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Trabalho de Conclusão de Curso
EDUCAÇÃO E POBREZA: UM ESTUDO SOBRE A EVASÃO ESCOLAR DOS
ALUNOS DO 7º ANO EM UMA ESCOLA DO INTERIOR DO MATO GROSSO DO
SUL
Jacqueline Cícera Fernanda da Silva Graça1
Cláudia Elizabete da Costa Moraes Mondini2
RESUMO
Este artigo teve o objetivo examinar a evasão escolar dos alunos de uma escola municipal,
analisando também os impactos das condicionalidades do Programa Bolsa Família através do
acompanhamento do Centro de Referência de Assistência Social-CRAS do interior. O estudo
é parte de uma investigação, coordenada pelo Curso de Especialização Educação, Pobreza e
Desigualdade Social da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul-Campus Pantanal, com
base numa amostra qualitativa com 06 famílias, que participaram através de entrevistas
semiestruturadas. As conclusões confirmam dados apontados por outras pesquisas sobre os
impactos do PBF na escolaridade de crianças e adolescentes, paralelamente à expansão da
rede escolar de Ensino Fundamental. Abordando através de uma reflexão crítica sobre o
posicionamento dos pais e desenvolvimento de estratégias para prevenir estas evasões.
Palavras-chave: Ensino Fundamental, Evasão Escolar, Condicionalidade.
1. INTRODUÇÃO
O presente trabalho Educação e Pobreza: um estudo sobre a evasão escolar dos alunos
do 7º ano em uma escola do interior do Mato Grosso do Sul, põe em relevo a relação entre o
Programa Bolsa Família e a evasão escolar dos alunos beneficiários, assim, como a reflexão
sobre a relação entre educação e o monitoramento das condicionalidades pertencentes ao
Programa.
A necessidade de investigar o tema a evasão escolar, surgiu devido à realidade
vivenciada dentro do Centro de Referência de Assistência Social-CRAS. Pois, há cinco anos
atuando como Assistente social levantou-se diversas questões, sobre os reais motivos que
levariam os adolescentes a se evadirem antes de concluir o Ensino Fundamental. Em contra
partida ouvia-se as mães reclamando do bloqueio de seus benefícios. Porém foi no Módulo
1 Graduada em Pedagogia pela FIFASUL em 2003 e Serviço Social pela UNIDERP em 2010. Atuando como
Assistente Social na Secretaria Municipal de Assistência Social e Cidadania de Corumbá-MS. E-mail: jacque-
fernanda@hotmail.com 2 Professora do curso de Psicologia da UFMS/CPAN, formada em Psicologia e mestra em Educação pela mesma
instituição; especialista em Educação Especial (UCDB), Psicopedagogia (UNIGRAN), Neuropsicologia
(UNIARA) e Psicologia Escolar e Educacional (CFP).
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III - Escola: espaços e tempos de reprodução e resistências da pobreza, que se fez uma junção
entre a teoria e o fenômeno da presente pesquisa.
No primeiro momento observamos que durante o atendimento com as famílias em
situação de descumprimento das condicionalidades, o índice da frequência era baixíssimo ou
apresentava evasão. Já a condicionalidade da saúde raramente é descumprida, pois é realizado
o acompanhamento in loco com os agentes do ESF, que avisam o dia da pesagem e lançam
no sistema do Programa Bolsa Família. Partindo deste contexto após saber que uma familia
havia sido excluída devido à evasão da filha adolescente houve-se a necessidade de pesquisar
sobre o fenômeno.
As famílias que descumprem as condicionalidades do Programa Bolsa Familia,
sofrem penalidades que se iniciam com a advertência, depois o bloqueio, a suspensão e o
cancelamento do benefício, ou seja, problemas que contribuirão para a exclusão social da
família.
Em face destes contextos o estudo assumiu como objetivo geral analisar sobre os
principais motivos que levam os adolescentes ao descumprimento da condicionalidade: a
evasão escolar. Como suporte ao alcance do objetivo supracitado, bem como da questão
levantada, a pesquisa buscou conhecer o perfil educacional das famílias, identificar as formas
de acompanhamento dos beneficiários pelos órgãos competentes e investigar o
posicionamento dos pais quanto a evasão e suas consequências.
Nesta sequência, as análises foram importantes para interpretação dos dados e no
processo de apreensão dos efeitos do Programa na vida de seus beneficiários.
A reflexão aqui proposta será feita em três partes, além desta introdução,
apresentaremos algumas reflexões que, de maneira direta ou indireta, problematizado a
evasão, juntamente com o monitoramento das condicionalidades em educação do Programa
Bolsa Família (PBF). No Desenvolvimento utilizaremos a teoria do materialismo histórico e
faremos uma tabulação com os dados obtidos com as entrevistas e encerraremos com as
conclusões finais com propostas preventivas para extinguir este fenômeno.
1.1 O PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA E AS CONDICIONALIDADES
A medida provisória nº 132, de 20 de Outubro 2003 criou o Programa Bolsa Família, foi
transformada na Lei no 10.836, de 09 de janeiro de 2004, e regulamentada pelo Decreto no
5.209, de 17 de setembro de 2004. O mesmo tem como objetivo contribuir para diminuição
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da transmissão da pobreza no País. Mas as condicionalidades são situadas como
contrapartidas dos beneficiários tanto para a inclusão quanto para a permanência no
Programa, vinculando-se do acesso ao benefício a uma pauta de obrigações em relação a
direitos sociais básicos nas áreas de educação, saúde e assistência social.
Para Valente (2002), os programas de distribuição de renda visam suprir a questão da
dignidade humana, ou seja, a nutrição é primordial que aluno busque a alfabetização e o
conhecimento. Partindo deste contexto levantamos alguns dados qualitativos sobre o
fenômeno da evasão escolar, pois o não cumprimento das condicionalidades inseridas neste
contexto privará estas famílias ao direito do benefício do PBF, acarretando nos períodos de
advertência, bloqueio, suspensão e exclusão do mesmo.
Segundo o portal da transparência o índice de acompanhamento da frequência escolar dos
alunos beneficiários do Bolsa Família registrou um aumento de 6 pontos percentuais nos
meses de agosto e setembro deste ano, comparado ao bimestre anterior. O número passou de
85,57% para 91,8%. Do total de 14,89 milhões de crianças e jovens de 6 a 17 anos
acompanhadas, 95,2% cumpriram a frequência exigida pelo programa de transferência de
renda.
[...] a vinculação da educação como condicionalidade do Programa Bolsa Família
insere-se no contexto das políticas neoliberais que ganham corpo em nosso país na
década de 90 do século passado, tendo por influências marcantes na área
educacional a vinculação da educação como preparação para o trabalho e
qualificação de mão de obra como meio de ativação para o mercado de
trabalho.(Grifo nosso).
Em Brasil (2014) as visões moralistas sobre a pobreza difunde-se amplamente pelos
meios de comunicação, uma compreensão moralista sobre a pobreza que a simplifica e a
reduz a hipotéticas ausências de valores e atitudes inadequadas dos pobres. E ainda ressalta
que:
[...] Mesmo as políticas públicas e os programas socioeducativos podem, muitas
vezes, carregar uma intenção corretiva e moralizadora, que apela para a educação
moral em valores nas escolas. A pobreza, assim, acaba sendo vista somente pelo
viés educacional, ficando mascarada toda a sua complexidade como questão social,
política e econômica (Brasil, 2014).
1.2 O FRACASSO ESCOLAR
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O Fracasso Escolar, (PATTO, M.H.S,1990) pode ser compreendido como a consequência
para um aluno da não-apropriação do aprendizado. Os conceitos, habilidades, valores,
conhecimento e a questão da cidadania não foi internalizada no aluno, culminando muitas
vezes, em baixas notas, reprovação e, por fim, no abandono da escola pelo mesmo.
Ao falar de fracasso escolar, é importante observar quando as dificuldades de
aprendizagem vêm encobrir a fragilidade da escola, centrando no aluno todo insucesso de sua
não aprendizagem. A falta de conhecimento didático do corpo docente está na raiz do
fracasso escolar. O fracasso muitas das vezes dá-se devido a educação infantil que o
individuo em causa teve. A importância de uma sadia educação infantil é muito importante, e
deve ser acompanhada diretamente dos pais (Pai e Mãe), para que este tenha uma base bem
acentuada.
As principais causas do fracasso escolar são oriundas, em sua maior parte, dos sistemas
de ensino que não conseguem atender às diversidades de necessidades presentes nas escolas,
deixando de identificar onde se localizam as inadaptações à aprendizagem, e levar o aluno a
descobrir sua própria modalidade de aprendizagem, considerando como ponto crucial seu
modo particular de se relacionar com o conhecimento, ou seja, a aprendizagem escolar.
O fracasso escolar também pode ocorrer dependendo do contexto familiar, cultural, social
e político que o indivíduo possa estar inserido.
2. PERCURSO METODOLÓGICO
O levantamento de dados deu-se em uma escola municipal do interior do Mato Grosso
do Sul, e sua atuação destina-se a Educação Infantil e Ensino Fundamental. Já o
monitoramento das famílias beneficiárias do PBF, cujo os filhos evadiram-se, foi realizado
pelo Centro de Referência de Assistência Social-CRAS. Tratando-se por um órgão da
Secretária Municipal de Assistência Social e Cidadania da Prefeitura Municipal de Corumbá-
MS. Ele atende as famílias referenciadas do território, ou seja, os bairros Arthur Marinho,
Dom Bosco, Cervejaria, Generoso, Beira Rio e Borroski.
A análise dos dados foi feita com embasamento na abordagem qualitativa que, de
acordo com Neto (1994) apud (MINAYO, 2000), nos proporciona uma visão da realidade, ou
seja, nos proporciona a resposta de questões peculiares. Porém retomaremos questões
individuais para que ocorra a compreensão dos fatores que desencadeiam estes alunos a
abandonar a educação básica. A pesquisa qualitativa responde a questões muito particulares.
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Ela se preocupa, nas ciências sociais, com um nível de realidade que não pode ser
quantificado, ou seja, trabalha com o universo de significados; aspirações, crenças, valores e
atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos
fenômenos que não podem ser reduzidos à operacional.
Foram entrevistas 06 responsáveis familiares (Responsável Familiar), que se
encaixavam nos critérios da pesquisa, a saber, pois as mesmas, descumpriram a
condicionalidade do programa, através da evasão escolar de seus filhos, que curiosamente
frequentavam o 7º ano do Ensino Fundamental.
Inicialmente após o levantamento destas famílias, nos encaminhamos aos endereços
das famílias selecionadas. O primeiro contato pessoal com as 05 mães e 01 pai; exigiu um
cuidado especial explicar o objetivo da pesquisa. Ressaltou-se que a atividade tratava-se de
uma pesquisa de especialização, não tendo nenhum vínculo com o Ministério do
Desenvolvimento Social. Após a assinatura do Termo Livre Esclarecido ficou acordado que
cada uma teria sua identidade preservada e que os depoimentos poderiam ser revisados e/ou
excluídos parcial ou integralmente, caso este fosse o desejo da entrevistada quando da
apresentação das transcrições. As entrevistas foram realizadas nos dias 20, 23, 25 e 26 de
Novembro de 2016, cuja, compreensão do objeto de estudo foi realizada através de
instrumentos de coleta de dados, ou seja, utilizamos questionário e entrevistas
semiestruturadas. Estes instrumentos nos auxiliaram a identificar quais os motivos da evasão
escolar destes adolescentes, assim como, o posicionamento dos pais quanto esta decisão e a
consequências sofridas nas condicionalidades do Programa Bolsa Família.
O levantamento qualitativo foi realizado sob uma concepção crítica das perspectivas
exploradas sobre os contextos que acercam o fenômeno da evasão escolar e suas
contradições. Porém os dados qualitativos e quantitativos foram levantados após uma
pesquisa prévia do quantitativo de evasões da referida escola. Em seguida nos dirigimos ao
CRAS, e realizamos as análises dos dados do SICON-Sistema de Condicionalidade do
Programa Bolsa Família, que resultou no bloqueio destas famílias, devido a evasão dos
adolescentes.
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
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Visando a redução consistente da desigualdade social no Brasil, este programa vem
sofrendo diversas críticas, pois há quem acredite que, embora tenha efeitos positivos para a
melhoria da vida de famílias mais pobres.
As políticas sociais são voltadas para um público em situação de vulnerabilidade
social, ou seja, extrema pobreza, consequentemente o foco é abranger os direitos sociais.
Porém devemos assumir que, os recursos não são suficientes para atender a todos. Assim faz-
se necessário levantar o perfil das famílias para que as mesmas sejam beneficiadas.
Tabela1. Perfil Socioeconômico dos Entrevistados
Família Nº filhos Faixa
Etária
Estado
Civil
Renda
Alessandra 04 38 Anos Viúva R$ 640,00
Rosaline 02 18 Anos Solteira R$ 300,00
Maria Antônia 04 40 Anos Casada R$ 700,00
Luciana 03 26 Anos Amasiada R$ 640,00
Tatiane
Jucineia
05
06
39 Anos
43 Anos
Amasiada
Separada
R$ 580,00
R$ 750,00
Quadro elaborado pela autora apartir dos dados coletados por meio das entrevistas.
De ARROYO (2014) citado no material do curso de especialização em Educação,
Pobreza e Desigualdade Social da UFMS (BRASIL, 2014), a empreitada catequético-
educativa colonizadora e até republicana se orienta nessa visão de inferioridade moral,
cultural, civilizatória dos Outros e no tratamento destes como inferiores, por serem diferentes.
Persistem empreitadas antipedagógicas sempre que os pobres (crianças, adolescentes), são
pensados como inferiores em valores e cultura. Partindo desta premissa, observou-se através
de suas falas, que existe certo conformismo de sua realidade, vejamos a fala da Responsável
da “Família Tatiane”: (“A gente luta, luta, mas é difícil criar cinco
filhos, meu marido ainda está adoentado (suspiro). Fazer o quê se é da vontade de Deus? O
que importa, é viver um dia de cada vez”) (23/11/2016).
Através do perfil socioeconômico das famílias entrevistadas pode-se avaliar que a
renda per capita mínima variou de R$ 100,00 a R$128,00, confirmando a situação de extrema
pobreza.
Ainda em Brasil (2014), ressalta-se que:
[...] Devemos lembrar, mais uma vez, que as pessoas em estado de extrema pobreza
são as mais vulneráveis, as mais expostas a não possuir nenhuma possibilidade de
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se autonomizar, mesmo nos sentidos mais primários, como o de fazer escolhas
mínimas relativas ao tipo de vida que gostariam de levar; por exemplo: escolher o
companheiro de vida, decidir o número de filho que se quer ter, desenvolver uma
vontade própria em relação à família e à vida em geral (Brasil,
2014).
Tabela 2. Grau de Escolaridade e Profissão da RF
Família Escolaridade Profissão
Alessandra 5º Ano E. F Pescadora
Rosaline 4º Ano E. F Diarista
Maria Antônia 5º Ano E. F Do lar
Luciana 6º Ano E. F Do lar
Tatiane
Jucineia
5º Ano E. F
7º Ano E. F
Doméstica
Vendedora
Quadro elaborado pela autora apartir dos dados coletados.
O nível máximo de escolaridade alcançado pelas responsáveis entrevistadas foi de 7º
ano do Ensino Fundamental, vemos claramente o círculo vicioso e exclusão no contexto das
famílias analisadas.
Segundo Marx (1996), ressalta que a pobreza, desde suas origens, continua a assolar
os grupos populacionais aos quais tem e vem sendo historicamente negligenciado o direito
aos frutos do próprio trabalho.
Para Brasil (apud Belluzzo, 2014), a formação educacional, entre nós, ou é relegada a
um segundo plano, ou, quando ocorre, é carente de princípios igualitários sustentadores da
cidadania democrática; ou seja, não prepara as pessoas para serem protagonistas da política.
Por tudo isso, não há como não observar, por exemplo, que o reconhecimento dos direitos de
cidadania das mulheres, sobretudo as que vivem na pobreza extrema e implica, ainda uma
vez, no reconhecimento das várias injustiças que as atingem. Tais injustiças lesaram,
fortemente, muitas dimensões de sua existência e de suas subjetividades:
Brasil apud Belluzzo (2014) descreve preconceito:
[...] O indivíduo é submetido a fortes preconceitos reproduzidos, tanto
historicamente, em grande escala na sociedade. Não é, com efeito, muito difícil
avaliar a profundidade destrutiva das subjetividades das pessoas alvejadas por eles.
Nessas coletividades, estão presentes atmosferas, e mecanismos de relacionamento
social e tipos de tratamento das pessoas pobres (muitas vezes, por parte das próprias
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instituições públicas), que redobram o sofrimento psíquico e cívico dos seus
membros.
Durante a entrevista duas mães ressaltaram que o estudo não era tão importante, pois
afirmaram que devido à crise que o Brasil está atravessando, diversos “Doutores”, estavam na
fila do desemprego.
Vejamos a fala da responsável da “família Jucineia”:
Com a crise que estamos no Brasil estudar é luxo. Acho que o importante é a
criança saber ler, escrever e saber contar dinheiro. Pois para por cerca no pasto e
tirar leite de vaca não é necessário o estudo. Pois a gente só pode arranja serviço em
sítio ou fazenda, meu guri já está lá com o pai dele. (20/11/2016).
A outra mãe ressaltou que o governo é o culpado pelos problemas enfrentados pelas
populações pobres, assim como a evasão dos filhos na escola.
Vejamos a fala da responsável da “Família Alessandra”: (“O menino estava indo bem na escola, mas começou a repetir a merenda e ele disse
que não iria mais, insisti ele continuou mais um pouquinho. Mas logo o pai doente.
faleceu por falta do remédio que o governo não deu. Depois o menino teve que
trabalhar para me ajudar em casa”) (20/11/2016).
De acordo com Brasil (2014), a indiferença diante do destino do sujeito semelhante
faz, em termos morais, do cinismo gelado uma forma de sociabilidade. Os cidadãos que são e
foram excluídos do acesso ao bem-estar, à cultura e à educação, tiveram seus direitos
prejudicados, na maioria das vezes, de forma irreparável. Sua liberdade, em sentido profundo,
que engloba capacidade de escolha e decisão sobre sua vida, foi gravemente ferida. Dessa
forma, instalam-se as injustiças sociais, econômicas, políticas e jurídicas; e se erigem modos
de intervenção das instituições e de seus agentes públicos, fundados na crueldade e na
indiferença em relação ao sofrimento dos pobres.
Tabela 3. Condições de Habitacionais
Família Situação Material Nº de
Cômodos
Valor *de
Aluguel
Alessandra Cedida Alvenaria 03 R$ 0,00
Rosaline Invadida Madeira 02 R$ 0,00
Maria Antônia Própria Alvenaria 02 R$ 0,00
Luciana Alugada Alvenaria 04 R$ 220,00
Tatiane
Jucineia
Alugada
Própria
Alvenaria
Alvenaria
03
04
R$ 180,00
R$ 0,00
Quadro elaborado pela autora apartir dos dados coletados.
Ao analisarmos a tabela acima vemos situação de moradia das famílias entrevistadas,
as maiorias das mães ressaltam utilizar parte do benefício para quitar o aluguel ou os serviços
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de energia e/ou saneamento. Exceto a responsável familiar da “Família Rosaline” que reside
com os filhos em situação insalubre de moradia, ou seja, trata-se de um imóvel abandonado
próximo a rede de esgoto. Em suas palavras: (“Casa é um lugar onde temos para descansar, se
a pessoa está precisando de um teto não se deve escolher, né?”) (25/11/2016).
Questionadas ainda se buscavam formas de sair da situação de extrema
vulnerabilidade, respondeu que devido a problemas de saúde e falta de escolaridade, tinha
dificuldades de se inserir no mercado formal de trabalho, e que esperava ser selecionada no
programa habitacional do município para mudar sua realidade. Direcionou-se a mesma
pergunta às demais mães, e algumas responderam que também aguardavam serem
selecionadas no mesmo programa.
Na fala da RF da “Família Tatiane”: (“O programa Bolsa Família é muito bom, com o
número do NIS a gente pode ir ao CRAS e fazer a inscrição das casinhas. É ruim morar de
favor, mas tenho fé que vou mudar de vida quando receber minha chave”) (26/11/2016).
Na concepção do materialismo histórico Marx (1996) afirmava não existir relação nos
termos do quadro da pobreza visto que o aumento na acumulação de capital implica em maior
exploração da força de trabalho e extração da mais valia.
Ainda em Marx (1996, p.286) podemos ressaltar que:
[...] o lar há de ser onde o teto for mais barato; em áreas onde a polícia sanitária dá
menos fruto, é mais lamentável o sistema de esgoto, menor o tráfego, máxima as
imundícies pública, mais miserável ou pior os suprimentos de água, em cidades,
com maior a falta de luz e ar.
Tabela 4. Condições de Saúde
Família Doença Membros
Alessandra Anemia
Falciforme
Filho
Rosaline Doença
Cardíaca
Filha
Maria Antônia Hipertensão RF
Luciana Diabetes Filha
Tatiane
Jucineia
Nenhuma
Lúpus
__________
RF
Quadro elaborado pela autora a partir dos dados coletados.
Ao observarmos a tabela acima, podemos verificar que quatro famílias apresentaram
um membro com problemas de saúde (exceto a família Tatiane), mas todas ressaltaram
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realizar acompanhamento junto a rede de saúde, pois esta é uma das condicionalidades do
Programa Bolsa Família.
Vejamos a fala da responsável da família Alessandra: (“Meu esposo faleceu da mesma
doença de meu filho de 06 anos. O médico disse não ter cura, tenho medo de perdê-lo
também. Porém ele faz acompanhamento e consegue sua medicação de graça na rede de
saúde”) (26/11/2016).
Vemos aqui o efeito do Programa Bolsa Família sobre a sobrevivência da criança está
associada às condicionalidades na saúde. Pois incluem visitas pré-natais, cuidados pós-natais
e atividades educacionais de saúde e nutrição para as mães, bem como o respeito ao
calendário de vacinação regular e de rotinas de check-up para crescimento e desenvolvimento
de crianças menores de 7 anos de idade. Já a fala da responsável da família Jucineia ressalta
a importância do benefício em sua vida: (“Tenho Lúpus, o médico falou que tem controle,
temo morrer e deixar meus filhos, mas me disseram que, na minha falta eles não perdem o
beneficio até ficarem de maior”) (23/11/2016).
O conhecimento e educação materna são alguns dos mais fortes determinantes da
saúde infantil. Porém é explícita a dependência dos entrevistados quanto a continuidade do
deferimento do benefício. Pois ao ser questionada sobre a possibilidade de pagamento de uma
previdência social não obteve-se resposta, ressaltando somente que realiza os
acompanhamentos da saúde.
Segundo Brasil (2009):
[...] Quando os beneficiários do PBF estão em uma área de cobertura do PSF, a
equipe do PSF tem que atuar formalmente, tendo a responsabilidade de oferecer
todos os serviços que estão relacionados às condicionalidade, enquanto a demanda
dos agentes comunitários de saúde devem, realizar visitas in loco domiciliares e
acompanhá-los ativamente nos cumprimentos das condicionalidades.
Após as análises das entrevistas verificou-se, que, todas as mães participantes
cumpriam a condicionalidade da saúde. Porém observou-se que o acompanhamento da
educação não possui o mesmo peso, ou seja, os cuidados com a saúde prolongam a vida,
assim, como o acesso ao beneficio, que lhes proporciona uma “significativa” segurança
financeira.
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Tabela 5. Valor do Benefício do PBF
Apesar de o conjunto de evidências até aqui apresentados, vemos que, as diferença de
valores dos benefícios são classificadas de acordo com as variáveis dos membros familiares.
De acordo com o Decreto nº 8.232, de 30 de abril de 2014, constituiu-se no reajuste de 10%
que em 1º junho de 2014, teve o aumento dos valores dos benefícios do Programa Bolsa
Família (PBF), além das linhas que se definem as situações de extrema pobreza e de pobreza.
Já o segundo aumento deu-se apartir 1º de Julho de 2016, onde o aumento médio de 9% nos
pagamentos do Bolsa Família, ou seja, a nova tabela vale para todos os tipos de benefícios,
como: Variável de 0 a 15 anos, Variável à Gestante, Variável Nutriz, Variável Jovem e
Superação da Pobreza. A fala da responsável da família Alessandra, nos remete a sensação de
estigma: (“Sou viúva e recebo somente R$116,00. Tenho conhecidas que tem marido e pega
mais dinheiro. É muito chato isso, tinha que ser só para quem realmente precisa”)
(26/11/2016). Observamos que a responsável da Família Maria Antônia está satisfeita com o
valor de seu benefício e acredita que o Programa Bolsa Família traz mais capabilidades para
sua família.
Família Valor R$ Tempo
Alessandra R$116,00 05 Anos
Rosaline R$163,00 01 Ano
Maria Antônia R$242,00 04 Anos
Luciana R$76,00 02 Anos
Tatiane
Jucineia
R$238,00
R$354,00
06 Anos
08 Anos
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Tabela 6. Motivos da Evasão Escolar
Quadro elaborado pela autora a partir dos dados coletados.
Podemos observar que diversos foram os motivos da evasão escolar das famílias
entrevistadas. Porém este fenômeno deu-se de forma mínima na instituição escolar, ou seja,
06 estudantes; porém não deixa de ser preocupante, uma vez que, o não cumprimento das
condicionalidades afeta, tanto o acesso ao conhecimento, quanto a transferência de renda.
Partindo deste contexto veremos a justificativa dada pela responsável quanto a evasão
escolar do filho de 16 anos.
Fala da família Alessandra:
“O meu filho estava bem na escola, mas começou o ajuntamento, e logo me
disseram que estava usando maconha. Ele passou a usar mais após a morte
do pai; não quis mais saber de escola e nem da família. Oro todo dia para ele
sair desta revolta” (23/11/2016).
A responsável da família Rosaline justificou a evasão escolar da filha de 15 anos:
Família
Motivo 1 Motivo 2
Alessandra Dependência
Química
Óbito na família
Rosaline Gravidez Infanto-
Juvenil
Dependência Química
Maria Antônia Exploração Sexual Dependência Química
Luciana Doença na
Família
Falta de interesse nos
Estudos
Tatiane
Jucineia
Fim de namoro
Separação dos
Pais
Dependência Química
Cumprimento de
medidas
socioeducativas
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“Parece castigo, minha começou a ficar com um malandro e começou a
matar aula. Disseram-me que estava cheirando cola. Um dia veio me contar
que estava grávida e largou os estudos”) (25/11/2016).
Enquanto a responsável da família Maria Antônia relatou que a filha de 16 anos estava:
“Era um tal, mãe vou na casa da minha amiga, até que um dia á vi descendo
de um carrão, logo vieram as roupas; dei parte na delegacia e lá descobri
que ela também usava drogas. Quase morri de desgosto. O estudo já sabe...)
(26/11/2016).
Já a responsável da família Luciana ressaltou que:
“Minha filha tem 14 anos, e descobriu a diabetes início do ano, aí ela comia doce
direto e vivia internada, até que desistiu de estudar; ano que vem vou ficar em
cima” (23/11/2016).
Para a responsável da família Tatiane, seu filho de 16 anos evadiu da escola por:
“Você sabe como é, primeiro amor, deixei namorar, que arrependimento!
Quando a fulana terminou ficou triste, começou a usar maconha. Acho que
foi para esquecer namorada e também os estudos” (25/11/2016).
E finalizamos com a justificativa da responsável da familia Jucineia que relatou ter:
“Era muita briga e separamos. Um menino de 15 anos sem o pai presente.
Se revoltou e foi roubar um casal, e a PM prendeu ele. Ficou internado na
UNEI e não quis mais estudar”. (25/11/2016).
Vimos através das falas acima descritas que estes pais negligenciaram os direitos dos
filhos, e consequentemente tiveram seu benefício bloqueado, por descumprimento da
condicionalidade da Educação.
Conforme o Art. 27. As condicionalidades do Programa Bolsa Família previstas no
art. 3º da Lei no 10.836, de 2004, representam as contrapartidas que devem ser cumpridas
pelas famílias para a manutenção dos benefícios e se destinam a: I - estimular as famílias
beneficiárias a exercer seu direito de acesso às políticas públicas de saúde, educação e
assistência social, promovendo a melhoria das condições de vida da população;
De acordo BRASIL (2014), à falta de instrução, faz crianças e adolescentes serem obrigadas
a deixar a escola para trabalhar e ajudar a família, enquanto a falta de instrução perpetua a
pobreza, pois, sem instrução e qualificação, não há como entrar no mundo do trabalho e sair
dessa condição. A exclusão econômica resulta, por sua vez, em exclusão social e política.
Partindo deste contexto ressalta-se que:
[...] Os adolescentes evadem-se das instituições escolares, pelos mais variados
motivos, pois atualmente muitos trabalham no mercado informal, ou seja,
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realizando bicos esporádicos como os serviços gerais, diaristas, entre outros para
ajudar na renda da familiar, foram reproduzindo o círculo vicioso e exclusão (Grifo
nosso).
Para Brasil (2014), pessoas negras, indígenas, pobres, mulheres etc. são grupos
socialmente considerados “minorias”. Assim como são discriminados e excluídos na escola,
isso também ocorre a tais grupos em outros âmbitos da vida social, principalmente com
relação à garantia de direitos e ao acesso a estes.
Tabela 7. Expectativas Futuras
Família RF (Responsável Familiar)
Alessandra TER ACESSO A CASA PRÓPRIA E
SOBREVIVER
Rosaline QUE OS FILHOS ESTUDEM PARA
TER SUCESSO
Maria Antônia ARRANJAR UM EMPREGO FORMAL
Luciana ENCAMINHAR OS FILHOS NA VIDA
Tatiane
Jucineia
PEGAR A CHAVE DA CASA
PRÓPRIA
REESTABELECER A SAÚDE PARA
CRIAR OS FILHOS
Quadro elaborado pela autora a partir dos dados coletados.
Ao observarmos a tabela acima, vemos que as expectativas futuras estão relacionadas
à moradia, emprego e saúde. Pois somente duas mães ressaltaram a importância de dar
continuidade nos estudos.
Brasil apud LEITE (2013, p. 139)
[...] traz outra possibilidade: a de voltarmos a ocupar nossas cidades, com nossas
crianças nas praças, nossos jovens nos parques, como os nossos bairros voltando a
ter a dimensão comunitária que os constituiu. Assim a circulação de crianças e
adolescentes pelas ruas do bairro, pelas praças, parques, museus faz com que
também os adultos comecem a olhar para estes espaços de outra forma, procurando
preservá-los, melhorá-los, para acolher esses novos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Neste trabalho obteve-se um conjunto de informações que nos permitiu maior
conhecimento a respeito do fenômeno da evasão escolar. Cada responsável familiar justificou
sua negligência por variados motivos, porém evidenciou-se a situação de violação de direitos
para com estes adolescentes.
Trabalho de Conclusão de Curso
Destacou-se em primeiro lugar a falta de escolaridade das mães entrevistadas, que não
possuem um posicionamento sobre a não continuidade do estudo no presente ano letivo. Em
segundo, foram destacadas as rendas derivadas do Programa Bolsa Família, pois ao mesmo
tempo em que as inclui, também as exclui, ou seja, transforma no comodismo de sua
realidade social, dando continuidade ao círculo de vicioso e exclusão de seus filhos. Por fim,
foram obtidas estimativas de expectativas onde duas famílias (Maria Antônio e Jucineia),
destacaram querer formar os filhos.
Acredita-se que os objetivos da pesquisa foram alcançados. Pode-se perceber que os
entrevistados possuem histórias de vida distintas; porém o que os diferencia são as
influências e os aspectos inseridos no contexto familiar. Pois, uma vez que a trajetória escolar
dos beneficiários é interrompida por aspectos de ordem econômica, social ou cultural, este
afeta a vida das pessoas simultaneamente de forma individual ou coletiva. Para que o
fenômeno da evasão escolar seja extinto é necessário desenvolver uma reflexão coletiva de
seus responsáveis através da inserção dos mesmos em grupos específicos, trabalhando sua
realidade, no intuito de criar capabilidades para mudá-la.
REFERÊNCIAS
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Diversidade e Inclusão (SECADI). Módulo Introdutório - Pobreza, desigualdades
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Justiça e Educação. Brasília, 2014. 70p.
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resistências da pobreza. Brasília, 2014. 13p.
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Trabalho de Conclusão de Curso
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