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DIREITO PENAL III
PROFESSOR MS. LUIZ FELIPE PINHEIRO NETO
Ponto I – Furto
Título II – Dos crimes contra o patrimônio
Capítulo I – Do Furto
Furto
Art. 155 - Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel:
Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.
§ 1º - A pena aumenta-se de um terço, se o crime é praticado durante o repouso
noturno.
§ 2º - Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor a coisa furtada, o juiz pode
substituir a pena de reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a dois terços, ou
aplicar somente a pena de multa.
§ 3º - Equipara-se à coisa móvel a energia elétrica ou qualquer outra que tenha
valor econômico.
Furto qualificado
§ 4º - A pena é de reclusão de dois a oito anos, e multa, se o crime é cometido:
I - com destruição ou rompimento de obstáculo à subtração da coisa;
II - com abuso de confiança, ou mediante fraude, escalada ou destreza;
III - com emprego de chave falsa;
IV - mediante concurso de duas ou mais pessoas.
§ 5º - A pena é de reclusão de 3 (três) a 8 (oito) anos, se a subtração for de veículo
automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior.
Bem jurídico protegido:
Objeto jurídico: patrimônio.
Para a corrente majoritária (incluindo Magalhães Noronha e Bitencourt),
protege-se prioritariamente a posse (de forma direta/imediata) e de forma
mediata a propriedade. Para Hungria (seguido por Capez), a propriedade é
protegida primordialmente e a posse, assessoriamente.
Patrimônio: valor econômico (Carlos Roberto Gonçalves) e, também, bens sem
valor econômico, de valor sentimental (Hungria).
Segundo Capez, patrimônio inclui a propriedade material e os direitos reais; a
propriedade imaterial; os direitos obrigacionais e a posse.
Tipo objetivo
Ação nuclear: SUBTRAIR – retirar a coisa da posse/propriedade da vítima e sujeitar a
seu poder. Deve haver ânimo definitivo da posse/propriedade, por parte do agente, para
sí ou para outrem.
Não é punido o furto de uso no ordenamento brasileiro.
Pode ocorrer sob vigilância da vítima –a clandestinidade pode ocorrer com
frequência, mas não é elementar do crime.
Coisa é bem corpóreo, passível de subtração e deslocamento, mesmo que
intangível. Uma pessoa não pode ser objeto de furto, nem mesmo o cadáver. A
coisa deve ser móvel e alheia.
Não é necessária a identificação da vítima, basta a res furtiva não ser do agente,
mas ter sido identificado que tem possuidor/proprietário diverso. Não podem ser
objeto do furto a res nullius (coisa que nunca teve dono), a res derelicta
(abandonada por alguém) ou a res commune omnium (a coisa comum a todos,
como o ar, luz, calor do sol...), estas se não captadas para gerar energia. Não
pode ser confundida a coisa perdida com coisa abandonada.
Quem detém disposição transitória sobre o bem não tem posse nem propriedade.
A coisa é alheia. Ex: empregados.
Coisa própria: Se alguém subtrai coisa que tem propriedade, mas não posse?
Para Noronha, haveria furto ao estar na posse legítima de outrem e o proprietário
tomá-la ilegitimamente. Para Hungria e Damásio, haveria exercício arbitrário
das próprias razões (art. 346, CP).
Bitencourt discorda dos dois posicionamentos, apontano que, no caso do art.
346, não se presta a tutelar questões patrimoniais, mas a administração
pública/administração da justiça, não se adequando a situação em comum às
ações propostas e o fim específico do furto não se faria presente no tipo do
exercício arbitrário. No caso de entendimento de furto, deveria-se observar a
rubrica “alheia”. O autor, então, vê como fato atípico, mas que pode ter proteção
de outras searas legais.
Lesão de interesse economicamente apreciável x lesão de bens morais (que constituam
coisas sem valor econômico).
Para Hungria e Manzini, o valor patrimonial não se confunde com valor
econômico, estando o patrimônio a alcançar o caráter econômico e bens úteis
(no que se inclui a utilização moral/afeição).
Para se configurar o furto, deve haver o dano, ou seja, a diminuição do
patrimônio da vítima.
Tipo subjetivo:
Dolo: vontade livre e consciente de subtrair coisa alheia.
Fim especial de agir: apoderar-se do objeto para sí ou para outrem – animus
apropriativo.
Não há previsão de modalidade culposa.
Sujeitos ativo e passivo:
• sujeito ativo, qualquer um (crime comum).
• Não pode ser sujeito ativo o proprietário (que poderia praticar o delito do art.
346, CP), bem como o co-herdeiro, sócio ou condômino. No caso do possuidor,
estaria este praticando o crime do art. 168, CP (apropriação indébita).
• Sujeito passivo (imediato): o proprietário, o possuidor ou o detentor (desde que
com interesse legítimo sobre a coisa). Bitencourt é a favor do detentor como
vítima, Capez é contra.
Consumação e tentativa
• Consumação: orientações distintas: deslocamento da coisa, mesmo que ainda
sob a esfera de vigilância da vítima; deslocamento da coisa COM
AFASTAMENTO da esfera de vigilância da vítima. Estado de posse tranquilo
da coisa pelo agente.
• Para Bitencourt e Noronha (e o STJ em 2005), consuma-se o crime quando a
coisa sai da esfera de disponibilidade/vigilância da vítima e fica em posse
tranquila do agente. Deve haver inversão da posse.
• Para Capez, não é necessária a posse tranquila. No mesmo sentido, Damásio de
Jesus. Há jurisprudência de 2008 adiante no STJ e em 2011 no TJRN.
• Tentativa: possível, desde que possível a divisão do iter criminis.
• Há crime impossível no furto em loja com sistema antifurto e seguranças? Há
ineficácia absoluta do meio empregado na execução?
Entendimento dominante nos Tribunais Superiores (STJ e STF). EMENTA. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. DIREITO PENAL. ART. 155
DO CP. FURTO. DESNECESSIDADE DA POSSE TRANQUILA DA RES. CONSUMAÇÃO
DO DELITO. DESCLASSIFICAÇÃO PARA ROUBO. IMPOSSIBILIDADE. VIOLÊNCIA DIRECIONADA PARA A RES.
1. O tipo penal classificado como furto consuma-se no momento, ainda que breve, no qual o
agente se torna possuidor da res, não se mostrando necessária a posse tranquila.
2. Segundo consta nos autos, o atual agravado, na tentativa de subtrair a res, "acabou empurrando a vítima. A vítima então acabou indo de encontro a um muro e o réu saiu correndo
do local na posse da mochila".
3. Irretocável o acórdão estadual com relação à inexistência, in casu, de suposta ocorrência de roubo, pois, consoante se depreende do voto condutor do decisum, a violência foi dirigida à res,
portanto não se configura a modalidade descrita no art. 157 do Código Penal - roubo.
4 . Segundo lição do Ministro Moreira Alves, no voto condutor do RE n. 102.490/SP, há quatro teorias que explicam a consumação dos tipos do roubo e do furto. Pela teoria da contrectatio, a
consumação se dá com o simples contato entre o agente a coisa alheia. Pela apprehensio ou
amotio, a consumação se dá quando a coisa passa para o poder do agente. Na ablatio, a
consumação se dá quando a coisa, além de apreendida, é transportada de um lugar para outro e, finalmente, na illatio, a consumação se dá quando a coisa é transportada ao local desejado pelo
agente para tê-la a salvo.
5. O art. 155 do Código Penal traz como verbo-núcleo do tipo penal do delito de furto a ação de "subtrair"; pode-se concluir que o direito brasileiro adotou a teoria da apprehensio ou amotio,
em que os delitos de roubo ou de furto se consumam quando a coisa subtraída passa para o
poder do agente, mesmo que num curto espaço de tempo, independentemente de a res permanecer sob sua posse tranquila.
6. O agravo regimental não merece prosperar, porquanto as razões reunidas na insurgência são
incapazes de infirmar o entendimento assentado na decisão agravada.
7. Agravo regimental improvido.(STJ, AgRg no REsp 1226382 / RS, Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, Julgado em 15/09/2011)
Princípio da Insignificância
• Relaciona-se ao princípio da fragmentariedade/subsidiariedade do direito penal.
• Afasta a tipicidade.
• Requisitos: mínima ofensividade da conduta do agente; mínima/nenhuma
periculosidade social da conduta; extremamente reduzido grau de
reprovabilidade social da ação; inexpressividade da lesão jurídica.
Furto de uso
• Só se criminaliza a subtração com animus apropriativo definitivo da coisa
alheia.
• Pronta e integral restituição (antes que a vítima constate a subtração) e ânimo de
utilização momentânea. É conduta atípica.
Furto famélico
• Suprimir fome sua ou de sua família;
• Estado de necessidade que exclui a ilicitude do crime;
• Art. 24, CP – considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato para
salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem podia de outro
modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era
razoável exigir-se.
Majorantes
• Repouso noturno: aumento em um terço da pena. Não se refere à noite, mas ao
período de recolhimento. O local precisa ser habitado, com pessoa repousando.
• Segundo doutrina e jurisprudência dominantes, não aplica-se esta majorante em
furto realizado em local desabitado ou na ausência do morador. Magalhães
Noronha e Capez discordam, com Capez apontando jurisprudência no sentido de
que pode ser cometida na ausência dos moradores e em locais não residenciais.
Hungria aponta que não pode acontecer se as vítimas estiverem alertas.
• Entendimento do STJ em 2012 no sentido defendido por Capez.
• Não se aplica ao furto qualificado.
Redução da pena (forma privilegiada).
Aplica-se ao furto simples e ao furto em repouso norturno. A jurisprudência
mais recente entende que também se aplica aos furtos qualificados.
Primariedade: para Bitencourt, é diferente da não reincidência. Primário é quem
nunca sofreu qualquer condenação irrecorrível. Reincidente é aquele que pratica
crime após trânsito em julgado de outra condenação, antes do prazo de cinco
anos do cumprimento ou extinção da pena. Não reincidente é aquele que não é
primário, nem reincidente (quem comete crimes antes do trânsito em julgado ou
após os cinco anos).
Para Damásio e Capez, no entanto, o réu não reincidente é o réu primário.
Furto de pequeno valor: fixado pela jurisprudência em um salário mínimo. Não
deve ser avaliado de acordo com a vítima. Não se deve confundir pequeno valor
com pequeno prejuízo (que tem consequências no crime de estelionato, p ex –
art. 171, § 1º. CP).
EMENTA. HABEAS CORPUS. PENAL. FURTO QUALIFICADO PELO ROMPIMENTO
DE OBSTÁCULO. APLICAÇÃO DO PRIVILÉGIO DO ART. 155, § 2º, DO CP.
INVIABILIDADE. BENS FURTADOS QUE NÃO SE CONFIGURAM DE PEQUENO VALOR.1. A atual jurisprudência do Supremo Tribunal Federal - à semelhança do que ocorre
no crime de homicídio - passou a entender que as qualificadoras, em especial as de natureza
objetiva, não são incompatíveis com a figura privilegiada do delito de furto.2. A partir dessa nova orientação, esta Corte Superior passou, também, a admitir a figura do furto qualificado-
privilegiado, desde que haja compatibilidade entre as qualificadoras e o privilégio. Precedentes
da Quinta e Sexta Turmas.3. No caso, entretanto, segundo consta do acórdão recorrido,
cometido o delito em 17/2/2004, foram os bens furtados avaliados em R$ 299,73 (duzentos e noventa e nove reais e setenta e três centavos), mais, inclusive, do que o salário mínimo vigente
à época (R$ 240,00 - duzentos e quarenta reais), não podendo ser considerados, portanto, de
pequeno valor, para fins de incidência do privilégio.4. Ordem denegada. (STJ, HC 147091 / MG, Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, Sexta Turma,julgado em 17/10/2011)
Furto qualificado:
Com destruição ou rompimento de obstáculo: violência contra a coisa, no
caso, contra obstáculo que tenha fim de proteger o patrimônio. Para Bitencourt,
tanto faz se a destruição ocorre antes ou depois da subtração/remoção, mas deve
ocorrer antes da consumação do crime.
Com abuso de confiança, ou mediante fraude, escalada ou destreza:
Confiança é um vínculo subjetivo entre agente e vítima. Não basta a simples
condição de empregado, por exemplo. Deve haver uso desta relação para a
consumação do crime.
É indispensável que a coisa tenha sido colocada na esfera de contato do agente
devido a esta confiança (mas não há posse anterior, pois haveria , então,
apropriação indébita).
A confiança não pode ter sido conquistada por ardil, o que constitui fraude. Não
deve se confundir com a fraude usada no estelionato, onde a vítima é induzida
ao erro e entrega o bem. No furto qualificado, a fraude diminui a vigilância da
vítima.
Escalada se refere a vencer obstáculos com esforço incomum/anormal. Se
houver um muro, mas sua escalada não tenha dificuldade anormal, não se fala
em escalada. O obstáculo deve ser idôneo para produzir dificuldade.
Destreza: habilidade especial para que a vítima não perceba o furto. (Obs: o
punguista/batedor de carteiras).
Com emprego de chave falsa: instrumento que sirva para abrir a fechadura,
tendo ou não formato de chave. Só se configura se usada em obstáculo à res
furtiva (ou seja, não indice na utilização de chave em ignição de carro para furtá-
lo).
Chave verdadeira? Para Magalhães Noronha, se foi achada ou roubada/furtada,
se enquadra como falsa. Para Bitencourt, não. Para o autor, se foi ardilosamente
conseguida, haveria emprego de fraude.
Concurso de pessoas (qualificadora)
Mediante concurso de duas ou mais pessoas.
Para Hungria, todos os agentes devem participar da execução. Para uma segunda
corrente (Damásio, Mirabete, Capez), não é necessária a participação na
execução ou ainda no local da infração.
Não importa de há inimputáveis ou agentes não identificados.
Concurso de crimes: formação de quadrinha e furto qualificado. Pode haver
concurso material entre estes crimes. Não haveria bis in idem. Posição do STF.
Furto de veículo automotor:
Transporte do veículo para outro estado ou para o exterior.
Pena exasperada.
Tentativa?
Furto de energia: crime equiparado.
Energia é equiparada à coisa móvel.
Para Bitencourt, para haver furto, deve-se ter uma ligação clandestina desde a
origem, antes do medidor oficial. Sendo feita após o medidor, ter-se-ia
estelionato.
Qualquer outra energia que tenha valor econômico.
Furto de sinal de TV paga – o sinal não se consume/exaure como a energia. Não
há furto.
Furto de wi-fi?
Pena e Ação Penal:
• Furto simples: pena de reclusão de um a quatro anos e multa;
• Furto no repouso noturno: pena do furto simples, majorada em um terço;
• Furto privilegiado: pena do furto simples, podendo ser substituída por detenção,
diminuída de um a dois terços ou ainda substituída por multa;
• Furto qualificado (§ 4º): Pena de reclusão de dois a oito anos e multa;
• Furto qualificado (§ 5º): pena de reclusão de três a oito anos.
• Pode haver isenção de pena em caso de furto contra ascendente, descendente ou
cônjuge (enquanto na convivência conjugal).
• Ação Penal Pública incondicionada.
• Ação Penal pública condicionada à representação nos casos do art. 182, CP.
Título II – Dos crimes contra o patrimônio
Capítulo VIII – Disposições Gerais
Art. 181 - É isento de pena quem comete qualquer dos crimes previstos neste título,
em prejuízo:
I - do cônjuge, na constância da sociedade conjugal;
II - de ascendente ou descendente, seja o parentesco legítimo ou ilegítimo, seja civil
ou natural.
Art. 182 - Somente se procede mediante representação, se o crime previsto neste
título é cometido em prejuízo:
I - do cônjuge desquitado ou judicialmente separado;
II - de irmão, legítimo ou ilegítimo;
III - de tio ou sobrinho, com quem o agente coabita.
Art. 183 - Não se aplica o disposto nos dois artigos anteriores:
I - se o crime é de roubo ou de extorsão, ou, em geral, quando haja emprego de
grave ameaça ou violência à pessoa;
II - ao estranho que participa do crime.
III - se o crime é praticado contra pessoa com idade igual ou superior a 60
(sessenta) anos.
(...)
Furto de coisa comum
Art. 156 - Subtrair o condômino, co-herdeiro ou sócio, para si ou para outrem, a
quem legitimamente a detém, a coisa comum:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa.
§ 1º - Somente se procede mediante representação.
§ 2º - Não é punível a subtração de coisa comum fungível, cujo valor não excede a
quota a que tem direito o agente.
Bem jurídico protegido:
Objeto jurídico: posse legitima e propriedade da coisa comum.
Tipo objetivo
Ação nuclear: SUBTRAIR coisa comum – retirar a coisa da posse/propriedade da
vítima e sujeitar a seu poder. Deve haver ânimo definitivo da posse/propriedade, por
parte do agente, para sí ou para outrem.
Tipo subjetivo:
Dolo: vontade livre e consciente de subtrair coisa alheia.
Fim especial de agir: apoderar-se do objeto para sí ou para outrem – animus
apropriativo.
Não há previsão de modalidade culposa.
Sujeitos ativo e passivo:
• sujeito ativo: condômino, co-herdeiro ou sócio da coisa comum (que não esteja
em posse da coisa, ou haveria apropriação indébita) – é crime próprio.
• Sujeito passivo (imediato): condômino, co-herdeiro ou sócio da coisa comum ou
outro possuidor legítimo.
Consumação e tentativa
• Nos moldes do furto
Exclusão de antijuridicidade:
Não se pune a subtração da quota do próprio agente, se coisa fungível
(substituível). Se for infungível, mesmo dentro da quota, há o crime.
Há quem defenda que seja exclusão de pena (posição minoritária) – não é
punível o crime (exclusão de ilicitude/antijuridicidade), não o autor (o que daria
a exclusão de punibilidade).
Pena e Ação Penal:
• Pena: detenção de seis meses a dois anos OU multa.
• Ação penal pública condicionada à representação do ofendido.