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Educação Física e Múltiplas Linguagens: Uma construção para o Saber Crítico
Dilce Maria Scandolara Cardosodilcescandolara@gmail.com 1
Christine Vargas Limacvargas@unicentro.br2
RESUMOO presente artigo tem por finalidade mostrar possibilidades de trabalhar com a disciplina Educação Física escolar, numa perspectiva crítica. Com conteúdos sistematizados pelo método dialético, prática-teoria-prática, oferecendo aos educandos uma aprendizagem significativa e relacionada aos problemas sociais, culturais e econômicos da atualidade. Também objetiva mostrar, a importância de utilizar todos os recursos/procedimentos didáticos possíveis para sensibilizar os alunos no trabalho individual ou coletivo. Ainda, ressalta possibilidades de utilizar múltiplas formas de linguagens na propulsão do conhecimento empírico para o científico, promovendo o desenvolver de ações que sugerem a resolução de problemas no meio de convívio comunitário, profissional e social.
PALAVRAS-CHAVE: Educação Física Escolar. Múltiplas Linguagens. Educação Crítica. Jogos e Brincadeiras.
ABSTRACTThis article has the purpose of showing the possibilities of working with the discipline Physical Education Instruction at school in a critical perspective. With content systematized by the dialectical method, practice-theory-practice, offering to students a meaningful learning, related with the current social, cultural and economic situation. It also has the purpose of showing the importance of using all the possible resources / educational procedures to reach students, individually or collectively, as well as forms of multiple languages in the propulsion of empirical knowledge to the scientific, besides promoting this organized knowledge aiming the resolution of problems in the community, professional and social living.
KEYWORDS: Physical Education Instruction. Multiple Languages. Critical Education. Games and Entertainment
INTRODUÇÃOO momento vivido pela disciplina de Educação Física hoje é de estudo e
resgate de um saber significativo e de qualidade no meio educacional. É
1 Graduada em Educação Física com Especialização em Educação Motora.2 Professora do Departamento de Pedagogia/Unicentro/G, Mestre em Educação-Unicamp/Unicentro, ministra a disciplina Pedagogia e Movimento: Jogos e Brincadeiras
inquestionável a necessidade de retomar conceitos e repensar a forma de dialogar
com os conteúdos, sobretudo, levando o educando a perceber a importância da
disciplina na escola e na sua formação integral. Nesta perspectiva, é imprescindível
que o professor estimule seu aluno a entender o conhecimento projetando-o, para a
realidade social que vivencia. Para Vasconcellos (1993, p. 42), “[...] o trabalho inicial
do educador é tornar o objeto em questão, objeto de conhecimento para aquele
sujeito”, ou seja, tornar aquele conteúdo significativo e pertinente ao momento vivido
pelo aluno seja no ambiente escolar ou social.
Possibilitar uma visão do conteúdo/conhecimento implica, ao professor, em
buscar fora da escola, subsídios que facilitem o entendimento das necessidades do
aluno, de conhecê-lo na totalidade e no seu meio de convivência para, então, poder
organizar metodologias que viabilizem o estudo dos conteúdos, objetivando como
produto final, um saber crítico e significativo.
Certamente, muitos devem ser os recursos e estratégias utilizados na
aplicação dos conteúdos: múltiplas formas de linguagens, recursos áudio/visuais,
textos e histórias reflexivas, materiais pedagógicos que estimulem e motivem a
participação de todos nas atividades propostas e suscitam a autonomia para
enfrentar desafios e conquistar propósitos através do conhecimento. É necessário,
também, considerar e compreender as limitações, potencialidades e individualidades
de cada educando no processo educacional, a fim de favorecer o direito a tão
almejada cidadania.
Compreender a necessidade de uma Educação Física de qualidade envolve
ações que não dependem somente do professor e do aluno, mas da comunidade
escolar como um todo, com a participação efetiva de sujeitos objetivando, com os
conteúdos da disciplina, a interdisciplinaridade. Entendemos que o conhecimento
não deve ser proposto ao aluno de forma segmentada, fragmentada, mas
concretizando a possibilidade de adentrar nas demais disciplinas do meio
educacional e estabelecer ligações, conexões, que viabilizem o entendimento das
visões de homem, mundo e sociedade.
Observando o modelo Curricular proposto pelas DCE (PARANÁ, 2008), o qual
fundamenta a Educação Física, pautada nas teorias críticas, enfocando a Cultura
Corporal e os conteúdos que a compõe, como ponto de partida para a pesquisa e
resignificação do professor e da disciplina na escola. Pesquisa porque se faz
necessário “estudar”, rever e reformular conceitos e posturas. Resignificar porque é
imprescindível devolver a ética, o respeito e a dignidade ao profissional da Educação
Física.
Para fundamentar estas questões, há que se pensar nas teorias que dão
suporte à disciplina de Educação Física e garantem sua ação pedagógica no meio
escolar. Em seus estudos Navarro (2004, p. 40) orienta que: “Dentre as principais
correntes críticas que sustentaram as discussões em Educação física a partir da
década de 90, o materialismo histórico-dialético como inspirador das teorias críticas,
destacou-se no Brasil, especialmente por ser a base que fundamentou as teorias a
cerca do conceito de Cultura Corporal”. Seguindo estes conceitos surgem duas
formas de pensar a Cultura Corporal, Navarro (2004, p. 40) “(...) a pedagogia crítico-
superadora e a pedagogia crítico-emancipatória”.
Então, ao pensar em formas de dialogar com os conteúdos da Educação
Física escolar, é questionável a importância de seguir somente uma linha teórica.
Entendemos que para ensinar com qualidade é necessário utilizar todas as
ferramentas possíveis para atingir o objetivo proposto. Em consequência, a
metodologia e as conexões que se estabelecem entre as disciplinas é que irão
fundamentar a vivência de práticas corporais significativas e caracterizar a
importância da comunicação na construção do conhecimento. Podemos então
entender que este pensar não é contraditório e sim paralelo como nos mostra Bracht
(1999 apud NAVARRO, 2004, p. 41):
Embora haja divergências, ambas as teorias, a crítico-superadora e a crítico-emancipatória, acabam por convergir para a transformação dos indivíduos e a formação de cidadãos políticos, afirmando a necessidade de superação das perspectivas que, até então, sustentavam o discurso da Educação Física na Brasil, dentre elas a ênfase no desenvolvimento de aptidões físicas e as proposições esportivas.
Embora existam diferenças entre as correntes, o que prevalece como
intenção é o conhecimento e as possibilidades de transformação que esse pode
infringir ao indivíduo. Assim, é perceptível e oportuna a necessidade de entender as
correntes teóricas como caminhos que podem inovar a prática educacional da
Educação Física escolar. Igualmente, é preciso aperfeiçoamento, adequação de
metodologias, atualização de conceitos, um “repensar” a disciplina focada em
conteúdos que suscitem esse conhecimento, de maneira a sustentar uma
aprendizagem contextualizada.
A pesquisa ainda sugere reflexões sobre a importância de sistematizar os
conteúdos da disciplina da Educação Física escolar, e da aplicabilidade das
múltiplas formas de linguagens para o entendimento destes mesmos conteúdos. Os
alunos envolvidos no projeto são crianças das séries iniciais do ensino fundamental
na cidade de Guarapuava, Paraná, e um dos objetivos do trabalho é a aprendizagem
prazerosa. Consideramos que se está falando de crianças em idade escolar, que
brincam de forma espontânea e fazem da diversão uma maneira natural de viver.
Logo, se torna prioritário, ao professor, sensibilizar as crianças para a importância de
seu corpo, sobre as várias possibilidades comunicativas que dele decorrem, as
associações que este corpo pode fazer com o conhecimento e as construções
reflexivas que pode visualizar sobre conceitos de homem, mundo e sociedade.
Para tanto, as ações foram organizadas da seguinte forma: a) apresentação
da proposta à comunidade escolar; b) conceituar os conteúdos da Cultura Corporal
com as crianças; c) vivenciar, na prática, o conteúdo Jogos e Brincadeiras; d)
análise crítica e contextualizada do conteúdo; e) realimentar a proposta com a
participação efetiva dos alunos.
Assim, faz-se necessário pontuar que todos estes elementos serão
considerados e discutidos na elaboração do presente artigo.
O PROFESSOR E A COMUNIDADE ESCOLAR – OS RECEIOS E
ESPECTATIVAS DIANTE DE UMA PROPOSTA DE MUDANÇA PEDAGÓGICA
A Educação física Escolar, segundo DCE (PARANÁ, 2008), é uma disciplina
cujo objeto de estudo é a Cultura Corporal, com conteúdos pautados em teorias
críticas, que sugerem o estabelecimento de relações entre o corpo, sua história e
sua cultura. Por analogia, sabemos que o meio está em constante transformação, e
as pessoas, em consequência, deveriam acompanhar estas mudanças. Para a
comunidade escolar a lógica seria a mesma se os envolvidos, em sua formação
profissional, fossem preparados para acompanhar este processo de
transformação/inovação e se estes mesmos profissionais fossem valorizados e
remunerados de forma justa e que a formação e atualização fossem contínuas com
metas e propósitos a alcançar.
Quisera que o ser humano, no meio educacional ou não, fosse capaz de
perceber a necessidade de transformar/inovar, de estabelecer um dialogo entre as
concepções/paradigmas que permeiam os períodos históricos e determinar um novo
olhar frente às possibilidades apresentadas pelo mundo moderno. As mudanças
nem sempre são naturais, mas precisam acontecer, elas alteram todo um contexto,
e levam as pessoas envolvidas a adaptar-se, sair da rotina, se comunicar e
dinamizar suas ações frente a esta evolução. É um movimento em cadeia, que
independe de nossa vontade. Isso incomoda, leva ao caos gera pânico, causa atrito,
mas, às vezes maravilhosamente pode levar ao crescimento pessoal, a aceitação da
importância de se permitir inovar.
Toda a apresentação de uma proposta educacional diferente sugere a
possibilidade de transformações no ambiente escolar, na convivência com as
pessoas e na forma de ver e entender os fatos e situações que compõem este meio.
O presente projeto se fundamenta na importância de analisar os conteúdos, rever
conceitos e visualizá-los segundo uma perspectiva crítica, que leve o aluno a
questionar, a dialogar com o conhecimento. Os conteúdos da Cultura Corporal são
divididos em: dança, jogos e brincadeiras, esportes, ginástica e lutas. Relembramos
que um dos objetivos da proposta é aprender brincando, considerando que, para a
criança, tudo que se aprende brincando é de maior relevância para o aprendiz, e se,
acrescentar-mos, segundo Carmem et. al. (1992), o lúdico, o artístico, o agonístico e
o estético a estas atividades, obteremos de forma significativa uma aprendizagem
integral, onde o conhecimento parte de experiências vividas, é problematizado e
reflete no social como uma ação contextualizada.
A ação de aprender brincando será mais eficiente e significativa, se a
comunidade escolar como um todo, participar ativamente do processo educacional.
Com a intenção de conhecermos um pouco da realidade escolar, realizamos alguns
questionamentos na escola, buscando proposta de trabalho,
pressupostos/concepções, teorias que a fundamentam e como são direcionadas
suas ações com professores e equipe pedagógica. Também, coletamos informações
com pais e alunos acerca das dificuldades enfrentadas no meio escolar, bem como
conceitos adquiridos através da convivência familiar e comunitária. Todo este
conjunto de informações visa entender como a escola processa o conhecimento
científico e como os alunos absorvem e entendem a aplicabilidade deste mesmo
conhecimento, elaborado e significativo.
O reconhecimento da turma, suas dificuldades, seu entrosamento, seu
conhecimento espontâneo, a história e os relatos de vida dos alunos, o meio onde
vivem, suas aspirações e necessidades trazem subsídios para a proposição e
organização das atividades e em consequência a projeção de resultados, levando
em consideração as peculiaridades de cada criança na execução e participação nas
ações. Como esclarece Vasconcellos, a respeito de conhecer os alunos e suas
individualidades: “Conhecer a realidade dos educandos implica em fazer um
mapeamento, um levantamento das representações do conhecimento dos alunos
sobre o tema de estudo. A mobilização é o momento de solicitar a visão/concepção
que os alunos têm a respeito do objeto (senso comum, “síncrese”)
[VASCONCELLOS, 1993, p. 48].
Em conformidade a esse “pensar”, é importante analisar, as mudanças e o
desenvolvimento corporal das crianças que, geralmente, segue sua idade
cronológica e mental. Consequentemente, no período das séries iniciais do ensino
fundamental, encontram-se em fase de descobertas, de auto-conhecimento, seus
sentidos aguçados, seu corpo começando a se modificar, sua sexualidade lhe
proporcionando sensações diferentes e ao mesmo tempo assustadoras, exigindo do
professor a observação, a avaliação, e reavaliação, na organização de seu trabalho,
levando em consideração fatores, que às vezes bloqueiam possibilidades e
manifestações corporais da criança e do grupo no coletivo e que interferem na
aprendizagem.
Percebemos, ainda, que a criança chega à escola com dificuldades de leitura
e interpretação das diversas linguagens e formas de comunicação do meio
educacional e, especificamente, as linguagens da Cultura corporal. Estas
dificuldades, somadas às transformações que estão ocorrendo no seu corpo, podem
interferir de forma significativa nas ações da criança no meio escolar. Nesse sentido,
trabalhar com práticas corporais que instigam a comunicação, o falar, o dramatizar,
a dança e outras formas de se expressar, geralmente causam constrangimento,
inibições e até certo preconceito por parte de alguns alunos. Por outro lado, cabe ao
professor identificar, orientar ou encaminhar a criança, no sentido de sanar estas
dificuldades, sendo elas pedagógicas, psicológicas ou emocionais.
É importante salientar que o aluno quando chega à escola, traz consigo uma
vivência familiar e social que o individualiza no coletivo, por sua historicidade
cultural. Itens que devem ser considerados durante o planejamento e organização
do saber pedagógico, e que sugerem a utilização de múltiplas linguagens e recursos
para alcançar o objetivo proposto. Portanto, torna-se indispensável a realização de
atividades diferenciadas que estimulem a participação de todos e propiciem a
utilização e adequação de metodologias no desenvolver do conteúdo, seja ele da
disciplina de Educação Física ou na correlação com as demais disciplinas
curriculares.
Para entender as dificuldades que a escola enfrenta e estimular o interesse
dos alunos pelo saber é importante o repensar, a pluralidade de ideias pedagógicas,
o diálogo, a troca de informações entre a escola e a comunidade. É dessa/nessa
comunicação que surge a necessidade de novas práticas, novas metodologias, de
dinamizar a aplicação dos conteúdos escolares, de olhar para os anseios da família,
de perceber as necessidades da comunidade, de entender este novo mundo do
trabalho e, então, direcionar este saber pedagógico objetivando suprir possíveis
dificuldades que aluno venha a enfrentar ao adentrar nesta sociedade que se
sustenta pelo capital e faz desse sua necessidade para sobreviver.
CONCEITUANDO A EDUCAÇÃO FÍSICA NUMA PROPOSTA CRÍTICA
Para conceituar os conteúdos da Educação física numa proposta crítica é
imprescindível entender a proposta da “Cultura Corporal” e as possíveis relações a
serem estabelecidas entre os conteúdos científicos da disciplina na escola, o
conhecimento empírico do aluno e as necessidades cognitivas exigidas para o
desempenho profissional e social. É preciso considerar a forma individual de cada
ser humano “ver” e entender os relacionamentos, seu tempo e seu espaço de
percepção de mundo e de sociedade.
É preciso sensibilidade para vislumbrar no aluno, e principalmente nas
crianças, o olhar ingênuo e ao mesmo tempo astuto, com fome de conhecer, de
saber como tudo funciona, como as pessoas se relacionam cada uma no seu
mundo, às vezes imaginário, fantasioso. Também é importante estar atento ao fato,
que muitos de nossos alunos, infelizmente, presenciam e vivem no mundo dos
excluídos, da escuridão, do medo, da violência, dos abusos. E as famílias nem
sempre são estruturadas, os pais não priorizam pela educação de seus filhos, não
estão atentos às suas necessidades físicas e emocionais e nem possibilitam
condições para que cheguem à escola em condições de aprender. Este conjunto de
fatores permeia todo um trabalho coletivo, onde o aluno adentra a escola com
conceitos formulados através de sua vivência familiar e de conhecimentos já
adquiridos de maneira empírica, muitas vezes, sendo difícil fazê-lo entender que
estes conceitos não são uma verdade absoluta, e que a escola pode contribuir no
sentido de organizar e conectar aquilo que ele já sabe com aquilo que ainda irá
aprender. Para Vygotsky, sempre existe um início que vem antes da escola e assim
afirma:
Em essência a escola nunca começa no vazio. Toda aprendizagem com que a criança depara na escola sempre tem uma pré-história. Por exemplo, a criança começa a estudar aritmética na escola. Entretanto, muito antes de ingressar na escola já tem certa experiência no que se refere à quantidades: já teve oportunidade de realizar essa ou aquela operação, de dividir, de determinar a grandeza, de somar e diminuir [...] a aprendizagem escolar nunca começa no vazio mas sempre se baseia em determinado estágio de desenvolvimento, percorrido pela criança antes de ingressar na escola [ VYGOTSKY, 2001b, p. 476].
Neste sentido, é dever do professor mostrar que existem formas, pontes de
ligação entre o conhecimento formalizado pela história da criança e o científico
formalizado pela escola e dar significado a estas formulações oportunizando a
aprendizagem.
Quando estabelecemos diálogo com o conhecimento, estamos estimulando
questionamentos, instigando para a construção do saber crítico, para o
entendimento da importância de “relacionar”, criar pontes, entre os conteúdos das
disciplinas no meio escolar. É primordial o desenvolvimento da comunicação no
processo de aprendizagem. Para aprender e para conceituar precisamos nos utilizar
de linguagens, falada, escrita, dramatizada, com o corpo e através do corpo. No
decorrer deste processo muitas dificuldades se apresentarão, muitos “problemas”
terão que ser solucionados e cabe ao professor proporcionar os “instrumentos”,
ferramentas necessários aos alunos para que busquem possibilidades para a
formação do saber significativo. O que fundamenta e viabiliza a solução do
problema através do conhecimento, é este “saber” elaborado, produzido e
construído pelo aluno.
A aprendizagem através dos conteúdos sistematizados orienta para a
problematização, para questionamentos, com a intenção de gerar “embates”,
conflitos de ideias, com o propósito de inovar no ser humano a forma de “ver”, e
entender os conteúdos da disciplina de Educação Física escolar, ainda que seja
capaz de perceber e superar as dificuldades que se apresentarem no seu convívio
social.
Continuamos a ressaltar sobre a importância da comunicação no
desenvolvimento pedagógico e corporal da criança e na sua percepção frente às
ações no coletivo. Para Kunz (2004, p. 41) “As crianças, especialmente, comunicam-
se muito pelo seu se-movimentar, pela linguagem do movimento”. Continua ainda:
“Saber se comunicar e entender a comunicação dos outros é um processo reflexivo
e desencadeia iniciativas do pensamento crítico”. Desta forma, utilizar metodologias
que auxiliem no processo de aprender a comunicar-se pode estar estimulando o
aluno ao pensar crítico, acerca de leitura e interpretação do ambiente escolar e
social de forma mais significativa e menos assustadora.
Kunz (2004, p. 37) ainda chama atenção: “Na Educação física a tematização
da linguagem, enquanto categoria de ensino ganha importância maior, pois não só a
linguagem verbal ganha expressão, mas todo o ser corporal do sujeito se torna
linguagem, a linguagem do se-movimentar enquanto diálogo com o mundo”. Neste
diálogo com o mundo podemos entender as possíveis relações sociais, políticas e
econômicas e a compreensão da importância e significado destas, para poder
vislumbrar o mundo projetado e transformado pela ação do conhecimento.
No contexto Educacional, o papel da escola não está na reprodução de
conteúdos para a resolução de problemas apresentados na atualidade, mas sim na
construção processual do conhecimento, capacitando o aluno em buscar possíveis
alternativas para a resolução dos problemas que surgirem no seu cotidiano. Em
consequência, assinalamos a importância da comunicação, na abordagem das
linguagens corporais a serem contracenadas no processo ensino aprendizagem,
linguagens estas, como as atividades lúdicas e musicais, contação, reprodução e
produção de histórias, as dramatizações, a expressão e interpretação corporal, os
movimentos espontâneos e técnicos do esporte. Neste sentido a comunicação
instiga e auxilia no conceituar e dar significado aos conteúdos da Educação Física,
onde o movimento humano é pensado segundo uma perspectiva histórico-crítica
partindo da prática social, problematização, instrumentalização, catarse e retorno à
prática social. Sistematizar estes conteúdos nada mais é do que potencializar e
viabilizar o trabalho com a Cultura corporal de forma crítica e espiralada, onde os
determinantes sociais são entendidos pelos alunos em consonância com os
conteúdos, levando em consideração, também, os conceitos de cultura e trabalho
para a sociedade a qual se apresenta.
O saber comunicar-se leva a criança a vivenciar situações do passado,
presente ou futuro, a aprender a ouvir, imaginar, sonhar, transcender. No âmbito
Educacional, e especificamente, no ensino da Cultura Corporal, a comunicação, vem
a auxiliar o educando a perceber-se como ser corpóreo capaz de através das
múltiplas formas de linguagens, interagir dialeticamente no social com criticidade.
VIVÊNCIA PRÁTICA E CONTEXTUALIZADA DO CONTEÚDO JOGOS E
BRINCADEIRAS
Desde o princípio dos tempos, o homem realiza a prática de exercícios
físicos, estimulado por necessidades naturais e de sobrevivência. Com o passar dos
períodos históricos estes estímulos e necessidades vão se modificando para atender
as mudanças que ocorrem com o meio natural e estrutural dos seres humanos, ou
seja, somos impulsionados a evoluir, para nos mantermos no topo da cadeia
alimentar, como único ser capaz de aprender e fazer analogias. Segundo Carmem
et. al. (1992) as práticas pedagógicas surgem das necessidades concretas do meio
social, ao qual está inserida determinada comunidade, num determinado período
histórico e cultural. Entendemos que esta vivência nada mais é do que a forma
natural das pessoas viverem em comunidade seguindo seus próprios padrões de
comportamento e religiosidade, estes saberes são incorporados pelas crianças que
os transformam em hábitos e os cultuam como verdades absolutas no meio familiar
e comunitário.
A Educação Física como disciplina, no princípio segue modelos vindos da
Europa, com práticas excludentes e desvinculadas a realidade brasileira. Passamos
por muitas escolas literárias, modelos políticos e educacionais para chegarmos aos
tempos modernos. Hoje, a Educação Física escolar se sustenta pelo estudo dos
conteúdos da Cultura Corporal. Carmem et. al. (1992, p. 62.), demonstra que os
conteúdos: “apreender a expressão corporal como linguagem”. Os gestos,
movimentos e expressões traduzem formas de falar, de escrever, de dramatizar,
enfim, a comunicação corporal, ou seja, o saber empírico e científico nas
transformações sociais.
Compreender a Educação Física escolar, nesta perspectiva, implica segundo
Paraná (2008), em levantar questionamentos sobre o ser humano, sua vivência
histórica, suas relações socioculturais, políticas e com o mundo do trabalho. Fica
fácil entender que não há possibilidades de significar as práticas corporais sem
estabelecer formas de interligação entre o ser humano, a natureza e os meios
sociais.
Assim, voltamos a ressaltar a importância da comunicação no
estabelecimento de relações entre o saber e o meio. Para Habermas (1981, p. 65), o
único atributo que pode nos diferenciar dos outros animais é a capacidade
comunicativa, assim: “o que nos eleva acima da natureza é a única coisa que
podemos conhecer de acordo com sua própria natureza: a linguagem. Através de
sua estrutura coloca-se para nos a maioridade.” A linguagem, a comunicação pode
ser o elo que nos possibilita a vivência das práticas corporais, apresentadas como
Jogos e Brincadeiras, tornando atividades, que são formais na escola, em
brincadeiras atrativas que estimulem os alunos ao aprender e entender os
conteúdos através das brincadeiras.
Existem muitas formas de comunicação, a linguagem falada, escrita,
dramatizada e outras. Todas diretamente ligadas à estrutura e formação do ser
humano. Para Jobim e Souza (1997, p. 21) “É na linguagem, e por meio dela, que
construímos a leitura da vida e de nossa própria história”. É no contar história, na
dramatização e na escrita, que construímos no coletivo a história, que começamos a
entender sobre sociedade, sobre capital e sobre trabalho e a influência destes
conceitos na compreensão da realidade que é o objetivo da significação dos
conteúdos no processo de aprendizagem do aluno.
No passado era comum para as crianças lembrar-se de seus avós, as
pessoas mais velhas da família, por suas narrativas cheias de suspense, de magia.
A família se reunia para ouvir histórias, discutir situações corriqueiras, passar
informações, conhecimento de geração em geração, o sentido grupal era natural e
incitava a troca de experiências com alegria e sabedoria. No decorrer dos tempos, a
estrutura familiar e social se modificou, na ânsia de conciliar os afazeres domésticos
com as atribuições profissionais, os relacionamentos entre as pessoas e o meio
sofrem rupturas, que refletem nas ações e no comportamento dos seres. Nossas
crianças não sabem brincar no coletivo, seus gestos e movimentos são
estereotipados, advindos de meios tecnológicos ou brinquedos eletrônicos. Também
possuem vícios posturais e sofrem com a obesidade, seus relacionamentos muitas
vezes são egoístas e buscam nas práticas corporais somente a competição.
A vivência da prática dos Jogos e Brincadeiras também se dá pelas
manifestações naturais da criança, tanto no individual como no coletivo, todos os
seus movimentos demonstram sua espontaneidade, sua criatividade nas formas
lúdicas de brincar. São momentos únicos, em que todos são iguais, sem diferenças,
assexuadas, sem preconceito de cor, raça ou etnia. A prioridade é a diversão, o
prazer pelo fazer, sem muitas regras, sem muitas dificuldades, a organização
depende de cada um, respeitando seu espaço e tempo. Esse brincar se dá na
informalidade, nas brincadeiras de rua, no fundo de quintal, nas visitas aos amigos.
Já na escola o brincar nem sempre acontece de maneira tão espontânea, e a
diversão não é mais vista como objetivo único, os grupos não são escolhidos por
afinidade ou por amizade, o ambiente é diferente e a principal dificuldade é a
participação de um adulto, que, ao interferir, pode quebrar o encanto ou conduzir
para o sucesso escolar.
O universo de uma criança ao brincar ou jogar, é tão maravilhoso e particular
que, intervir ou interromper esta ação natural, nos dá a devida noção do quanto de
poder o professor tem nas mãos, o quanto pode prejudicar o aluno em sua formação
se seus objetivos, suas metodologias, seus recursos não estiverem claros e
organizados no momento de aplicar determinado conteúdo. O saber pedagógico
para ser construído de forma significativa deve levar em consideração todos os
fatores relacionados acima e proporcionar ao aluno a possibilidade de aprender
brincando.
Para Kunz (2004, p. 37) “trata-se da interação social que acontece em todo
processo coletivo de ensinar e aprender, mas que deve ser tematizada enquanto
objetivo educacional que valoriza o trabalho coletivo de forma responsável,
cooperativa e participativa.” Além disso, a “interação social”, citada pelo autor
anteriormente, pode com um trabalho cooperativo resgatar saberes e valores que
foram transformados pelo tempo numa ótica de mundo tecnológico e capitalista.
Já Escobar (1995) estabelece formas de comunicação com significado e
sentido lúdico, e o que constitui a materialidade corporal do ser humano. É
importante trabalhar com a criança a vivência de práticas corporais a partir de uma
intervenção lúdica, de resgate a fantasia, de possibilidades simbólicas, de
construção do conhecimento no coletivo, pautado no princípio da dialética, do
cooperar e interagir. Respeitando sempre as características individuais da criança.
O CONTEÚDO SISTEMATIZADO E CRÍTICO – POSSIBILIDADES
ENTRAVES
Pensar em conteúdos sistematizados e críticos na disciplina de Educação
Física escolar nos remete a uma análise sobre o que é sistematizar como
fundamento básico, sobre o que são teorias críticas e o que sugerem em sua
fundamentação. Também, sobre possibilidades de trabalho com conteúdo
sistematizado no ambiente escolar levando em consideração toda a estrutura
pedagógica e curricular da escola.
Para entendermos a escola é necessário conhecermos seu Projeto Político
Pedagógico no qual deve conter informações acerca do ambiente escolar e de sua
comunidade. Segundo Carmem et. al. (1992, p. 25) “um projeto político-pedagógico
representa uma intenção, ação deliberada, estratégia. É político porque expressa
uma intervenção em determinada direção e é pedagógico porque realiza uma
reflexão sobre a ação dos homens na realidade explicando suas determinações.”
Logo, não é possível organizar um trabalho pedagógico na escola de maneira
isolada, sem conhecer os alicerces que sustentam a entidade, as teorias que
fundamentam e direcionam as disciplinas, sem priorizar e alinhar objetivos e metas
com a comunidade escolar.
É fundamental para a disciplina da Educação Física escolar, significar práticas
pedagógicas e sistematizar seus conteúdos através de vivências corporais, para
tanto é necessário estabelecer conexões entre o conhecimento empírico da criança
e científico do meio educacional. Percebemos que estas conexões acontecem,
quando o aluno, nos devolve uma resposta modificada, refletida, frente à
problemática apresentada pelo conteúdo. Para Leontiev (1981), isto não acontece
pela vontade do homem, mas pelas relações que este estabelece na sua esfera de
comunicações reais. Ainda, Ausebel (1978, p. 159) caracteriza: “a aprendizagem
significativa acontece quando uma informação nova é adquirida e o aprendiz se
esforça para ligar esta informação a conceitos preexistentes em sua formação
cognitiva”
Comunicação esta que demonstra existir ligações entre os conhecimentos
das diversas disciplinas e, também, com o empirismo de cada um. Estas ligações
levam o aluno a questionar sobre a importância do “saber” significativo, para atender
a seus interesses na sua formação como indivíduo, como ser social e profissional.
O corpo, para a Educação Física escolar, no desenvolver de suas práticas
pedagógicas, é o ponto de partida de todas as formas de comunicação, portanto é o
centro de possibilidades linguísticas no qual a Cultura Corporal faz parte. Afirma
Kunz (2004, p. 41) que: “é pelo pensar e falar, enquanto competência comunicativa,
que as estruturas para as interações humanas bem-sucedidas se estabelecem”.
Pode-se pensar, então, que estas interações humanas no ambiente
educacional, podem auxiliar na visualização de elementos simbólicos que garantem
a criança à possibilidade de estabelecer conexões entre o mundo real vivido e o
mundo projetado e sonhado. Vygotsky (1989 apud CANDAU, 2002, p. 139), sob o
mesmo ponto de vista, argumenta, “a cultura fornece os sistemas simbólicos de
representação e suas significações, que se convertem em organizadores do
pensamento, ou seja, em instrumentos aptos para representar a realidade.” Este
organizar o pensamento, sugere que a criança pode estar fazendo relações com seu
conhecimento vivido e os que se apresentam no meio escolar, bem como, estar
inter-relacionando com as demais disciplinas que tomam forma no ensino seriado, e
que, talvez, não esteja sendo vivenciado no meio escolar de forma a possibilitar para
a criança esta apropriação, com este sentido e significado.
Para Kuenzer (2002, p. 139) “é de fundamental importância para a escola
reconhecer que a relação entre o homem e o conhecimento se dá através da
mediação da linguagem, em suas múltiplas formas de manifestação, a língua, a
matemática, as artes, a informática, a linguagem do corpo.” Estes elementos
permitem adentrar em temas relacionados a outras áreas do conhecimento, e
somar, na busca pela resolução de problemas, de forma interdisciplinar. Esta
pesquisa sugere significar os conteúdos da Cultura Corporal através das múltiplas
formas de linguagens, também o entendimento pelo aluno de que o conhecimento
não se constrói de fragmentos, mas de um todo sistematizado em forma de
conteúdos e em movimento, unindo-se para simbolizar o ambiente educacional e o
processo ensino aprendizagem.
Possibilitar a vivência prática dos Jogos e Brincadeiras na escola, sob uma
abordagem crítica, deve possibilitar ao professor adequar o conteúdo ao
desenvolvimento motor e intelectual da criança, respeitando suas etapas,
valorizando sua individualidade e capacidade de superação diante das dificuldades.
Para Vygotsky (2001ª, p.336), a criança está sempre se superando para alcançar a
escola:
Quando observamos o curso do desenvolvimento da criança na idade escolar e o processo de sua aprendizagem, vemos efetivamente que toda matéria de ensino exige da criança mais do que ela pode dar hoje, ou seja, na escola a criança desenvolve uma atividade que a obriga a colocar-se acima de si mesma.
Sob este ponto de vista, é preciso entender que criança precisa ser criança,
aprender como criança e agir como criança. Nas atribulações do mundo do trabalho,
esquecemos o que é ser criança e tratamos nossos pequenos como se fossem
adultos, muitas vezes delegamos a eles funções de muita responsabilidade, a qual
não estão preparados emocionalmente e psicologicamente para responder. Os
Jogos e Brincadeiras na escola devem ser vivenciados de forma a proporcionar
prazer e alegria, sem a obrigatoriedade de vencer, de executar o movimento
perfeito, de ser o melhor. A participação coletiva sugere o lúdico e o
restabelecimento do movimento adequado às possibilidades reais de execução da
criança, no qual o conhecimento é construído em consequência de toda uma ação
pedagógica no ambiente educacional.
CONSIDERAÇÕES FINAIS: ANÁLISE E REALIMENTAÇÃO DA
PROPOSTA
Consideramos que avaliar faz parte do processo educacional, que tem por
finalidade a análise, a reflexão e a reformulação de ações pedagógicas, que podem
ou não, ter sido significativas num determinado contexto histórico e social.
Ao propor uma prática pedagógica diferenciada, é fato, esta se apresentar
impregnada de conceitos, objetivos, metodologias e estratégias particulares e
congruentes no pensar de seu propositor, bem como, caracterizar o envolvimento
afetivo frente ao objeto de estudo. Como consequência, os dizeres que seguirão
podem não ser verdades absolutas, mas para o momento vivido fizeram “jus” a
muitas das indagações que angustiavam e limitavam o papel do professor e da
disciplina Educação Física na escola.
Logo, o momento pede relatos e entraves que se sucederam no
desenvolvimento das ações durante a aplicação do projeto.
Primeiramente posiciono os alunos, habituados a vivenciar práticas
pedagógicas fragmentadas e desconectadas de valores simbólicos e críticos. Sua
única relação entre Educação Física e escola se materializava pelos conceitos de
“bola e quadra” para os meninos, e “qualquer material/qualquer espaço” para as
meninas. O conhecimento pautado na maioria das vezes no “saber jogar futebol” e
somente futebol, o papel do professor, como “aquele que melhor ensina a jogar
futebol”, com ressalvas, “sem teoria”. Então, para desmistificar estas práticas e
orientar para um novo olhar, uma nova Educação Física na escola, nada mais
correto que o método dialético. Como diz Gasparin (2007, p. 153): [...] “três grandes
passos do método dialético de construção do conhecimento: prática-teoria-prática”.
Então esse foi o ponto de partida para o trabalho com os conteúdos, relacionando-os
aos problemas vividos no cotidiano e no social, sempre mostrando a prática
intimamente atrelada à teoria e vice-versa, e que para entender os conteúdos da
Educação Física escolar de forma significativa é imprescindível estar relacionando,
associando, interligando estes conteúdos com a prática social. No início, pouca
receptividade, muitos alunos não querendo participar, principalmente os meninos.
Assim, com persistência , atividades dinâmicas e criativas o conteúdo Jogos
e Brincadeiras começou a tomar forma e ter significado para os alunos. Nem tudo foi
maravilhoso, houve a necessidade de realimentar a proposta a todo o momento,
considerando erros, acertos e novas possibilidades de errar e acertar. A prática e a
teoria marcaram um caminhar juntas no desenvolvimento dos conteúdos da
Educação Física escolar durante a aplicação do projeto, dialogando com o aluno de
maneira a fazê-lo vislumbrar o conhecimento efetivo que leva a ação/transformação
no social.
Em síntese, Vasconcellos (1993, p. 81), assinala que:
A unidade indissolúvel teoria-prática se dá na prática e, portanto, o processo de conhecimento não está completo enquanto não houver a atividade prática relativa ao elemento teórico em questão, ou seja, entendemos que o conhecimento efetivo só se realiza quando da prática relativa a ele. Um conhecimento, para levar à ação, deve ser carregado de significado (compreensão) e de afetividade (envolvimento emocional). Desta forma entendemos que o trabalho com o conhecimento deve estar articulado com a realidade no sentido de sua transformação.
Nesse sentido, toda prática sugere uma teoria e esta deve orientar para possíveis
transformações sociais, proporcionando autonomia ao ser na forma de agir, pensar e
expressar o saber elaborado, já impregnado de particularidades e que caracterizam
o ser humano como único. Neste momento a realização pessoal foi imensa diante da
vivência dos alunos na aula, com participação e sentido de cooperação mostrando
através de suas ações que aquele conteúdo foi significativo e essa nova forma de
trabalho com a Educação Física é muito mais prazerosa.
Para o professor, também é difícil “mudar” sua forma de trabalhar, como já
discutimos anteriormente, e perceber seu aluno como ser humano único, em meio a
um grupo de trinta/quarenta alunos, se torna uma meta quase impossível. Elaborar
atividades adequadas e pertinentes ao conteúdo, aplicar as mesmas em locais
inadequados e sem material suficiente, torná-las prazerosas e oportunas no
individual ou no coletivo, estar o tempo todo atento e apto a corrigir, intervir,
reencaminhar ou recomeçar com outro objetivo. Muitos são os entraves para um
trabalho de qualidade, alguns foram identificados na elaboração e desenvolvimento
do projeto, e, pontuados/partilhados com a comunidade escolar, este diálogo
estabelece relações de intenção/aproximação e possibilita a conquista de parceiros
para o repensar das práticas pedagógicas.
Também gera questionamentos comuns a todas as disciplinas, relacionados à
fundamentação teórica, metodologias, avaliação, ou mesmo, atividades simples do
cotidiano. Esta troca de experiências entre os professores, no momento de elaborar
ou aplicar um projeto diferenciado, é muito importante e pertinente ao crescimento
coletivo da escola. Principalmente quando a proposta está embasada em teorias
críticas do conhecimento. Gasparin (2007, p. 154), explica que: “os professores não
possuem muita clareza de como proceder na aplicação dessa proposta didático-
pedagógica em sua prática docente cotidiana. Têm grande dificuldade em planejar
sua ação seguindo os cinco passos3”. Comprovadamente isso aconteceu, no
decorrer da aplicação do projeto, no entanto, como observado acima, os parceiros
estavam sempre prontos a dialogar, rever e auxiliar na construção de novas
possibilidades de vivenciar o conteúdo.
É imprescindível para o profissional de a Educação Física ter a certeza de
seus objetivos e conhecer o método que está utilizando, respeitar seu aluno nas
individualidades e no coletivo, ser coerente e justo nas suas avaliações, não ter
medo de errar e no seu caminhar conquistar muitos parceiros.
Deve, também, atrelar aos seus objetivos, os da escola, estando atento às
necessidades e limitações do aluno e aos anseios da comunidade. Ser consciente
desta totalidade é fazer a diferença no processo ensino/aprendizagem. Olhar para o
todo e enxergar as individualidades, estar sensível para ensinar e avaliar deferente.
Entender que a aprendizagem nada mais é do que a resposta do aluno já
modificada, diante daquilo que foi ensinado, e que, este conhecimento já elaborado
está em constante transformação, sempre passível a novas contribuições. É
3 - Os cinco passos se referem à forma que GASPARIN propõe para se trabalhar com os conteúdos numa perspectiva histórico-crítica, que são prática social, problematização, instrumentalização, catarse e volta a prática social.
importante avaliar ao final do processo, não objetivando somente mensurar, medir o
conhecimento elaborado, mas como diz Carmem et. al. (1992, p. 98):
[...] é muito mais do que simplesmente aplicar testes, levantar medidas, selecionar e classificar alunos. E para compreender isso é necessário considerar que a avaliação do processo ensino-aprendiagem está relacionada ao projeto pedagógico da escola, está determinada também pelo processo de trabalho pedagógico, processo inter-relacionado dialeticamente com tudo o que a escola assume, corporifica, modifica e reproduz e que é próprio do modo de produção da vida em uma sociedade capitalista, dependente e periférica.
Portanto, é plausível considerar as ações de ensinar e avaliar como um
processo que acontece em conformidade, sendo significativas quando o conteúdo é
planejado e organizado objetivando o conhecimento contextualizado. Nesta
perspectiva situo a Educação Física escolar, com conteúdos da Cultura Corporal,
sistematizados e orientados por teorias críticas, como mais uma forma de dialogar
com o conhecimento em meio a tantas mudanças pedagógicas a qual nos
sujeitamos nos últimos tempos. É demagogo afirmar que esta seja a maneira
correta, ou que seja a única, ou então, que outras não irão surgir, mas depende do
professor conhecer e dialogar com estas teorias, e encontrar formas de levar o aluno
a este tão almejado “saber crítico”, a esta construção do conhecimento que
desencadeia para possíveis transformações sociais.
Finalizando o presente artigo, deixo o alerta para a importância do professor
em utilizar múltiplas formas de linguagens, estratégias e recursos educacionais, na
tentativa de atingir seu objetivo na proposição de seus conteúdos. Também, chamo
a atenção para as inúmeras dificuldades que o aluno apresenta para relacionar este
conhecimento científico com o conhecimento empírico, utilizado no seu cotidiano.
Ainda complemento que os dados resultantes da aplicação do projeto demonstram
que a escola não está preparada para trabalhar com esta realidade, e que os
educandos possuem muitas dificuldades para entender as disciplinas escolares, e as
relações que estabelecem com o conhecimento. Cada uma com suas
especificidades, mas que no processo ensino aprendizagem, devem resultar com o
sucesso escolar do aluno. Salientamos, também, que as práticas pedagógicas
possuem uma intenção e nem sempre conseguem atingir seus objetivos por
influência de vários fatores: históricos, econômicos, culturais e sociais, mas que não
podem ser desconsiderados no momento de projetar e avaliar.
Observamos que precisa haver harmonia no ambiente educacional, escola/
comunidade e professor/aluno, caminhando para os mesmos fins. Objetivando as,
mesmas metas, talvez em tempos ou períodos diferentes, mas sabedores das
necessidades, das dificuldades e dos anseios que permeiam a educação nos dias
de hoje, e que é possível articular um saber pedagógico contextualizado e coerente
com as necessidades de transformação exigidas pela sociedade.
Ousar, inovar, buscar no diferente a prática pedagógica significativa, devolve
ao profissional da Educação Física escolar a “priori” como Educador, a escola o
sabor de partilhar com a sociedade um ser humano capaz de transformar e ao aluno
a “alegria” de “estar” na Escola e aprender com significado.
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