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No Mundo Estrela
Nas profundezas do bosque brilhante, uma coruja,
um veado, um texugo e um lobo encontravam -se reu-
nidos em torno de uma lagoa de estrelas, observando
uma imagem na superfície cintilante. Mostrava quatro
raparigas de 10 anos, todas elas afagando um animal
— uma raposa, um esquilo, uma gata -selvagem e uma
corça. Todos os animais tinham belos olhos índigo.
— Maia, Lottie, Ionie e Sita — enunciou o lobo.
— Estão a revelar -se excelentes Amigas Estrela.
— É verdade. Estão a criar muito bem no mundo
dos humanos recorrendo à magia — concordou a
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coruja. — Os seus Animais Estrela estão a ajudá -las
a descobrir novas capacidades e a desenvolverem os
seus poderes.
Ocasionalmente, viajavam jovens animais do
Mundo Estrela para o mundo humano. Lá chegados,
tinham de encontrar uma criança que acreditasse
o suficiente em magia para ser o seu Amigo Estrela.
Cada animal ensinava ao seu Amigo Estrela a forma
de se ligar à corrente de magia que fluía entre o
mundo humano e o Mundo Estrela, e então a criança
tinha de a usar para ajudar terceiros e travar quem
pretendesse fazer maldades.
— Os nossos jovens Animais Estrela parecem
muito felizes com as suas amigas — salientou o
texugo.
— E estão, mas também enfrentam presente-
mente uma ameaça perigosa — disse a coruja.
— A pessoa que exerce magia negra perto deles é
muito poderosa, apesar de eles ainda não saberem
quem ela é.
— Vem aí uma batalha — anunciou o lobo.
A coruja assentiu com seriedade.
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— E aproxima -se depressa.
O veado pareceu ansioso.
— Esperemos que os nossos animais e as amigas
consigam ganhar.
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Capítulo Um
Só posso estar a sonhar. A Maia arrepiou -se ao olhar
em volta. Estava parada no bosque, apenas de pijama
vestido. O céu ostentava — somente a oriente — um
leve toque da luz do amanhecer.
Quero acordar, pensou a Maia com firmeza. Acorda
já! Mas não conseguiu. Por entre as árvores, avistou
a clareira onde conhecera a Giesta, a sua raposa, que
viera do Mundo Estrela. Começou a caminhar nessa
direção, mas depois estacou. Viu um vulto de capuz
no centro da clareira, cercado por um círculo de luz
verde. Estava a arrancar folhas e a depositá -las numa
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taça de prata. A Maia sentiu um arrepio na coluna.
Tinha a sensação de que ia acontecer algo mau.
Acorda, disse a si mesma, muito depressa. Acorda lá!
Mas permaneceu no bosque.
— Hera trepadeira, podagrária, beladona… — mur-
murou a mulher enquanto largava as folhas das
plantas. Um grande capuz escondia -lhe o rosto.
— Juntem -se, fundam -se, deem -me o poder para unir
para sempre…
Acenou com a mão por cima da taça e saiu de lá,
em forma de espiral, fumo verde. A seguir, apontou
para um arbusto ali perto. De imediato, brotaram
pequenas flores cor -de -rosa e brancas, os botões a
abrirem como se fosse um dia de verão e não uma
noite fria de início de primavera.
Colhendo as flores, a mulher adicionou -as ao
conteúdo da taça.
— E para selar o feitiço — disse ela.
O fumo tornou -se mais espesso e um odor acre
vagueou na direção das narinas da Maia.
— Entreguem -me o vosso poder, árvores! — gritou
a mulher.
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Um vento frio varreu a clareira, soprando para
o rosto da Maia o seu cabelo louro, que lhe dava
pelos ombros. Ela sentia a magia a retumbar no ar,
picando -lhe a pele como agulhas. As árvores aba-
naram e a seguir surgiu um clarão brilhante dentro
da taça, e a clareira voltou a sossegar.
A mulher riu -se e, pegando num frasco de prata
que tinha no bolso, encheu -o com o líquido escuro
da taça. De seguida, endireitou -se e elevou -o na
direção das estrelas.
— Para quem se intromete nos meus assuntos —
proferiu ela, num tom sombrio. — Vão arrepender -se.
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A Maia sentiu um mau agoiro a percorrê -la ao
olhar para o pequeno frasco de prata que a mulher
segurava.
Com uma gargalhada, a mulher guardou -o no
bolso da capa e abandonou em passos largos a cla-
reira. Passou pela Maia sem dar por ela, com a capa
negra a agitar -se junto aos tornozelos…
A Maia despertou, com o coração a bater de modo
descompassado. Um focinho húmido farejava -lhe
a bochecha.
— Sentes -te bem? — Ela deu por si a olhar para
os olhos índigo da Giesta. — Estavas a ter um pesa-
delo? — quis saber a raposa, ansiosa.
Ela assentiu com a cabeça e sentou -se, olhando em
redor do quarto. Ela e as amigas tinham ido dormir a
casa da Ionie. O Animal Estrela da Ionie — a Azeda,
uma gata -selvagem —, estava estendido aos seus
pés. A Lottie dormia num saco -cama com o Zimbro,
o esquilo, aconchegado no peito dela, enquanto a
Sita, tal como a Maia, dormia num colchão insuflável
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no chão. A Faia, a corça, estava deitada ao lado da
Sita, com as suas patas delicadas enroscadas por
baixo do corpo, tendo a cabeça pousada nas costas
da sua Amiga Estrela. Todas pareciam bastante
sossegadas. A Maia puxou a Giesta para os seus
braços e afagou -lhe o macio pelo arruivado. Os seus
bigodes pretos fizeram -lhe cócegas.
— Foi um pesadelo mágico? — perguntou a
raposa, ao aconchegar -se ainda mais.
A Maia passou os dedos no cabelo, puxando -o
para trás enquanto se recordava.
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— Foi.
Os Animais Estrela tinham mostrado à Maia e às
amigas o modo de usar a corrente de Magia Estrela,
para que conseguissem fazer mesmo magia. Cada
uma das raparigas tinha as suas próprias capaci-
dades mágicas. A Ionie era capaz de criar ilusões,
viajar nas sombras e ordenar às Sombras que voltas-
sem para o seu lugar, e a Lottie podia usar a magia
para ser incrivelmente ágil e correr super depressa.
A Sita podia curar e apaziguar, e também tinha a
capacidade de ordenar a qualquer ser que fizesse
o que desejava, apesar de achar este poder assusta-
dor e quase nunca o usar; e as capacidades da Maia
tinham que ver com a visão. Conseguia usar uma
superfície brilhante para ver o que se passava nou-
tros locais e para olhar para o passado e o futuro,
e os seus sonhos muitas vezes mostravam -lhe acon-
tecimentos que eram úteis.
— O que é que viste? — perguntou a Giesta.
A Maia contou -lhe.
— Já tiveste um sonho assim, não foi? — comen-
tou a Giesta.
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— Mais ou menos, mas não era exatamente igual
— respondeu a Maia. Da última vez que vira a figura
encapuzada num sonho, o vulto também estava a
extrair energia das árvores em volta e a usá -la para
preparar uma poção. — Desta vez, havia menos
vento e não havia relâmpagos, e a mesma mulher
fez um arbusto florescer, e depois usou as flores
numa poção que estava a preparar. Ela proferiu
palavras que soaram como um feitiço. — A rapa-
riga arrepiou -se ao recordar o frasco prateado que o
vulto erguera. — Não sei verdadeiramente o que
fazia, mas pareceu -me magia má.
— É melhor contarmos às outras — afirmou a
Giesta, ansiosa.
A Maia espreitou para cima, para a janela. Uma
luz pálida começava a percorrer o céu noturno.
— OK, vamos acordá -las. — Começou a sacudir
gentilmente os ombros das amigas, enquanto a
Giesta despertava os Animais Estrela. Acordou
o Zimbro e a Faia com um toque de focinho, mas
ao chegar à vez da Azeda, puxou ousadamente a sua
comprida cauda peluda.
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Ela levantou -se de um pulo, a bufar, fulminando -a
com o olhar.
— O que estás a fazer, raposa? — despejou ela.
— Como te atreves a morder -me…
— A Maia teve um sonho — interrompeu a Giesta.
— Tive de te acordar depressa. Vamos lá, gatinha…
Deixando a Azeda com o seu pelo eriçado, a raposa
saltou de novo para os braços da Maia. Ela abanou
a cabeça na direção da raposa, mas foi -lhe impossí-
vel conter um sorriso. A raposa e a Azeda tinham
uma relação espinhosa. A gata -selvagem era muito
arrogante, às vezes, e a Giesta gostava de a provocar.
Daí a pouco tempo, as raparigas estavam sentadas
no colchão insuflável da Maia, com os edredões sobre
as pernas e a fazer festas aos animais, enquanto a
ouviam a recontar o sonho.
— Então estavas no bosque e viste alguém a pre-
parar a poção? — disse a Ionie.
— Tens a certeza de que era a mesma pessoa que
tinhas visto antes? — perguntou a Sita, afagando
a pelagem aveludada e manchada a castanho da
Faia.
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— Sem qualquer dúvida — respondeu a Maia.
— Não lhe consegui ver a cara, mas tenho a certeza
de que era a mesma pessoa.
— A que anda a fazer magia negra na clareira,
a preparar poções e a invocar Sombras — declarou a
Faia, arrepiando -se.
A Maia anuiu com a cabeça. A clareira era um
ponto de passagem entre o mundo humano e o
Mundo Estrela e, portanto, a corrente mágica era
muito forte ali. Há umas semanas, as raparigas e
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os animais tinham descoberto que a clareira estava
a murchar — as flores da primavera e os botões
verdes estavam a secar. Os animais desconfiaram
que se devia ao facto de alguém andar a praticar
magia negra na clareira, sugando -lhe o poder.
Os sonhos e as visões da Maia pareceram confirmar
isso mesmo.
— Maia, achas que estavas a ver algo que aconte-
ceu no passado ou era alguma coisa que iria acon-
tecer no futuro? — indagou a Lottie. — Os teus
sonhos podem mostrar ambos, não é?
A Maia assentiu com a cabeça.
— Não sei qual deles será.
— Disseste que era quase de manhã no teu sonho
— frisou a Ionie, pensativa, espreitando pela janela
do seu quarto. — Bem, o sol está a quase a nascer.
Estarias a ver o presente?
A Maia não pensara em tal possibilidade.
— Se calhar… Eu estava com este pijama — disse
ela, devagar.
— Então podias estar a presenciar o que estava
realmente a acontecer, no exato momento em que
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acontecia? — questionou a Giesta, espetando as
orelhas. — É uma ideia inteligente, Ionie!
— Claro que é — confirmou a Azeda. Ronronou
e encostou -se ao peito da Ionie. — A Ionie tem
sempre excelentes ideias.
A Ionie pareceu agradada.
— Se aconteceu mesmo agora, pode ainda haver
pistas na clareira… pistas que nos ajudem a descobrir
quem é esta pessoa — referiu, ansiosa. — Podemos
descobrir uma pegada ou a pessoa pode ter deixado
cair algo. — Empurrou o edredão para trás. — Podía-
mos ir dar uma vista de olhos.
— Está bem! — exclamou a Maia, levantando -se
de um pulo.
— Mas, e se a tua mãe aqui vier, Ionie? — per-
guntou a Lottie.
— Deixo um bilhete a dizer que fomos dar um
passeio logo pela manhã e que levo o telemóvel para
ela ligar se ficar preocupada — respondeu a Ionie.
— Não há problema.
— Hum… e se formos à clareira e a pessoa voltar?
— interrogou a Sita.
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— Ainda melhor. Assim vamos poder saber quem
ela é e usar a tua magia para lhe ordenar que pare!
— declarou a Ionie.
— Oh… OK — disse a Sita, parecendo um pouco
alarmada.
— Vamos lá, meninas, toca a vestir! — insistiu a
Ionie. Pegando numa camisola de capuz, ela enfiou-
-a por cima do pijama.
— Sim, já chega de ficarem aí sentadas como
estátuas e toca a entrar em ação — disse a Azeda,
passando levemente sobre os colchões insufláveis e
parando ansiosa junto à porta, com a cauda felpuda
bem espetada para cima. — A Ionie tem razão. Não
há tempo a perder.
A Giesta saltitou até junto dela.
— Desta vez concordo contigo, gatinha — decla-
rou a raposa, com os seus olhos a brilhar de excitação
e a cauda felpuda a agitar -se. — Vamos lá!
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