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CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ
DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIAREVISÃO E REDAÇÃO
SESSÃO: 160.3.51.O
DATA: 04/09/01
TURNO: Matutino
TIPO SESSÃO: Sessão Solene - CD
LOCAL: Plenário Principal - CD
HORA INÍCIO: 9h
HORA TÉRMINO: 10h04min
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I - ABERTURA DA SESSÃO
O SR. PRESIDENTE (Wilson Santos) - Declaro aberta a sessão.
Sob a proteção de Deus e em nome do povo brasileiro iniciamos nossos
trabalhos.
O Sr. Secretário procederá à leitura da ata da sessão anterior.
II - LEITURA DA ATA
O SR. ......................................................................, servindo como 2°
Secretário, procede à leitura da ata da sessão antecedente, a qual é, sem
observações, aprovada.
O SR. PRESIDENTE (................................................................) - Passa-se à
leitura do expediente.
O SR. .................................................................., servindo como 1º Secretário,
procede à leitura do seguinte
III - EXPEDIENTE
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O SR. PRESIDENTE (Wilson Santos) - Finda a leitura do expediente, passa-
se à
IV – HOMENAGEM
O SR. PRESIDENTE (Wilson Santos) – Esta sessão solene destina-se a
homenagear o centenário de aniversário de nascimento de José Lins do Rego, a
partir de requerimento do nobre Deputado Marcondes Gadelha.
De início, não poderia deixar de apresentar meus cumprimentos ao nobre
Deputado Marcondes Gadelha, autor da iniciativa de realização desta sessão, pelo
que ela representa de enaltecimento à cultura nacional.
O menino de engenho nasceu em 3 de junho de 1901, no engenho da família,
no Município paraibano de São José de Taipu. Foi também num engenho que
cresceria, sob os cuidados do avô materno, à falta da genitora, morta quando ele era
ainda muito pequeno.
Estas as vivências mais remotas de José Lins do Rego: telúricas e
patriarcais. Foi do pano de fundo sustentado pelo trabalho semi-escravo; foi da
ambiência rica em tipos humanos com suas histórias de submissão ancestral; foi do
cenário de pujança e seca, de risos e lágrimas, de lirismo e realidade, de vida e
morte, de privilégios e iniqüidades, de cangaço e senzala; foi, por último, de um
mundo distante para nós, um mundo envolto nas brumas da indiferença do Brasil do
Sul, rico e elitista, que José Lins do Rego extraiu a substância da obra romanesca,
admirável e engajada, não só política como filosoficamente.
O conjunto da obra, assim escoimada, feita de beleza rude, pedra
excepcionalmente burilada, oferece-nos um verdadeiro painel sociológico do
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Nordeste açucareiro, no qual se encaixam ora as tintas da mais inventiva ficção, ora
o traçado autobiográfico magistral. Nesse painel, “Menino de Engenho”, publicado
em 1932, assoma como livro verdadeiramente emblemático, o mais emblemático –
como também o mais conhecido — de todos. Juntamente com “Doidinho”, “Moleque
Ricardo”, “Usina”, “Riacho Doce”, “Pedra Bonita”, “Verdes Anos”, entre outros,
constitui um marco do moderno romance brasileiro.
Entretanto, a obra-prima de José Lins do Rego é, longe de dúvida, “Fogo
Morto”, escrito em 1943. Ali estão retratados os feitos do Capitão Vitorino, figura
quixotesca, que se lança a combater a prepotência dos senhores de engenho, bem
como o arcaísmo de seus métodos, responsáveis diretos pelos equívocos históricos
com que se conduziram os destinos do Nordeste.
A literatura com que José Lins do Rego brindou a cultura nacional impõe-se
como vital pela riqueza humanística, pelo tesouro de idéias, pela densidade
narrativa. Ela é universal e é eterna, porque as coisas de que tratou são invariáveis
no espaço e no tempo: a terra terá sempre o mesmo cheiro, em toda parte; os
indivíduos serão sempre alvo das mesmas injustiças, não importa quando e onde
nasçam; o poder jamais deixará de ser fonte das mesmas disputas, aqui e alhures.
Quem alguma vez teve o prazer de ler José Lins do Rego bem sabe disso.
São essas as palavras da Presidência.
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O SR. PRESIDENTE (Wilson Santos) – Convido a fazer uso da tribuna o
autor do requerimento para realização desta homenagem, o nobre e valoroso
Deputado Marcondes Gadelha. S.Exa. disporá de dez minutos para seu
pronunciamento.
O SR. MARCONDES GADELHA (Bloco/PFL-PB. Sem revisão do orador.) –
Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, quando João do Rego Cavalcanti e sua
esposa Amélia celebravam a chegada de seu rebento naquele 3 de junho de 1901, a
luz do Engenho Corredor, filtrada por rendas e brocados, tocaria a fronte do menino,
distinguindo-o para sempre.
Desde então, estaria iluminando os passos de um dos maiores gênios da
literatura nacional, cuja capacidade e imaginação, perpetuadas em uma canastra de
fábulas e narrativas, vêm encantando o leitor brasileiro há décadas, ajudando a
firmar a Paraíba como um dos maiores celeiros culturais do País nos últimos dois
séculos.
Assim, a viga mestra para fundar qualquer análise ou resenha sobre José
Lins do Rego é essa assimilação da sua vida e das suas obras com as suas raízes
geográficas e familiares, tão variadas e enriquecedoras que são apontadas, por
vezes, como a força elemental que suscitou em José Lins a compulsão de escrever.
Exemplo patente disso é o conjunto de obras conhecido como “Ciclo da Cana-de-
Açúcar”, no qual o autor enfatiza as circunstâncias que rodeiam as personagens da
zona canavieira do Nordeste, conotando-as como produtos do meio e dando-lhes a
mesma forma que ele assumiu a partir da sua própria infância. Infância que se inicia
com os primeiros estudos, no Instituto Nossa Senhora do Carmo, em Itabaiana, na
Paraíba, onde continuava a viver, com muita liberdade, as descobertas e reinações
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descritas com ressonâncias autobiográficas em “Menino de Engenho”. Contudo, logo
o menino José sofreria o seu primeiro choque cultural ao iniciar, em 1912, os seus
estudos ginasiais no Colégio Diocesano Pio X, na capital do Estado. É uma fase de
afastamento do ritmo e modo de vida a que José Lins estava acostumado, mas que,
por outro lado, lhe oferece o primeiro contato com a literatura, que revela
prontamente um ávido e obstinado leitor.
De fato, ele lê muito, especialmente em uma primeira fase os autores
nacionais. Alguns livros o marcam profundamente, como, por exemplo, “O Ateneu”,
de Raul Pompéia, que José desvenda com apenas 15 anos, e “Dom Casmurro”, que
assinala o seu primeiro contato com Machado de Assis, em 1918.
Também no ano de 1918 o autor faz o seu début oficial, ao escrever um
pequeno artigo sobre Rui Barbosa, ao passo em que se inicia nas obras mais
complexas de Rousseau e Stendhal. É dessa forma, mergulhado nesse vasto e rico
universo literário, que José Lins faz a transição entre o moleque que nasceu e se
criou em um Brasil rural e um homem que logo se tornaria um dos maiores escritores
de um País cada vez mais urbano e, paradoxalmente, saudosista.
O novo José Lins começa a ser talhado a partir do seu ingresso na Faculdade
de Direito de Recife, na qual ele se matricula em 1920. Lá começa a freqüentar os
círculos do meio literário e da intelectualidade, onde pontificavam figuras como José
Américo de Almeida e Aníbal Fernandes. Todavia, o maior impacto sobre a linha de
pensamento de José Lins dar-se-ia em 1923, quando Gilberto Freyre retorna de
seus estudos nos EUA e lhe apresenta os seus conceitos sobre a construção da
sociedade brasileira, os quais, anos mais tarde, tornar-se-iam corriqueiros na
temática regionalista das obras de José Lins do Rego.
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A essa altura, José já havia se tornado um homem bastante refinado, de
verve fácil e largo lastro de amizades; algo distante do menino do Engenho
Corredor. Essa mudança se consolida com o diploma recebido em 1923, ano em
que ajudou a fundar (e se tornou colaborador permanente da publicação de política
e literatura) Dom Casmurro, de propriedade de um de seus grandes amigos, Osório
Borba. Então com 22 anos, José Lins iniciava um questionamento particular que
marcaria sua vida por vários anos: enveredar pelo território cada vez mais atrativo
dos romances e artigos, ou seguir carreira dentro do Direito.
Contudo, um ano mais tarde, José Lins se casa com Filomena Massa,
carinhosamente chamada por ele de Naná, filha do proeminente Senador Massa,
que, em troca da mão da filha, exige que José se defina profissionalmente. Dessa
forma, ele decide-se pela magistratura, e em 1925 é nomeado promotor público do
Município de Manhuaçu, em Minas Gerais. Mas José Lins não se adapta às
atribuições do cargo e em 1926 decide retornar ao Nordeste, estabelecendo-se em
Maceió. Desse quase exílio, José traz, apenas, mais influências artísticas. A
principal delas é a do Modernismo, que, junto a Thomas Hardy e Marcel Proust, se
constituem nas leituras preferidas do cada vez mais escritor José Lins do Rego.
A condição de chefe-de-família, porém, demanda de Lins do Rego que ele
assuma outra função burocrática, desta vez como fiscal de bancos na capital
alagoana. Ainda que os deveres do cargo lhe consumam grande parte do dia, José
Lins continua absorvendo e produzindo literatura de forma sistemática e passa a
freqüentar um círculo que incluía virtuoses como Graciliano Ramos e Aurélio
Buarque de Hollanda. Desses profícuos encontros surge a primeira obra de José
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Lins, “Menino de Engenho”, reconhecido como uma obra-prima do romance
nacional.
Apesar dos percalços para o lançamento da obra, ela se transformou em um
grande sucesso de vendas e de crítica. O autor ofereceu os manuscritos à maioria
dos editores nacionais. Mais tarde, com recursos do próprio autor, a primeira edição
foi publicada por uma pequena e desconhecida editora.
Mais de dois mil exemplares foram vendidos no Rio de Janeiro, enquanto o
público paulistano, embora atormentado com uma revolução, esgotou a sua edição
em três meses. As críticas foram igualmente muito boas, a ponto de José Lins ter
dito, anos mais tarde, que chegou a dormir com um recorte de jornal no bolso do
pijama. Era um artigo crítico escrito por João Ribeiro que ressaltava a capacidade
ímpar do paraibano de fazer de suas raízes histórias atrativas e dos recônditos de
sua terra e gente personagens próximos de todo e qualquer brasileiro. Disse João
Ribeiro: “Este livro pungente é de uma realidade profunda. Nada há que não seja o
espelho do que se passa na sociedade rural e na das cidades do Norte e do Sul do
Brasil. É de todo o Brasil e um pouco do mundo”.
Ao receber o prêmio Fundação Graça Aranha pelo melhor romance do ano,
José Lins passa a ser reconhecido também pelo círculo literário do Sul do País e
aumenta a ansiedade pela chegada do segundo volume do Ciclo da Cana, o
romance “Doidinho”, lançado pouco mais de um ano a seguir.
Ainda em Alagoas, escreve “Banguê”, que marca, em 1934, a sua despedida
definitiva do Nordeste, uma vez que em 1935 ele assume o posto de fiscal do
imposto de consumo no Rio de Janeiro.
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Mesmo em terras cariocas, mantém a temática que lhe dava grande prazer
com a publicação de “Moleque Ricardo”, grande sucesso de 1935, e conclui o Ciclo
da Cana-de-Açúcar, com “Usina”, já em 1936.
Uma vez no Rio de Janeiro, já pai de três meninas (Maria Elizabeth, Maria
Cristina e Maria da Glória), José Lins passa a viver intensamente a fervilhante vida
cultural da Capital do País, tornando-se inclusive articulista de O Globo, dos Diários
Associados e do Jornal dos Esportes, no qual revela uma nova faceta que o
acompanharia pelo resto da vida: a de apaixonado torcedor, especialmente de um
esporte que se consolidava como coqueluche de ricos e pobres, como aprazia a ele
— o futebol. Exerceu cargos de direção no Flamengo — afinal de contas, ninguém é
perfeito! —, na Confederação Brasileira de Desportos e no Conselho Nacional de
Desportos. Contudo, sua produção cultural continua intensa, apesar das tantas
atividades por ele exercidas. Prova disso é o lançamento de “Pureza”, em 1937; a
que se seguem “Pedra Bonita” e “Riacho Doce”.
É somente em 1941 — portanto, seis anos após deixar o Nordeste — que
Lins escreve a primeira obra ambientada fora de sua região natal. “Água Mãe” se
passa em Cabo Frio e lhe vale o Prêmio Felipe d’Oliveira. A cisão mostra-se
passageira, haja vista o reencontro fulgurante com o Nordeste, através do
extraordinário romance “Fogo Morto”, de 1943, considerado sua obra-prima e um
dos mais importantes livros da literatura nacional em todos os tempos.
Mário de Andrade ficou tão impressionado com “Fogo Morto” que, valendo-se
da sua formação de musicólogo, traçou um painel do livro, à semelhança de uma
sonata. O livro “Fogo Morto” teria sido composto em três tempos: um alegro inicial,
refletido no personagem Mestre Zé Amaro, o celeiro; em seguida, um andante um
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tanto triste, calcado no comportamento do Coronel Lula de Holanda, macambúzio,
vivendo a sua própria solidão entre quatro paredes; por fim, um presto grandioso, na
figura do Coronel Vitorino Carneiro da Cunha, o Papa-Rabo, uma espécie de
Quixote do Nordeste, numa luta desenfreada contra os poderosos da época.
Esse livro mereceu também de Otto Maria Carpeaux o reconhecimento. A
partir daí, Carpeaux chegou a afirmar que José Lins era efetivamente o maior
escritor vivo do Brasil àquela época.
A relação umbilical com o Rio de Janeiro já estava consumada, tanto que
após o lançamento de “Eurídice”, em 1947, passa a escrever uma coluna em O
Globo chamada “Conversas de Lotação”, uma crônica diária do cotidiano carioca.
O que se pode dizer com alguma aproximação é que José Lins havia deixado
de ser paraibano e nordestino, mas tampouco havia se tornado carioca. Graças ao
sucesso de seus livros, ele passara a ser, na verdade, uma figura emblemática do
Brasil como um todo e com as traduções de sua obra pelo mundo afora para outras
línguas. Pela série de viagens oficiais que empreenderia nos anos a seguir, ele era
guindado, na verdade, à condição de cidadão do mundo.
Entre 1947 e 1956, José Lins visitou de Portugal ao Peru, do Uruguai à
Grécia, sempre divulgando suas obras e buscando novos elementos para sua
seminal escrita, fato comprovado nos relatos “Bota de Sete Léguas” e “Gregos e
Troianos”, repletos de elementos “importados”.
Em 1955, a Academia Brasileira de Letras o elege para ocupar a cadeira
número 25. A investidura dá-se com quase um ano de atraso, quando o escritor
retorna de longa viagem à Europa, já bastante debilitado fisicamente. Sua
experiência dentro da ABL é curta, já que falece prematuramente no dia 12 de
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setembro de 1957. Com apenas 56 anos de idade, José Lins se despedia da vida, e
o País dizia adeus a um dos seus mais profícuos e talentosos escritores.
Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, é comum, é quase um clichê, dizer-se
que os regionalistas souberam traduzir a alma do povo brasileiro. Isto certamente é
verdade também para o conjunto da obra de José Lins do Rego.
José Lins foi mais do que um simples intérprete. Foi protagonista de uma
história que não tem final: a de um povo que luta para obter tudo o que o fastígio da
ciência e da produção podem oferecer, mas que não está disposto a esquecer suas
raízes e a cortar seu passado como preço a pagar pela inserção no futuro.
É por isso que a homenagem ao centenário de José Lins é mais do que uma
celebração dos amantes da leitura ou de nós, paraibanos, envaidecidos por tê-lo
como conterrâneo. É a exaltação das artes e virtudes de um gênio que, embora
reconhecido no mundo inteiro, sempre entendeu que a chave do seu sucesso havia
sido cunhada nos grotões do Engenho Corredor, onde, antes de prepararem um
grande escritor, fizeram um grande homem! (Muito bem!)
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O SR. PRESIDENTE (Wilson Santos) – Parabéns, Deputado Marcondes
Gadelha! Sem dúvida, V.Exa. faz uma justa homenagem a um dos maiores
intelectuais do Brasil. José Lins do Rego enalteceu não só a literatura nacional, mas
toda a cultura brasileira, divulgando-a no mundo inteiro.
A Paraíba tem, sem dúvida, grandes nomes, como Epitácio Pessoa, que
governou este País de 1919 a 1922, João Pessoa, que acabou dando o próprio
nome à Capital da Paraíba, e Assis Chateaubriand.
Hoje esta Casa tem o privilégio de homenagear um grande paraibano, José
Lins do Rego, leitura obrigatória para todo brasileiro.
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O SR. PRESIDENTE (Wilson Santos) – Convido a ocupar a tribuna o nobre
Deputado Themístocles Sampaio, que falará em nome do PMDB.
O SR. THEMÍSTOCLES SAMPAIO (PMDB-PI. Sem revisão do orador.) – Sr.
Presidente, Sras. e Srs. Deputados, tenho a honra de falar em nome da Liderança
do PMDB. Para mim, fazer uma homenagem a este grande patrício, que foi José
Lins do Rego, é muito importante. Passo a proferir o meu discurso certo de que
todos os brasileiros estão com José Lins do Rego no coração.
A obra de José Lins do Rego é um dos maiores patrimônios da cultura
brasileira. Além de brindar os leitores com os prazeres de uma prosa rica e
cativante, seus livros imortalizaram uma forma de ser e pensar, uma visão de mundo
que desapareceu junto com os engenhos de açúcar e as relações sociais que
gravitavam em torno deles.
Leitura obrigatória nas escolas nordestinas de gabarito, José Lins do Rego
ajudou a formar nas mentes dos alunos uma consciência da realidade brasileira que,
de outra forma, seria maculada por uma parcialidade inaceitável.
Não são apenas personagens e estilos de vida que desfilam nas páginas de
uma produção extensa e vibrante. A própria fala dos nordestinos ganha vida e salta
para um convívio apaixonado com os leitores.
Quem, na adolescência, travou contato com “Menino de Engenho”,
“Doidinho”, “Bangüê” e “Fogo Morto” saiu profundamente marcado do encontro com
aquele mundo mágico, mas tão real, no qual o drama humano é tocado com
profundidade e sensibilidade poética.
A força da cultura nordestina, que se manifestou de forma brilhante em
Rachel de Queiroz, Graciliano Ramos, Jorge Amado, João Cabral de Mello Neto,
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Gilberto Freire, para citar apenas alguns nomes, encontrou em José Lins do Rego
um expoente, cujo talento inconteste rivalizava com um carisma irresistível.
O escritor paraibano, celebridade na terra natal que tanto amou, foi
amplamente reconhecido no plano nacional, tanto pelos leitores quanto por críticos e
outros literatos, que inclusive o acolheram na Academia Brasileira de Letras. Homem
culto e educado, cultivou muitas amizades e nunca se deixou impressionar por
elogios e aplausos, mantendo sempre ativa uma intensa consciência crítica das
mazelas que afligiam e ainda maltratam o povo nordestino.
Num momento em que o Brasil parece seduzido por modismos culturais
variados e os produtos da cultura de massa se multiplicam aceleradamente é um
grande desafio para os educadores manter ou mesmo reacender o interesse dos
jovens por obras que guardam a memória de nossa cultura.
Nesse sentido, o centenário de nascimento de José Lins do Rego é uma
excelente oportunidade, para que sejam debatidas essas questões. Não se trata
apenas de transpor para outros meios, como filmes ou seriados na televisão, o texto
dos livros, mas de divulgar e encontrar novas formas de apresentação que valorizem
a palavra escrita. Quando conquistamos um adolescente para o mundo da leitura,
abrimos-lhe as portas da civilização.
O chamado grupo de escritores regionalistas tem papel proeminente na
cultura nacional. Seus textos não são apenas divertimento, garantia de satisfação
estética, mas peças de grande significação política. Se falam com amor de uma
realidade única, também denunciam as forças opressoras que sustentam as
desigualdades de uma sociedade injusta e dividida.
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A leitura de José Lins do Rego é imprescindível e deve ser estimulada de
todas as formas. Oferecer aos jovens a possibilidade de manter contato com sua
obra é a maior homenagem que podemos prestar à memória de um homem que
representa o que o Brasil produziu de melhor em termos de talento literário,
dignidade e amor pela vida.
Era o que tinha a dizer.
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O SR. PRESIDENTE (Marcondes Gadelha) - Concedo a palavra ao Deputado
José Antonio Almeida, que falará pelo PSB.
O SR. JOSÉ ANTONIO ALMEIDA (Bloco/PSB-MA.) - Sr. Presidente, Sras. e
Srs. Deputados, eminente Deputado Marcondes Gadelha, autor da proposição desta
justa homenagem que esta Câmara presta hoje a José Lins do Rego, V.Exa., que
representa muito bem nesta Casa, como já representou no Senado Federal, a
Paraíba, com esta propositura, dá oportunidade a todos nós, brasileiros, de
homenagearmos um grande paraibano, que foi, como disse o Deputado
Themístocles Sampaio, um escritor tido como regionalista, mas que, na realidade,
foi autor de obras universais, que representaram um resgate muito grande da cultura
brasileira para todos da nossa Pátria.
Tive oportunidade de conhecer José Lins do Rego, como escritor, na minha
adolescência. Os livros do chamado Ciclo da Cana-de-Açúcar, “O Moleque
Ricardo”, “Usina”, “Bangüê”, foram leituras estimuladas pela minha mãe,
professora de Português. Depois, com enorme prazer, já adulto, estudante de
Direito, adquiri memorável conjunto de obras, as “Obras Completas de José Lins do
Rego”, editada pela Editora Aguilar, em papel bíblia, com três volumes, que trazem
especialmente suas obras de ficção.
Dessa forma, foi possível aquilatar, com mais de vinte anos, a grandeza
desse grande romancista que foi José Lins do Rego. A imagem que me vem agora
e me faz utilizar esta tribuna de improviso, pois nem ao menos tive ciência anterior
desta homenagem, é a de José Lins do Rego, de "Fogo Morto", memorável romance
sobre o Brasil, eu ousaria dizer. Os engenhos de "Fogo Morto", que representavam a
outrora pujante economia da cana-de-açúcar do Nordeste, economia do Brasil rural,
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ainda hoje poderiam trazer ao nosso País um grande handicap, se tivesse havido,
por exemplo, a continuidade do Programa do Álcool.
Sr. Presidente, conseguimos — e aqui faço um parêntese — em pouco
tempo, no momento da crise do petróleo, adotar um combustível alternativo, menos
poluente, com todas as condições de ser usado nos veículos motorizados do mundo
todo. Chegamos a ter a imensa maioria dos nossos automóveis movidos a álcool e
abandonamos, de uma hora para outra, todo esse potencial.
José Lins do Rego, no memorável “Fogo Morto”, falava sobre o que acontecia
e ainda acontece no Brasil.
José Lins do Rego, segundo muitos registravam, identificava-se com Vitorino
Carneiro da Cunha, o Vitorino Papa-Rabo, principal personagem do romance que,
como D. Quixote, nem que fosse lutando contra moinhos de vento, buscava
recuperar a pujança da economia regional.
Recordo-me de imagem que me ficou marcada na descrição do meu
conterrâneo, Josué Montello, romancista como José Lins do Rego e autor de
belíssimo ensaio introdutório à edição em três volumes da obra completa de José
Lins do Rego, da Editora Aguilar. Em seu ensaio, compara o romancista a uma
árvore florida e se recorda da última vez que o viu, quando seguia para a Europa,
onde ocuparia a cadeira de Literatura Brasileira, da Universidade de Paris. José Lins
do Rego foi ao cais do porto para deixá-lo. Chegou atrasado, e Josué já se
encontrava-se na amurada do navio. Ele o saudou efusivamente com as duas
mãos, deixando claro, com aquele abraço, o sentimento de amizade que nutria por
aquele jovem, e estendendo-o a todo o Brasil.
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Sr. Presidente, ao lembrar essa efusiva saudação de José Lins do Rego a
seu compatriota, que viajava para lecionar literatura brasileira no estrangeiro, quero
registrar o abraço efusivo do Partido Socialista Brasileiro a V.Exa. por esta
homenagem. Recuperar hoje o nome de José Lins do Rego, grande romancista
brasileiro, que completaria cem anos de existência, é um ato de justiça.
Muito obrigado.
Durante o discurso do Sr. José Antonio Almeida, o
Sr. Wilson Santos, 4º Suplente de Secretário, deixa a
cadeira da presidência, que é ocupada pelo Sr.
Marcondes Gadelha, § 2º do artigo 18 do Regimento
Interno.
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O SR. PRESIDENTE (Marcondes Gadelha) – A Mesa agradece aos nobres
Deputados João Almeida e Themístocles Sampaio pela análise brilhante e
circunstanciada sobre a personalidade e a obra de José Lins do Rego, e associa-se
às justas homenagens agora consagradas a esse escritor extraordinário, que se fez
universal ao retratar as inúmeras e variadas facetas de seu povo.
A obra de José Lins do Rego é imortal. Passarão modismos, correntes
literárias, novos falares, mas o seu texto há de perdurar. Vivemos um período de
globalização acelerada, de apelo ao conhecimento científico e tecnológico, de ficção
científica, de modernização exacerbada nos relacionamentos humanos; no entanto,
aquele mundo criado por José Lins do Rego persistirá.
Com encantamento crescente, as novas gerações adentrarão esse mundo
para contactar-se com Vitorino Carneiro da Cunha, o Papa-Rabo, com o Coronel
Lula de Holanda, com o mestre Zé Amaro, com Carlinhos, com o moleque Ricardo,
porque sempre haverá espaço em nossa alma, em nossa imaginação e em nossa
sensibilidade para preservar os valores, o estilo de vida, a relação social, expostos
com tanta grandeza, brilho e talento por José Lins do Rego.
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V - ENCERRAMENTO
O SR. PRESIDENTE (Marcondes Gadelha) – Nada mais havendo a tratar,
vou encerrar a sessão.
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O SR. PRESIDENTE (Marcondes Gadelha) - Está encerrada a sessão.
(Encerra-se a sessão às 10 horas e 4 minutos.)