Post on 28-Nov-2018
Diálogo teatral...
Sensibilidades não modernas! Adaptado de:
LATOUR, Bruno. Como terminar uma tese de sociologia: pequeno dialogo entre um aluno e seu
professor (um tanto socrático). Cadernos de Campo. n. 14, dez. 2006. p. 341-352.
A - Professora, estou achando difícil aplicar, devo dizê-lo, o
Actor Network Theory (ANT) para o meu caso de estudo em
organizações empresariais!
P - Não admira, não é aplicável a qualquer coisa!
A - Mas fomos ensinados… Quero dizer! Parecem quentes as
coisas por aqui. Você está dizendo que... É realmente inútil?
P - Poderia ser útil, mas só se não se "aplicar" para algo.
A - Desculpe-me está jogando algum tipo de truque Zen aqui?
Tenho de avisá-la: Eu sou apenas um doutorando na reta
final, por isso não espere…
P – Desculpe, eu não estava tentando dizer nada esótico. Apenas
que o ANT é, antes de tudo, um argumento negativo. Não diz
nada de positivo em qualquer estado de coisas!
A - Mas você sempre tem que colocar as coisas em um
contexto, não é?
P - Nunca compreendi o que significa contexto! Não. Um Quadro
de referência faz um retrato aparentemente agradável, que
pode direcionar melhor o olhar, aumentar o valor, mas não
acrescenta nada à imagem. A moldura, ou o contexto, é,
precisamente, a soma dos fatores que não fazem diferença
alguma para os dados... Se eu fosse você, eu me absteria
completamente dos quadros de referência. Basta descrever o
estado de coisas que você tem à mão.
A - Somente descrever! Desculpe a perguntar: mas isto não é
terrivelmente ingênuo? Este não é exatamente o tipo de
empiricismo, ou realismo, que todos nos advertem? Pensei
que o seu argumento era, como devo dizer? Mais sofisticado
do que isso.
P - Porque você acha que é fácil fazer uma descrição? Você deve
estar confundindo descrição, eu suponho, com clichês. Para
cada cem livros de comentários, argumentos, há apenas um
de descrição. Para descrever, é preciso estar atenta ao
concreto estado das coisas, para encontrar a maneira única e
adequada de contar uma determinada situação - Eu,
pessoalmente, sempre achei isso incrivelmente exigente.
A - Estou perdido aqui, disseram-nos que existem dois tipos de
sociologia, a interpretativa e a objetivista. Certamente você
não quer dizer que é uma objetivista?
P - Sim, por todos os meios!
A - Você? Mas todos dizem que você é uma relativista! Você foi
citada como tendo afirmado que as ciências naturais ainda
não são objetivas… Assim, certamente você está mais para a
sociologia interpretativa, simulacros, multiplicidade de
pontos, do que qualquer outro.
P - Não tenho paciência para a realidade da sociologia
interpretativa, ou o que se pode chamar por esse nome. Não!
Pelo contrário, acredito firmemente que as ciências são
objetivas - o que mais elas poderiam ser? Eu simplesmente
digo que os objetos podem ser olhados como um pouco mais
complicados, dobrados, múltiplos e complexos, do que aquilo
que os “objetivistas”, como você diz, gostariam de vê-los.
A - Mas isso é exatamente o que? Interpretação, argumentos
sociológicos, não?
P - Ah, não, não todos. Dizer o que o homem deseja, os sentidos
humanos, intenções entre humanos, etc. Introduzir alguma
"flexibilidade interpretativa", em um mundo de objetos
inflexíveis, de "puras relações causais", de " conexões
estritamente materiais". Isso não é de todo o que estou
dizendo. Todas as ciências foram inventando maneiras para
passar de um nível para o outro, de um quadro de referência
para o próximo, por amor de Deus: O que se chama
relatividade?
A - Ah! Então você é uma relativista!
P - Mas, naturalmente, o que mais eu poderia ser? Se eu quiser
ser uma cientista e chegar à objetividade, não posso deixar de
ter a possibilidade de viajar de um quadro de referência para
a próximo, sem esses deslocamentos, eu ficaria limitada ao
meu ponto de vista.
A - Então você associa objetividade com relativismo?
P - "Relatividade", sim, claro. Todas as ciências fazem o mesmo.
Nossa ciência (Estudos culturais das Ciências) também.
A - Mas qual é a nossa maneira de alterar a nossa posição?
P - Estamos no negócio de descrições. Todo o resto é negociação
e clichês. Inquéritos, sondagens; nós vamos lá, ouvimos,
aprendemos praticamos, tornamo-nos competentes,
mudamos nossa opinião. Realmente é muito simples: tudo
isso é chamado campo de trabalho. Um bom trabalho de
campo sempre produz uma grande quantidade de novas
denominações.
A - Mas já tenho lotes de descrições! Estou afogando neles. Esse
é todo o meu problema. É por isso que eu estou perdido e é
por isso que eu pensei que seria útil esse ANT, não pode me
ajudar com essa massa de dados? Eu preciso de um quadro
de referência, meu orientador quer!
P - Meu Reino por uma moldura! Eu compreendo o seu
desespero. Mas não, ANT é bastante inútil para isso. Os seus
principais princípios são que os próprios atores fazem tudo,
incluindo os seus próprios quadros, as suas próprias teorias,
os seus próprios contextos, a sua própria metafísica, até
mesmo as suas próprias ontologias… Portanto, receio que o
caminho a seguir seria: mais descrições...
A - Mas descrições são demasiado longas. Eu tenho que dar
alguma explicação.
P – Eu vou te dizer, se a sua descrição precisa de uma explicação,
não é uma boa descrição, ponto final. Só más descrições
necessitam de uma explicação. É muito simples. O que se
entende por uma "explicação", na maioria das vezes? É
Acrescentar outro ator para fornecer aos já descritos, a
energia necessária para agir? Mas se tiver de acrescentar,
significa que a rede não funciona sozinha, e se os atores já
montados não têm energia suficiente para agir, então eles
não são "atores", mas meros intermediários, fantoches. Eles
não fazem nada, então eles não devem estar na descrição.
Nunca vi uma boa descrição necessitar de uma explicação.
Mas li incontáveis más descrições para as quais nada foi
acrescentado por um enorme acréscimo de 'explicações'!
A - Isso é muito preocupante. Eu devia ter ouvido os outros
alunos quando me alertaram a não ir em frente com o ANT…
Agora você está me dizendo que eu não deveria sequer
tentar explicar nada!
P - Você pode mantê-las, se te faz bem, mas acredito que
explicar qualquer coisa não será mais que meros ornamentos.
Como regra geral, o contexto é simplesmente uma maneira
de parar a descrição quando você está cansado ou com
preguiça de ir adiante.
A - Mas isso é exatamente o meu problema: Para parar tenho
de concluir este Doutoramento. E você diz: "mais
descrições". Meus atores estão por todos os lados! Onde
devo ir? O que é uma descrição completa?
P - Agora sim uma boa pergunta! Porque é uma questão prática.
É como eu sempre digo: uma boa tese é a tese feita. Mas há
outra maneira de parar, do que por 'adicionamento de uma
explicação "ou" colocando uma moldura "...
A - Diga-me então.
P - Você pára quando tiver escrito 50.000 palavras, ou, como é
mesmo o formato aqui? Eu sempre esqueço.
A - Oh! Isso é realmente fantástico! Assim, a minha tese terá
acabado quando for preenchida… Tão útil, muito obrigado!
Sinto-me tão aliviado…
P – Fico contente que tenha gostado! É sério, você concorda que
qualquer método depende do tamanho e tipo de texto que
prometeu entregar?
A - Mas o limite textual não tem nada a ver com o método.
P – Veja! E é por isso que não gosto muito das formas com que
os doutorandos são treinados. Escrever textos tem tudo a ver
com o método. Você escreve um texto de tantas palavras, em
tantos meses, com base em tantas entrevistas, tantas horas
de observação, de tantos documentos... O método depende
inteiramente do texto! Você não faz mais nada.
A - Claro que eu faço: Eu sei coisas, eu estudo, me explicam
coisas, me criticam, eu…
P - Mas todas essas metas grandiosas se concretizam através de
um texto, não é?
A - Claro, mas é um instrumento, um meio, uma maneira de
expressar-me.
P - Não há nenhuma ferramenta, nem meio, apenas mediadores.
Um texto é espesso. Isso é um princípio ANT, se houver.
A - Desculpe, professora, eu lhe digo que posso escrever em C, e
até mesmo C++, mas eu não estudei Derrida, semiótica...
essas coisas. Não acredito que o mundo é feito de palavras e
coisa e tal...Em que sentido essas coisas que você me diz vão
me ajudar a ser mais científico?
P - Dependendo da forma como ela é escrita, ou não, irá capturar
o ator-rede que você deseja estudar. O texto, em nossa
disciplina, não é uma história, e não é uma história bonita, é o
equivalente funcional de um laboratório. É um lugar para os
ensaios, experimentos e simulações. Dependendo do que
acontece na mesma, haja ou não haja um ator e exista ou não
exista uma rede a ser rastreada. E isso depende inteiramente
das precisas formas em que é escrito. Cada um novo tópico
requer uma nova forma de ser tratado por um texto. A
maioria dos textos são simplesmente mortos. Não acontece
nada com eles.
A - Mas ninguém menciona “texto” no nosso programa. Fala-se
em "organizar os estudos”, não "escrever" sobre o assunto.
P - É o que estou a dizer-lhe: você está sendo mal treinado! Não
ensinam, nas ciências sociais, doutorandos a escrever os seus
doutorados. Sinto-me como uma velha repetindo sempre a
mesma coisa: "descrever, escrever, descrever, escrever…"
A - O problema é que não é isso o que o meu supervisor quer!
Ele quer que o meu caso seja generalizável. Ele não quer
"mera descrição". É por isso que estou começando a entrar
em pânico.
P - Você deve entrar em pânico apenas se os atores não
estiveram fazendo o que constantemente, ativamente,
reflexivelmente, obsessivamente fazem: eles também
comparam, também produzem tipologias, também desenham
padrões, também espalham suas máquinas, bem como as
suas organizações, as suas ideologias, os seus estados de
espírito. Por que você pensa que é o único a fazer coisas
inteligentes, enquanto os seus atores agiriam como um
bando de retardados? O que eles fazem para expandir,
relacionar, comparar, organizar é o que você tem para
descrever tão bem. Não se trata de outra camada que você
teria de adicionar à "mera descrição". Não tente uma
mudança de designação para a explicação: simplesmente vá
em frente com a descrição. As suas próprias idéias sobre o
que os outros fazem não têm interesse em relação à forma
como estes produzem e espalham as suas próprias empresas.
A - Mas, se eles são reprimidos, negados, silenciados?
P - Nada sobre a terra lhe permite dizer que eles existem, sem
trazer na prova de sua presença. Essa prova poderá ser
indireta, exigente, complicada, mas que precisa. Se é
invisível... são invisíveis. Se eles fazem outras coisas para
mover-se, e você pode documentar esses movimentos, então
eles são visíveis.
A - Professora! A prova! O que é uma prova assim? Isso é
terrivelmente positivista?
P - Espero que sim, sim.
A - Mas se eu não acrescentar nada, simplesmente vou repetir
o que dizem os agentes.
P - Qual seria a validade de acrescentar coisas a entidades
invisíveis que atuam sem deixar qualquer rasto e não fazem
diferença a qualquer estado de coisas?
A - Mas tenho de fazer os atores aprender algo que não sabiam;
se não, por que eu iria estudá-las?
P – Vocês! cientistas sociais. Se você estivesse estudando
formigas, em vez de ANT. O que você esperaria? Formigas
para aprender algo de seu estudo? Claro que não. Elas sabem,
não é? Elas são as professoras, você é quem aprende com
elas. Você explica o que elas fazem para si mesmo, para seu
próprio benefício, ou para outro entomologista, não para
elas, que não se importam nem um pouco. O que faz você
pensar que um estudo é sempre feito para ensinar as coisas
para as pessoas a serem estudadas?
A - Mas isso é toda a idéia das ciências sociais! É por isso que
estou aqui: eu tenho de prestar algumas reflexivas
compreensões para o povo…
P -… Que é claro, antes de você, nunca refletiram!
A - De certo modo, sim! Não? Eles fizeram coisas, mas não sei
por quê… O que há de errado com isso?
P - O que está errado!? A maior parte do que os cientistas sociais
chamam de "reflexividade" é apenas redigir perguntas
totalmente irrelevantes para as pessoas que pedem outras
perguntas para as quais o analista não tem a mínima idéia de
uma resposta! Reflexividade não é um patrimônio que você
transporte com você, só porque você está no doutorado!
Você e seus informantes têm preocupações diferentes -
quando se cruzam é um milagre, e milagres, caso você não
saiba, são raros…
A - Mas se eu não tenho nada a acrescentar ao que os agentes
dizem, não vou poder ser crítico. Ora! Não te entendo, num
momento você é um ingênuo realista voltando-se ao objeto,
e logo depois você diz que tenho de escrever um texto que
nada acrescenta, mas simplesmente descreve as trilhas do
seus famosos "atores próprios". Isto é totalmente apolítico!
Nenhuma crítica importante que eu possa ver.
P - Diga-me, mestre Debunker (iconoclasta, desenganador), como
vai se tornar um ”crítico astuto” sobre seus atores? Estou
ansiosa por ouvir.
A - Só se eu tiver um quadro de referência. Isso é o que eu
estava procurando ao vir aqui, mas obviamente ANT é
incapaz de dar-me algum.
P - E estou bastante satisfeita por ele não… Este quadro seu,
presumo eu, está oculto aos olhos dos seus informadores, e
será revelado pelo seu estudo?
A - Sim, com certeza. Esse deve ser o valor do meu trabalho,
pelo menos assim o espero.
P - Bom para você… O que você está me dizendo é que, em seus
seis meses de trabalho de campo, pode por si, apenas por ter
escrito algumas centenas de páginas, produzir mais
conhecimento do que os 340 engenheiros e o pessoal que foi
estudar?
A - Não 'mais' conhecimento, mas, talvez, diferente. Sim,
espero. Caso contrário porque exatamente estaria me
esforçando? Não é por isso que estou neste negócio?
P - Não estou certa do porque você está nesta empreitada, mas a
forma como você quer produzir um conhecimento diferente
do produzido por eles, é toda a questão.
A – Isso é uma piada, o que estou fazendo aqui? Lutando para
que esse tipo de quadro seja viável para mim…
P - Mas é desejável? Veja, o que você está realmente me dizendo
é que os atores em sua descrição não fazem diferença
alguma. O que significa que eles não são os intervenientes:
eles simplesmente conduzem a força que vem através deles.
Portanto, meu caro estudante, você tem desperdiçado o seu
tempo descrevendo pessoas, objetos, sites que não são nada,
com efeito, mas passivos intermediários, uma vez que eles
não fazem nada sozinhos. Seu tempo no campo de pesquisa
foi simplesmente desperdiçado. Você deveria ter ido
diretamente para a causa.
A - Mas isso é o que a ciência é! Apenas isso: encontrar as
estruturas escondidas que explicam o comportamento dos
agentes que achavam estar fazendo algo, mas, na realidade,
são simplesmente porta-vozes de outra coisa.
P - Então você é um estruturalista! Fora do armário! Finalmente!
Porta-vozes! É o que você chama de atores?! E você quer
fazer Actor-Network Theory, ao mesmo tempo! Isso é esticar
os limites do ecletismo para bastante longe!
A - Por que eu não posso fazer as duas coisas? Certamente se
ANT tem qualquer conteúdo científico, tem de ser
estruturalista.
P - Você pode dizer-me que tipo de ação um porta-voz tem em
uma explicação estruturalista?
A - Sim, naturalmente: ela desempenha uma função, que é tão
importante quanto a estrutura lhe permitir! Se eu
compreendi corretamente. Qualquer outro agente da
mesma posição seria forçado a fazer o mesmo…
P - Então, um porta-voz, por definição, é totalmente substituível
por qualquer outro?
A - Sim, é isso o que estou dizendo!
P - Mas isso é também o que é tão idiota e que faz com que seja
radicalmente incompatível com ANT: um ator que faz
diferença, no meu vocabulário, não é um ator em tudo. Um
agente, se palavras têm algum significado, é exatamente o
que não é substituível por qualquer outra pessoa, é um
acontecimento único, totalmente irredutível a qualquer
outro.
A - Então você está me dizendo que o ANT não é uma ciência!
P - Não é uma ciência estruturalista, isso é certo.
A - "Sistemas de transformações", que é exatamente o que se
diz por estruturalismo!
P - Você não parece entender o abismo que existe entre o
estruturalismo e o ANT. A estrutura é apenas uma rede em
que você tem apenas informações muito incompletas. Não
me diga que é mais científica. Se eu quiser ter atores na
minha conta, eles têm de fazer as coisas, a não ser porta-
vozes; eles têm que fazer a diferença. Se eles não fazem
qualquer diferença, deixe-os.
A- Você e suas histórias… memoráveis histórias, que é que você
quer fazer? Estou falando de explicações, do conhecimento,
de crítica de ponta, não de escrever scripts para novelas do
canal 4!
P - Você quer que seu pacote de “algumas centenas de páginas”
faça a diferença, não? Pois bem, você tem que ser capaz de
provar que a sua descrição daquilo que as pessoas fazem,
quando levadas de volta para elas, faz uma grande diferença
para a maneira como elas estavam fazendo as coisas. Será
isto o que você chama ser um crítico de ponta?
A - É, acho que sim... sim.
P - Mas, então, você deve concordar que precisa dizer o que
fazer para dotá-los do conhecimento do que é irrelevante e
do que é relevante naquilo que eles (os atuantes) fazem,
porque são muito genéricas?
A - Claro que não, eu estava falando de causas reais.
P - Mas então eles não fazem muito, porque, eles não teriam
nenhum outro efeito que não o de ser porta-vozes da
realidade, um Outro ator? É o que se chamaria: a função, a
estrutura, etc... Então, eles não seriam realmente atores, mas
marionetes. Bem, você está fazendo os atores serem nada: na
melhor das hipóteses, eles poderiam acrescentar algumas
pequenas perturbações ao concreto mundo das coisas.
A - …
P - Agora você tem que me dizer o que é politicamente tão
importante ao transformar aqueles que estudamos em
infelizes 'actless' , porta-vozes de funções escondidas que
você, e somente você, pode ver e detectar?
A - Hmm, você tem uma forma de transformar as coisas de
cabeça para baixo… Veja! Se os atores se tornam
conscientes das determinações impostas a eles... Suas
consciência não se torna mais reflexiva? Eles podem tomar o
destino nas suas próprias mãos. Eles tornam-se mais
esclarecidos, não? Em caso afirmativo, gostaria de dizer que
agora, finalmente, em parte graças a mim, sim, há mais
atores agora, estou convencido disso.
P - Bravo, bravíssimo! Portanto, você é o ator de alguns agentes
plenamente determinados, acrescidos da função de porta-
vozes, acrescidos de um pouco de perturbação, acrescidos de
alguma consciência, desde que lhes sejam esclarecidos por
cientistas sociais? Horrível, simplesmente horrível… E as
pessoas querem fazer ANT! Depois de ter reduzido os atores a
meros porta-vozes, você deseja “generosamente” trazer para
os pobres homens a reflexivilidade que tinham antes e que
você retirou por tratá-los de uma maneira estruturalista!
Magnífico! Eles eram atores antes que você viesse com a sua
"explicação", não venha me dizer que este é o seu estudo!?
Ótimo trabalho estudante! Bourdieu, não poderia ter feito
melhor…
A - Você pode não gostar muito de Bourdieu, mas pelo menos
ele era um verdadeiro cientista, e ainda melhor, ele era
politicamente relevante.
P - Obrigado. Tenho estudado as ligações entre a ciência e a
política durante cerca de trinta anos, por isso não me intimido
facilmente com palestras de que a ciência é "politicamente
relevante".
A - Argumentos de autoridade não vão intimidar-me, portanto,
seus trinta anos de estudos não fazem nenhuma diferença
para mim...
P - Touché… Mas, a pergunta era: "O que posso fazer com ANT?“.
Eu lhe respondi: nenhuma explicação estruturalista! Os dois
são totalmente incompatíveis. Para o ANT você tem atores
em potencial e eles não são atores de tudo; ou você estrutura
com seu quadro de referência uma descrição-explicativa dos
agentes que estão fazendo virtualidades reais, o que exige
muito textos específicos, conexões mil com aqueles que quer
estudar. Exige muitos protocolos específicos para trabalhar.
Acho que isto é o que você chama “crítica de ponta" e de
"relevância política".
A - Então, o que devo fazer? Rezar por um milagre? Sacrificar
uma galinha?
P - Você está confundindo ciência com maestria. Diga-me, você
pode imaginar um único tópico em que, por exemplo,
Bourdieu critica a sociologia ou a ciência?
A – Não! Mas não posso imaginar um único tema a que se
aplicaria ANT!
P – Maravilha! , você está certo, é exatamente o que eu acho…
A - Isso não foi concebido como um elogio.
P - Mas vou tomá-lo como uma verdade!
A – Me desculpe, posso educadamente fazer uma observação?
Para toda a sua extremamente sutil filosofia da ciência, terá
ainda de dizer-me como escrever um...
P - Você estava tão ansioso para adicionar tabelas, contexto,
estrutura às suas "simples descrições"...
A - Mas qual é a diferença entre um bom e um mau texto ANT?
P - Essa é uma boa pergunta! Finalmente! Resposta: O mesmo
que entre um bom e um mau laboratório. Nem mais, nem
menos.
A - Pois bem, muito obrigado… Foi agradável você falar comigo.
Mas penso que depois de tudo, em vez de ANT… Eu estava
pensando em usar a teoria do sistema de Luhmann... Ou
talvez eu vá usar um pouco de ambos.
P -…
A - Você gosta de Luhmann não?
P – Deixaria de lado todos os "quadros subjacentes", se eu fosse
você!
A - Mas, a sua espécie de 'ciência', ao que me parece, significa
violar todas as regras de formação na área das ciências
sociais!?
P - Eu prefiro quebrá-las e seguir meus atores… Como você disse,
sou, ao final, de uma ingenuidade realista... Uma positivista.
A - Uma vez que ninguém parece compreender o que é ANT por
todo o campus, você poderia escrever um guia sobre ele;
certificar-se de que os nossos professores sabem o que é, e
depois, se é que posso dizer, não quero ser mal educado…
Mas eles poderiam não tentar forçar-nos em direção a ele…
Se você entende o que eu quero dizer…
P - É realmente assim tão mau? Um..., um... Guia? Por que veio a
mim, então?
A - Nessa última meia hora, tenho de confessar! Estive
pensando a mesma coisa…