Brasil alargou e organizou de forma centralizada a ação das polícias
políticas criando um clima de medo e preconceito contra qualquer organização social
que questionasse o poder então constituído. ( REZNIK, 2004)
Aliado a criação de diversos órgãos e apreensões constantes no âmbito Federal e
local, e ao mesmo tempo com a desconfiança intra-elites, conjugaram-se e formaram-se
como base em conflitos deste período: a reforma mais geral no poder judiciário durante
o Estado Novo e a reformulação do código Penal, do Código do processo penal e da Lei
de contravenções, a Polícia Civil passou a se constituir enquanto Divisão buscando
assim adaptar-se a Constituição de 1937.
O pressuposto do ambiente de guerra esquentava o sangue de suspeitos
“comunistas”, intensificado concomitantemente pelos Estados Unidos, Inglaterra,
Alemanha e Itália, quanto ao perigo do “credo vermelho”, e tão temidos, citados e
apreendidos no mundo Capitalista, com exposição frequente na documentação da DPS,
polícia política criada em 1946 que teremos oportunidade de observar.
Do ponto de vista institucional, neste período, a polícia adquiriu status de
Divisão com o decreto-lei 6.378 de 28 de março de 1944. Assim, a polícia civil do
Distrito Federal foi transformada em Departamento Federal de Segurança Pública -
DFSP, com atribuições locais e também nacionais. Este Departamento passou a ter as
seguintes Divisões: Polícia Técnica, Polícia Marítima, Aérea e de fronteiras. Além
disso, a Divisão de Polícia Política e Social foi organizada com uma Delegacia de
Segurança Política (D.SeP), e outra, a Delegacia de Segurança Social (DSS), com as
Seções de Fiscalização e Explosivos, Armas e Munições, Arquivo e a Seção de
Administração.
No âmbito Nacional, a DFSP ficou responsável pelo movimento de entrada e
saída dos estrangeiros, particularmente imigrantes – tarefa esta, onde a estatística foi de
grande valia como instrumento de vigilância e controle social. ( LEX - 1944, v.8: 115-
117)
Neste mesmo período, a DPS – Divisão de Polícia política e Social foi aprovada
por decreto-lei 20.532-a de 25 de janeiro de 1946, e em seu regimento determinava
entre suas funções a “necessidade de manter atualizado o fichário de pessoas que
interessassem ao DFSP e a galeria fotográfica de indivíduos expulsos do território
nacional, além dos reconhecidos como nocivos à ordem pública e aos interesses do país.
(LEX - 1946, v.II:467-468)
Cabe ressaltar a ampliação de competência da DFSP no âmbito Nacional com o
decreto-lei n. 9.353 de 13 de junho de 1946, ficando estabelecido que cabia a “apuração
das infrações penais que atentassem contra a personalidade internacional, a estrutura e
segurança do Estado, a ordem social e a organização do trabalho (LEX – 1946: 204)
Esta defesa, fazia parte da cooperação com os órgãos policiais dos Estados e
Territórios. No âmbito local previa ainda seis delegacias especializadas: Defraudações
e Falsificações, roubos e furtos, costumes, tóxicos e mistificações, jogos e diversões,
vigilância e menores, além de 30 distritos policiais. Ficaram subordinados ao DFSP o
Instituto Felix Pacheco e Médico Legal, além de outros órgãos administrativos.
Boris Fausto exemplifica esta legislação relacionando o “crime” vadiagem que
poderia ser processado concomitantemente pelas delegacias de Defraudações, roubos e
furtos e vigilância.
Neste sentido o período denominado democrático não deixava margem para a
não-criminalização, conquanto “vadios” se enquadravam em qualquer “setor” da polícia
vedando a possibilidade de justificativa de liberdade e democracia. Criminalizar e
seguindo justificativa de quaisquer setores da polícia se relacionava com procedimentos
e organização cada vez mais centralizada ( REZNIK, 2004).
Num Boletim Reservado da polícia política em 1953, sobre a Conferência
Nacional dos trabalhadores Agrícolas, um agente do Serviço Secreto, alertava as
autoridades:
“Os comunistas de São Paulo estão desenvolvendo intensa doutrinação aliciatória,
objetivando a mobilização dos camponeses para uma Conferência Regional;
programada para 5 e 6 de agosto em São Pulo.
Neste manifesto, os vermelhos se dirigem aos assalariados agrícolas e aos camponeses
sem terra ou possuidores de pouca terra, convidando-os que elejam representantes...
Estão sendo conduzidos pelos vermelhos com visíveis possibilidades de completo
desmantelamento de nossa agricultura com caráter de certa gravidade”(Relatório de
assuntos indexados em microfilme, Fundo DPS – Série Fichas Verdes”, Microfilme 34)
O trabalho de ação da DPS foi aumentado, infiltrando policiais, bastante
utilizado neste momento como pudemos observar na documentação em que este agente,
ao escrever um “boletim”reservado” que fazia parte do “serviço secreto” descreveu a
“mobilização de camponeses” enquanto “doutrinação aliciatória”, mostrando inclusive a
padronização de diversos tipos de denominações muito próprias quanto ao preconceito,
ao se remeter a organização camponesa e aos comunistas.
O “Serviço Secreto” já estava inserido na organização policial em 1955, quando
o DFSP passa por uma reestruturação. Algumas destas atribuições já utilizadas pela
polícia política são consolidadas com o Decretoi-lei n. 37.008 de 08 de março de 1955
E passam a ser exercidas por duas delegacias: Delegacia de Segurança Politica e
Delegacia de Segurança Social. O objetivo era “ exercer o controle de todas as
atividades que visem a perturbação da ordem política e social;” e ainda “ velar pela
estabilidade das instituições nacionais
Dessa vez, os serviços especializados ganharam função: o Serviço de
Investigação com atribuição de “vigilância permanente dos locais, pessoas e instituições
suspeitas”. E o Serviço de Informação “a quem compete as atividades internas como
administração do órgão, processamento de informações, elaboração de códigos,
controle de correspondência e arquivamento da documentação.” ( REZNIK &
GUERRA, APERJ, 1993). Cartório e xadrez especial completam o serviço. Dando
suporte as delegacias, destinavam ao recolhimento das pessoas presas ou detidas. “Neste
momento, ao DSFP competia quer execução das tarefas de polícia na cidade do Rio de
Janeiro, quer o papel de órgão federal de inteligência, traçando diretrizes,
centralizando procedimentos e informações de outros estados.”( REZNIK &
GUERRA;1993)
O papel da polícia e o Governo de Carlos Lacerda
Neste contexto, vale indicar aqui, outro elemento dessa conjuntura no Rio de
Janeiro. A mudança da capital federal para Brasília e a criação de um novo Estado –
pela Lei n. 3.752, de 14 de março de 1960-, possibilitou à UDN disputar as eleições
previstas para outubro seguinte. Esta campanha assumiu, na Guanabara, as
características de uma disputa entre forças pró e antilacerdistas. (Dicionário
CPDOC,Verbete Lacerda, Carlos, 1722-1723: 1984)
Neste caso, a questão ideológica merece destaque, pois este documento pertence
aos arquivos das polícias políticas, e em poder deste órgão servia não aos limites
institucionais da União, mas aos interesses políticos do então Governador Carlos
Lacerda. O governador Carlos Lacerda, mantinha íntimas relações com a polícia política
e também com a guarda florestal, pois à ele estava vinculado.
Como podermos observar no Relatório enviado pela inspetoria Regional
Florestal no Estado do Rio de Janeiro à DPS :
“(...) em Tinguá foi constatada a invasão de reservas florestais protetoras de
mananciais que abastecem o Estado da Guanabara e várias cidades do Rio de
Janeiro. Tendo já tomado as medidas cabíveis junto às autoridades policiais daquele
município.”( APERJ, Fundo Polícias políticas, Setor Geral)
Podemos perceber este vínculo quando o inspetor florestal defendeu a expulsão
de lavradores com o argumento da defesa da reserva florestal. Ao atentar para a opinião
do agente, criticando a ação da União, que só teria “expulsado lavradores sem prendê-
los” não nos deixou dúvidas que este órgão era instrumentalizado pelo então
governador da Guanabara, Carlos Lacerda.
Este caso está ligado ao poder político do Estado da Guanabara que ainda
mantinha um vínculo forte como Distrito Federal, recém transferido para Brasília neste
contexto, aumentando as lutas institucionais que vieram a se agravar neste período entre
o Presidente João Goulart e o Governador Carlos Lacerda.
Com a eleição de Carlos Lacerda como governador do Estado da Guanabara e a
transferência da capital federal para Brasília em 1960, nem todos os órgãos federais se
transferiram, este foi o caso da Divisão de Polícia Política e Social – DPS - que optou
pela permanência no Rio de Janeiro. As funções da polícia não foram alteradas. O
Estado da Guanabara continuou centralizando as informações de ordem política e social
vindas de outros estados.
Em 1963, foi criado o DOPS - Departamento de Ordem Política e Social,
subordinado a Secretaria de Segurança Pública de acordo com a lei n. 263 de 24 de
dezembro e organizado de acordo com o decreto “N” n. 28, de 15 de junho do mesmo
ano. Esta regulamentação em 1963, compreendia os serviços Técnico, de Investigações,
de Operações e de fiscalização de Armas e explosivos, cada qual possuindo diversas
seções.
Aliando a questão do conflito entre Lacerda e João Goulart, o contexto deste
período se referia inclusive a questão de que, o Rio de Janeiro deixou de ser capital do
Brasil, transferida para Brasília. Como algumas instituições importantes continuaram a
fazer parte do Rio de Janeiro e a maior parte do efetivo policial por aqui, sob o governo
de Carlos Lacerda, não mediu esforços para tornar o Rio de Janeiro um palco da cena
política de conflitos com o então Presidente João Goulart.(MOTTA, 2000)
Coincidência ou não, razões “subversivas” não faltaram ao primeiro governador
do Estado da Guanabara, nem à DPS e posteriormente o DOPS, para continuidade e
aumento da repressão política no Rio de Janeiro. Em outras palavras, a ação das
polícias políticas, na conjuntura da crise institucional decorrente da ascenso do
trabalhismo na figura do presidente João Goulart, vinha bater de frente com os
interesses da oposição personificadas em Carlos Lacerda.”( REZNIK &
GUERRA;1993)
Além disso, o contexto internacional do pós-guerra e a idéia do perigo
“vermelho” caíam como uma luva com as propostas do governador da Guanabara de
impedir este perigoso “credo” de entrada no Brasil. A questão das elites se pautava no
corte monopolista da economia brasileira com a exclusão das classes dominadas.
(ROZENTINO, 339:2011)
Por outro lado, a exclusão do campo e a necessidade de reformas reivindicadas
pelos movimentos sociais pressionavam o presidente João Goulart, que por sua vez as
utilizavam como queda de braço no jogo de forças contra o governador Lacerda e
alguns setores civis e militares golpistas. .
Isto se torna evidente num relatório enviado ao Diretor da DPS e ao Chefe de
polícia da DSFP, que se referia a “greve do plebiscito” que mobilizou a sociedade na
escolha entre presidencialismo e parlamentarismo, quando esta última forma de
governo diminuiria o poder de Jango enquanto presidente. O movimento sindical já se
posicionava ao lado de João Goulart. Além das reivindicações específicas das
categorias, destacava-se a importância da defesa do plebiscito com a garantia de João
Goulart governando e na defesa de seus ministros com o fim de pressionar o
Congresso, que por sua vez, se opunha ao presidente.
Esta greve referenciada na historiografia é considerada uma greve de natureza
política, uma das greves de relevância para o movimento sindical, tanto pelo seu caráter
partidário quanto pela dimensão nacional. Leôncio Martins Rodrigues afirma sobre a
referida greve:
“Cumpre notar, entretanto, que em muitos lugares os grevistas tiveram a
cobertura das forças armadas, especialmente no Rio de janeiro, onde o I exército se pôs
ao lado dos trabalhadores contra a polícia estadual controlada pelo Governador Carlos
Lacerda.”
Sobre a mesma greve o autor indica:
“Novamente, os grevistas contaram com o apoio do exército”
E na nota de pé de página reitera:
“ No Rio de Janeiro, tropas do Exército chegaram a deter dois agentes da polícia
estadual e libertar operários presos.”(RODRIGUES, 1983:543)
Diferindo da interpretação de Leôncio Martins Rodrigues, John Foster W.Dulles,
que fora secretário de estado do governo Eisenhower escreve uma obra em dois
volumes sob o título “ Lacerda: A vida de um Lutador”, onde atribui a liberação dos
operários a boa vontade de Lacerda, e por isso destaco:
“ Atendendo a um apelo do Ministério do Trabalho, o governador concordou
com a liberação de cerca de 30 dirigentes, entre eles, Rafael Martinelli, presidente da
Federação dos Ferroviários” ( DULLES, 2000:115)
Entretanto, além da questão da veracidade das interpretações acima referidas, o
documento selecionado da polícia política revela para minha hipótese, faces ainda não
desveladas. A própria natureza da ação da polícia política, o cunho ideológico na ação
cotidiana, trata do confronto aberto entre a polícia política e o I Exército:
“...a greve geral de natureza política que a partir de 12 horas do dia 14 corrente,
perturbou a vida em vários estados da federação, com graves repercussões sobretudo
na Guanabara, poderia ter sido grandemente atenuada nas suas conseqüências não
fosse a intervenção ilegal, violenta, de tropas do I Exército, que deram cobertura aos
grevistas e impediram a ação da polícia política” (Setor Guanabara, APERJ)
Assinado por Cecil Macedo Borer, diretor do DOPS/GB, este confronto
exemplifica que, desde a aliança entre udenistas e os civis-militares golpistas, Lacerda
era um dos agentes desta aliança e que por outro lado, a greve geral se referia a
ascensão do trabalhismo. Aqui fica evidente a tentativa de medir forças com o governo
federal, comprovando, portanto a nossa hipótese de trabalho.
Os conflitos políticos existentes aumentavam conforme as contradições de
projetos de ambos os lados, com a instrumentalização da polícia política pelo lado de
Lacerda, com ações de repressão cada vez maiores no Estado da Guanabara, em relação
as manifestações que tivessem cunho oposicionista e (pró-janguista), que por sua vez
se instrumentalizava também com os movimentos sociais.
Assim os ânimos da polícia política, ligado ao governador , se acirraram visto
este relato sobre as ações do I Exército legalista, apoiador de João Goulart.
Observa-se aqui a forma como a polícia política se refere:
“ A interferência ilegal do I Exército se processou em três casos...na Radio Mayrink
Veiga, quando uma patrulha do Exército e outra do corpo de fuzileiros navais
impediram que o comissário José Lúcio e policiais que com ele estavam a serviço do
DESP, cumprissem sua missão...aconselhando-os que fossem à presença do tenente
coronel Donto Machado, do I Exército, o que foi feito, sendo os policiais instados a
afastarem do local” (Setor Guanabara, APERJ)
A autoridade da polícia ficou abalada por força das tropas militares, além de
afetar moralmente, desqualificando a ação da polícia política, defendendo-se com a
acusação aos militares de deixar livre a ação dos comunistas, ficando evidente a
tentativa de medir força e desestabilizar o governo federal. O terceiro momento da ação
do I Exército evidencia esta relação, reforçada com as próprias palavras do diretor do
DOPS, Cecil de Macedo Borer:
“... o terceiro caso de maior gravidade revelou o conluio , entre esses
elementos do I Exército e as autoridades do Ministério do Trabalho . Foi a
diligência realizada no CNTI. A DPS sabia de antemão da reunião de
emergência da entidade com líderes comunistas, o detetive Simas para lá se
deslocou, ( todos com antecedentes nesta divisão em face de suas atividades
em prol do credo vermelho) (...) conseguiu deter os cabeças com exceção do
Deputado Hécules Correia dos Reis ( imune)” (Setor Guanabara, APERJ)
É possível verificar a tentativa de registrar sua eficiência nesta ação, da polícia
política( apesar de totalmente fracassada).Entretanto o “conluio” referido pela polícia
política entre as tropas do I Exército e da União, dá o tom do conflito com dimensões
políticas em que a polícia sabia informar e também agir, tentando deter qualquer
movimento de oposição ao governo Lacerda. Após descrição de todos os integrantes do
comando de greve, o documento registra a desmoralização que sofreu a polícia política
naquela ação, e o tom emocional anti janguista nos ajuda a confirmação da hipótese da
instrumentalização da polícia política pelo governo Lacerda:
“ Já estavam todos recolhidos ás viaturas da polícia para serem trazidos à
DPS, quando surgiu o capitão Hermes da Fonseca da polícia do I
Exército(...), impedindo seu deslocamento e exigindo a libertação dos
detidos(...) Autoridades do Exército chegaram: grevistas soltos sob aclamação
dos mesmos”(Setor Guanabara, APERJ)
Em função da leitura acerca da divisão no interior do exército como uma das
causas da crise política que iria se agravar com o golpe, esta divisão e a possibilidade
de instrumentalização da polícia por um lado foi que resolvi percorrer esta
documentação e encontrei com carimbo “reservado” a solicitação de informações
sobre possíveis “ subversivos” dentro da corporação. Esta solicitação foi direcionada
ao diretor do DOPS. A relação entre a polícia política e uma fração do exército nos
inclina observar a instrumentalização dos respectivos governantes de então a cerca das
possibilidades de governabilidade, principalmente pautada na coerção e criminalização
principalmente no governo de Carlos Lacerda: Este foi o caso da punição do I e III
exércitos e do golpe civil-militar em 1964 com a participação mais que comprovada de
civis, como o próprio governador e suas respectivas alianças.
A atuação das “Ligas” e dos movimentos sociais nos arquivos das polícias políticas
Quanto ao surgimento das Ligas Camponesas, tem se atribuído ao ano de 1955
a sua fundação com a liderança de Francisco Julião. Embora seja correto afirmar o
papel preponderante assumido pelas Ligas Camponesas a partir de 1955, foi possível
verificar nos arquivos das polícias políticas que as características destas organizações
se diversificaram ao longo do tempo, e que esta organização tem precedentes já em
1945 de acordo com a bibliografia pesquisada, e desde 1930 nos arquivos das polícias
políticas.
Trabalhando com a hipótese de que, no contexto em que a DPS agiu e
organizou-se através de sua respectiva organização e seu padrão de ação, é que foi
possível verificar na documentação pesquisada, os planos de ação da polícias políticas
com seus respectivos atributos a quem quer que fosse, ou se aproximasse de militantes
sociais. Assim eram acusados de comunistas, e se fossem comunistas, foram ou seriam
investigados como criminosos e logo aprisionados e/ou mortos nos planos de ação das
mesmas. É possível aferir esta hipótese com a documentação trabalhada.
A hipótese da polícia investigativa está relacionada a incorporação da mesma
na instituição policial. Este setor das polícias políticas era formado a partir nos setores
de investigação e tinham como tática de ação, a infiltração no interior dos movimentos
sociais. Eram policiais que se passavam por militantes sociais ou comunistas no interior
das organizações que aqui podemos identificar nos relatórios escritos aos seus
superiores em seus respectivos setores. Aqui selecionei um relatório de investigação, da
Seção do Serviço Secreto da polícia política:
“ Liga dos Camponeses do Distrito Federal
Em 24 de Junho de 1946 Boletim da S.S. – Realizou-se ontem na Estrada do Gabinal,
Número 54 Jacarepaguá, a segunda reunião da liga acima. Estiveram presentes, além
de seus organizadores, que são em número de 54 lavradores, e pequenos sitiantes do
local, os senhores Gregório Bezerra e Pedro Coutinho Filho, que usaram da palavra. A
reunião teve por finalidade principal um debate entre os camponeses e seus
orientadores com o objetivo de troca de impressões sobre a situação efetiva de despejo
por parte de pessoas que se dizem proprietárias de terras em que as mesmas estão
localizadas há vários anos” (Série Fichas Verdes, microfilme 35, APERJ)
Foi possível verificar a preocupação da polícia política em assinalar todas as
informações que fossem úteis ao aprofundamento da investigação, como o nome das
lideranças, o lugar de reunião, o número de pessoas, o objetivo da reunião. Sobre “as
pessoas que se dizem proprietárias” para a polícia política era preciso considerar a
referência preconceituosa em relação as classes menos favorecidas, considerados
criminosos em potencial; e como supostos “orientadores”, os militantes que eles
identificavam como “comunistas” para justificar a repressão; característica muito
própria das polícias políticas neste período.
É possível verificar esta característica nos documentos das polícias políticas:
“Departamento Federal de Segurança Pública-DFSP
Os dirigentes vermelhos incumbidos de orientar o desencadeamento das lutas no campo
entregam-se às mais intensas atividades e estão subordinando seu plano de ação a uma
propaganda orientada no sentido de convencer aos trabalhadores da gleba, da
excelente oportunidade que se lhe enseja com a época das colheitas para imporem
suas pretensões. Os asseclas de Prestes infiltrados nos meios mais densos e, ao mesmo
tempo, nos mais estratégicos núcleos camponeses espalhados pelo território nacional,
conclamam à ação os elementos já politizados, catequizam, dentro dos postulados
bolchevistas, os campônios ignaros; arregimentam, acenando-lhes com promessas
falazes, os descontentes para, finalmente induzi-los a paralisar os trabalhos, sabotar e
si necessário destruir as safras” (Movimento Camponês, Inventário Preliminar,
DPS,APERJ, 2003)
É possível observar como esta característica do pensamento da polícia política já
fortemente institucionalizada, absorvida pela sociedade, já considerava camponeses
ignorantes; e se organizados, comunistas e inimigos de toda a Sociedade.
Outro aspecto importante, no sentido de observar a organização dos camponeses
em “ligas” antes de 1955 é o período que segue a interrupção da Ditadura Vargas,
“pelo fato de não se poder superar esses rígidos limites institucionais, a
única possibilidade residia em atuar dentro do âmbito do código civil, o
mesmo que admite a organização de associações de caráter não
especificamente trabalhista. Neste caminho operaram os ativistas do Partido
Comunista, realizando entre 1945 e 1947, uma grande e organizada
mobilização de trabalhadores agrícolas em quase todos os estados
brasileiros. Fundaram-se , então , centenas de Ligas Camponesas, que
reuniam milhares e milhares de pessoas.”(STEDILE, 2002:2)
O nome “ligas” passam a ser denominadas também como organização não só
de camponeses, mas de outras organizações da sociedade civil, devido a proibição da
livre organização, principalmente nas cidades. Daí diversas organizações em “ligas”
foram encontradas, incluindo os militantes do Partido Comunista até “ligas” de
comércio. Neste sentido é que os camponeses também encontraram um meio de
militância política, na tentativa de driblar as dificuldades que a ditadura havia deixado,
quando os camponeses eram vistos como agentes políticos passivos, que deveriam
sofrer a ação benfeitora do Estado sem ocuparem a cena política como protagonistas,
incorporando-se numa ação política imaginária, daí organizaram-se de forma
diferenciada das organizações trabalhistas vinculadas ao poder estatal. (LINHARES &
TEIXEIRA, p.111:1999)
Dando procedimento a esta afirmativa, encontramos na documentação
pesquisada, não só as “ Ligas” Camponesas neste período, mas também no período
anterior, quando só no ano de 1930 foi possível verificar e enumerar 99 organizações
em “ligas”, sendo que entre as 99 organizações havia Liga de Emancipação Nacional,
Liga em defesa das Liberdades democráticas, Liga Udenista Feminina Pró Eduardo
Gomes, Liga pela oficialização do jogo, entre outras. Entre as 99 ligas incluindo as
citadas, haviam 10 Ligas Camponesas no ano de 1930.( Relatórios de Assuntos
Indexados em microfilme-Fundo DPS- Série Fichas Verdes)
O número de camponeses organizados nas Ligas aumentou principalmente a
partir de 1945, chegando a milhares de camponeses, que sem acesso a terra, diante da
expulsão do campo de milhares de camponeses neste período, a isto se somou uma forte
repressão policial, que a mando do Estado, arbitrava os conflitos no campo, ou através
dos partidos aliados com forte base eleitoral dos grandes latifundiários como o PSD e a
UDN (STÉDILE, 2002:12)
Assim, o deslocamento da repressão para o campo pôs fim as Ligas
Camponesas em 1947. Mas os camponeses deixariam sua semente que iria ser força
política no campo em 1955 devido a não resolução do problema da posse da terra a
partir de uma Reforma Agrária, com a divisão da terra entre os que nela trabalhavam.
Com conflito de terras neste período em quase todo o país envolvendo as Ligas
Camponesas, alguns acontecimentos marcaram o movimento dos camponeses incluindo
as “Ligas” dessa época. No caso do Paraná, desde 1946, 1500 famílias de posseiros
habitando terras devolutas em Jaguapitã, passaram a sofrer o problema do despejo,
porque o governo cedera terras já ocupadas por grandes proprietários. Despejos
violentos levaram a formação de grupos armados que resistiam ou atacavam fazendas.
Havia confronto com a polícia. A situação se agravou quando o governo envolvido com
negociatas de terras, procurou os camponeses de Jaguapitã e ofereceu outras terras no
rio Paranauí com casa e transporte, sem que esta promessa fosse cumprida. A isto
somou-se a Revolta dos Lavradores de Porecatu, outra importante manifestação
camponesa localizada na margem esquerda do curso médio do rio Paranapanema, que
divide São Paulo e Paraná, próximo a Jaguapitã, onde a situação era idêntica. Desta vez,
o governo pretendia desenvolver um projeto de colonização de terras. Muitos
camponeses para lá se deslocaram abrindo posses. Mas o governo traficou terras,
vendendo-as para outras pessoas. Nos últimos meses de 1950, devido a ação do PCB e
seus comitês regionais em Londrina do Paraná, Presidente Prudente , e Assis em São
Paulo, explode a Guerrilha de Porecatu com a liderança de José Billar. Esta guerrilha
teve duração até 1951. Os camponeses foram desarmados pela polícia. (MARTINS, 73-
74: 1999) Além da forte repressão, a investigação policial seguia esses mesmos passos.
Foi possível verificar a ressonância destes conflitos nos fichários microfilmados
das polícias políticas na Liga Camponesa Estrela de Centenário, no Paraná:
“Anotações : Comunista
Em 09/04/51Boletim reservado número 62- Com intuito de hipotecar
solidariedade aos trabalhadores rurais de Porecatu, na luta que eles
empreenderam para se manter nas terras que exploram , a liga acima acaba
de divulgar uma manifesto em sua defesa” (Microfilme 34, série fichas verdes,
Fundo DPS, APERJ)
É possível verificar que as ligas não se organizavam só no campo, mas também
se espalhavam por diversas outras cidades e solidarizavam entre si. A polícia política
estava atenta e infiltrada. O resultado desta luta política do movimento social de
Porecatu foi que a partir de 1951 houve disposição de um novo governo em Porecatu
resolver a situação, e, pela primeira vez no país foi declarado que as terras seriam de
utilidade pública para desapropriação por interesse social. No entanto, isto foi feito com
mais de 300 camponeses armados, que foram desarmados por 250 homens da
polícia.(MARTINS, 1990:74)
Como fruto da organização das Ligas Camponesas, outra manifestação
camponesa destacamos:
“Liga dos Camponeses da Alta Sorocabana- São Paulo:
Em 24/03/49 – Boletim S/S- os comunistas fundadores da epigrafada, no dia
21, surpreendidos pela polícia em uma reunião clandestina na sede de uma
cooperativa em Santo Anastácio, recebeu-a à bala, dando lugar a um
prolongado tiroteio, no qual resultou saírem feridos cinco policiais, dentre os
quais, um Cabo da força pública, que já faleceu.”
Foi possível verificar no documento selecionado, o nível de tensão no campo já
em 1949, e ainda, a ação violenta da polícia ao supor uma reunião comunista por si já
merecia ser destruída, sem dar conta do outro lado, ou seja, de quantos camponeses
feridos ou mortos houveram, deixando nos transparecer, o papel ideológico da polícia.
A Revolta de Trombas e Formoso levou também a uma importante experiência
de conquista do movimento social organizado no campo, que teve duração de 1948 até
1964.
Sobre este importante episódio do movimento social do campo, foi possível
verificar um momento do conflito em Trombas e Formoso no olhar da polícia política
e confrontar o relato da polícia com a bibliografia atualizada sobre o assunto
(MARTINS, 1990:72)
Num conflito entre fazendeiros e camponeses em Goiás, desde 1948 se delineia
a Revolta de Trombas e Formoso. Com a construção da Estrada Transbrasiliana, as
terras do então município de Uruaçu se valorizaram. Esta estrada iria fazer parte da
futura Rodovia Belém-Brasília, iniciada a construção da capital em 1956.
Neste confronto, José Porfírio, posseiro de terra, liderou o confronto com os
fazendeiros. Jagunços foram lançados sobre os camponeses. Vencida a primeira batalha,
os fazendeiros começam a grilagem em 1952. Foram feitas tentativas de transformar
posseiros em parceiros como ocorria em Minas Gerais na mesma ocasião,
empobrecendo ainda mais a condição social dos camponeses. Encontrando resistência,
mulher e filho recém nascido de José Porfírio são arrancados de casa e a mulher morre.
Em 1954 foram enviados para a região 4 militantes do PCB. Os camponeses se
organizaram e se armaram contra os jagunços e fundaram a Associação dos
Lavradores de Trombas e Formoso. Em 1957, o governo do Estado enviou agentes para
combatê-los.
Nos arquivos das polícias políticas, um telegrama datado de 25/03/57 do
Secretário do Estado de Segurança pública de Goiás, endereçado ao General Augusto
Magessi, o remetente tenta acalmar os ânimos do General diante do conflito instalado
na cidade divulgado na então capital do país, o Rio de Janeiro:
“Cumpre-se levar conhecimento vossência, tendo em vista as alarmantes
notícias veiculadas pela imprensa carioca, sobre ocorrências policiais
registradas nas proximidades dos povoados denominados Trombas e Formoso,
município de Amaro Leite, neste Estado, cujas notícias tendenciosas foram
dadas por adversários do governo com intuito exclusivo de exploração
política, esclareço a Vossa Excelência , abém da verdade, que nada há de
grave a respeito naquela região. Atendendo a solicitação do delegado de
polícia do município de Amaro Leite, terminei o envio para aquela localidade
um reforço policial sob comando do segundo tenente Joseh Pinto sobrinho,
afim de apurar em inquérito policial, os responsáveis pelos homicídios
praticados pelos comunistas José Porfírio, Joseh Firmino e Joaquim Limaro,
os quais chefiam o bando armado de comunistas, inocentes lavradores, estes
posseiros de terras naquela região.”( Fundo Polícias Políticas, setor Estados,
2)
O Secretário de polícia descreve então, o feito policial, fazendo mais uma vez
a sua versão fria e unilateral sobre o conflito:
“A caminho esta tropa foi atacada, de tocaia, cerca de seis quilômetros do
povoado de Trombas por uma grupo de homens, armados de fuzil, mosquetão
e carabinas, havendo troca de tiros...”
Mesmo se configurando um conflito, com a “troca de tiros”, o Secretário
tentava minimizar o problema naquela região:
“...resultou a perda de um policial, ignorando-se o número de vítimas dos
atacantes comunistas, que conseguiram evadir levando os prováveis feridos
para o interior de uma vasta floresta ali existente. Diante disto, e atendendo o
pedido do Juiz de Direito da Comarca de Porangatu, município vizinho
daqueles povoados, que teriam novos assaltos, outros reforços foram enviados
por via terrestre e em aviões do Estado. As últimas notícias trazidas ao meu
conhecimento hoje, pelo Delegado Juvenal Campos Amaral, da Ordem
Política e Social que havia seguido para as referidas localidades por minha
determinação, informava que em toda a região foi restabelecida a ordem e a
tranqüilidade públicas...”(Setor Estados 2)
E após longo relato, o secretário supõe tratar de conflito entre grileiros e
posseiros, cabendo tal conflito ser arbitrado pelo Estado, tratando-se, no caso, de terras
devolutas e pertencentes ao Estado.
Como parte do ethos da polícia política, aliava lavradores a comunistas, e dessa
forma, justificava a ação de repressão:
“...quase todos lavradores, os quais estão insuflados por elementos comunistas
contra particulares que alegam serem proprietários das referidas terras...
Determinei ao delegado da ordem política e social a abertura competente de
inquérito policial, afim de apurar os crimes praticados pelos elementos
comunistas, em conformidade com a lei que define crimes contra segurança
nacional. Cordiais saudações, Dr. Iracy José Gomes ( Secretário do Estado
de Segurança Pública.”
A partir da documentação de um momento tenso do conflito no município de
Trombas e Formoso descrito por um agente da polícia política pode nos reafirmar a
dimensão que este conflito teve, a sua importância para História da luta camponesa,
devido o seu nível elevado de enfrentamento, além da reafirmação da forma truculenta
da ação da polícia política.
Isto se confirma nos desdobramentos deste conflito, que, no mesmo ano foi feito
acordo de permanência dos posseiros em troca de voto para o então governador do
Estado, Pedro Ludovico, na sucessão do governo para seu filho Mauro Borges.
Daí até 1964 Trombas e Formoso se constituiu território liberado, com governo
próprio, facilitando a criação do município de Formoso com José Porfírio Deputado
Estadual.
Mas esta liberdade duraria pouco com o golpe de 1964, tendo os líderes fugidos
e presos, e em 1970 torturados. José Porfírio foi preso em 1972 no Maranhão durante
combate na Guerrilha do Araguaia. Solto em 1973, desapareceu, havendo suspeita de
seqüestro e assassinato (MARTINS, 1990:73).
Com isso, foi possível constatar a presença de organizações em ligas
Camponesas antes de 1955, que demonstram a repressão no campo antes deste período
e ainda, que havia outras formas de organização em ligas que não eram
necessariamente o das Ligas Camponesas fundadas em 1955 a partir de documentos
nos arquivos da polícias políticas.
Conclusão:
Sem presunção de concluir todas as pesquisas sobre polícias políticas e os
movimentos sociais e de quem está no primeiro semestre do mestrado, ou reiniciando
esta pesquisa, segue aqui algumas conclusões preliminares com as hipóteses propostas
aferidas neste artigo.
Se por um lado a divisão intra-elites acirrava a luta institucional e ampliava a
ação das polícias políticas, é possível perceber que os movimentos sociais atuavam na
trincheira das instituições de controle destes movimentos. Por um lado, foi possível
verificar de que forma as polícias políticas agiam em relação aos governos num período
democrático em que estas instituições tentavam um controle com repressão cada vez
maior. Por outro lado, a criação e fundação de ligas permitiam que estas se
movimentassem e tivessem algumas vitórias significativas neste período apontando
possibilidades de reforma agrária e atuação política mais ampla e que estas
organizações foram experimentadas, passaram por mudanças e amadurecimentos.
Enfim, num país marcado por sucessivos governos com características
autoritárias, ainda assim sempre contou com muita disposição de luta por justiça,
dignidade, igualdade e liberdade política. As diversas organizações, os movimentos
sociais em geral nem sempre tiveram oportunidade nem direcionamento que facilitasse
suas lutas. Ainda hoje, depois de muitos anos de ações, temos negros, mulheres,
analfabetos, camponeses sem-terra e a população pobre em geral, brigando para
conquistar direitos básicos. Aliado a esta luta, precisa-se ter acesso a memória de muitos
lutadores e lutadoras ainda guardados nos porões da História do Brasil. Esta tem sido a
tônica da luta pelo acesso ao conhecimento da História de um outro Brasil.
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