Post on 05-Jul-2022
UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
CENTRO DE CIÊNCIAS MÉDICAS
MESTRADO EM SAÚDE DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: ATENÇÃO INTEGRADA À CRIANÇA
Fernanda Campos da Silva
Z ESCORE PARA PESO AO NASCIMENTO NA PREDIÇÃO DE DESFECHO NEONATAL ADVERSO NA INSUFICIÊNCIA
PLACENTÁRIA GRAVE.
Niterói
2007
Fernanda Campos da Silva
Z ESCORE PARA PESO AO NASCIMENTO NA PREDIÇÃO DE DESFECHO NEONATAL ADVERSO NA INSUFICIÊNCIA
PLACENTÁRIA GRAVE.
Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado em Medicina, da Universidade Federal Fluminense, como requisito parcial para obtenção do Grau de Mestre em Medicina. Área de Concentração: Atenção Integrada à Criança.
Orientador: Prof. Dr. RENATO AUGUSTO MOREIRA DE SÁ
Co-orientador: Prof. Dr. LAUDELINO MARQUES LOPES
Niterói
2007
Fernanda Campos da Silva
Z ESCORE PARA PESO AO NASCIMENTO NA PREDIÇÃO DE DESFECHO NEONATAL ADVERSO NA INSUFICIÊNCIA
PLACENTÁRIA GRAVE.
Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado em Medicina, da Universidade Federal Fluminense, como requisito parcial para obtenção do Grau de Mestre em Medicina. Área de Concentração: Atenção Integrada à Criança.
Aprovada pela seguinte banca examinadora:
Prof. Dr. Adauto Dutra Moraes Barbosa Universidade Federal Fluminense
Prof. Dr. Manoel de Carvalho Universidade Federal Fluminense
Prof. Dr. Marcus José do Amaral Vasconcellos Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro
Niterói 2007
Aos meus pais, que me ensinaram a andar.
Ao meu marido, que hoje caminha ao meu lado.
AGRADECIMENTOS
Ao meu orientador, Prof. Renato Augusto Moreira de Sá, sem ele nada disso seria
realidade. Sua dedicação, paciência, humildade, confiança e amizade serão para
sempre lembradas.
Ao meu co-orientador, Prof. Laudelino Marques Lopes, pela cobrança, que me fez
crescer; e pelo reconhecimento, através das oportunidades.
Ao Dr. Paulo Roberto Nassar de Carvalho, pelas inúmeras e oportunas
“observações”.
Aos amigos Renata, Cristina, Flávia, Viviane, Ana Paula, Bruno, Bené, Ana Elisa,
pela compreensão, trocas de plantões, coberturas. Fundamentais.
Às gestantes que participaram do estudo, pelo desejo de contribuir para a Medicina
mesmo num momento tão difícil.
Às gestantes que ainda estão por vir, por me confiarem a vida de seus filhos.
Aos meus pais, irmão, avó, Neneu e Regina, sempre presentes, mesmo na minha
ausência. Base da minha existência.
Ao Felipe, companheiro dos momentos mais felizes e mais difíceis, pelo apoio
irrestrito, e amor incondicional.
“Três paixões simples, mas irresistivelmente fortes, governam minha vida: o desejo
imenso de amar, a procura do conhecimento e a insuportável compaixão pelo
sofrimento da humanidade”.
BERTRAND RUSSEL
RESUMO
O manejo da insuficiência placentária, quando envolve fetos prematuros,
ainda é motivo de estudos, pois não há um método de avaliação fetal ideal que consiga predizer o desfecho neonatal de forma clara. Tivemos então o objetivo de determinar um modelo de predição de desfecho neonatal incluindo parâmetros hemodinâmicos e a variável Z escore para peso ao nascimento como preditor de mortalidade e morbidade neonatal grave nessas gestações. Estudamos para isso os fetos com idade gestacional entre 25 e 33 semanas, de forma prospectiva, encaminhados com diagnóstico de centralização fetal, no período de novembro de 2002 a dezembro de 2005. Os critérios de inclusão foram: (i) gestação única; (ii) anatomia fetal normal; (iii) índice de pulsatilidade (IP) da artéria umbilical anormal; (iv) relação umbilico-cerebral alterada; (v) IP da artéria cerebral média (ACM) menor que 2DP (brain sparing); (vi) última avaliação dopplerfluxométrica até 24 horas antes do parto. Nós consideramos como possíveis variáveis independentes: fluxo diastólico ausente ou reverso na artéria umbilical, ducto venoso alterado, seja pela razão S/A, ou pelo fluxo ausente ou reverso na sístole atrial, e índice Z escore para peso ao nascimento. Os desfechos avaliados foram: mortalidade neonatal e morbidade neonatal grave, definida como hemoragia peri-ventricular graus 3 ou 4, retinoptia da prematuridade graus 3 ou 4, leucomalácia periventricular cística e displasisa broncopulmonar. A análise de regressão logística multivariada tipo backward foi utilizada para a obtenção de um modelo ótimo para predição de mortalidade neonatal e morbidade neonatal grave. 46 pacientes foram incluídas no estudo, houve oito casos de mortalidade neonatal e 22 de morbidade grave. Nesta análise o Z escore para peso ao nascimento mostrou maior força de associação OR = 1,87 [1,17 – 2,99] em todos os desfechos, sendo todas as outras variáveis excluídas do modelo. Não houve morte no grupo com Z escore normal. Nosso estudo sugere que o índice Z escore para peso ao nascimento talvez seja o preditor mais importante de desfecho neonatal adverso na insuficiência placentária grave. Palavras-chave: insuficiência placentária, crescimento intra-uterino restrito, Z escore para peso ao nascimento, desfecho neonatal.
ABSTRACT
Management of placental insufficiency in preterm pregnancies is still
challenging as we lack a surveillance tool that is able to clearly predict neonatal outcome. Our goal was to determine a model for prediction of adverse neonatal outcome including hemodynamic parameters and birth weight Z score in the prediction of neonatal mortality and severe morbidity in such pregnancies. In order to do so we prospectively studied consecutive premature fetuses at between 25 and 32 weeks´ with fetal centralization. Inclusion criteria were: (i) singletons (ii) normal anatomy; (iii) abnormal umbilical artery Doppler pulsatility index (PI); (iv) abnormal cerebroplacental ratio; (v) middle cerebral artery (MCA) PI < - 2SD (“brain sparing”); (vi) last Doppler examination performed within 24 hours prior to delivery. We considered as independent potential predicting variables: absent or reversed end diastolic flow in umbilical artery, abnormal ductus venosus S/A ratio or absent or reversed flow during atrial contraction in the ductus venosus and birth weight Z score. Outcome parameters were: neonatal mortality and severe neonatal morbidity, defined as one of the following: periventricular-intraventricular hemorrhage grades 3 or 4, retinopathy of prematurity grades 3 or 4, cystic periventricular leukomalatia or broncopulmonary dysplasia. Backward logistic regression analyses was used to determine the optimal model for the prediction of neonatal mortality and severe neonatal morbidity. 46 pacients were included, eight newborns died and 22 had at least one of the severe morbidity. In this analysis birth weight Z score index showed the strongest association OR = 1,87 [1,17 – 2,99] with all neonatal outcome, all other independent variables were excluded for the optimal model. There was no mortality for the group with normal birth weight Z score. Our study suggests that birth weight Z score may be the strongest predictor of adverse neonatal outcome in severe placental insufficiency. Key words: placental insufficiency, fetal growth restriction, birth weight Z score, neonatal outcome.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
FIGURA 1 - O remodelamento da artéria espiralada ........................................
FIGURA 2 - A vilosidade intermediária madura ................................................
FIGURA 3 - Modelo do desenvolvimento vilositário anormal no CFR precoce
e tardio ...............................................................................................................
FIGURA 4 - Influência dos padrões de angiogênese na aparência histológica
dos vilos .............................................................................................................
FIGURA 5 - Esquema da circulação fetal ..........................................................
FIGURA 6 - Resumo da seqüência temporal da resposta adaptativa fetal
precoce e tardia .................................................................................................
21
22
27
27
30
53
LISTA DE TABELAS TABELA 1 - Características da população estudada........................................... 63
TABELA 2 - Incidência de desfecho neonatal adverso nos grupos de estudo.... 65
TABELA 3 - Resultados da análise de regressão logística para desfecho
neonatal .............................................................................................................
TABELA 4 - Área da curva ROC para o índice Z escore .................................... 66
QUADRO 1 - Distribuição das pacientes nos grupos de estudo......................... 64
66
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
% Percentual
a. Artéria
A Sístole atrial
ACM Artéria cerebral média
ACOG Colégio Americano de Obstetrícia e Ginecologia
AU Artéria umbilical
bpm batimentos por minuto
CA Circunferência abdominal
CC Circunferência cefálica
CCN Comprimento cabeça nádega
CF Comprimento do fêmur
CFR Crescimento fetal restrito
CPDT Centro Pré-natal de Diagnóstico e Tratamento
CTG Cardiotocografia basal
D Final da diástole
DBP Diâmetro biparietal
DP Desvio-padrão
DPIG Desvio-padrão na idade gestacional conhecida
DUM Data da última menstruação
DV Ducto venoso
FCF Freqüência cardíaca fetal
g Grama
GH Hormônio de crescimento
IG idade gestacional
IGF Fator de crescimento insulina-like
IGFBP Proteína ligadora do fator de crescimento insulina-like
ILA Índice de líquido amniótico
IP Índice de pulsatilidade
IR Índice de resistência
MHz Megahertz
mm milímetro
OMS Organização Mundial da Saúde
ONSe Óxido nítrico sintetase endotelial
OVF Onda de velocidade de fluxo
PBF Perfil biofísico fetal
PIG Pequeno para a idade gestacional
ROC receptor-operador característica
RN Recém-nato
S Sístole ventricular
S/A Relação sístole ventricular / sístole atrial
S/D Relação sístole/ diástole
SNC Sistema nervoso central
TEV Trofoblasto extraviloso
U/C Umbilico-cerebral
USG Ultra-sonografia
UTI Unidade de tratamento intensivo
v. veia
VII Vilosidade intermediária imatura
VIM Vilosidade intermediária madura
VPN Valor preditivo negativo
VPP Valor preditivo positivo
XIG Peso fetal estimado em uma idade gestacional conhecida
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO 2. REFERENCIAL TEÓRICO 2.1. PLACENTAÇÃO NORMAL E ANORMAL 2.1.1. Placentação normal 2.1.2. Placentação anormal 2.1.2.1. Patologia do leito placentário 2.1.2.2. Patologia das artérias tronculares 2.1.2.3. Desenvolvimento viloso 2.1.3. Respostas adaptativas da placenta à insuficiência
vascular útero-placentária 2.2. HEMODINÂMICA FETAL E MECANISMO DE RESTRIÇÃO
DE CRESCIMENTO 2.2.1. Circulação fetal normal 2.2.2. Redistribuição da circulação fetal 2.2.3. Avaliação das alterações circulatórias 2.2.4. O fígado e o ducto venoso na restrição de crescimento
fetal 2.3. RESPOSTA COMPORTAMENTAL 2.4. DIAGNÓSTICO 2.4.1. Definições 2.4.2. Determinação da idade gestacional 2.4.3. Estimativa de peso fetal 2.4.4. Rastreamento do feto pequeno 2.4.4.1. Medida do fundo uterino 2.4.4.2. Ultra-sonografia 2.4.5. Diagnóstico de restrição de crescimento por
insuficiência placentária 2.4.5.1. Ultra-sonografia 2.4.5.2. Doppler de artérias uterinas 2.4.5.3. Doppler de artéria umbilical 2.4.5.4. Doppler de artéria cerebral média 2.5. AVALIAÇÃO DO BEM ESTAR FETAL 2.5.1. Ultra-sonografia 2.5.2. Doppler da artéria umbilical 2.5.3. Doppler da artéria cerebral média 2.5.4. Doppler do ducto venoso 2.5.5. Cardiotocografia basal 2.5.6. Perfil biofísico fetal 2.6. MONITORIZAÇÃO DA GESTAÇÃO 2.6.1. Seqüência temporal das mudanças ao Doppler 2.6.2. Avaliação fetal integrada
15 20 20 20 23 24 24 25 28 28 28 30 32 33 35 36 37 37 38 39 39 39 40 40 41 41 42 43 43 43 44 46 48 49 50 51 53
3. OBJETIVOS 3.1. OBJETIVO GERAL 3.2. OBJETIVO ESPECÍFICO 4. MATERIAL E MÉTODO 4.1. DELINEAMENTO DO ESTUDO 4.2. LOCAL DO ESTUDO 4.3. PACIENTES 4.3.1. Critérios de inclusão 4.3.2. Termo de consentimento e aprovação pelo Comitê de
Ética em Pesquisa 4.4. COLETA DE DADOS 4.4.1. Dopplerfluxometria 4.4.1.1. Artéria umbilical 4.4.1.2. Artéria cerebral média 4.4.1.3. Ducto venoso 4.4.2. Cálculo do Z escore para peso ao nascimento 4.4.3. Variáveis independentes 4.4.4. Desfecho neonatal 4.5. ANÁLISE ESTATÍSTICA 5. RESULTADOS 6. DISCUSSÃO 7. CONCLUSÃO REFERÊNCIAS PUBLICAÇÃO ANEXO
56 56 56 57 57 57 57 58 58 59 59 59 60 60 60 61 61 62 63 67 71 72 83 90
1. INTRODUÇÃO
O termo “insuficiência placentária” era usado nos anos 70 para explicar
perdas gestacionais tardias, sem muito entendimento da causa ou patologia
subjacente (TRUDINGER, 2007). Entre os sobreviventes, era observado o
nascimento de crianças pequenas para a idade gestacional e com pouco líquido
amniótico. Sabemos hoje que diversas são as causas de fetos pequenos, existindo
inclusive aqueles sem patologia subjacente, o que sempre dificultou o estudo correto
da doença. Posteriormente, com o uso do Doppler a partir do final dos anos 70,
foram possíveis os estudos sobre a circulação placentária, sua relação com a função
desta placenta e com o desfecho perinatal (TRUDINGER et al., 1985). Apesar de
ainda restarem muitas dúvidas acerca da fisiopatologia, da etiologia, do diagnóstico
e do manejo da insuficiência placentária, muito se evoluiu desde os tempos prévios
ao Doppler.
Os avanços no estudo morfológico da placenta normal contribuíram de forma
substancial para a compreensão da placenta anormal. Além do uso do Doppler
auxiliando o estudo da circulação, técnicas mais modernas para o estudo
morfológico, molecular e genético tiveram seu papel (HUPPERTZ et al., 2006).
Conforme será visto com mais detalhes posteriormente, a placenta insuficiente é
pequena e com menor superfície de troca materno-fetal, tanto por diminuição e
malformação das vilosidades coriônicas, quanto por redução da circulação materna
e fetal.
Muitas questões existem pelo largo espectro de etiologias que cursam com fetos pequenos. Patologias diferentes implicam em prognóstico e condutas diferentes. A separação dos fetos de baixo peso ao nascer em um grupo de fetos constitucionalmente pequenos, e em outro com fetos com restrição de crescimento foi um grande divisor, pois habitualmente os fetos do primeiro grupo não têm um prognóstico pior em relação a controles de peso normal (BRODSKY; CHRISTOU, 2004). Os fetos com restrição de crescimento foram definidos como aqueles que não atingiram seu potencial de crescimento, estando condicionados a uma
patologia subjacente, que vai influenciar no prognóstico (ERGAZ; AVGIL; ORNOY, 2005).
Quanto à prevalência, em 2003, 7.8% das crianças nascidas nos Estados
Unidos tiveram baixo peso ao nascer, aproximadamente 40,000 crianças
(HAMILTON; MARTIN; SUTTON, 2004). Em termos populacionais, a incidência de
restrição de crescimento é difícil de ser mensurada, já que o peso e a idade
gestacional são sempre registrados, mas fatores maternos, ambientais e co-
morbidades não são. Em populações de mães bem nutridas, o crescimento fetal
restrito (CFR) gira em torno de 3 a 5%, e em mães hipertensas ou com história
prévia de CFR chega a 25% (SIMON et al., 1990).
Face um feto com suspeita de restrição de crescimento intra-útero, é
importante a diferenciação entre as etiologias. A insuficiência placentária desponta
como principal causa de CFR. Tem alguns fatores de risco estabelecidos, embora
nem sempre seja possível enquadrar esses fatores em uma gestação acometida.
Sabe-se da relação da nutrição materna, do tabagismo, da gravidez na
adolescência, do uso de drogas ilícitas, de grandes altitudes, e de um intervalo curto
entre as gestações, com CFR por insuficiência placentária. A gemelaridade é outro
fator de risco importante. As co-morbidades maternas, principalmente a hipertensão
arterial, mas também o diabetes mellitus, as trombofilias, a insuficiência renal, e
outras, são causas importantes de insuficiência placentária, e devem ser
pesquisadas (BRODSKY; CHRISTOU, 2004; ERGAZ; AVGIL; ORNOY, 2005).
A história natural da insuficiência placentária inclui uma redução progressiva
da oferta de nutrientes para o feto, que como mecanismo de defesa, faz uma
resposta adaptativa que privilegia a nutrição de órgãos nobres como o cérebro e o
coração. A restrição do crescimento é uma das principais formas de poupar energia,
e a diminuição do líquido amniótico se dá por diminuição da perfusão renal. A partir
do momento que o feto não consegue manter sua resposta adaptativa, acontece a
insuficiência cardíaca, aumentando o desequilíbrio ácido-base, culminando com o
óbito (BASCHAT, 2004a).
As repercussões clínicas da insuficiência placentária vão além do período
antenatal estando presentes até a vida adulta (SCHREUDER, A. et al., 2002;
BARKER, 1992). No período neonatal, há incidência maior de índice de Apgar
menor que 3 no quinto minuto, pH menor do que 7, necessidade de intubação,
sepse e crise convulsiva no primeiro dia de vida. Morbidades graves com seqüelas
como a displasia broncopulmonar, a hemorragia intraventricular, a retinopatia da
prematuridade e a leucomalácia cística periventricular também estão mais presentes
nesse grupo de baixo peso (PEEBLES, 2004).
Grande estudo americano avaliou as crianças de baixo peso e de peso
adequado ao nascimento e aos sete anos. De modo geral, os resultados aos sete
anos foram melhores no grupo que nasceu com peso adequado. O crescimento fetal
restrito parece ter impacto na inteligência e no desenvolvimento motor quando há
diminuição importante da circunferência cefálica (STRAUSS; DIETZ, 1998). Outros
estudos que se propuseram a testar adolescentes e adultos jovens também mostram
uma tendência de atraso escolar em nascidos pequenos (LARROQUE et al., 2001;
STRAUSS, 2000).
Já na adolescência e na vida adulta observa-se uma tendência ao
desenvolvimento da síndrome plurimetabólica com obesidade, hipertensão arterial,
doença cardiovascular, dislipidemia, e intolerância a glicose/diabetes mellitus tipo 2
(BARKER et al., 1993). Além da hipótese de que uma alteração do metabolismo fetal
geraria esse distúrbio no adulto, a baixa perfusão renal durante a gravidez seria
responsável por rins menores e com menor número de néfrons causando
hipertensão arterial (SCHREUDER, M.; VAN DE WAAL; VAN WIJK, 2006).
Até os dias de hoje, apesar dos avanços na área de diagnóstico e
acompanhamento, ainda não há tratamento intra-útero que reverta o quadro. O foco
de muitos estudos ainda é definir o melhor momento para o parto. A questão envolve
fetos prematuros, principalmente antes de 33 semanas (THE GRIT STUDY GROUP,
2003). Nesta fase, as seqüelas da prematuridade se somam às da insuficiência
placentária, agravando o quadro clínico do feto (GARITE; CLARK; THORP, 2004).
Nos fetos a termo, a melhor conduta é o parto, já nos prematuros temos que definir
esse momento com mais cautela.
O bem-estar fetal é avaliado por alguns métodos como a ultra-sonografia, a
cardiotocografia, o perfil biofísico fetal, e a dopplerfluxometria arterial e venosa.
Diversos autores têm se dedicado ao estudo dos métodos de avaliação fetal e sua
relação com o prognóstico, na tentativa de encontrar um critério para indicar a
antecipação do parto de modo que haja um menor número de mortes e de
morbidades graves. Apesar dos esforços, restam ainda muitas dúvidas, os
resultados são discordantes e parecem não seguir um padrão (TRUDINGER, 2007).
O Doppler avalia a circulação fetal, e observa-se uma seqüência de
alterações circulatórias na resposta adaptativa fetal. De modo geral, quando
somente o sistema arterial foi afetado, o feto está compensado. Quando o sistema
venoso, principalmente através da avaliação do ducto venoso, está alterado, seria
um sinal de descompensação fetal, um sinal de insuficiência cardíaca. A
cardiotocografia e o perfil biofísico fetal, que avaliam a resposta adaptativa
comportamental, parecem alterar tardiamente, junto com a circulação venosa.
O Doppler arterial, e posteriormente o venoso, contribuíram para o
entendimento da fisiopatologia e para a monitorização da gestação. Entretanto, a
capacidade desses testes de prever o desfecho, e de estabelecer uma relação com
outros métodos tradicionalmente utilizados como a cardiotocografia e o perfil
biofísico fetal ainda não foi comprovada (TRUDINGER, 2007). Em meio à discussão
de métodos de avaliação fetal, outros fatores começam a aparecer como preditores
do prognóstico: a idade gestacional e o peso ao nascimento. Ou seja, tanto na
prematuridade quanto no baixo peso extremo, a morte parece não ocorrer pela
normalidade ou não do ducto venoso, mas sim pela precocidade da idade
gestacional e pelo peso muito baixo ao nascer (BASCHAT, 2004).
Esse estudo teve como objetivo determinar um modelo ótimo de predição de
desfecho neonatal adverso com os parâmetros hemodinâmicos e com o Z escore
para peso ao nascimento. Este índice relaciona o peso ao nascimento à idade
gestacional, indicando quanto o peso ao nascimento do recém-nato estudado se
afasta do peso adequado.
Pesquisas no tema se justificam por diversos fatores. A prevalência da
doença na população de gestantes, a gravidade do acometimento fetal
principalmente nos prematuros, e a persistência das dúvidas em relação ao manejo
são alguns deles. Além de o alto custo hospitalar dos recém-natos de baixo peso.
Nos Estados Unidos o gasto médio com bebês com peso inferior a 1500g é 16,8
vezes superior aos recém-natos com de nascimento maior que 2500g. Estima-se
ainda que 7 % dos prematuros sejam responsáveis por 1/3 do total de gastos com
infantes durante o 1º ano de vida (CUNNINGHAM et al., 2001).
O estudo do papel do peso ao nascimento na predição do desfecho foi
impulsionado pela própria linha de pesquisa desenvolvida por nós no Centro Pré-
natal de Diagnóstico e Tratamento (CPDT). Em um primeiro momento Sá et al., em
2004, relacionou o Doppler venoso a acidemia fetal, baseado na hipótese que a
acidose gerada pela descompensação fetal era responsável pelas mortes perinatais
(SÁ et al., 2004). Posteriormente, Carvalho et al. (2005) testaram a avaliação
dopplerfluxométrica do ducto venoso na predição de desfecho perinatal adverso.
Como resultado, observou que o ducto venoso com fluxo alterado não conseguiu
prever nenhuma morbidade avaliada, e relacionou a mortalidade com significância
próxima ao limite (p=0,049). Restava ainda a dúvida do que realmente levaria esses
fetos ao óbito. O Doppler venoso não conseguiu se provar um bom preditor de forma
clara. Além disso, a observação em pesquisas mais recentes da importância do peso
ao nascimento e da idade gestacional, e a escassez de estudos desenhados para
estudar o efeito do peso ao nascimento do desfecho também nos estimulou
(BILARDO et al., 2004; GHIDINI, 2007). A maioria dos estudos foi, na verdade,
desenhada para testar os diferentes métodos como o Doppler ou a cardiotocografia,
e não propriamente o peso ao nascimento. O índice Z escore ainda não foi aplicado
para esse fim, mas nos pareceu uma boa variável a ser testada por sua capacidade
de relacionar a variação do peso ao nascimento com a média correspondente a
idade gestacional, possivelmente demonstrando uma relação direta com a própria
gravidade do acometimento fetal. Nossa expectativa é que o estudo dessa variável
seja mais uma contribuição para o complexo manejo da insuficiência placentária e
de suas repercussões perinatais.
2. REFERENCIAL TEÓRICO
2.1. PLACENTAÇÃO NORMAL E ANORMAL
2.1.1. Placentação normal
O conceito de insuficiência placentária é baseado na suposição de que a placenta é de alguma forma inadequada para garantir o crescimento esperado do feto. Desse conceito
surge a questão do que vem a ser uma placenta normal, e como ela pode ser caracterizada estruturalmente, para que a partir daí seja possível o entendimento da placenta anormal.
Grande contribuição para o estudo morfológico da placenta foi feita com as
pesquisas de Paul Kaufmann nos anos 70 e 80. Antes da sua obra, supunha-se que
as vilosidades coriônicas da placenta humana eram formadas por várias gerações
de troncos vilosos que formavam uma rede de suporte, e vilos terminais
responsáveis pelas trocas materno-fetais (BOYD; HAMILTON, 1970). Paul
Kaufmann e seu grupo identificaram uma outra vilosidade, a vilosidade intermediária,
que está interposta entre os dois tipos previamente descritos (KAUFMANN; SEN;
SCHWEIHART, 1979; SEM; KAUFFMAN; SCHWEIHART, 1979).
A placentação começa com a implantação do blastocisto no epitélio uterino e
a diferenciação em tecido embrionário e extra-embrionário (BENIRSCHKE;
KAUFMANN, 2000). Nesse estágio, o embrioblasto é envolto por um “escudo
trofoblástico” de sinciociotrofoblasto. Colunas, ou trabéculas, de células
citotrofoblásticas que estão em proliferação, chamadas de trofoblasto extraviloso
(TEV), penetram e ultrapassam esse sinciciotrofoblasto para invadir o estroma
uterino e as artérias espiraladas maternas, processo que se inicia com oito semanas
de gestação. Além disso, o TEV realiza uma comunicação, via sinais endócrinos
com a mãe, para promover fluxo sangüíneo para o sítio de implantação, e mediar as
respostas adaptativas maternas. Ele parece aumentar o débito cardíaco e diminuir a
pressão arterial materna por vasodilatação sistêmica. Essas trabéculas vão, então,
quebrando o escudo trofoblástico, formando espaços dentro da camada sincicial,
conhecidos como lacunas, que vão eventualmente coalecer para formar o espaço
interviloso, por onde o sangue materno entra (CHADDHA et al., 2004).
Um subgrupo do TEV prolifera por dentro das arteríolas espiraladas e é
chamado de trofoblasto endovascular. Essas células ocluem as artérias espiraladas
na decídua para impedir a entrada de sangue materno no espaço interviloso em
desenvolvimento (KAUFMANN; BLACK; HUPPERTZ, 2003). O fenômeno mantém
um estado de hipóxia, que é importante porque estimula a angiogênese na
vilosidade em formação.
Por outro lado, um segundo grupo de TEV, o intersticial, envolve as artérias
espiraladas e substituem a parede arterial muscular por uma camada de fibrina,
formando canais condutores de sangue para o espaço interviloso (LYALL et al.,
2001). O terço inferior do miométrio é invadido pelo TEV intersticial em 3 a 5 mm.
Essa invasão é reduzida a 2 mm na pré-eclampsia e a densidade da invasão é
reduzida, principalmente por apoptose mediada pela persistência de leucócitos
maternos secretores de citocinas pró-apoptose (KADYROV et al, 2003; REISTER et
al, 2001) (FIGURA 1).
Adaptado de Dash e Keogh, 2007.
Figura 1: O remodelamento da artéria espiralada
artéria não modificada artéria após invasão trofoblástica
endotélio
musculatura lisa
trofoblasto invasor
criação de zona de alto fluxo e baixa resistência
perda da espiral substituição da
musculatura lisa por trofoblasto
Além da invasão trofoblástica, outro fenômeno importante na placentação é a
formação dos vilos placentários, que começa ao redor do 13º dia pós-concepção. O
trofoblasto se prolifera lateralmente para começar o desenvolvimento dos troncos
vilosos. Essas vilosidades, que inicialmente contém só trofoblasto, são chamadas de
vilosidades primárias. Depois de 21 dias da concepção as vilosidades primárias são
invadidas centralmente pelo mesênquima alantóico, derivado do embrioblasto,
transformando-a em vilosidade secundária (KINGDOM et al, 2000). Em poucos dias
se inicia a formação de vasos sangüíneos dentro da vilosidade, processo chamado
vasculogênese (RISSAU, 1999). Os primeiros capilares feto-placentários são vistos
com cinco a seis semanas de gestação pós-menstrual, quando passam a ser
chamados de vilos terciários. Por definição todas as gerações subseqüentes de vilos
vascularizados (mesenquimal, intermediária imatura, tronco vilositário, intermediária
madura e terminal) são subclasses da terciária (KINGDOM et al., 2000) (FIGURA 2).
Adaptado de Benirschke e Kaufmann, 2000.
Figura 2: A vilosidade intermediária madura
Estudos Doppler da artéria umbilical mostram o aparecimento de fluxo ao final
da diástole no final do primeiro trimestre. Inicialmente é um fluxo de alta resistência,
depois a velocidade de fluxo aumenta progressivamente, sugerindo uma menor
resistência na circulação feto-placentária, e aumento na pressão sangüínea fetal
(HENDRICKS et al., 1989). Histologicamente esse período é caracterizado pela
transformação da primeira geração de vilosidades terciárias, a vilosidade
mesenquimal, em vilosidade intermediária imatura (VII). Há uma expansão do tecido
vilos terminais
vilosidade tronco
vilosidade intermediária madura
conjuntivo frouxo e um aumento da densidade capilar nessa vilosidade por
angiogênese ramificada (CASTELLUCCI et al., 1990).
Na ocasião do alcance da viabilidade fetal (24-26 semanas), há uma
mudança no desenvolvimento da placenta, com ênfase na formação de vilos
terminais especializados nas trocas materno-fetais, em detrimento dos troncos
coriônicos de condução, são as vilosidades intermediárias maduras (VIM). Estas têm
capilares alongados, não-ramificados, dentro dos quais o crescimento longitudinal
dos capilares excede o da própria vilosidade. Como conseqüência, os capilares se
enovelam, ficam com uma camada fina de sinciociotrofoblasto, aumentando a
superfície de troca. A formação das vilosidades terminais ocorre exponencialmente
no terceiro trimestre, e essa fase é caracterizada pela predominância de
angiogênese não ramificada da VIM (KINGDOM et al., 2000).
2.1.2. Placentação anormal
Na última década aconteceram avanços significativos no entendimento da
fisiopatologia da insuficiência placentária. Primeiro, uma maior elucidação dos
mecanismos do desenvolvimento placentário normal nos permitiu observar a
importância do desenvolvimento anormal como causa primária da doença. Em
segundo lugar, o uso da ultra-sonografia propiciou a seleção de placentas de fetos
com crescimento restrito (CFR) de início precoce, próprios para o estudo e a
definição do padrão vascular dessa placenta (KREBS; MACARA; KINGDOM, 1996).
Várias etapas do processo de placentação têm sido implicadas na falha de
desenvolvimento das placentas insuficientes. Discutiremos, a seguir, alterações
vistas na placenta anormal que contribuem para a fisiopatologia da insuficiência
placentária.
2.1.2.1. Patologia do leito placentário
A gravidez aumenta significativamente o fluxo diastólico pelas artérias
uterinas, e acreditava-se que a menor invasão nas artérias espiraladas fosse
responsável pela persistência do padrão de alta resistência visto na pré-eclâmpsia.
Na realidade, estudos recentes utilizando Doppler e ressonância nuclear magnética
têm demonstrado que a maior parte do fluxo sangüíneo no segundo e terceiro
trimestres não entra pelo espaço interviloso. A diminuição da resistência seria por
fístulas artério-venosas dentro do miométrio. Esse dado implica que o TEV promove
aumento do fluxo uterino não só por erosão das artérias espiraladas, mas também
pela secreção de sinais angiogênicos e vasodilatadores. A invasão trofoblástica
deficiente pode implicar em diferenciação inadequada da via que produz células
produtoras de vasodilatores sistêmicos e locais, impedindo a secreção desses
sinais, de forma que a resistência ao fluxo se mantém (HEMBERGER et al., 2003;
ZHOU et al., 2003).
Como visto anteriormente, os sinais angiogênicos e endócrinos secretados
pelo TEV intersticial também vão mediar as respostas adaptativas maternas. A falha
na queda da pressão arterial e da hemoglobina no segundo trimestre está associada
à restrição de crescimento fetal precoce e/ou pré-eclâmpsia. A expansão de volume
é menor nas mulheres destinadas a desenvolver pré-eclâmpsia de início precoce.
Atenção a essas ações endócrinas locais e sistêmicas do trofoblasto pode propiciar,
no futuro, estratégias preventivas para essas doenças (CHADDHA et al., 2004).
2.1.2.2. Patologia das artérias tronculares
O mecanismo que envolve o aumento da resistência ao fluxo das artérias
umbilicais ainda não está totalmente esclarecido. É outro ponto importante no estudo
da insuficiência placentária, já que até hoje a detecção de alteração nesse fluxo
ainda é o melhor sinalizador da doença.
O sistema arterial que supre as vilosidades não é inervado pelo sistema
nervoso autônomo. Assim, o comprimento do cordão, o padrão de ramificação das
vilosidades e as interações parácrinas do endotélio e da musculatura lisa regulam a
resistência vascular feto-placentária. As artérias umbilicais de fetos com CFR
parecem ser hipoplásicas e com lúmen menor, o que pode ter efeito no volume de
fluxo pela artéria umbilical (BRUCH et al., 1997). Esses vasos do cordão expressam
menor quantidade de óxido nítrico sintetase endotelial (ONSe) no CFR em
comparação a controles normais (RUTHERFORD et al., 1995).
A primeira alteração vascular sugerida em placentas de fetos com CFR e
Doppler de artéria umbilical alterado foi a redução da densidade das artérias
tronculares (TRUDINGER et al., 1985). Estudos posteriores não confirmaram esse
achado e tão pouco confirmaram diferença na vascularização das vilosidades tronco
(JACKSON; WAISH; MORROW, 1995). Alguns pesquisadores observaram
hipertrofia da artéria troncular (MITRA; SESHAN; RIACHI, 2000). O estresse
oxidativo pode contribuir para aumentar a resistência das artérias tronculares no
CFR já que resíduos de nitrotirosina, um produto local da lesão por radicais livres,
são encontrados no endotélio vascular e estromas dessas artérias. Também parece
haver dano por interleucinas 6 e 8 (WANG; ATHAYDE; TRUDINGER, 2003).
2.1.2.3. Desenvolvimento viloso
Finalmente, alterações no desenvolvimento das vilosidades coriônicas têm sido implicadas na gênese da insuficiência placentária. Aqui, tem destaque a época do acometimento placentário e fetal. Quando a restrição de crescimento é de início precoce, as alterações são tipicamente mais pronunciadas, e diferentes das observadas no comprometimento tardio (FIGURAS 3 e 4). O CFR precoce está associado a alterações importantes no desenvolvimento
das vilosidades de troca, especialmente das vilosidades intermediárias maduras
(JACKSON; WAISH; MORROW, 1995). Há pouca formação das vilosidades
terminais provavelmente por falha na transformação da angiogênese não ramificada
em ramificada (KREBS; MACARA; KINGDOM, 1996). Como conseqüência há menor
superfície de troca materno-fetal, o feto tem uma capacidade menor de extração de
oxigênio do espaço interviloso, o que é visto por um conteúdo de oxigênio que sai da
placenta próximo do valor do que entra nela. A morfologia do trofoblasto que recobre
esses vilos defeituosos também é alterada com pouco citotrofoblasto proliferativo, e
um sinciciotrofoblasto envelhecido e apoptótico os cobrindo (MACARA; KINGDOM;
KAUFMANN, 1996). O desenvolvimento anormal das vilosidades periféricas é de
suma importância nos fetos com crescimento restrito com fluxo diastólico ausente ou
reverso nas artérias umbilicais. Alterações nas vias de diferenciação trofoblástica,
seja na via endovascular, intersticial ou das vilosidades coriônicas, parecem ter um
papel na patogenia do CFR precoce, sugerindo uma alteração no fenótipo do
trofoblasto tronco.
No caso do CFR de início tardio, as alterações placentárias parecem ser
outras. Já foi visto que as gestações complicadas por pré-eclâmpsia e/ou CFR
tipicamente têm diminuição do fluxo pelas artérias uterinas. Em torno de 22-24
semanas, quando a resistência das artérias uterinas é detectada, o feto só consome
em torno de 25% da demanda da placenta, sugerindo que a placenta, e não o feto, é
inicialmente afetada pela falha na transformação da circulação útero-placentária
(MOLINA; MESCHIA; WILKENING, 1990). Esse conceito de “hipóxia placentária” foi
descrito pela primeira vez nos anos 40 por Tenney e Parker, e depois por outros
pesquisadores, e eles interpretaram a capilarização excessiva como resposta a
hipóxia (KINGDOM; KAUFMANN, 1997). Experimentos com porcos de Guiné
demonstraram que a diminuição do oxigênio aumentou a capilarização feto-
placentária (SCHEFFEN et al., 1990).
Esse desenvolvimento aumentado das vilosidades pode explicar porque
essas entidades podem cursar com Doppler de artéria umbilical normal. O CFR que
se apresenta ao final da gestação está associado maturidade placentária precoce
(Grannum 2 ou 3) e estudos estereológicos dessas placentas mostram um aumento
de 40% no volume dos capilares em comparação com controles com placentas
imaturas (BURTON; JAUNIAUX, 1995). O Doppler umbilical foi normal apesar de
sinais evidentes de comprometimento (diminuição do líquido amniótico,
redistribuição do fluxo cerebral) (HERSHKOVITZ et al., 2000).
Adaptado de Kingdom e Kaufmann, 1997
Figura 3: Modelo do desenvolvimento vilositário anormal no CFR precoce e tardio
CFR precoce Placenta normal CFR tardio
Adaptado de Mayhew; Charnock-Jones; Kaufmann, 2004.
Figura 4: Influência dos padrões de angiogênese na aparência histológica dos vilos
gestação normal
CFR precoce: - Predomínio da angiogênese não ramificada. - Doppler se artéria umbilical com fluxo ausente ou reverso.
CFR tardio: - Predomínio da angiogênese ramificada. - Doppler de artéria umbilical com fluxo normal.
2.1.3. Respostas adaptativas da placenta à insuficiência vascular útero-placentária.
A maior parte das gestações com aumento de resistência das artérias
uterinas não desenvolve CFR. Uma explicação seria que as vilosidades tronco
poderiam se adaptar ao ambiente de pouca perfusão de sangue materno
aumentando sua fração de extração de oxigênio (KINGDOM, 1998). Além disso, há
um estímulo para o maior desenvolvimento viloso. Nesses casos o crescimento fetal
seria mantido e poderia também explicar o fluxo umbilical normal no CFR tardio.
Conforme descrito anteriormente, em uma coorte de CFR tardio o Doppler de artéria
umbilical estava normal em dois terços dos casos apesar de sinais claros de
comprometimento do crescimento fetal.
Além da placenta, o feto também terá respostas adaptativas à diminuição da
oferta metabólica. Essa resposta fetal tenta protegê-lo da restrição de crescimento.
2.2. HEMODINÂMICA FETAL E MECANISMO DE RESTRIÇÃO DE
CRESCIMENTO
O feto, ao ter sua oferta de oxigênio e nutrientes restrita, irá iniciar uma série
de respostas circulatórias, metabólicas e comportamentais compensatórias, para
tentar manter o funcionamento de seus órgãos nobres. O entendimento da
circulação fetal normal é essencial para o posterior estudo das mudanças geradas
na insuficiência placentária.
2.2.1. Circulação fetal normal
O sangue com maior concentração de oxigênio entra no feto pela veia umbilical
e alcança o fígado, que é o primeiro órgão a receber o sangue oxigenado. O ducto
venoso é o primeiro shunt que vai regular a distribuição do sangue entre o fígado e a
circulação central.
Em seguida, o coração receberá sangue com um conteúdo nutricional variado
dependendo da fonte. Dentre as tributárias do átrio direito, o ducto venoso e a veia
hepática esquerda têm maior aporte de oxigênio em relação às veias cava superior e
inferior, veias hepáticas direita e média, e seio coronário. Do lado esquerdo, o átrio
recebe sangue desoxigenado das veias pulmonares. O forame oval é o segundo
shunt de direcionamento das correntes sanguíneas que chegam ao átrio direito.
Devido às diferenças de velocidade e direção, à posição da crista dividens e da
válvula do forame oval, o sangue mais saturado de oxigênio do ducto venoso chega
ao ventrículo esquerdo, enquanto o sangue menos oxigenado entra no ventrículo
direito (BASCHAT, 2006a).
Do ventrículo esquerdo, o sangue alcança a aorta. A aorta pré-ductal irriga o
miocárdio e o sistema nervoso central, ao passo que o sangue menos oxigenado do
ventrículo direito irriga o pulmão e chega ao ducto arterioso. Este vai unir essas duas
circulações através da sua inserção na aorta distal. Assim, a aorta descendente
contém sangue com conteúdo nutricional misto. Através das artérias umbilicais o
sangue retorna para a placenta para trocas de nutrientes e fluidos (BASCHAT,
2006a) (FIGURA 5).
A distribuição do sangue fetal não é igual durante toda a gestação.
Inicialmente, uma maior proporção do fluxo é desviada do fígado. Isso acontece
numa época em que a velocidade de crescimento placentário é maior que a
velocidade do crescimento fetal (MOLTENI; STYS; BATTAGLIA, 1978). Quando o
crescimento fetal aumenta, a oferta hepática de nutrientes também aumenta, e foi
sugerido que esse aumento na “dominância hepática” seja um instrumento na
regulação do crescimento fetal (TCHIRIKOV et al., 2002). No coração, a contribuição
do sangue oxigenado que chega pelo forame oval para o enchimento do ventrículo
esquerdo diminui, ao passo que a circulação pulmonar e o retorno venoso
aumentam. Ao mesmo tempo, é observado no istmo aórtico, um shunt diastólico
progressivo para o tronco braquiocefálico. Já nas artérias umbilicais, a diminuição da
resistência placentária mantém a perfusão para a placenta. A avaliação dessa
dinâmica de distribuição se torna mais relevante em condições de restrição de
suprimento para o feto.
Fonte: Moore; Persaud, 1994.
Figura 5: Esquema representativo da circulação fetal.
2.2.2. Redistribuição da circulação fetal
Na ocasião de restrição ao fluxo sanguíneo para o feto, ocorre o processo de
redistribuição, ou resposta circulatória fetal. Ela tem sido definida como uma
mudança na proporção da contribuição de cada ventrículo para o débito cardíaco
(AL-GHAZALI et al., 1989). O aumento do débito ventricular esquerdo aumentaria o
aporte de nutrientes para o miocárdio e cérebro através do tronco braquiocefálico.
Esse conceito é, na realidade, simplificado. A distribuição fisiológica dos nutrientes
para os órgãos essenciais segue uma ordem (fígado, miocárdio, cérebro e placenta).
Além disso, há um partilhamento do fluxo sangüíneo em diferentes níveis da
circulação (ducto venoso, forame oval, istmo aórtico e artérias umbilicais).
Finalmente, os órgãos essenciais individualmente dispõem de mecanismos de ajuste
de sua perfusão de acordo com o grau de acometimento fetal. Assim, a
redistribuição da circulação fetal deve ser considerada através de seu sistema
venoso, arterial e os efeitos poupadores individuais dos órgãos (BASCHAT, 2006a).
No sistema venoso, a dinâmica do shunt pelo ducto venoso responde ao
conteúdo nutricional pela veia umbilical, há diminuição do fluxo pela artéria umbilical
e um aumento importante da resistência placentária (BELLOTI et al., 2004; RIGANO
et al., 2001). Os mecanismos exatos de regulação do diâmetro do ducto venoso
estão em investigação. Por exemplo, uma redução do fluxo pela veia umbilical,
causa aumento do diâmetro do ducto venoso, mantendo o conteúdo de sangue que
chega ao coração. Uma conseqüência direta é uma redução do fluxo pela veia
hepática que recebe o fluxo da umbilical que não entra no ducto venoso. A menor
perfusão hepática e diminuição de substrato podem comprometer a função do fígado
e a síntese e armazenamento do glicogênio, diminuindo a velocidade do crescimento
da circunferência abdominal (HAUGEN et al., 2005).
Já no sistema arterial, a redistribuição ocorre a nível do forame oval e do
istmo aórtico. O aumento da resistência vascular pulmonar observado na restrição
de crescimento aumenta o shunt direito-esquerdo pelo forame oval, com maior
contribuição de sangue do ducto venoso para o ventrículo esquerdo (RIZZO et al.,
1996). Tanto o aumento da resistência vascular subdiafragmática e do leito
placentário, como uma diminuição da resistência braquiocefálica, têm impacto no
coração e no istmo aórtico. Esses fatores também geram elevação da pós-carga
ventricular direita, promovendo shunt direito-esquerdo pelo forame oval.
O fluxo pelo istmo aórtico normalmente é anterógrado. Na situação de
vasoconstrição periférica, o fluxo diastólico pelo istmo aórtico é reverso, o que
aumenta a perfusão braquiocefálica. Os efeitos desses ajustes são aditivos. O fluxo
pelo tronco braquiocefálico e do miocárdio é ampliado pelo aumento relativo do
débito cardíaco esquerdo, e o shunt pelo istmo aórtico também aumenta a perfusão
cerebral (MAKKIKALLIO; JOUPPILA; RASANEN, 2003). Além disso, a manutenção
da perfusão placentária é crucial para as trocas materno-fetais. A vasoconstrição nos
membros inferiores e na pelve favorece o fluxo pelas artérias umbilicais, mecanismo
que pode ajudar na preservação do fluxo placentário na insuficiência placentária
(MARI, 1991).
É importante notar que a redistribuição venosa e arterial só são efetivas
enquanto a função cardíaca é mantida. Com o agravo do acometimento e piora da
função do coração, a pressão venosa central aumenta (RIZZO; ARDUINI, 1991). É
observada transmissão retrógrada da pressão atrial direita através do ducto venoso
dilatado. A contribuição do ducto venoso para o enchimento ventricular esquerdo
diminuirá. Do lado arterial, a função cardíaca pode ser insuficiente para manter o
fluxo anterógrado pelo istmo aórtico, levando a diminuição do shunt intra-cardíaco e
ausência da redistribuição arterial. A piora progressiva da função cardíaca está
relacionada à grave comprometimento, até a morte fetal.
Quanto ao fígado, este recebe suprimento sanguíneo da veia umbilical, do
sistema porta e da artéria hepática. Ele tem seu fluxo diminuído na hipóxia por
aumento do fluxo para o ducto venoso. Na redistribuição venosa prolongada, há um
estado de insuficiência hepática e acontece uma vasodilatação arterial hepática para
melhorar sua perfusão (BATTAGLIA, 2003). Nesse estágio há associação com grave
distúrbio ácido-base.
2.2.3. Avaliação das alterações circulatórias
A disfunção placentária é avaliada em seu compartimento materno pelo
Doppler das artérias uterinas, através da constatação de incisura bilateral nas
artérias principalmente após 24 semanas (BOWER; KINGDOM; CAMPBELL, 1998).
Sua gravidade também é avaliada na artéria umbilical. Quando 30% dos vasos das
vilosidades são anormais, o fluxo diastólico umbilical diminui indicando aumento da
resistência (GILES; TRUDINGER; BAIRD, 1985). O fluxo diastólico ausente ou
reverso é visto com redução de 60% a 70% da perfusão vascular das vilosidades
(MORROW et al., 1989). Enquanto o Doppler da circulação materna indica risco para
pré-eclâmpsia, CFR e descolamento de placenta, os índices da artéria umbilical
alterados colocam o feto em risco de hipóxia e acidemia proporcionais ao grau da
anormalidade (BILARDO; NICOLAIDES; CAMPBELL, 1990).
O desvio do débito cardíaco para o lado esquerdo do coração é identificado
ao Doppler pela diminuição da relação dos índices da artéria cerebral média em
relação aos da artéria umbilical (GRAMELLINI et al., 1992). Além disso, a
vasodilatação cerebral estimulada pela hipóxia diminui a resistência ao fluxo e os
índices da artéria cerebral média (ACM). A vasodilatação cerebral é um achado
precoce na restrição de crescimento por insuficiência placentária, mas representa
uma resposta fisiológica. Na ocasião de piora, quando os mecanismos de
compensação circulatórios não conseguem mais manter o débito cardíaco, a
circulação cerebral também não consegue manter essa resposta de aumento de
fluxo e os índices da ACM podem voltar a níveis normais (HARMAN; BASCHAT,
2003).
Mesmo na restrição grave de crescimento a velocidade de fluxo é mantida no
ducto venoso, até que a insuficiência cardíaca se instale. Nessa situação, um
aumento na pressão de enchimento nos átrios direito e esquerdo, que acontece pela
menor contratilidade ventricular e pelo aumento da pós-carga, vai diminuir o fluxo
anterógrado no ducto venoso durante a sístole atrial (HECHER; CAMPBELL, 1996).
O achado de fluxo ausente ou reverso no ducto venoso durante a sístole atrial é
tardio na resposta hemodinâmica à hipóxia, e como indica comprometimento da
função cardíaca, está relacionado à pior prognóstico perinatal.
2.2.4. O fígado e o ducto venoso na restrição de crescimento fetal
O mecanismo da restrição de crescimento ainda não é totalmente esclarecido.
Uma explicação que tem sido proposta para a restrição de crescimento é uma
alteração no eixo hormônio de crescimento-fator de crescimento insulina-like (GH-
IGF) (ERGAZ; AVGIL; ORNOY, 2005). Esses fatores de crescimento e suas
proteínas ligadoras (IGFBP) têm um papel cada vez mais estabelecido na regulação
do crescimento fetal, e suas funções são reguladas pela oferta de nutrientes para o
feto (GICQUEL; LE BOUC, 2006). Na presença de oxigenação adequada, do
funcionamento normal dos mecanismos de transporte transplacentários de glicose,
aminoácidos e ácidos graxos, a oferta de substrato para o feto é assegurada. A
glicose e os aminoácidos são os principais estimuladores da insulina, do eixo GH-
IGF e estimulam o crescimento longitudinal do feto. Em uma série, Economides e
Nicolaides (1989) avaliaram as conseqüências metabólicas do CFR. O gradiente de
glicose entre a veia e a artéria umbilical foi maior, indicando uma captação maior
pelo feto. Observaram também uma maior relação entre ácidos graxos não
essenciais para os essenciais e hipertrigliceridemia, correlacionados com o grau de
hipoxemia fetal. O efeito da diminuição da glicose e dos ácidos graxos foi estudado
por Ostlund, Tally e Fried (2002), que observaram uma inibição do eixo endócrino do
crescimento envolvendo a insulina, o IGF-1 e 2 e outros fatores.
O fígado, como visto anteriormente, é um órgão privilegiado em termos de
suprimento sanguíneo, pois recebe sangue oxigenado diretamente da placenta. Ele
é responsável pela produção de proteínas, lipídeos e carboidratos, e está envolvido
em seus metabolismos. Além disso, produz os fatores de crescimento insulina-like,
suas proteínas ligadoras e outros fatores de crescimento. Tem sido proposto que a
perfusão hepática, alterada no CFR por desvio do fluxo para o ducto venoso, teria
papel na gênese da restrição do crescimento, por ser sabidamente regulador da
produção dos fatores de crescimento e do metabolismo dos nutrientes (TCHIRIKOV;
SCHRÖDER; HECHER, 2006).
Tchirikov et al., em 2002, publicaram estudo em que utilizaram um modelo
animal para avaliar os efeitos da dilatação do ducto venoso, simulando o que
acontece na insuficiência placentária, na perfusão hepática e no metabolismo no feto
da ovelha. A colocação de um stent no ducto venoso reduziu o fluxo sanguíneo para
o fígado pela metade. Houve uma redução de 50% na proliferação celular no fígado,
coração e na musculatura esquelética. Eles também fizeram o oposto, em outro
estudo, ocluindo o ducto venoso. A perfusão hepática aumentou, aumentando a
proliferação celular no fígado, coração, rins e musculatura esquelética. Nesse grupo,
eles também observaram um aumento do RNAm para IGF-1 e 2 no fígado. Esses
achados sugerem um possível papel da perfusão hepática no controle do
crescimento fetal.
2.3. RESPOSTA COMPORTAMENTAL
Além da resposta circulatória, o feto também responde à hipóxia com
mudanças comportamentais, que envolvem uma série de variáveis biofísicas com o
objetivo de diminuir o consumo de oxigênio. Essas variáveis seriam o padrão da
freqüência cardíaca fetal, sua movimentação, seu tônus, sua movimentação
respiratória e o volume de líquido amniótico.
A freqüência cardíaca fetal (FCF) é determinada por reflexos autonômicos
superimpostos a atividade intrínseca do coração. Esses reflexos se originam do
tronco cerebral, e as variações da FCF com acelerações transitórias, somados à boa
movimentação fetal indicam bom funcionamento dessas conexões. Ao contrário,
uma FCF anormal pode ser decorrente de efeitos da hipóxia nos centros
regulatórios, assim como a observação de diminuição da movimentação fetal. A fim
de estudar a relação entre doença feto-placentária e padrão da FCF, Gagnon,
Johnston e Murotsuki (1996), embolizaram a placenta ovina por 10 dias. Mesmo
quando o fluxo estava reduzido em 50% e com acidose metabólica, não houve
alteração na freqüência cardíaca de base ou desacelerações. Houve somente uma
redução de 84% nas acelerações transitórias, o que sugere que a FCF tem
comprometimento tardio.
A movimentação fetal e os movimentos respiratórios são fontes importantes
de consumo de oxigênio. Em ovelhas há economia de 20% no consumo quando os
movimentos corporais são inibidos (RURAK; GRUBER, 1983). Quando a hipoxemia
é percebida, acontece uma diminuição global na movimentação fetal antes da perda
das variáveis biofísicas, e é associada a uma diminuição gradual do volume de
líquido amniótico. A regulação do volume de líquido é complexa, mas no terceiro
trimestre é dependente da urina fetal. A disfunção placentária e a hipoxemia fetal
diminuem a perfusão renal como mecanismo de adaptação circulatória, sendo causa
de oligúria e, conseqüentemente, de oligodramnia.
O agravamento do quadro leva a parada nos movimentos respiratórios fetais,
e em seguida há diminuição da movimentação e do tônus quando a acidemia se
desenvolve.
Os parâmetros biofísicos são avaliados pela cardiotocografia e pelo perfil
biofísico fetal, testes que serão estudados posteriormente.
2.4. DIAGNÓSTICO
As dificuldades no manejo da gestação com insuficiência placentária são
diversas a começar pelo diagnóstico. A identificação do feto em risco de desfecho
perinatal adverso depende de uma idade gestacional precisa, do diagnóstico de feto
pequeno, e da diferenciação entre as várias causas de fetos pequenos para a idade
gestacional. O crescimento fetal por sua vez vai depender de fatores intrínsecos
(genética) e extrínsecos (placenta e mãe). Uma alteração em um desses fatores
pode comprometer o crescimento do feto (HARKNESS; MARI, 2004).
A identificação da causa do CFR é importante para determinar o manejo
clínico, o aconselhamento para os pais e o prognóstico. A causa mais freqüente de
CFR com morfologia normal é a insuficiência placentária. Doenças maternas que
alteram a microcirculação e causam insuficiência placentária incluem hipertensão
crônica, insuficiência renal, diabetes mellitus, trombofilias, lupus eritematoso
sistêmico, síndrome anticorpo antifosfolipídeo e anemia crônica. As anomalias
cromossômicas são outra causa importante de CFR principalmente quanto mais
cedo for o acometimento fetal. Inúmeras malformações fetais cursam com
crescimento restrito. Há ainda as causas placentárias como placenta prévia,
descolamentos de placenta, infartos e hematomas placentários (BASCHAT, 2004).
Uma vez que a suspeita de CFR é confirmada, outros recursos diagnósticos podem
ser empregados a depender do quadro clínico, como cariótipo fetal, sorologias para
infecções maternas, entre outros.
2.4.1. Definições
Os termos pequeno para a idade gestacional (PIG) e crescimento fetal restrito
(CFR) foram por muito tempo utilizados como sinônimos o que gerou muitos erros de
avaliação. No primeiro caso, estão os recém-natos que nasceram com peso menor
que o esperado pela idade gestacional, sem levar em conta a etiologia. A maior
parte é constituída de fetos pequenos constitucionais, sem uma doença subjacente
que tenha interferido no seu crescimento. O feto com CFR é aquele cujo potencial de
crescimento não foi atingido e tem maior morbidade e mortalidade perinatais. O
Colégio Americano de Ginecologia e Obstetrícia (ACOG), em 2000, definia o feto
com CFR como aquele com estimativa de peso menor que o percentil 10 para a
idade gestacional. Sabemos que nem todos os fetos pequenos têm seu crescimento
restrito, muitos são constitucionalmente pequenos. Os que pertencem a este último
grupo geralmente têm prognóstico melhor (MANNING, 1995).
Tradicionalmente, os fetos com restrição de crescimento são classificados em
CFR simétrico e assimétrico. Mais do que etiologia, essa classificação indica a
época do acometimento Na restrição início precoce haveria um padrão simétrico de
restrição de crescimento, e assimétrico com acometimento tardio. No primeiro caso,
o crescimento dos ossos longos, cabeça e abdome são afetados porque acontece
em época de divisão celular. Já com o acometimento tardio, os ossos longos e a
cabeça são poupados e o abdome não cresce por diminuição do depósito de tecido
subcutâneo e do tamanho do fígado (DASHE et al., 2000).
2.4.2. Determinação da idade gestacional
Datar a gestação de forma correta é de suma importância para o diagnóstico
e manejo de fetos pequenos. A data da última menstruação (DUM) muitas vezes não
é confiável, porque as pacientes realmente não sabem, ou têm dúvida por ciclos
menstruais irregulares, uso recente de anticoncepcionais, ou por sangramentos de
primeiro trimestre (CAMPBELL et al., 1985).
A ultra-sonografia (USG) no primeiro trimestre, especialmente a medida do
comprimento cabeça-nádega, tem melhor acurácia na determinação da idade
gestacional, e deve ser utilizada para datar a gravidez sempre que a diferença para
a DUM for maior que sete dias (BASCHAT, 2004). No segundo trimestre, a USG
também pode avaliar a idade gestacional através da biometria fetal, utilizado as
medidas do diâmetro biparietal (DBP), da circunferência cefálica (CC), da
circunferência abdominal (CA), e do comprimento do fêmur (CF). O melhor
parâmetro nessa fase é a CC, mas o uso conjunto dos parâmetros aumentou o valor
preditivo (CHERVENAK et al., 1998).
Já no terceiro trimestre, a biometria tem uma chance de erro maior, pois a
distribuição normal de valores de medidas aumenta com o avançar da gestação.
Outros marcadores sonográficos podem ajudar na estimativa de idade gestacional,
os mais utilizados são os centros de ossificação dos ossos longos, que são as
epífises femoral distal, tibial proximal e umeral distal (GOLDSTEIN et al., 1989).
2.4.3. Estimativa de peso fetal
Existem diversas fórmulas que calculam o peso fetal. De modo geral, a
precisão aumenta proporcionalmente ao número de partes fetais medidas até o
máximo de três. Uma das mais usadas é a fórmula de Hadlock et al. (1985) que
utiliza a circunferência cefálica, a circunferência abdominal e o comprimento do
fêmur para o cálculo e tem uma margem de erro de 15% para mais ou para menos
(dois desvios-padrão).
Em seguida, a idade gestacional e o peso estimado são confrontados para a
determinação do percentil de peso para a idade gestacional. A princípio, valores
entre o percentil 10 e 90 são considerados normais. O crescimento fetal, no entanto,
sofre influência de fatores genéticos e ambientais e populações diferentes
necessitam de curvas diferentes. Diversas curvas de crescimento foram elaboradas
desde a clássica curva de Lubchenco et al. em 1963. Essas curvas de maneira geral
foram feitas a partir de subpopulações que poderiam ser não representativas da
população geral. A referência americana para crescimento fetal, publicada em 1996
por Alexander et al., passou a ser mais utilizada. A curva de Lubchenco, em
comparação com a de Alexander, tende a subestimar a incidência de recém-natos
pequenos para a idade, só detectando 2,76% dos casos ao invés dos 10%
esperados. Posteriormente, a curva de Schwärzler, publicada em 2004, diferenciou
os recém-natos pelo sexo, tornando possível o controle desse fator caso necessário
(SCHWÄRZLER, 2004).
2.4.4. Rastreamento do feto pequeno
2.4.4.1. Medida do fundo uterino
Apesar de estudos anteriores terem demonstrado uma sensibilidade de 56% a
86% e especificidade de 80% a 93% da medida do fundo uterino para detectar fetos
pequenos (BELIZAN et al., 1978), estudos posteriores não confirmaram esses
achados mostrando uma baixa sensibilidade e muitos falso-positivos com importante
diferença inter-observador, tornando a medida imprópria para diagnóstico. Em
algumas situações, no entanto, tem valor no rastreamento desses fetos. Medidas
seriadas do fundo uterino podem aumentar a sensibilidade do teste aumentando a
detecção dos fetos, com nível de evidência 2 pelo Royal College of Obstetricians and
Gynaecologists (2002).
2.4.4.2. Ultra-sonografia
De acordo com uma meta-análise, dentre as medidas ultra-sonográficas, a
circunferência abdominal e a estimativa de peso fetal são os melhores preditores de
fetos pequenos para a idade (CHANG et al., 1992). Em população de alto risco a
sensibilidade da CA foi de 73 a 95% e do peso estimado de 43 a 83%. No baixo
risco, a sensibilidade foi de 48 a 64% para a CA e de 31 a 73% para o peso. Outro
estudo mostrou que a CA foi melhor preditor de feto pequeno que o DBP, CC, ou
que a combinação de parâmetros (WARSOF et al., 1986).
2.4.5. Diagnóstico de restrição de crescimento por insuficiência placentária
A diversidade de etiologias por trás dos fetos pequenos e com restrição de
crescimento impõe a necessidade da integração de informações de métodos
diagnósticos diferentes. A começar pela história clínica da mãe, seguindo com uma
completa avaliação do feto, da placenta, e do volume de líquido amniótico a conduta
diagnóstica e de manejo dessas gestações podem ser direcionadas.
2.4.5.1. Ultra-sonografia
A ultra-sonografia, além rastrear as gestações de risco ao identificar fetos
pequenos é importante no diagnóstico etiológico. Tem papel na pesquisa de fetos
com crescimento restrito por outras causas como as aneuploidias, displasias
esqueléticas, síndromes outras e infecções virais, que despontam como causa de
CFR. Ela avalia a morfologia do feto, sua estimativa de peso e velocidade de
crescimento, volume de líquido amniótico e aspecto da placenta, porém não é
suficiente para o diagnóstico de insuficiência placentária. A associação com o
Doppler vai identificar melhor os fetos pequenos em risco de desfecho adverso
(HECHER et al., 1995a; OTT, 2000).
Quanto à biometria, como já descrito, tem na CA a medida de maior
sensibilidade e valor preditivo negativo para a detecção do CFR. A avaliação seriada
com intervalo de 14 dias aumenta ainda mais essa sensibilidade. Usando como
referência recém-natos a termo de mulheres saudáveis, uma CA menor que o
percentil 2,5 é compatível com CFR. Quando os pequenos ou prematuros são
incluídos o valor apropriado é de percentil 10. Como já exposto para rastreamento, a
estimativa de peso utilizando várias medidas tem uma sensibilidade menor que a
medida da CA, mas com maior valor preditivo positivo.
O volume de líquido amniótico deve ser avaliado junto com a morfologia do
feto. Apesar da acurácia da ultra-sonografia na avaliação do líquido amniótico não
ser boa, sua a avaliação, por qualquer método (maior bolsão, índice de líquido
amniótico), principalmente se executado de forma seriada, dá informações sobre o
diagnóstico e o prognóstico do feto (MAGANN et al., 2000).
2.4.5.2. Doppler de artérias uterinas
O Doppler das artérias uterinas tem sido usado na identificação de gestações
em risco de restrição de crescimento e de pré-eclâmpsia. O uso se justifica pela
diminuição do fluxo diastólico que altera a forma da onda, com identificação de
incisura diastólica bilateral, e aumento dos índices de resistência. Esse achado
parece ter relação com a invasão trofoblástica deficiente das artérias espiraladas
maternas, causando a persistência da circulação de alta resistência (HARKNESS;
MARI, 2004).
Estudo multicêntrico com 7.851 mulheres mostrou que a sensibilidade do
Doppler de artérias uterinas com índice de pulsatilidade (IP) maior que 1,63
(percentil 95) para a predição de pré-eclâmpsia e CFR com 23 semanas foi de
93,3% e de 56,3% para CFR sem pré-eclâmpsia quando o parto aconteceu antes de
32 semanas. O valor preditivo negativo foi de 100% e 99,9% respectivamente.
Quando todos os partos foram incluídos a sensibilidade caiu para 69% para a
predição de pré-eclâmpsia e CFR e para 13,2% para CFR isoladamente. Quando o
teste de rastreamento incluiu a alteração de índice e/ou a presença de incisura
bilateral, a sensibilidade quando o parto foi antes de 32 semanas foi de 100% e
68,8% para CFR sozinho, apesar de aumento importante nos resultados falso-
positivos (PAPGEORGHIOU et al., 2001). O maior valor do teste parece estar nos
resultados negativos, cujas gestações estarão em baixo risco de insuficiência
placentária.
2.4.5.3. Doppler de artéria umbilical
A medida da CA, a estimativa de peso fetal, a morfologia e o volume de
líquido amniótico não bastam para o diagnóstico de CFR por insuficiência
placentária. Fetos pequenos constitucionais ainda estarão entre esses fetos. O
Doppler de artéria umbilical (AU) terá papel importante nessa diferenciação.
A velocidade de fluxo da artéria umbilical é determinada principalmente pela
arquitetura vascular das vilosidades (KINGDOM; BURREL; KAUFMANN, 1997).
Uma vez que a superfície de troca vilosa fica comprometida o suficiente, a
resistência vascular placentária aumenta, reduzindo o fluxo diastólico na artéria
umbilical (MORROW, 1989).
O uso do Doppler de AU reduz mortalidade e intervenções iatrogênicas, pois
a documentação da insuficiência placentária separa fetos normais dos que precisam
de monitorização e possível intervenção (NEILSON; ALFIVERIC, 2002). Fetos
pequenos com Doppler de artéria umbilical anormal são admitidos com maior
freqüência a Unidades de Terapia Intensiva (UTI) neonatais e com internações mais
prolongadas (BERKOWITZ et al., 1988). Baschat e Weiner (2000) estudaram 308
pacientes com fetos com peso estimado menor que o percentil 10 para idade
gestacional ou com CA menor que o percentil 2,5. Recém-natos que tinham Doppler
de AU alterado tiveram maior incidência de hipoxemia crônica, disfunção respiratória
e admissões à UTI neonatal.
2.4.5.4. Doppler da artéria cerebral média
Quando o acometimento fetal acontece até 34 semanas, o Doppler da artéria
umbilical normalmente é alterado. Após esse tempo o Doppler pode ser normal.
Nesses casos a artéria cerebral média (ACM) poderá fornecer informações
importantes. A resposta fetal à hipóxia inclui a redistribuição de fluxo para órgãos
nobres como o SNC, o miocárdio e as glândulas adrenais. A ACM normalmente tem
um fluxo de alta resistência, mas na situação de hipóxia, a resistência ao fluxo
diminui o que é percebido pela diminuição dos índices S/D e de pulsatilidade. A
suspeição de CFR por insuficiência placentária deve ser levantada nos casos de
índice de ACM alterado, ou da relação IP da ACM/IP da AU mesmo quando a AU for
normal. Em relação a diagnóstico, a avaliação da ACM pode ser usada para
diagnóstico de insuficiência placentária quando a AU for normal. Quando a AU for
alterada não precisa (HARKNESS; MARI, 2004).
2.5. AVALIAÇÃO DO BEM-ESTAR FETAL
2.5.1. Ultra-sonografia
A velocidade de crescimento é um parâmetro importante na avaliação do
bem-estar fetal. A avaliação seriada das medidas do feto, em especial da
circunferência abdominal, da circunferência cefálica e do comprimento do fêmur, vai
estimar sua taxa de crescimento (CHANG et al., 1993). No passado, a ausência de
crescimento da circunferência abdominal num período de duas semanas era usada
como indicativo da necessidade de parto. Hoje, essa avaliação ainda é importante,
mas não é usada isoladamente. No entanto, é necessário um intervalo de 10 a 14
dias entre cada exame para a estimativa de crescimento, e em determinadas
situações é tempo demais para a tomada de uma decisão (ILLANES; SOOTHILL,
2004).
Outro parâmetro importante é o volume de líquido amniótico. Após 20
semanas de gestação, o líquido amniótico é em grande parte originado da produção
de urina fetal, e reduções do volume de líquido amniótico no CFR provavelmente
representam uma queda no fluxo sangüíneo renal fetal como resultado de hipóxia
crônica. O problema com as estimativas de líquido amniótico é que são difíceis de
serem realizadas e não são bem reproduzidas (MAGANN et al., 2000). Através da
ultra-sonografia os outros parâmetros biofísicos vão ser avaliados como o tônus, a
movimentação fetal e os movimentos respiratórios, que fazem parte do perfil
biofísico fetal.
2.5.2. Doppler da artéria umbilical
O Doppler da artéria umbilical com cálculo dos índices de resistência reflete o
estado vascular da placenta. Placentas pequenas, com menor número de
vilosidades, ou com vilos com desenvolvimento anormal podem alterar o fluxo
umbilical (SEBIRE, 2003). O aumento da resistência ao fluxo seria o sinalizador para
a disfunção placentária.
Após o uso para diferenciar fetos com restrição de crescimento dos
constitucionalmente pequenos, o Doppler foi testado quanto a sua capacidade de
reconhecer fetos em risco de morte intra-útero, passando a ser o principal método de
avaliação do bem-estar fetal (KARSDORP et al., 1994; ZELOP; RICHARDSON;
HEFFNER, 1996). Diversos estudos compararam o Doppler de AU a outros métodos
de vigilância como a cardiotocografia. Em 1993, Soothill et al. publicaram ensaio
clínico randomizado que comparou o uso da cardiotocografia (CTG), do perfil
biofísico fetal (PBF) e do Doppler de artéria umbilical na predição de morbidade em
fetos normais e com CFR. A circunferência abdominal se confirmou como método de
identificar o CFR e o Doppler alterado previu morbidade ao nascimento. A CTG e o
PBF não conseguiram o mesmo feito. Importante notar que esses resultados valem
para fetos pequenos, nos fetos sem restrição de crescimento o Doppler não teve
associação com desfecho. Baschat e Harman (2001) demonstraram que quanto
maior a deteriorização ao Doppler da AU, maior a chance de efeitos perinatais
adversos como, natimortalidade, oligodramnia, baixo peso ao nascer e cesariana por
sofrimento fetal. Outros problemas relacionados incluem acidose na veia umbilical,
maior necessidade de ressuscitação cardio-pulmonar e uso de prótese ventilatória e
de vasopressores.
Baseado nessas observações, a antecipação do parto para fetos com fluxo
ausente ou reverso na artéria umbilical foi proposto no passado (KARSDORP et al.,
1994). Posteriormente, estudos foram demonstrando que a artéria umbilical não
seria o preditor ideal do desfecho perinatal (ARDUINI et al., 1996; ZELOP;
RICHARDSON; HEFFNER, 1996). O Doppler da artéria cerebral média começou a
se provar como um bom preditor de desfecho (ARDUINI; RIZZO, 1992).
2.5.3. Doppler da artéria cerebral média
O fluxo sangüíneo cerebral do feto foi demonstrado por estudo Doppler das
artérias carótida interna, cerebral média, cerebral posterior e cerebral anterior. A
artéria cerebral média (ACM) é mais utilizada por detecção e aferição mais fáceis.
(VAN DEN WIJNGAARD et al., 1989).
Durante a gravidez há um fluxo anterógrado contínuo em todas as artérias
cerebrais durante todo o ciclo cardíaco. O IP da ACM diminui nas últimas semanas
de gravidez e permanece inalterado no início da vida neonatal. A redistribuição de
fluxo que acontece na hipóxia fetal é demonstrada com a diminuição dos índices de
resistência da ACM e por aumento da velocidade sistólica máxima. A coleta de
sangue fetal indicou uma relação entre hipoxemia fetal e o IP da ACM (VYAS et al.,
1990). Mari e Deter (1992) descreveram um padrão parabólico do IP da ACM em
gestações normais por idade gestacional, sendo os valores maiores entre 25 e 30
semanas. Eles mostraram que recém-natos pequenos com IP alterado estariam em
risco de morte perinatal e maior tempo de internação em UTI neonatal.
Tendo em vista que o feto com crescimento restrito tem aumento da
resistência na artéria umbilical e diminuição da resistência da ACM por redistribuição
de fluxo, a razão umbilico-cerebral (U/C) parece ser um índice melhor para avaliação
desses fetos que a AU ou a ACM isoladamente (WLADIMIROFF et al., 1987).
Geralmente o IP da AU e da ACM são utilizados, mas também pode ser a razão S/D
de cada um. Utiliza-se o ponto de corte de 1,0, com a redistribuição sendo
considerada quando a razão fosse maior que o ponto de corte.
A ACM também possibilitou a avaliação de fetos comprometidos com AU
normal. Esses fetos, como já exposto, normalmente tiveram acometimento mais
tardio, e o Doppler da ACM anormal pode ser indicativo de parto se a prematuridade
não for problema (HERSHKOVITZ et al., 2000). Embora o Doppler de artéria
umbilical alterado seja um melhor preditor de desfecho adverso em fetos pequenos,
o PI da ACM tem melhor sensibilidade (91,7%) e valor preditivo negativo (98,6%)
para desfecho neonatal adverso grave, especialmente antes de 32 semanas (FONG,
et al., 1999).
Mais recentemente, a velocidade sistólica máxima da ACM foi testada como
parâmetro de avaliação de predição de mortalidade em fetos com CFR (MARI et al.,
2007). Os autores compararam o IP da ACM com sua velocidade máxima.
Inicialmente na insuficiência placentária, o IP da ACM diminui refletindo uma
diminuição da resistência vascular cerebral e um pequeno aumento do fluxo. O
agravamento do quadro aumenta o débito cardíaco esquerdo e a velocidade máxima
da ACM. A pesquisa concluiu que a velocidade máxima parece ser um preditor
melhor que o IP da ACM em fetos com Doppler de artéria umbilical alterado, e eles
atribuíram a esse achado o fato do IP da ACM ter uma tendência a normalizar
próximo ao parto e a velocidade máxima, apesar de diminuir, se mantém em níveis
alterados.
2.5.4. Doppler do ducto venoso
As grandes veias centrais do feto, o ducto venoso, a veia cava inferior e a
veia umbilical têm sido objetos de estudo. O fluxo nessas veias é influenciado pela
pressão venosa central, que por sua vez está relacionada à função cardíaca do feto,
sendo esse o princípio da avaliação do sistema venoso para detecção do bem-estar
fetal.
A onda de velocidade de fluxo (OVF) do ducto venoso exibe um fluxo
unidirecional e com dois picos. O primeiro pico (onda S) reflete o enchimento atrial
direito durante a contração ventricular. O segundo pico (onda D) reflete a fase de
enchimento ventricular passivo no início da diástole. O ponto mais baixo da onda
(onda A) corresponde à contração atrial, e é sempre positiva em condições normais
na gestação (HECHER; CAMPBELL, 1996).
Essa OVF venosa se altera por dois mecanismos: aumento da pós-carga
ventricular direita e falência cardíaca. Enquanto o feto consegue manter seu estado
compensado por redistribuição de fluxo, a perfusão miocárdica é mantida, adiando a
falência ventricular mesmo quando a pós-carga aumenta. O Doppler venoso nesse
estágio ainda é normal. O agravamento da hipóxia é vista ao Doppler por alteração
nas ondas de velocidade de fluxo venosas. Sá et al. (2004) avaliaram a relação
entre a razão da sístole ventricular/contração atrial (S/A) do ducto venoso e acidemia
fetal. Foi demonstrada essa associação e estabelecido um ponto de corte de 3,4
para a predição de gasometria anormal em fetos centralizados.
Na ocasião da descompensação fetal, a razão S/A, um dos índices utilizados,
aumenta para depois o fluxo durante a contração atrial ser ausente ou reverso, fase
que pode ser acompanhada de pulsação na veia umbilical (HARMAN; BASCHAT,
2003).
A mortalidade perinatal é alta na presença da onda A do DV ausente ou
reversa variando de 63% a 100% em séries diferentes (HECHER et al., 1995b;
OZCAN et al., 1998). Um estudo que avaliou 224 gestações com CFR por
insuficiência placentária, testou o fluxo ausente ou reverso na AU, o fluxo ausente ou
reverso na onda A do DV e a pulsatilidade da veia umbilical para predição de
natimortalidade, morte neonatal, morte perinatal, acidemia e asfixia perinatal antes
de 37 semanas de gestação (BASCHAT, 2003a). A AU ofereceu maior sensibilidade
e valor preditivo negativo, enquanto que o DV e a pulsatilidade da veia umbilical
tiveram maior especificidade e valor preditivo negativo na predição dos desfechos.
De modo geral, o DV e a pulsatilidade da veia umbilical foram melhores preditores
independente da forma da onda da AU. No caso de fluxo ausente ou reverso na AU
a predição de asfixia e natimortalidade foi aprimorada significativamente pelo
Doppler venoso. Os autores sugeriram que esses fetos com AU alterada podem
ganhar tempo enquanto o Doppler venoso for normal (BASCHAT, 2003a).
Outros estudos se seguiram relacionando o Doppler venoso com desfecho
perinatal adverso, como o de Bilardo et al. (2004) que descreveu o IP para veias
como melhor preditor de desfecho e o de Baschat et al. (2004) que relacionou o DV,
a veia cava inferior e a veia umbilical ao estado ácido-base fetal. No entanto, na
medida em que os resultados foram sendo concluídos as limitações ao método
também foram sendo percebidas. Carvalho et al. (2005) avaliaram a relação da
razão S/A do ducto venoso alterada com desfechos morte e morbidades neonatais
graves. Os autores não encontraram associação com nenhuma morbidade
estudada, e para mortalidade foi estatisticamente significativa, mas com valor
próximo ao limite (p=0,049). Outros fatores preditivos foram ganhando destaque
como a idade gestacional no parto e o peso ao nascimento, tornando a decisão do
momento da antecipação do parto ainda sem definição. No estudo de Carvalho et
al., quando o peso do recém-nato foi menor que 400g, a associação com
mortalidade não foi mais vista.
2.5.5. Cardiotocografia basal
A movimentação fetal foi associada a acelerações da freqüência cardíaca por Lee, Diloreto e O’Lane (1976). Posteriormente foi descrita como método de avaliação da saúde fetal (LEE; DILORETO, 1976). O teste é considerado reativo na presença de duas acelerações de 15 batimentos por minuto (bpm), com duração de 15 segundos, em 20 minutos de exame, e não reativo com nenhuma em 40 minutos. A reatividade da FCF é considerada um indicador de função autonômica normal. A perda da reatividade é, na maior parte das vezes, associada ao ciclo de sono fetal, mas pode ser resultado de qualquer causa de depressão do sistema nervoso central (SNC), incluindo a acidose fetal (MANNING, 2000).
As desacelerações tardias podem significar hipóxia fetal. São caracterizadas
por uma recuperação lenta após a contração. O mecanismo provável na hipóxia
reflete o mecanismo de redistribuição do fluxo sangüíneo a órgãos vitais que leva a
um aumento da resistência vascular periférica global e da pressão arterial com
bradicardia compensatória. Nos fetos hipoxêmicos a desaceleração tardia pode estar
associada à diminuição da variabilidade com ou sem taquicardia da linha de base
(MANNING, 2000).
Um teste não reativo é achado inespecífico e em geral considerado como
indicação de mais testes. Raramente será usado como único parâmetro para indicar
interrupção da gestação. Em uma população obstétrica de alto risco, pode ser
esperada uma incidência de teste reativo de 85 a 90% e de não reativo de 10 a 15%.
A presença de teste anormal é muito mais alta que a doença perinatal em gestantes
de alto risco indicando uma alta taxa de falsos positivos. A estimulação acústica do
feto pode ser um recurso útil e seguro para produzir aceleração da FCF. Deve-se
lembrar que no feto pré-termo não comprometido o teste pode ser não reativo. Entre
24 e 28 semanas 50% dos testes são não-reativos e de 28 a 32 semanas 15% o são
(MANNING, 2002).
A introdução da cardiotocografia basal foi importante avanço nos métodos de
avaliação fetal para reconhecimento e conduta em fetos comprometidos. As
limitações do método ficam agora aparentes. A sensibilidade fica em torno de 50%
(2 a 90%). No feto a termo, o impacto perinatal da baixa sensibilidade provavelmente
não tem conseqüências mais graves já que esse recém-nato não vai sofrer pelo
parto antecipado iatrogênico. No prematuro, no entanto, soma-se à sua condição
clínica subjacente a morbidade da prematuridade. A especificidade e o valor
preditivo negativo da cardiotocografia são altos, mas altamente influenciados pela
baixa prevalência da doença. A maioria dos estudos avaliou o método em
populações de baixo risco em que uma suposição sobre o estado de bem-estar fetal
apresentaria uma especificidade de 94,7% mesmo se todos os fetos com resultado
adverso fossem perdidos (sensibilidade = 0). A especificidade do teste é melhor que
a sensibilidade, mas fica abaixo de desempenho de outros métodos de
monitorização fetal (DEVOE, 1990).
Dessa forma, o uso da cardiotocografia basal como único método de
avaliação fetal já não se justifica. Sua importância hoje parece ser na
complementação do estudo hemodinâmico do feto já que a alteração na FCF parece
ser mais tardia que as alterações hemodinâmicas (MANNING, 2000).
2.5.6. Perfil biofísico fetal
Método introduzido por Manning em 1980, o Perfil Biofísico Fetal (PBF), tem
como objetivo a avaliação da probabilidade de um determinado feto ter ou não ter
oferta de oxigênio suficiente para selecionar órgãos vitais primários e secundários
como o SNC, rins, pulmão, a fim de manter uma função normal (MANNING, 2002).
São analisadas variáveis que refletem hipóxia aguda que são: tônus, movimentos
respiratório, movimentação fetal e freqüência cardíaca, e a hipóxia crônica é
sugerida pela presença de oligodramnia (MANNING; PLAT; SIPOS, 1980). A cada
variável é atribuída uma nota de 0 a 2, tendo como somatório final a nota máxima de
10 pontos. Ainda é a modalidade mais utilizada nos Estados Unidos para
monitorização do CFR (MARI; HANIF, 2007).
O teste se baseia no fato de que a normalidade do padrão biofísico dos órgãos reflete a integridade da função deste órgão. A ausência da variável biofísica em questão seria um sinal de disfunção até que provado contrário. De forma direta, a hipóxia provoca disfunção celular, que no caso de diminuição de oxigênio no centro de regulatório de alguma atividade biofísica, causaria uma parada completa da atividade regulada pelo centro em específico (MANNING, 2002).
A oligodramnia é a variável do PBF que sinaliza hipóxia crônica. A
redistribuição de fluxo sanguíneo na hipóxia com detrimento ao fluxo renal diminui a
produção de urina fetal e, como a deglutição é mantida, o líquido amniótico vai
sendo reduzido gradativamente. Vários estudos demonstraram associação de
oligodramnia e desfecho perinatal adverso (VINTZILEOS et al., 1980;
CHAMBERLAIN et al., 1984).
O PBF, quando normal (≥ 8/10 pontos), é uma medida direta da boa
oxigenação tecidual e ausência de acidemia central. Quando anormal (≤ 6/10
pontos), o PBF é uma medida de probabilidade de hipóxia e, de forma secundária,
avalia o grau de hipóxia. Quanto menor a pontuação do teste, menor o pH do
sangue fetal, demonstrando maior a gravidade do quadro. De forma indireta, o PBF
parece diminuir a risco de morte perinatal, principalmente a incidência de natimortos.
O PBF é altamente relacionado ao pH do cordão umbilical, mas pode não se tornar
anormal até que o feto esteja acidótico (VINTZILEOS et al., 1987). Esse ponto é
preocupante já que a acidemia fetal está relacionada a comprometimento
neurológico. A limitação impulsionou o estudo e a monitorização fetal por outros
métodos como o Doppler.
2.6. MONITORIZAÇÃO DA GESTAÇÃO
2.6.1. Seqüência temporal das mudanças ao Doppler
O objetivo da monitorização fetal no CFR é aperfeiçoar o momento da
interrupção da gestação, quando os riscos fetais ultrapassam os riscos neonatais
conseqüentes da prematuridade. Cada parâmetro Doppler estudado teve relação
com o prognóstico neonatal, mas houve a necessidade de conhecer melhor como, e
em que momento essas mudanças aconteceriam, para que fosse possível prever
uma piora da condição fetal e indicar a intervenção. Três grupos se propuseram a
descrever a seqüência dessas mudanças e relacionar ao período neonatal em 2001
e 2002 (FIGURA 6). Hecher et al. (2001) estudaram de forma prospectiva e observacional 93
gestações com CFR. Foram divididas em dois grupos: grupo 1 com gestações em
que o parto ocorreu antes de 32 semanas, e grupo 2 com gestações com mais de 32
semanas no parto. A cada avaliação foram registrados o padrão da FCF, o IP arterial
e venoso e o volume de líquido amniótico. A primeira conclusão importante foi que
os dois grupos tiveram resultados bem diferentes entre si, mostrando a importância
da idade gestacional tanto nos resultados dos testes quanto no prognóstico. Na
amostra, o volume de líquido amniótico e o IP da artéria umbilical foram os primeiros
a se alterarem, seguidos da artéria cerebral média, aorta, FCF, ducto venoso e veia
cava inferior. No grupo 1, o IP do ducto venoso e o padrão da FCF tiveram
mudanças em torno da mesma época, e tiveram maior relação com mortalidade
principalmente quando os dois estavam alterados. Os autores sugeriram que esse
seria um bom momento para a intervenção. No grupo 2, a seqüência temporal não
foi bem estabelecida, as alterações ao Doppler foram menos pronunciadas, talvez
porque o parto foi realizado antes, já que a prematuridade não estava em questão.
Baschat, Gembruch e Harman (2001), por sua vez, estudaram 44 fetos com
CFR e IP da artéria umbilical alterado que tiveram um PBF menor que 6/10 antes do
parto. A idade gestacional média na admissão foi de 25 semanas, com máximo de
32 semanas e no parto de 29 semanas e 6 dias. Entre a primeira avaliação e o parto
houve deteriorização dos parâmetros do Doppler e biofísicos principalmente nos sete
dias que antecederam o parto. O Doppler variou primeiro. Quatro dias antes da
alteração do PBF, houve aceleração da alteração da AU e do ducto venoso, dois a
três dias antes os movimentos respiratórios diminuíram, e no dia seguinte o volume
de líquido amniótico caiu. A artéria cerebral média não teve mudança significativa
depois de identificada a redistribuição. Na maioria dos casos (70%), as mudanças do
Doppler se completaram 24 horas antes do PBF, e a seqüência foi AU, ACM e DV
em 72% dos casos; ACM e DV em 13,6%; e alteração do DV somente em 9,1%.
Ferrazzi et al. (2002) avaliaram 26 fetos com CFR e Doppler de artérias
uterinas e umbilical anormais. A indicação de parto foi o padrão da FCF alterada,
avaliada pela cardiotocografia. Mudanças precoces, presumidamente refletindo a
resistência placentária e a hipóxia, incluíram o fluxo diastólico ausente na AU, e o IP
da ACM alterado (redistribuição). Metade dos fetos mostrou essas alterações 15 dias
antes do parto. Mudanças tardias, indicando colapso circulatório, foram fluxo reverso
na AU, ducto venoso, e velocidade do trato de saída da artéria pulmonar e aórtica
anormais. Metade desses fetos apresentou essas mudanças tardias quatro a cinco
dias antes do parto. Essas mudanças tiveram relação com mortalidade. No entanto,
60% dos fetos não apresentaram essas mudanças tardias antes da alteração na
cardiotocografia.
Esses resultados embora apontem para uma seqüência temporal, não
mostraram um padrão consistente de mudança. A resposta fetal foi variada e não
houve consenso sobre o padrão com habilidade de predizer morte ou morbidade
(TRUDINGER, 2007). Também não se conseguiu determinar a relação entre os
testes hemodinâmicos e os biofísicos. Parece claro que o Doppler identifica a
doença fetal antes de alterações biofísicas, mas a relação temporal é mais evidente
nos prematuros. Já nos fetos mais próximos do termo, quando as alterações ao
Doppler são mais sutis, essa relação temporal não se comprovou. Ao contrário, a
deteriorização das variáveis biofísicas é independente da idade gestacional
(MANNING et al., 1993). Surgiram outras questões a partir desses estudos,
principalmente sobre o conceito de avaliação fetal integrada, que será discutido a
seguir.
Adaptado de Baschat, 2004.
Figura 5: Resumo da seqüência temporal da resposta adaptativa fetal precoce e tardia.
2.6.2. Avaliação fetal integrada
O estudo do uso de uma combinação de testes hemodinâmicos e biofísicos
para um melhor acesso da condição fetal surgiu da incapacidade desses métodos
Precoce Tardio
Doppler
PBF
Alteração do controle da FCF
Alteração dos parâmetros biofísicos
Perda da variabilidade
desacelerações tardias
diminuição do líquido amniótico
diminuição da movimentação global
perda de mov. respiratórios
perda da movimentação
perda do tônus
Aumento da resistência Fluxo diastólico ausente/reverso
Redistribuição cerebral
a.uterina
a.umbilical
a. cerebral média
ducto venoso
v. umbilical
isoladamente predizerem a morte e a morbidade perinatais de forma consistente
(BASCHAT, 2003b). Nem todos os fetos seguiam o mesmo padrão de
comprometimento, e diferenças na seqüência temporal de mudanças foram
identificadas. As seqüências apresentadas não levaram em conta a variação
individual da resposta fetal, o impacto da idade gestacional no prognóstico, e os
efeitos de mudanças súbitas na condição materna (BASCHAT; GEMBRUCH;
HARMAN, 2001). Essas diferenças são em parte responsáveis pelo amplo espectro
na forma de apresentação da doença. A lógica da combinação de testes é bem
ilustrada pelo PBF. Seus cinco parâmetros são alterados de forma independente
pela hipóxia, e a combinação dos cinco prediz a morbidade melhor que cada um
isoladamente.
Em teoria, a combinação do Doppler e do PBF se justifica porque embora
ambos sejam capazes de detectar o comprometimento fetal, eles o fazem de forma
diferente e em tempos distintos. O Doppler tem sido o instrumento para o
entendimento da relação entre as alterações circulatórias e metabólicas. Suas
alterações iniciais acontecem antes dos distúrbios de crescimento e do desequilíbrio
ácido-base. Isso faz do Doppler uma boa ferramenta para diagnóstico, que identifica
fetos em um período “pré-doença”. O PBF e a CTG não conseguem esse feito
(BASCHAT, 2003b). Por outro lado, o Doppler sozinho também ainda não tem bom
resultado. O Doppler venoso, por exemplo, detecta o comprometimento em 50 a
60% dos fetos com CFR de início precoce, e em proporção ainda menor próximo ao
termo (BASCHAT; GEMBRUCH; HARMAN, 2001; HECHER et al., 2001; FERRAZZI
et al., 2002).
Diversos autores têm documentado as vantagens da avaliação integrada.
Arabin et al. (1993) usaram uma análise de curva ROC and mostraram que a
combinação da relação do Doppler umbilical/cerebral com a CTG melhorou a
predição de sofrimento fetal. Ott et al (1998) mostraram melhor avaliação fetal com
PBF em combinação com o Doppler de AU e ACM. Baschat (2003b) quando testou o
uso combinado do Doppler arterial e venoso e do PBF, e como resultado observou
que o uso combinado foi melhor preditor de acidemia, mortalidade e morbidade
perinatal que qualquer parâmetro isolado.
Baschat et al.(2006b) ainda estudaram a relação entre o Doppler e o PBF
quando usados simultaneamente nos fetos com CFR. 228 fetos com CFR foram
divididos em três grupos de acordo com o Doppler (AU alterada, ACM alterada e
ducto venoso alterado), e em três grupos de acordo com a avaliação biofísica
(normal com PBF >6/10, equivocada com PBF 6/10 e anormal com PBF <6/10).
Esses grupos dividiram fetos de acordo com o grau de comprometimento segundo a
avaliação do método testado, Doppler ou PBF. Foi concluído que tanto o Doppler
quanto o PBF estratificaram os fetos em categorias de risco, mas os dois métodos
não teriam uma relação consistente entre si, inclusive 57% dos fetos tiveram
resultados discordantes nos dois exames. Os autores ainda sugeriram que mais
estudos seriam necessários para investigar como esses testes deveriam ser
combinados.
3. OBJETIVOS 3.1. OBJETIVO GERAL
Determinar um modelo de predição de desfecho neonatal desfavorável
considerando os parâmetros hemodinâmicos e o índice Z escore para peso ao
nascimento em fetos prematuros centralizados.
3.2. OBJETIVOS ESPECÍFICOS
Avaliar o papel do fluxo ausente ou reverso na artéria umbilical na predição de
morte e morbidade grave neonatais.
Avaliar o papel do ducto venoso alterado seja pela razão S/A, ou pelo fluxo
ausente ou reverso na contração atrial na predição de morte e morbidade grave
neonatais.
Avaliar o papel do Z escore do peso ao nascimento na predição de morte e
morbidade grave neonatais.
4. MATERIAL E MÉTODO 4.1. DELINEAMENTO DO ESTUDO
Trata-se de um estudo observacional, seccional, com os dados colhidos de
forma prospectiva.
4.2. LOCAL DO ESTUDO
O estudo foi realizado com pacientes referenciadas ao Setor de Medicina
Fetal de Clínica Perinatal Laranjeiras (Centro Pré-Natal de Diagnóstico e Tratamento
– CPDT), oriundas de diversas instituições da cidade do Rio de Janeiro e da clínica
privada.
A Clínica Perinatal Laranjeiras é considerada uma maternidade de nível
terciário no atendimento obstétrico e neonatal, desempenhando papel de referência
para gestação de alto risco no Município do Rio de Janeiro.
4.3. PACIENTES
Todas as pacientes referenciadas para monitorização da gestação no local do
estudo, cujos fetos apresentaram centralização do fluxo sangüíneo entre 25 e 33
semanas de gestação, de dezembro de 2002 a novembro de 2005.
4.3.1. Critérios de inclusão
(i) Gestação única.
(ii) Morfologia fetal normal.
(iii) Idade gestacional entre 24 e 33 semanas confirmadas pela data da
última menstruação (DUM) através do critério adotado pela
Organização Mundial de Saúde (OMS) e referendada pela Federação
Internacional de Ginecologia e obstetrícia em 1976 (REZENDE, 1999),
ou ultra-sonografia realizada antes de 20 semanas de gestação
(HADLOCK; HARRIST; DETER, 1982).
(iv) Doppler com índice de pulsatilidade (IP) da artéria umbilical (AU) acima
de dois desvios-padrões (DP) para a idade gestacional (ARDUINI;
RIZZO, 1990).
(v) Razão umbilico/cerebral menor que 1 (centralização fetal).
(vi) IP da artéria cerebral média (ACM) mais de dois desvios-padrões para
a idade gestacional (brain sparing reflex).
(vii) Última avaliação pelo Doppler realizada a menos de 24 horas do parto.
4.3.2. Aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa
Todas as pacientes concordaram em participar do estudo assinando um
termo de consentimento livre e esclarecido. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de
Ética da Maternidade Escola – Universidade Federal do Rio de Janeiro, protocolo
número 08/2005 (ANEXO).
4.4. COLETA DE DADOS
As pacientes eram encaminhas ao serviço de medicina fetal da Clínica
Perinatal–Laranjeiras (Centro Pré-natal de Diagnóstico e Tratamento – CPDT), por
seus médicos assistentes, para avaliação fetal, e convidadas a ingressar no estudo
caso os critérios de inclusão fossem preenchidos. A inclusão se confirmava após
assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido.
Uma vez no estudo, dados maternos, fetais, referentes ao parto, e do recém-
nascido foram coletados em uma ficha elaborada para a pesquisa e anotados em
planilha própria.
4.4.1. Dopplerfluxometria
Todos os exames foram realizados com transdutor setorial de ultra-sonografia
de 4 ou 5 MHz (Voluson 730, Medical Systems, USA). O filtro de alta freqüência foi
ajustado para sensibilidade de 100 Hz. Em cada exame foram feitas análises da
artéria umbilical, da artéria cerebral média e do ducto venoso.
4.4.1.1. Artéria umbilical
A análise da AU foi realizada localizando com o auxílio do Doppler colorido
três seguimentos do cordão umbilical: proximal (próximo à inserção na parede
abdominal fetal), alça livre e distal (próximo à inserção placentária). Para cada
segmento foram calculados os índices de resistência, e quando discordantes, foi
utilizada a média aritmética dos valores para a análise.
4.4.1.2. Artéria cerebral média
A ACM pode ser visualizada em uma imagem axial transversa do pólo cefálico
fetal, em plano ligeiramente mais caudal que o utilizado para a medida do diâmetro
biparietal. Neste nível, que inclui os pedículos cerebrais, a ACM pode ser observada
como ramo lateral do polígono de Willis, seguindo ântero-lateralmente em direção à
borda lateral da órbita ao nível da asa menor do esfenóide, entrando no sulco lateral
e desaparecendo na fossa cerebral entre a insula e o lobo temporal (VAN DER
WIJNGARD et al., 1989). A amostra foi posicionada na parte proximal da ACM, em
período de repouso fetal (MARI; DETER, 1992).
4.4.1.3. Ducto venoso
A insonação DV foi realizada na origem do vaso, a partir da identificação do
sinus portal usando a imagem de ultra-som em duas dimensões e Doppler colorido,
em corte transversal ou médio-sagital do abdome fetal. Foram medidas a velocidade
de pico durante a sístole ventricular (S) e a velocidade correspondente à contração
atrial (A) e calculada a relação S/A. Esta foi considerada alterada segundo curva de
normalidade elaborada por Sá et al. (2000). O fluxograma do DV foi registrado por
pelo menos 5 ciclos contínuos e com sinal constante, e durante período de repouso
fetal. Essa abordagem garante um coeficiente de variação menor que 10%
(HECHER et al., 1995).
4.4.2. Cálculo do índice Z escore para peso ao nascimento A tabela de referência para peso ao nascimento escolhida foi a de Schwärzler
por diferenciar os recém-natos por sexo, para melhor controle desse fator
(SCHWÄRZLER, 2004).
O Z escore foi calculado da seguinte forma:
Z escore= (XIG – MIG) / DPIG
Sendo que XIG é o peso estimado em uma idade gestacional conhecida (IG), MIG é o
valor médio usado nessa IG e DPIG é o desvio padrão do valor médio nessa IG de
acordo com a referência. Foi considerado alterado, aquele menor que dois desvios-
padrões da média (-1,645).
4.4.3. Variáveis independentes
(i) Fluxo ausente ou reverso na artéria umbilical.
(ii) Ducto venoso com fluxo alterado seja pela razão S/A do ducto venoso
alterada, ou por fluxo ausente ou reverso durante a sístole atrial.
(iii) Índice Z escore para peso ao nascimento.
4.4.4. Desfecho Neonatal
A análise do desfecho se limitou aos primeiros 28 dias de vida. Os desfechos
avaliados foram mortalidade e morbidade grave no período neonatal. O curso clínico
no período neonatal foi revisado em todos os casos. Os critérios para classificação
como morbidade grave foi a presença de um dos seguintes parâmetros: hemorragia
periventricular-intraventricular graus 3 ou 4, retinopatia da prematuridade graus 3 ou
4, leucomalácia periventricular cística ou displasia broncopulmonar.
4.5. ANÁLISE ESTATÍSTICA
Uma análise de regressão logística do tipo backward foi utilizada para
identificar um modelo ótimo para a predição do desfecho neonatal. As três variáveis
independentes foram incluídas no modelo de forma inicial, e excluídas caso não se
mostrassem significativas. O teste de Fisher comparou a freqüência dos desfechos
entre os grupos. A área abaixo da curva receiver-operator characteristic, curva ROC,
foi calculada para as variáveis independentes significativas. Um p<0,05 foi
considerado estatisticamente significativo.
Toda a análise estatística foi feita utilizado o programa SPSS para Windows,
versão 10.0 (SPSS, Inc., Chicago, Illinois).
5. RESULTADOS
O período de estudo foi de dezembro de 2002 a novembro de 2005. Quarenta e seis pacientes foram incluídas no estudo e não houve perda de seguimento. Em média as gestantes tinham 32,6 anos e a idade gestacional média ao diagnóstico foi de 28,0 semanas. O peso médio ao nascimento dos recém-natos foi de 855 g, e o intervalo médio entre a primeira avaliação com Doppler e o parto de três dias. Os recém-natos sobreviventes permaneceram internados por 61,2 dias em média (TABELA 1).
Tabela 1: Características da população estudada
Número de pacientes 46 Idade Gestantes (anos) Média ± desvio padrão 32,6 ± 5,4 Mínimo – Máximo 22 – 43 Idade Gestacional – Diagnóstico (semanas) Média ± desvio padrão 28,0 ± 2,6 Mínimo – Máximo 24 – 33 Idade Gestacional – parto (semanas) Média ± desvio padrão 28,3± 2,6 Mínimo – Máximo 25-33 Via de Parto Cesárea 100% Peso do RN (gramas) Média ± desvio padrão 855,3 ± 381,5 Mínimo – Máximo 315 – 1670 Tempo de internação do RN sobreviventes (n=38) na UTI (dias)
Média ± desvio padrão 61,3 ± 44,1 Mínimo – Máximo 02 - 186
As pacientes foram alocadas em grupos de acordo com o resultado do Doppler e do Z
escore para peso ao nascimento. Dezoito fetos (39%) tiveram fluxo diastólico ausente ou reverso na artéria umbilical. O ducto venoso estava com fluxo alterado em 19 pacientes (41%). O índice Z escore para peso ao nascimento foi abaixo do limite inferior (-1,645) em 22 casos (48%) (QUADRO 1).
Quadro 1: Distribuição das pacientes nos grupos de estudo Fluxo diastólico ausente ou reverso na artéria
umbilical 18 (39%)
Ducto venoso alterado 19 (41%) Z escore alterado 22 (48%)
Em relação aos desfechos avaliados, a morte no período neonatal aconteceu em oito
casos. Levando-se em conta o fluxo diastólico ausente ou reverso na AU, 5 mortes ocorreram no grupo com esse achado e 3 mortes foram em recém-natos sem o fluxo diastólico ausente ou reverso na AU. Já em relação ao ducto venoso, 2 mortes foram em recém-natos com fluxo normal no ducto venoso e 6 quando esse fluxo estava alterado. Não houve morte no período neonatal quando o Z escore foi normal (TABELA 2).
Dentre os sobreviventes (38 casos), a morbidade grave esteve presente em 22 casos (58%). No caso da variável fluxo diastólico ausente ou reverso na artéria umbilical, dos 25 recém-natos sobreviventes com essa variável ausente, 12 (48%) tiveram uma morbidade grave. Dos 13 casos com a presença da variável, 10 (77%) tiveram uma morbidade grave. Já para o fluxo alterado no ducto venoso, dos 25 sobreviventes com fluxo normal, 13 tiveram uma morbidade grave (52%), e dos 13 que tinham o fluxo alterado, 9 tiveram o desfecho (69%). Dos 14 casos de Z escore alterado que sobreviveram, 11 (78%) tiveram uma morbidade grave. Quando o Z escore foi normal, 24 casos, 11 (46%) tiveram desfecho adverso. (TABELA 2).
Tabela 2: Distribuição de desfecho neonatal adverso nos grupos de estudo Mortalidade Morbidade grave
sobrevida óbito Total
ausente presente Total
Fluxo diastólico presente
25 3 28 13 12 25
Artéria umbilical Fluxo
diastólico ausente ou
reverso
13 5 18 3 10 13
Total 38 8 46 16 22 38 Normal 25 2 27 12 13 25 Ducto
venoso Alterado 13 6 19 4 9 13 Total 38 8 46 16 22 38
Normal 24 0 24 13 11 24 Z escore Alterado 14 8 22 3 11 14
Total 38 8 46 16 22 38
Foi utilizada análise de regressão logística backward para determinar um modelo
ótimo para predição de mortalidade neonatal e morbidade neonatal grave. Nesta análise, tanto a mortalidade quanto a morbidade neonatal grave tiveram o Z escore para peso ao nascimento como única variável significativa (F test 12.33 e p-valor 0,001 para mortalidade e teste F 8,26 com p-valor de 0,006 para morbidade neonatal grave). O fluxo diastólico na artéria umbilical ausente ou reverso e o ducto venoso alterado foram excluídos do modelo para ambos os desfechos (TABELA 3).
Tabela 3 – Resultados da análise de regressão logística para desfecho neonatal. Variável de
desfecho Variável
significativa p-valor Variáveis excluídas
Mortalidade -Z escore para peso ao nascimento 0,001
-Fluxo diastólico ausente ou reverso na artéria umbilical.
-Ducto venoso alterado
Morbidade Grave - Z score para peso ao nascimento 0,006
-Fluxo diastólico ausente ou reverso na artéria umbilical.
-Ducto venoso alterado.
O índice Z escore para predição de mortalidade, calculado pela área abaixo da curva
ROC, foi de 0,956, com erro padrão de 0,029 e p-valor <0,001. O desfecho morbidade grave teve o índice calculado em 0,789, com erro padrão de 0,067 e p-valor de 0,001 (TABELA 4).
Tabela 4 – Área da curva ROC para o índice Z escore Variável de desfecho ASC EP p-valor
Mortalidade 0,956 0,029 <0,001 Morbidade grave 0,789 0,067 0,001
ASC- área da curva ROC. EP –erro padrão
6. DISCUSSÃO
Nos últimos anos, muito foi alcançado em relação ao entendimento da
fisiopatologia da insuficiência placentária e de suas repercussões fetais. O Doppler
contribuiu de forma substancial para esses avanços. Conseguimos uma boa
avaliação do estado hemodinâmico fetal, antes do comprometimento grave aparecer.
Previamente, o bem-estar fetal era avaliado pelos parâmetros biofísicos, que alteram
quando a acidemia está instalada. Como ainda não temos um tratamento intra-útero
para oferecer, nos resta a busca do melhor momento do parto. O alvo hoje não é
apenas a redução da mortalidade, mas também a redução de seqüelas a curto e
longo prazo.
O manejo clínico não está bem definido por algumas razões. Enquanto o uso
do Doppler de AU para identificação de fetos em risco está bem estabelecido, a
procura por um determinador do momento do parto ainda continua. Embora não
totalmente concordantes, os estudos de seqüência temporal descritos apontam uma
tendência de alterações ao Doppler que estariam relacionadas a uma piora
progressiva da condição fetal. No entanto, quando se tentou relacionar a mortalidade
e a morbidade a curto e a longo prazo, observou-se que nem todos os fetos
respondiam da mesma forma à restrição imposta pela placenta, o que nos deixa em
dúvida se de fato os distúrbios hemodinâmicos são responsáveis pela morte e dano
fetais (TRUDINGER, 2007). Ainda, especialmente os estudos de desfecho
neurológico a longo prazo têm demonstrado dano em fetos que tinham Doppler de
artéria umbilical normal, ou seja, a intervenção pode não prevenir as seqüelas
tardias.
Um ensaio clínico randomizado publicado pelo grupo GRIT (Growth
Restriction Intervention Group), comparou duas estratégias de manejo a cerca do
momento para intervenção. Achava-se que muitas questões seriam elucidadas já
que não se tratava de um estudo observacional como os anteriores. Comparou-se a
intervenção precoce nas gestações de alto risco com a tardia, quando o obstetra não
tinha mais dúvidas na condução. Os resultados foram publicados em duas partes,
primeiro com resultados neonatais (2003) e depois o seguimento de dois anos
(2004). Não foi vista diferença entre os dois grupos, a morbidade e a mortalidade
neonatais, assim como a desenvolvimento neurológico aos dois anos de idade não
foram influenciados pela época da intervenção. Possíveis limitações ao estudo
seriam o fato de que nem todos os fetos foram monitorizados com Doppler e PBF, e
que um quarto deles tinham Doppler de artéria umbilical normal, ou seja,
possivelmente pequenos constitucionais. Além disso, o Doppler venoso não foi
testado.
Não podemos deixar de notar o impacto de outros fatores não hemodinâmicos
ou biofísicos para o prognóstico. A idade gestacional e o peso ao nascimento estão
sendo cada vez mais reconhecidos como preditores do prognóstico. Após estudar a
placentação e as alterações presentes na insuficiência placentária, observamos que
as alterações ao Doppler são mais pronunciadas nos prematuros, já que com o
acometimento mais tardio, a placenta consegue aumentar suas vilosidades
terminais, melhorando as trocas materno-fetais. É uma explicação para o
comprometimento mais leve nos fetos a termo.
Tivemos, no presente estudo, o objetivo de determinar um modelo ótimo de
predição de desfecho neonatal adverso utilizando, além dos parâmetros
hemodinâmicos, o índice Z escore para peso ao nascimento. O índice Z escore foi
escolhido, pois ao relacionar o peso à idade gestacional, nos informa sobre a
gravidade do acometimento do recém-nato, pelo seu grau de restrição de
crescimento. Outros autores já haviam utilizado esse índice mas não para esse
propósito. Lawlor et al. (2005), Hack (2005), entre outros, utilizaram o índice para o
estudo do peso ao nascimento, o relacionando com hipertensão arterial e doença
coronariana no adulto.
Utilizamos para a criação do modelo a regressão logística multivariada do tipo
backward. Quisemos com isso avaliar o papel de cada variável na predição da morte
e da morbidade grave neonatal. Desse modo, todas as variáveis começaram no
modelo, e à medida que foram sendo testadas, as que não foram significativas foram
sendo excluídas do modelo ótimo. Assim, entraram no modelo a princípio, o Doppler
de artéria umbilical ausente ou reverso, o ducto venoso alterado e o Z escore para
peso ao nascimento menor que dois desvios-padrões da média. Todas as variáveis
a exceção do Z escore foram excluídas do modelo ótimo de predição de desfecho.
Assim, não conseguimos determinar o modelo ótimo, mas constatamos a
importância do peso ao nascimento na predição de mau prognóstico. Pelo tamanho
da nossa amostra e pelo fato do índice não ter sido testado antes para esse fim,
além da regressão multivariada, também calculamos a área da curva ROC para
avaliar a significância do Z escore para peso ao nascimento. Essa variável se
confirmou como significativa tanto para morbidade quanto para mortalidade.
Nossos resultados corroboram com outros estudos como o de Bilardo et al.
(2004), que relatou a importância do peso ao nascimento, apesar de seu estudo não
ter sido desenhado para esse fim. Outro resultado importante foi a ausência de
mortalidade no grupo com índice Z escore normal.
Bilardo et al. (2004) publicaram sobre as relações entre o Doppler e a
cardiotocografia computadorizada e desfechos perinatais adversos. As gestações
foram divididas em dois grupos de acordo com a idade gestacional, grupo 1 com
gestações entre 26 e 29 semanas, e grupo 2 com gestações de 30 a 33 semanas. A
primeira observação importante foi que os resultados diferiram muito entre esses
grupos, sugerindo a importância da idade gestacional para o prognóstico. Nos fetos
entre 26 e 29 semanas, um terço daqueles com ducto venoso alterado e um quinto
dos que tinham AU com diástole zero ou reversa tiveram desfecho normal. Já no
grupo entre 30 e 33 semanas, a diferença de desfecho entre os que tinham ducto
normal e alterado não se confirmou. Após ajuste para idade gestacional as relações
entre diástole zero/ausente de AU, CTG computadorizada anormal e desfecho
adverso não foram estatisticamente significativas.
Em 2007, grande estudo multicêntrico teve como objetivo identificar
estimadores e preditores de mortalidade e morbidade neonatais em fetos com
restrição de crescimento precoce por insuficiência placentária (BASCHAT et al.,
2007). 604 neonatos entraram no estudo, tinham entre 24 e 33 semanas no parto e
peso médio ao nascimento de 600g, indicando restrição grave de crescimento. Os
resultados incluíram avaliação da mortalidade, morbidade e sobrevida intacta, sem
morbidade grave até 28 dias de vida. De modo geral, só a ACM, o sexo e a
indicação do parto não tiveram relação com o prognóstico. O impacto da idade
gestacional foi diferente para mortalidade e morbidade. Até 26 semanas e 6 dias, a
idade gestacional foi o preditor mais importante de mortalidade, neutralizando o
efeito do Doppler. Ou seja, no feto muito prematuro, o ducto venoso normal ou
anormal não conseguiu prever quem iria morrer. A influência na morbidade se
estendeu até 29 semanas e 2 dias. A área da curva ROC mostrou que a idade
gestacional acima de 27 semanas e 6 dias foi o melhor preditor de sobrevida, e
acima de 29 semanas e 2 dias de sobrevida intacta. O peso ao nascimento perdeu
seu impacto na morbidade e mortalidade quando maior que 600g. O peso maior que
800g teve melhor predição de sobrevida intacta. Quando esses pontos de corte para
idade e peso foram ultrapassados o Doppler, e o pH menor que 7,20 foram
preditores de mortalidade. O ducto venoso com onda A ausente ou reversa foi
importante preditor de queda na sobrevida intacta. Os autores concluíram que
conseguiram resultados importantes para a questão que envolve a insuficiência
placentária e a prematuridade. A sobrevida neonatal ultrapassou 50% com 26
semanas, e a sobrevida intacta com 28 semanas, duas semanas acima de neonatos
sem doença. O aumento da sobrevida em 2% por dia no útero nos faz ter como alvo
27 semanas e 600g no mínimo.
O papel do ducto venoso pôde ser questionado no estudo acima. Apesar de
ele ter sido um bom preditor depois que as metas de peso e idade gestacional foram
atingidas, todos os preditores independentes juntos só conseguiram detectar 41%
dos casos de sobrevida intacta, ou seja, quase 60% da mortalidade e morbidade
grave não puderam ser previstas. Certamente, outros fatores não testados
provavelmente influenciaram no desfecho (GHIDINI, 2007).
Pelo tamanho da nossa amostra, não pudemos estratificar os resultados por
idade gestacional, como o estudo multicêntrico citado conseguiu. Talvez, por não ter
sido possível avaliar o papel das variáveis por idade gestacional, não tenhamos
conseguido comprovar a relação do Doppler arterial e venoso com a morte e
morbidade neonatais. Mesmo assim, nossos resultados são importantes,
considerando que se aplica a nossa população. Ainda, impulsiona novas pesquisas,
como aplicando o mesmo índice para o peso fetal estimado pela ultra-sonografia, na
tentativa de estimar a gravidade, auxiliando na decisão do momento da interrupção
da gestação.
7. CONCLUSÃO
Nosso estudo sugere que o modelo ótimo de predição de desfecho neonatal
desfavorável ainda não pode ser determinado, porém o índice Z escore para peso
ao nascimento parece ser um bom preditor de morte e morbidade grave no período
neonatal.
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