ConsideraçõEs Sobre A Sexualidade Do Autista Com A

Post on 06-Jun-2015

9.131 views 4 download

description

Resumo: Na nossa sociedade a deficiência é compreendida como uma diferença que representa desvantagens sociais e, neste sentido, costuma-se generalizar as limitações impostas por ela a vários aspectos da vida, incluindo a sexualidade. Compreendemos por sexualidade um conceito amplo que engloba, além do sexo, os sentimentos, afetos, concepções de gênero, entre outras manifestações relacionadas, que correspondem a diferentes formas de expressão humana e envolvem representações, emoções, desejos, erotismo, sentimentos de afeição e amor, etc. Todos nós, deficientes ou não, estamos sujeitos a sofrer discriminação, pois ela é predominante na nossa sociedade, mas a condição da deficiência multiplica a discriminação. Se a questão da sexualidade freqüentemente é tratada enquanto um tabu em nossa sociedade, esse assunto ainda se polemiza mais quando discutimos as manifestações da sexualidade em pessoas com deficiência. Sobretudo para os autistas, as manifestações amorosas e as sexuais eram inaceitáveis até pouco tempo atrás porque se julgava que estas pessoas, muitas vezes, eram assexuadas e, portanto, estas suas capacidades foram subestimadas e foram infantilizadas. Infelizmente, ainda a mídia retrata de forma especulativa, cômica, estereotipada e pouco esclarecida exemplos de algumas pessoas autistas. E a intenção não é das piores, não apresentar o amor e os sentimentos seria equivalente a uma tentativa de protegê-los de se frustrarem emocionalmente, adquirem doenças sexualmente transmissíveis, etc. Infelizmente, no Brasil, o deficiente e suas necessidades ainda são freqüentemente ignorados, posto que a evolução da sociedade não fosse suficiente para afastar a exclusão e as dificuldades experimentadas. Então, numa sociedade na qual se busca o arquétipo do homem ideal, a pessoa deficiente é ignorada e excluída, e resta ser confinada na própria família ou em uma instituição, na qual partem da premissa "o que os olhos não vêem o coração não sente". Um dos temas a que muitas vezes são afastados as pessoas deficientes é o amor e a sexualidade.Neste curso, será focado o autista diagnosticado com a Síndrome de Asperger e associado a esse tema os relacionamentos amorosos e a sexualidade que são tidos como um tabu para essas pessoas. Neste mini-curso seu proponente chamará atenção para os insidiosos mecanismos que não permitem que a qualidade de vida no que concerne ao amadurecimento emocional dos autistas seja realizada.

Transcript of ConsideraçõEs Sobre A Sexualidade Do Autista Com A

CONSIDERAÇÕES SOBRE A SEXUALIDADE

DO AUTISTA COM A SÍNDROME DE ASPERGER: A

REALIDADE BRASILEIRA

Thiago de Almeida(Psicólogo. Pesquisador da

Universidade de São Paulo – Departamento de Psicologia

Clínica)www.thiagodealmeida.com.br

“Sexo é coisa muito simples. Eu explico os essenciais em poucas linhas. (...) Pra se entender o sexo há de se entender a música que ele toca. (...) A música que o corpo quer tocar se chama prazer. (...) Os instrumentos da orquestra-corpo são os seus órgãos. (...) todos têm uma utilidade. Além disso, esses mesmos órgãos e membros são lugares de prazer. (...) Entre os órgãos da orquestra-corpo estão os órgãos sexuais. Não há nada de especial que os distinguia dos outros. Como os demais órgãos eles são fontes de prazer. Os prazeres do sexo são variados. Vão desde uma sensação muito suave que mais parece uma coceira de bicho-de-pé e que chega a provocar riso, até um prazer enorme, explosão vulcânica, que tem o nome de orgasmo, e que deixa aqueles que por ele passaram semimortos. (...) Mas eles anunciam o fim da brincadeira. (...) Complicados são os pensamentos dos seres humanos sobre ele (o sexo). Os homens por razões que não entendo, passaram a considerar o sexo uma coisa vergonhosa.” (Rubem Alves, 1999)

“O amor não é cego, é autista.ele vê tudo, ele sabe tudo

mas no seu mundo, só ele explica o que se sente.”

Recuperado de: http://images.google.com.br/imgres?imgurl=http://bp0.blogger.com/_vZsvNvA565U/SERjm4e7d3I/AAAAAAAAAZU/87XxbC1PkOI/s320/DSC05931.JPG&imgrefurl=http://conversadeterapeuta.blogspot.com/2008/06/arte-de-autistar.html&h=240&w=320&sz=9&hl=pt-BR&start=36&usg=__q0TAa4CbtcaCHCxN9okB0oMe-GM=&tbnid=A5M3RBNd5JrCEM:&tbnh=89&tbnw=118&prev=/images%3Fq%3Dautista%2Bamor%26start%3D18%26gbv%3D2%26ndsp%3D18%26hl%3Dpt-BR%26sa%3DN

Introdução• Na nossa sociedade a condição da

deficiência é compreendida como uma diferença que representa desvantagens sociais e, neste sentido, costuma-se generalizar as limitações impostas por ela a vários aspectos da vida, incluindo a questão da sexualidade;

• Todos nós, deficientes ou não, estamos sujeitos a sofrer discriminação, pois ela é predominante na nossa sociedade, mas a condição da deficiência multiplica a discriminação.

• Sobretudo para os autistas, as manifestações amorosas e as sexuais deles eram inaceitáveis até pouco tempo atrás porque se julgava que estas pessoas, muitas vezes, eram pessoas assexuadas e, portanto, estas suas capacidades foram subestimadas e foram infantilizadas.

Questionamentos

• O que é a Síndrome de Asperger?

• Em que ela difere do autismo convencional?• Afinal o que é a sexualidade?• Como é tratada no Brasil a

sexualidade dos deficientes, sobretudo, os deficientes mentais?

Síndrome de Asperger (SA): características: etiologia e

prevalência • Definição - Um dos Transtornos

Abrangentes do Desenvolvimento que difere clinicamente do autismo em relação ao comprometimento cognitivo e de linguagem mais leves, o que permite aos seus acometidos, uma melhor adaptação social.

CaracterísticasEm se tratando da dimensão lingüística algumas características merecem ser destacadas:

• hiperlexia;• a linguagem exibida é

notadamente artificial e pedante;

• Geralmente possuem algum interesse específico excessivo e podem se tornar especializadas em alguma área de interesse.

Prevalência• Autismo comum: taxa de 4 a

cada 10.000 crianças;• Síndrome de Asperger:

(estimativa) de 20 a 25 por 10.000.

• 4 X 1• No Brasil existam

aproximadamente 600 mil pessoas afetadas pela SA.

Contribuições ao longo do tempo para o

entendimento da Síndrome de Asperger

• Bleuler, em 1911, criador do termo autismo;

• Léo Kanner (1943) e as 11 crainças com o que ele chamou de Léo Kanner

• Hans Asperger (1944) e a questão da ‘Psicopatia autística’;

• Lorna Wing –1981 – e a questão do "espectro autista“ (Wing, 1988)

Dr. Eugen Bleuler

Léo Kanner

Hans Asperger

Lorna Wing

O que é sexualidade?

Sexualidade é um conjunto de processos inter-relacionados que permeiam toda a existência humana e está presente em todas as fases da vida e permeia a forma como cada um lida com a afetividade, com sua capacidade de entrega, com sua comunicação interpessoal e a maneira com a qual cada pessoa lida com ela mesma e com o outro.

A sexualidade do autista com a

Síndrome de Asperger • Sexualidade não é sexo!• Sexualidade um conceito amplo que

engloba, além do sexo, os sentimentos, afetos, concepções de gênero, entre outras manifestações relacionadas, que correspondem a diferentes formas de expressão humana e envolvem representações, emoções, desejos, erotismo, sentimentos de afeição e amor, etc.

Mitos da sexualidade do deficiente

• Denari (1997) discute a respeito dessa polarização que se cria ao se tratar da sexualidade do deficiente, e especialmente o que está na fase da adolescência: ou ele é considerado ser hiperssexualidado ou assexuado;

• A concepção de que as pessoas com alguma deficiência, e aqui especificamente os autistas, também possam manter relações afetivo-sexuais não é culturalmente muito aceita, preferindo-se ignorar e fazer desaparecer do imaginário coletivo tais manifestações para seus acometidos (Almeida, 2008).

Talvez, então, boa parte dos conflitos existentes entre esses dois mundos, pode estar relacionada à falta de informação. Dessa forma, diversos são os desafios para pessoas com algum tipo de deficiência para o exercício positivo de suas sexualidades, além da questão de uma comorbidade orgânico-cognitiva e do preconceito social a ela atrelado (Almeida, 2008; Almeida & Assumpção Jr,2007).

• E a intenção não é das piores, não apresentar o amor e os sentimentos seria equivalente a uma tentativa de protegê-los de se frustrarem emocionalmente, adquirem doenças sexualmente transmissíveis, etc. Infelizmente, no Brasil, o deficiente e suas necessidades ainda são freqüentemente ignorados, posto que a evolução da sociedade não fosse suficiente para afastar a exclusão e as dificuldades experimentadas.

Há que se ressaltar que quando a sexualidade é ignorada, ou ainda negada, e isso contribui para o surgimento de comportamentos sexuais inadequados (Assumpção Jr. & Sprovieri, 1993; Maia, 2006). A negação da sexualidade e a infantilização das pessoas com deficiência colaboram para que estas apresentem dificuldades para se tornar mais independentes, bem como para desenvolverem sua sexualidade e estabelecer outros relacionamentos.

• Embora a sexualidade seja um processo que permeia toda a existência humana, segundo Ferreira (2001), a sexualidade, independentemente de nos referirmos às pessoas com deficiência ou não, é um assunto difícil em nossa sociedade porque é mantida sobre muitos tabus e repressões sociais.

• Quer versemos especificamente ou não na esfera autística, a sexualidade é um dos principais domínios que incitam, sobremaneira, os jovens a criarem uma esfera de autonomia individual relativamente à família de origem (Heilborn, 2006).

• A construção desse espaço privado pressupõe o aprendizado de como se estabelece um relacionamento afetivo e sexual (Bozon, 1993; 2004).

• Não obstante, constitui-se um dos mais ricos e complexos aspectos definidores do ser humano, ainda que não tenhamos uma total clareza da pluralidade de seus componentes psicológicos, biológicos, sociais e culturais que lhe são concernentes (Denari, 1997).

A sexualidade pressupõe formas de pensar, sentir e agir, pertencentes ao ser humano, a forma de se perceber no mundo, de ver o mundo e de interagir com outros homens e mulheres (Becker, 1984; Wüsthof, 1994).

• Ainda que seja socialmente convencionada derivada de um impulso, na verdade, a sexualidade trata-se de um processo dinâmico de aproximação e assim: “reconhecer o significado de estados internos, organizar a seqüência dos atos especificadamente sexuais, decodificar situações, estabelecer limites nas respostas sexuais e vincular significados de aspectos não sexuais da vida para a experiência sexual propriamente dita” (Gagnon & Simon, 1973/2005, p. 13).

Infelizmente, ainda a mídia retrata de forma especulativa, cômica, estereotipada e pouco esclarecida exemplos de algumas pessoas autistas. E a intenção não é das piores, não apresentar o amor e os sentimentos seria equivalente a uma tentativa de protegê-los de se frustrarem emocionalmente, adquirem doenças sexualmente transmissíveis, gravidezes indesejadas.

Por estarmos tratando de seres humanos...

• ...seria mais razoável orientar e não interditar esse processo presente e em andamento.

• Então, pensam os pais e cuidadores: como é possível sentir falta de algo que eles não conhecem, e que talvez nunca lhe venha a pertencer? Contudo, é sabido, que mesmo à revelia da própria vontade e mesmo para as pessoas sem tais condições, os sentimentos e os desejos bailam diante de nós e com eles muitas vezes caímos na emboscada dos afetos e, atordoados, tornamo-nos cativos de nós mesmos, pois todos, autistas ou não, compartilhamos de uma mesma natureza humana. Agora imaginemos essa situação para os autistas que não tem a quem recorrer em seus conflitos e irresoluções no que se refere a estes assuntos?

Considerações finais• O que se constata atualmente,

sobretudo no Brasil é que o que emerge é a desconsideração da possibilidade de um relacionamento físico e amoroso para esta população, a tal ponto que os próprios autistas tornam-se paulatinamente mais enclausurados em um mundo onde haveria, pelo amor, uma possibilidade de se reconectarem ao mundo a sua volta.

• Para o tratamento, via de regra, em um ambiente de educação especial é necessário, que os profissionais devem ser treinados para lidar especificamente estes portadores de necessidades educacionais especiais, portadoras de Síndrome de Asperger. A intervenção deve ser a mais intensiva e precoce possível, realizada por equipe multidisciplinar que inclua psiquiatra da infância e adolescência, psicólogo, neurologista, pediatra, professor, psicopedagogo, fonoaudiólogo e fisioterapeuta, dentre outros.

• Há de se evidenciar que o mecanismo de inclusão não deve se restringir unicamente à inserção de pessoas acometidas por algum tipo de deficiência específica nas escolas regulares e em demais ambientes acadêmicos. De pouco adiantará para as pessoas com necessidades educacionais especiais se instrumentalizarem falando que lhe são tolhidos os direitos de interagir socialmente e colocar em prática, com vista a uma cidadania global, os conhecimentos adquiridos nesses ambientes (Brasileiro, Nogueira Jr. Lourenço & Almeida, 2008).

• Se a questão da sexualidade freqüentemente é tratada enquanto um tabu em nossa sociedade, esse assunto ainda se polemiza mais quando discutimos as manifestações da sexualidade em pessoas com deficiência;

• Sobretudo para os autistas, as manifestações amorosas e as sexuais eram inaceitáveis até pouco tempo atrás porque se julgava que estas pessoas, muitas vezes, eram assexuadas e, portanto, estas suas capacidades foram subestimadas e foram infantilizadas;

• Infelizmente, ainda a mídia retrata de forma especulativa, cômica, estereotipada e pouco esclarecida exemplos de algumas pessoas autistas.

Hoje em dia, proclama-se o direito à diferença, mas verifica-se, muitas vezes, que é praticado o comportamento da desconfiança sobre os diferentes. Como tal, consideramos ser fundamental criar um sentimento de pertença, quer nas pessoas portadoras de deficiência, de forma a sentirem que pertencem a uma sociedade, quer nas pessoas sem deficiência, de forma a possibilitar a integração da pessoa com deficiência, em busca da isonomia que tanto buscamos em nossas práticas inclusionistas.

A todos muito obrigado pela atenção e...

Ao Amor...Sempre!!