M H º 129-6 D 0 5 A cadeia fica situada num edifício velhíssimo, … · 2018. 6. 24. · 44 S...

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44 SEMANÁRIO ALTOMINHO Nº 1219 - 6 DEMAIODE 2015

"A cadeia fica situada ... num edifício velhíssimo,que fornece lamentável espetáculo de miséria e sordidez"

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O FIM DA CLAUSURA | OS ÚLTIMOSANOS DE FUNCIONAMENTO

DA CADEIA VELHA DE PONTE DE LIMA

Esta investigação insere-se noestudo de uma fração do passado,não tão distante mas que realça asdiferenças da estrutura socioeconó-mica de um país e sobretudo, deuma região em particular, uma loca-lidade rural.

Um trabalho no âmbito do‘Arquivo e Memória’ requer umapequena ‘viagem no tempo’ de for-ma a conceber reflexões válidas quepossibilitem que o projeto tenha umdesfecho plausível.

Para além de ter contactadoinvestigadores e professores de áreastangíveis com aquilo que pretendiaestudar, as minhas principais fontesinformativas, que me possibilitaramrecolher os dados a analisar, foram aBiblioteca Municipal de Ponte deLima, o Arquivo Municipal dePonte de Lima, A Direção Geral deReinserção e Serviços Prisionais e ocontributo de cidadãos limianos,nomeadamente testemunhos ecuriosos.

A partir destas fontes informati-vas foi-me possível descobrir foto-grafias e vídeos inéditos, exumarmemórias sobre o funcionamentodo estabelecimento e relatórios deinspeção da DGRSP.

A primeira fotografia selecionadapara análise retrata o edifício daCadeia Velha rodeado de transeun-tes que se apropriam do espaçopúblico. Numa análise preliminar épossível reconhecer homens e

mulheres com trajes específicos e,em pano de fundo, temos o retratoda Cadeia. A fotografia é a preto ebranco e, por esse motivo, sabemosque pertence aos primeiros anos deexistência de máquinas fotográficas.

É possível identificar que umjovem leva em cima da cabeça, umcesto, mas não se consegue ver o seuinterior. As pessoas parecem estaratarefadas e conversam entre elassem dar, especial atenção ao edifícioque está atrás deles. Uma mulhercarrega aos ombros um saco pesadoe descobre-se entre a multidão,encostado à parede uma série decabos de madeira.

Se olharmos mais em pormenorvemos que a porta está rodeada deum material que indicia cimento,que existem algumas aves permane-cem nas grades das janelas. Umolhar mais atento vai dissecar a ima-gem e encontrar desde a janela mais

alta até à rua um cordel branco emtoda a sua extensão. E a amarraresse cordel uma mão.

Esta fotografia foi captada pelafigura popular Conde d’Aurora, umentusiasta e curioso que gostava decaptar fotograficamente os dias defeira. Retratava em detalha a feiraquinzenal de Ponte de Lima. OConde d’Aurora era das poucas pes-soas que tinha uma câmara fotográ-fica na sua época.

Não foi possível identificar o ano,mas sabe-se, que esta fotografiaremonta a década de 50 e pertenceao Arquivo da Casa d’Aurora.

Após esta análise é possível con-cluir que esta fotografia desenha amargem que separa um espaço deencarceramento da tradução culturalque é um dia de feira.

O contacto entre os presos e ostranseuntes revela-se num fio decordel, invisível aos olhares pregui-

çosos, um pormenor que diz muitomais do que aparenta ser. No entan-to este objeto está distante do olharimpressionista. Existe uma ligaçãoentre dois espaços, mas um pareceser neutro face à multiplicidade dooutro.

A segunda fotografia que decidianalisar retrata um espaço despidode corpos, que se complementa como modo cru e forense como os ele-mentos pictóricos estão dispostos.

Esta imagem pertence ao arquivoda DGRSP, está datada do ano de1959, não se sabe a autoria da pes-soa que a captou mas é percetívelque foi tirada por um fotógrafoamador (talvez um funcionário daDGRSP) e tem como legenda:‘Vista parcial da cela dos homens (amais sombria) ‘. Esta fotografia fazparte de uma série de oito fotogra-fias pedidas à Secretaria Judicial dePonte de Lima para complementarum relatório de inspeção à CadeiaVelha.

Em suma esta imagem tem umcaracter mais forense e inalteradodo que a primeira (etnografiavisual). Transparece as condições deaprisionamento da Torre, que sereconhecem precárias e muito limi-tadas. Esta série de fotografias éúnica e nunca foi revelada ao públi-co. No entanto confere um grau deveracidade relativamente às descri-ções feitas por cidadãos limianos,verbalmente.

É uma imagem que revela comoviviam os enclausurados e de queforma comunicavam para o exterior.O saco preso ao cordel é uma parti-cularidade a ressalvar na medida em

que é crucial para entender de queforma subsistiam os presos.

A terceira análise incidiu sobreuma imagem em movimento.

As cenas selecionadas descrevemo edifício da Cadeia e o espaço emseu redor. Vemos a rua que está emfrente ao edifício, como era a dispo-sição das casas e árvores, mas não épossível ver para dentro da Cadeia.

A terceira cena selecionada figuraa capela construída na mesma cotaque a janela lateral do edifício amando de um cidadão emigrante,para que os presos pudessem ver eouvir as missas. Nessa cena é possí-vel identificar uma senhora idosa eum provável casal sentado na esca-daria.

Na quarta cena selecionada iden-tifica-se uma mulher com um bebéno regaço a subir um escadório queleva à parte de trás do edifício daCadeia.

A ‘parte de trás’ da Cadeia é retra-tada na cena seguinte, composta porum casal com uma criança. O arcoentre a Cadeia e a Capela é retrata-do quando passa uma mulher comum cântaro de água.

A escolha das cenas onde se per-ceciona inúmeras mulheres a lavar aroupa no Rio Lima, denominadasvulgarmente como ‘lavadeiras’. Aco-pladas a estas imagens é possívelvisualizar as roupas estendidas noareal mesmo em frente da Torre daCadeia.

Esta peça videográfica faz partede um programa da série ‘Terras dePortugal’ e foi dirigida por ReinaldoVarela em 1963 para a Rádio eTelevisão Portuguesa (RTP).

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A escolha deste vídeo prende-se pelo factode ser o primeiro vídeo filmado em Ponte deLima e em que a Cadeia é retratada aquandodos últimos anos de funcionamento.A conveniência das cenas selecionadas reve-

la-se no facto de explanar como era o espaçoda vila que circundava o edifício. Quais oshábitos dos cidadãos na década de 60 e sobre-tudo qual era a imagem que os presos tinhamao alcance do seu olhar, isto é, o que elespodiam efetivamente ver para além das gra-des. As ‘lavadeiras’ fazem parte do quotidianodos encarcerados por serem a principal vista apartir daTorre.Relativamente aos relatórios de inspeção, os

signos são completamente arbitrários e reme-tem para uma decifração de um código domi-nante. Não tendo em conta o código da lín-gua portuguesa, o símbolo do Ministério daJustiça reconhece o documento como oficial econcernente às normas do estado.No cabeçalho é notória a indicação do Ser-

viço de Inspeção por parte da DGRSP e areferência à Cadeia Comarcã de Ponte deLima.No relatório de inspeção existe uma parte

escrita à mão, uma caligrafia pouco percetívelmas onde se destacam os vocábulos ‘carcereiro’e ‘fama’.No corpo de texto os fragmentos com mais

relevância nesta análise são:"É mais uma cadeia sem condições no que

este círculo é fértil.""As retretes são uns buracos, não há vidros

nem redes nas janelas. Não há camas mas unsestrados de madeira, as mantas são insuficien-tes e a instalação elétrica precisa de reparaçãourgente. Já há água na Cadeia.""Carcereiro: Chama-se Albertino Rodri-

gues Martins, tem 26 anos de idade e 1 deserviço.Vence 800$00 e não tem casa.""Rancho: Compõe-se de café e ao almoço e

ao jantar 1 litro de sopa forte e 600 grs. de pãode milho. É pouco variado e de deficientevalor nutritivo.""Higiene: Não há banho por falta de condi-

ções. Os reclusos cortam a barba 1 x porsemana e o cabelo 1 x por mês.""Religiosa: o arcipreste visita frequente-

mente os reclusos e confessa-os pela Páscoa."Nos trechos sublinhados é possível identifi-

car fielmente, através das palavras do inspetor,quais eram as condições de higiene, o quoti-diano das refeições, o nome do carcereiro ematividade, o que comiam e quanto custavamdeterminados serviços ao estado. Até o venci-mento do carcereiro é identificado.Há uma transparência cruel mas autêntica

do espaço, é possível reconhecer uma preocu-pação pelas condições em que permaneciamos reclusos.Neste relatório não é clara a ideologia

dominante, mas através da exploração decomo funcionava a cadeia podemos deduzirque a realidade que se apresenta nesta cadeiaera similar a tantas outras comarcãs e de certomodo é o reflexo da política vigente no ano dapublicação do relatório.No segundo relatório datado de 1958, escri-

to no Porto, reconhecemos um símbolo dife-rente, nomeadamente, a Procuradoria daRepública – Junta da Relação do Porto.Destavez o relatório é dirigido ao Diretor dos Ser-viços Prisionais."A cadeia fica situada ao centro da vila,

num edifício velhíssimo, que fornece umlamentável espetáculo de miséria e sordidez.""Dada a sua situação é impossível evitar o

contato dos presos com o exterior, o que per-mite, por vezes, aos mais audazes conseguirinstrumentos para efetuar ou tentar evasão.""Onde se misturam indiscriminadamente

os delinquentes primários com indivíduos jácadastrados."Nos excertos selecionados é relevante notar

que o procurador da república vê a Cadeia dePonte de Lima como um lamentável espetá-culo de miséria, ou seja, que os presos são des-pidos de vergonha e são expostos a toda a vila,que a frequente comunicação com o exteriorfacilita a fuga e que não há separação dosreclusos nem pelo tipo de crime nem pelo seucomportamento.No ano em que este relatório foi publicado

a Cadeia não tinha carcereiro, o que pode jus-tificar as palavras impiedosas que traduzem arealidade da Cadeia. O trecho colocado a ver-melho e sugere urgência e alarme perante asituação.Neste relatório é possível identificar uma

relação direta com a ideologia dominanteatravés da congratulação típica do EstadoNovo: ‘A Bem da Nação’.O saco retratado na primeira imagem é um

ícone, uma referência transversal a váriasentrevistas e testemunhos, onde os presosconseguiam contatar com o exterior atravésdeste método.O objeto que servia como rece-táculo varia entre saco e lata nos diferentesdiscursos mas é comparável a um método uti-lizado atualmente nos espaços prisionais,denominado como ‘elevador’.Os presos eram estigmatizados e envergo-

nhados nos dias de maior afluência de cida-dãos na vila, isto é, nos dias de feira.Os retratos verbais, as imagens mentais do

interior da Cadeia são verificados através dasfotografias anexas aos relatórios de inspeção,onde se pode visualizar as condições precáriasde aprisionamento, a insalubridade do edifícioe os recursos nefastos para subsistência.Foi possível constatar que os presos estavam

em contato permanente com o exterior, atra-vés do método de ‘elevador’ ou através defugas.Que o panorama visível todos os os diaspassava pelas lavadeiras no rio (para além dosdias de feira).Na análise semiológica dos documentos

foram identificados símbolos e ícones queremetiam para além da própria Cadeia, parauma ideologia dominante: o estado Salazaris-ta.A decifração do texto leva-nos a informa-

ções detalhadas, mormente a opinião públicados espaços de encarceramento, o fim da suafinalidade corretiva e as condições específicasde higiene, salubridade, ambiente, refeições,acesso e difusão da atividade religiosa.Os próprios inspetores ligados à ideologia

dominante, refletem sobre a miséria vividanaquele edifício e sublinham a necessidade demudança. Estas aceções fazem-nos refletirsobre o que a sociedade identifica como des-viante da norma, a criminalidade efetiva, ajustiça do homem vs. a justiça social.A aplicação da pena é agravada com as con-

dições miseráveis daquele edifício. Isto é, paraalém da crueldade que está intrínseca na pri-vação da liberdade, os presos teriam mais cas-tigos herméticos acoplados à sua pena, como avergonha de serem expostos à comunidade, oestigma de comportam por estarem enclausu-rados e a falta de condições de diversas natu-rezas que dificultavam a permanência naqueleespaço.A crise que assolou Portugal no regime do

Estado Novo determinou com clareza que osindivíduos que cometem crimes, os loucos einsanos não deveriam ter um melhor trata-mento do que aqueles que pertenciam à classesocial e económica mais baixa. Isto porque apobreza e a precaridade eram uma constantenas regiões rurais, como é o caso de Ponte deLima.