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FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA CAMPUS DE CACOAL
Departamento do Curso de Direito
DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NA
EXECUÇÃO CIVIL POR QUANTIA CERTA CONTRA DEVEDOR SOLVENTE
Kelcylen Moreira Martins Leite
CACOAL-RO
2007
KELCYLEN MOREIRA MARTINS LEITE
DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NA EXECUÇÃO CIVIL POR QUANTIA CERTA CONTRA DEVEDOR
SOLVENTE
Trabalho de Conclusão de Curso, apresentado à Universidade Federal de Rondônia, Campus de Cacoal, como requisito parcial para obtenção do grau de bacharel em Direito, sob orientação do professor especialista Silvério dos Santos Oliveira.
Cacoal-RO
2007
LEITE,K.M.M. Desconsideração da Personalidade Jurídica na Execução Civil por Quantia Certa Contra Devedor Solvente – 2007 Vii,111f.,enc.;30cm. Monografia – Fundação Universidade Federal de Rondônia – Campus Cacoal,2007. Bibliografia: f.76-79. I-Título
PARECER DE ADMISSIBILIDADE
A Acadêmica Kelcylen Moreira Martins Leite desenvolveu o Trabalho de
Conclusão de Curso intitulado DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NA EXECUÇÃO CIVIL POR QUANTIA CERTA CONTRA DEVEDOR SOLVENTE, obedecendo aos critérios do Projeto de Monografia apresentado ao
Departamento de Direito da Universidade Federal de Rondônia – UNIR, campus de
Cacoal / RO.
O acompanhamento foi efetivo, observou-se no desenvolvimento do trabalho,
todos os prazos fixados pelo Departamento de Direito.
Assim sendo, a acadêmica está apta para a apresentação expositiva de sua
monografia junto à Banca Examinadora.
Cacoal, RO, 06 de agosto de 2007.
_____________________________________
Professor Esp. Silvério dos Santos Oliveira.
KELCYLEN MOREIRA MARTINS LEITE
DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NA EXECUÇÃO CIVIL
POR QUANTIA CERTA CONTRA DEVEDOR SOLVENTE
AVALIADORES
________________________________________ - __________ Prof. Especialista Silvério dos Santos Oliveira - UNIR Nota
________________________________________ - __________ Prof. Ms.Isabela Esteves Cury - UNIR Nota
________________________________________ - __________ Prof. Fábio - UNIR Nota
________________________ Média
Cacoal-RO 2007
Dedico ao meu Deus amado da minha alma pela iluminação, sabedoria e proteção; À meus pais Albertino e Ana Lucimar e ao meu irmão Kairo pelo carinho, dedicação e cuidado sempre e constantes.Amo Vocês.
Agradeço ao meu orientador professor Silvério pelo incentivo e colaboração; Aos meus mestres, professores que contribuíram para o meu crescimento intelectual e por me auxiliarem a alçar este vôo pelo mundo do Direito, indicando os caminhos a serem percorridos; Aos meus amigos e colegas de jornada, que durante estes anos estiveram ao meu lado distribuindo alegria, motivação, carinho, que outrora anônimos, agora marcos da minha história.
A leitura mudou meus sentimentos.Alterou minhas preces, ó Senhor, para que fosse dirigidas a Ti mesmo.Os livros me deram valores e prioridades diferentes.De repente, toda a esperança vã se tornou vazia para mim e eu ansiava pela imortalidade da sabedoria com um ardor incrível em meu coração.Senhor, Deus da verdade, acaso para Te agradar, basta ter conhecimento? Infeliz do homem que tendo conhecimento de todas as coisas, Te ignora; mas feliz de quem te conhece, mesmo que ignore todas as demais coisas.Quanto ao que é cheio de conhecimento e ainda também Te conhece, não é mais feliz por causa de sua ciência, mas só é feliz por Ti, se conhecendo-te, Te glorificar como Deus e Te der graças, e não se desvanecer em seus pensamentos. Santo Agostinho
RESUMO
LEITE.Kelcylen Moreira Martins.Desconsideração da Personalidade Jurídica na Execução Civil Por Quantia Certa Contra Devedor Solvente, folhas, Trabalho de Conclusão de Curso.Fundação Universidade Federal de Rondônia – Campus de Cacoal,2007. O presente trabalho tem por objetivo apresentar o estudo acerca da aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica na execução civil por quantia certa contra devedor solvente. Demonstrar a finalidade e natureza da pessoa jurídica e da desconsideração da personalidade jurídica, bem como seus pressupostos, características e incidência.Que a recepção da teoria pelo artigo 50 do Código Civil de 2002, constitui-se em instrumento de proteção e preservação da própria pessoa jurídica, e de efetividade da ação executória quando no curso dela se constata que a executada, pessoa jurídica, está sendo manipulada e desvirtuada de sua finalidade, com ações de abuso ao direito e de fraude à lei. A pessoa jurídica é um ente autônomo, cuja função é limitar os riscos empresariais e estimular o desenvolvimento das atividades econômicas, e sua existência não poder servir para alcançar um escopo ilícito, ou burlar as normas e obrigações que dizem respeito aos sócios.A desconsideração da personalidade jurídica é um instrumento recepcionado para combater este desvio de finalidade, a assertiva de que a sociedade não se confunde com o sócio é um princípio jurídico, mas não pode ser um tabu a entravar a ação do Estado na efetivação da Justiça. PALAVRAS-CHAVE: Pessoa jurídica.Desconsideração.Execução por quantia certa contra devedor solvente.Justiça.
ABSTRACT LEITE. Kelcylen Moreira Martins. Disregard of the Juridical Personality in the Civil Execution for Certain Amount against Solvent Debtor, pages. Monography for the Foundation Federal University of Rondonia - Cacoal Campus, 2007. The present paper has the objective to present the study related to the application of the theory of the disregard of he juridical personality in the civil execution for certain amount against solvent debtor. Demonstrate the utility and the nature of the juridical person and the disregard of the juridical personality, as well as its presupposes, features and incidence. The reception of the theory by the 2002 Civil Code, in its article 50, constitutes an instrument of protection and preservation of the juridical person on its own, and of effectiveness of the executorial action when it is clear that the juridical person is manipulated and betrayed in its finality, with abusive actions to its rights and fraud to the law. The juridical person is an autonomous unit, whose functions is to limit the management risks and stimulate the development of the economic activities, and its existence may not serve neither to an illicit achievement , nor to rules that extinguish the obligations of the partners. The disregard of the juridical personality is an instrument receipted to wrestle with the deviation of finality, the conception that the society does distinguish from the partners is a juridical principle, however, it may not be a taboo to impede the action of the State in the effectiveness of the Justice. Key-words: Juridical Person, Disregard, Execution for certain amount against solvent debtor, Justice.
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO................................................................................................... 09 2. PESSOA JURÍDICA E PERSONALIDADE JURÍDICA...................................... 11 2.1DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO DA PESSOA JURÍDICA.......................... 11 2.2 NATUREZA DA PESSOA JURÍDICA E CONCEITUAÇÃO........................... 14 2.3 DA CLASSIFICAÇÃO DAS PESSOAS JURIDICAS........................................ 17 2.4 DA CAPACIDADE E REPRESENTAÇÃO DA PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PRIVADO............................................................................................... 18 2.5 DA REPONSABILIDADE CIVIL DA PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PRIVADO............................................................................................................... 19 3. ORIGEM DA TEORIA DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA.............................................................................................................. 22 3.1 HISTÓRICO..................................................................................................... 25 3.2 CONCEITO...................................................................................................... 26 3.3 NATUREZA JURIDICA.................................................................................... 27 3.4 A TEORIA NO DIREITO COMPARADO.......................................................... 29 3.4.1 França........................................................................................................... 29 3.4.2 Argentina....................................................................................................... 30 3.4.3 Itália.............................................................................................................. 31 3.4.4 Portugal e Espanha...................................................................................... 32 4 EXECUÇÃO........................................................................................................ 33 4.1 CONCEITO E HISTÓRICO.............................................................................. 36 4.2 EXECUÇÃO POR QUANTIA CERTA CONTRA DEVEDOR SOLVENTE,
SUA CONCEITUAÇÃO E FINALIDADE................................................................ 36 4.3 A PROCESSUALIDADE DA EXECUÇÃO POR QUANTIA CERTA................ 36 5. ARTIGO 50 DO CÓDIGO CIVIL........................................................................ 46 5.1 PRESSUPOSTOS E FINALIDADE.................................................................. 46 5.1.1 Desvio de Finalidade.e Abuso de Direto...................................................... 48 5.1.2 Fraude........................................................................................................... 49 5.1.3 Confusão Patrimonial................................................................................... 51 5.1.4 Fraude Contra credores................................................................................ 52 5.2 TIPOS SOCIETÁRIOS ATINGIDOS................................................................ 54 5.3 FORMA DE APLICAÇÃO DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NO PROCESSO CIVIL......................................................................... 56 5.4 INCIDÊNCIA DA DESCONSIDERAÇÃO NA EXECUÇÃO CIVIL POR QUANTIA CERTA CONTRA DEVEDOR SOLVENTE............................................................ 62
6.CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................... 73
7.REFERÊNCIAS.................................................................................................. 76
ANEXOS................................................................................................................ 81
1.INTRODUÇÃO
A natureza da pessoa jurídica é um assunto que ainda causa divergências
doutrinárias.Para a corrente ficcionista a pessoa jurídica é um ente real a quem o
direito apenas reconhece a personalidade.Para a corrente realista a pessoa jurídica
é uma criação da lei, instrumento para atingir fins práticos.
A par desta discussão doutrinária que será explanada neste estudo, e
independentemente da teoria adotada, o presente trabalho vem apresentar os vários
posicionamentos doutrinários acerca da pessoa jurídica e da desconsideração da
personalidade jurídica, respondendo aos seguintes questionamentos: Qual a
finalidade do legislador civil ao admitir em seu arcabouço normativo a incidência
deste instituto? Qual a motivação e necessidade que levou os doutrinadores a criá-
lo? Qual a aplicabilidade da desconsideração na ação executória por quantia certa
contra devedor solvente?
Por meio dos métodos dedutivo, histórico e teleológico utilizados, pretende-
se demonstrar que o referido instituto é instrumento eficaz para responsabilizar os
sócios e seu patrimônio em uma ação executória, quando estes se escondem atrás
da pessoa jurídica e cometem atos ilícitos, burlando a efetividade da execução,
como forma de se eximir de responsabilidades, desvirtuando assim a finalidade da
pessoa jurídica que é a de agregação para que o homem em coletividade alcance
objetivos lícitos e idôneos, superando assim as suas limitações individuais.
A admissibilidade desta teoria pelo legislador civil, permite que o Poder
Judiciário levante o manto da pessoa jurídica desconsiderando a sua personalidade
para determinados atos, desprezando-se a autonomia patrimonial existente entre a
sociedade e os sócios, responsabilizando-os pelas obrigações assumidas,
combatendo o prejuízo a terceiros, sem, contudo, atingir os demais interesses que
gravitam em torno da pessoa jurídica.
A desconsideração da personalidade jurídica incidirá em circunstâncias em
que a própria pessoa jurídica é utilizada com abuso de poder, desvio de finalidade,
fraude a lei, servindo de escudo para que pessoas físicas atinjam seus objetivos,
olvidando-se de suas responsabilidades, porque acreditam estar protegidos pelo
princípio da autonomia patrimonial, no qual a personalidade da sociedade não se
confunde com a dos sócios, muito menos com o seu patrimônio.
A desconsideração da personalidade jurídica vem relativizar este principio, e
proteger a própria pessoa jurídica que existe para atingir fins lícitos, conforme dispõe
a Constituição Federal em seu artigo, 5º, XVII.
2.PESSOA JURÍDICA E PERSONALIDADE JURÍDICA 2.1 DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO DA PESSOA JURÍDICA
Sabe-se que o Direito é uma criação do homem que tem por escopo
proteger os interesses do próprio homem, que a todo momento se envolve em
relações jurídicas necessárias a vida em sociedade e que essas relações existem
desde o surgimento da convivência humana em grupos.
Porém, o homem e a humanidade evoluíram e com eles as relações
jurídicas, do simples escambo, sistema arcaico de comércio baseado na troca de
víveres, passou pelo comércio de manufaturas, primeira forma de produção
sistematizada, artesanal e em pequena escala; chegando-se as grandes relações
comerciais trazidas pela revolução industrial e a produção em larga escala.
Já no século XVIII, em pleno capitalismo industrial, e durante todo este
processo evolutivo, o homem sozinho não pôde suportar o seu ônus, nem dispor dos
recursos e forças necessários, como preleciona Silvio Venosa, “isoladamente era
pequeno demais para a realização de grandes empreendimentos”.1
Para que o homem fosse sujeito de direitos nessas relações e por ser ele
eminentemente social, foi preciso que ele se agregasse a outros indivíduos imbuídos
dos mesmos propósitos e desígnios, conjugando esforços para que se alcançasse
os objetivos almejados e as suas limitações individuais fossem superadas.
1 VENOSA,Sílvio de Salvo.Direito Civil:Parte Geral.5.ed.SãoPaulo:Atlas,2005,p.255.
A partir dessa necessidade, surge a pessoa jurídica que nasceu para
satisfazer interesses humanos, conforme escreve Francisco Amaral:
Sua razão de ser está na necessidade ou conveniência de as pessoas singulares combinarem recursos de ordem pessoal ou material para realização de objetivos comuns, que transcendem as possibilidades de cada um dos interessados por ultrapassarem o limite moral da sua existência ou exigirem a prática de atividades não exercitáveis por eles.”2
Segundo Thomas Hobbes, a palavra pessoa se liga a idéia de personagem
e se define da seguinte forma:
A palavra ‘pessoa’ é de origem latina. Para lhe dar significado os gregos tinham prósopon, que significa ‘rosto’, tal como em latim persona significa o disfarce ou a aparência exterior de um homem, imitada no palco. Por vezes, mais particularmente aquela parte dela que disfarça o rosto, como máscara ou viseira. Do palco a palavra foi transferida para qualquer representante da palavra ou da ação, tanto nos tribunais como nos teatros. Uma pessoa é o mesmo que um ator, tanto no palco como na conversação corrente. Personificar é representar, seja a si mesmo ou a outro." 3
O surgimento da pessoa jurídica sofreu influências do Direito Romano, do
Direito Germânico e do Direito Canônico, mas foi com os romanos que ela se
desenvolveu.
No período pré-clássico os romanos compreendiam que “se um patrimônio
pertencia a várias pessoas, os titulares desse patrimônio não formavam uma
entidade abstrata, a corporação, mas pertenciam aos diferentes indivíduos que
constituíam o conjunto, sendo cada um, titular de uma parte dos bens, que o
conceito de pessoa jurídica está relacionado à idéia de corporação” 4.
A idéia de corporação, entidade abstrata de direitos e obrigações, distinta
da pessoa física; nasce no direito clássico, no qual os romanos passam a admitir o
Estado como um ente abstrato; aqui se estabelece o marco inicial da existência da
pessoa jurídica de direito privado.
Já no período pós- clássico os romanos criam duas grandes categorias de
pessoas jurídicas: as universitates personarum, que constituíam-se na associação
2 Apud TOMAZETTE,Marlon.Direito Societário.São Paulo:Juarez de Oliveira,2004.p.47. 3 HOBBES,Thomas.Leviatã.Tradução de Alex Marins.São Paulo:Claret,2005,p.123. 4VENOSA,Sílvio de Salvo.Direito Civil:Parte Geral.5.ed.SãoPaulo:Atlas,2005. p.250.
de pessoas que têm personalidade e patrimônio próprios, distinto de seus membros,
e as universitates rerum, que eram as fundações formadas por bens destinados a
fins específicos, como os religiosos, pios ou educacionais, que eram os colégios
operários, as associações religiosas; as igrejas , conventos, hospitais e hospícios
eram tidos como fundações.
Segundo Washington Monteiro de Barros, as fundações se desenvolveram
no direito canônico, pois qualquer ofício eclesiástico que tivesse patrimônio próprio,
era considerado ente autônomo e independente, visto que outrora eram
subordinadas à igreja.
Conforme leciona Silvio Venosa, para a constituição de uma pessoa jurídica
no Direito romano, necessitava-se da existência de três membros e de um pacto ou
estatuto, demorou muito para que se fosse exigida uma autorização legal para
composição.
No entendimento dos doutrinadores do período pós-clássico, as pessoas
jurídicas eram consideradas incapazes de fato, precisava que alguém praticasse
atos por elas.
A administração do patrimônio das fundações era atribuído a um
administrador denominado oeconomus, a pessoa jurídica não se extinguia com o
desaparecimento de um de seus membros, mas o desaparecimento de todos
implicava diretamente na extinção da pessoa jurídica, a sua extinção não era só
determinada pelo sumisso de seus membros, bem como pelo decurso de prazo e
pela vontade daqueles que a compunham.
Quanto à destinação dos bens das corporações e fundações, quando a lei
ou o estatuto não determinava, ou os bens iam para o estado ou eram concedidos
aos próprios associados, nesse aspecto, existiam muitas divergências.
2.2 NATUREZA DA PESSOA JURÍDICA E CONCEITUAÇÃO
A natureza da pessoa jurídica é um assunto polêmico e divergente para os
doutrinadores e juristas no mundo ocidental, várias teorias foram criadas e
defendidas para se determinar a natureza da pessoa jurídica, dentre elas pode-se
mencionar quatro grupos predominantes, os quais são:
O primeiro grupo é defensor da teoria ficcionista.No entendimento dessa
corrente, que originou-se no direito canônico e prevaleceu até o século XVIII, só o
homem é capaz de ser titular de direitos, mas o Estado pode modificar esse
principio, ora negando capacidade ao homem ora estendendo a outros entes que
não o homem, como as pessoa jurídicas, que se constituem em seres fictícios.
Assim, a pessoa jurídica é uma criação artificial da lei para exercer direitos
patrimoniais; é pessoa puramente pensada, mas não existente na realidade, sendo,
portanto, abstrata.Essa teoria é sustentada por Savigny e defendida por Vareilles-
Sommières, que diz :
“ A pessoa jurídica não existe senão na inteligência, sendo puro ato de espírito; é pessoa imaginária, sem qualquer realidade, sem qualquer objetividade, simples efeito de ótica, simples projeção”.5
O segundo grupo defende a teoria da equiparação, seus criadores e
defensores foram Windscheid e Brinz, para eles a pessoa jurídica é um patrimônio,
massa de bens, equiparado no seu tratamento jurídico às pessoas naturais, são
meros patrimônios destinados à um fim específico, conforme escreve Elizabeth
Cristina Campos Martins de Freitas:
Tal teoria admite apenas a existência de certas massas de bens e determinados patrimônios, equiparados, em seu tratamento jurídico, às pessoas naturais.As pessoas jurídicas seriam entendidas aqui como meros patrimônios destinados a determinado fim, ou ainda, patrimônios personificados pelo Direito em função de um objetivo perseguido.6
5 Apud MONTEIRO,Washington de Barros.Curso de Direito Civil.33.ed.São Paulo:Saraiva,1995, p.98. 6 FREITAS,Elizabeth Cristina Campos Martins de.Desconsideração da personalidade jurídica: análise a luz do código de defesa do consumidor e do novo código civil.2.ed.São Paulo:Atlas,2004.
O terceiro grupo, formado por Gierke e Zitelmann, precursores da teoria
objetiva ou orgânica, difundida na Alemanha.Pessoa não é só o homem, pessoa
natural, junto deles existem organismos vivos, dotados de existência real e vontade
própria, distinta das pessoas físicas, que são as pessoas jurídicas, ou seja:
Junto à pessoa natural, como organismo físico, há organismos sociais, ou pessoas jurídicas, que têm vida autônoma e vontade própria, cuja finalidade é a realização do fim social. Por conseguinte, pessoas jurídicas são corpos sociais, que o direito não cria, mas se limita a declarar existente.7
O quarto e último grupo é o da teoria da realidade das instituições jurídicas,
defendida por Hauriou.Essa teoria prega que entre a teoria da ficção e a teoria da
realidade, está a teoria da realidade técnica ou jurídica.
Para a qual a personalidade humana deriva do direito, da mesma forma
pode o Direito, concedê-la a outros entes, que não os homens; os quais tenham
como objetivo a realização de interesses humanos.Ou seja, a personalidade jurídica
não é uma ficção, mas um atributo que o Estado concede ou outorga a outros entes
que o merecem, desta forma, a pessoa jurídica tem realidade, não realidade física,
mas a realidade jurídica.
Essa quarta teoria é a mais eclética segundo Washington de Barros
Monteiro, é a que melhor atende à essencialidade da pessoa jurídica, definindo-a
como realidade jurídica ou técnica, e como preleciona Caio Mário da Silva Pereira, “
as pessoas jurídicas existem no mundo do direito, e existem como seres dotados de
vida própria, de uma vida real” 8.
O direito brasileiro, que é eminentemente positivista, é adepto desta teoria,
a pessoa jurídica é objetiva e essa objetividade pode ser notada no Código Civil
brasileiro, o qual dispõe que:
Artigo 45 – Começa a existência legal das pessoas jurídicas de direito privado com a inscrição do ato constitutivo no respectivo registro, precedida, quando necessário, de autorização ou aprovação do Poder Executivo,
7 MONTEIRO,Op.cit..p.99. 8 PEREIRA,Caio Mario da Silva.Instituições de Direito Civil, 6.ed..Rio de Janeiro:Forense,1995, p.195.
averbando-se no registro todas as alterações por que passar o ato constitutivo9
Portanto, é em decorrência da adoção da teoria da realidade técnica, é que
a pessoa jurídica, pessoas morais como era usada na França ou pessoa coletiva
como era usada no direito português, é definida pelos doutrinadores pátrios como:
“Pessoa jurídica é a unidade de pessoas naturais ou de patrimônios, que visa à consecução de certos fins, reconhecida pela ordem jurídica como sujeito de direitos e obrigações”.10
Pessoas jurídicas, portanto, são entidades a que a lei empresta personalidade, isto é, são seres que atuam na vida jurídica, com personalidade diversa da dos indivíduos que as compõem, capazes de serem sujeitos de direitos e obrigações na ordem civil. 11
Entidade jurídica é constituída e criada pelo ser humano, pessoa física, sendo dele dependente, que deve sua existência ao ordenamento jurídico e que é o que ordenamento deseja que ela seja, pois não é, no âmbito da vida jurídica, fenômeno natural pré-existente, mas mera criação do pensamento humano para a consecução de determinados fins.12 “Organização de pessoa naturais com interesse comum ou de massa de bens dirigidos à realização de interesses comuns ou coletivos aos quais a ordem jurídica reconhece como sujeitos de direito.”13
“Uma unificação produzida pelo Direito para a atuação externa do grupo no comércio jurídico com os demais algo assim como uma máscara aplicada sobre um rosto, embora não o refletindo exatamente.” 14
Entretanto, segundo Suzy Elizabeth Koury :
o conceito de pessoa jurídica varia de acordo com o momento histórico e a
ideologia adotada pela ordem jurídica de tal forma, que só se pode
conhecer o que um determinado ordenamento considera como pessoa
jurídica através da verificação das normas por ele consagradas 15.
E é em razão desses fatos que decorre a relatividade da personalidade
jurídica. 9 BRASIL.Lei 10406/2002.Código Civil.Diário Oficial da República Federativa do Brasil.Brasília, 11 de janeiro de 2002.Disponível em: www.planalto.gov.br.Acesso em : 08/09/2007. 10 DINIZ,Maria Helena.Curso de Direito Civil Brasileiro.v.1.22.ed.São Paulo:Saraiva,2005,p.222. 11 RODRIGUES,Silvio.Direito Civil.V.1.33.ed.São Paulo:Saraiva,2003,p.86. 12 Apud BRUSCHI,Gilberto Gomes.Aspectos processuais da desconsideração da personalidade jurídica.São Paulo:Juarez de Oliveira,2004, p.5. 13 Apud BRUSCHI,Op.cit., p.6. 14 KOURY,Suzy Elizabeth Cavalcante.A desconsideração da personalidade jurídica.Rio de Janeiro: Forense,2003, p.10. 15 Ibid., p. 6.
Hans Kelsen, apesar de nem sempre ser considerado um ficcionista,
defende que o conceito de pessoa em sua literalidade não significa realidade
alguma, mas um meio de se exercer direitos.
A pessoa funciona como um centro de imputações normativas, por isso não
há que se falar na distinção de pessoa física e pessoa jurídica, pois ambas devem
ser consideradas criações do direito, pessoas jurídicas, recurso mental e artificial
para o raciocínio jurídico.Os deveres e direitos da pessoa jurídica não são mais do
que deveres e direitos de homens individuais que devem em suas condutas seguir
as normas prescritas.
Quando se diz que a ordem jurídica confere a uma corporação personalidade jurídica, isso significa que a ordem jurídica estatui deveres e direitos que têm por conteúdo a conduta de indivíduos que são órgãos e membros da corporação constituída através de um estatuto, e que esta situação complexa pode ser descrita com vantagem, de maneira relativamente mais simples, com o auxilio de uma personificação do estatuto constitutivo da corporação.16
2.3 DA CLASSIFICAÇÃO DAS PESSOAS JURÍDICAS
As pessoas jurídicas podem ser classificadas em razão da sua estrutura ou
da órbita de sua atuação.
Sob o primeiro aspecto, têm-se as pessoas jurídicas que se compõem pela
reunião de pessoas, que são as associações e as sociedades; e existem as pessoas
jurídicas que se constituem em torno de um patrimônio destinado a um fim, que são
as fundações.
No segundo aspecto quanto a atuação, as pessoas jurídicas podem ser de
direito público interno, como a União, Estados, entre outros, de direito público
externo, como a Organização das Nações Unidas, países estrangeiros, e finalmente
as pessoas jurídicas de direito privado.
16 Apud VENOSA,Op.cit.,262.
Segundo Silvio de Salvo Venosa, “as pessoas jurídicas de direito privado
originam-se da vontade individual, e se propõem à realização de interesses e fins
privados em beneficio dos próprios instituidores ou de determinada parcela do
grupo”,17 e se subdivide em:
Associações e sociedades ambas se constituem por ato jurídico bilateral ou
plurilateral inter vivos, porém se diferenciam na destinação, as associações não
visam o lucro, e as sociedades têm fins econômicos;
As fundações são constituídas por ato jurídico unilateral inter vivos ou causa
mortis, e se compõem de um patrimônio destinado a fins determinados,
normalmente altruísticos, dedicados à educação, pesquisa ou filantropia;
Por fim, têm-se as organizações religiosas, igrejas, e os partidos políticos,
os quais a própria denominação já define as suas finalidades, e estes têm lei própria
que as regem.
O presente trabalho se aterá às pessoas jurídica de direito privado, que
objetivam fins econômicos, lucros.
2.4 DA CAPACIDADE E REPRESENTAÇÃO DA PESSOA JURÍDICA DE DIREITO
PRIVADO
A capacidade da pessoa jurídica está estritamente condicionada à finalidade
para a qual foi criada, os poderes que se outorgam à pessoa jurídica estão
delimitados na lei e em seus atos constitutivos, ou seja, as cláusulas e normas
estabelecidas nos estatutos e contratos sociais, os quais são a certidão de
nascimento da pessoa jurídica de direito privado, que depois de registrados no
Cartório de Registro Público, concedem vida jurídica e limites ao ente privado.
17 Íbid,p.270.
A partir deste momento, o ente pessoa jurídica de direito privado tem
existência própria e passa a ter personalidade civil, podendo ser titular de direitos e
obrigações, obtém nome, nacionalidade, domicílio, capacidade processual,
contratual e autonomia patrimonial.Conforme leciona Silvio Venosa:
Assim, uma vez registrada a pessoa jurídica, o Direito reconhece-lhe a atividade no mundo jurídico, decorrente daí, portanto, a capacidade que se estende por todos os campos do Direito e em todas as atividades compatíveis com a pessoa jurídica. Ao ganhar vida, a pessoa jurídica recebe denominação, domicilio e nacionalidade, todos os atributos da personalidade. A base jurídica da pessoa jurídica em sua ordem interna será sempre seu ato constitutivo, seus estatutos, ou contrato social.Quando estes não contrariarem norma de ordem pública, prevalecerá sobre os dispositivos legais em prol da autonomia da vontade. 18
Seu querer e seus contatos com o mundo nas suas mais diversas relações,
se fazem por meio de seus presentantes, pessoa físicas nomeadas nos seus atos
constitutivos, que são instrumentos da expressão da vontade da pessoa jurídica, que
como bem define Silvio Venosa “é uma vontade autônoma, como decorrência de seu
próprio conceito” .19
2.5 DA RESPONSABILIDADE DA PESSOA JURÍDCA DE DIREITO PRIVADO
A pessoa jurídica de direito privado responde na esfera civil no âmbito
contratual e extracontratual.No campo contratual, a pessoa jurídica devedora é
responsável, devendo cumprir com o estabelecido em contrato e reponde com seus
bens em caso de inadimplemento ou descumprimento da obrigação, conforme
prescreve o artigo 389 do Código Civil :
“Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualizações monetária segundo índices regularmente estabelecidos, e honorários de advogado.” 20
Na esfera extracontratual, a pessoa jurídica de direito privado responde nos
moldes dispostos no artigo 927, 932, III e 933 do Código Civil, que assim dispõem:
18 Op.cit.,p.268. 19 Ibid.,p.268. 20 Ibid., p.248.
Artigo 927- Aquele que, por ato ilícito causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem. Artigo 932 - São também responsáveis pela reparação civil: III - o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele. Artigo 933 - As pessoas indicadas nos incisos I a V do artigo antecedente, ainda que não haja culpa de sua parte,responderão pelos atos praticados pelos terceiros ali referidos.21
Conforme leciona Silvio Venosa, “a responsabilidade civil, resulta de um
dano, direto ou indireto, causado a patrimônio de terceiro, por dolo, culpa ou simples
fato, que deve ser ressarcido” 22.
Essa responsabilidade pode recair sobre o autor do dano, então fala-se em
responsabilidade direta, como pode recair sobre outra pessoa que não a praticante
do ato lesivo, quando o autor desse ato for representante, mandatário ou a quem a
lei atribui responsabilidade.
A responsabilidade civil, também pode ser classificada como objetiva,
quando ela decorre apenas do nexo causal e do fato danoso, chamada teoria do
risco, como pode ser subjetiva, quando a responsabilidade advém da culpa, ou do
risco da atividade desenvolvida.
O Código Civil de 2002 permite que o juiz adote a responsabilidade objetiva
no caso concreto, e não somente nos casos especificados em lei, apesar de ser
pactuante, como regra, da responsabilidade subjetiva.
Desta feita, as sociedades respondem objetivamente pelos danos
provocados por atos ilícitos praticados pelos seus representantes, pois como
preleciona Maria Helena Diniz, “não há presunção juris tantum de culpa in eligendo
21 Ibid, p,286. 22 Op.cit.p. 279.
ou in vigilando,” 23, em que a pessoa jurídica tinha que provar que não teve culpa,
independentemente da culpa a pessoa jurídica responde pelos danos ocasionados
pelos seu empregados, é o que atesta a própria redação artigo 932 supracitado.
23 Op.cit.,p.264.
3. ORIGEM DA TEORIA DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA
3.1 HISTÓRICO
A origem da teoria da desconsideração da personalidade jurídica se deu no
século XIX, em razão de premente necessidade e preocupação da doutrina e da
jurisprudência com a má utilização da pessoa jurídica, e de se encontrar meios
legais de reprimí-la.
A partir desta necessidade, doutrinadores passaram a desenvolver teorias,
dentre elas surgiu a antecessora da Disregard Doctrine, a chamada teoria da
soberania, desenvolvida pelo alemão HAUSSMANN e pelo italiano MOSSA.
Essa teoria tinha por finalidade imputar responsabilidades ao controlador de
uma sociedade de capitais, quando esta não conseguia cumprir com as obrigações
assumidas, porém essa teoria não se desenvolveu.
Foi nos países adeptos ao Common Law, especialmente no direito norte-
americano que se desenvolveu a teoria da desconsideração da personalidade
jurídica.
O primeiro caso em que se tentou aplicar esta teoria, ocorreu em 1809,na
causa em que litigavam o Bank of United States e Deveaux, no qual o Juiz Marshall,
com a intenção de preservar a jurisdição das cortes federais sobre corporations, já
que a Constituição Federal Americana, no seu artigo 3º, seção 2ª, limita tal jurisdição
às controvérsias entre cidadãos de diferentes estados, conheceu da causa,
levantando o véu, de modo a reconhecer o conflito estabelecido entre os indivíduos
que por trás da pessoa jurídica atuavam, tal decisão foi rechaçada por grande parte
dos doutrinadores da época.
Dentre os juristas norte – americanos que desenvolveram essa teoria, pode-
se destacar Maurice Wormser e Paul Hoffmann.
Wormser desde 1912 trabalhava com o tema, e definiu seu conceito,
postulando que na ocorrência de hipóteses em que a pessoa jurídica fosse utilizada
como meio para fraudar credores, eximir-se de obrigação pré-existente, para desviar
a aplicação de uma lei, haveria possibilidade de se desconsiderar a pessoa jurídica
e atingir o conjunto de homens que participam desses atos.
Posteriormente, também, se admitiu a aplicação da teoria em caso de abuso
de direito; essa teoria era conhecida nos tribunais americanos como disregard of
legal entity, ou como lifting the corporate veil.O trabalho do americano Wormser em
proteger a pessoa jurídica pode ser resumido em: “ Seria contrário ao próprio
conceito de pessoa jurídica permitir seu uso com fins e propósitos que
subvertessem tal conceito”.24
Mesmo sendo precursores da aplicação da teoria, os magistrados norte-
americanos, admitiam a teoria como medida de caráter excepcional, sendo a
autonomia da pessoa jurídica regra, e a disregard exceção.
No Direito Inglês, poucas foram as discussões acerca do tema , porém o
tribunal inglês se perpetuou na história da desconsideração da personalidade
jurídica, pois foram eles que julgaram o caso mais famoso, em que litigaram
Salomon V. Salomon & Co.
24 KOURY,Op.Cit., p.68.
Esse caso foi julgado em 1897, oitenta e oito anos após a primeira
manifestação da jurisprudência americana, e refere-se a uma sociedade que a partir
de sua constituição tornou-se insolvente, visto que seu fundador Aaron Salomon ao
constituir a empresa, cedeu seu fundo de comércio, em troca subscreveu vinte mil
ações a si mesmo, porém direcionou as restantes, uma a cada um de seus seis
familiares, tornando-se credor hipotecário da própria empresa, repercutindo na
insolvência da mesma, que não garantiu nada aos credores quirografários, pois o
próprio fundador era credor privilegiado, por esta razão formou-se a massa falida,
que optou pela aplicação da teoria da desconsideração, sendo que o liquidante
sustentou a tese de que a atividade da companhia era atividade das pessoas físicas,
que usou da pessoa jurídica para limitar sua responsabilidade.
A aplicação da teoria foi aceita, Aaron Salomon foi condenado ao
pagamento das dividas da empresa, mesmo tendo postulado pela autonomia da
pessoa jurídica, porém a sentença foi reformada pela House of Lordes, sob o
argumento de que a companhia foi constituída de forma válida e lícita.
Segundo Piero Verrucoli o caso Salomon influenciou de forma negativa a
disregard doctrine, pois a jurisprudência inglesa preservou o privilégio da
personificação da pessoa jurídica, permitindo o uso da desconsideração somente
em casos extremos25. O que foi contrário ao pensamento do doutrinador italiano,
que sustentava que pelo fato da personalidade jurídica constituir um privilegio que o
Estado concede aos membros da pessoa jurídica, sendo esta centro de imputação,
não poderá servir esse mesmo privilégio a fins contrários ao Direito. 26
No Direito Alemão, o jurista que defendeu essa teoria foi Rolf Serick, que na
década de 50 passou a estudar casos sobre o tema, nominando a teoria como
“durchgriff der juristichen personen”, ele estabeleceu a sistematização da teoria da
desconsideração da personalidade jurídica em três pressupostos, quais sejam :
a pessoa jurídica quando manipulada, se agir abusivamente, fugindo às obrigações legais ou contratualmente assumidas, lesando terceiros, é
25 Apud BRUSCHI,Op.cit., p.15. 26 Apud FREITAS,Op.cit., p.64.
simplesmente posta de lado, descartada.Entretanto, se não houver abuso, não há que se cogitar de desconsideração; o princípio da autonomia da pessoa jurídica deve prevalecer, repudiando-se qualquer forma de desvirtuamento ou má utilização.Somente se houver a ocorrência de ilicitude, é que pode haver a desconsideração da personalidade jurídica; as normas jurídicas aplicáveis aos indivíduos isoladamente considerados, são em tese também aplicáveis à pessoa jurídica;nos negócios em que são partes a pessoa jurídica e seus integrantes, deve haver nítida distinção e plena identidade entre eles.27
Rolf Serick estabeleceu a relatividade da autonomia da pessoa jurídica,
demonstrando que é possível derrogar esse principio, conforme se constata nesta
citação:
(...) embora, via de regra, se deva partir do principio que a pessoa jurídica se conserva nitidamente distinta de seus membros, este principio é, em diversos modos, derrogado.Se trata de derrogação que não infirmam, em termos gerais, o principio da autonomia subjetiva da pessoa jurídica, mas que todavia permitem que, em casos particulares, verificando-se determinados pressupostos, se distancie do principio referido.28
No Brasil a teoria da desconsideração da personalidade jurídica teve como
um de seus precursores, o doutrinador Rubens Requião, o qual por influência do
alemão Rolf Serick, construiu a teoria no direito brasileiro, como sendo “ aquela que
autoriza o juiz a ignorar a autonomia patrimonial da pessoa jurídica em relação às
pessoas que a compõem, sempre que se utilizar a entidade jurídica para fraude e
abuso de direito” 29.
Desta forma, o doutrinador, em seu primeiro artigo doutrinário em 1969,
apresentou ao direito pátrio, que é eminentemente romano-germânico e positivista,
para o qual a existência distinta entre a pessoa jurídica e seus membros era um
obstáculo ao desenvolvimento do tema, a inovadora teoria, segundo mostra o trecho
abaixo:
É preciso, para a invocação exata e adequada da doutrina, repelir a idéia preconcebida dos que estão imbuídos do fetichismo da intocabilidade da
27 Apud BRUSCHI,Op.cit., p.16. 28 Apud BRUSCHI,Op.cit .,p.17. 29 Apud BRUSCHI,Op. cit..,p.18.
pessoa jurídica,que não pode ser equiparada tão insolitamente à pessoa humana no desfrute dos direitos incontestáveis da personalidade; mas também não devemos imaginar que a penetração do véu da personalidade jurídica e a desconsideração da pessoa jurídica se torne instrumento dócil nas mãos inábeis dos que, levados ao exagero, acabassem por destruir o instituto da pessoa jurídica, construído através dos séculos pelo talento dos juristas dos povos civilizados.30
O Código de defesa do Consumidor, lei 8078/1990, foi um inovador
prevendo pela primeira vez a aplicabilidade da desconsideração da personalidade
jurídica, dirimindo qualquer dúvida a respeito da superação da autonomia da pessoa
jurídica.
Atualmente a incidência da desconsideração é prevista no direito tributário,
direito do trabalho, direito econômico, direito ambiental e até mesmo no direito de
família.
3.2 CONCEITO
A desconsideração da personalidade jurídica é uma teoria, que
desenvolvida no mundo inteiro, foi criada para que a pessoa jurídica, enquanto ente
jurídico, fosse preservada do mau uso, segundo Fábio Ulhoa Coelho:
A teoria da desconsideração foi criada exatamente para aprimorar a separação dos patrimônios, visando impedir a perpetração de fraudes e abusos de direito, que se consumam sob a proteção da figura da pessoa jurídica, sendo que ela simultaneamente tema intenção de preservar o instituto, mas no mau uso que se pode fazer dele e de se resguardar a própria pessoa jurídica que foi utilizada na realização de fraude, ao atingir nunca a validade de seu ato constitutivo, mas apenas a sua eficácia episódica.31
A teoria é um instrumento que possibilita a responsabilização daquele que
age de má-fé, preservando a existência e a integridade da pessoa jurídica, a
desconsideração não visa à dissolução ou despersonalização da pessoa jurídica,
mas a declaração de sua ineficácia para determinado efeito.
Na ação fraudulenta e abusiva da forma da pessoa jurídica, na sua
disfunção, é possível penetrá-la e quebrar a distinção e autonomia da pessoa 30 Apud BRUSCHI, Op.cit.,p.19. 31 Apud BRUSCHI,Op.cit., p29.
jurídica em relação aos sócios, para que o sócio praticante do ato seja
responsabilizado e não a sociedade em si, e se impeça o alcance de objetivos
escusos, conforme demonstram Rolf Serick e Rubens Requião :
Em se verificando o abuso da forma da pessoa jurídica, é facultado ao juiz a possibilidade de afastar o principio que estabelece a distinção entre a pessoa jurídica e os seus sócios, impedindo, assim, que seja alcançados o objetivo ilícito pretendido.32
(....) Com efeito, o que se pretende com a doutrina da disregard não é a anulação da personalidade jurídica em toda sua extensão, mas apenas a declaração de sua ineficácia para determinado efeito, em caso concreto, em virtude de o uso legítimo da personalidade ter sido desviado de sua legítima finalidade(abuso de direito) ou para prejudicar credores ou violar a lei (fraude).Se se abusa de uma sociedade para fins alheios a sua razão de ser,escreve o mesmo jurista, a disregard doctrine evita que o direito tenha que se sancionar tão temerária empresa.Com isto no fundo não se nega a existência da pessoa, senão que se preserva na forma com que o ordenamento jurídico a tem concebido.33
Desestima a doutrina esse absolutismo, perscruta através do véu que a encobre, penetra em se âmago, para indagar de certos dos sócios ou do destino de certos bens.Apresenta-se, por conseguinte, a concessão da personalidade jurídica com um significado ou um efeito relativo, e não absoluto, permitindo a legítima penetração inquinadora em seu âmago.34
3.3 NATUREZA JURÍDICA
A teoria da desconsideração da personalidade jurídica se define de modo
particular, pela não aplicação do princípio da autonomia patrimonial da pessoa
jurídica, em determinado caso concreto, o que se objetiva é a ineficácia da pessoa
jurídica e não a sua invalidade.
Quando fala-se em ineficácia, traduz-se este termo em uma ineficácia
relativa, ou seja, subjetiva, e está relacionada a uma disfunção e não a existência de
um vício.
Para os doutrinadores pátrios, o que se analisa não é somente a
objetividade do exercício de um direito contrário ao fim proposto, mas também a
intenção do agente de causar prejuízo à terceiro.
32 Apud BRUSCHI,Op.cit..,p.32. 33ApudGONÇALVES,Oksandro.Desconsideração da Personalidade Jurídica.1.ed.Curitiba:Juruá,2006. 34 FREITAS,Op.cit.,p.86.
Em sua forma o ato cumpre os seus requisitos de validade e produz efeitos,
porém não os produz ilimitadamente perante terceiros, pois a ineficácia se dá
perante pessoa determinada, ou seja, a teoria se dá, porque, segundo Marçal Justen
Filho,”o particular não está autorizado a frustrar a realização da função social de que
são dotados todos os poderes jurídicos” 35
Desta forma, vislumbra-se que a aplicação da teoria constitui-se em um ato
jurídico de natureza processual.
É uma teoria autônoma, em que a intenção do agente é um requisito de
importante relevância, mas que não pode ser analisado isoladamente, no qual o
regime jurídico é alterado em relação aos sujeitos envolvidos na prática do ato
inquinador da desconsideração, prevalecendo a eficácia da pessoa jurídica perante
as demais pessoas não envolvidas na relação declarada ineficaz, que a teoria
constitui-se em uma exceção à regra segundo demonstram Rubens Requião,
Gilberto Bruschi e Luciano Amaro, que lecionam:
Ao definir a sua natureza jurídica, esclarece que a disregard doctrine não visa anular a personalidade jurídica, mas somente objetiva desconsiderar, no caso concreto, dentro de seus limites, a pessoa jurídica, em relação às pessoa ou bens que atrás dela se escondem.É o caso da declaração de ineficácia especial da personalidade jurídica para determinados feitos, prosseguindo, todavia,a mesma incólume para seus outros fins legítimos36
Devemos interpretar a natureza jurídica da desconsideração como uma forma de recusa aos efeitos do ato constitutivo societário, para aquele caso concreto especificamente, mantendo-se no mais e ante aqueles que nada tem a ver com o fato, perfeitamente válido e plenamente eficaz, tendo em vista que somente irá tornar relativamente ineficaz a pessoa jurídica.37
É uma técnica casuística (e, portanto de construção pretoriana) de solução de desvios de função da pessoa jurídica, quando o juiz se vê diante de situações em prestigiar a autonomia e a limitação de responsabilidade da pessoa jurídica implicaria sacrificar um interesse que ele reputa legítimo.São, portanto, situações para as quais na lei não contemplaria uma solução justa, ou melhor, seria injusta a solução decorrente da aplicação do preceito legal expresso.38
35 Apud FREITAS, Op.cit., p.91. 36 Apud BRUSCHI,Op.Cit., p.37. 37 BRUSCHI, Op.cit., p.37. 38 Apud FREITAS,Op.cit., p.97.
Segundo Ascarelli a pessoa jurídica, e a existência de uma sociedade não
podem servir para alcançar escopo ilícito, não pode servir para burlar as normas e
as obrigações que dizem respeito aos seus sócios.
A desconsideração da pessoa jurídica não visa negar sua existência, ao
contrário, para Serick: “Quem nega a sua personalidade é quem abusa dela. Quem
luta contra semelhante desvirtuamento, afirma tal personalidade”39.Conforme julgado
do Tribunal de Alçada Civil de São Paulo:
A assertiva de que a pessoa da sociedade não se confunde com as pessoas dos sócios é um principio jurídico, mas não pode ser um tabu, a entravar a própria ação do Estado, na realização de perfeita e boa justiça, que outra não é a atitude de juiz procurando esclarecer os fatos para ajustá-los ao direito.40
3.4 A TEORIA NO DIREITO COMPARADO
3.4.1 França
O ordenamento jurídico Francês também aderiu ao combate dos desvios da
personalidade jurídica, adotando a teoria da desconsideração da pessoa jurídica, em
seu arcabouço jurídico.
A França tem como dispositivo legal que admite a teoria a Lei nº 67.573, de
julho de 1967, a qual nos artigos 99 e 101, permite ao juiz, nos feitos de falências e
concordatas, quando o sócio abusa em interesse próprio da sociedade deficitária,
que se penetre no seu patrimônio.
A desconsideração da pessoa jurídica aplica-se nos casos de simulação,
aparência e interposição de pessoas, se a pessoa jurídica for utilizada para prática
de atos de interesse pessoal, o patrimônio pessoal do dirigente de direito ou de fato
será atingido, mesmo que a pessoa jurídica esteja em concordata ou tenha falido, o
39 Apud KOURY,Op.cit., p.89. 40 Apud KOURY,Op.cit., p.68.
dirigente também é responsabilizado pela insuficiência do ativo para pagamento do
passivo.
Segundo a análise de Pierre Colombel, a característica fundamental da
Corte Francesa está em reconhecer “o principio da autonomia da pessoa jurídica,
porém, não considerar essa autonomia” 41.
A aplicação da teoria depende do exame individual de cada caso concreto,
em razão da França não possuir um conjunto sistematizado de normas.
3.4.2 Argentina
A doutrina da desconsideração da personalidade jurídica para os
argentinos é chamada de “desestimación ou penetración de la personalidade de las
sociedades”, de acordo com a jurisprudência a aplicação da teoria se dá de forma
subjetiva, e incidem em grupos de empresas, os doutrinadores argentinos aceitam a
comunicação de responsabilidade entre controladores e controladas.
Dobson um dos defensores do tema no Direito Argentino, sintetizou três
posicionamentos doutrinários acerca do tema, porém apenas dois foram
consagrados, e dispõem que:
A existência do controle não permite que se conclua pela unidade econômica entre dominante e dominada, havendo necessidade de que os atos celebrados entre elas possam ser considerados como anormais ou irregulares, ou seja, prejudiciais aos interesses da controlada; O critério atributivo de responsabilidade deve ser o desvio do objeto social da controlada por parte da controladora.42
A regulamentação legal da teoria na Argentina se deu em 1972, porém é
1971, o caso SWIFT DE LA PLATA,arcou os julgados, nesse caso a empresa Swift
de la plata, enfrentando sérias dificuldades, propôs concordata aos seu credores.
41 Apud BRUSCHI,Op.cit., p.46. 42 Apud KOURY,Op.cit., p.134.
Embora estes tivessem aceito o pedido, o juiz verificando que a empresa
integrava um grupo econômico,grupo Deltec,rechaçou a concordata e aplicou a
Diregard doctrine, estendendo a falência da Swift a todo o grupo.
A aplicação da teoria é importante, principalmente quando o caso envolve
créditos trabalhistas, conforme demonstra o artigo 31 da Lei nº 21.297/76, que tem a
seguinte redação:
Art.31 - Sempre que uma ou mais empresas, embora tenham cada uma delas personalidade jurídica própria, estiverem sob a direção, controle ou administração de outras, ou de tal modo relacionadas que constituam um conjunto econômico de caráter permanente, serão para os fins das obrigações contraídas por cada uma delas com seus trabalhadores e com os organismo de seguridade social solidariamente responsáveis, quando tenham ocorrido manobras fraudulentas ou direção temerária.43
3.4.3 Itália
As manifestações doutrinárias sobre o tema, no direito italiano, são de
grande importância para o aprimoramento da teoria no mundo inteiro, Tullio Ascarelli
e Piero Verrucoli, são disseminadores da teoria na Itália.
Na visão de Verrucolli a aplicação da desconsideração da personalidade
jurídica, consiste em um instrumento de interesse direto do próprio Estado nas
relações tributárias, na repressão da fraude à lei, fraude contratual e da realização
de interesses de terceiros.
Para Ascarelli, a teoria tem seu fundamento de incidência no abuso de
direito, negócio simulado e na boa fé, o doutrinador conceitua negócio simulado
como sendo:
Aquele em que o negócio visado não é, afinal, o normalmente realizado através do negócio adotado, mas um escopo diverso, muitas vezes análogo àquele de outro negócio ou sem forma típica própria no sistema jurídico.44
43 Apud KOURY,Op.cit., p.136. 44 Apud BRUSCHI,Op.cit., p.47.
3.4.4 Portugal e Espanha
Em Portugal a teoria também foi disseminada, Antunes Varela e Ferrer
Correia, foram os primeiros a elaborarem pareceres sobre o assunto, influenciados
por Gierke e Serick, os portugueses sustentaram o entendimento de que “a veste da
pessoa jurídica atribuída às sociedades comerciais é muito frágil, e não pode ser
instrumento criado para fins de direito e sirva para negar o direito”45.
A separação sociedade – sócio não pode ser invocada para legitimar
soluções contrárias à lei, ao contrato e a boa fé, para produzir abuso de direito e
fraude.
A Espanha também acompanha o entendimento dos portugueses, o objetivo
da teoria para eles é evitar a fraude à lei e aos contratos. A doutrina espanhola
admite que o capital social se concentre nas mãos de um único sócio, sendo a
sociedade subsistente até que volte a pluripessoalidade, não havendo prazo para
isso, e não constituindo abuso ou fraude, tal atitude.
45 Apud BRUSCHI,Op.cit., p.49.
4. EXECUÇÃO
4.1 CONCEITO E HISTÓRICO
A execução é uma das fases do processo judicial, que tem por objetivo fazer
cumprir o disposto em sentença ou em um título extrajudicial.
Segundo Vicente Greco Filho, “é o conjunto de atividade atribuídas aos
órgãos judiciários para realização prática de uma vontade concreta da lei
previamente consagrada em um título.”46 Dessa forma, a execução vem fazer
cumprir o que foi estabelecido no processo de conhecimento ou cautelar,
possibilitando que a regra sancionadora presente na sentença ou no título produza
efeitos em razão da não efetivação do direito líquido e certo do credor .
Conforme leciona Paulo Lúcio Nogueira, “o objeto da execução é a
composição da obrigação devida ou contraída, tendo o devedor de responder com
todos os seus bens presentes e futuros para o cumprimento de suas obrigações.”47
Desta forma,o Estado Juiz, provocado pelo credor,age para que o devedor seja
responsabilizado patrimonialmente, dado o seu inadimplemento voluntário.
O processo executório é um procedimento que remonta ao Direito
Romano.Naquele período a execução incidia diretamente sobre a pessoa do
devedor, podendo ser esse vendido pelo credor, esquartejado, perder a condição de
46 GRECO FILHO,Vicente.Direito Processual Civil.São Paulo: Saraiva, 1997, p.08. 47 NOGUEIRA,Paulo Lúcio.Curso Completo de Processo Civil.. 6.ed.São Paulo: Saraiva,1995, p .386.
cidadão romano e sua liberdade, transformando-se em coisa, em virtude de seu
inadimplemento.
A primeira forma de execução patrimonial foi a pignoris capio, que consistia
na apreensão dos bens do devedor, podendo o credor até destruí-los, e o devedor
se livrar da execução com o pagamento, ou com a nomeação de uma pessoa que
aceitasse o débito.
Posteriormente, no período formulário surgiu a missio in bona, que era a
apreensão universal de todos os bens do devedor, aparecendo o comprador, os
bens eram vendido e o comprador tornava-se sucessor do devedor.
No terceiro período, chamado de cognitio extra ordinem, nasce a pignus in
causa judicati captum, que era a apreensão de bens para serem vendidos até o
limite do crédito, e essa venda era realizada pelo credor, havendo mais de um
credor exequente, tinha preferência o que apreendesse primeiro os bens.
Após a queda da Roma Ocidental, na Europa, o que prevalecia era o direito
intermédio, de execução violenta e coercitiva sobre o devedor, inexistia distinção
entre responsabilidade civil e penal, entre cognição e execução.Passado algum
tempo renasce a actio judicati, a execução por juros posteriores a sentença ou para
a execução de sentença ilíquida, sendo a sentença líquida executada por
determinação do juiz como complemento da cognição.
Em Portugal, no período das ordenações, a execução era estatal. A
preferência na execução era de quem primeiro penhorava os bens do devedor, não
sendo conhecidos os títulos extrajudiciais, sendo a execução sempre precedida de
um processo de conhecimento. A primeira norma jurídica a tutelar a execução foi o
regulamento 737 e 738, logo após veio o código de 1939.
Atualmente, o código vigente disciplina a execução como um procedimento
autônomo, cognição e execução formam a estrutura do processo civil. São aliadas,
porém independentes, que não se confundem mas se diferem. A cognição segundo
Humberto Theodoro, “busca a solução, enquanto a execução vai em rumo à
realização das pretensões” 48, não sendo portanto, nem integrante do processo de
conhecimento, nem uma seqüência necessária dele.
E esta autonomia se dá pelos seguintes motivos:
• Porque o processo de conhecimento em muitos casos é suficiente
para a satisfação completa do litígio, exaurindo-se sem a necessidade de se
utilizar do processo de execução;
• Porque o processo de execução não depende, nem pressupõe o
processo de conhecimento, os títulos executivos extrajudiciais possibilitam
que se utilize diretamente do processo executório, sendo desnecessário
passar pelo procedimento cognitivo.
Mesmo com a reformulação do Código de Processo Civil, que promoveu
alterações no processo executivo, principalmente no que tange ao reconhecimento
do direito a receber coisa ou quantia certa, a qual estabeleceu que havendo
processo de conhecimento e sentença reconhecendo tal direito, torna-se
desnecessário recorrer-se ao processo de execução, visto que a realização do
direito se dá no próprio processo de conhecimento que produziu a sentença
condenatória.
Desta feita, cumpre ressaltar que ainda assim, persiste a autonomia do
processo de execução, pois conforme leciona Humberto Theodoro, “o que se dá no
processo de conhecimento após a prolação da sentença são atos executivos de
realização material e satisfação da obrigação adquirida, e não um processo
executivo, o qual é uma relação processual específica que visa à execução de atos
que levem ao cumprimento da obrigação assumida, firmada em um título executivo
extrajudicial”. 49
48 THEODORO JÚNIOR,Humberto.Curso de Direito Processual Civil-Processo de Execução e Cautelares.Rio de Janeiro:Forense,2006,p.123.. 49 Ibid., p.124.
4.2 EXECUÇÃO POR QUANTIA CERTA CONTRA DEVEDOR SOLVENTE: SUA
CONCEITUAÇÃO E FINALIDADE
A execução por quantia certa contra devedor solvente consiste em um
procedimento que pretende a obtenção da satisfação de um crédito em pecúnia, o
qual recai sobre um devedor que possui bens suficientes para garantir o pagamento
do débito, ou seja, “sobre aquele cujo patrimônio apresenta ativo maior do que o
passivo”50.
A obrigação assumida nesse caso, está expressa em título executivo
extrajudicial que estabelece uma importância em valor monetário, não importando se
a origem do título é contratual ou extracontratual, se advém de um negócio jurídico
unilateral ou bilateral.
Ao assumir uma obrigação, o devedor se responsabiliza pelo seu
cumprimento voluntário, em caso de inadimplemento a responsabilidade recairá
sobre o patrimônio do devedor, e isso ocorre quando o credor se utiliza da execução
forçada, da execução por quantia certa.
A execução por quantia certa envolve as obrigações de pagar e tem por
objetivo, “expropriar bens do devedor, o devedor ao ajuizar a ação pretende que
sejam praticados atos instrumentais, a fim de satisfazer o direito do credor” 51, o que
se pretende é o pagamento coativo da dívida firmada em um título executivo, desde
que não produza uma onerosidade excessiva ao devedor, conforme artigo 620 do
Código de Processo Civil.
4.3 A PROCESSUALIDADE DA EXECUÇÃO POR QUANTIA CERTA
Os atos fundamentais da execução por quantia certa são a adjudicação,
penhora, a alienação e o pagamento ou o usufruto.
50Ibid, p.265. 51 GRECO FILHO,Vicente.Direito Processual Civil.São Paulo: Saraiva, 1997, p.70.
O processo executivo inicia-se com a provocação do credor, por meio de
uma petição inicial devidamente redigida nos termos do artigo 282 do Código de
Processo Civil.
Instruída com o demonstrativo de débito atualizado na forma do artigo 652 §
2º do Código de Processo Civil, podendo o credor indicar na inicial os bens a serem
penhorados, visto que não é mais prerrogativa do executado a nomeação de bens à
penhora, postula o exequente a citação do devedor para que pague no prazo de três
dias, ou embargue no prazo de quinze dias, contados da juntada aos autos do
mandado de citação.
Acolhida a petição inicial pelo juízo competente, esse determinará a
expedição de mandado executivo, citando o devedor para que pague, nos termos do
artigo 652 do Código de Processo Civil, no prazo de três dias.
Neste momento, o devedor é convocado para cumprir a determinação, e
não para defender-se, visto que o processo executório não almeja o contraditório, e
nem possui essa natureza.
Não efetuado o pagamento, o oficial de justiça procederá imediatamente a
penhora de bens e a sua avaliação, lavrando-se auto dos respectivos atos,
intimando na mesma ocasião o executado da penhora efetuada.
Porém, a possibilidade trazida para a prática de tais atos, não impede que o
juiz de ofício, ou a requerimento do exequente, intime o executado para que indique
bens passíveis de penhora.
A intimação da penhora será realizada a pessoa do advogado do
executado, não havendo advogado, se procederá a intimação pessoal do mesmo.
Caso o executado não seja encontrado para que seja intimado da penhora,
o oficial de justiça certificará as diligências realizadas, podendo o juiz neste caso,
dispensar a intimação ou determinar novas diligências.
Ao despachar a inicial o juiz fixará o valor dos honorários advocatícios a
serem pagos pelo devedor.Tendo o devedor efetuado o pagamento no prazo de três
dias, ficam reduzidos a metade os valores de honorários advocatícios fixados pelo
juiz.
Não tendo localizado o devedor, o oficial de justiça poderá realizar o arresto,
e assim arrestar tantos bens quantos bastem para garantir a execução.
Conforme disposição do artigo 653 do Código de Processo Civil, realizado o
arresto, o oficial de justiça deverá procurar o devedor por três vezes consecutivas
em dias distintos, não o encontrando, certificará os acontecimentos.
Após, o credor será intimado do mesmo e terá o prazo de 10 dias, contados
da intimação, para requerer a citação por edital do devedor, ao qual será dado novo
prazo para pagamento, não havendo a manifestação do devedor no prazo
estabelecido no edital, o arresto será convertido em penhora.
A penhora é um ato executivo de afetação e apreensão de bens, ela vincula
os bens à execução, e torna sua eventual alienação, fora do processo judicial,
ineficaz ou irrelevante para a execução.
Por meio dela o credor obtém o direito de preferência processual sobre os
bens, desapossando-o diretamente do devedor, sua finalidade é a individuação e
preservação dos bens, ademais à disposição do devedor dos bens constritos
representa fraude à execução, e torna qualquer ato negocial ineficaz em relação ao
credor. Humberto Theodoro preleciona que:
Sua imediata conseqüência, de ordem prática e jurídica, é sujeitar os bens por ela alcançados aos fins da execução, colocando-os a disposição do órgão judicial, para à custa e mediante sacrifício desses bens, realizar o objetivo da execução, que é a função pública de dar satisfação ao credor.52
52 Op.cit.,p..270.
Além, dos efeitos acima mencionados, segundo Misael Montenegro Filho, a
penhora é condição sine qua non para oposição dos embargos, visto que:
A ausência da penhora revela a própria inexistência do interesse de agir, no que se refere a oposição dos embargos, em vista de não ser necessária a irresignação do devedor, por não ter assistido à invasão do seu patrimônio por atos de sujeição.53
Realizada a penhora dos bens, e sendo esses depositados, procede-se a
lavratura de um termo processual, surgindo para o devedor indisponibilidade dos
bens afetados pela execução em relação ao exeqüente, conforme leciona Lopes da
Costa “a penhora torna ineficaz em relação ao exeqüente os atos de disposição
praticados pelo executado sobre os bens penhorados”54.
Para o credor penhora significa a especificação dos bens sobre os quais ele
pode exercer o seu direito, passando a ter sobre ele preferência.
Em relação a terceiros, se o crédito ou o bem executado atingido pela
penhora estiver sob a posse de terceiro, fica este obrigado a obedecer a constrição
judicial, e todo e qualquer terceiro deve se abster de negociar com o executado o
bem penhorado.
A penhora ou a indicação de bens à penhora deve recair sobre os seguintes
bens, e na respectiva ordem, quais sejam: dinheiro, veículos, bens móveis em geral,
bens imóveis, navios e aeronaves, ações e quotas de sociedades empresariais,
percentual do faturamento da empresa devedora, pedras e metais preciosos, títulos
da dívida pública da União ou dos Estados, títulos e valores mobiliários que tenham
cotação em mercado, e outros direitos.
A penhora obedecerá aos requisitos legais dispostos no Código de
Processo Civil, obedecendo-se às peculiaridades de cada tipo.
53 MONTENEGRO FILHO,Misael.Curso de direito processual civil,volume2.3.ed.São Paulo: Atlas,2006.p.435. 54 Ibid., p.272.
A penhora não poderá recair sobre os respectivos bens: os bens
inalienáveis e os declarados por ato voluntário não sujeito à execução; os móveis
pertences e utilidades domésticas que guarnecem a residência do executado, salvo
os de elevado valor ou que ultrapassem as necessidades comuns correspondentes
a um médio padrão de vida; os vestuários, bem como pertences de uso pessoal,
salvo se de elevado valor; os livros , máquinas e instrumentos, ou outros bens
móveis necessários ao exercício de qualquer profissão; o seguro de vida; os
materiais necessários a obras em andamento, salvo se essas forem penhoradas; a
pequena propriedade rural trabalhada pela família; os recursos públicos recebidos
por instituições privadas pra aplicação obrigatória em educação, saúde e assistência
social; até o limite de quarenta salários mínimos depositado em caderneta de
poupança, na falta de outros bens podem ser penhorados os frutos e rendimentos
dos bens inalienáveis, salvo se destinados a prestação de alimentos.
O juiz poderá de oficio, ou a requerimento do exeqüente, determinar a
qualquer tempo a intimação do executado pra que indique bens passíveis de
penhora.
Ao indicar os bens, o devedor deverá fazê-lo diretamente ao juiz por meio
de petição a ele dirigida.É dever legal do executado, no prazo fixado pelo juiz,
indicar onde se encontram os bens sujeitos à execução e exibir a prova de sua
propriedade, será concedido prazo de dez dias,após ser intimado, para que o
devedor manifeste se deseja que os bens penhorados sejam substituídos, desde
que comprove que a substituição não trará prejuízo ao exequente e será menos
gravosa ao devedor.
A penhora considera-se realizada com a apreensão, avaliação e o depósito
dos bens, e a conseqüente lavratura do auto de penhora que conterá todas as
informações pertinentes aos bens apreendidos.O depósito obedecerá às disposições
do artigo 666 do Código de Processo Civil, podendo permanecer depositado nas
mãos do executado, somente nos casos de difícil remoção ou com a expressa
anuência do exequente.
Uma vez realizada a apreensão, avaliação e penhora, dá-se início ao
processo de expropriação dos bens, que pode ser feita pela adjudicação, a qual
ocorre quando o exequente não oferecendo preço inferior ao da avaliação, requer
que lhe sejam adjudicados os bens penhorados, ou seja, que os bens passem a sua
posse e domínio, não sendo os bens adjudicados poderá o credor requerer que os
bens sejam alienados por sua própria iniciativa ou por intermédio de corretor
credenciado ao juízo.
Não se realizando a alienação particular, será expedido edital de hasta
pública para realização da praça ou leilão, a alienação pública deverá cumprir as sua
formalidades legais para que produza os efeitos necessários.
Ultrapassada a fase dos embargos, se o bem penhorado não consistir em
dinheiro, proceder-se-á a alienação judicial do bem ou bens em hasta pública, por
meio da arrematação, que consiste de um ato de expropriação executiva, para que
com a venda do bem se obtenha o valor monetário desejado.
Segundo Humberto Theodoro “a arrematação é um ato de desapropriação,
ou seja, ato processual de soberania do Estado, que pelo órgão judicial expropria os
bens do executado”55.
Mas para que se realize a arrematação, é necessário um ato preparatório
anterior a ela, que é a avaliação, cujo objetivo é estimar o valor aproximado dos
bens que serão levados à hasta, e torná-lo público.
A avaliação é produzida por um avaliador judicial ou perito nomeado pelo
juízo, a avaliação só não será efetivada se o credor aceitar a estimativa feita na
nomeação de bens, se se tratar de títulos ou de mercadorias que tenham cotação
em bolsa de valores, ou se os bens forem de pequeno valor.
O avaliador ao concluir seus trabalhos deverá apresentar um laudo em dez
dias, descrevendo os bens e seus respectivos valores.
55 Op.cit.,p..314.
Logo após, é concedido prazo às partes para se manifestarem quanto ao
laudo, que pode ser impugnado, porém a decisão judicial é sumária no que tange a
qualquer argüição.
Resolvida a impugnação, ordenará o juiz que se publique os editais de
praça ou leilão.
O edital de praça ou leilão será publicado com pelo menos cinco dias de
antecedência da hasta pública, é afixada cópia nos átrios do fórum, cópia e certidão
de afixação são juntadas aos autos, é publicado resumo do edital em jornal de
grande circulação local.
Cumpridos os requisitos de publicação dos editais, o devedor obterá
conhecimento da hasta pública por meio de seu advogado, se não o tiver, por meio
de mandado, carta registrada, edital ou outro meio idôneo.
Realizada a venda judicial, considera-se arrematante o licitante que deu
maior lance, sendo aquele ao qual o juiz transfere a propriedade do bem, só pode
arrematar em hasta pública aquele que estiver na livre administração de seu bens,
sendo, portanto agente capaz.O exequente pode licitar, não podendo participar do
certame as pessoas descritas no artigo 690 –A do Código de Processo Civil, quais
sejam:
É admitido a lançar todo aquele que estiver na livre administração de seus bens, com exceção: I - dos tutores, curadores, testamenteiros, administradores, síndicos ou liquidantes, quanto aos bens confiados a sua guarda e responsabilidade;
II - dos mandatários, quanto aos bens de cuja administração ou alienação estejam encarregados; III - do juiz, membro do Ministério Público e da Defensoria Pública, escrivão e demais servidores e auxiliares da Justiça Parágrafo único. O exeqüente, se vier a arrematar os bens, não estará obrigado a exibir o preço; mas, se o valor dos bens exceder o seu crédito, depositará, dentro de 3 (três) dias, a diferença, sob pena de ser tornada
sem efeito a arrematação e, neste caso, os bens serão levados a nova praça ou leilão à custa do exeqüente. 56
A arrematação far-se - á em dinheiro à vista, ou no prazo de quinze dias,
mediante caução idônea, se o arrematante ou seu fiador não efetuar o pagamento
no prazo estabelecido, a perda da caução será posta em favor do exeqüente,
voltando os bens a nova praça ou leilão, dos quais não poderão participar os
remissos.
Efetuado o leilão ou a praça, produz-se imediatamente o auto de
arrematação, o qual retrata as condições em que o bem foi alienado.
Posteriormente com a ordem judicial da entrega do bem e depois de
prestados o depósito ou a garantia pelo arrematante, procede-se a tradição ou
transferência por meio da carta de arrematação, tornando-se o ato perfeito, acabado
e irretratável, sendo portanto, transferido o domínio e posse do bem ao arrematante,
o dinheiro depositado ocupa o lugar dos bens arrematados, entra provisoriamente
para o patrimônio do executado e vincula-se a penhora.
Por fim, estando depositado o dinheiro, o juiz autoriza que o credor levante
o valor de seu crédito, no valor suficiente pra cobrir a importância principal e seus
acessórios, juros, custas e honorários.
Porém, a entrega do dinheiro não é a única forma de satisfazer os direitos
do credor, podendo ser dada ao credor à adjudicação dos bens penhorados ou o
usufruto do bem imóvel ou de empresa, essas duas possibilidades só ocorrerão se
tornar inviável o pagamento em dinheiro, ou se houver a frustração da arrematação
dos bens penhorados.
A adjudicação consiste na expropriação do bem do devedor passando
diretamente para a posse e domínio do credor, fora da arrematação, o que depende
56BRASIL.Lei 5869/73.Código de Processo Civil.Diário Oficial da República Federativa do Brasil.Brasília, 17 de janeiro de 1973.Disponível em: www.planalto.gov.br.Acesso em : 24/ 04//07. .
da provocação do credor e da sua manifestação em receber o bem in natura, para
que ocorra a adjudicação, o preço oferecido pelo credor não pode ser inferior ao da
avaliação.
Já o usufruto do imóvel ou móvel, pode ser concedido judicialmente quando
o juiz reputar ser esta alternativa menos gravosa para o executado, e mais eficiente
para tornar possível o pagamento do crédito, o usufruto durará até que o exeqüente
receba o principal, juros, custas e honorários advocatícios, o usufruto pode ser
requerido pelo credor antes que se realize a praça de imóvel penhorado.
Independentemente de penhora, depósito ou caução, o executado poderá
opor-se a execução por meio dos embargos.
Os embargos segundo Misael Montenegro Filho, trata-se de “uma ação
incidental autônoma, que objetiva desconstituir os elementos de liquidez,
exigibilidade e certeza do título executivo”.57 Nesta mesma linha de pensamento,
assevera Alexandre Freitas Câmara que:
os embargos do executado são, pois, processo autônomo, incidente à execução, de natureza cognitiva, dentro do qual se poderá apreciar a pretensão manifestada pelo exeqüente, para o fim de verificar se a mesma é procedente ou improcedente.58
Os embargos serão oferecidos no prazo de quinze dias, contados a partir
da juntada aos autos do mandado de citação, e serão distribuídos por dependência
em autos apartados, os mesmos não mais possuem efeitos suspensivos, ou seja,
impedindo que atos sejam praticados nos autos da ação principal até que se julgue
os embargos, pois o modelo anterior dava um caráter protelatório aos embargos.
Atualmente eles só produzirão este efeito a requerimento do
embargante/executado; quando ficar demonstrado que o prosseguimento da
execução pode causar ao executado grave dano de difícil ou incerta reparação, ou
seja fumus boni júris e periculum in mora, desde que a execução já esteja garantida
57 Op.cit.,p.446. 58 CÂMARA, Alexandre Freitas.- Lições de Direito Processual Civil. vol. II. Editora Lumen Juris. Rio de Janeiro: 2005, p. 399
por penhora, depósito ou caução suficientes, porém a concessão destes efeitos não
impedirá a efetivação de penhora e avaliação.
Caso não tenha ocorrido, isto se refere a segurança do juízo, também
poderá se atribuir efeito suspensivo aos embargos nas hipóteses do artigo 739-M do
Código de Processo Civil.59FPT
Recebidos os embargos, o exequente será ouvido no prazo de quinze dias,
em seguida o juiz julgará o pedido ou designará audiência de conciliação, instrução
e julgamento, proferindo no prazo de dez dias a sentença.
59 FERREIRA, Reinaldo Alves. Dos embargos do executado à luz da Lei nº 11.382/2006. Boletim Jurídico,Uberaba/MG,a.5,nº218.Disponívelem:<http://www.boletimjuridico.com.br/doutrina/texto.asp?id=1767> Acesso em: 15/06/ 2007.
5.ARTIGO 50 DO CÓDIGO CIVIL
5.1 PRESSUPOSTOS E FINALIDADE
A lei 10.406/2002 alterou profundamente o Código Civil Brasileiro, mudando
o antigo ordenamento que vigia desde 1916, estas alterações trouxeram
modificações principalmente no que tange à pessoa jurídica e a sua autonomia.
Isto se deu com a admissão da Teoria da Desconsideração da
Personalidade Jurídica, que insculpida no artigo 50 do referido diploma, veio à baila
para prevenir e repelir os abusos concretizados à sombra da personalidade jurídica,
que é utilizada em muitas situações como um biombo, máscara, que oculta ações
não previstas em lei, conforme dispõe o próprio artigo, que diz:
Artigo 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.60
A regulamentação deste instituto ocorreu não para levar a pessoa jurídica à
extinção nem a sua despersonalização, mas para que os efeitos de determinadas
obrigações realizadas com abuso, confusão patrimonial e desvio de finalidade, seja 60 BRASIL. Lei 10.406/2002.Código Civil.Diário Oficial da República Federativa do Brasil.Brasília, 11 de janeiro de 2002. .Disponível em: www.planalto.gov.br. Acesso em:15/06/2007.
estendido aos sócios e administradores, suspendendo a autonomia da
pessoa jurídica momentaneamente e declarando a sua ineficácia em relação a
determinado caso concreto.
A teoria surgiu para obstaculizar as atividades subversivas que desviam dos
fins para os quais se criou a pessoa jurídica, sua finalidade é fortalecer o próprio
instituto, sendo instrumento de manutenção da pessoa coletiva e da subsistência e
restauração da sua integridade, conforme leciona João Baptista Galhardo Júnior e
Rubens Requião:
Levantando o manto da pessoa jurídica, a teoria da desconsideração penetra no âmago da sociedade, desconsiderando a personalidade distinta desta para determinados atos.Desta forma, impede que fraudes venham a ser cometidas pelos sócios com o intuito de locupletamento ilícito.Permite assim, que o Poder Judiciário despreze a autonomia patrimonial existente entre a sociedade e os sócios, responsabilizando-os pela obrigação assumida, sem, contudo, atingir os demais interesses que gravitam em torno da pessoa jurídica.61
a disregard doctrine não visa anular a personalidade jurídica, mas somente objetiva desconsiderar, no caso concreto, dentro de seus limites, a pessoa jurídica, em relação às pessoas ou bens que atrás dela se escondem.62
O Ministro Ruy Rosado de Aguiar, expressa que o legislador brasileiro
introduziu a teoria para que “a impunidade não reine absoluta em razão de fatos
ilícitos e antijurídicos praticados por pessoas naturais“.63Cumpre ressaltar que a
regulamentação da teoria, não significa que ela deixa de ser uma exceção à regra, e
que ela só incidirá na ocorrência dos seguintes pressupostos:
• Fraude à lei, aos contratos ou à transferência da titularidade da
sociedade; enfim, para o Ministro a fraude é um dos requisitos que
devem estar presentes no ato do agente para que o juiz empregue a
teoria da desconsideração;
61 Apud FERREIRA,Giovanini Comodaro.Desconsideração da Personalidade Jurídica e o Institutos da Fraude contra credores e da Fraude a Excecução.Diponível em: www.oneofito.com.br. Acessado em :15/06/2007. 62 Apud GARCIA.Ricardo Barison. A desconsideração da personalidade jurídica na concepção do Minstro Ruy Rosado de Aguiar, no I Congresso de Dierito Civil de Ribeirão Preto/SP.Acesso em:15/06/2007. 63 Apud GARCIA.Ricardo Barison. A desconsideração da personalidade jurídica na concepção do Minstro Ruy Rosado de Aguiar, no I Congresso de Dierito Civil de Ribeirão Preto/SP.Acesso em:15/06/2007.
• Abuso da proteção que a lei oferece à pessoa jurídica, quando sua
existência visa um fim ilícito, e quando a finalidade da empresa é
desviada.
A aplicação só pode ocorrer em sociedade na qual o exaurimento do
patrimônio social, não implica diretamente na responsabilização dos sócios, ou seja,
em sociedade anônima ou sociedade por quotas de responsabilidade limitada.
Pode ser requerida por qualquer que tiver sido violado por atos maculados
por abuso de direito, bem como pelo Ministério Público, mesmo quando ele não faça
parte do processo, a consecução da desconsideração é realizada pelo juiz, que só
atua mediante requerimento, não podendo atuar de ofício.64
5.1.1 Desvio de Finalidade e Abuso de Direito
Para que seja aplicada a teoria da Desconsideração da Personalidade
Jurídica, é necessário haver o abuso da personalidade, que consiste em utilizar-se
da pessoa jurídica como escudo, protegendo a personalidade física dos sócios.
Este abuso é caracterizado ou comprovado pelo desvio de finalidade ou
confusão patrimonial.
Sabe-se que para o surgimento legal do ente coletivo, pessoa jurídica, é
preciso haver a criação de um estatuto, o qual regulamenta a entidade criada,
estabelecendo seus objetivos, sua estrutura de comando e formação, sua finalidade,
subsistência, entre outros aspectos importantes relacionados.
Estes estatutos devem ser devidamente registrados em Cartório e Junta
Comercial competente, oficializando e atestando o nascimento no mundo legal e
jurídico da pessoa jurídica criada.
64PEIXOTO,MauricioCunha.Direito Societário Face ao Novo Código Civil. Disponível em:www.almg.gov.br. Acessado em: 15/06/2007.
Portanto os estatutos são a mola – mestra, o condutor da sociedade
criada.O desvio da finalidade se compõe quando os sócios e administradores, se
afastam dos princípios, regras e valores estabelecidos nos referidos estatutos ou
contrato social, tendo condutas atípicas, não previstas nos referidos normativos, se
desvirtuando da finalidade para a qual a sociedade foi criada.
Segundo Oksandro Gonçalves “ o abuso cometido é o abuso não permitido -
ou melhor não assumido pelo direito e pela comunidade.É a situação de excessiva
ofensa aos princípios jurídicos.” 65
Flávia Lefèvere Guimarães comenta que: “Assim, a sociedade não pode
praticar atos que não se adequem ao objeto social; que fujam do tipo de atividade
correspondente ao objeto.”66
Segundo Koury, o abuso de direito corresponde a um mau uso do
direito.Ou seja, ao exercício normal de um direito, estando o seu titular, todavia,
desviado do fim econômico-social para o qual aquele direito foi criado.
5.1.2 Fraude
Segundo a definição de Deocleciano Torrieri Guimarães, fraude é ”má-fé,
artifício malicioso, usado para prejudicar, dolosamente, o direito ou os interesses de
terceiro.”67 Marlon Tomazette e Alexander Couto lecionam que :
Fraude é o artifício malicioso para prejudicar terceiros, isto é, "a distorção intencional da verdade com o intuito de prejudicar terceiros". O essencial na sua caracterização é o intuito de prejudicar terceiros, independentemente de se tratar de credores.Tal prática a princípio é lícita , sua ilicitude decorre do desvio na utilização da pessoa jurídica, nos fins ilícitos buscados no manejo da autonomia patrimonial.68
65 Op.cit.,p.77. 66ApudGONÇALVES,Op.cit.,p.79. 67TORRIERI,DeoclecianoGuimarães.Dicionário Técnico Jurídico.5.ed.São Paulo: Rideel,2003.p.319. 68 TOMAZETTE, Marlon. A desconsideração da personalidade jurídica: a teoria, o CDC e o novo Código Civil. Jus Navigandi, Teresina, ano 6, n. 58, ago. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3104>. Acesso em: 17/06/ 2007.
Neste caso a fraude está diretamente relacionada à autonomia patrimonial
da pessoa jurídica.
O sócio não pode utilizar o ente coletivo para realizar atos de
desvirtuamento, contrários à lei, se olvidando por detrás da pessoa jurídica, visto
que ele pessoa física não responderá por determinação legal, pelas obrigações
realizadas em nome da pessoa jurídica. A fraude aqui está em seu sentido amplo, e
abarca a lei, credores e até componentes da pessoa jurídica.
Fábio Ulhoa Coelho, ilustra bem a figura da fraude no exemplo que se
segue:
Quando um comerciante aliena seu estabelecimento (trespasse), normalmente é imposta uma cláusula de não restabelecimento, isto é, se impõe ao alienante a obrigação de não se restabelecer fazendo concorrência ao adquirente. Trata-se de obrigação pessoa do alienante, que para se furtar ao cumprimento da mesma, poderia constituir uma pessoa jurídica, a qual sendo dotada de existência distinta, não seria imposto o não restabelecimento. Todavia, vê-se claramente neste particular um artifício para prejudicar o adquirente, isto é, uma fraude.69
Para Gilberto Bruschi, a fraude consiste em uma das espécies de desvio de
finalidade e está implícita nesta definição, como a seguir :
é indispensável imaginar-se que a pessoa jurídica venha a constituir-se para, dentre as sua finalidades, poder praticar atos fraudulentos em detrimento dos seu credores.Como não há autorização para tal prática em seu objeto social, se constitui em razão pela qual tal fraude se configura em desvio de finalidade70
Diferentemente descreve a ministra do STJ Fátima Nancy Andrighi, que
postula que a figura da fraude tanto pode estar no desvio de finalidade, como na
confusão patrimonial.
69 Apud TOMAZETTE, Marlon. A desconsideração da personalidade jurídica: a teoria, o CDC e o novo Código Civil. Jus Navigandi, Teresina, ano 6, n. 58, ago. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3104>. Acesso em: 17 jun. 2007. 70 BRUSCHI,Op.cit.,p.71,72.
5.1.3 Confusão Patrimonial
A confusão patrimonial se consagra quando não há separação entre
patrimônio societário e os bens pessoais, segundo Meneses Cordeiro:
“ a confusão patrimonial verifica-se quando, por inobservância das regras societárias, ou mesmo por qualquer decorrência objetiva, não fique clara, na prática, a separação entre o patrimônio social e o do sócio ou sócios.”71
A confusão patrimonial não é por si só um elemento justificador para
aplicação da teoria, é preciso existir o abuso funcional do ente coletivo visto que, se
houver pura e simplesmente a confusão patrimonial, existem outros meios para a
solução, que a pura e simples separação do patrimônio, mas se existe má-fé e
tentativa de burlar a lei, que impeça esta distinção, desta feita há sim fundamento
para aplicar-se a desconsideração, Marçal Justen Filho, dispõe que :
Mas a confusão patrimonial não é, em si mesma e necessariamente, indicadora da disfunção.Tratar-se , eventualmente, de uma conseqüência de um abuso na utilização da sociedade.Em outros termos, a confusão patrimonial será produto e , não, causa da utilização abusiva.Não será a confusão patrimonial que causa o resultado indevido ou insatisfatório, mas será corolário do abuso, cujas raízes se encontrarão em outros fatos. Portanto, a confusão patrimonial que ensejaria a desconsideração é aquela que reflita um abuso na utilização da personificação, pois o mau uso da pessoa jurídica não consiste na confusão patrimonial, mas a confusão patrimonial é(ou pode ser) uma decorrência do mau uso da pessoa jurídica.72
Logo, a confusão patrimonial é uma conseqüência do uso indevido da
pessoa jurídica, de uma atitude tirana.Para Fábio Konder Comparato:
a pessoa jurídica nada mais é, afinal, do que uma técnica de separação patrimonial.Se o controlador, que é o maior interessado na manutenção desse principio, descumpre-o na prática, não se vê bem por que os juízes haveriam de respeitá-lo, transformando-o, destarte, numa regra puramente unilateral.73
71 Apud BRUSCHI,Op.cit.,p.69. 72 Apud GONÇALVES,Op.cit.,p.80,81. 73 Apud GONÇALVES,Op.cit.,p.83.
5.1.4 Fraude contra Credores
A fraude contra credores trata-se de uma ação ilícita de burlar à lei e ao
dever, que toda pessoa tem de adimplir suas obrigações, e ocorre antes da
existência de um processo executório, em que o devedor na tentativa de se olvidar e
fugir às suas responsabilidades aliena ou transfere fraudulentamente o seu
patrimônio, comprometendo o pagamento do débito, tendo como único e exclusivo
intuito o prejuízo ao credor.
Na lição de Caio Mário da Silva Pereira , "a fraude contra credores ocorre
através de um ato de disposição de bens, com o fito de prejudicar credores, de
forma a reduzir o ativo patrimonial".74
Silvio Rodrigues ainda leciona que, “quando o devedor insolvente, ou na
iminência de tornar-se tal, pratica atos suscetíveis de diminuir seu patrimônio,
reduzindo, desse modo, a garantia que este representa, para resgate de suas
dívidas." 75
Observa-se que a transferência ou alienação deve colocar o devedor em
estado de insolvência, e deve causar prejuízo ao credor conforme leciona Misael
Montenegro Filho. Sabe-se que o direito de propriedade é inerente à pessoa, seja
ela física ou jurídica, e a ela é assegurado dispor de seu patrimônio.
O patrimônio constitui-se em uma garantia do credor, e o devedor só pode
dele se dispor, desde que não prejudique, nem lese a segurança do credor.
Para combater a fraude a credores, o ordenamento jurídico já disponibilizou
o mecanismo adequado, que é a ação pauliana, conforme disposição do artigo 158
do Código Civil, através da qual pleiteia-se uma sentença declaratória de anulação
da relação jurídica, seja de transferência ou alienação estabelecida entre o devedor
e terceiro, deixando de produzir efeitos perante o credor.
74 Op.cit.,p.367. 75 RODRIGUES,Silvio. Direito Civil: Parte Geral. 25. ed. São Paulo: Saraiva, 1995.p.228.
Porém, a existência do instrumento adequado, ação pauliana, não retira a
possibilidade de aplicação, pois para que seja utilizada a Ação Pauliana ou
Revocatória precisa existir uma relação negocial anterior, em que já ficam
estabelecidos os seus sujeitos, ou seja, credor e devedor, e que a atividade
fraudulenta seja posterior a constituição do débito, além do que, o devedor deve
estar em estado de insolvência ou na iminência de sê-lo.
Entretanto, a desconsideração da personalidade jurídica vai além disto, a
desconsideração alcança entes coletivos que já foram criados com objetivos
fraudatórios, nos quais os seus criadores fazem de suas práticas, uma maneira de
se manterem impunes, e de não serem chamados a cumprir com suas obrigações.
A teoria prescinde a estes requisitos exigidos na ação pauliana, conforme
leciona Misael Montenegro Filho “são o eventus damni prejuízo ao credor, e
consilium fraudis, ciência de que o ato de transferência está sendo realizado com
intuito de prejudicar o credor”76.
Sobretudo, a desconsideração tem caráter preventivo, pois antes que uma
relação negocial ou uma obrigação se firme, a desconsideração já pode ser
invocada obedecendo aos seus pressupostos, e pode ser aplicada com o decurso
do prazo prescricional, o que não ocorre para o ajuizamento da ação pauliana.
Conforme leciona Flávia Lefévre Guimarães,a teoria combate a impunidade,
preserva o ente coletivo e o credor,como se demonstra a seguir:
na hipótese de constituição de sociedade com o intuito, desde a origem, de fraudar os credores, ou da transmissão de bens da sociedade para os sócios ou vice-versa, chegaremos sempre à insolvência decorrente dos atos de alienação do patrimônio que deveria responder pelas obrigações assumidas.77
76 Op.cit.,p.374. 77 Apud FERREIRA, Giovanni Comodaro. A desconsideração da personalidade jurídica e os institutos da fraude contra credores e da fraude à execução . Jus Navigandi, Teresina, ano 6, n. 52, nov. 2001. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2456>. Acesso em: 20/06 2007.
5.2 TIPOS SOCIETÁRIOS ATINGIDOS
Quando se fala em sociedade na qual o exaurimento do patrimônio social
não implica diretamente na responsabilização dos sócios, refere-se diretamente a
dois tipos societários que são a Sociedade Anônima e a Sociedade por quotas de
responsabilidade limitada.
Leciona Fábio Ulhoa Coelho que as sociedades empresariais se classificam
de acordo com vários critérios, e um destes é o critério de responsabilidade dos
sócios pelas obrigações sociais.
Dentro deste grupo existem dois sub-grupos, em ambos os sócios
respondem subsidiariamente, nos termos do artigo 1024 do Código Civil que dispõe:
“ Os bens particulares dos sócios não podem ser executados por dívidas da sociedade, senão depois de executados os bens sociais”.78
No sub-grupo da responsabilidade ilimitada, se o patrimônio social não for
suficiente para adimplir com suas obrigações, os sócios responderão pelas
obrigações sociais até o limite em que seus patrimônios particulares alcançarem.
Se o patrimônio social não foi suficiente para integral pagamento dos credores da sociedade, o saldo do passivo poderá ser reclamado dos sócios, em algumas sociedades, de forma ilimitada, ou seja, os credores poderão saciar seus créditos até a total satisfação, enquanto suportarem os patrimônios particulares dos sócios.79
No sub-grupo da responsabilidade limitada, o sócio responde pelas
obrigações sociais no limite do capital subscrito, mas ainda não integralizado, de
78 BRASIL.Lei 10.406/2002 .Disponivel em: www.planalto.gov.br. Acesso em:20/06/2007 79 COELHO,Fabio Ulhoa.Manual de Direito Comercial.14.ed.São Paulo:Saraiva,2003.p.117.
maneira que um acionista não poderá ser responsabilizado pela não-integralização
de um outro.
Ao sócio de responsabilidade limitada nenhuma responsabilidade subsiste,
integralizada sua quota-parte, constituído o capital social ou o preço das ações
subscritas, fica totalmente a salvo seu patrimônio particular.Dentro deste sub-grupo
encontra-se o da Sociedade Anônima e da Sociedade Limitada.
A Sociedade Anônima disciplinada pelas Leis 6.404//76 e 9.457/97 constitui-
se em uma sociedade de capital, que é formada pelos títulos representativos da
participação societária, que são as ações livremente negociáveis, podendo ingressar
no quadro societário qualquer pessoa, sendo que nenhum acionista pode proibí-lo.
A característica maior é que o sócio ou acionista que é aquele detentor do
título representativo da ação, responde pelas obrigações sociais até o limite do que
falta para integralização, ou seja, responde pelo preço de emissão, sendo portanto a
responsabilidade das obrigações assumidas pelo ente coletivo limitada ao seu
patrimônio social.
O acionista não tem qualquer responsabilidade adicional, segundo Márcia
Regina Frigeri e Amador Paes Almeida:
“Integralizada que seja sua obrigação, nenhuma responsabilidade existira da sua parte, quer para com a sociedade, quer para com terceiros.”80
A sociedade por quotas de responsabilidade limitada, regulamentada pelo
Código Civil, tem a responsabilidade dos sócios limitada ao importe de sua quota,
mas todos subsidiariamente respondem solidariamente pelo total do capital social
subscrito e não integralizado, segundo a redação do artigo 1052 do Código Civil.
Desta feita, ao se constituir em sociedade limitada, todos os sócios tem sua
responsabilidade limitada a sua quota se o capital social todo estiver integralizado,
caso contrário, não havendo integralização total do capital social, todos responderão
80 ALMEIDA,Amador Paes.Execução de bens dos sócios.8.ed.São Paulo:Saraiva,2007.p.87.
solidariamente pelas obrigações da pessoa jurídica, conforme colaciona as
jurisprudências a seguir:
“O limite da responsabilidade é o capital social.Se o capital social for integralizado nenhum cotista pode ser compelido a fazer qualquer prestação.” (Rt,520/272)81
Os bens particulares dos sócios, uma vez integralizado o capital da sociedade por quotas, não respondem pelas dívidas desta, nem comuns, nem fiscais, salvo se o sócio praticou ato com excesso de poderes ou infração da lei, do contrato social ou dos estatutos.STF,RTJ,858945)82
A desconsideração vem atingir estes dois tipos societários, justamente pelo
entrave que a sua formação e construção social possui e impõe, que é decorrente
da própria lei, principalmente no que tange a responsabilidade do sócio.
5.3 FORMA DE APLICAÇÃO DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE
JURÍDICA NO PROCESSO CIVIL
Existem duas correntes doutrinárias que tratam acerca da aplicação da
desconsideração da personalidade jurídica, o momento oportuno, e como o instituto
deve ser aplicado.
A primeira corrente propugna pela idéia de que há necessidade de um
processo autônomo, ou seja, uma ação de conhecimento paralela à execução para
que com a obtenção de uma sentença, e conseqüentemente de título executivo
judicial, se consiga invadir a esfera do patrimônio do sócio ou representante da
pessoa jurídica.
A segunda corrente defende que a desconsideração pode ocorrer
incidentalmente em um processo de execução, bastando para isso, que se prove a
ocorrência de fraude, ou má utilização da pessoa jurídica; podendo a partir deste
momento haver uma constrição sobre os bens do sócio, pessoa física, ligada a
pessoa jurídica executada. 81 ALMEIDA,Op.cit.,p.54.
A primeira corrente luta pela idéia de um processo autônomo de
conhecimento, como forma de preservação dos princípios constitucionais do devido
processo legal, do contraditório e da ampla defesa.
Os defensores desta corrente acreditam que o simples despacho proferido
no processo de execução fere os princípios constitucionais citados, dentre os
estudiosos desta matéria está o doutrinador Fábio Ulhoa Coelho, que leciona: “é
indispensável a dilação probatória através do meio processual adequado, sendo
equivocado tomar essa medida por meio de decisão interlocutória.” 83
Manoelle Brasil Soldati expõe que :
No entanto, quando a Teoria da Penetração vem a ser considerada em fase de execução, para constrição judicial dos bens dos sócios, em justificativa à insuficiência do patrimônio da pessoa jurídica à satisfação do crédito devido, e aqueles só tomam conhecimento e oportunidade de defesa em fase de embargos à execução, insurge-se no descumprimento do princípio constitucional que confere direito ao devido processo legal e ampla defesa, consagrados no art. 5º, LIV e LV, respectivamente, da Constituição Federal. Senão veja-se, no processo de conhecimento que deu origem ao título executório em questão, figuravam nos pólos do litígio, credor e pessoa jurídica. Entretanto, em fase de embargos os sócios estão sendo chamados ao processo a responder por uma eventual constrição de seus bens, sem, no entanto, ter tido direito à defesa, pois não figurava no pólo passivo daquela cognição. Ademais, cabe ao credor, uma vez alegada existência dos pressupostos que justifiquem a desconsideração da pessoa jurídica, prová-las; no entanto, em fase de embargos à execução, estaria havendo clara inversão do ônus da prova, já que este recairia ao sócio/administrador da entidade. Isto é, o despacho que, em execução e nesses termos, autoriza a constrição dos bens dos sócios, a fim de garantir juízo, até que, em sede de embargos, discuta-se a desconsideração da pessoa jurídica, cerceia qualquer tipo de defesa legítima por parte dos sócios/administradores. Outrossim, a tentativa de responsabilizar os sócios, com base em título executivo proveniente de cognição da qual não configuravam em pólo passivo, demonstra, ainda, descumprimento aos limites subjetivos da coisa julgada, regidos em nosso ordenamento pelo artigo 472 do diploma Processual Civil: “ A sentença faz coisa julgada às partes entre as quais é dada, não beneficiando, nem prejudicando terceiros. Nas causas relativas ao estado de pessoa, se houverem sido citados no processo, em litisconsórcio necessário, todos os interessados, a sentença produz coisa julgada em relação a terceiros.”84
83 Apud BRSUCHI,Op.cit.,p.76. 84 SOLDATI,Manoelle Brasil. O Momento Processual Adequado Para Desconsideração Da PersonalidadeJurídicanoDireitoBrasileiro.Disponívelem:www.marcusbittencourt.com.br/doc/personalidade_juridica.doc.Acesso em:26/06/2007.
A segunda corrente propugna pela aplicação da desconsideração no
processo executório, visto que o processo deve ser efetivo e célere, e isto não
implica diretamente no comprometimento dos princípios constitucionais insertos no
artigo 5º da Constituição Federal, pelo contrário estes princípios devem sempre ser
respeitados, e o respeito a estes princípios não se constitui em entrave à aplicação
da desconsideração no processo de execução, a ponto de suspendê-la para que a
processe em uma ação de conhecimento.Nelson Luiz Pinto dispõe que:
O processo é o instrumento para a realização e obtenção do direito material, e como tal, deve ser rápido, caso contrario, tornar-se-ia inútil.E vai mais longe ao dizer que é daí que decorre a idéia de efetividade como garantia fundamental do processo, a ser extraída dos princípios constitucionais que alicerçam os fundamentos do sistema processual brasileiro.Não basta assegurar a existência de mecanismo adequado à solução de controvérsias, se as pessoas não tiverem efetivo acesso a ele.Absolutamente nada adianta assegurar o contraditório, ampla defesa, juiz natural e imparcial, se a garantia de acesso ao processo não for efetiva, ou seja, não possibilitar realmente a todos a utilização dos meios suficientes para superar eventuais óbices existentes ao pleno exercício dos direitos em juízo.A efetividade da tutela jurisdicional pressupõe, um tratamento igualitário entre as partes que estão litigando, em consonância com o principio constitucional da isonomia.85
Para Gilberto Gomes Bruschi, a execução é via adequada para aplicação da
desconsideração e ela não lesa os princípios constitucionais, conforme se expõe a
seguir as citações de Bruschi e Marlon Tomazette:
Não há que se falar em violação do contraditório ao se desconsiderar a
personalidade jurídica por decisão interlocutória, pois este será postergado,
para o momento em que os terceiros ou mesmo os executados originários
se rebelarem contra tal pronunciamento . 86
Dificilmente se consegue visualizar a necessidade de desconsideração da personalidade jurídica, quando surge a obrigação da pessoa jurídica. Do mesmo modo, ao longo de um processo de conhecimento manejado em face da mesma pessoa jurídica, é praticamente impossível verificar a necessidade de se buscar bens de sócios ou administradores. Todavia, nos processos de execução ou no cumprimento das sentenças, é bastante freqüente que se verifique a insuficiência dos bens da pessoa jurídica, constatando-se que tal fato decorreu do abuso da personalidade jurídica.87
85 Apud BRSUCHI,Op.cit.,p77. 86 BRUSCHI,Op.cit.,p.78 87 TOMAZETTE, Marlon. Aspectos processuais da desconsideração da personalidade jurídica: desnecessidade de uma ação de conhecimento. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 1149, 24 ago. 2006. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8840>. Acesso em: 26 jun. 2007.
Segundo Vicente Greco Filho :
"O contraditório se efetiva assegurando-se os seguintes elementos: a) o
conhecimento da demanda por meio de ato formal de citação; b) a oportunidade, em
prazo razoável, de se contrariar o pedido inicial; c) a oportunidade de produzir prova
e se manifestar sobre a prova produzida pelo adversário; d) a oportunidade de estar
presente a todos os atos processuais orais, fazendo consignar as observações que
desejar; e) a oportunidade de recorrer da decisão desfavorável." 88
Desta feita, é inquestionável que o processo executório não ofende os
princípios supracitados, os quais são realizados no momento adequado, quem alega
tem que provar obedecendo-se os ditames do artigo 333 do Código de Processo
Civil.
Fábio Ulhoa assim escreve: “o credor da sociedade que pretende a sua
desconsideração deverá fazer prova da fraude perpetrada, caso contrário suportará
o dano da insolvência da devedora.”89.
E isto deve ser cumprido na aplicação da desconsideração, sendo
oportunizada ao executado a ampla defesa que não ocorre nos autos da execução,
mas nos embargos, o qual consubstancia-se em ação autônoma onde o mesmo
pode exercer os seus direitos constitucionalmente garantidos plenamente, ou ainda
pode se utilizar do recurso de agravo de instrumento, para atacar a decisão
interlocutória.
Aos terceiros não envolvidos no processo de execução, também é
assegurado o devido processo legal, os quais após aplicação da desconsideração
88 GRECO FILHO,Op.cit., p. 90 89 Apud CEOLIN,Ana Caroline Santos.Abusos na aplicação da teoria da desconsideração da pessoa jurídica.Belo Horizonte:DelRey,2002.p.60.
da personalidade jurídica, podem utilizar-se da defesa por meio dos embargos de
terceiro.
Quando fala-se em terceiro faz-se referência ao sócio que teve seu bem
constrito.
Segundo Bruschi os embargos de terceiro é um instrumento processual que
ainda está sendo difundido pela doutrina e pela jurisprudência, pois para os
estudiosos deste tema, os embargos de terceiro deve ser utilizado na ocorrência da
constrição ao patrimônio ou na constrição em potencial.
Essa sistemática foi defendida por Donaldo Armelin em sua tese de
doutorado, conforme se transcreve a seguir:
(...) a doutrina tem se mostrado favorável a esses embargos, embora sob diversos fundamentos.Assim é que Ernane Fidelis, invocando a lição de Hugo Simas, opina no sentido de ser despicienda a efetiva apreensão do bem para justificar a propositura dos embargos de terceiro, bastando para tanto a ordem judicial respectiva.Isto porque a ordem judicial, em face de sua imperatividade, já é ato de apreensão juridicamente caracterizada como turbador da posse.Ponte de Miranda, por sua vez esclarece: o interesse e a motivação para embargos de terceiro pode surgir antes da medida de constrição.Desde que o pedido, ainda que não cumprido, já os embargos de terceiro são oponíveis.(..) Entretanto, tendo-se em vista aquele equilíbrio supra referido,que deve existir no tratamento do terceiro embargante e das partes litigantes no processo principal, a viabilidade dos embargos de terceiro preventivo deve resultar da constatação de um interesse processual medido na conformidade do que consta naquele processo principal.(..) Portanto, a simples ordem de constrição, não pode ser considerada, por si só, como ato de turbação de posse do terceiro.A existência de ameaça de constrição há de ser determinada e inexorável pra que surja o interesse processual de embargar.90
Todavia, interposto os embargos de terceiro e deferido seu pedido, será
suspenso o processo no qual ocorreu a constrição dos bens.
Se os embargos versarem sobre parte dos bens, continuará o processo
sobre aqueles que não foram abrangidos pelos embargos.
90 Apud BRSUCHI,Op.cit.,p.98,99.
Depois de deferido os embargos, será ordenada a citação de todas as
partes do processo principal que terão prazo de dez dias para contestar.
Os tribunais brasileiros têm se posicionado no sentido de que o processo
de execução é via adequada para aplicação da desconsideração da personalidade
jurídica, conforme se colaciona a seguir:
FALÊNCIA – EXTENSÃO DOS SEUS EFEITOS ÀS EMPRESAS COLIGADAS – TEORIADA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA – POSSIBILIDADE –REQUERIMENTO – SÍNDICO – DESNECESSIDADE – AÇÃO AUTÔNOMA –PRECEDENTES DA SEGUNDA SEÇÃO DESTA CORTE. I - O síndico da massa falida, respaldado pela Lei de Falências e pela Lei n.º 6.024/74, pode pedir ao juiz, com base na teoria da desconsideração da personalidade jurídica, que estenda os efeitos da falência às sociedades do mesmo grupo, sempre que houver evidências de sua utilização com abuso de direito, para fraudar a lei ouprejudicar terceiros. II – A providência prescinde de ação autônoma. Verificados ospressupostos e afastada a personificação societária, os terceirosalcançados poderão interpor, perante o juízo falimentar, todos osrecursos cabíveis na defesa de seus direitos e interesses. Recurso especial provido. Vistos, relatados e discutidos os autos, acordam os Srs. Ministros da TERCEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade,conhecer do recurso especial e dar-lhe provimento. Os Srs. Ministros Antônio de Pádua Ribeiro, Humberto Gomes de Barros, Carlos Alberto Menezes Direito e Nancy Andrighi votaram como Sr. Ministro Relator”.91
TEORIA DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA OU DOUTRINA DA PENETRAÇÃO- CABIMENTO - A Teoria da Desconsideração da Personalidade Jurídica ou Doutrina da Penetração (Disregard of legal entity, in Rubens Requião, "Curso de Direito Comercial Saraiva, 4ª.ed., 1974, p.239), busca atingir atos de malícia e prejuízo. A jurisprudência aplica essa teoria quando a sociedade acoberta a figura do sócio e torna-se instrumento de fraude (RT 479/194; 552/181; Ap.458.453/6, 4ª.C, Rel.Octaviano Lobo)...Há necessidade de demonstração que os sócios agiram dolosamente...que a sociedade foi usada como biombo, para prejudicar terceiros, ficando o patrimônio dos sócios astuciosos longe do alcance do processo de execução." (Juiz Octaviano Santos Lobo, 1º.TAC, AI 554.563/3, 4ª.C, j.27.10.93) cit. in RT 708, p.117”.92
TEORIA DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA- EXTINÇÃO IRREGULAR DA SOCIEDADE - RESPONSABILIDADE DOS SÓCIOS- "Execução - Penhora - Sociedade - Bens pessoais do sócio - Teoria da desconsideração da pessoa jurídica. Ante a extinção irregular da
91 BRASIL.Superior Tribunal de Justiça.RESP 228357 – Relator Ministro Castro Filho, DJ de 02/02/2004.Disponivelem:http://www.stj.gov.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?acao=imprimir&livre=RDR.font.+ou+RDR.suce.&&b=JUR2&p=true&t=&l=20&i=120.Acesso em:26/06/2007 92 BRASIL.Juiz Octaviano Santos Lobo, 1º.TAC, AI 554.563/3, 4ª.C, j.27.10.93) cit. in RT 708, p.117.Disponívelem:http://www.escritorioonline.com/webnews/noticia.php?id_noticia=2674&.Acesso em:26/06/2007.
sociedade, que restou sem patrimônio para fazer face aos débitos pendentes, respondem os bens particulares dos sócios, desconsiderando-se, para esse efeito, a personalidade jurídica da devedora. (2.°TACIVIL - Ap.s/Rev.502.922 - 6.ª Câm.- Rel. Juiz Paulo Hungria - j.03.12.1997) AASP, Ementário,2052/3.93
5.4 INCIDÊNCIA DA DESCONSIDERAÇÃO NA EXECUÇÃO CIVIL POR QUANTIA
CERTA CONTRA DEVEDOR SOLVENTE
Na existência de processo de execução de titulo extrajudicial de quantia
certa contra devedor (pessoa jurídica) solvente, ocorrendo os pressupostos
autorizadores da incidência da desconsideração da personalidade jurídica previstos
nos artigos 50 e 1024 do Código Civil, isto é, desvio de finalidade, abuso de direito,
fraude e confusão patrimonial, tendo como parte executada pessoa jurídica na qual
o exaurimento do patrimônio social, não implica diretamente na responsabilização
dos sócios.
A saber, em sociedade anônima ou sociedade por quotas de
responsabilidade limitada, que durante o processo executório não consegue pagar
sua dívida, nem dispor de bens suscetíveis a penhora, e nem qualquer outra forma
de extinção de sua obrigação, pode o exeqüente, em vez de utilizar o disposto no
artigo 94, II da Lei 11.101 de 2005, pedindo a declaração da falência da executada,
requerer a penhora dos bens do sócio, pessoa física, obtendo assim a solvência do
seu crédito, evitando a falência da devedora e os percalços de um processo
falimentar.
Mas quando fala-se em devedor solvente, neste caso, refere-se a pessoa
jurídica não falida.
A execução civil por quantia certa contra devedor solvente, segundo Misael
Montenegro, “parte da premissa de que o patrimônio do devedor é maior ou igual ao
valor do débito” .Entretanto, para aplicação da desconsideração da personalidade
jurídica, a pessoa jurídica já não tem patrimônio social para arcar com as suas
dívidas. Porém para que seja declarada insolvente ou falida, é preciso que seja
93 BRASIL.2.°TACIVIL - Ap.s/Rev.502.922 - 6.ª Câm.- Rel. Juiz Paulo Hungria - j.03.12.1997 AASP, Ementário,2052/.Disponívelem:http://www.escritorioonline.com/webnews/noticia.php?id_noticia=2674&.Acesso em:26/06/2007.
declarado judicialmente por sentença, tornando-se público o estado falencial.De
maneira que na prática, é comum sociedades empresariais serem executadas ainda
na condição de solvente,segundo a classificação do código de processo civil que
rege o tipo executório em discussão,e porém, já não sê-la, em razão de não ter
havido a sua declaração de falência, tampouco a regular dissolução da sociedade
conforme prescreve o artigo 1.103 do Código Civil.
Desta feita, no mundo jurídico e social a empresa é considerada regular,
não havendo aparentemente qualquer suspeita inquinadora quanto a sua idoneidade
e solvabilidade, em virtude de não existir qualquer documento judicial que prove o
contrário até que se proponha a ação executória em questão, sendo tais fatos só
descobertos no curso da execução por quantia certa contra devedor solvente.
Neste caso, havendo os pressupostos legais exigidos, invoca-se a
desconsideração da personalidade jurídica para que o sócio seja responsabilizado,
evitando-se o processo falimentar, de maneira que se garanta a efetividade da ação
executória, sem que seja preciso utilizar outro instrumento processual, e ainda
confere-se ao credor a possibilidade de ter o seu crédito satisfeito, evitando que o
mesmo suporte prejuízos em razão da autonomia patrimonial, que neste caso é
relativizada para a efetivação da justiça.
A desconsideração da personalidade jurídica repercute em benefícios à
comunidade, pois tal medida implica diretamente na preservação dos postos de
trabalho, da economia local e principalmente da própria pessoa jurídica, instituto que
segundo Rolf Serick e Piero Verrucoli existe para propósitos legítimos, conforme se
demonstra nas citações e julgado a seguir:
não existe para permitir que a pessoa física burle uma obrigação que lhe é imposta, não existe para que a pessoa física faça algo que lhe é proibido, ela existe como ente autônomo para o exercício normal das atividades econômicas, isto é, para o tráfico jurídico de boa- fé.94.
94 TOMAZETTE,Marlon.A desconsideração da personalidade jurídica; a teoria, o código de defesa do consumidor e o novo código civl.Revista dos Tribunais,São Paulo,v.794.n.90, p.85,dez.2001.
“A desconsideração, é pois, a forma de adequar a pessoa jurídica aos fins para os quais ela foi criada, vale dizer, é a forma de limitar e coibir o uso indevido deste privilegio que é a pessoa jurídica”.95
Sociedade comercial – Paralisação – Falta de bens – Inexistência de distrato – Penhora de bens de sócio – Cabimento – Embargos de Terceiro rejeitados. Admite-se a execução contra um sócio, se a sociedade não mais exerce atividade, sem que tenha sido distratada, e não se encontrem bens de sua propriedade (Ap. Civ. nº 10.470 – 3ª Câm. Civ. Rel. Des. Reynaldo Alves. TJSC)
Sociedade Comercial – Responsabilidade Limitada – Dissolução irregular – Responsabilidade dos sócios por dívidas da empresa – Admissibilidade de incidência de penhora sobre seus bens pessoais – Inteligência dos arts. 596 do CPC e 2º da Lei 3.708/19. A determinação legal de que os sócios não respondem pelas dívidas sociais (art. 596 do CPC) diz respeito a regular extinção da empresa e à regularidade das obrigações sociais. A irregularidade da atuação, constatada pelo desaparecimento da empresa sem a regular quitação de seus débitos, impõe outro entendimento, ou seja, o de que o art. 2º da Lei 3.708/19 autoriza o alcance dos bens pessoais dos sócios para completar o capital social que foi diluído pela má gestão dos negócios da sociedade (RT/635, p. 225/226)
Sociedade comercial – Execução – Penhora de bens particulares dos sócios – Admissibilidade – Empresa em situação irregular, cujos bens desapareceram – Aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica – Declarações de voto vencedor e vencido. Estando a sociedade comercial em situação irregular, cujos bens desapareceram, mas aquela continua a existir, é justo que sejam penhorados bens de seus sócios, que bastem para o pagamento da dívida assumida pela empresa, aplicando-se no caso, a teoria da desconsideração da personalidade jurídica (RT/713, p. 95/98).96
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA.RECURSO ESPECIAL Nº 331.478 RJ (2001⁄0080829-0)PROCESSO CIVIL - RECURSO ESPECIAL EM AUTOS DE AGRAVO DE INSTRUMENTO RETENÇÃO LEGAL AFASTAMENTO - DEFICIÊNCIA NA FUNDAMENTAÇÃO E FALTA DE PREQUESTIONAMENTO - SÚMULAS 284 E 356 DO STF - PROCESSO EXECUTIVO - PEDIDO DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICADAEMPRESA-EXECUTADA-POSSIBILIDADE- DISPENSÁVEL O AJUIZAMENTO DE AÇÃO AUTÔNOMA. 1- Caracterizada está a excepcionalidade da situação de molde a afastar o regime de retenção previsto no art. 542, § 3º, do CPC, haja vista tratar-se de recurso especial proveniente de decisão interlocutória proferida no curso de execução de título extrajudicial (REsp nº 521.049⁄SP, de minha relatoria, DJ de 3.10.2005; REsp nº 598.111⁄AM, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, DJ de 21.6.2004). 2 - Se a parte recorrente não explica de que forma o acórdão recorrido teria violado determinado dispositivo, deficiente está o recurso em sua fundamentação, neste aspecto (Súmula 284⁄STF). 3 - Não enseja interposição de recurso especial matérias não ventiladas no julgado impugnado (Súmula 356⁄STF).
95 Apud TOMAZETTE,Marlon.Direito Societário.São Paulo:Juarez de Oliveira,2004.p.67. 96 OLIVEIRA, Edilson Mariano de. Desconsideração da Personalidade Jurídica da Empresa: Uma abordagem à luz do CDC e do Código Civil. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 4, nº 145. Disponível em:<http://www.boletimjuridico.com.br/doutrina/texto.asp?id=830> Acesso em: 29/06/ 2007.
4 - Esta Corte Superior tem decidido pela possibilidade da aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica nos próprios autos da ação de execução, sendo desnecessária a propositura de ação autônoma (RMS nº 16.274⁄SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, DJ de 2.8.2004; AgRg no REsp nº 798.095⁄SP, Rel. Ministro FELIX FISCHER, DJ de 1.8.2006; REsp nº 767.021⁄RJ, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, DJ de 12.9.2005). 5 - Recurso parcialmente conhecido e, nesta parte, provido para determinar a análise do pedido de desconsideração da personalidade jurídica da empresa-executada no curso do processo executivo.ACÓRDÃOVistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da QUARTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer em parte do recurso e, nesta parte, dar-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator, com quem votaram os Srs. Ministros HÉLIO QUAGLIA BARBOSA, MASSAMI UYEDA, CESAR ASFOR ROCHA e ALDIR PASSARINHO JUNIOR. Brasília, DF, 24 de outubro de 2006 (data do julgamento). MINISTRO JORGE SCARTEZZINI, Relator RECURSO ESPECIAL Nº 331.478 - RJ (2001⁄0080829-0)
RELATÓRIO O Exmo. Sr. Ministro JORGE SCARTEZZINI (Relator): Infere-se dos autos que COMDIP - COMERCIAL DISTRIBUIDORA DE PEÇAS LTDA interpôs agravo de instrumento contra a r. decisão que, nos autos da ação de execução proposta em face de MAGNETON COMÉRCIO DE AUTO PEÇAS E ACESSÓRIOS LTDA, indeferiu o pedido de desconsideração da personalidade jurídica desta, entendendo que a referida desconsideração somente poderia ocorrer "em devido processo legal. Nas razões recursais, afirmou a possibilidade de, "presentes os pressupostos legais, nos autos do processo de execução - fase de penhora, aplicar a desconsideração da personalidade jurídica, (...) objetivando a constrição dos bens particulares dos sócios". Informou o encerramento irregular das atividades da empresa-executada e a inexistência de bens para o pagamento das dívidas (fls. 3⁄9). A c. 16ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, à unanimidade, negou provimento ao agravo de instrumento, conforme se depreende da ementa a seguir transcrita (fls. 59⁄62): "Agravo de Instrumento. Execução. Desconsideração da Pessoa Jurídica. A desconsideração não pode ser concedida por simples despacho em execução, por ausentes os requisitos do permissivo do Codecon em seu art. 28. Ordinária. Impõe-se, na espécie, o devido processo legal porque o resultado que se busca não se dá por simples despacho ordinatório da execução. Agravo improvido. Inconformada, COMDIP - COMERCIAL DISTRIBUIDORA DE PEÇAS LTDA interpôs recurso especial, com base no art. 105, III, "a", da CF⁄88, alegando ter o v. acórdão recorrido violado os arts. 592 e 596, § 1º, do CPC; 329, 330 e 338 do Código Comercial. Sustenta a existência dos pressupostos legais para a desconsideração da personalidade jurídica da empresa-executada, podendo ser reconhecida no curso da ação de execução; a validade da "penhora de bens particulares de sócio que citado para pagar o débito não o fez e nem nomeou bens à penhora; que "as obrigações dos sócios só acabam após satisfeitas e extintas todas as responsabilidades sociais"; e a dissolução irregular e ilegal da sociedade (fls. 65⁄72). Não foram apresentadas contra-razões (fls. 90). Admitido o recurso (fls. 91⁄92), subiram os autos a esta Corte.
Após, aos 25.6.2004, vieram-me os autos conclusos, por atribuição.É o relatório. RECURSO ESPECIAL Nº 331.478 - RJ (2001⁄0080829-0 VOTO O Exmo. Sr. Ministro JORGE SCARTEZZINI (Relator): Srs. Ministros, de início, apenas para registro, tratando-se de recurso especial proveniente de decisão interlocutória proferida no curso de execução de título extrajudicial, configura-se indevida a respectiva retenção, porquanto não caracterizadas as hipóteses taxativas do art. 542, § 3º, do CPC. Este é o entendimento desta Corte Superior, de acordo com os seguintes precedentes:” PROCESSO CIVIL - RECURSO ESPECIAL EM AUTOS DE AGRAVO DE INSTRUMENTO - RETENÇÃO LEGAL - AFASTAMENTO - PROCESSO EXECUTIVO (...). 1 - Tratando-se de recurso especial proveniente de decisão interlocutória proferida no curso de execução de título extrajudicial, configura-se indevida a respectiva retenção, porquanto não caracterizadas as hipóteses taxativas do art. 542, § 3º, do CPC. Precedentes (REsp nº 598.111⁄AM e MC nº 4.807⁄SP). (...)." (REsp nº 521.049⁄SP, de minha relatoria, DJ de 3.10.2005). PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL ORIUNDO DE DECISÃO INTERLOCUTÓRIA PROFERIDA EM PROCESSO DE EXECUÇÃO. RETENÇÃO. DESCABIMENTO. (...). 1. A retenção prevista no § 3º do art. 542 do CPC não se aplica aos recursos especiais e extraordinários oriundos de decisão interlocutória proferida em processo de execução, porquanto esse dispositivo legal somente faz alusão aos apelos extremos provenientes de decisão interlocutória proferida em processo de conhecimento, cautelar ou embargos à execução. (...). (REsp nº 598.111⁄AM, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, DJ de 21.6.2004). Desta feita, estando caracterizada a excepcionalidade da situação de molde a afastar o referido regime de retenção, passo ao exame da controvérsia suscitada. Consta dos autos que COMDIP - COMERCIAL DISTRIBUIDORA DE PEÇAS LTDA, ora recorrente, ajuizou ação de execução contra MAGNETON COMÉRCIO DE AUTO PEÇAS E ACESSÓRIOS LTDA, ora recorrida, com base em títulos executivos extrajudiciais. Não realizada a penhora, pelo fato de terem sido encontrados apenas bens considerados de família (fls. 48-v), a exeqüente requereu a desconsideração da personalidade jurídica da empresa-executada, alegando dissolução irregular desta, não subsistindo "bens que respondam pelo passivo" (fls. 29⁄33). O d. Juízo de Direito da 2ª Vara Cível Regional de Campo Grande⁄RJ indeferiu o pedido, nos seguintes termos: "Indefiro. A desconsideração da pessoa jurídica só pode ocorrer em devido processo legal" (fls. 35). Em sede de agravo de instrumento, o Colegiado de origem manteve a r. decisão, argumentando: "A desconsideração não pode ser concedida por simples despacho em Execução, por ausentes os requisitos do permissivo do Codecon em seu art. 28. (...) Impõe-se, na espécie, o devido processo legal porque o resultado que se busca não se dá por simples despacho ordinatório da execução". “Foi, então, interposto o presente recurso especial, cujo cerne é analisar a possibilidade do julgador decidir acerca da desconsideração da personalidade jurídica de empresa-executada no curso do processo executivo. Conforme leciona RUBENS REQUIÃO, "diante do abuso de direito e da fraude no uso da personalidade jurídica, o juiz brasileiro tem o direito de indagar em seu livre convencimento, se há de consagrar a fraude ou abuso de direito, ou se deva desprezar a personalidade jurídica,
para, penetrando em seu âmago, alcançar as pessoas e bens que dentro dela se escondem para fins ilícitos ou abusivos'" (RT, p. 14, 1969). FRAN MARTINS assenta: "em certas hipóteses, poderá o juiz decretar a descaracterização da personalidade jurídica, no propósito de comprovar sua fraude, abuso, desvio e confusão patrimonial, a fim de se proteger interesse coletivo, do consumidor ou indeterminado" ("Curso de Direito Comercial", 30ª ed., RJ: Forense, 2005, p. 196). Segundo FÁBIO ULHOA COELHO, "o princípio da separação patrimonial e o da limitação da responsabilidade dos sócios não são absolutos. (...) exceção ao princípio da autonomia da pessoa jurídica, relativamente aos seus integrantes: é a hipótese de fraude ou abuso de direito perpetrados por meio do instituto da separação patrimonial. A teoria da desconsideração da personalidade jurídica visa precisamente a coibir as fraudes e abusos, viabilizados através do mau uso da regra da separação patrimonial. O pressuposto incontornável da aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica é a manipulação fraudulenta ou abusiva da autonomia patrimonial" (Repertório Jurisprudência, RJ 3, nº 2⁄2000, Civil, Processual, Penal e Comercial, 2ª janeiro, p. 48⁄45). CÂNDIDO RANGEL DINAMARCO, por sua vez, argumenta que o pronunciamento judicial a respeito da desconsideração da personalidade jurídica "pode ter lugar na própria execução, incidentemente, quando existir prova documental inconcussa da situação legitimante" ("Fundamentos do Processo Civil Moderno", Tomo II, 5. ed., São Paulo: Malheiros Editores, p. 1198). Esta Corte Superior tem decidido pela possibilidade da aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica nos próprios autos da ação de execução, sendo desnecessária a propositura de ação autônoma. Nas palavras da i. Ministra NANCY ANDRIGHI, proferidas quando do julgamento do RMS nº 16.274⁄SP, DJ de 2.8.2004: "Verificados os pressupostos de sua incidência, poderá o Juiz, incidentemente no próprio processo de execução (singular ou coletiva), levantar o véu da personalidade jurídica para que o ato de expropriação atinja os bens particulares de seus sócios, de forma a impedir a concretização de fraude à lei ou contra terceiros". Naquela oportunidade, a e. Ministra esclareceu em seu voto, verbis:” (...) a desconsideração da pessoa jurídica torna cada um de seus sócios parte no processo de execução, porquanto a desconsideração da personalidade suprime o sujeito de direito representado pela pessoa jurídica, fazendo-o substituir-se, por ampliação subjetiva, pelas pessoas de seus sócios, sejam essas naturais ou jurídicas. E isto se dá porque a aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica dispensa a propositura de ação autônoma para tal. Tal entendimento exsurge da própria lógica conceitual inerente à formulação da Doctrine of Disregard of Legal Entity. Verificados os pressupostos de sua incidência (uso abusivo da personificação societária para fraudar a lei ou prejudicar terceiros, como se depreende do Resp nº. 158.051⁄RJ, Rel. Min. Barros Monteiro, Quarta Turma, unânime, DJ 12⁄04⁄1999), poderá o Juiz, incidentemente no próprio processo de execução (singular ou coletiva), levantar o véu da personalidade jurídica para que o ato de expropriação atinja os bens particulares de seus sócios. Cite-se, a respeito, trecho do acórdão e do voto do i. Relator, Min. Eduardo Ribeiro, em precedente desta Terceira Turma (Resp nº. 211.619⁄SP, DJ 23⁄04⁄2001), o qual admitiu a aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica nos próprios autos do processo de falência, exemplificando, a respeito, com o que estatui o art. 28 do CDC (...). Válido, ainda, trazer à colação os precedentes a seguir elencados: CIVIL. LOCAÇÃO. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. CONFUSÃO PATRIMONIAL. CABIMENTO. SÚMULA 7⁄STJ.
DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. COTEJO ANALÍTICO. FALTA. SIMILITUDE FÁTICA. FALTA. I - A aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica dispensa a propositura de ação autônoma, podendo ser concedida incidentalmente no próprio processo de execução desde que verificados os pressupostos de sua incidência. Precedentes. II - Todavia, se o c. Tribunal a quo entende suficientes as provas colacionadas aos autos para caracterizar a confusão patrimonial, infirmar essa conclusão demandaria ao reexame do conjunto fático probatório (Súmula 7⁄STJ). III - Não se conhece do recurso pela divergência, se o recorrente descuida-se do necessário cotejo analítico, deixando de demonstrar as teses apontadas como contraditórias e as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os casos confrontados, e, se, além do mais, os vv. acórdãos paradigmas não guardam similitude fática como o aresto recorrido. Agravo regimental desprovido." (AgRg no REsp nº 798.095⁄SP, Rel. Ministro FELIX FISCHER, DJ de 1.8.2006). PROCESSUAL CIVIL. AUSÊNCIA DE OMISSÃO, OBSCURIDADE, CONTRADIÇÃO OU FALTA DE MOTIVAÇÃO NO ACÓRDÃO A QUO. EXECUÇÃO FISCAL. ALIENAÇÃO DE IMÓVEL. DESCONSIDERAÇÃO DA PESSOA JURÍDICA. GRUPO DE SOCIEDADES COM ESTRUTURA MERAMENTE FORMAL. PRECEDENTE. 1. Recurso especial contra acórdão que manteve decisão que, desconsiderando a personalidade jurídica da recorrente, deferiu o aresto do valor obtido com a alienação de imóvel. 2. (...) 3. “A desconsideração da pessoa jurídica, mesmo no caso de grupos econômicos, deve ser reconhecida em situações excepcionais, onde se visualiza a confusão de patrimônio, fraudes, abuso de direito e má-fé com prejuízo a credores. No caso sub judice, impedir a desconsideração da personalidade jurídica da agravante implicaria em possível fraude aos credores. Separação societária, de índole apenas formal, legitima a irradiação dos efeitos ao patrimônio da agravante com vistas a garantir a execução fiscal da empresa que se encontra sob o controle de mesmo grupo econômico” (Acórdão a quo). 4. “Pertencendo a falida a grupo de sociedades sob o mesmo controle e com estrutura meramente formal, o que ocorre quando diversas pessoas jurídicas do grupo exercem suas atividades sob unidade gerencial, laboral e patrimonial, é legítima a desconsideração da personalidade jurídica da falida para que os efeitos do decreto falencial alcancem as demais sociedades do grupo. Impedir a desconsideração da personalidade jurídica nesta hipótese implicaria prestigiar a fraude à lei ou contra credores. A aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica dispensa a propositura de ação autônoma para tal. Verificados os pressupostos de sua incidência, poderá o Juiz, incidentemente no próprio processo de execução (singular ou coletiva), levantar o véu da personalidade jurídica para que o ato de expropriação atinja terceiros envolvidos, de forma a impedir a concretização de fraude à lei ou contra terceiros” (RMS nº 12872⁄SP, Relª Minª Nancy Andrighi, 3ª Turma, DJ de 16⁄12⁄2002). 5. Recurso não-provido." (REsp nº 767.021⁄RJ, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, DJ de 12.9.2005). Em relação aos arts. 592 do CPC e 330 do Código Comercial, o recurso encontra-se deficiente em sua fundamentação, haja vista não ter sido explicitado de que forma o v. acórdão teria ofendido cada dispositivo (Súmula 284⁄STF). E, no que tange aos demais artigos, anoto a ausência do devido prequestionamento, já que as matérias não restaram analisadas no v. aresto guerreado (Súmula 356⁄STF).
Por tais fundamentos, conheço parcialmente do recurso e, nesta parte, dou-lhe provimento para determinar a análise do pedido de desconsideração da personalidade jurídica da empresa-executada no curso do processo executivo. É como voto. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURIDICA-Adimissibilidade - Encerramenteo da sociedade de forma irregular-Inexistencia de bens socias para garantir a penhora - Inteligência dos arts.1023 e 1.024 do CC/2002. Ementa da Redação: Nos termos dos arts.1023 e 1024 do CC/2002, aplica-se a teoria da desconsideração da personalidade jurídica se houver encerramento irregular da sociedade e diante da inexistência de bens sociais para garantir a penhora. Agin.1.240.635-0-2ªCam-j.03.12.2003-rel.Juiz Nemer Jorge. Acórdão:Ementa Oficial: Penhora-Pessoa Jurídica - Desconsideração da sua personalidade-Possibilidade, diante de encerramento irregular, sem a existência de bens para a penhora-Agravo desprovido. Vistos,relatados e discutidos estes autos de Agin 1.240.635-0, da comarca de Campinas, sendo agravantes Dicatrevo Comercio de Veículos Ltda(e outros) e agravada Diamenta Comercio de Tintas Ltda. Acordam, em 2ª Câm. Do 1º Tribunal de Alçada Civil, por v.u., negar provimento ao recurso. Trata-se de ação de execução de titulo extrajudicial(cheques).O MM. Juiz da causa desconsiderou a personalidade jurídica da executada,q eu não encerrou suas atividades regularmente, fechando as portas, sem saldas sua dividas. A executada e seus sócios agravaram dessa decisão, alegando que os requisitos necessários para a desconsideração da personalidade jurídica não estão presentes, porque: não agiram com má-fé e não utilizaram a pessoa jurídica para fraudar credores; não tiraram proveito da sociedade de forma ilícita; e não houve desvio de finalidade da empresa ou confusão patrimonial. Negou-se feito suspensivo ao presente recurso. A gravada ofereceu contraminuta. É o relatório. A jurisprudência formada em torno da possibilidade da penhora em bens dos sócios pacificou-se no sentido de admiti-la, na hipótese de encerramento irregular da sociedade, aplicando-se a teoria da desconsideração da personalidade jurídica: Execução-Sociedade Comercial por quotas de responsabilidade limitada-Dissolução irregular-Penhora de bens do sócio- gerente-Admissibilidade-recurso Improvido” (TAMG,1ª Câm.Ap.28.374-Itaúna.rel Juiz Joaquim Alves,v.u.,j.21.06.1985-RT610/223). Penhora-Bens particulares dos sócios - Admissibilidade, uma vez inexistente bens da pessoa jurídica para garantia da executória, não estando a mesma extinta-Aplicabilidade da teoria da despersonalização da pessoa jurídica” (1º TACivSP,5ª Câm.Agin618.051-4,rel.Juiz Carlos Luiz Bianco,j.22.03.1995-RT721/156)Destarte, verifica-se que os requisitos mencionados pelos agravantes são irrelevantes para ensejar a desconsideração da personalidade jurídica da pessoa jurídica.Por outro lado, o encerramento regular das atividades da pessoa jurídica ocorre mediante baixa na junta comercial e comunicação desse fato ao fisco.Os agravantes não provaram que procederam dessa forma, pois não apresentaram qualquer documento a respeito.Ademais, a certidão do oficial de justiça revela que a sociedade-agravante encerrou suas atividades de forma irregular, baixando suas portas, sem deixar bens passíveis de penhora.Finalmente, os arts.1023 e 1024 do atual CC permitem a penhora dos bens dos sócios, se houver saldo após a excussão dos bens, é possível a penhora pretendida pela gravada.Essas normas legais se aplicam ao processo em curso por força da regra do art.2035 do atual
CC.Posto isso, nega-se provimento ao agravo.Presidiu-se o julgamento o Juiz Amado de Fria e dele participaram os juízes Jacob Valente e Ribeiro de Souza.São Paulo,3 de dezembro de 2003-NEMRE JORGE,relator.97
Observa-se que aplicação da teoria não pode ser realizada livremente, é
necessário a ocorrência de pressupostos que ensejam a sua aplicabilidade. A teoria
não foi criada para quebrar o princípio da separação das sociedades comerciais,
nem dos atributos da personificação, o qual é um incentivador e protetor para que
empresas se estabeleçam e realizem relações comerciais, que não são absolutos,
nem são um cobertor para ocultar as práticas infracionais à própria lei, segundo Ana
Carolina Santos Ceolin e Miguel Reale:
A partir do momento que o princípio da separação enseja a prática de abusos, ele deve ser considerado não mais um direito absoluto, mas sim relativo.O fundamento da desconsideração reside, portanto, na relatividade desse principio.Daí o seu caráter excepcional, pois não é a qualquer pretexto que se pode autorizar a quebra do principio da separação, que, mesmo sendo relativo, é fundamental par as relações socioeconômicas.98
Não abandonamos o princípio que estabeleceu a distinção entre pessoa jurídica e os seus membros componentes, mas também não convertemos esse princípio em tabu, até o ponto de permitir sejam perpetrados abusos em proveito ilícito dos sócios e em detrimento da comunidade.99
Conforme leciona Bruschi, exemplo que demonstra claramente a má
utilização da pessoa jurídica, na qual também é perfeitamente aplicável a
desconsideração da personalidade jurídica, é a criação de uma nova empresa com
objetivo de dar continuidade as negociações realizadas por empresa insolvável e em
estado pré-falimentar com passivo muito maior que o ativo, cujo patrimônio
encontra-se comprometido com pagamento de dívidas.Procurando fugir aos seus
deveres, os sócios criam uma nova razão social, uma nova empresa, que sucede a
anterior, sem se responsabilizar pelas dívidas e ônus da antecessora, para que
prossiga em suas atividades comerciais, exemplo muito comum no cotidiano das
sociedades.
97 Revista dos Tribunais,v.825,n.93,p.273-274,jul2004. 98 CEOLIN,Ana Caroline Santos.Abusos na aplicação da teoria da desconsideração da pessoa jurídica.Belo Horizonte:DelRey,2002.p.42. 99 Apud KOURY.Op.cit.,p.143.
Em ocorrendo esta prática é possível levantar-se o manto da pessoa
jurídica, afim de que a sucessora seja responsabilizada, conforme se demonstra no
julgado proferido pelo Tribunal de Justiça do Acre:
A doutrina e jurisprudência nacional são pacificas no sentido de admitir a desconsideração da personalidade jurídica de uma empresa para que outra,que a esteja administrando – o que acontece no presente caso- arque com os débitos pendentes daquela primeira.Com efeito entendo possível romper o principio geral que veda a responsabilidade de uma empresa em lugar de outra,ambas do mesmo grupo financeiro, dependendo, apenas, das circunstancias especificas verificadas em cada caso, haja vista que a flagrante intenção da doutrina da penetração é o combate à fraude e abusos de direito, de maneira a estender a relação existente entre sociedades do mesmo grupo empresarial.(...) A idéia que alimenta a teoria da desconsideração da personalidade jurídica é a da existência da fraude, da manipulação da autonomia patrimonial ou de clausulas de contrato que venha prejudicar terceiros.A recorrente tem a administração da empresa executada e comodato de seus bens, ora, como administradora teria a obrigação de atender as exigências de uma execução, pagando ou nomeando bens à penhora.Não o fez, logo, passível do entendimento esposado pelo magistrado a quo 100(TJAC,Rel.Des.Jersey Pacheco Nunes,j.27/05/2002)
Cumpre ressaltar que o legislador ao regulamentar a desconsideração da
personalidade jurídica no artigo 50 do Código Civil, trouxe mecanismo de coibir os
autos fraudulentos de má-fé negocial que ocorrem sob o véu da pessoa jurídica, a
qual é desvirtuada por completo das finalidades para as quais foi criada, quando
dela se utilizam para consecução de objetivos escusos à lei.
O referido instituto, nasce no direito civil brasileiro na lição de Wilson Souza
Campos Batalha” para se afastar as cortinas conceituais quando se trata de
apanhar a realidade que se oculta sob as máscaras do formalismo jurídico”101.
A desconsideração é uma exceção que deve ser aplicada cautelosamente
na existência de todos os seus pressupostos, é um instituto que preserva a pessoa
jurídica, a sua essência e estrutura, que criada desde o período pré-clássico e
desenvolvida pelos Romanos, nasceu para que por meio dela a pessoa humana,
física, alcance objetivos nobres e lícitos de acordo com os ditames da lei, segundo
se depreende da citação abaixo.
100 Apud BRUSCHI,Op.cit.p.117. 101 Apud TOMAZETTE,Marlon.Direito Societário.São Paulo:Juarez de Oliveira,2004.p.65.
Somente quando a pessoa jurídica for utilizada para a realização de uma fraude ou abuso de direito é que o juiz está autorizado a ignorá-la.O simples prejuízo de terceiros em razão da limitação da responsabilidade dos sócios pelas obrigações sociais nunca será, por si só, fundamento para desconsideração.Sem o elemento subjetivo, intencional, destinado a ocultar uma ilicitude atrás da pessoa jurídica, não há como superar a autonomia patrimonial que a caracteriza.Se inexiste fraude ou abuso de direito, a personalização da sociedade de ser amplamente prestigiada.102
FPT
102 CEOLIN,Op.cit.p.75.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A pessoa jurídica é um instituto do direito que surgiu como ente distinto,
autônomo, capaz de direitos e obrigações, que responde pelos seus atos, que
possui nome, domicílio, nacionalidade, independência patrimonial, características
que limitam os riscos empresariais promovendo o desenvolvimento das relações
comerciais, o crescimento de sociedades empresariais, expandindo o comércio, a
produtividade, o mercado de trabalho e a fomentação de riquezas.
De acordo com o posicionamento adotado pelo ordenamento jurídico
brasileiro, em sua natureza jurídica a pessoa jurídica é uma forma, uma investidura,
um atributo que o Estado defere aos entes merecedores desta personalização, que
só existe, porque o mundo jurídico o admite.
É uma realidade técnica que não se confunde com os sujeitos humanos,
mas que é perceptível no mundo real, na atuação das sociedades empresariais, as
quais só originam-se a partir da elaboração de seus atos constitutivos e seu
conseqüente registro no órgão competente; em tudo obedecendo aos ditames da lei.
Como sujeito autônomo e independente, a pessoa jurídica responde pelos
atos praticados em seu nome, como pessoa ela responde pelos danos ocasionados
seja por dolo ou por culpa; o que as torna responsáveis objetivamente pelos atos
ilícitos praticados por seus representantes.Observa-se que o ente, pessoa jurídica, é
essencial ao direito e ao homem. Atualmente é impossível visualizar a existência de
uma sociedade sem essa personalidade, que existe para atingir os fins sociais do
Direito.
.A desconsideração da personalidade jurídica é uma teoria que originou-se
nos países da Common Law, e consiste em um instituto que vem relativizar a
autonomia e independência existente entre pessoa jurídica e pessoa física.
Quando a personalidade jurídica das sociedades é utilizada com desvio de
função, abuso de poder ou fraude a própria lei, a desconsideração incidi para coibir
a utilização pervertida da pessoa jurídica, combatendo a má-fé, o uso indevido dos
privilégios da pessoa jurídica.
A teoria nasce a partir da premente necessidade de preservar o próprio
instituto, e assim levanta o véu da personalidade jurídica temporariamente e no caso
concreto, erguendo o dogma da autonomia, para que aqueles que agem por detrás
dela sejam responsabilizados.
Esse instituto regulamentado pelo artigo 50 do Código Civil Brasileiro em
2002 é abraçado pelo Direito Civil Brasileiro para atingir as sociedades anônimas e
as sociedades por quotas limitadas, dois tipos societários que por prescrição da
própria lei, o exaurimento do patrimônio social, não é suficiente para levar a
responsabilização dos sócios; a desconsideração é o mecanismo o remédio que
vence o impedimento da própria lei.
A desconsideração além de preservar os fins colimados pela própria lei com
a criação do ente jurídico; é um instrumento que vem garantir a efetividade de uma
ação executória de título extrajudicial por quantia certa contra devedor solvente; pois
na existência de uma sociedade empresarial, seja ela anônima ou por quotas
limitadas,em que os seus sócios agem com abuso de poder, desvio de finalidade e
fraude,a qual não encontra-se em estado falencial declarado nem presumido,
portanto, no mundo jurídico solvente, sem que nenhum elemento probatório prove
o contrário,que porém não possui patrimônio social suficiente para adimplir o titulo
executado.
Havendo os pressupostos autorizadores acima mencionados, pode ser
aplicada à desconsideração da personalidade jurídica, em vez de ser requerida a
declaração da falência da empresa executada, a desconsideração vem fazer com
que os sócios sejam responsabilizados, impedindo o inadimplemento e os calotes,
evita a processualidade de um processo falencial, e a inutilização de um tipo
processual que já está em curso, assegurando o seu julgamento e a solução ao
caso concreto, impedindo que o credor suporte o ônus de arcar com o prejuízo do
não recebimento de um crédito em razão de uma autonomia patrimonial da pessoa
jurídica que não pode ser um tabu, muito menos uma trava que intercepte a
efetivação da justiça.
O instituto é um remédio legal que deve ser utilizado com toda a cautela.
Não basta o descumprimento de uma obrigação pela sociedade empresarial, deve
coexistir os elementos autorizadores da aplicação do instituto, o qual constitui-se em
uma exceção e não em regra, o sacrifício da autonomia só ocorre com a
comprovação do desvio no uso da pessoa jurídica. E sua aplicabilidade na execução
não foge aos princípios do processo executório, que impede o aniquilamento do
sócio devedor, de forma que a onerosidade não pode ser excessiva.
Em suma, conclui-se que o presente trabalho respondeu aos objetivos
apresentados, demonstrando que admissibilidade do instituto que outrora foi teoria,
vem assegurar e preservar a existência, a integridade e a finalidade para qual foi
criada a pessoa jurídica, que é facilitar e impulsionar o desenvolvimento econômico-
social do homem, sendo, sobretudo, excelente antídoto no combate aos objetivos
escusos à lei, a todo e qualquer ato que por sua motivação e por seu fim, aja
contrariamente ao destino, contra a função do direito que se exerce, de maneira que
a desconsideração constitui-se em um avanço do Direito Civil pátrio na consolidação
da justiça, que é a maior finalidade do Direito.
7. REFERÊNCIAS
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_______.Superior Tribunal de Justiça.RESP 228357 – Relator Ministro Castro Filho, DJ de 02/02/2004.Disponivelem:http://www.stj.gov.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?acao=imprimir&livre=RDR.font.+ou+RDR.suce.&&b=JUR2&p=true&t=&l=20&i=120.Acesso em:26/06/2007.
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ANEXOS
Superior Tribunal de Justiça AgRg no AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 499.844 - PB (2002/0174334-3)RELATOR : MINISTRO CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITOAGRAVANTE : ARAÚJO E AGUIAR ADVOGADOS ASSOCIADOS LTDAADVOGADO : JOÃO PAULO DE JUSTINO E FIGUEIREDO E OUTROAGRAVADO : SERTELI - SERVIÇOS TÉCNICOS DE ENGENHARIA LTDAADVOGADO : WALTER DE AGRA JUNIOR E OUTROS EMENTA Agravo regimental. Recurso especial não admitido. Execução.Desconsideração da personalidade jurídica.1. A execução em questão foi movida contra a agravante, sociedade por quotasde responsabilidade limitada. O Tribunal a quo aplicou a Teoria daDesconsideração da Personalidade Jurídica da Empresa, tendo invocado o artigo596 do Código de Processo Civil, constatada a inexistência de bens em nome daagravante e para evitar lesão à agravada. No caso, não se tratou daresponsabilidade solidária entre os sócios, pois a dívida foi contraída pela própriaempresa e não por apenas um dos sócios. Os devedores, portanto, são os doisúnicos sócios da empresa.2. Agravo regimental desprovido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas,acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negarprovimento ao agravo regimental. Os Srs. Ministros Nancy Andrighi, Castro Filho e Antônio dePádua Ribeiro votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro AriPargendler.Brasília (DF), 19 de agosto de 2003. (data do julgamento)MINISTRO CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO Relator Superior Tribunal de JustiçaAgRg no AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 499.844 - PB (2002/0174334-3)RELATÓRIOO EXMO. SR. MINISTRO CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO:Araújo e Aguiar Advogados Associados Ltda. ingressa com agravo regimentalinconformado porque neguei provimento ao agravo de instrumento em despacho assimfundamentado: "Vistos. Araújo e Aguiar Advogados Associados Ltda interpõe agravode instrumento contra o despacho que não admitiu recurso especialassentado em ofensa aos artigos 896 do Código Civil, 165, 458, incisos II eIII, 535, inciso II, e 568, inciso I, do Código de Processo Civil, além dedissídio jurisprudencial.Insurge-se, no apelo extremo, contra Acórdão assimementado: 'AGRAVO. Execução extrajudicial movidacontra sociedade por quotas de responsabilidade limitada.Ausência de nomeação, pelos sócios, de bens da sociedade,para efeito de penhora. Ausência, ademais, do benefício deordem. Constrição judicial de bens de um dos sócios.Admissibilidade. Desprovimento. 1. Ainda que, em princípio, não devamresponder pelas dívidas da sociedade os bens particulares dosócio, nada obsta, contudo, a sua penhora, mormente quando sequer invocou o benefício de ordem, não nomeando,ademais, a teor do § 1º do art. 596 do CPC, 'bens dasociedade, sitos na mesma comarca, livres e desembargados'. 2. 'Inexistentes bens da pessoa jurídicasucumbida para a garantia executória, não estando a mesmaextinta, insta realmente se deferir a postulação para asalvaguarda dos interesses do exeqüente'.' (fls. 198)Os embargos de declaração (fls. 204 a 207) foram rejeitados(fls. 231 a 235).
Decido. Observe-se, de início, que, no caso, não há omissão a sersanada, visto que o Tribunal a quo enfrentou e decidiu, fundamentadamente,a questão jurídica posta ao seu alcance. Assim, o Acórdão recorrido não énulo, descabendo a alegação de ofensa aos artigos 165, 458, incisos II e III,e 535, inciso II, do Código de Processo Civil.Outrossim, observe-se que a questão posta nos autos foijulgada considerando-se a desconsideração da personalidade jurídica, nãoa solidariedade, como quer fazer crer o recorrente. E não se fazianecessário que os julgadores analisassem a questão sob o prisma trazidopelo recorrente, tendo-se encontrado razões suficientes para embasar suadecisão analisando a desconsideração da personalidade jurídica. Por fim, anote-se que os julgadores desconsideraram apersonalidade jurídica aplicando ao caso o artigo 596 do Código deProcesso Civil. Assim, não cabe discussão acerca do Código de Defesa doConsumidor.Ante o exposto, nego provimento ao agravo.Intime-se" (fls. 300/301).Argumenta a agravante que "ainda que se leve em conta a desconsideraçãoda personalidade jurídica" , não restou comprovado nos autos que a dívida tocava de algumaforma ao segundo sócio-cotista Edvaldo Alves de Aguiar.Sustenta que:"(...)4 - Muito pelo contrário, venia rogata, os autos comprovam,de forma exuberante, tanto que em várias passagens documentam que aorigem da dívida executada seria um título executivo extraído de um contratode prestação de serviços de construção e ampliação de um colégio depropriedade exclusiva do sócio cotista Rivaldo Antônio de Araújo Filho,firmado entre este e a Construtora ora recorrida.5 - De fato. Nas razões de seu inconformismo, disse o oraAgravante, ipsis litteris: "O sócio não emitente do título executivo - e, pois,alheio ao negócio jurídico havido entre o portador da cártula (exeqüente) e oúnico emitente (executado) - é figura absolutamente estranha à lideexecutiva, não podendo sujeitar-se à pretensão do credor de terceiro a pontode responder com os seus bens particulares, por débito particular do outrosócio - cotista" (fl. 310). Alega, por fim, que: "(...)8 - Além disso, ad argumentandum tantum , ainda que orecorrente Edvaldo, fosse parte legítima para figurar no pólo passivo dademanda executiva, inocorre, na espécie, qualquer motivo que autorize adesconsideração da personalidade jurídica, uma vez que, para a aplicaçãode tal fenômeno jurídico de índole excepcional, faz-se necessáriocomprovação, a contento, de existência de abuso de direito, violação docontrato, dolo ou dissolução irregular da empresa , circunstâncias essas que,em momento algum, na hipótese submetida a julgamento, foram sequerventiladas, muito menos comprovadas" (fl. 311).É o relatório. AgRg no AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 499.844 - PB (2002/0174334-3) EMENTA Agravo regimental. Recurso especial não admitido. Execução.Desconsideração da personalidade jurídica.1. A execução em questão foi movida contra a agravante, sociedade por quotasde responsabilidade limitada. O Tribunal a quo aplicou a Teoria daDesconsideração da Personalidade Jurídica da Empresa, tendo invocado o artigo596 do Código de Processo Civil, constatada a inexistência de bens em nome daagravante e para evitar lesão à agravada. No caso, não se tratou daresponsabilidade solidária entre os sócios, pois a dívida foi contraída pela própriaempresa e não por apenas um dos sócios. Os devedores, portanto, são os doisúnicos sócios da empresa.2. Agravo regimental desprovido.VOTO O EXMO. SR. MINISTRO CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO:
O inconformismo não merece prosperar.No presente caso, a execução em questão foi movida contra a agravante,sociedade por quotas de responsabilidade limitada. Os dois únicos sócios da empresa são ossenhores Edvaldo Alves de Aguiar e Rivaldo Antônio de Araújo Filho.O Tribunal a quo aplicou a Teoria da Desconsideração da Personalidade Jurídicada Empresa, tendo invocado o artigo 596 do Código de Processo Civil, constatada a inexistênciade bens em nome da agravante e para evitar lesão à agravada. Vejamos os fundamentos doacórdão: "Em princípio, não devem os bens particulares do sócio pelasdívidas da sociedade 'senão nos casos previstos em lei'. Essa é a dicção daprimeira parte do art. 596 do CPC, segundo o qual, em sua segunda parte,dispõe que 'o sócio, demandado pelo pagamento da dívida, tem direito aexigir que sejam primeiro excutidos os bens da sociedade'. Para esse efeito,contudo - é a ilação que se recolhe do § 1º desse preceito -, deverá o sócio,'que alegar o benefício deste artigo, nomear bens da sociedade, sitos namesma comarca, livres e desembargados, quantos bastem para pagar odébito'.No caso sub judice, o primeiro sócio da agravante - que tevebens imóveis penhorados - não invocou o benefício de ordem e tampouconomeou bens da sociedade, em conformidade com o referido parágrafo.Demais disso, não trouxe a agravante à colação essa matéria nos embargosdo devedor (fls. 86 a 93), que, aliás, foram declarados extintos, 'com fulcronos artigos 257, 267, § 1º, e 736, todos do CPC' (fls. 127-128). E essadecisão transitou em julgado (fls. 129)....hei de proclamar que dos autos não consta a existência debens em nome da agravante, o que foi aferido pelo oficial de justiça (fls. 21v.), pois asseverou, em sua certidão, que lavrou a penhora 'em bens dosócio Rivaldo Antônio de Araújo Filho'. E é escusado afirmar que aagravante não possui bens para a garantia da execução, bastando, paraesse efeito, examinar o contrato de constituição da sociedade cuja CláusulaQuinta estabelece que 'o capital social será inicialmente de R$ 1.000,00(hum mil reais) dividido entre os sócios da maneira seguinte: o sócio RivaldoAntônio de Araújo Filho com R$ 500,00 (quinhentos reais) e o sócio Edvaldo Alves de Aguiar com R$ 500,00 (quinhentos reais) cujasintegralizações promovem nesta data, em moeda corrente do País' (fls. 97)..Finalmente, gostaria de enfatizar que, se não for aplicada, nocaso concreto, a teoria da desconsideração da pessoa jurídica, estaria aconsumar-se uma lesão à agravada" (fls. 199/200).Não há falar, assim, em ilegitimidade de um dos sócios, pois o débito foi contraídopela própria sociedade.Diante dos fundamentos acima transcritos e sendo a dívida da empresa, em nomeda qual não foram encontrados bens penhoráveis, regular a constrição sobre bens de um dos doisúnicos sócios cotistas. Vejamos os precedentes da Corte:"Processual Civil. Recurso especial. Ação de embargos dodevedor à execução. Acórdão. Revelia. Efeitos. Grupo de sociedades.Estrutura meramente formal. Administração sob unidade gerencial, laboral epatrimonial. Gestão fraudulenta. Desconsideração da personalidadejurídica da pessoa jurídica devedora. Extensão dos efeitos ao sóciomajoritário e às demais sociedades do grupo. Possibilidade.- A presunção de veracidade dos fatos alegados pelo autor emface à revelia do réu é relativa, podendo ceder a outras circunstânciasconstantes dos autos, de acordo com o princípio do livre convencimento doJuiz. Precedentes. - Havendo gestão fraudulenta e pertencendo a pessoajurídica devedora a grupo de sociedades sob o mesmo controle e comestrutura meramente formal, o que ocorre quando as diversas pessoasjurídicas do grupo exercem suas atividades sob unidade gerencial, laboral epatrimonial, é legitima a desconsideração da personalidade jurídica dadevedora para que os efeitos da execução alcancem as demais sociedadesdo grupo e os bens do sócio majoritário.- Impedir a desconsideração da
personalidade jurídica nestahipótese implicaria prestigiar a fraude à lei ou contra credores.- A aplicação da teoria da desconsideração da personalidadejurídica dispensa a propositura de ação autônoma para tal. Verificados ospressupostos de sua incidência, poderá o Juiz, incidentemente no próprioprocesso de execução (singular ou coletivo), levantar o véu dapersonalidade jurídica para que o ato de expropriação atinja os bensparticulares de seus sócios, de forma a impedir a concretização de fraude àlei ou contra terceiros." (REsp nº 332.763/SP, Terceira Turma, Relatora aMinistra Nancy Andrighi, DJ de 24/6/02)"Recurso ordinário. Mandado de segurança. Ação decobrança. Indisponibilidade de bens. Desconsideração da personalidadejurídica. Produção de provas.1. O Acórdão recorrido bem afastou a pretensão manifestadano mandado de segurança ao entendimento de que correta a decisãoimpugnada face a conclusão de que há, consoante os elementos probatóriosproduzidos, possibilidade de ocorrência de fraude contra credores.Esclareceu o Acórdão, ainda, estar comprovado que a impetrante é sócia daré na ação de cobrança. Nesses casos, a jurisprudência desta Corte admite a desconsideração da personalidade jurídica para evitar a fraude.2. O acolhimento da pretensão contida no mandamusdemandaria dilação probatória, prática que não se mostra compatível com avia eleita.3. Recurso ordinário desprovido." (RMS nº 15.312/MG,Terceira Turma, de minha relatoria, DJ de 04/8/03)Esclareço, por fim, que no caso não se tratou da responsabilidade solidária entreos sócios, pois a dívida foi contraída pela própria empresa e não por apenas um dos sócios. Osdevedores, portanto, são os dois únicos sócios da empresa. Não honrada a dívida e não tendo aempresa bens penhoráveis, justifica-se a captura de bens do sócio-devedor para evitar a fraudecontra credores.Nego provimento ao agravo regimental.
CÂMARA CÍVEL
100.001.1995.019089-7
Agravo de Instrumento 41741
Origem : 00119950190897 Porto Velho/RO (3ª Vara Cível)
Agravante: Aldemar Moreno de Andrade
Advogados: Hélio Vieira da Costa (OAB/RO 640) e outra
Agravada : Cintex Indústria e Comércio de Movéis Ltda.
Advogado : Ely Roberto de Castro (OAB/RO 509)
Agravado : Aroldo Gonçalves da Costa
Advogado : Lourival Goedert (OAB/RO 477-A)
Relator : Desembargador Renato Mimessi
RELATÓRIO
Cuida-se de agravo de instrumento manejado por Aldemar Moreno de Andrade
contra decisão que, proferida pelo Juiz da 3ª Vara Cível desta Comarca, após
chamar o feito à ordem, desconstituiu a penhora realizada, indeferiu os pedidos do
exeqüente e determinou sua intimação para que se manifestasse, se ainda tinha
interesse na continuidade do feito.
Sustenta o agravante que a decisão de penhora sobre bens dos sócios da agravada
foi proferida em agosto de 1998, quando ainda não vigia o Novo Código Civil, que
prevê a figura da desconstituição da personalidade jurídica. Afirma que a lei não
pode retroagir no tempo e interferir de forma substancial numa execução que já
prossegue há mais de seis anos.
Assevera que a incidência da penhora sobre os bens dos sócios da agravada foi
deferida não com base na desconstituição da personalidade jurídica, que naquela
época, não se encontrava em vigor, mas, sim, com base na sedimentada
jurisprudência que permitia a providência sempre que a empresa encerrasse suas
atividades de modo irregular, em evidente fraude contra credores. Colaciona aos
autos decisões recentes nesse sentido.
Por fim, alega estar preclusa a matéria, uma vez que não foi objeto de recurso no
momento oportuno, porquanto além de o agravado ter tomado ciência da decisão
em janeiro de 1999, já se manifestou outras vezes nos autos, deixando para alegar o
fato apenas quando o imóvel foi levado à leilão judicial.
Requer seja dado provimento ao agravo, prosseguindo-se a execução contra os
sócios da executada.
O juiz prestou as informações, ratificando a decisão proferida.
Os agravados deixaram de apresentar a contraminuta.
É o relatório.
VOTO
DESEMBARGADOR RENATO MIMESSI
Pretende o agravante a reforma da decisão proferida pelo magistrado de primeiro
grau, que chamou o feito à ordem e desconstituiu a penhora realizada, ao
argumento de que não poderia prosseguir a execução em face do agravado,
porquanto não houve deferimento da desconsideração da personalidade jurídica.
Compulsando-se os autos, verifica-se que a execução se originou de sentença
judicial transitada em julgado, por meio da qual foi a empresa Cintex condenada ao
pagamento de uma indenização no valor de R$45.350,40 (quarenta e cinco mil
trezentos e cinqüenta reais e quarenta centavos), em razão de acidente de trabalho.
Iniciada a execução, o oficial de justiça, em cumprimento ao mandado de citação,
penhora e avaliação, constatou que a empresa não mais existia, nada encontrando
em seu nome para proceder o arresto.
Foi então requerido pelo exeqüente, ora agravante, a expedição de novo mandado
em nome dos sócios, tendo em vista a irregularidade na dissolução da sociedade, o
que foi deferido pelo magistrado em decisão proferida em 31/8/1998. Em 22/1/1999,
foram citados os sócios Aroldo Gonçalves da Costa e Francisco Severino Iananes
de Oliveira, tendo aquele primeiro oferecido bem à penhora, consoante auto de
penhora e avaliação juntado aos autos.
Em razão da sobrevinda de embargos, foi o agravado intimado a oferecer outro bem
à penhora, que não fosse pertencente a terceiro, deixando transcorrer in albis o
prazo.
O agravante indicou então um lote de terras, sendo o agravado devidamente
intimado da penhora, muito embora tenha se negado a exarar seu ciente, conforme
certidão da oficial de justiça.
Posteriormente, ao ser o agravado intimado da data e horário para venda judicial do
imóvel, veio aos autos alegar a nulidade da penhora por ter recaído sobre o bem de
família, a falta de citação e intimação do cônjuge e do advogado constituído, bem
como questionar o valor de avaliação do bem.
O magistrado de primeiro grau desconstituiu a penhora realizada, entendendo que a
execução haveria de cessar com relação ao Sr. Aroldo, porquanto não teria ocorrido
a desconstituição da personalidade jurídica.
Diante de tais fatos, entendo assistir razão ao agravante.
Com efeito, a matéria já havia sido decidida no ano de 1998, quando o magistrado
deferiu o pedido de que fossem penhorados bens dos sócios para satisfazer a
execução, tendo em vista que a sociedade havia sido dissolvida irregularmente, sem
comunicação à Junta Comercial e aos órgãos competentes.
Diante desse fato, conforme sedimentado na jurisprudência, existindo um título
executivo judicial e sendo constatada a dissolução irregular da sociedade, exsurge a
responsabilidade patrimonial dos sócios da empresa.
Nesse sentido:
Embargos de terceiro. Execução. Penhora incidente sobre bens particulares do
sócio. Dissolução irregular das empresas executadas. Constrição admissível. O
sócio de sociedade por cotas de responsabilidade limitada responde com seus bens
particulares por dívida da sociedade quando dissolvida esta de modo irregular.
Incidência no caso dos arts. 592, inc. II, 596 e 10 do Decreto. n. 3.708, de 10/1/1919.
Recurso especial não conhecido (REsp. n. 140.564/SP, Rel. Ministro BARROS
MONTEIRO,DJ17/12/2004).
E ainda:
1-Processual Civil e Comercial. Preliminar de cerceamento de defesa. Dissolução
irregular de sociedade comercial. Responsabilidade dos sócios.
2 - Tendo a empresa encerrado de forma irregular suas atividades, merece ser
confirmada a sentença que declara a responsabilidade ilimitada dos sócios,
relativamente às obrigações por eles contraídas em nome da sociedade
(APC4851298/DF, Relator Mário-Zam Belmiro, DJU 3/2/1999). Dessa forma, já
existindo decisão acerca da possibilidade, na presente hipótese, dos bens dos
sócios responderem pela execução, não poderia o magistrado chamar o feito à
ordem para afirmar o contrário, máxime se o Sr. Aroldo Gonçalves da Costa foi
intimado do deferimento do pedido de que a execução recaísse sobre tais bens, não
interpondo nenhum recurso no momento oportuno.
Em face do exposto, dou provimento ao agravo para reformar a decisão de primeiro
grau e determinar o prosseguimento da execução contra os sócios. É o meu voto
DESEMBARGADOR GABRIEL MARQUES DE CARVALHO
Acompanho o voto do relator.
JUIZ CONVOCADO JOSÉ ANTONIO ROBLES
Acompanho.
DECISÃO
Como consta da ata de julgamentos, a decisão foi a seguinte: RECURSO PROVIDO
POR UNANIMIDADE.
Presidente e Relator o Excelentíssimo Desembargador Renato Mimessi. Tomaram
parte no julgamento os Excelentíssimos Desembargadores Renato Mimessi, Gabriel
Marques de Carvalho e o Excelentíssimo Juiz convocado José Antonio Robles.
Porto Velho, 20 de setembro de 2005.
Desconstituição da penhora realizada. Dívida da sociedade. Dissolução irregular.
Incidência sobre bens dos sócios. Matéria já decidida anteriormente. Inexistência de
recurso a respeito. Manutenção.
Ocorrendo a dissolução irregular da sociedade, e inexistindo bens em seu nome,
respondem pela execução os bens do patrimônio particular dos sócios, máxime se já
houve decisão judicial a respeito, não combatida via recurso no momento oportuno.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Desembargadores da
Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia, na conformidade da
ata de julgamentos e das notas taquigráficas, em, POR UNANIMIDADE, DAR
PROVIMENTO AO RECURSO.
Porto Velho, 20 de setembro de 2005.
DESEMBARGADOR RENATO MIMESSI PRESIDENTE E RELATOR
Agravo de instrumento n. 2002.014151-3, de Criciúma.
Relator: Des. Fernando Carioni.
AGRAVO DE INSTRUMENTO - EXECUÇÃO - ARRESTO DE BENS - PREJUÍZO A
TERCEIROS - HIPÓTESE CARACTERIZADA - DESCONSIDERAÇÃO DA
PERSONALIDADE JURÍDICA - APLICABILIDADE. COMPROVAÇÃO DA
PROPRIEDADE - CERTIDÃO EXARADA PELO OFICIAL DE JUSTIÇA - FÉ
PÚBLICA - PRESUNÇÃO DE VERACIDADE. FRAUDE À EXECUÇÃO - CARÁTER
EXCEPCIONAL - RESPONSABILIDADE ILIMITADA DOS SÓCIOS -
ADMISSIBILIDADE.
Para a aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica, faz-se
insofismável a comprovação de que os sócios tenham agido, alternativamente, com
abuso de direito, desvio de poder, fraude à lei, violação aos estatutos ou ao contrato
social, ou em palmar prejuízo a terceiros" (Agravo de instrumento n. 01.021960-3, de
Araranguá).
Os atos praticados pelo Oficial de Justiça são dotados de fé pública e, em princípio,
devem ser reputados válidos. Desta feita, há a presunção de veracidade, de cunho
juris tantum, incumbindo ao interessado o ônus de demonstrar a sua inadequação.
Em se tratando de responsabilidade limitada dos sócios, é sabido que esta
contempla algumas exceções, vez que, em hipóteses de caráter excepcional, dentre
as quais se inclui a fraude à execução, aqueles responderão subsidiária, mas
ilimitadamente, pelas obrigações sociais.
RECURSO PROVIDO.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de agravo de instrumento n. 02.014151-3,
da Comarca de Criciúma, em que é agravante Canguru Embalagens Criciúma Ltda.,
e agravada Gauplast Indústria e Comércio de Plásticos Ltda.:
ACORDAM, em Terceira Câmara Civil, por votação unânime, conhecer e dar
provimento ao recurso.
Custas na forma da lei.
RELATÓRIO:
Trata-se de agravo de instrumento interposto por Canguru Embalagens Criciúma
Ltda. contra decisão prolatada pela MMa. Juíza de Direito da 2ª Vara Cível da
Comarca de Criciúma que, nos autos da Ação de Execução n. 020.99.015400-9,
indeferiu pedido de arresto de bens, sob a alegativa de que "não existe prova de que
os bens que se pretende arrestar são de propriedade da executada Galplast" (fls.
09).
Aduz a agravante, a aplicabilidade da teoria da desconsideração da personalidade
jurídica, a fim de superar eventuais vícios decorrentes da constituição de pessoa
jurídica, nos casos em que ela é utilizada como estratégia para encobrir propósitos
escusos de seus titulares.
Afirma que a certidão de fls. 15v., com fé pública, deixou evidenciado que o
proprietário da empresa agravada é o Sr. Enivaldo Gava, alegando, para tanto, que
este sempre foi sócio-proprietário daquela e que, após contrair muitas dívidas,
constituiu uma nova empresa (Amplast), a fim de fraudar seus credores, a qual
funciona desde 1998 no mesmo endereço da empresa executada, sem qualquer
baixa desta perante a Junta Comercial, utilizando-se dos mesmos equipamentos,
com a mesma atividade e gerência.
Não houve pedido de efeito suspensivo.
Sem contra-minuta.
VOTO:
O conteúdo da postulação há de ser apreciado, ante a presença dos pressupostos
de admissibilidade recursal.
Discute-se aqui, primordialmente, se há ou não a possibilidade da desconsideração
da personalidade jurídica, ante a alegativa de sucessão de empresas, com a
finalidade de fraudar credores.
Para a aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica, faz-se
indispensável que se comprove uma das seguintes hipóteses: que os sócios tenham
agido com abuso de direito, desvio de poder, fraude à lei, praticado fato ou ato ilícito,
violado os estatutos ou o contrato social ou, ainda, que os atos praticados por
aqueles tenham causado prejuízos a terceiros.
Segundo Athos Gusmão Carneiro, os pressupostos acima consignados "são de
extrema importância para ensejar a aplicação da desconsideração da
personalidade jurídica. Por fundamental que haja e seja demonstrado o abuso de
direito, ou o desvio de poder, assim como estejam evidenciados os prejuízos,
causados a terceiro, em virtude da confusão patrimonial entre o controlador (pessoa
física ou jurídica) e a empresa controlada (pessoa jurídica). É preciso que tenha
havido uma fraude contra terceiros, praticada pelo controlador, utilizando-se da
pessoa jurídica como uma espécie de véu, que venha a acobertá-lo, ou de biombo
que dissimule a efetiva atuação da pessoa física, ensejando, por parte do Poder
Judiciário, o levantamento do véu e o afastamento do biombo" (RJ n. 217/05).
Deste Tribunal:
A teoria da disregard of legal entity só tem cabimento diante de hipóteses
excepcionalíssimas, quando demonstrado que a pessoa jurídica fora manipulada por
seu dirigente a fim de fraudar o direito de terceiros" (AI n. 97.000426-5, de Brusque,
rel. Des. Eder Graf).
Nesse sentido, têm os Tribunais reconhecido que a teoria da disregard of legal entity
só tem cabimento diante de hipóteses excepcionalíssimas, ou seja, quando presente
a intenção dolosa, dirigida à infração dos preceitos legais, consubstanciada em atos
praticados pelo sócio da sociedade. Em tais casos, faz-se possível a execução e
penhora sobre os bens particulares deste, isto se admitindo, também, quando não
demonstrada a integralização do capital ou a irregular extinção da empresa, ou,
ainda, quando ocorrer confusão entre a pessoa física e a pessoa jurídica.
In casu, a certidão de fls. 15 comprova que o Sr. Enivaldo Gava é proprietário da
empresa Gauplast Indústria e Comércio de Plásticos Ltda., tendo constituído outra
empresa, a qual funciona no mesmo endereço da recorrida, sem qualquer baixa
desta perante a Junta Comercial, sendo que ambas atuam na mesma atividade e
tem o Sr. Enivaldo Gava no papel de sócio-proprietário, o que evidencia que este
está tentando furtar-se do cumprimento de suas obrigações, a fim de causar prejuízo
a terceiros.
Quanto à certidão exarada pelo Oficial de Justiça, que corrobora a propriedade do
Sr. Enivaldo Gava, há que se ressaltar que os atos praticados por aquele, como é
cediço, gozam de fé pública e, em princípio, devem ser reputados válidos. Desta
feita, há a presunção de veracidade, de cunho juris tantum, incumbindo ao
interessado o ônus de demonstrar sua inadequação.
A respeito, ensina o Doutrinador Alexandre de Paula:
A intimação certificada por oficial de justiça - que tem fé pública, de valor
praticamente absoluto - é de ser aceita até inequívoca prova em contrário, que é
ônus da parte interessada (Ac. unân. da 5a. Câm. do TJRJ de 7.4.87, no agr.
270/87, rel. Des. Jorge Loretti; RDTJRJ, 4/263).
O oficial de justiça tem fé pública. O que ele certifica é tido como verdadeiro até
prova em contrário. Em outras palavras: há presunção iuris tantum de autenticidade
e de veracidade do que ele porta por fé (...) (Ac. unâm. da 6a. Câm. do 1°. TACivSP
de 17.6.86, na apel. 357.486, rel. juiz Ernâni de Paiva)." (in Código de Processo Civil
Anotado, vol. I, 6. ed., São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 1994, p. 682/683).
Egas Moniz de Aragão é enfático:
Dotado de fé pública - por isso pode portar por fé - o oficial atesta o que se passou,
independendo da contribuição do citando." (in Comentários ao CPC, Forense, vol. II,
p. 220 - apud, RTJ 121/749).
No mesmo sentido é a jurisprudência do nosso Tribunal:
Os atos praticados por oficial de justiça gozam de fé-pública, constituindo-se
presunção juris tantum de regularidade em seu favor, devendo a parte que os atacar
fazer prova cabal de que não está conforme a verdade nele declarada. (...) (AI n.
98.014441-8, de Ponte Serrada, Des. Nilton Macedo Machado, j.18.03.99).
Outrossim, afirma a recorrente que o Sr. Enivaldo Gava deu à credora, como
pagamento de compras de matéria-prima, cheques seus, os quais estão sendo
objeto de ação monitória, ante a falta de fundos, fato este corroborado nos autos, às
fls. 32/33, sendo que o vencimento de um deles se deu em data anterior à
constituição da segunda empresa, denotando-se, assim, o vínculo do Sr. Enivaldo
Gava com a empresa executada.
No que toca à responsabilidade limitada dos sócios, é sabido que esta contempla
algumas exceções, vez que, em hipóteses de caráter excepcional, dentre as quais
se inclui a fraude à execução, aqueles responderão subsidiária, mas ilimitadamente,
pelas obrigações sociais.
Nesse espírito, leciona o doutrinador Fábio Ulhoa Coelho:
Se o sócio fraudar credores valendo-se do expediente da separação patrimonial,
poderá ser responsabilizado ilimitadamente por obrigação da sociedade, em
decorrência da teoria da desconsideração da pessoa jurídica." (in Manual de Direito
Comercial, 12.ed., São Paulo: Saraiva, 2000, p.150).
Assim sendo, a responsabilidade recai, ilimitadamente, na pessoa do Sr. Enivaldo
Gava - sócio-proprietário da empresa agravada.
Diante de todo o exposto, a reforma da decisão guerreada é medida que se impõe.
DECISÃO:
Nos termos do voto do relator, conhece-se do recurso para dar-lhe provimento.
Participaram do julgamento, com votos vencedores, os Exmos. Srs.
Desembargadores Cláudio Barreto Dutra e Torres Marques.
Florianópolis, 31 de outubro de 2002.
Cláudio Barreto Dutra
PRESIDENTE COM VOTO
Fernando Carioni
RELATOR
AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0400921-2, DA 8ª VARA CÍVEL DO FORO
CENTRAL DA COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE CURITIBA
AGRAVANTE: HOLCIM BRASIL S/A
AGRAVADOS: CEDIZA CONSTRUÇÕES LTDA E OUTRO
RELATOR: DES. RUBENS OLIVEIRA FONTOURA
AGRAVO DE INSTRUMENTO - EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL -
DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA - APLICAÇÃO DA
TEORIA MENOR DA DESCONSIDERAÇÃO - COMPROVAÇÃO DE INSOLVÊNCIA
DAAGRAVADA-RECURSOPROVIDO.
Deve haver a aplicação da teoria menor da desconsideração da personalidade
jurídica quando verificar-se que a existência da pessoa jurídica é obstáculo ao
adimplemento da obrigação em razão de sua insolvência.VISTOS, relatados e
discutidos estes autos de Agravo de Instrumento nº 0400921-2, da 8ª Vara Cível do
Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba, em que é agravante
HOLCIM BRASIL S/A e agravados CEDIZA CONSTRUÇÕES LTDA. E OUTRO
1.EXPOSIÇÃO
Trata-se de agravo de instrumento interposto por HOLCIM BRASIL S/A, contra
decisão do Dr. Juiz de Direito da 8ª Vara Cível do Foro Central da Comarca da
Região Metropolitana de Curitiba, que nos autos nº 29/04, de Execução de Título
Extrajudicial, indeferiu o pedido de desconsideração da personalidade jurídica da
empresa executada para atingir o patrimônio do sócio quotista minoritário.Pugnou
pela concessão do efeito suspensivo ao agravo de instrumento, sob a justificativa de
que estariam presentes o fumus boni iuris, traduzida pelo entendimento atual do
Tribunal de Justiça do Paraná de que o sócio minoritário poderia ser
responsabilizado pelas dívidas da empresa, sendo que para a desconsideração da
personalidade jurídica da empresa bastariam indícios.Disse que nesse caso o sócio
Rodrigo Vieira Proença teria declarado ciência da situação financeira e econômica
da empresa e que este seria responsável pelas obrigações anteriores ao seu
ingresso na sociedade (cláusula 6ª da alteração contratual), ou seja, pelas duplicatas
vencidas antes do seu ingresso na empresa. Destacou que a empresa agravada não
teria o objetivo de cumprir com as obrigações da empresa, inclusive após o ingresso
do sócio minoritário, já que sequer haveria cumprido com o acordo homologado
anteriormente.Quanto ao periculum in mora, sustentou residir no fato de que os
únicos bens encontrados a fim de pagar a dívida exeqüenda seriam os veículos do
sócio minoritário, razão pelo qual, pediu a expedição de ofício ao DETRAN/PR para
bloqueio do veículo, a fim de impossibilitar sua alienação.Asseverou que o bloqueio
seria necessário para evitar a transferência do bem e, consequentemente, fraudar
credores de boa-fé ou até mesmo a execução.Às fls. 115/117 deixou-se de
conceder o efeito suspensivo pretendido.Prestadas as informações pelo juízo
monocrático (fls. 122/123) este informou que o agravante cumpriu com o previsto no
art. 526 do CPC, bem como que manteve a decisão agravada por seus próprios
fundamentos. Conforme certidão de fls. 124 a parte contrária deixou de apresentar
contra-razões.
É o relatório.
2.VOTO
O presente recurso de agravo de instrumento merece ser provido pelos fundamentos
que seguem.
Trata-se de agravo de instrumento através do qual pretende a agravante ver
reformada a decisão que deixou de determinar a desconsideração da
personalidade jurídica da empresa executada para atingir o patrimônio do sócio
quotista minoritário.
Por oportuno interessante transcrever a decisão recorrida: "Em que pese o
posicionamento defendido pela exeqüente, não é possível que a
desconsideraçãoda personalidade jurídica da sociedade, atinja bens e direitos de
sócio quotista, cuja responsabilidade limita-se ao capital integralizado. A disposição
legal que autoriza essa desconsideração, inclusive, é clara ao estabelecer a
responsabilidade dos sócios administradores (ou sócios gerentes), mas nunca um
sócio que simplesmente integralizou capital na sociedade.Por isto, indefiro o
requerimento" (fls. 106).
Importante analisar os casos em que se admite a desconsideração da
personalidade jurídica.
Destaca-se que a teoria da desconsideração da pessoa jurídica pode ser
conceituada como sendo um afastamento momentâneo da personalidade jurídica da
sociedade, para destacar ou alcançar diretamente a pessoa do sócio, como se a
sociedade não existisse, em relação a um ato concreto e específico. Tal questão
veio disposta no art. 50 do Código Civil que assim prevê:"Art. 50: Em caso de abuso
da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão
patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público
quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas
relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores
ou sócios da pessoa jurídica."Desta feita, pode haver a desconsideração da
personalidade jurídica nos casos em que houver demonstração do abuso da pessoa
jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial, sendo
que no caso em análise, deve ficar configurado que tais hipóteses estão causando
prejuízo aos credores. Pondera-se que ultimamente tem-se feito uso de uma nova
teoria, chamada Menor Desconsideração, em que basta a insolvência da sociedade
para que se possa, imediatamente, buscar o patrimônio dos sócios para a satisfação
das obrigações da sociedade.Assim já decidiu este Tribunal de Justiça, veja-
se:"AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL.
PRELIMINAR DE NULIDADE DA DECISÃO RECORRIDA POR AUSÊNCIA DE
FUNDAMENTAÇÃO AFASTADA. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE
JURÍDICA. EXISTÊNCIA DE PROVA DA OCORRÊNCIA DE CONFUSÃO
PATRIMONIAL. ARTIGO 50 DO CÓDIGO CIVIL. DECISÃO MANTIDA. 1. Existindo
prova da ocorrência de abuso da personalidade jurídica, caracterizada pela confusão
patrimonial, desvio de finalidade, abuso de direito, excesso de poder, infração da lei,
fato ou ato ilícito, violação dos estatutos ou contrato social, bem como quando
houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa
jurídica provocados por má administração, deve ser aplicada a desconsideração da
personalidade jurídica, a teor do disposto no artigo 50 do Código Civil e do artigo 28
do Código de Defesa do Consumidor - Lei de nº 8.078/1990. 2. " Impedir a
desconsideração da personalidade jurídica nesta hipótese implicaria prestigiar a
fraude à lei ou contra credores" (STJ, 3ª Turma, RMS 16105/GO, Relator Min. Nancy
Andrighi, DJU 22/09/2003, p. 314) RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO."
(TJPR, Ac. nº 3935, 16ª C.C., Rel. Des. Shiroshi Yendo, julg. em
04.10.2006)AGRAVO DE INSTRUMENTO - EXECUÇÃO DE TÍTULO
EXTRAJUDICIAL CONTRA PESSOA JURÍDICA - INEXISTÊNCIA DE BENS PARA
GARANTIR A EXECUÇÃO - TEORIA DA MENOR DESCONSIDERAÇÃO -
ENCERRAMENTO IRREGULAR DAS ATIVIDADES - DESCONSIDERAÇÃO DA
PERSONALIDADE JURÍDICA - POSSIBILIDADE - BENS DOS SÓCIOS E
ADMINISTRADOR DEVERÃO GARANTIR A DÍVIDA - LEGITIMIDADE PASSIVA
MANTIDA - RECURSO PROVIDO - 1. "Na ausência de bens para garantir dívida da
pessoa jurídica, a penhora recairá sobre bens de propriedade dos sócios; hipótese
perfeitamente possível ante a doutrina da Desconsideração da Personalidade
Jurídica, haja vista que a pessoa jurídica não possui lastro patrimonial para suportar
as dívidas contraídas. Recurso conhecido e provido". (TJPR, 17ª Câm. Cív., AC.
852, Rel. Des. Rosana Amara Girardi Fachin, j. 10/06/05); 2. A aplicação da teoria
menor da desconsideração às relações de consumo está calcada na exegese
autônoma do § 5º do art. 28, do CDC, porquanto a incidência desse dispositivo não
se subordina à demonstração dos requisitos previstos no caput do artigo indicado,
mas apenas à prova de causar, a mera existência da pessoa jurídica, obstáculo ao
ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores. (STJ, 3ª Turma, rEsp
279.273-SP, Rel. Min. Nancy Adrighi); 3. Além da ausência de patrimônio capaz de
pagar a dívida, a empresa não encerrou suas atividades de forma regular, o que
também autoriza a desconsideração de sua personalidade jurídica, devendo os
sócios e administrador garantir o débito, permanecendo no pólo passivo da
demanda. (TJPR - AI 0321836-6 - 16ª C.Cív. - Rel. Des. Hélio Henrique Lopes
Fernandes Lima - J. 01.02.2006) (grifou-se).Salienta-se que às fls. 130 dos autos
originários (fls. 81-TJ) o douto magistrado assim decidiu:"Observando-se que a
pessoa jurídica ora executada, encerrou de forma irregular suas atividades, não
deixando ativo para saldar sua obrigações, passam os sócios-gerentes a responder
subsidiariamente aos débitos deixados por conta de sua administração irregular, a
teor do artigo 10, do Decreto-lei 3.708/19. (...)À vista do exposto, acolho o pedido
retro, para desconsiderar a personalidade jurídica da empresa executada,
determinando a inclusão no pólo passivo da execução, do sócio qualificado às fls.
128, último parágrafo". Assim, verificando-se que já fora desconsiderada a
personalidade jurídica da empresa de forma parcial, somente atingindo um dos
sócios, e detectando-se que este não possui bens capazes de satisfazer o crédito do
ora agravante conforme se verifica das certidões do Sr. Oficial de Justiça constantes
às fls. 83 e seguintes, impõe-se que seja novamente desconsiderada a
personalidade jurídica da empresa agravada para, agora, atingir o sócio minoritário.
Isto porque, conforme ensina Silvio Venosa (Teoria Geral do Direito Civil, fls. 313)
quando ocorre a desconsideração da personalidade, não deve ser levada em conta
a personalidade técnica, não devendo ser tomada em consideração sua existência,
decidindo o julgador como se o ato ou negócio houvesse sido praticado pela pessoa
natural, devendo ser imputada a responsabilidade aos sócios e membros integrantes
da pessoa jurídica.
Portanto, levantando-se o véu da personalidade jurídica tem-se que os atos
praticados pelos sócios, em nome da sociedade, foram praticados pela própria
pessoa natural devendo a esta ser imputada a responsabilidade pelos débitos
existentes.
Além disto, destaca-se que ambos os sócios quando do ingresso na sociedade
afirmaram estar cientes da situação econômica da empresa, assumindo inteiramente
e ficando sub-rogados em quaisquer direitos e obrigações, conforme se vê da
cláusula terceira da sexta alteração contratual às fls. 99.Desta feita, verificando-se a
insolvência da agravada e não possuindo o sócio gerente bens para saldar o débito,
é medida que se impõe a desconsideração da personalidade jurídica para atingir o
sócio minoritário, haja vista que esgotado os demais meios possíveis para o
adimplemento da obrigação.
A contrario sensu esse é o entendimento que se denota do seguinte
julgado:"AGRAVO DE INSTRUMENTO - EXECUÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER
- PESSOA JURÍDICA CONDENADA AO PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO -
PEDIDO DE BLOQUEIO DE BENS DE SÓCIO MINORITÁRIO, SEM PODER DE
GERÊNCIA - DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE - PRESSUPOSTOS
AUSENTES - ABUSO E DESVIO DE FINALIDADE NÃO DEMONSTRADOS - NÃO
COMPROVAÇÃO DA INATIVIDADE OU DA INSOLVÊNCIA DA PESSOA
JURÍDICA. Não havendo prova de abuso ou desvio de finalidade e não estando
demonstrada a insolvência ou a inatividade da pessoa jurídica, não há razão para
desconsiderar a personalidade jurídica e proceder ao bloqueio de bens do ex-sócio
minoritário, máxime quando este não detinha poder de gerência. RECURSO
CONHECIDO E NÃO PROVIDO." (TJPR, Ac. nº 3377, 9ª C.C., Rel. Des. Rosana
Amara Girardi Fachin, julg. em 14.09.2006).Na mesma linha de raciocínio são os
seguintes julgados deste Tribunal de Justiça: "EMBARGOS À EXECUÇÃO - AÇÃO
MONITÓRIA - DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA DA
EMPRESA DEVEDORA - DECISÃO CORRETA - PENHORA EFETIVADA EM BEM
DE SÓCIO QUE NÃO EXERCIA ATOS DE ADMINISTRAÇÃO DA EMPRESA ORA
DESATIVADA - POSSIBILIDADE - AUSÊNCIA DE CITAÇÃO DA SÓCIA ORA
APELANTE - ATO SUPRIDO PELO COMPARECIMENTO ESPONTÂNEO AOS
AUTOS - NULIDADE INOCORRENTE - CERCEAMENTO DE DEFESA -
INOCORRÊNCIA. (...) A teoria da desconsideração da personalidade jurídica
(disregard doctrine) é albergada pelo direito pátrio para defender o interesse dos
credores de boa-fé, que não conseguem satisfazer seus créditos frente a empresas
que se valem dos entraves societários para não honrarem seus credores. Mesmo
alegando a pessoa física que era sócia minoritária da empresa executada por título
judicial e que nunca exerceu atos de mando, gerência ou administração, pode
responder com seu patrimônio pessoal em face da desconsideração da
personalidade jurídica da empresa da qual também participava. (...)." (TJPR, Ac. nº
2314, 9ª C.C., Rel. Des. Cunha Ribas, julg. 17.04.06).Portanto, diante da situação
posta a desconsideração da personalidade jurídica é medida que se impõe,
todavia, não se vislumbram motivos para autorizar a expedição de ofício ao
DETRAN/PR para bloqueio dos veículos.Assim o é, pois não se verifica nos autos
qualquer ato de má-fé da agravante em quitar sua obrigação, bem como de seus
sócios, somente se vê que a agravante não possui condições financeiras de saldar
sua dívida.
Sendo, portanto, a desconsideração da personalidade jurídica autorizada em razão
da insolvência da agravante e de um de seus sócios, não há razão para determinar
o bloqueio dos veículos, medida esta recomendável somente quando se verifica
ausência de boa-fé dos devedores.
Pelas razões expostas, que se adota como razão de decidir, voto pelo provimento do
presente agravo de instrumento, para o fim de desconsiderar a personalidade
jurídica da agravada atingindo os bens e direitos do sócio minoritário necessários
para o pagamento do débito, sem contudo, determinar a expedição de ofício ao
DETRAN/PR para o bloqueio dos veículos.
3. DECISÃO
ACORDAM os Julgadores integrantes da Décima Quarta Câmara Cível do Tribunal
de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em dar provimento ao
agravo de instrumento, nos termos do voto.
Participaram do julgamento os Senhores Julgadores EDSON VIDAL PINTO e
GLADEMIR VIDA ANTUNES PANIZZI.
Curitiba, 09 de maio de 2007.
RUBENS OLIVEIRA FONTOURA
AGRAVO DE INSTRUMENTO N.º 403.406-2 DA 11.ª VARA CÍVEL DO FORO DA
COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE CURITIBA
AGRAVANTE: MJ MEDEIROS MONTAGEM E ELETROTÉCNICA LTDA.
AGRAVADA: ROCAMIL RECUPERADORA DE ARTEFATOS DE MATERIAL
PLÁSTICO – ME
RELATOR: JUIZ CONV. FÁBIO HAICK DALLA VECCHIA
AGRAVO DE INSTRUMENTO - EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL -
APLICAÇÃO DA TEORIA DA DESCONSIDERAÇÃO DA PESSOA JURÍDICA -
POSSIBILIDADE - INCORREÇÃO NO ENDEREÇO DA EXECUTADA NOS
CADASTROS DA EMPRESA QUE INVIABILIZA A CITAÇÃO DO ADMINISTRADOR
RESPONSÁVEL - CIRCUNSTÂNCIA QUE REVELA INDÍCIOS DE
IRREGULARIDADE NA DISSOLUÇÃO DA SOCIEDADE - RECURSO PROVIDO.
1. Não sendo encontrada a empresa no seu endereço cadastral, é forçoso concluir
pela sua dissolução irregular, o que autoriza a aplicação excepcional da teoria da
desconsideração da pessoa jurídica e inclusão dos sócios no pólo passivo da
demanda.
2. Destaca-se que a desconsideração da pessoa jurídica é medida excepcional,
que, mediante a comprovação pelos sócios da ausência de dissolução irregular da
sociedade, pode ser afastada posteriormente.Recurso conhecido e provido.
1.RELATÓRIO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento de n.º 403.406-
2, da 11.ª Vara Cível do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de
Curitiba, em que é agravante MJ MEDEIROS MONTAGEM E ELETROTÉCNICA
LTDA e agravada ROCAMIL RECUPERADORA DE ARTEFATOS DE MATERIAL
PLÁSTICO – ME
A agravante, inconformada com a decisão proferida nos autos de execução de
sentença, decorrente de execução de título extrajudicial n.º 1424/2005, que
indeferiu o pedido de desconsideração da pessoa jurídica da empresa executada e
determinou a juntada do contrato social da ré para possibilitar a citação da gerência,
recorre a esta Corte.
Alega que a execução será frustrada, diante da dissolução irregular da empresa e
da ausência de patrimônio, sendo inócua a citação dos sócios conforme
determinado.
Assevera que houve diligência ao endereço da empresa executada, no local
informado pela Junta Comercial, e o Oficial de Justiça não localizou a empresa
(fl.62-TJ).
Afirma que a empresa estava ativa, o que revela o encerramento de fato e
irregular.Sustenta que, por meio de outras diligências, chegou-se a outro endereço
(informado pela Receita Federal), contudo não foi possível, mais uma vez, intimar a
empresa ré, estando o imóvel desocupado para locação (fl. 64-TJ).Destaca que a
responsabilidade limitada dos sócios não é absoluta, devendo ser responsabilizados
quando agirem em desacordo com a legislação e abusando da personalidade
jurídica da sociedade.
Ressalta, ainda, que a aplicação da Teoria da Desconsideração da Pessoa Jurídica
se faz necessária, pois o sócio-administrador causou prejuízo a terceiro de boa-fé
(exeqüente), infringindo a lei encerrando a sociedade de forma irregular sem deixar
bens para pagar seus credores.
Frisa que o sócio Orlando Ferraz Braga Filho residia em São Paulo e não exercia
nenhuma função administrativo-financeira, não podendo ser responsabilizado.Por
fim, pugna pela concessão de efeito suspensivo, para suspender os efeitos da
decisão, que vez que a fundamentação é relevante e a penhora dos bens dos sócios
resultaria em dano irreparável ou de difícil reparação.
É o relatório.
2.FUNDAMENTAÇÃO
Preliminarmente, da análise do juízo de admissibilidade, verifico a presença de todos
os requisitos necessários para o conhecimento do presente recurso.A decisão
singular merece ser reformada, diante da presença dos requisitos legais para
desconsideração da personalidade jurídica.
Com efeito, a desconsideração da personalidade jurídica, a chamada disregard
doctrine, é resultado de intenso trabalho doutrinário e jurisprudencial, trazida ao
nosso país por meio do direito comparado e incorporada ao ordenamento jurídico
pátrio, tanto que hoje é positivada no Código Civil e Código de Defesa do
Consumidor.
É concebida como uma alternativa de coibir a utilização do instituto da personalidade
jurídica como obstáculo a responsabilização de atos dos sócios que venham a
prejudicar outrem.
Há vasta doutrina e jurisprudência acerca do assunto, do que podemos reunir alguns
pontos necessários para a apreciação do pedido de desconsideração de
personalidade jurídica deste recurso.
De início, relembro os ensinamentos de Sílvio de Salvo Venosa, para quem a
decisão do juiz, em se tratando de desconsideração da pessoa jurídica deve
pautar-se pela verificação caso a caso.
Leciona o jurista, após referir-se ao novo artigo do Código Civil (art. 50), no seguinte
sentido:
"Essa redação melhorada atende à necessidade de o juiz, no caso concreto, avaliar
até que ponto o véu da pessoa jurídica deve ser descerrado para atingir os
administradores ou controladores nos casos de desvio de finalidade, em prejuízo de
terceiros. O abuso da personalidade jurídica deve ser examinado sob o prisma da
boa-fé objetiva, que deve nortear todos os negócios jurídicos. Nem sempre deverá
ser avaliada com maior profundidade a existência de dolo ou culpa. A
despersonalização é aplicação de princípio de eqüidade trazida modernamente pela
lei" (Direito Civil, Parte Geral, 4.ª edição, ed. Atlas, pág. 311).Ou seja, a par da
análise criteriosa, há de se ter em mente que a despersonalização é cabível sempre
que a entidade jurídica é utilizada para fugir de suas finalidades primordiais.
Já, para Alexandre Couto e Silva, "o principal pressuposto de incidência da
desconsideração é a intenção de usar o expediente da separação entre sócio e
sociedade, desviando-se a pessoa jurídica do fim para o qual foi constituída,
empregando-se a fraude ou abuso de direito" (in Aplicação da Desconsideração da
Personalidade Jurídica no Direito Brasileiro, LTr, 1999).Além da doutrina, a
jurisprudência pátria também tem considerável papel na discussão e disseminação
do assunto, senão vejamos:
"AGRAVO DE INSTRUMENTO. INDENIZAÇÃO. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS,
EXECUÇÃO DE SENTENÇA. INEXISTENTES BENS DA SOCIEDADE A
PENHORA. EVIDENCIADA FRAUDE A EXECUÇÃO. PENHORA SOBRE BENS
DOS SÓCIOS. ADMISSIBILIDADE. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE
JURÍDICA. RECURSO IMPROVIDO. 1- Aplica-se a teoria da desconsideração da
personalidade jurídica, com a penhora de bens particulares dos sócios, quando
inexistentes bens da sociedade para fazer frente ao pagamento de credores. 2- A
perda da autonomia da pessoa jurídica frente ao artigo 20 do Código Civil, justifica-
se pelo mau uso desta (art. 596 do CPC)" (Agravo de instrumento 186.775-2 - PATO
BRANCO - Ac. 13.844. JUIZ MIGUEL PESSOA - SÉTIMA CÂMARA CÍVEL - julg.
8/4/02 - DJ: 26/4/02 - Por unanimidade de votos, negaram provimento).Como visto
antes, desconsiderar a personalidade jurídica de uma sociedade é um remédio
jurídico utilizado de forma episódica, ou seja, da análise do caso concreto, repita-se,
verifica-se a necessidade de se retirar o véu da empresa e permitir que os sócios
respondam diretamente pelos prejuízos causados diante de situações de fraude ou
abuso de direito.
Com isso, o absolutismo criado com a personificação jurídica da sociedade se rende
ao real fim do instituto, originariamente criado com a finalidade de conceber a
separação e autonomia patrimonial da sociedade e de seus sócios,
fundamentalmente necessário a fomentar a economia do país.Outra consideração
necessária a ser feita é a de que a personalidade jurídica não deixa de existir, ela
somente é afastada, episodicamente, e, no caso concreto, para que os seus sócios
possam ser atingidos e responsabilizados por atos eventualmente praticados com o
objetivo de fraudar credores ou como abuso de direito, permanecendo plenamente
válida e eficaz para outros fins seus.Pois bem, feitas estas considerações, passo
então à análise dos presentes autos.Denota-se que a empresa executada não foi
citada ainda, pois os endereços presentes nos comprovantes de inscrição e de
situação cadastral não configuram a sede da empresa (fls. 34, 42 e 74-TJ).
O Sr. Oficial de Justiça, por duas vezes, em endereços distintos, tentou localizar a
empresa agravada e não obteve êxito, conforme se depreende das certidões de fls.
62-TJ e 64-TJ.
Diante dessas circunstâncias, percebe-se que o endereço informado pela empresa
(aos órgãos públicos) não correspondem à sua real localização. Isso inviabiliza a
citação e configura irregularidade, pois é dever da empresa manter atualizados os
seus dados cadastrais perante a Junta Comercial e a Receita Federal.Ademais, o
fato de o Oficial de Justiça não encontrar a empresa nos endereços presentes em
seus cadastros é indício de que ela tenha sofrido dissolução irregular.Portanto, o
caso dos autos revela situação excepcional que autoriza a aplicação da teoria da
desconsideração da pessoa jurídica.Este tem sido o entendimento jurisprudencial
ao analisar casos similares ao presente:
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO - AGRAVO DE INSTRUMENTO -
DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA - RESPONSABILIDADE
PESSOAL DO SÓCIO-GERENTE - DISSOLUÇÃO IRREGULAR DA EMPRESA
EXECUTADA - MUDANÇA DE DOMICÍLIO - A dissolução irregular da empresa,
assim compreendido o encerramento de suas atividades sem a observância das
obrigações perante o fisco, configura, ipso facto, a gestão ilícita da pessoa jurídica,
haja vista a inexorável ofensa aos diplomas legais de regência. - Em idêntica
situação se encontra a sociedade que transfere seu domicílio, ou seja, sua sede,
sem nenhuma comunicação à Fazenda ou alteração de seus atos constitutivos. -
Plenamente justificável, portanto, a responsabilização pessoal do sócio-gerente da
sociedade executada. Inteligência dos artigos 134 e 135 do Código Tributário
Nacional. Agravo de instrumento provido. (TRF 5ª R. - AGTR 2004.05.99.000465-6 -
1ª T. - CE - Rel. Des. Fed. José Maria de Oliveira Lucena - DJU 15.12.2005 - p. 624)
AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE EXECUÇÃO - TEORIA DA
DESCONSIDERAÇÃO DA PESSOA JURÍDICA - DISSOLUÇÃO IRREGULAR DA
SOCIEDADE - RESPONSABILIDADE DO SÓCIO - RECURSO PROVIDO - Em caso
de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela
confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte ou do Ministério
Público, quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e
determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos
administradores ou sócios da pessoa jurídica. A teoria da desconsideração visa
coibir fraudes perpetradas através do uso da autonomia patrimonial da pessoa
jurídica. Sua aplicação é especialmente indicada na hipótese em que a obrigação
imputada à sociedade oculta uma ilicitude. Havendo indícios de que a empresa
encerrou irregularmente suas atividades, é possível redirecionar a execução ao
sócio, a quem cabe provar o contrário. (TJMS - AG 2005.015359-5/0000-00 - Ponta
Porã - 3ª T.Cív. - Rel. Des. Hamilton Carli - J. 05.12.2005). Destarte, por ora, a
inexistência de endereço válido nos registros da empresa revela indícios de
irregularidade, levando a crer inclusive em uma dissolução anômala que autoriza a
desconsideração da pessoa jurídica da sociedade. Podendo, obviamente, tal
situação ser afastada mediante prova em contrário dos sócios, o que possibilitaria o
retorno à normalidade, com distinção patrimonial dos bens deles e dos bens da
sociedade.Diante do exposto, conhece-se do agravo de instrumento, com o
provimento, a fim de reformar a decisão agravada, para desconsiderar a pessoa
jurídica da empresa executada e incluir os sócios no pólo passivo da demanda.
3.DISPOSITIVO
ACORDAM os Magistrados integrantes da Décima Quinta Câmara Cível do Tribunal
de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em conhecer do recurso
e, no mérito, julgá-lo provido para desconsiderar a pessoa jurídica da empresa
agravada e incluir os sócios no pólo passivo da demanda.O julgamento foi presidido
pelo Excelentíssimo Senhor Desembargador Hamilton Mussi Corrêa (sem voto) e
dele participaram, acompanhando o voto do Relator, os Excelentíssimos Senhores
Desembargadores Luiz Carlos Gabardo e Jucimar Novochadlo.
Curitiba, 2 de maio de 2007.
Fábio Haick Dalla Vecchia
Juiz de Direito Substituto em Segundo Grau
Relator Convocado
Agravo de Instrumento nº 296.200-5
AGRAVO DE INSTRUMENTO - EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL EM
FACE DE PESSOA JURÍDICA - AUSÊNCIA DE BENS PARA A GARANTIA DO
CRÉDITO EXEQÜENDO - PENHORA SOBRE BENS DE SÓCIO - POSSIBILIDADE
- DESCONSIDERAÇÃO DA PESSOA JURÍDICA.
Na ausência de bens para garantir dívida da pessoa jurídica, a penhora recairá
sobre bens de propriedade dos sócios; hipótese perfeitamente possível ante a
doutrina da Desconsideração da Personalidade Jurídica, haja vista que a pessoa
jurídica não possui lastro patrimonial para suportar as dívidas contraídas. RECURSO
CONHECIDO E PROVIDO.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento nº Agravo de
Instrumento nº 296.200-5, de Curitiba - 18ª Vara Cível em que é Agravante Unit
Locadora de Veículos Ltda. e Agravado Brastrans do Brasil Transportes
Internacionais Ltda.
Unit Locadora de Veículos Ltda. agrava da decisão1 proferida na ação de execução
de título extrajudicial (autos nº 17/1996) por si deduzida em face da Brastrans do
Brasil Transportes Internacionais Ltda., mediante a qual o Magistrado indeferiu o
pedido desconsideração da personalidade jurídica da executada, conforme
despacho exarado nos seguintes termos:1. Observo que a exeqüente apenas
demonstrou, nos autos, que a empresa executada não possui bens para serem
penhorados, não se caracterizando, assim, as hipóteses ensejadoras do permissivo
para a desconsideração da personalidade jurídica, conforme norma cogente
estampada no art. 50, do Código Civil, que exige comprovação de que a empresa
não possua bens penhoráveis e que seu esvaziamento patrimonial se deu em
função de desvio em sua finalidade.(...)Portanto, indefiro o requerimento.
2.Assevera o Recorrente, em síntese, que: a) a desconsideração da personalidade
jurídica tem por objetivo evitar fraudes e abuso dos sócios; b) nos termos do art. 50
do Código Civil, a desconsideração da personalidade jurídica pode ser decretada
quando houver nítido desvio de finalidade ou confusão patrimonial; c) caso o
patrimônio da sociedade não seja suficiente para arcar com as dívidas por si
contraídas, por elas respondem os bens particulares dos sócios; d) durante o
processo executivo foi constatado que a empresa agravada não possui bens ou
direitos que respondam pela dívida exeqüenda.Dispensadas a resposta da Agravada
e informações do Magistrado singular, por estarem presentes todos os elementos
para o julgamento do feito, vieram os autos à conclusão.
É o relatório.
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do presente recurso de
agravo de instrumento.
O cerne da questão se delimita na possibilidade de excussão de bem particular de
sócio em razão de dívida da sociedade.
O ordenamento jurídico, ao possibilitar a reunião de várias pessoas na formação de
um ente distinto, atribui a este status de pessoa jurídica cuja personalidade e
patrimônio, a princípio, não se confundem com o dos sócios. Ao atribuir-lhes
personalidade jurídica, ao mesmo tempo, habilita-os à prática de atos jurídicos e
lhes impõe responsabilidade patrimonial. Assim é que o binômio autonomia e
responsabilidade patrimonial constitui principal apanágio das pessoas
jurídicas.Portanto, neste sentido devem se orientar as atividades das pessoas
jurídicas, sendo vedada a sua utilização para fins diversos ou como forma de
locupletamento dos sócios às custas de terceiros prejudicados e credores.Assim é
que doutrina e jurisprudência consagraram a teoria da "disregard doctriné",
permitindo a desconsideração da personalidade jurídica nos casos que esta é
utilizada com desvio de finalidade ou de forma fraudulenta. José Lamartine Corrêa
de Oliveira em seu livro "A dupla crise da pessoa jurídica" ao discorrer acerca do
surgimento da teoria da desconsideração da pessoa jurídica explica que esta foi
formulada como reação doutrinária e jurisprudencial ao uso indevido da pessoa
jurídica. Ensina que o princípio da separação patrimonial não é absoluto e pode ser
afastado quando a pessoa jurídica vem sendo utilizada para fins imorais ou
ilegais:"E da reação que os Tribunais desenvolveram através de um conjunto de
julgados que tiveram por ponto comum uma espécie de suspensão de vigência -
para o caso concreto em julgamento - do princípio da separação entre a pessoa
jurídica e a pessoa-membro. Esse fenômeno é conhecido pelo pensamento moderno
pelas expressões "desconsideração" da pessoa jurídica (tradução aproximada da
expressão norte americana "disregard of the legal entity") ou penetração na pessoa
jurídica (aproximada tradução do alemão Durchgriff")." (grifei)
3 E mais adiante o referido professor reafirma o caráter sancionatório desta teoria,
bem como a necessidade de se fazer uma hermenêutica finalistica dos atos
praticados através de pessoas jurídicas:"As técnicas de disregard ou de Durchgriff
são o mais agudo sintoma de crise de função. Elas denunciam a existência de um
desvio do instituto - da função que lhe foi assinalada pelo legislador. E ao mesmo
tempo, visam evitar - principalmente ao servirem de inspiração à interpretação de
algumas normas legais específicas - o surgimento concreto de novos casos de
desvio.Se analisarmos a grande e fundamental obra de SERICK, não podemos
deixar de reconhecer qual a sua grande e meritória intuição: a da necessidade de
maior atenção ao elemento ético na análise e interpretação do Direito. O nosso
tempo é testemunha da crescente preocupação dos Códigos com a necessidade de
reintrodução de critérios éticos como básicos para a valoração dos fatos jurídicos. É
nessa linha que se inscreve a crescente importância atribuída por diplomas
legislativos recentes ao princípio da boa-fé e à prevenção do abuso de direito. Tudo
isso está a denunciar também - como de resto é evidente - o colapso do
individualismo jurídico.
4 Como se vê, a desconsideração da personalidade jurídica não pressupõe a
decretação da nulidade do ato constitutivo da pessoa jurídica, apenas o afastamento
momentâneo da sua eficácia para que bens dos sócios também respondam por
dívidas da sociedade.
É o que esclarece Fábio Ulhoa Coelho:
"A desconsideração da pessoa jurídica não atinge a validade do ato constitutivo,
mas a sua eficácia episódica. Uma sociedade que tenha a sua autonomia
patrimonial desconsiderada continua válida, assim como válidos são todos os
demais atos que praticou. A separação patrimonial em relação aos seus sócios é
que não produzirá nenhum efeito na decisão judicial referente àquele ato específico
ato objeto da fraude. Esta é, inclusive, a grande vantagem da desconsideração."
5Da leitura dos autos, infere-se que foram realizadas diligências no sentido de
encontrar bens de propriedade da executada passíveis de garantir a execução
contra ela manejada.
No entanto mostraram-se infrutíferas tais diligências, pois não foram encontrados
quaisquer bens em nome da devedora.
É o que se depreende da certidão de fls. 110 - TJ que bem revela que o arresto
deixou de ser realizado por não terem sido localizados bens. Os documentos
carreados aos autos às fls. 177/185 - TJ nos dão conta de que a agravada não
possui bens imóveis (fls. 184/185 - TJ), veículos (fls. 182), nem terminais telefônicos
(fls. 43 - TJ) que possam garantir a dívida.
Assim a inexistência de bens, ao longo do curso do processo, as diversas mudanças
de endereço, e a emissão de cheque sem suficiente provisão de fundos são fortes
indícios de irregularidades e confusão patrimonial, portanto, se faz possível
descortinar a venda da proteção da pessoa jurídica. Hipóteses como esta vêm
sendo sancionada pela jurisprudência pátria, com a desconsideração da
personalidade jurídica:
"(...) Já amplamente cristalizado na jurisprudência atual o posicionamento de que,
por desconsideração da personalidade jurídica, mesmo sendo a sociedade de
responsabilidade limitada e tendo seus sócios integralizado o capital social,
respondem os bens destes pelas dívidas da empresa, se esta cessou suas
atividades de forma irregular, sem satisfazer, antes, o que devia ou exibir bens
próprios bastantes a assegurar seu pagamento, frustrando o recebimento pelos
credores de seus créditos. Vem-se admitindo, outrossim, a desconsideração da
personalidade jurídica, alcançando as sociedades comerciais em geral, inclusive as
anônimas, quando sua dissolução ou transformação, sob qualquer título, tenha sido
realizada com notórios propósitos de escapar às obrigações existentes,
caracterizando uso abusivo de seus direitos ou ânimo de fraudar os credores.
Semelhante situação fica evidenciada, sobretudo, com a não satisfação pela
empresa de seus débitos e a não localização ou ofertamento por ela de bens seus,
livres e desembaraçados, que se revelem efetivamente bastantes a garanti-los,
havendo notórias evidências de que seus ativos acabaram transferidos, embora de
maneira formalmente regular ou sem violação de preceitos legais, a uma nova
companhia".
6 (o grifo não é do original)Logo deve ser reformada a decisão que indeferiu o
pedido de desconsideração da personalidade da executada, uma vez que restou
comprovada a inexistência de bens de sua propriedade.
Por estas razões, o voto é pelo provimento do agravo, para o fim de decretar a
despersonalização da empresa agravada possibilitando a penhora de bens dos
sócios.
Ante o exposto, ACORDAM os Desembargadores integrantes da Décima Sétima
Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de
votos, em conhecer e dar provimento ao presente recurso de agravo de instrumento,
nos termos do voto acima relatado.
O julgamento foi presidido por esta Relatora, e dele participaram os Senhores
Desembargadores ANTENOR DEMETERCO JÚNIOR e PAULO ROBERTO
VASCONCELOS.
Curitiba, 24 de maio de 2005.
ROSANA AMARA GIRARDI FACHIN
1 Fls. 186 - TJ.
2 Fls. 186 - TJ.
3 CORRÊA DE OLIVEIRA, J. Lamartine. A dupla Crise da Pessoa Jurídica. São
Paulo, Saraiva 1979, fls. 262.
4 CORRÊA DE OLIVEIRA, J. Lamartine. Ob. Cit., fls.608.
5 COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de Direito Comercial. São Paulo: Saraiva 2000, p.
114.
6 2a TACIvSP, 1a Câm, AI 716.551-00/7, rel. Juiz Vieira de Moraes, j. 19/02/2002.