Post on 23-Nov-2015
HISTRIA DAS RELAES PBLICAS: FRAGMENTOS DA MEMRIA DE UMA REA
Pontifcia Universidade Catlica do Rio Grande do Sul
Chanceler: Dom Dadeus Grings
Reitor:
Joaquim Clotet
Vice-Reitor: Evilzio Teixeira
Conselho Editorial:
Alice Therezinha Campos Moreira Ana Maria Tramunt Ibaos Antnio Carlos Hohlfeldt
Draiton Gonzaga de Souza Francisco Ricardo Rdiger Gilberto Keller de Andrade Jaderson Costa da Costa
Jernimo Carlos Santos Braga Jorge Campos da Costa
Jorge Luis Nicolas Audy (Presidente) Jos Antnio Poli de Figueiredo
Lauro Kopper Filho Lcia Maria Martins Giraffa
Maria Eunice Moreira Maria Helena Menna B. Abraho
Ney Laert Vilar Calazans Ren Ernaini Gertz
Ricardo Timm de Souza Ruth Maria Chitt Gauer
EDIPUCRS: Jernimo Carlos Santos Braga Diretor Jorge Campos da Costa Editor-chefe
Cludia Peixoto de Moura
Organizadora
HISTRIA DAS RELAES PBLICAS: FRAGMENTOS DA MEMRIA DE UMA REA
PORTO ALEGRE
2008
EDIPUCRS, 2008 Capa: Vincius de Almeida Xavier Diagramao: Gabriela Viale Pereira Reviso Lingstica: Daniela Origem e Grasielly Hanke Angeli
Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)
H673 Histria das relaes pblicas : fragmentos da memria de uma rea [recurso eletrnico] / Cludia Peixoto de Moura (Org.) Porto Alegre : EDIPUCRS, 2008.
700 p.
Sistema requerido: Adobe Acrobat Reader Modo de Acesso: World Wide Web:
ISBN 978-85-7430-749-7 (on-line)
1. Relaes Pblicas Histria. 2. Comunicao Social Brasil. I. Moura, Cludia Peixoto de.
CDD 659.2
Ficha Catalogrfica elaborada pelo
Setor de Tratamento da Informao da BC-PUCRS
Av. Ipiranga, 6681 - Prdio 33 Caixa Postal 1429
90619-900 Porto Alegre, RS - BRASIL Fone/Fax: (51) 3320-3523 E-mail: edipucrs@pucrs.br
http://www.pucrs.br/edipucrs
SIGLAS ADOTADAS
CNPq Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico
CONFERP - Conselho Federal de Profissionais de Relaes Pblicas
EBAP - Escola Brasileira de Administrao Pblica
ECA/USP - Escola de Comunicaes e Artes da Universidade de So Paulo
FACCAT - Faculdades Integradas de Taquara
FAPERGS - Fundao de Amparo Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul
FEE - Fundao de Economia e Estatstica
FEEVALE - Federao de Estabelecimentos de Ensino Superior em Novo
Hamburgo
FIB - Faculdades Integradas de Bauru
FIP - Faculdade do Interior Paulista
FTC - Faculdade de Tecnologia e Cincias
IPA - Instituto Porto Alegre
MEC - Ministrio da Educao
PGQP - Programa Gacho da Qualidade para a Produtividade
PUCRS - Pontifcia Universidade Catlica do Rio Grande do Sul
UCB - Universidade Catlica de Braslia
UCS - Universidade de Caxias do Sul
UCSAL - Universidade Catlica de Salvador
UEFS Universidade Estadual de Feira de Santana
UEL - Universidade Estadual de Londrina
UFG - Universidade Federal de Gois
UFMT - Universidade Federal de Mato Grosso
UFRGS Universidade Federal do Rio Grande do Sul
UFRJ Universidade Federal do Rio de Janeiro
UFRN Universidade Federal do Rio Grande do Norte
UFSM - Universidade Federal de Santa Maria
ULBRA - Universidade Luterana do Brasil
UMESP - Universidade Metodista de So Paulo
UNEB - Universidade do Estado da Bahia
UNESP - Universidade Estadual Paulista Julio de Mesquita Filho
Uni-Bh - Centro Universitrio de Belo Horizonte
UNIFACS Universidade Salvador
UNIJU - Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul
UNIOESTE - Universidade Estadual do Oeste do Paran
UniRio - Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro
UNISC - Universidade de Santa Cruz do Sul
UNISINOS Universidade do Vale do Rio dos Sinos
UNIVALI - Universidade do Vale do Itaja
USC - Universidade do Sagrado Corao
SUMRIO
Prefcio ........................................................................................................................... 11 Jos Marques de Melo Apresentao: A histria e a memria das Relaes Pblicas ................................. 13 Cludia Peixoto de Moura Parte I: Reflexes e Aes de Relaes Pblicas....................................................... 20 Captulo 1: Origens e Contextos da rea ..................................................................... 21 O contexto histrico do nascimento das Relaes Pblicas .................................... 21 Jlio Afonso Pinho(UFG) (Re)Construindo a histria das Relaes Pblicas .................................................... 43 Cleusa Maria Andrade Scroferneker (PUCRS) Relaes Pblicas Processo histrico e Complexidade......................................... 53 Rudimar Baldissera (FEEVALE/UCS) e Marlene Branca Slio (UCS) Estudos em Relaes Pblicas e o Pensamento Latino-Americano em Comunicao.................................................................................................................. 71 Yuji Gushiken (UFMT) Teoria e Prtica uma relao dissonante em Relaes Pblicas no Brasil do Sculo XX........................................................................................................................ 89 Ana Maria Walker Roig Steffen (PUCRS) Contextualizando as Relaes Pblicas como atividade do campo profissional . 103 Sonia Aparecida Cabestr (USC) O campo profissional de Relaes Pblicas e a entrada das Multinacionais no Brasil: uma anlise atravs da perspectiva da Pesquisa Histrica (1956-1979).... 137 Gisele Becker (PPGCOM-PUCRS) e Carla Lemos da Silva (PPGCOM-PUCRS) O campo profissional de Relaes Pblicas e o momento de reabertura poltica no Brasil: Uma anlise atravs da perspectiva da Pesquisa Histrica (1979-1985) ... 154 Gisele Becker (FEEVALE) e Carla Lemos da Silva (PPGCOM-PUCRS) Captulo 2: Aes e Representaes Profissionais.................................................. 170 Governo Mdici: discurso oculto na comunicao institucional o caso AERP.. 170 Heloiza Matos (ECA/USP Faculdade Csper Lbero) Aspectos histricos da atividade de Relaes Pblicas: paralelos com a origem das assessorias de comunicao social ................................................................... 194 Ana Maria Crdova Wels (PUCRS e FEE) De Chapa Branca Interlocutora Qualificada: a trajetria da atividade de assessoria de imprensa no Brasil e no RS................................................................ 205 Laura Maria Gler (Centro Universitrio Metodista IPA)
O conceito de Empresa-Rede na Assessoria de Imprensa - um estudo em Porto Alegre (RS).................................................................................................................... 225 Laura Maria Gler (Centro Universitrio Metodista IPA) O moderno planejamento em relaes pblicas na fragmentao narrativa do mundo contemporneo ............................................................................................... 237 Yuji Gushiken (UFMT) 2006: um marco na histria das relaes pblicas no Brasil .................................. 253 Marcello Chamusca e Mrcia Carvalhal (Portal RP-Bahia) Reconhecimento e Valorizao: histria e memria de uma campanha que movimentou profissionais, estudantes, instituies de ensino e entidades de classe em todo o pas em 2006 e 2007....................................................................... 270 Marcello Chamusca e Mrcia Carvalhal (Portal RP-Bahia; UNIFACS; Faculdade Isaac Newton) O Parlamento Nacional das Relaes Pblicas e as medidas adotadas pelo CONFERP para sua viabilizao prtica .................................................................... 288 Andria Athaydes (ULBRA e FACCAT) O pioneirismo do Sindicato de Relaes Pblicas no Estado do Rio Grande do Sul....................................................................................................................................... 304 Helaine Abreu Rosa (FEEVALE) e Cintia da Silva Carvalho (FEEVALE e ULBRA) Captulo 3: Prticas de Relaes Pblicas ................................................................ 319 Central de Atendimento 0800 do Senado Federal: uma histria de conquistas para o cidado ...................................................................................................................... 319 Marcia Yukiko Matsuuchi Duarte (Senado Federal/DF) Criana Esperana: exemplo do marketing de causas sociais, articulado pelas relaes pblicas ......................................................................................................... 341 Anglica Helena Santini Montes Gallego (UMESP, FIB, FIP) e Daniel dos Santos Galindo (UMESP) A Pesquisa Emprica na Mdia Digital: uma prtica de Relaes Pblicas ............ 357 Cludia Peixoto de Moura (PUCRS) Apropriao dos blogs como ferramenta estratgica de Relaes Pblicas ........ 374 Cintia da Silva Carvalho (FEEVALE) A comunicao organizacional na cultura da gesto da qualidade: o PGQP no perodo de outubro de 1992 a maro de 2007 ........................................................... 391 Carla Schneider (PPGCOM-PUCRS) A memria da Comunicao em instituies biomdicas: consideraes sobre os efeitos da Comunicao Organizacional em mudanas na relao biomdico-paciente......................................................................................................................... 407 Simone Vaisman Muniz (UniRio) O discurso imagtico do destino Brasil antes e depois da criao do Ministrio do Turismo ......................................................................................................................... 420 Diana Costa de Castro (UCB) e Priscila Chiattone (UNIOESTE)
Relaes Pblicas e Turismo: uma reflexo sobre Comunicao e Ps-Modernidade ................................................................................................................. 439 Helaine Abreu Rosa e Mary Sandra Guerra Ashton (FEEVALE) As Relaes Pblicas de artistas da msica no Brasil: trajetrias pioneiras........ 460 Patricia Spinola Parte II: Ensino e Formao em Relaes Pblicas ................................................. 475 Captulo 4: Fragmentos da Histria dos Cursos....................................................... 476 Relaes Pblicas e Modernizao: o curso especial da EBAP ............................. 476 Odilon Sergio Santos de Jesus (UEFS) A trajetria do curso de Relaes Pblicas da FEEVALE: dos primrdios contemporaneidade ..................................................................................................... 488 Cintia da Silva Carvalho (FEEVALE e ULBRA) e Helaine Abreu Rosa (FEEVALE) Uma Contribuio para a Memria do Curso de Relaes Pblicas da UFRGS.... 503 Eno Dag Liedke e Daniela Esmeraldino Colissi (UFRGS) 35 anos do Curso de Relaes Pblicas da Universidade de Caxias do Sul UCS....................................................................................................................................... 520 Rudimar Baldissera, Silvana Padilha Flores e Marlene Branca Slio (UCS) Ensino das profisses miditicas: trajetria do Curso de Comunicao da UFSM....................................................................................................................................... 536 Eugenia Maria Mariano da Rocha Barichello (UFSM) Descaminhos das Relaes Pblicas na Bahia: bastidores de uma institucionalizao (Questionando a forma de implantao do primeiro curso universitrio de Relaes Pblicas da Bahia)........................................................... 552 Jlio Csar Lobo e Joanita Nascimento Souza Neta (UNEB) Empreendedorismo e Comunicao: o perfil e a formao empreendedora dos egressos do Curso de Comunicao Social da UNIJU ........................................... 560 Tiago Mainieri de Oliveira e Felipe Rigon Dorneles (UNIJU) Um olhar sobre a histria do Curso de Relaes Pblicas da UNISC Universidade de Santa Cruz do Sul ................................................................................................... 574 Elizabeth Huber Moreira e Mnica Elisa Dias Pons(UNISC) Captulo 5: Tpicos para a Memria do Ensino ........................................................ 583 Panorama Histrico das Relaes Pblicas na Bahia.............................................. 583 Henrique Wendhausen, Marcello Chamusca e Mrcia Carvalhal (FTC) A trajetria das Relaes Pblicas na regio Noroeste do RS................................ 599 Marcia Formentini, Andr Gagliardi e Tiago Mainieri de Oliveira (UNIJU) As Relaes Pblicas Internacionais nos currculos de Relaes Pblicas do Rio Grande do Sul............................................................................................................... 612 Vagner de Carvalho Silva (PPGCOM - PUCRS)
Inventrio bibliogrfico em monografias de Relaes Pblicas ............................. 628 Gustavo Eugnio Hasse Becker (ULBRA) O ensino das Relaes Pblicas em Santa Catarina................................................ 640 Ediene do Amaral Ferreira (UNIVALI) A Trajetria dos Projetos Experimentais Estgio do Curso Relaes Pblicas da Universidade do Vale do Itaja/SC .............................................................................. 654 Ediene do Amaral Ferreira e Joo Carissimi (UNIVALI) Snia Bandeira (1965-1999): a trajetria de vida da relaes-pblicas em Santa Catarina ......................................................................................................................... 661 Joo Carissimi (UNIVALI) O pioneirismo de Cndido Teobaldo de Souza Andrade na pesquisa em Relaes Pblicas no Brasil ........................................................................................................ 669 Waldyr Gutierrez Fortes (UEL) Parte III: Frum de Professores de Relaes Pblicas ............................................ 687 Fragmentos da Histria do Ensino de Relaes Pblicas no Brasil....................... 688 Cludia Peixoto de Moura (PUCRS) Os Reflexos das Diretrizes Curriculares no Ensino de Relaes Pblicas............ 695 Sidinia Gomes Freitas (USP)
Histria das Relaes Pblicas
11
Prefcio
Jos Marques de Melo
Presidente-fundador da Rede Alcar
A comemorao dos 200 anos da introduo da imprensa no Brasil,
efemride que catalisa a pauta da mdia nacional, neste ano de 2008, tem sido
oportunidade singular para uma reviso da trajetria das reas que compem o
universo da comunicao social em todo o pas.
o caso, por exemplo, das Relaes Pblicas, atividade profissional que
surgiu na esteira da humanizao do capitalismo, cujo aparecimento no Brasil
tem fisionomia precoce, mas seu desenvolvimento s vem ocorrer quando se
organiza uma corporao que luta pelos seus direitos e reivindica a formao de
quadros especializados.
Se a gnese das Relaes Pblicas est no ato de fundao do servio de
atendimento ao pblico e imprensa da Light, em 1914, por Eduardo Pinheiro
Lobo, seu florescimento s encontra sustentao na regulamentao profissional
reivindicada desde 1954, quando os praticantes do oficio criam sua associao
nacional.
Mas o fortalecimento da rea passa necessariamente pela educao
superior dos futuros ocupantes de funes dessa natureza nas empresas, no
servio pblico e no setor tercirio. O marco emblemtico a fundao do curso
pioneiro por Candido Teobaldo de Souza Andrade, em 1967, na Universidade de
So Paulo.
Desde ento a profisso deslanchou, construindo seu corpo cognitivo e
negociando suas fronteiras com as ocupaes contguas, como o jornalismo e as
relaes pblicas.
De que forma esse desenvolvimento ocupacional se deu no espao
brasileiro, ou seja, nos diferentes quadrantes da geografia verde-amarela? Quem
quiser uma resposta satisfatria poder encontrar nesta coletnea organizada
com esmero pela professora Claudia Moura, lder da equipe que vem escrevendo
a Histria das Relaes Pblicas no Brasil na Rede Alfredo de Carvalho para o
Resgate da Memria da Imprensa e a Construo da Histria da Mdia no Brasil.
Cludia Peixoto de Moura (Organizadora)
12
Mobilizando jovens professores, de norte a sul, de leste a oeste, a
tranqila, diligente e carismtica pesquisadora gacha comps um panorama
elucidativo da rea, que representa um desafio s novas geraes no sentido de
discernir para onde caminha a profisso nesta conjuntura enigmtica de
globalizao capitalista.
Ao prefaciar esta obra coletiva, tecida pelo Grupo de Trabalho de Histria
das Relaes Pblicas da Rede Alfredo de Carvalho, no posso fugir tentao
de fazer duas perguntas aos leitores potenciais.
Em que medida a etapa da globalizao da economia no est na raiz da
prpria profisso? Tanto assim que as pistas de Ivy Lee, cuja frmula para
humanizao de uma linhagem de capitalistas selvagens, so tomadas ao p da
letra por Eduardo Pinheiro Lobo, mas no surtem os resultados pretendidos,
exatamente por que o capitalismo brasileiro muito tardio?
E, na seqncia, uma provocao. Por que as Relaes Pblicas no Brasil
s seriam nutridas pelo capitalismo de Estado sustentado pelo regime militar ps-
64?
Trata-se de questes histricas que ambicionam suscitar a leitura crtica
deste livro pelos jovens profissionais e estudiosos da rea.
So Paulo, maro de 2008
Histria das Relaes Pblicas
13
Apresentao: A histria e a memria das Relaes Pblicas
Cludia Peixoto de Moura
Coordenadora do GT Histria das Relaes Pblicas da Rede Alcar
A obra uma coletnea de textos selecionados para apresentao no
Grupo Temtico Histria das Relaes Pblicas, da Rede de Pesquisadores de
Memria da Imprensa e a Construo da Histria da Mdia no Brasil (Rede
Alfredo de Carvalho REDE ALCAR). Os artigos j foram disponibilizados
comunidade cientfica da rea, atravs do site da REDE ALCAR
(www.jornalismo.ufsc.br/redealcar). Porm, nesta obra esto reunidos com a
finalidade de documentar as discusses ocorridas no perodo de cinco anos, por
ocasio dos Encontros realizados, de 2004 a 2008. Alm disso, o lanamento
desta edio acontece no ano do bicentenrio da Imprensa Brasileira, registrando
alguns estudos desenvolvidos na rea de Relaes Pblicas.
O VI Encontro Nacional de Histria da Mdia ocorre em 2008, ano
comemorativo, e tem como tema central os 200 anos de mdia no Brasil
Historiografia e Tendncias. A publicao da Histria das Relaes Pblicas:
fragmentos da memria de uma rea registra uma parte da trajetria do ensino e
formao, das reflexes e aes de Relaes Pblicas, sendo resultante do
Grupo Temtico. Os textos, em sintonia com a ementa do GT Histria das
Relaes Pblicas, abrangem pesquisas que focalizam a histria dos processos
de relacionamento estabelecidos entre os pblicos e as organizaes, a origem e
contexto das aes comunicacionais existentes nas instituies pblicas,
privadas e no governamentais, a evoluo dos conceitos e prticas de Relaes
Pblicas, a trajetria do ensino e de cursos para a formao acadmica na rea.
O resultado dos cinco encontros um conjunto de 42 trabalhos,
selecionados de 2004 a 2008, nas modalidades de Comunicaes Cientficas, de
Memrias de Experincias e de Depoimentos de Especialistas, Todos esto
indicados a seguir, considerando as temticas abordadas, divididas em dois
segmentos que deram origem s partes do livro:
Cludia Peixoto de Moura (Organizadora)
14
a) temticas relacionadas s origens, contextos, aes e prticas de Relaes
Pblicas:
AUTOR(ES) TTULO DO TRABALHO
Laura Maria Gler (Centro Universitrio
Metodista IPA/RS) 2004
De Chapa Branca a Interlocutora Qualificada: a
trajetria da atividade de assessoria de
imprensa no Brasil e no RS
Marcia Yukiko Matsuuchi Duarte
(Relaes Pblicas Senado
Federal/DF) 2004
Central de Atendimento 0800 do Senado
Federal: uma histria de conquistas para o
cidado
Sonia Aparecida Cabestr (USC/SP)
2004
Contextualizando as Relaes Pblicas como
atividade do campo profissional
Heloiza Matos (ECA/USP e Faculdade
Csper Lbero/SP) 2004
Governo Mdici: discurso oculto na
comunicao institucional o caso AERP
Jlio Afonso Pinho (UFG/GO) 2005 O contexto histrico do nascimento das
Relaes Pblicas
Rudimar Baldissera (FEEVALE e
UCS/RS) e Marlene Branca Slio
(UCS/RS) 2005
Relaes Pblicas Processo histrico e
Complexidade
Cleusa Maria Andrade Scroferneker
(PUCRS/RS) 2005
(Re)Construindo a histria das Relaes
Pblicas
Ana Maria Walker Roig Steffen
(PUCRS/RS) 2005
Teoria e Prtica uma relao dissonante em
Relaes Pblicas no Brasil do Sculo XX
Ana Maria Crdova Wels (PUCRS e
FEE/RS) 2005
Aspectos histricos da atividade de Relaes
Pblicas: paralelos com a origem das
assessorias de comunicao social
Laura Maria Gler (Centro Universitrio
Metodista IPA/RS) 2005
O conceito de Empresa-Rede na Assessoria de
Imprensa - um estudo em Porto Alegre (RS)
Helaine Abreu Rosa (FEEVALE/RS) e
Cintia da Silva Carvalho (FEEVALE e
ULBRA /RS) 2006
O pioneirismo do Sindicato de Relaes
Pblicas no Estado do Rio Grande do Sul
Gisele Becker e Carla Lemos da Silva
(PPGCOM PUCRS/RS) 2006
O campo profissional de Relaes Pblicas e a
entrada das Multinacionais no Brasil: uma
anlise atravs da perspectiva da Pesquisa
Histrica (1956-1979)
Histria das Relaes Pblicas
15
Yuji Gushiken (UFMT/MT) 2006 Estudos em Relaes Pblicas e o Pensamento
Latino-Americano em Comunicao
Marcello Chamusca e Mrcia Carvalhal
(Portal RP-Bahia/BA) 2007
2006: um marco na histria das relaes
pblicas no Brasil
Carla Schneider (PPGCOM
PUCRS/RS) 2007
A comunicao organizacional na cultura da
gesto da qualidade: o PGQP no perodo de
outubro de 1992 a maro de 2007
Anglica Helena Santini Montes Gallego
(UMESP, FIB, FIP/SP) e Daniel dos
Santos Galindo (UMESP/SP) 2007
Criana Esperana: exemplo do marketing de
causas sociais, articulado pelas relaes
pblicas
Cludia Peixoto de Moura (PUCRS/RS)
2007
A Pesquisa Emprica na Mdia Digital:
uma prtica de Relaes Pblicas
Cintia da Silva Carvalho (FEEVALE/RS)
2008
Apropriao dos blogs como ferramenta
estratgica de Relaes Pblicas
Andria Athaydes (ULBRA e
FACCAT/RS) 2008
O Parlamento Nacional das Relaes Pblicas
e as medidas adotadas pelo CONFERP para
sua viabilizao prtica.
Gisele Becker (FEEVALE/RS) e Carla
Lemos da Silva (PPGCOM-PUCRS/RS)
2008
O campo profissional de Relaes Pblicas e o
momento de reabertura poltica no Brasil: Uma
anlise atravs da perspectiva da Pesquisa
Histrica (1979-1985)
Marcello Chamusca e Mrcia Carvalhal
(Portal RP-Bahia; UNIFACS; Faculdade
Isaac Newton/BA) 2008
Reconhecimento e Valorizao: histria e
memria de uma campanha que movimentou
profissionais, estudantes, instituies de ensino
e entidades de classe em todo o pas em 2006
e 2007
Simone Vaisman Muniz (UniRio) 2008 A memria da Comunicao em instituies
biomdicas: consideraes sobre os efeitos da
Comunicao Organizacional em mudanas na
relao biomdico-paciente
Yuji Gushiken (UFMT/MT) 2008 O moderno planejamento em relaes pblicas
na fragmentao narrativa do mundo
contemporneo
Helaine Abreu Rosa e Mary Sandra
Guerra Ashton (FEEVALE/RS) 2008
Relaes Pblicas e Turismo: uma reflexo
sobre a Comunicao na Ps-Modernidade
Diana Costa de Castro (UCB/DF) e O discurso imagtico do destino Brasil antes e
Cludia Peixoto de Moura (Organizadora)
16
Priscila Chiattone (UNIOESTE/PR)
2008
depois da criao do Ministrio do Turismo.
Patricia Spinola (SP) 2008 As Relaes Pblicas de artistas da msica no
Brasil: trajetrias pioneiras
b) temticas relacionadas trajetria do ensino de Relaes Pblicas:
AUTOR(ES) TTULO DO TRABALHO
Ediene do Amaral Ferreira e Joo
Carissimi (UNIVALI/SC) 2004
A Trajetria do Projeto Experimental Estgio do
Curso Relaes Pblicas da Universidade do
Vale do Itaja/SC
Eugenia Maria Mariano da Rocha
Barichello (UFSM/RS) 2004
Ensino das profisses miditicas: trajetria do
Curso de Comunicao da UFSM
Odilon Sergio Santos de Jesus
(UEFS/BA) 2004
Relaes Pblicas e Modernizao: o curso
especial da EBAP
Jlio Csar Lobo e Joanita Nascimento
Souza Neta (UNEB/BA) 2004
Descaminhos das Relaes Pblicas na Bahia:
bastidores de uma institucionalizao
(Questionando a forma de implantao do
primeiro curso universitrio de Relaes
Pblicas da Bahia)
Cintia da Silva Carvalho (FEEVALE e
ULBRA/RS) e Helaine Abreu Rosa
(FEEVALE/RS) 2005
A trajetria do curso de Relaes Pblicas da
FEEVALE: dos primrdios
contemporaneidade
Mrcia Formentini, Andr Gagliardi e
Tiago Mainieri de Oliveira (UNIJU/RS)
2005
A trajetria das Relaes Pblicas na regio
Noroeste do RS
Ediene do Amaral Ferreira (UNIVALI/SC)
2005
O ensino das Relaes Pblicas em Santa
Catarina
Joo Carissimi (UNIVALI/SC) 2005 Snia Bandeira (1965-1999): a trajetria de vida
da relaes pblicas em Santa Catarina
Gustavo Eugnio Hasse Becker
(ULBRA/RS) 2005
Inventrio bibliogrfico em monografias de
Relaes Pblicas
Vagner de Carvalho Silva (PPGCOM
PUCRS/RS) 2005
As Relaes Pblicas Internacionais nos
currculos de Relaes Pblicas do Rio Grande
do Sul
Histria das Relaes Pblicas
17
Henrique Wendhausen, Marcello
Chamusca e Mrcia Carvalhal (FTC-
Salvador/BA) 2006
Panorama Histrico das Relaes Pblicas na
Bahia
Rudimar Baldissera, Silvana Padilha
Flores e Marlene Branca Slio (UCS/RS)
2006
35 anos do Curso de Relaes Pblicas da
Universidade de Caxias do Sul UCS
Elizabeth Huber Moreira e Mnica Elisa
Dias Pons (UNISC/RS) 2006
Um olhar sobre a histria do Curso de Relaes
Pblicas da UNISC Universidade de Santa
Cruz do Sul
Tiago Mainieri de Oliveira e Felipe Rigon
Dorneles (UNIJU/RS) 2006
Empreendedorismo e Comunicao: o perfil e a
formao empreendedora dos egressos do
Curso de Comunicao Social da UNIJU
Eno Dag Liedke e Daniela Esmeraldino
Colissi (UFRGS/RS) 2008
Uma Contribuio para a Memria do Curso de
Relaes Pblicas da UFRGS
Waldyr Gutierrez Fortes (UEL/PR)
2008
O pioneirismo de Cndido Teobaldo de Souza
Andrade na pesquisa em Relaes Pblicas no
Brasil
Nos dois quadros acima possvel identificar mais de 40 autores1 com
textos selecionados. Destes autores, treze (13) pesquisadores participaram mais
de uma vez do evento da REDE ALCAR. So eles: Cintia da Silva Carvalho
(FEEVALE/RS e ULBRA/RS), Helaine Abreu Rosa (FEEVALE/RS), Marcello
Chamusca (Portal RP-Bahia), Mrcia Carvalhal (Portal RP-Bahia), Ediene do
Amaral Ferreira (UNIVALI/SC), Joo Carissimi (UNIVALI/SC), Laura Maria Gler
(Centro Universitrio Metodista IPA/RS),Marlene Branca Slio (UCS/RS),
Rudimar Baldissera (FEEVALE/RS e UCS/RS), Tiago Mainieri de Oliveira
(UNIJU/RS), Carla Lemos da Silva (PPGCOM-PUCRS), Gisele Becker
(FEEVALE/RS), Yuji Gushiken (UFMT/MT).
Com a participao de diversos autores houve a representao de vrias
Instituies, conforme demonstram os quadros anteriores. Igualmente,
representam os seguintes estados brasileiros: Rio Grande do Sul, Santa Catarina,
Paran, So Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Distrito Federal, Gois, Mato
Grosso e Bahia.
Cludia Peixoto de Moura (Organizadora)
18
Desde 2004, primeiro encontro do GT Histria das Relaes Pblicas, as
propostas dos participantes foram abordar a questo do ensino (construo dos
cursos / experincias), a questo das entidades representativas (processos
institucionais / ABRPs / Sindicatos / CONRERPs), a questo dos organismos
pblicos e privados (polticas de comunicao / uso de instrumentos), e a questo
dos autores de Relaes Pblicas (suas idias / personalidades). Os diversos
assuntos elencados esto contemplados nesta obra.
Outra sugesto foi a organizao de um Encontro de Professores de
Relaes Pblicas, a ser realizado na seqncia do evento da REDE ALCAR. O
evento ocorreu em 2005, denominado Frum de Professores de Relaes
Pblicas, com o objetivo de abordar Os Reflexos das Diretrizes Curriculares no
Ensino de Relaes Pblicas. Para tanto, a profa. Dra. Sidinia Gomes Freitas
(USP) foi convidada como palestrante, em virtude de sua experincia e vivncia
no MEC, inclusive na elaborao das Diretrizes Curriculares dos Cursos de
Comunicao Social. Houve uma retomada de questes do passado e uma
avaliao da situao atual, focando a formao na rea. O debate foi norteado
por uma pauta.
O Frum contou com a presena de professores que participaram do
encontro da REDE ALCAR, de 2005, e de outros docentes de instituies de
ensino localizadas no estado do Rio Grande do Sul. A pauta estabelecida gerou
muitas discusses. O texto de Abertura do Frum e o artigo apresentado por
Sidinia Gomes Freitas finalizam esta publicao.
Tambm gostaria de destacar a participao de quatro sites que
colaboraram com a divulgao do GT Histria das Relaes Pblicas, nos
encontros ocorridos. So eles:
- www.comunicacaoempresarial.com.br : de Wilson da Costa Bueno,
- www.mundorp.com.br : de Rodrigo Cogo,
- www.portal-rp.com.br : de Waldyr Gutierrez Fortes,
- www.rp-bahia.com.br : de Mrcia Carvalhal e Marcello Chamusca.
A obra Histria das Relaes Pblicas: fragmentos da memria de uma
rea uma documentao contendo todos os textos selecionados para os
1 Os dados dos autores, registrados em nota de rodap junto aos textos, apresentam a situao acadmica e profissional de cada participante no perodo em que ocorreu a seleo de seu artigo para o encontro da REDE ALCAR.
Histria das Relaes Pblicas
19
encontros ocorridos de 2004 a 2008. Quero registrar o meu agradecimento a
todos que participaram das cinco edies do GT. Somente o interesse de tantas
pessoas pelo debate dos assuntos pautados na ementa do GT garante a
produo de conhecimento e o desenvolvimento de investigaes voltadas
Histria das Relaes Pblicas.
Agradeo EDIPUCRS Editora da Pontifcia Universidade Catlica do
Rio Grande do Sul por realizar a publicao eletrnica do material, possibilitando
assim a sua divulgao para a comunidade acadmica e profissional. Finalizo
esta apresentao com um agradecimento especial ao prof. Dr. Jos Marques de
Melo, presidente da REDE ALCAR, que possibilitou a incluso do GT Histria das
Relaes Pblicas na Rede de Pesquisadores de Memria da Imprensa e a
Construo da Histria da Mdia no Brasil (Rede Alfredo de Carvalho), resultando
em um espao relevante para a discusso das questes pertinentes rea.
A histria e a memria das Relaes Pblicas necessitam ser pesquisadas
e registradas na REDE ALCAR, atravs dos estudos apresentados em seus
encontros anuais. Uma interpretao do passado, condicionada a um contexto
social e construda a partir de problemas de pesquisa que interessam no tempo
presente, com base em fontes primrias ou secundrias, escritas manuscritas
ou impressas, orais, materiais e visuais podem ser adotadas para reconstruir a
histria de Relaes Pblicas.
Parte I: Reflexes e Aes de Relaes Pblicas
Histria da Relaes Pblicas
21
Captulo 1: Origens e Contextos da rea
O contexto histrico do nascimento das Relaes Pblicas
Jlio Afonso Pinho2 (UFG)
Resumo
Este trabalho aborda uma reflexo sobre o contexto histrico do
nascimento das Relaes Pblicas com o objetivo de compreender os fatores
responsveis pelo seu surgimento no final do sculo XIX. O cenrio poltico,
social e econmico da poca por demais revelador no que diz respeito
natureza e funo da atividade de Relaes Pblicas, demonstrando as foras
sociais que foram responsveis por sua gnese e posterior desenvolvimento. Por
fim, aborda uma reflexo a respeito do incio da atividade no Brasil, frisando as
situaes histricas da sua chegada no pas e as implicaes da decorrentes no
exerccio da profisso.
1. INTRODUO
importante frisar que a profisso de Relaes Pblicas tem seus
fundamentos ligados ao fenmeno da opinio pblica. Somente numa sociedade
democrtica, onde a opinio pblica assume papel preponderante no processo
poltico, haver a devida importncia atividade profissional das Relaes
Pblicas. Necessariamente, numa democracia, h que se estabelecer o dilogo,
o consenso, a ausculta aos diversos grupos e movimentos sociais.
A opinio pblica um fenmeno tpico dos albores da modernidade,
alicerada nas idias iluministas. De fato, tal opinio, revigorada nos espaos
pblicos do incio da modernidade, cumpriu seu papel de frum democrtico;
espao onde a sociedade civil se aglutinava para questionar, debater e refletir os
2 Doutor em Comunicao e Cultura, Professor Adjunto do Curso de Relaes Pblicas da Universidade Federal de Gois.
Cludia Peixoto de Moura (Organizadora)
22
rumos da administrao pblica, dos direcionamentos e apostas polticas dos
governos dos Estados-Nao dos sculos XVIII e XIX.
justamente o fortalecimento da sociedade civil, com suas conseqentes
necessidades de discusso de temas relevantes e de mobilizao poltica, que
vai abrir espao para o surgimento da atividade de Relaes Pblicas,
demonstrando assim, o carter eminentemente poltico das RPs. Torna-se
imprescindvel, destarte, proceder a um minucioso cotejo entre os fatos histricos
significativos dos EUA, no sculo XIX, e a cronologia da evoluo das Relaes
Pblicas, tendo em vista proporcionar uma reflexo profcua a respeito dos
determinantes polticos, econmicos, sociais e culturais que viabilizaram e
contingenciaram o surgimento dessa nova profisso.
Nesta cena histria, a luta de classes, o movimento sindical e as
associaes patronais e o desenvolvimento do capitalismo monopolista integram
um captulo essencial e imprescindvel para conhecer a gnese da profisso de
Relaes Pblicas naqueles Estados Unidos do sculo XIX.
Por fim, necessrio empreender uma anlise da profisso na atualidade
a partir do enriquecimento que tal contexto de seu nascimento nos lega. Numa
poca de crise da poltica, fragmentao do sujeito, declnio dos sindicatos e da
opinio pblica, o que podermos ter como perspectiva da profisso de Relaes
Pblicas? Sem dvida alguma, a reflexo sobre o surgimento das RP como
profisso torna-se extremamente importante para entender a evoluo conceitual,
a fundamentao tica, os pressupostos tericos e os paradigmas dessa
profisso desde a sua origem at nossos dias.
2. O SINDICALISMO NORTE-AMERICANO NO SCULO XIX: UMA SOCIEDADE EM TRANFORMAO
Os Estados Unidos foram o primeiro pas a industrializar-se fora do
continente europeu, contando com uma certa pujana industrial j pelos idos de
1840. Tal processo foi facilitado por diversos fatores responsveis pela
consolidao dos EUA como nao. Dentre eles, podemos citar os mais
significativos como o movimento expansionista americano poca; a Guerra da
Histria das Relaes Pblicas
23
Secesso e por fim a grande onda migratria intensificada pela chegada das
hordas de irlandeses.
O movimento expansionista legou aos EUA, na primeira metade do sculo
XIX, os territrios da Flrida, Lousianna, Alaska, Texas, Novo Mxico, Califrnia,
Utah, Arizona e Nevada, sendo que os trs primeiros foram anexados pela via
diplomtica, mediante o pagamento de altas somas de dinheiro; j os territrios
mexicanos foram agregados pelo uso da fora. S nos trs anos da Guerra do
Mxico (1845-1848) mais da metade da ex-colnia espanhola passou a fazer
parte do territrio americano.
No final da primeira metade do sculo XIX formaram-se as primeiras
grandes concentraes de trabalhadores no entorno das cidades-plo do
processo de desenvolvimento industrial americano. Nesta poca, os EUA
tambm receberam um significativo contingente de irlandeses alm dos
costumeiros imigrantes de diferentes procedncias que fugiam das conhecidas
fomes que assolaram a Irlanda no incio do sculo XIX, fato que acabou por
fortalecer e ampliar ainda mais o exrcito de reserva necessrio para a expanso
do capitalismo industrial. Aliado a essa conjuntura, podemos citar tambm o
enriquecimento dos estados do norte, a partir da guerra da secesso (1860-
1865). Essa grande guerra civil, com toda sua destruio, foi, contudo, decisiva
para formar um mercado economicamente unificado e guindar a nao americana
condio de potncia mundial.
A conquista do oeste tambm pode figurar como um elemento
desencadeador desse processo industrial, uma vez que resultou em abundncia
de recursos, servindo tambm como elemento inibidor de crises trabalhistas. A
expanso da fronteira americana (teoria da fronteira) representava uma vlvula
de escape, contribuindo para a cristalizao das condies sociais da poca, com
profundos reflexos nas questes trabalhistas. Segundo a Teoria da Fronteira, as
fronteiras a serem conquistadas representavam a possibilidade do direito de
propriedade a terra, inibindo crises sociais e anseios revolucionrios de
transformao social. 3
3 Sobre a Teoria da Fronteira, ver FARAGHER, John Mack. Rereading Frederick Jackson Turner: The significance of the frontier in American history. New Haven/Connecticut: Yale University Press, 1999.
Cludia Peixoto de Moura (Organizadora)
24
A questo da propriedade decisiva para delinearmos o perfil dos
trabalhadores americanos desse perodo histrico. Eles almejavam alcanar a
condio de proprietrios, segundo o iderio da livre iniciativa, pois o imaginrio
da poca estava perpassado pela idia da posse da terra, da aventura bem-
sucedida de tornar-se proprietrio, o que, por sinal, delineou uma forte rejeio
aos monoplios, cartis e trustes, toda e qualquer organizao do capital que
pusesse em risco a esperana da distribuio de terras e o acesso de um grande
nmero de cidados s benesses do capitalismo. A filosofia de vida americana
postulava a salvaguarda dos ideais liberais da livre iniciativa, da economia
competitiva e da igualdade de possibilidades para todos.
Tal perfil fez com que o movimento sindicalista americano fosse, at certa
medida, destitudo de uma forte mobilizao, no sentido de promover uma
transformao social profunda, capaz de fazer desencadear os grandes ideais
comunistas to presentes e cada vez mais fortes poca. Na verdade, at a crise
de 1929, a grande heterogeneidade da classe operria americana, a grande
imigrao, a abundncia de terras livres, os ideais burgueses do direito
propriedade e o surto de prosperidade advindo do grande desenvolvimento
econmico, refrearam as reivindicaes da classe operria americana, a despeito
do que ocorria na Europa nessa mesma poca palco de avanos dos
movimentos operrios aps as revolues liberais no perodo compreendido entre
1800 a 1848 em que os princpios do socialismo direcionaram reformas
econmicas e sociais profundas contra a desigualdade social.
Na verdade a Europa j presenciava, neste perodo, a insurreio dos
trabalhadores contra as pssimas condies de vida decorrentes de crises
econmicas, desemprego, falta de liberdade civil e poltica; exigiam liberdade de
imprensa, democracia, sufrgio universal, poltica social e direitos trabalhistas.
No por acaso que o Manifesto Comunista texto fundador da teoria
marxista foi publicado pela primeira vez, no ms de fevereiro de 1848, em
Londres. Este documento foi concebido inicialmente para atuar como um
programa terico da Liga dos Comunistas, na Inglaterra. Contudo, ele possui
como caracterstica maior ser um programa para a organizao mundial dos
trabalhadores de diferentes pases. Tal funo faz com que o Manifesto possua
um carter propagandista, persuasivo, visando conscientizar, esclarecer, advertir
e conclamar os operrios de todo o mundo a respeito da luta de classes, da mais
Histria das Relaes Pblicas
25
valia, da superestrutura do capitalismo etc. Segundo LASKI, seu objetivo
insistir na solidariedade internacional, ser vanguarda em cada pas, com seu
profundo conhecimento terico do movimento da histria, cooperando na
conquista do poder pelos trabalhadores.4
A Europa de 1848 vivia uma grande onda revolucionria, com
manifestaes de operrios em quase todos os pases, conseqncia das crises
advindas da crescente concentrao do capital e da intensificao da explorao
do trabalho. Tal panorama acirrou os choques entre burgueses e proletrios,
resultando numa maior conscincia e poder de mobilizao dos operrios.
Esse famoso Manifesto traduzido pela primeira vez nos Estados Unidos
em 1871, convocando os operrios americanos a integrarem-se no grande
projeto marxista: proletrios de todos os pases, uni-vos. Chegava finalmente
Amrica o fantasma do comunismo, que at ento rondava a Europa.
3. A CONSOLIDAO DOS MOVIMENTOS SINDICAIS
As primeiras tradues do Manifesto Comunista nos Estados Unidos
surgem a partir de 1871. desta data, tambm, a publicao do Manifesto no
semanrio Nova Iorquino, de lngua francesa, Le Socialiste. Percebe-se que a
divulgao do Manifesto foi ampla, como era planejado desde a prpria
elaborao do documento. O acesso a tais idias pelas massas fez surgir novas
perspectivas para a compreenso da sociedade daquela poca. Segundo Mota,
o Manifesto Comunista (1848), de Marx e Engels, indica a mudana de
concepes abstratas e utpicas sobre a sociedade, para outras mais concretas
e combativas.5
No ltimo quartel do sculo XIX, o movimento operrio cresceu no mundo
todo, haja vista a primeira experincia concreta, ou batismo de fogo, de poder
poltico dos trabalhadores, fato ocorrido na Frana com a famosa revoluo
proletria denominada Comuna de Paris, em 1871.
Nos Estados Unidos tal perodo foi marcado por vrios acontecimentos
importantes ocorridos no cenrio trabalhista norte-americano. Em 1869, foi
fundada a Ordem dos Cavaleiros do Trabalho (OCT), primeira organizao 4 LASKI, Harold J. O manifesto comunista de 1848. Rio de Janeiro: Zahar, 1967, p. 31.
Cludia Peixoto de Moura (Organizadora)
26
trabalhista nos EUA que se transformou, nos anos seguintes, numa poderosa
central sindical capaz de um intenso movimento de massa, congregando
trabalhadores de diferentes ofcios. Seus associados chegaram a mais de 700 mil
em 1885. A Ordem foi sucedida pela Federao Americana do Trabalho (FAT),
fundada em 1886, que refutou a idia de um nico e grande sindicato, apostando
na completa autonomia dos diferentes sindicatos, cada um deles possuindo sua
constituio, seus regulamentos e mtodos de negociao.
interessante notar que a Federao Americana do Trabalho era
preocupada com a opinio pblica. Na verdade, a FAT possua, como um dos
seus princpios bsicos, a mobilizao da opinio pblica, visando torn-la
favorvel para com sua causa: Os sindicatos devem cultivar a opinio pblica
com o objetivo de se tornarem mais aceitveis para a economia e a sociedade
americana.6
Este ano de 1886 tambm tornou-se emblemtico devido famosa greve
pela jornada de oito horas de trabalho, mobilizao esta que obteve xito em todo
o pas, exceto na cidade de Milawaukee, perto de Chicago, onde a polcia
interveio contra os operrios (...), matando vrios trabalhadores7.
Este acontecimento marcou a histria do sindicalismo mundial, pois levou
o Congresso Americano a aprovar, em 1889, a lei de regulamentao da jornada
de oito horas de trabalho. Tambm, em honra aos mrtires de Chicago, o dia 1o
de maio foi proclamado, pelo Congresso Operrio Socialista de Paris, em 1889,
como o Dia Universal do Trabalho.
No podemos deixar de citar, ainda, o ano de 1877, marcado por uma
grande depresso econmica, resultando em cerca de trs milhes de
desempregados. Neste ano ocorreu tambm uma grande greve dos
trabalhadores da estrada de ferro que abalou todo o pas. O foco desta greve era
a luta pela expanso dos sistemas de negociaes coletivas e aumento salarial;
j os anos de 1883 e 1885 assinalam duas grandes greves, a dos telegrafistas e
dos ferrovirios, respectivamente.
Vale ressaltar que tais acontecimentos abalaram toda a economia da
nao americana, acirrando ainda mais as diferenas sociais de classe, o que por 5 MOTA, Carlos Guilherme. 1822: Dimenses. So Paulo: Perspectiva, 1986. 6 MARSHALL, F. Ray & RUNGELING, Brian. O papel dos sindicatos na economia norte-americana. Rio de Janeiro: Forense Universitria, 1980, p. 49.
Histria das Relaes Pblicas
27
sua vez acabou por consolidar a militncia dos sindicatos. interessante notar,
para o objetivo do nosso estudo, que sindicalistas e patres procuraram
exaustivamente trabalhar a opinio pblica para que esta aderisse s suas
causas, mobilizando, para isto, publicaes de diferentes matizes ideolgicos.
Surge, assim, a necessidade de desenvolver um trabalho profissional direcionado
aos meios de comunicao de massa. Ambas as partes tinham plena conscincia
de que o xito nos conflitos de classe dependia, sobremaneira, de um
significativo apoio da opinio pblica. Algo to bem previsto j no prprio
Manifesto Comunista.
Esse amadurecimento do movimento sindical americano fez com que o
centro das mobilizaes da classe operria migrasse das negociaes coletivas
com empregadores, centrando seu foco para as atividades polticas capazes de
mobilizar esforos e estratgias que melhorassem as condies gerais de
trabalho. A luta pela reviso das legislaes trabalhistas um bom exemplo
desse novo direcionamento.
Para obter pleno xito nessa empreitada, era preciso atingir as massas;
trabalhar atravs da implementao de estratgias de comunicao que fossem
capazes de granjear o apoio da sociedade americana, estendendo a influncia
dos sindicatos para alm de seus quadros de associados, tendo em vista atingir a
opinio pblica norte-americana.
4. A MOBILIZAO DO PATRONATO: POLTICAS E ESTRATGIAS ANTI-SINDICAIS
Nos ltimos vinte anos do sculo XIX, as grandes corporaes
(monoplios) assumiram uma crescente importncia no cenrio econmico norte-
americano. As indstrias do ao e as companhias ferrovirias capitanearam, por
sua vez, grandes mobilizaes anti-sindicais medida que o sindicalismo tomava
fora.
A j existente Associao dos Diretores de Estradas de Ferro somou-se a
Associao Americana Antiboicote, criada em 1902, constituindo-se em uma
entidade secreta dos fabricantes com o objetivo de atacar os sindicatos. Por volta
7 Ver http://www.novomilenio.inf.br/festas/trab01.htm , capturado em 08.02.2005.
Cludia Peixoto de Moura (Organizadora)
28
da mesma poca, foi organizada a Associao Nacional dos Fabricantes que
tinha tambm a finalidade de combater sindicatos por meio de medidas polticas e
legislativas.
A United States Steel Corporation tambm se notabilizou em estratgias
para desmobilizar os sindicatos, conforme revela o relato de uma comisso
investigadora do Congresso na poca:
A grande massa de trabalhadores sindicalizados americanos na indstria de ferro e ao compreendeu que era indesejvel nas usinas da U. S. Steel Corporation. O processo usado para preencher as vagas deixadas por esses trabalhadores sindicalizados interessante e importante... Apelou-se para a Europa Meridional. Hordas afluram aos Estados Unidos. (...). Eles no sabiam absolutamente nada sobre a fabricao de ferro e ao, mas foram o suficiente para lutar contra os sindicatos trabalhistas8.
O perodo compreendido entre o final do sculo XIX e o incio do sculo
XX foi marcado por mais greves. Em 1897 ocorreu a greve dos mineiros, em
1901, a dos mecnicos e trabalhadores do ao e em 1904, a dos matadouros.
Frente a esse quadro de acirrada crise, a classe patronal contou com a ajuda das
transformaes nas relaes de trabalho, fruto da Teoria da Administrao
Cientfica, de autoria de Frederick Winslow Taylor (1856-1915). O taylorismo
representou um duro golpe nos xitos sindicais logrados at ento. Tal mtodo
destitua o trabalhador daquilo que lhe era mais caro: seu conhecimento e
habilidade profissional, fazendo-o perder o controle tcnico do processo de
produo.
De fato, o objetivo maior do taylorismo era fazer com que as tarefas
laborais fossem planejadas, classificadas e sistematizadas. O processo de
produo era, destarte, escandido, fragmentado, dividido em fases:
planejamento, concepo e direo. O processo de trabalho era agora
administrado cientificamente, segundo procedimentos de tempos e movimentos,
que eram capazes de estipular, sob a gide da linha ou cadeia de montagem, um
movimento a ser desenvolvido num tempo ideal, devidamente cronometrado.
Esse irromper da padronizao das formas de produzir, bem como da
Histria das Relaes Pblicas
29
conseqente avaliao dessa produtividade, ficou imortalizado nas cenas do filme
Tempos Modernos, de Charles Chaplin.
Na verdade, o taylorismo opera uma verdadeira separao entre o trabalho
intelectual e o trabalho manual, o que acaba por diminuir a necessidade de
trabalhadores diretamente envolvidos na produo, desde que ela os despoja de
funes mentais que consomem tempo e atribui a outrem essas funes. Tal
fato, contudo, no passou despercebido aos trabalhadores. Os sindicatos
acabaram por se mobilizar diante da gerncia cientfica do trabalho na medida
em que essas novas condies de produo se tornaram generalizadas.
Como bem nos lembram Rago & Moreira (1984), o discurso taylorista
constitui-se numa hbil estratgia de dominao social, visando delinear o perfil
de um trabalhador dcil, alienado, apostando na mera fora fsica (o conceito de
homem boi perfeitamente adequado nesse contexto) e na atomizao da
classe operria, agora motivada por incentivo/prmio por produtividade individual.
Tal realidade minava qualquer incentivo solidariedade, conscincia de classe,
luta por direitos coletivos. A produo individual passou a ser a grande promessa
por melhores salrios, rechaando as negociaes coletivas e as conquistas
oriundas das legislaes trabalhistas.
A legitimao do taylorismo, e mais tarde tambm do fordismo9, estava
justamente no argumento da cincia e da tcnica que eram habilmente
instrumentalizadas para servir aos interesses da burguesia. Esta operao
ideolgica permitiu mascarar o contedo poltico da tcnica de uma maneira
muito hbil, ou seja, dissociando a questo da tcnica da questo da poltica de
tal modo que ambas aparecem como elementos independentes.10
Essa desumanizao do trabalho, que agiu no sentido de subtrair a
capacidade crtica, a conscincia, a cidadania, a luta por direitos, tornando-o
facilmente substituvel e refm dos grandes monoplios, foi duramente combatida
pelos sindicatos. A Federao Americana do Trabalho fez guerra administrao
cientfica do trabalho. Em 1912, por presso dos sindicatos, houve um inqurito 8 Cmara dos Deputados, 62o Congresso, 2a. Sesso, Relatrio n 1.127, pg. 128. apud PETERSON, Florence. Sindicatos operrios norte-americanos. Rio de Janeiro: Agir,1953, p. 71. 9 O Fordismo, idealizado na dcada de 1910, por Henry Ford, na sua fbrica de automveis, a Ford Motor Company, nos EUA, foi responsvel pelo desenvolvimento de uma tecnologia apropriada para o sistema taylorista, delineando os princpios da produo em massa, com a implantao da linha de montagem.
Cludia Peixoto de Moura (Organizadora)
30
parlamentar contra Taylor e no foram raras as revoltas dos trabalhadores contra
os cronometristas e apontadores que vigiavam cada atividade empreendida pelos
operrios. Greves, entre 1911 e 1916, exigiram o cancelamento de tais medidas.
No tardou para que os novos operrios semiqualificados ou taylorizados
engrossassem as fileiras dos trabalhadores sindicalizados e comeassem a lutar
por seus direitos. O nmero de sindicalizados cresceu de dois milhes, em 1910,
para cinco milhes, em 192011.
5. SEGUNDO QUARTEL DO SCULO XX: A CONSOLIDAO DAS RELAES PBLICAS COMO ATIVIDADE PROFISSIONAL
Embora alguns autores, como CHAUMELY & HUISMAN12, considerem Ivy
Lee como o verdadeiro fundador das Relaes Pblicas, devido ao fato do
mesmo ser o fundador do primeiro escritrio mundial de Rel. Pblicas, no ano de
1906, em Nova Iorque, consenso que o incio da profisso aconteceu quando
William H. Vanderbilt, filho do Comodoro Cornelius Vanderbilt, pronunciou a
famosa expresso: The public be damned (O pblico que se dane). A declarao,
segundo Gurgel13, teria sido feita, em 1882, a um grupo de jornalistas de Chicago
sobre o interesse pblico a respeito de um novo trem expresso entre Nova Iorque
e Chicago. Vanderbilt, diante do descrdito que sua declarao produziu, tentou
desmenti-la, em entrevista posterior ao New York Times.
Tal ocorrncia, longe de ser um acontecimento pontual, o reflexo da
maneira como os dirigentes dos grandes monoplios norte-americanos se
posicionavam frente opinio pblica. Alguns desses grandes magnatas so
John D. Rockfeller, magnata do petrleo, J.P. Morgan, banqueiro, e o prprio
Vanderbilt, empresrio de estradas de ferro.
Nesta poca os Estados Unidos viviam o grande problema dos
monoplios. No caso das estradas de ferro, alguns poucos grupos, dentre os
quais o liderado por Vanderbilt, detinham a posse de quase todas as estradas de 10 RAGO, Luzia M. & MOREIRA, Eduardo. F. P. O que Taylorismo. S. Paulo: Brasilense, 1984, p. 27. 11 Idem. p . 45. 12 CHAUMELY, Jean. & HUISMAN, Denis. As Relaes Pblicas. So Paulo: Difuso Europia, 1964.
Histria das Relaes Pblicas
31
ferro do pas. Esse captulo da histria econmica americana v o modelo de
capitalismo, baseado no laissez-faire, lassez-passer, ser gradativamente
submetido a um maior controle do Estado, atravs de normas, regulamentaes e
legislaes, com o objetivo de destitu-lo do seu perfil excessivamente liberal e
totalmente descompromissado com os direitos e necessidades dos trabalhadores
e de toda a sociedade.
importante cruzar os dados histricos e confront-los com essas datas
da cronologia da evoluo histrica das Relaes Pblicas. William Vanderbilt,
autor da famosa sentena the public be damned, era um empresrio do ramo
das estradas de ferro. Seu pai, o comodoro Cornelius Vanderbilt, inaugurou, em
1851, quando a corrida do ouro rumo ao Oeste americano estava em alta, uma
linha de transporte ferrovirio, unindo a costa do leste Califrnia. Aps a Guerra
Civil americana, Cornelius expandiu o seu imprio a ponto de obter o controle, em
1867, da New York Central Railroad, chegando a ligar, via estrada de ferro, Nova
Iorque a Chicago, em 187314.
Em 1877, como vimos, houve uma grande greve dos trabalhadores das
estradas de ferro com grande repercusso em todos os Estados Unidos, e vinte
anos depois, em 1897, a Associao das Estradas de Ferro dos Estados Unidos
empregou, pela primeira vez, a expresso Relaes Pblicas (Public Relations),
com o significado que hoje se d ao termo, no seu Year Book of Railway
Literature15. preciso que no esqueamos que esse intervalo de tempo
representa um perodo histrico muito significativo no mbito econmico e social
para os Estados Unidos.
As prximas dcadas tambm esto repletas de fatos ligados ao
sindicalismo, como a grande greve dos ferrovirios de 1885 e a criao da
Associao Americana Antiboicote, em 1902.
Como podemos ver, o nascimento das relaes pblicas est inserido
numa poca de bastante efervescncia poltica, diretamente ligada aos fluxos e
contrafluxos do movimento sindical americano. Tal mobilizao da classe
trabalhadora despertou toda uma srie de estratgias para mobilizar a opinio
pblica, tarefa esta disputada tambm pela classe patronal, que, de muitas 13 GURGEL, Joo Bosco Serra. Cronologia da Evoluo Histrica das Relaes Pblicas. Braslia: Linha Grfica e Editora, 1985. 14 Ver http://www.infoplease.com/ce6/people/A0850423.html, capturado em 16.02.2005.
Cludia Peixoto de Moura (Organizadora)
32
maneiras, se aglutinou e tomou medidas para organizar-se como classe, tambm
com a preocupao de granjear uma opinio pblica favorvel s suas causas e
interesses. Esta profissionalizao, em matria de comunicao, tanto do
sindicalismo como do patronato, fez emergir as relaes pblicas como atividade
profissional.
O contexto histrico da sentena O pblico que se dane revela uma
sociedade atribulada pelas lutas, reivindicaes e arregimentao da classe
trabalhadora que reverberava o slogan proletrios de todo mundo, uni-vos,
proclamado pela Internacional Comunista e descrito no Manifesto Comunista.
Este ltimo, inclusive, traduzido nos EUA em 1871 onze anos antes do fato
considerado marco inicial das Relaes Pblicas.
A grande importncia, aqui, deve ser dada opinio pblica. Percebe-se
que quando a sociedade civil americana comea a organizar-se, surge a
necessidade da profisso de relaes pblicas. Tal atividade, que tem como
princpio, nesse perodo, persuadir a opinio pblica, tornando-a favorvel a
diferentes causas e princpios (trabalhadores ou patres), revela possuir um
fundamento claramente poltico. Surge como fruto de mobilizaes e
reivindicaes ocorridas, essencialmente, na esfera poltica. O que no pode
tambm passar despercebido que este procedimento, inicialmente surgido em
alguns segmentos sociais especficos, acabou, depois, por ser incorporado pela
prpria esfera governamental.
Em 1903, um ano aps o surgimento da Associao Americana
Antiboicote, Ivy Lee, jornalista e publicitrio, despontou no cenrio norte-
americano, escrevendo artigos para jornais, como press agent (agente de
imprensa), sugerindo um tipo de atividade para relacionamento das instituies
com seus pblicos.16 Na verdade, no se trata de mais uma atividade
propagandista com a finalidade de divulgar uma instituio, um governo ou uma
personalidade, mas sim de traar estratgias para relacionar-se com os
diferentes pblicos, ainda que nesta fase inicial da profisso tenha prevalecido
uma orientao calcada no suborno e aliciamento da imprensa e de muitos
jornalistas dos grandes jornais da poca.
15 GURGEL, Op. cit. p. 09. 16 GURGEL, Op. cit., p. 10.
Histria das Relaes Pblicas
33
A histria da atuao de Ivy Lee, como profissional de Relaes Pblicas,
est voltada para as grandes empresas e para os mais proeminentes magnatas
daquele perodo. O perodo compreendido entre 1903 a 1914 foi marcado, nos
EUA, por uma intensa campanha contra o big business americano. Nesta fase
surgem em cena os muckrakers17 (exploradores de escndalos) que atravs de
reportagens e artigos em pequenos opsculos, revistas e jornais, denunciam a
corrupo existente tanto no mbito governamental como no privado. As grandes
empresas eram acusadas da prtica de monoplio, atravs da formao de
cartis, com o objetivo de barrar a livre concorrncia; tambm havia denncias
referentes ao pagamento da mo-de-obra com salrios de fome e ainda a
existncia de conluios entre empresas e governo para salvaguardar transaes
escusas entre ambos. Alm disso, tais escndalos tambm expunham mostra
os truques sujos utilizados pelas grandes empresas para eliminar as suas
congneres de menor porte: sabotagem, dumping, formao de cartis, trustes e
consrcios.
Grandes escritores norte-americanos da poca, como Upton Sinclair18,
Theodore Dreiser, Lincoln Steffens, David Phillips, Jack London e Ida Tarbell19,
dispararam crticas, em muitas de suas obras, contra os magnatas da economia
americana. Nesse perodo, as empresas ferrovirias20 foram as mais atingidas
por essa onda de denncias, bem frente at mesmo das grandes companhias
financeiras e de petrleo. justamente nesta poca que as empresas
ferrovirias, segundo Gurgel, organizaram uma contra-ofensiva a essa onda de
crticas, montando uma assessoria de imprensa e Relaes Pblicas, como foi
chamada na poca.
Outro importante feito de Lee foi, em 1906, atuar na George F. Baer &
Associates, tendo desempenhado um papel muito importante durante uma crise
originada a partir de uma greve ocorrida numa indstria de carvo. Nessa
17 A mesma denominao vlida, de uma forma genrica, para revistas de forte apelo poltico, muito afeitas a polmicas, que tinham como objetivo defender os interesses do operariado norte-americano daquela poca. 18 Autor da famosa novela The Jungle, de 1906, denunciando as condies insalubres em que trabalhavam os operrios dos frigorficos de Chicago. 19 Esta autora escreveu, tambm em 1906, The history of the Standard Oil Co denunciando as improbidades dessa empresa do ramo petrolfero, liderada por John D. Rockfeller, fato que constrangeu o governo americano (Theodor Roosevelt) a entrar na justia contra a Standard Oil Co., acusando-a da prtica ilegal de monoplio. 20 Estas empresas, juntamente com aquelas dos ramos de finanas, siderurgia e petrleo, lideravam o ranking da concentrao do capital nos EUA.
Cludia Peixoto de Moura (Organizadora)
34
ocasio, Ivy Lee inaugurou a etapa das Relaes Pblicas baseadas na mxima
de que o pblico deve ser informado, um verdadeiro paradigma da atividade de
RP, baseado na sua Declarao de Princpios, que determina o seguinte:
Este no um Departamento de Imprensa secreto. Todo nosso trabalho feito s claras. Pretendemos divulgar notcias, e no distribuir anncios. Se acharem que o nosso assunto ficaria melhor como matria paga, no o publiquem. Nossa informao exata. Maiores pormenores sobre qualquer questo sero dados prontamente e qualquer redator interessado ser auxiliado, com o mximo prazer, na verificao direta de qualquer declarao de fato. Em resumo, nossos planos, com absoluta franqueza, para o bem das empresas e das instituies pblicas, divulgar imprensa e ao pblico dos Estados Unidos, pronta e exatamente informaes relativas a assuntos com valor e interesse para o pblico21.
Em 1909 Ivy Lee tornou-se o responsvel pelo setor de divulgao e
propaganda da Pennsylvannia Railroad, empresa onde permaneceu at 1914.
Fica claro que a atividade desenvolvida por Lee no pode ser considerada uma
extenso dos servios de publicidade e propaganda da poca. At mesmo
porque o seu cunho poltico; trata-se de um mtier preocupado em manter um
relacionamento satisfatrio com seus diferentes pblicos. Tal ao
desenvolvida de forma profissional, capaz de dar um direcionamento lgico e
ordenado a partir de um conjunto de estratgias, previamente planejadas, com o
objetivo de compor uma poltica de comunicao direcionada para os pblicos de
uma organizao. No se tratava de uma extenso ou desdobramento da
publicidade e propaganda, mas sim, de uma nova e especfica atividade
profissional. Uma atividade profissional que nasce em decorrncia das
transformaes ocorridas na sociedade americana, mas especificamente na
esfera poltica, tendo como ponto de partida as lutas e reivindicaes do
operariado.
Dando continuidade trajetria de Ivy Lee, merece registro o trabalho
prestado, no ano de 1914, por Lee para a famlia Rockfeller. Os Rockfeller
estavam sendo detratados pela imprensa norte-americana, em decorrncia dos
maus tratos impingidos aos grevistas em uma de suas empresas, a Colorado
Fuel and Iron Co. A estratgia de Lee foi trabalhar a imagem pessoal de John
Histria das Relaes Pblicas
35
Rockfeller, atravs de aes de filantropia e benemerncia, o que culminou por
notabiliz-lo como grande filantropo perante a opinio pblica. Para alguns
autores, tal fato representa o incio da preocupao com o papel social dos
negcios.
Finalizando, temos, em 1916, a abertura da Lee & Harris & Lee, empresa
de consultoria de Relaes Pblicas, constituda e administrada por Ivy Lee.
Esse cotejo entre o nascimento das Relaes Pblicas e o sindicalismo
americano do final do sculo XIX e incio do sculo XX revela que a gnese
da profisso encontra-se estreitamente relacionada com os embates entre os
operrios e grandes empresrios mais especificamente aqueles que eram
dirigentes de grandes companhias de transporte ferrovirio. Tal assertiva se
comprova com os fatos histricos j aqui descritos e ainda com um
acontecimento que pode ser considerado como emblemtico. Em 1913, J.
Hampton Baumgartner, da Baltimore-Ohio Railroad, proferiu uma conferncia, na
Virginia Press Association, cuja temtica versava diretamente sobre Relaes
Pblicas: As Estradas de Ferro e as Relaes Pblicas,22 advertindo os
empresrios do ramo a desenvolverem um trabalho intensivo de relacionamento
com seus pblicos atravs da imprensa.
Enquanto o sindicalismo se fortalecia e organizava, tendo como meta
conscientizar trabalhadores e sociedade, o patronato desenvolvia toda uma srie
de conhecimentos e estratgias voltadas para salvaguardar seus interesses,
como a criao de movimentos e associaes patronais e o financiamento de
teorias administrativas com a conseqente elaborao de tcnicas capazes de
implantar tais pressupostos tericos; tais transformaes levaram as empresas
da poca a serem submetidas a processos de reengenharia administrativa,
econmica, poltica etc. No bojo de tais transformaes, surgem as Relaes
Pblicas.
21 GURGEL, Op. cit. p. 12. 22 GURGEL, Op. cit. p. 14.
Cludia Peixoto de Moura (Organizadora)
36
6. A CRISE DE 1929 E A ERA ROOSEVELT: AS RELAES PBLICAS NA ESFERA GOVERNAMENTAL
O cenrio poltico norte-americano na dcada de vinte do sculo passado
era tenso. As idias socialistas fervilhavam. Se o manifesto comunista
desencadeou o medo do fantasma do comunismo que pairava sobre governos e
naes, a Revoluo Russa despertou ainda mais temor.
A revoluo russa provocou, nos Estados Unidos, a solidificao de vrios
grupos da ala esquerda, como os sindicalistas, anarquistas e radical-
socialistas.23 Somado a isso, temos o lanamento oficial do partido comunista
americano em 1920. Dentre as instrues da Internacional Comunista estava a
de fazer propaganda do partido, das idias marxistas e da revoluo.
Com a Crise de 1929, decorrente do colapso da Bolsa de Valores de Nova
Iorque, os Estados Unidos com reflexos em todo o orbe enfrentam
turbulncias de toda espcie. As conseqncias do crack da Bolsa nova-iorquina
foram desastrosas, basta frisar que em decorrncia dela foi gerado um exrcito
de mais de doze milhes de desempregados. Havia a necessidade, destarte, de o
governo tomar medidas rpidas e eficazes para afastar as violentas crises sociais
que poderiam desaguar em uma revoluo, haja vista a forte mobilizao da
esquerda americana nesse sentido. Tambm a ascenso de regimes totalitrios,
como aconteceu (,) na Itlia e na Alemanha, constituiu-se em uma outra ameaa
democracia americana.
Para isto, saber lidar com a opinio pblica da sociedade americana
tornou-se uma tarefa indispensvel:
Com a grande crise de 1929, a informao deixou de ser um luxo: tornou-se uma necessidade. Abraham Lincoln tinha-o dito: Com a opinio pblica nada pode malograr; sem ela nada pode resultar bem. Esse apelo opinio pblica tornou-se especialmente urgente pela existncia de mais de doze milhes de desempregados. No fcil recordar de que uma revoluo iminente tenha podido ameaar os americanos da dcada de 3024.
23 PETERSON, Florence. Op. cit. p. 82. 24 CHAUMELY, Jean & HUISMAN, Denis. Op. cit. p. 12.
Histria das Relaes Pblicas
37
A dcada de 30 foi carregada de embates. Socialistas e comunistas
advogavam a abolio do capitalismo25, agora com muito mais poder de
persuaso em face do estado de crise. Contudo, a posse de Franklin Delano
Roosevelt presidncia dos Estados Unidos iniciou a chamada Era
Rooseveltiana (1933-1945), perodo de intensas articulaes para garantir a
sobrevivncia da sociedade americana, em meio pior crise do capitalismo em
toda a histria.
Vrias foram as medidas adotadas por Roosevelt atravs do New Deal
(novo acordo) na dcada de 30. Os ganhos trabalhistas foram muitos durante o
perodo de vigncia do New Deal. A disputa pela opinio pblica norte-americana
sinaliza importantes vitrias para os operrios americanos:
A mar antitrabalhista comeou a baixar antes que se alcanassem as profundezas da depresso. Em 1932, somente trs anos depois do Grande Pnico de 1929, o Congresso aprovou a Lei Norris-LaGuardia, que tornou mais difcil para os tribunais federais a emisso de interditos contra organizaes trabalhistas (....). A opinio pblica retirava seu apoio ao big business, j que muita gente acreditava que os empregadores eram quem tinham causado a Grande Depresso da dcada de 3026.
O clima favorvel para a organizao sindical, atravs de uma profcua
legislao nesse sentido, foi claramente observado nas aes decorrentes do
Novo Acordo, com uma srie de medidas tomadas poca, tais como a
legalizao dos sindicatos e do direito de greve; fixao do salrio mnimo;
proibio do trabalho s crianas; jornada de trabalho de 40 horas semanais;
criao do seguro desemprego; frentes de trabalho financiadas pelo governo para
absorver mo-de-obra ociosa e, por fim, uma forte interveno do Estado na
economia legislao antitrustes, protecionismo, moratria, privatizaes etc.
Alm de todas essas medidas, uma srie de aes foram direcionadas,
especificamente, para viabilizar um dilogo com a opinio pblica. Foram
organizados os servios de imprensa, nos principais rgos federais, somados
distribuio oficial de credenciais aos redatores de jornais, dando-lhes todo o
25 GALBRAITH, John Kenneth. O colapso da bolsa, 1929: anatomia de uma crise. Rio de Janeiro: Expresso e Cultura, 1972, p. 196. 26 MARSHALL, F. Ray & RUNGELING, Brian. O papel dos sindicatos na economia norte-americana. Rio de Janeiro: Forense Universitria, 1980, p. 58.
Cludia Peixoto de Moura (Organizadora)
38
direito de ter acesso irrestrito s informaes dos rgos pblicos. As famosas
conversas ao p do fogo, atravs da emisso semanal em cadeia nacional de
rdio, era tambm uma forma do presidente prestar contas da atuao do
governo perante o povo americano. Houve ainda a criao das press
conferences, que aconteciam, em mdia, 250 vezes ao ano; um trabalho que era
complementado com a interveno dos chamados agentes especiais,
funcionrios do governo destinados a esclarecer a opinio pblica atravs de
contatos pessoais com os diferentes setores da sociedade civil.
Neste perodo percebemos a incorporao das atividades de Relaes
Pblicas pela esfera governamental. Justamente numa poca onde tornou-se
fundamental estabelecer formas de relacionamento, participao e dilogo com
diferentes setores da sociedade americana, esta ltima cada vez mais articulada
e organizada, capaz de expressar-se e informa-se via meios de comunicao de
massa. O jornalismo de denncia, os movimentos sindicais, os escritores
defensores da causa operria, as idias socialistas, a crise econmica mundial, a
ameaa de uma revoluo comunista, o surgimento de governos ditatoriais da
Europa, a situao de convulso social que vivia a sociedade americana,
acabaram por solidificar e consolidar, a partir da Era Rooseveltiana, a profisso
de Relaes Pblicas no mbito governamental.
Vrios momentos so esclarecedores dessa filosofia de Relaes
Pblicas, presente no governo Roosevelt. Soube utilizar-se do lobby, fazendo
presso sobre o congresso, atravs da mdia27. Seu governo, com um perfil
profundamente marcado pelo walfare-state, tentou, de diversas maneiras,
estabelecer formas de prestar assistncia social aos mais carentes. Tal ao,
exercida de forma planejada e fazendo parte de toda uma estratgia poltica,
acabou por auferir, para seu governo, uma boa aceitao por parte do povo
norte-americano: O governo foi incumbido de ajudar os necessitados e isso
ampliou a experincia de seus funcionrios, dando-lhes conhecimentos de muitos
problemas que antes estavam alm de seu alcance; criou uma sabedoria que
podia ser posta a servio dos indivduos.28
27 FREIDEL, Frank Burt. Franklin D. Roosevelt: a rendezvouz with destinity. New York: Little, Brown and Company, 1990, p. 99. 28 WOODS, John A. Roosevelt e a Amrica Moderna. Rio de Janeiro: Zahar, 1693, p. 178.
Histria das Relaes Pblicas
39
Como podemos perceber, a sociedade civil americana, j fortemente
organizada, pressionava o governo para atender suas reivindicaes. Era
necessrio ceder, conhecer suas necessidades mais iminentes, prestar-lhe
contas das aes e medidas governamentais. Tornou urgente e prioritrio correr
atrs da aprovao popular com a concretizao de medidas que visassem
atender as demandas da populao.
Esta orientao dialgica e consensual torna-se evidente, por exemplo, na
poltica exterior do governo Roosevelt, que pautou-se pelos princpios do dilogo,
informao, consenso, entendimento e negociao. Exemplo disso foi a
elaborao do plano de criao da ONU, da elaborao da Carta do Atlntico
salvaguardando o princpio de autodeterminao dos povos , somados
renncia da poltica de fora na regio do Caribe e a fundao do Bir
Interamericano. Este ltimo era destinado aplicao da poltica da boa
vizinhana, voltada para a Amrica Latina e orientada atravs do princpio de
cooperao e solidariedade entre os EUA e os pases latino-americanos.
Muitos autores citam esse perodo como uma poca de grande revoluo
das relaes pblicas, em decorrncia da assimilao da profisso pelo setor
governamental, acabando por verdadeiramente legitimar a atividade de Relaes
Pblicas. Prova conteste de tal assertiva foi a publicao, no ano de 1936, do
livro intitulado Public administration and the Public Interest, de autoria de
Pendleton Herring, registrado como o primeiro livro sobre Relaes Pblicas
governamentais29. Pouco antes disso, em 1934, iniciou-se uma grande
disseminao de cursos de Relaes Pblicas nos Estados Unidos, fato que s
veio a fortalecer-se durante e aps a segunda guerra mundial.
7. CONCLUSO
Esta abordagem do nascimento das Relaes Pblicas, considerando o
contexto econmico, social e poltico da poca, bastante esclarecedora para
que se possa estabelecer com clareza a verdadeira natureza e funo das
Relaes Pblicas. Percebemos que a profisso nasce como resultado do
fortalecimento do movimento sindical, embalado pela ideologia marxista, com
29 GURGEL, Op. cit, p. 21.
Cludia Peixoto de Moura (Organizadora)
40
todos seus diversos matizes, algo to em voga poca. A sociedade civil
fortalece-se, organiza-se e os grupos sociais, frutos desse amadurecimento
poltico, comeam a fazer valer sua cidadania; cobram do governo seus direitos;
denunciam, atravs da mdia, os desmandos e as prticas corruptas das quais o
governo e iniciativa privada articulavam em conjunto. A opinio pblica se
fortalece apoiada nos meios de comunicao de massa.
Diante de tal panorama, era necessrio desenvolver habilidades voltadas
para o entendimento, a negociao, a importncia e a relevncia das opinies
dos diferentes pblicos. Era, assim, cada vez mais difcil, para uma organizao,
legitimar-se sem tais prerrogativas; afinal, a era dos terrveis monoplios, dos
patres de direito divino, da grande explorao dos trabalhadores por fraude ou
diferentes tipos de violncia entrava em declnio. A sobrevivncia no mundo dos
negcios e o xito nas administraes governamentais voltam seu foco para a
conquista da opinio pblica.
Na verdade, as relaes pblicas possuem uma natureza e uma funo
poltica. Foram graas aos embates, choques, oposies e resistncias, entre as
diferentes classes sociais, que surgiu o despertar de operrios, empresrios e
governo para o investimento em polticas e aes de comunicao. Estava,
assim, firmado um ambiente propcio e adequado para o nascimento da profisso
de relaes pblicas.
interessante notar que, no Brasil, as Relaes Pblicas surgem
especialmente voltadas para a administrao pblica, amparada por decretos-lei
que instituam servios de informao, divulgao e publicidade de vrios rgos
pblicos. A ditadura de Getlio Vargas, na dcada de 40, por exemplo, tinha, em
matria de comunicao, o objetivo de elaborar e utilizar tcnicas de persuaso,
tendo em vista a perpetuao do poder; os esforos nessa rea foram pautados
pela demagogia e pela mera utilizao da publicidade governamental30.
A realidade brasileira era bastante distante da situao de efervescncia
poltica, econmica e social vivida pelos Estados-Unidos, quando do nascimento
das Relaes Pblicas. Tal fato marcou sobremaneira as Relaes Pblicas no
Brasil. O conceito da profisso no Brasil reflete esse momento inicial de forma por 30 Podemos citar, a esse respeito, o clebre Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP) do governo Vargas, criado por decreto presidencial, em 1939, que tinha como objetivo difundir a
Histria das Relaes Pblicas
41
demais significativa. Por no estar atrelada a uma prtica democrtica e s
questes polticas, sociais e econmicas da decorrentes as Relaes Pblicas,
no seu nascedouro, j no foi utilizada em todo seu potencial; brotam e se
disseminam privadas da sua verdadeira eficcia, importncia e amplitude.
Contudo, percebemos que atualmente as Relaes Pblicas voltam a
inserir-se no cerne das grandes questes contemporneas. Fala-se de uma
revivescncia da profisso a partir do fortalecimento dos movimentos sociais de
demanda especializada, to bem representados pelas ONGs e demais grupos e
associaes pertencentes sociedade civil. De fato, com a constatao do
fortalecimento da chamada sociedade do espetculo, em que a prestao de
contas para com a opinio pblica preterida em favor do impacto e visibilidade
meramente publicitrios, geralmente pertencentes a processo de
espetacularizao e estetizao31 do cotidiano, surge o receio das Relaes
Pblicas regredir para seu estgio inicial, quando muitas vezes as atividades
profissionais estavam voltadas para a fabricao de uma imagem favorvel via
de regra de forma falaciosa e fraudulenta de pessoas e instituies, sem
possuir uma proposta verdadeira e consistente de dilogo, consenso, negociao
e conciliao entre interesses e partes divergentes.
Vivemos uma crise da poltica, com o conseqente enfraquecimento dos
sindicatos, dos partidos polticos, do parlamento, e, em decorrncia disso, o
horizonte otimista para o crescimento e a expanso das Relaes Pblicas est
exatamente no terceiro setor, que para muitos no sem ressalvas e crticas
onde a prtica da cidadania, a conscincia poltica e articulao social, em busca
do consenso, parecem abrir portas para o exerccio da profisso de RRPP,
preservando a sua funo essencialmente poltica.
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS
BAUDRILLARD, Jean. A sociedade do consumo. Lisboa: Edies 70, 1995.
BAVERMAN, Harry. O trabalho e capital monopolista: a degradao do trabalho no sculo XX. Rio de Janeiro: Zahar, 1981. ideologia do Estado Novo, organizando manifestaes cvicas, exposies, conferncias, e outros eventos de carter propagandista. 31 Ver BAUDRILLARD, Jean. A sociedade do consumo. Lisboa: Edies 70, 1995.
Cludia Peixoto de Moura (Organizadora)
42
CHAUMELY, Jean. & HUISMAN, Denis. As Relaes Pblicas. So Paulo: Difuso Europia, 1964.
FARAGHER, John Mack. Rereading Frederick Jackson Turner: The significance of the frontier in American history. New Haven/Connecticut: Yale University Press, 1999.
FREIDEL, Frank Burt. Franklin D. Roosevelt: a rendezvouz with destinity. New York: Little, Brown and Company, 1990.
GALBRAITH, John Kenneth. O colapso da bolsa, 1929: anatomia de uma crise. Rio de Janeiro: Expresso e Cultura, 1972.
GURGEL, Joo Bosco Serra. Cronologia da Evoluo Histrica das Relaes Pblicas. Braslia: Linha Grfica e Editora, 1985.
LASKI, Harold J., O manifesto comunista de 1848. Rio de Janeiro: Zahar, 1967, p. 31.
MARSHALL, F. Ray & RUNGELING, Brian. O papel dos sindicatos na economia norte-americana. Rio de Janeiro: Forense Universitria, 1980.
MOTA, Carlos Guilherme. 1822: Dimenses. So Paulo: Perspectiva, 1986.
PETERSON, Florence. Sindicatos operrios norte-americanos. Rio de Janeiro: Agir,1953.
RAGO, Luzia M. & MOREIRA, Eduardo. F. P. O que Taylorismo. S. Paulo: Brasilense, 1984.
WOODS, John A. Roosevelt e a Amrica Moderna. Rio de Janeiro: Zahar, 1693.
Sites:
http://www.novomilenio.inf.br/festas/trab01.htm , capturado em 08.02.2005
http://www.infoplease.com/ce6/people/A0850423.html, capturado em 16.02.2005.
Histria das Relaes Pblicas
43
(Re)Construindo a histria das Relaes Pblicas
Cleusa Maria Andrade Scroferneker 32 (PUCRS)
Resumo
A polissemia do termo, a diversidade de definies, associada a
discusses infindveis (e, s vezes, incuas) sobre a usurpao dos espaos
por outras reas, tem sido, em grande parte, responsabilizada pelos inmeros
equvocos sobre a importncia e atuao das Relaes Pblicas. Essa uma
parte da histria, especialmente no Brasil. provvel, contudo, que o momento
atual vivido pelas organizaes e mesmo pelos cursos de Relaes Pblicas
esteja permitindo a construo de uma outra etapa dessa histria que busca na
reflexo terica a aproximao mais consistente com a prtica.
* * * * *
A proposta do presente texto, com certeza, no original, a medida que
objetiva refletir (novamente) sobre algumas questes que envolvem a rea de
Relaes Pblicas. A originalidade, talvez, esteja na reflexo guiada pelo
pensamento moraniano. A opo pela Complexidade se justifica, pois se acredita
ser necessrio a (re)construo da histria das relaes pblicas, tendo como
referncia(s) outro(s) paradigma(s).
Opta-se igualmente pela expresso rea na tentativa de minimizar os
impasses conceituais que o prprio termo encerra, como bem assinalou Simes
(1995, pp.45) O termo Relaes Pblicas polissmico. (...) verifica-se essa
assero observando-se o discurso de todos aqueles que tratam do assunto, pois
com estas duas palavras visam identificar vrios objetos.
Para Frana (2003, p.129), difcil tentar encontrar os caminhos pelos
quais se chegou formao do conceito de relaes pblicas no Brasil.
32 Doutorado em Cincias da Comunicao Escola de Comunicao e Artes/Universidade de So Paulo ECA/USP e Professora Titular Faculdade de Comunicao Social FAMECOS e do Programa de Ps-Graduao em Comunicao PPGCOM da Pontifcia Universidade Catlica do Rio Grande do Sul PUCRS.
Cludia Peixoto de Moura (Organizadora)
44
Polissmicas em suas manifestaes, elas fazem que cada interlocutor as veja
na medida de sua percepo.
Essa polissemia, por sua vez, impregna as inmeras definies mais de
100 revelando as incongruncias e vicissitudes de uma rea relativamente
recente no Brasil. Em artigo publicado em 1999, Moura e Scroferneker33 j
constatavam, aps anlise das definies de Rel