O amor mora ao lado debbie macomber

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Sumário

Capa

Sumário

Folha de Rosto

Folha de Créditos

Dedicatória

Agradecimentos

Um

Dois

Três

Quatro

Cinco

Seis

Sete

Oito

Nove

Dez

Petiscos Caseiros Para Seu Gato

Notas

Leia também – A Pousada RoseHarbor

Capítulo 1

A vida também nos reserva boassurpresas...

DEBBIEMACOMBER

TraduçãoPaula Gentile Bitondi

Publicado sob acordo com Harper Collins PublishersTítulo original: Family Affair

Copyright © 1994, 2011 by Debbie MacomberCopyright © 2013 Editora Novo Conceito

Todos os direitos reservados.

Esta é uma obra de ficção. Nomes, personagens,lugares e acontecimentos descritos são produto daimaginação do autor. Qualquer semelhança com

nomes, datas e acontecimentos reais é meracoincidência.

Versão digital – 2013

Produção Editorial:Equipe Novo Conceito

Este livro segue as regras da Nova Ortografia daLíngua Portuguesa.

Dados Internacionais de Catalogação naPublicação (CIP)

(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)Macomber, DebbieO amor mora ao lado / Debbie Macomber;tradução Paula Gentile Bitondi. -- 1. ed. --

Ribeirão Preto, SP : Novo Conceito Editora,2013.

Título original: Family affair.ISBN 978-85-8163-297-1

1. Ficção norte-americana I. Título.

13-06052 | CDD-813

Índices para catálogo sistemático:1. Ficção : Literatura norte-americana 813

Rua Dr. Hugo Fortes, 1.885 – Parque IndustrialLagoinha

14095-260 – Ribeirão Preto – SPwww.editoranovoconceito.com.br

Para Denise Weyrick,por seu amor, sua bondade,

sua dedicação à família e aos amigos,e também por sua coragem

Queridos amigos,

Muitos anos atrás me pediram paraescrever uma história que tivesse umgato como personagem. Sem problemas,nossos filhos já tiveram vários gatos. Oprimeiro animal de estimação queWayne e eu tivemos era um gato que sechamava, de maneira bem apropriada,Kitty. Durante os primeiros anos denosso casamento, os gatos eram tudopara nós. Depois, além dos filhos,vieram os hamsters, os porquinhos-da-índia, vários cães, uma ou duas cobras,um corvo ferido e até um cavalo. A casavirou um zoológico. Quatro filhos quenasceram em um período de cinco anose uma coleção de animais... Ah, os

velhos tempos!

Dei à minha história o título de OAmor Mora ao Lado por motivos quevocês entenderão assim que começarema ler. O livro fez um pequeno alvoroçono mundo das publicações; depois, foicolocado de lado no banco de dados dealgum computador, até agora...

Aparentemente minha gata Cléo, aheroína do livro, tem mais de uma vida.Ela está de volta e mal pode esperarpara contar sua história. Como vocêsverão em seguida, o amor no mundo dosgatos é quase tão complicado quanto nomundo dos humanos.

Espero que gostem desta comédia

romântica, ressurgida das cinzas como afênix, para viver e encantar mais umavez. Sirvam-se de uma xícara de chá,aconcheguem-se em uma cadeiraconfortável e, se possível, coloquem umgato no colo e o afaguem enquantoestiverem lendo. Sempre acheireconfortante ter um animal no colo.

Adoro falar com meus leitores. Vocêpode entrar em contato comigo pelo meusite: www.DebbieMacomber.com ouescrevendo para P. O. Box 1458, PortOrchard, WA 98366.

Com amor,Debbie Macomber

Um

— Sou tão firme quantouma minhoca — Lacey Lancastermurmurou enquanto entrava em seuapartamento. Jogou a correspondênciasobre uma mesa de canto e olhou para

Cléo. — Não disse uma palavra ao Sr.Sullivan, não soltei nem um pio.

Cléo, sua gata da raça abissínia,entrelaçou o corpo amorosamente nostornozelos de Lacey. O rabo dela seenrolou em volta de sua canela como umboá de penas, suave, macio eacalentador.

— Tive a oportunidade perfeita parapedir um aumento, e você acha que aaproveitei? — Lacey perguntou,chutando o ar para que os sapatosvoassem em direções contrárias. — Ah,não, deixei-a passar. E sabe por quê?

Cléo aparentemente não sabia. Laceytirou a capa de chuva de vinil verde-

brilhante, abriu a porta do armário e aenfiou lá dentro.

— Porque sou uma covarde, por isso!

Entrando na cozinha, ela abriu ageladeira, botou a cabeça lá dentro eficou observando deprimentes sobras decomida, duas embalagens de comidachinesa e os bulbos de tulipa que elapretendia plantar na sacada outubropassado.

— Estou morta de fome! — Ela abriua gaveta de vegetais e pegou um talomole de aipo. — Você sabe qual é omeu problema, não sabe?

Cléo miou e se esfregou nostornozelos de Lacey novamente.

— Ah, desculpe! Você também deveestar com fome. — Lacey abriu oarmário da cozinha e pegou uma lata decomida para gatos. Para sua surpresa,Cléo não demonstrou nem um pingo deinteresse, levantou o rabo e empinou otraseiro.

— O que está havendo com você?Sério, Cléo, esse não é o momento parabancar a esquisita. Preciso conversar!— Levando seu talo de aipo consigo, foiaté a sala e se jogou no sofá.

— Trabalho como uma escrava,aguento todo tipo de hora extra semreceber nem um tostão por isso, aliás, etudo isso para quê? O Sr. Sullivan nãome dá valor. E ainda usa as minhas

ideias de decoração. A pior parte é queele nem se dá ao trabalho de me darcrédito. — Ela abocanhou a ponta doaipo e mastigou-a com se estivesse sevingando de algo. O talo balançou de umlado para outro com o ataque e, então,curvou-se lentamente para baixo.

Lacey estudou o aipo.

— Parece comigo, de tão mole! —Sem conseguir ficar sentada, começou aandar pela pequena sala. — Não tiveaumento durante o ano todo em quetrabalhei para ele, mas assumi muitasoutras responsabilidades e completeiprojetos que ele não podia ou não queriafazer. Se não fosse por mim, o Sr.Sullivan não saberia o que estava

acontecendo no próprio negócio. —Nesse ponto, ela já estava sem fôlego efuriosa. — Trabalho mais que ele, masele quem é o dono, por Deus!

Obviamente Cléo concordava, poissoltou um gemido grave e choroso.Lacey nunca havia tido um gato, mas,depois de um divórcio devastador,sentiu que precisava de alguém. Ou deuma coisa. Que veio a ser Cléo.

Ela avistou a gata pela primeira vezna vitrine de um pet shop, com um olhardesamparado. O irmão e a irmã de Cléohaviam sido vendidos duas semanasantes e ela estava sozinha. Abandonada,a gata, já um pouco crescida, olhava,sem esperança e triste, o mundo passar

diante de seus olhos.

Lacey estava sofrendo com as mesmasemoções e, logo que se conheceram, asduas se tornaram amigas. Nada bobo, odono do pet shop reconhecia uma boavenda de longe. Ele usou toda sua lábiapara convencê-la de que Cléo era umótimo investimento. Se ela a cruzasse evendesse os filhotes, dentro de mais oumenos um ano, de acordo com ele, oinvestimento original seria compensado.

Lacey não estava muito interessadaem criações, mas parecia algo quedeveria tentar. Ela queria companhia, e,depois de seu casamento desastroso, nãoqueria mais saber de homens em suavida. Um gato não mentiria para ela, não

a trairia nem a faria sofrer. Peter, noentanto, havia feito tudo isso com umaprecisão cirúrgica.

Ah, o velho Peter! Ela lhe deveriaagradecer por todas as lições preciosasque ele a havia ensinado. Talvez um diaela se lembrasse do casamento semsentir aquela dor esmagadora. Eleprometeu amá-la e respeitá-la, e entãoanunciou, calmamente, em uma tarde dedomingo, sem aviso prévio, que a estavadeixando para ficar com outra pessoa.

A tal da outra pessoa era uma louraalta com olhos azul-piscina e um corpovoluptuoso. Lacey analisou aconcorrência, decidiu que não tinhanenhuma chance de ganhar a disputa e

assinou o divórcio. Ah, houve outrostipos de disputa, mas ela deixou seuadvogado tratar disso e fez o máximopara ficar de fora. Assim que o divórciosaiu, cortou seus laços com a cidade,mudou-se para São Francisco, encontrouum trabalho que amava e recomeçou avida.

Mais ou menos isso.

Dessa vez ela seria mais esperta.Homens estavam completamente fora dequestão. Pela primeira vez, estava sesustentando. Pela primeira vez, nãoprecisava de mais ninguém; porquepoderia acontecer tudo de novo: outraloura com corpo de coelhinha daPlayboy poderia destruir sua vida uma

segunda vez. Era melhor não arriscar.Quem precisava desse tipo desofrimento? Ela, não!

Lacey não estava se menosprezando.Com cabelos loiros esculpidos ao redordo rosto e os olhos verdes, parecia umafada adorável. Ela não chegava a ter ummetro e meio de altura, enquanto seuirmão, cinco anos mais velho, tinhaquase um metro e oitenta. Ela nuncaentendeu por que a natureza haviaeconomizado tanto em sua altura.

Após o divórcio, Lacey ficou aosfrangalhos e se sentiu perdida. TrazerCléo para sua vida a ajudou muito, tantoque achava ser possível viver sem acompanhia de um homem. Sua gata era a

companhia de que precisava.

— Tudo bem, tudo bem, você estácerta — Lacey disse, olhando para suainquieta amiga felina. — Concordoplenamente com você. Sou uma covarde.O verdadeiro problema é que não querolargar esse emprego. Só quero ganhar oque mereço, que é bem mais do queganho agora. — Ela saiu do divórciocom um acordo generoso. Casocontrário, estaria passando por umtremendo aperto.

Cléo concordou com um choramingargrave, diferente de qualquer som que jáfizera antes.

Lacey estudou a gata.

— Você está bem, garota? Sua vozestá estranha.

A gata empinou novamente o traseiroe saiu como um tiro pela sala paraatacar seu rato de tecido. O que quer quea estivesse incomodando, haviapassado. Pelo menos, Lacey esperavaque sim.

Resmungando para si mesma, voltou àcozinha e reexaminou o conteúdo dageladeira. Não havia nada lá dentro quea deixasse com água na boca. Asembalagens de comida chinesa estavamcheias de arroz duro e seco, e de ummolho vermelho grosso que um diahavia sido carne de porco agridoce. Acarne já não estava mais lá e o molho

parecia gelatina de cereja. Os únicositens comestíveis eram os bulbos detulipa, não que pensasse napossibilidade de comê-los.

Ela esperava se dar o luxo decelebrar seu aumento. A pizza doDomino era a coisa mais extravaganteque conseguia pensar. Mas não estavacelebrando nada naquela noite. Sequisesse jantar, teria de preparar algumacoisa.

O conteúdo dos armários da cozinhanão estava promissor: algumas latas desopa no meio de quinze latas de comidagourmet para gatos.

Sopa.

Sua vida se reduziu a uma escolhaentre creme de cogumelo ou sopa devegetais. Às cegas, pegou uma lata desopa de vegetais. No freezer, havia umaembalagem de pão de fôrma. Suasopções de sanduíche se limitavam ao depasta de amendoim com geleia ou queijoquente.

— Às vezes acho que odeio você! —As palavras atravessaram a parede dacozinha com tamanha clareza queparecia que a pessoa que as dizia estavaa seu lado.

Lacey suspirou. Seu vizinho, JackWalker, e a namorada estavam brigandooutra vez. Não havia sido apresentada aele, mas tudo bem. O cara sofria de

problemas graves com mulheres. Peloque ouvia através da parede, pareciaque o casal precisava de terapiadesesperadamente. Ela evitava o vizinhocomo o diabo evita a cruz, apesar de elejá ter tentado estabelecer contatoinúmeras vezes. Era educada, mas firmee até mesmo desencorajadora. Noentanto, tinha de lhe dar algum crédito:ele não aceitava “não” como respostatão facilmente. Com o passar dos meses,seus métodos se tornaram cada vez maiscriativos. Ele tentou flores, recadospresos à porta e, uma vez, tentou atraí-laaté seu apartamento com a oferta de umjantar. De todas as táticas, a promessade uma refeição havia sido a maisatraente, mas Lacey reconhecia uma

encrenca de longe, então, resistiubravamente.

Sair com Jack estava fora de questão,principalmente porque ele já estavaenvolvido com outra pessoa. Laceyperdeu a conta das vezes em que pôdeouvi-lo discutir com a namorada. Emalgumas noites, teve de ligar o rádiopara abafar o barulho.

Como era educada e preferia evitarproblemas, nunca reclamou. Lacey era otipo de pessoa que deixava que osoutros passassem por cima dela.

— Antes eu não era mole assim —ela se queixou para Cléo. — Foi nesseúltimo ano que perdi a autoconfiança.

Gostaria de culpar o Sr. Sullivan, masnão posso. Não quando sou eu aculpada. Você pensa que é fácil, que éuma coisa pequena, pedir aumento, né?Mas não é, e, para piorar, fico mesentindo como o Oliver Twist.[1] Aomenos ele teve coragem de pedir mais.O Sr. Sullivan deveria agradecer aoscéus. Sou boa no que faço, mas ele lápercebe? Ah, não! Ele simplesmente nãoreconhece meu valor.

Terminado o discurso, percebeu queCléo havia desaparecido. Até mesmo agata havia desertado. Ela a encontrou nopeitoril da janela, miando pateticamente.

Lacey pegou a gata no colo e a

afagou.

— Será que estou tão envolvida commeus problemas que deixei você delado?

Cléo saltou de seus braços e correuaté o quarto.

A discussão continuava no outroapartamento.

— Sarah, pelo amor de Deus, sejasensata! — Jack gritava.

— Solte os cachorros em cima dele— Lacey disse em voz baixa. — Apostoque você não sabia que ele estavasaindo com outras, né? Bem, não semartirize. Eu também não sabia que

Peter era tão mulherengo.

Sarah aparentemente seguiu seuconselho, pois a gritaria se intensificou.Jack, que geralmente era o mais calmodos dois, já estava começando a perderas estribeiras.

Se ouvisse com bastante atenção,talvez descobrisse a causa da briga,mas, na verdade, Lacey não estava tãointeressada assim.

— Eu o vi com outra semana passada— ela complementou, só por diversão.Lacey havia encontrado Jack nas caixasde correio. Havia uma mulher com ele enão era Sarah. Mas era sempre Sarahque voltava. Era sempre com Sarah que

ele gritava. Pelo jeito, a pobrezinhagostava muito dele. Que azar!

— Vou tomar a sopa de vegetais —Lacey informou Cléo enquanto entravano quarto, achando que a gata gostariade saber. — Não é nada que lheinteresse, infelizmente. — O que estavaincomodando sua gata antes pareciaestar sob controle.

Com o jantar pronto, Lacey colocou atigela de sopa fumegante e o queijoquente sobre a mesa. Havia acabado dese sentar quando algo atingiu a parededo apartamento ao lado. Por reflexo, deuum pulo.

O volume das vozes furiosas

aumentou. Jack já não estava mais tãocalmo nem no controle. Na verdade,parecia que ele havia perdidocompletamente a razão. Os dois estavamgritando, um tentando gritar mais altoque o outro.

Lacey suspirou. Era demais para ela.Deixando o guardanapo de lado, foi atéa parede da cozinha e bateu gentilmente.Ou eles não escutaram ou optaram porignorá-la, algo que faziam comfrequência cada vez maior.

Ela havia acabado de se sentarquando uma explosão quase a fez cair dacadeira. Um dos amantes enfurecidosdecidiu ligar o rádio. No volumemáximo.

O rádio foi desligado abruptamente,seguido por um discurso de Jack.

E foi ligado de novo.

E então desligado.

Mais uma vez, com a mesmagentileza, Lacey bateu com a palma damão na parede.

Eles a ignoraram.

Então, por alguma razão, houve umsilêncio. Um silêncio abençoado. Oproblema havia sido resolvido ou elesse mataram. Qualquer que fosse a razão,o silêncio era uma bênção.

Quando Lacey terminou o jantar,lavou a louça. Cléo continuava a se

entrelaçar em seus tornozelos, miando echoramingando o tempo todo.

— O que há de errado com você,garota? — Lacey perguntou outra vez.

Agachando-se, correu a mão sobre aespinha da gata.

Cléo arqueou as costas e choramingouum pouco mais.

— Você está diferente — Laceycomentou, preocupada.

Então, finalmente se deu conta.

— Você está no cio! Ai, meu Deus,você está no cio! — Como ela poderiaser tão burra?

Saindo da cozinha, procurou em sua

agenda o nome que o dono do pet shophavia passado. Se ia cruzar a gata,precisava falar antes com essa mulher.

— Coitada da Cléo — Lacey dissecom compaixão. — Pode confiar emmim, querida, os homens não valem essetrabalho todo. — E rapidamenteencontrou o número.

— Meu nome é Lacey Lancaster —ela disse apressada. — O dono da Pet’sWorld me deu seu número. Comprei umagata da raça abissínia alguns mesesatrás.

Logo depois que se apresentou, adiscussão no apartamento ao ladorecomeçou.

— Sinto muito, querida, mas nãoconsigo entendê-la! — a mulher do outrolado da linha disse com um sotaqueirlandês suave.

— Disse que comprei uma gata daraça abissínia.

— Parece que você está em uma festa.

— Não tem festa nenhuma — Laceydisse mais alto, quase gritando também.

— Talvez seja melhor me ligarquando seus convidados forem embora— disse a irlandesa, gentil, e desligou otelefone.

Lacey teve um estalo. Sua educaçãoque lhe dizia para nunca causar

problemas foi por água abaixo em umsegundo. Ela bateu o telefone no ganchoe cerrou os punhos.

— Estou farta disso! — ela gritou. Ede fato estava. Farta dos homens que nãosabiam o significado das palavras:“fiel” e “compromisso”. Dos patrõesque tiravam vantagem dos empregados.E dos vizinhos neandertais que levavamuma mulher atrás da outra para dentro deseus apartamentos sem ao menos pensarduas vezes.

Lacey saiu de seu apartamento para ocorredor. Seus passos eram rápidos elargos. Entretanto, quando chegou aoapartamento de Jack, o fogo de seu ódiohavia abrandado. A raiva não resolveria

nada. Bateu à porta calmamente eesperou.

A discussão parou abruptamente e aporta se abriu. Lacey levou um susto,que até a fez dar um pulo para trás.Sarah também saltou para trás e olhoupara ela. Era evidente que a outramulher não a havia ouvido bater.

— Olá — Lacey disse com osbatimentos cardíacos zunindo em seusouvidos. — Queria saber se vocês doispodiam falar um pouco mais baixo.

A mulher, jovem e bonita, piscavatentando conter as lágrimas.

— Não precisa se preocupar. Já estoude saída.

Então Jack apareceu, parecendocortês e calmo. Seu rosto se iluminouquando viu que era Lacey.

— Lacey — ele disse dando-lhe umsorriso afável —, que surpresaagradável!

— Com essa gritaria toda nãoconsegui nem dar um telefonema — elaexplicou, sem querer dar uma impressãoerrada. Não era uma visita social.

— Me perdoe! — Jack olhou paraSarah. — Isso não vai se repetir.

O queixo de Sarah caiu enquanto elapendurava a bolsa no ombro.

— Eu... eu acho que não temos mais

nada a dizer um para o outro. — Passoupor Lacey e foi em direção ao elevador.

— Sarah! — Jack colocou as mãossobre os ombros de Lacey e a colocoude lado, virando-se novamente paraSarah. — Estou avisando... só não façanenhuma besteira.

— Como ouvir você?

Jack suspirou e olhou para Lacey,como se tudo fosse culpa dela.

Lacey abriu a boca para dizerexatamente o que pensava dele, mas, derepente, mudou de ideia. Jack não aescutaria. Homens nunca a escutavam.Por que perder tempo?

Sem nada mais a dizer, voltou aoapartamento. Para sua surpresa,percebeu que havia deixado a portaaberta. Imediatamente pensou em Cléo ecorreu para dentro, em pânico.

Parou assim que a avistou.

— Cléo! — A gata estava em meio aofogo da paixão com um gato que nuncahavia visto antes.

Colocando as mãos sobre a boca,Lacey soltou o corpo apoiando-se naparede. Não precisava mais dairlandesa. Cléo já havia encontrado seupar.

Dois

— Pare! — Lacey ordenou,sabendo que era tarde demais. Os gatosa ignoraram. E lá se foi a alegria de sertutora de um gato.

Sabendo que só havia uma coisa a serfeita, Lacey correu até a cozinha eencheu um copo grande de água. Embreve, ela conseguiria chamar a atençãodos dois amantes. Correndo de volta àsala, tropeçou em um tapete ecambaleou, em uma tentativadesesperada para não cair. Quandoalcançou os gatos, a maior parte da águaestava em sua blusa e apenas algumasgotas caíram sobre o casal apaixonado.

Nesse momento, já haviam terminadoe o gato desconhecido estavaprocurando uma maneira de sair doapartamento. Típico macho! Conseguiu oque queria e já estava pronto para seguirfeliz com sua vida.

Lacey estava prestes a abrir a portade correr envidraçada que dava para asacada, quando alguém tocou acampainha. Virando-se com um olharferoz de reprovação para o gato de rua,atravessou a sala e olhou pelo olhomágico.

Era seu vizinho metido a Don Juan,recém-saído da briga com Sarah.

— Olá, mais uma vez. — Ele lhelançou um sorriso tranquilo que, Laceyodiava admitir, tinha lá seu efeito. Nãosabia o que exatamente a tornava tãovulnerável a esse tipo de homem, mas,fosse o que fosse, ela sinceramentedesejava que isso não acontecesse mais.

— Você não viu meu gato por aí, viu?

— Você tem um gato?

— Na verdade, ele permite que eumore com ele.

Como se fosse planejado, Cléopassou desfilando, com o raboempinado, dando a impressão de fazerparte da realeza. O gato de pelos longose de raça indefinida veio logo atrás,parecendo ter descansado o suficientepara o segundo round.

— Olha o Cão aí — disse Jack.

— Cão? Você deu o nome de Cão aseu gato?

— Sim — ele disse, passando por

ela. Então pegou o gato com carinho e oembalou nos braços. — Eu queria umcachorro, mas tive de abrir mão.

— Então você pegou um gato ecolocou o nome de Cão? — Em vista decomo conheceu seu companheiro fiel,Lacey não achou isso engraçado.

— Exatamente.

— Bem, escuta só, seu Cão tirou avirgindade da Cléo. O que vocêpretende fazer a respeito?

Os olhos de Jack se arregalaram.Lacey podia jurar que ele pareciaextremamente satisfeito.

— Cão! O que você tem a dizer em

sua defesa?

— Estou perguntando a você e não aele — Lacey disse, endireitando osombros. — Como um dono responsável,espero que tenha uma resposta.

Os olhos escuros de Jack seapertaram.

— Tudo o que posso fazer é medesculpar.

— Então aceito suas desculpas —Lacey murmurou. Parecia muito poucoem vista das possíveis consequências,mas, quanto menos conversassem,melhor. Quanto mais o analisava, maisse sentia atraída por ele, o que não faziasentido algum. Ela parecia alguém em

uma dieta restrita, totalmente seduzidapor uma bandeja de sobremesa.

— Olha, eu estava mesmo esperandouma oportunidade de a conhecer melhor— Jack disse, como se estivesseplanejando ficar por lá mais um pouco.

Lacey não podia permitir que issoacontecesse. E quase abriu a porta paraele.

— Já somos vizinhos há váriosmeses. Acho que começamos mal — elecontinuou, sem dar nenhum indício deque estava de saída. — Entendo que nãoesteja interessada em namorar, maspoderíamos ser um pouco maisamigáveis, não acha?

Lacey concordou educadamente,porém de forma relutante. Seria útil teralguém para alimentar a gata e pegar acorrespondência às vezes. Ela faria omesmo por ele, mas queria deixar bemclaro que era só isso que estava dispostaa oferecer.

E foi o que disse a ele.

— Amigos?— ele perguntou,estendendo a mão.

— Amigos. — Ela aceitou, e os doisselaram o acordo com um aperto demão.

Sentiu que o aperto dele eradeterminado e seus dedos seguraram osdela por mais tempo que o necessário.

Ela não gostou de como seu coraçãoreagiu. Esse homem era perigoso emvários sentidos. Quanto menos seenvolvesse com ele, melhor.

Parecia que ele estava esperando queela o convidasse para um café ou umaconversa. A ideia era tentadora. Serialegal ter um vizinho amigável, mas alição que aprendera com Peter bateumais forte.

— Parece que temos o mesmo amorpelos gatos — Jack adicionou, como seisso fosse a base para uma amizadeduradoura.

— Eu gosto da Cléo — ela disseenfaticamente. — Agora, se me dá

licença... — Dessa vez, ela segurou aporta para ele sair.

— Foi legal conversar com você,Lacey — disse Jack, com um sorrisotolo e poderoso o suficiente paraderrubar sua decisão de limitar aamizade entre eles. — Espero que nostornemos bons amigos.

Lacey não deixou de perceber aênfase em bons. A última coisa de queprecisava ou que desejava era umaamizade com um conquistador decarteirinha. Principalmente porque jáhavia sido tola o suficiente para se casarcom um desses, que a deixou por outrasem nenhuma piedade.

Como não tivera coragem para pediraumento, achou ainda mais difícilexplicar a seu vizinho que não estavainteressada em um homem infiel.

Então Jack foi embora, para alívio deLacey. Ela pegou Cléo nos braços e aapertou, como se sua amada gata tivesseescapado por um triz. Cléo, no entanto,não gostou de ser apertada contra ablusa molhada e se contorceu,conseguindo saltar para o carpete. Elafoi até a cadeira de assento fofo, seulugar favorito para uma soneca, e entãose encolheu, realizada. Devia ser aimaginação de Lacey, mas Cléo pareciacompletamente calma e plenamentesatisfeita.

Quando Lacey estava prestes a ligar atelevisão, o telefone tocou.Provavelmente era sua melhor amiga,Jeanne Becker. Jeanne foi uma dasprimeiras pessoas com quem Laceyfizera amizade depois de se mudar paraSão Francisco. Ela era assistenteodontológica e solteira, mas estavanamorando firme com Dave havia quaseum ano. Contudo, nenhum dos doisparecia ter pressa para firmar umcompromisso. Com tantos amigos sedivorciando, eles queriam ter bastantecerteza de que estariam dando o passocerto.

— E então? — Jeanne perguntou. —Você pediu o aumento?

— Não — Lacey confessou.

— Por que não? — Jeanne indagou.— Você prometeu que pediria. Por queé tão difícil assim falar com o Sr.Sullivan?

— Não tenho desculpa nenhuma. Souuma molenga mesmo.

— Do que tem tanto medo? — Jeanneperguntou depois de um momento,pensativa, como se houvesse algoprofundo e sombrio escondido nainfância de Lacey que a impedia deconfrontar seu patrão.

— Não sei — Lacey admitiu. — É sóque o Sr. Sullivan é tão... intimidador.Ele tem aqueles olhos intensos e, quando

peço para falar com ele, olha para orelógio no pulso como se não tivessetempo para mim e me pergunta se issovai lhe tomar muito tempo. E quandotermina essa pequena rotina, eu já perdia coragem.

— Você não percebe que esta é aintenção dele?

— É, suponho que sim — Laceymurmurou desanimada. — Mas saberdisso não ajuda em nada. Minhaconversa com o Sr. Sullivan não foi aúnica coisa que deu errado — elaacrescentou. — Cléo está no cio e o gatodo vizinho entrou furtivamente em meuapartamento, achei os dois... juntos.

— Nossa, parece que você teve umdia péssimo!

— E tem mais — Lacey disse. —Meu vizinho sugeriu que nostornássemos amigos.

— Aquele pedaço de mau caminhoque está tentando chamar você para sairhá seis meses? Eu o conheci, lembra?

Lacey não estava gostando de pensarem Jack daquele jeito, mas deixoupassar o comentário da amiga.

— Sim. Ele é o dono do Cão, o gatoque se aproveitou da Cléo. E, antes quevocê pergunte, é esse mesmo o nome dogato.

— Acho que eu ia gostar dessevizinho — Jeanne disse, rindosuavemente.

— Pode ficar com ele.

— Lacey! Sinceramente, quando vocêvai superar o passado? Peter foi umidiota, mas ele não está mais na suavida. A pior coisa que pode fazer éculpar outros homens pelo queaconteceu entre seu ex e você.

— Não estou culpando outroshomens.

— Você está divorciada há mais deum ano e nunca sai com nenhum homem.

— Não quero outro relacionamento.

— Foi uma decisão sábia não seenvolver com ninguém logo depois dodivórcio — Jeanne disse, compreensiva.— Mas agora é hora de seguir com suavida. Se quer um conselho, acho quedeve sair com Jack. Ele é adorável.

— Você está louca? — Lacey insistiu.— Ele estava brigando com Sarah outravez. Tudo o que posso fazer é não contaràquela doce jovem o que sei. Ele a estáfazendo de boba, assim como Peter fezcomigo.

— Você está tirando conclusõesprecipitadas.

— Não acho, não — Lacey insistiu.— Eles brigam o tempo todo. Das partes

das conversas que escutei, parece queJack quer que ela more com ele. Eparece que ela o conhece muito bem,porque se recusa a aceitar o convite. Eutambém não confiaria nele.

— Você sabe o que aconteceu, nãosabe? — Jeanne perguntou. — Você setornou uma cética. Acho que não fazideia do quanto Peter machucou você.

— Besteira! — Foi a respostaimediata de Lacey. — Ele não fez nadaalém de me ensinar uma lição valiosa.

Lacey não dormiu bem aquela noite.Não era de se admirar, em vista do dia

que teve. A desagradável confrontaçãocom seu vizinho continuava a incomodá-la. Jack era tranquilo e amigável, o tipode homem que deixa as pessoas àvontade. Mas não ela. Lacey sempreficava na defensiva quando ele estavapor perto.

E, na manhã seguinte, cruzaram-se aoacaso no corredor, quando saíam paratrabalhar.

— Vejo que está indo para a labuta— ele disse amigavelmente enquantoiam até o elevador.

Ele estava vestindo um terno de trêspeças escuro e, na cabeça de Lacey, aúnica palavra que encontrou para

descrevê-lo era elegante. Seu sorrisoera aberto e encantador. “Encantador atédemais”, Lacey concluiu. Seus olhoseram amigáveis e ternos, o tipo de olhardo qual uma mulher pode ficar selembrando por um bom tempo.

— Onde você trabalha? — eleperguntou, puxando conversa enquantochamava o elevador.

— Na Sullivan’s Decoração — elarespondeu, sem discorrer mais sobre oassunto. Encorajar a conversa entre osdois não seria sábio. Era fácil demais sedeixar seduzir pelo magnetismo de Jack.

— Mesmo? Acho que foi essa aempresa que o banco contratou no ano

passado quando resolveram redecorá-lo.

— Já redecoramos vários bancos —ela concordou calmamente. Então, Jackera um executivo do ramo bancário?Lacey não pediu mais informações,embora não pudesse negar que estavacuriosa.

Como se lesse seus pensamentos, elepegou um cartão de visita do bolso e lheentregou.

— Venha falar comigo se precisar deempréstimo um dia.

— Pode deixar, obrigada.

— Esperarei ansioso para ajudá-lacom isso — ele sorriu para ela e,

mesmo sabendo o que sabia sobre ele,seu coração palpitou. “É algum tipo demaldição”, Lacey pensou. Ela estavafadada a se sentir atraída pelo tipoerrado de homem. Provavelmente haviaalgum nome científico para isso, algumtermo que os psicólogos utilizavam paradescrever mulheres como ela. “Louca depedra”, ela decidiu. Envolver-se comele seria totalmente desastroso.

— Tenha um bom dia! — Jack dissequando a porta do elevador se abriu.

— Você também — respondeu e suavoz saiu pouco mais alta que umsussurro.

— Me diga uma coisa! — Jack disse,

virando-se para ela bruscamente, comose tomado de inspiração. — Por acasoestaria livre para jantar comigo amanhãà noite?

Instintivamente, Lacey ficou tensa. Eleainda não havia desistido.

— Não... sinto muito. Não estareilivre — ela disse. E aparentemente, suamensagem foi entendida, pois ele nãoinsistiu.

Ele olhou para o relógio e franziu assobrancelhas.

— Talvez outro dia.

— Talvez.

Lacey não prometera nada a Jack

Walker. Mas não conseguiu parar depensar nele o dia todo.

Na noite seguinte, quando Laceyestava colocando o lixo para fora, nofinal do corredor, deparou-se com Jackoutra vez, logo que ele saiu de seuapartamento.

Pegos de surpresa, os dois pararam ese olharam. Ele estava vestidoformalmente, como se estivesse indo aum jantar chique. Ninguém precisavalembrá-la de que poderia estar jantandocom ele. Ela recusara seu conviteinusitado e, por um momento, desejoutê-lo aceitado. Mas decidiu que fez bem

em recusá-lo. Provavelmente haviavárias outras mulheres por quem eleestava interessado. E também semprehavia Sarah. Sempre leal e fiel.

— Olá de novo — Jack disse, comseu sorriso eletrizante.

— Olá. — Sua voz soava estranha.Tensa.

— Tudo bem com você?

— Tudo — ela não perguntou devolta. A resposta era óbvia. Ele pareciaestar ótimo. Deveria ser proibidoexecutivos serem tão atraentes eamigáveis assim.

— Espere aí, me deixe ajudá-la —

ele tirou a lixeira de plástico de suamão.

— Pode deixar, eu aguento. —Todavia, ficou feliz por ele teroferecido ajuda.

— Tenho certeza que sim, mas medeixe fazer o papel de cavalheiro.Minha mãe ficaria orgulhosa. — E osorriso estava lá de volta, poderoso osuficiente para derreter as decisões maisfirmes. As dela, infelizmente,costumavam se dissolver maisrapidamente que as dos outros.

Eles andaram juntos pelo corredor.Lacey fez de tudo para não esbarrar seusombros nos dele.

— Obrigada pela ajuda — Laceydisse, quando chegavam à porta de seuapartamento.

— Sem problema. Fiquei feliz deajudar.

Ela pegou na maçaneta com a intençãode escapar da situação.

— Divirta-se — ela disse, virando-sede costas para ele.

— Isso provavelmente não acontecerá— ele falou suavemente. —Principalmente porque não estarei comvocê. Estou fadado a aguentar ummaçante jantar de negócios. Se ao menosvocê tivesse aceitado meu convite.

— Eu... — Ela estava tão atordoadacom suas palavras sedutoras que malconseguia falar. — Tenho certeza de queterá uma noite agradável. Vai seencontrar com Sarah? — ela adicionou,sem saber de onde viera a coragem parafazer a pergunta. Era Sarah que eledeveria ter convidado, não ela.

— Não nesta noite — ele respondeu.— Infelizmente vou ter de levar minhaassistente.

Primeiro a convidou e, então, quandoela recusou o convite, ele convidou aassistente. De repente, Lacey ficoufuriosa. Era exatamente isso que elaesperava de alguém como Jack. Dealguém como Peter.

Pobre Sarah! Destinada a ter seucoração partido.

Três

— Cléo está prenha — Laceylamentou e se jogou no banco do metrôao lado de Jeanne, duas semanas depois.— Levei-a ao veterinário ontem à tardee ele confirmou. — Ela estava

profundamente decepcionada porque suagata abissínia de raça pura haviacruzado com o gato de Jack. E ainsatisfação com o vizinho não paravapor aí.

Sarah havia passado por lá no últimofim de semana e os sons da discussãoentre eles atravessaram as paredes denovo. Estavam furiosos. Dessa vez, noentanto, mantiveram a intensidade em umtom mais grave e a briga não duroumuito tempo. Não mais que dez minutosse passaram antes de Lacey ouvir aporta do apartamento de Jack bater comforça e os passos de Sarah pelocorredor. Jack colocou a cabeça parafora e a chamou, sem sucesso.

— O que você fará quanto à Cléo? —Jeanne queria saber.

— Eu... ainda não decidi. — Ela tinhavárias opções, mas uma coisa era certa:estava determinada a fazer com que Jackassumisse sua parte daresponsabilidade.

Naquela noite, depois do trabalho,com o coração na boca, Lacey foi até aporta de Jack e bateu três vezes, combatidas firmes e marcadas.

— Lacey, olá. Que surpresaagradável!

— Olá — respondeu com um tom

sério. — Será que eu poderia entrar umsegundo?

— Claro, vai ser uma honra. — Eleabriu caminho para que ela entrasse nasala de estar, que era mais que o dobroda dela em tamanho. — Aceita algo parabeber? — ele ofereceu.

— Não, obrigada. — Ela se sentouem um sofá de couro branco e tirou umcaderninho da bolsa. — Esta não é bemuma visita social.

Jack se acomodou em uma cadeirareclinável, de frente para ela. Ele sesentou na beirada do assento e apoiou oscotovelos nos joelhos.

— Algum problema?

— Na verdade, sim — Laceyrespondeu. — Cão engravidou Cléo.

— Entendo.

— Achei que você deveria serinformado.

— Sim, claro. — Ele olhou para elacomo se não fizesse a menor ideia doque exatamente ela queria. — E você,está precisando de alguma coisa? —perguntou, depois de alguns segundosconstrangedores.

Típico dos homens!

— Sim — ela disse, com dificuldadede conter a irritação. — Quero que vocêhonre minha gata.

— O quê? Você está sugerindo queeles se casem?

— Não seja ridículo!

— Então, o que quer dizer com isso?

— É no mínimo justo que você dividaas despesas comigo.

Ela odiou a maneira como sua voztremeu.

— O Dr. Christman, veterinário daCléo, prescreveu vitaminas caras eexames. Além disso, espero que vocêencontre donos para a sua metade dosfilhotes.

— Minha metade.

— Sim. Por favor, me envie os nomes

para que passem pela minha aprovação.

Jack coçou a cabeça.

— Você está falando sério?

O simples fato de ele questionar asrazões de Lacey já lhe disse tudo o queprecisava saber sobre ele.

— Sim. Estou falando sério. Muitosério. — Ela se levantou e lhe entregouuma lista com tudo o que havia gastadoaté aquele momento. — Você pode mepagar quando quiser. — Encostou abolsa no peito como se fosse algum tipode escudo e manteve as costasextremamente eretas. — Existemconsequências quando se tem um gato derua, Sr. Walker. Mesmo se o nome dele

for Cão. — Lacey sabia o quanto soavafalsa. Linhas de retidão enrugavam seurosto enquanto ela saía do apartamento.

Ela só percebeu o quanto estavatremendo quando chegou a seuapartamento. Sentiu como se os joelhosestivessem prestes a desmontar. Sentou-se no sofá e Cléo pulou em seu colo,ávida por atenção.

Lacey correu a mão pelas costas dagata.

— Bem, garota, você vai ser mãe. Oque acha disso?

Cléo miou.

— Os próximos meses deverão ser

bem interessantes — ela disse. Dr.Christman havia lhe dado diversospanfletos sobre a reprodução dos gatos.Lacey os havia lido várias vezes. Elacrescera na companhia de um meigococker spaniel chamado Sherlock, mas,como era macho, nunca havia pensadonesse tipo de coisa.

Na tarde seguinte, a campainha deLacey tocou. Jack estava do lado defora, apoiando-se no batente da porta.Ele abriu um sorriso lento e leve, defazer parar o coração.

— Como anda Cléo?

— Bem. Ela está mais carente, mas,fora isso, tem se comportado como decostume.

— Levei Cão para ser castrado. Eletem ficado mais recluso ultimamente.

Lacey precisou apertar os lábios paranão sorrir. No que lhe dizia respeito,seria bom que Cão contivesse seusmodos promíscuos.

— Posso entrar?

Lacey não sabia se era uma boa ideiadeixar Jack entrar no apartamento.

— Tudo bem — ela disse, relutante,abrindo caminho.

Então ela cometeu o erro de lhe

perguntar se aceitava algo para beber eJack respondeu que aceitava um café.Como ela não tinha café pronto, teve depreparar.

Para seu espanto, Jack estavadeterminado a ajudá-la. Ela ligou a águae mediu a quantidade de grãos, o tempotodo reclamando internamente do quantosua cozinha era pequena. Não conseguiase mover sem encostar em Jack. Quandoficou nas pontas dos pés para pegar ascanecas, ele passou por trás dela eencostou todo o seu corpo nela.

Sentiu-se sem saída e sem graça, alémde insuportavelmente desconfortável. E,pior, estava corada, embora houvessefeito tudo o que podia para disfarçar o

efeito que ele tinha sobre ela.

— Já que vou pagar pelas despesasda gravidez de Cléo, é no mínimo justoque eu tenha direito a visitas — eledisse, despreocupado.

Um arrepio correu pelo corpo deLacey.

— Direito a visitas?

— Sim. Gostaria de vê-la de temposem tempos para ver se está bem.

Lacey também não sabia ao certo seessa era uma boa ideia, mas nãoconseguiu pensar em nenhuma razãoplausível para protestar.

— Posso garantir que cuidarei bem da

Cléo.

— Tenho certeza de que sim, masgostaria de ver com meus própriosolhos.

— Tudo bem — ela concordou, masdeixou claro, no tom de voz, que eracontra a sua vontade.

O café ficou pronto. Jack quis o seupuro e forte, e esperou enquanto Laceydiluía o dela com leite, antes de voltar àsala.

Cléo entrou majestosa na sala e, semtitubear, pulou no colo de Jack. Laceyficou atônita. A gata não gostava deestranhos.

— Cléo! — Lacey a reprimiu. —Desça já daí!

A gata não seria tola de obedecê-la.Jack estava acariciando suas costas commovimentos longos e suaves, que afaziam ronronar de prazer. Issoprovavelmente acontecia com todas asmulheres em que ele tocava. Laceytentou se ressentir por isso, mas, parasua surpresa, percebeu que nãoconseguia.

Na verdade, ocorreu exatamente ooposto. Era como se as mãos de Jackestivessem sobre Lacey. Uma sequênciade sensações quentes e desconcertantescomeçou a brotar dentro dela. Sensaçõessexuais. Sua respiração vinha em sopros

curtos. Ela deu um gole no café e seforçou a olhar para o outro lado,qualquer coisa que fizesse com que assensações se dissipassem. Eradesconfortável demais se lembrar dessaparte de sua natureza, que ela enterrarafundo depois do divórcio econvenientemente ignorara até a chegadade Jack a sua vida.

Olhar para o outro lado não ajudou.Nada ajudou.

— Cléo é uma gata linda — ele disse,com uma voz arrastada, sexy e grave,que fez com que Cléo ronronasse e ocoração de Lacey acelerasse.

— Obrigada — conseguiu dizer.

A sensação de dormência seespalhava lentamente, inexoravelmente,por todo o corpo, deixando-a com umanecessidade que ela não ousariaexpressar para qualquer outro serhumano no Universo. Fazia bem mais deum ano que um homem não a tocava. Atéentão.

Agora era uma tortura ficar ali semfazer nada. Para seu espanto, Jackparecia relaxado e sem nenhuma pressade ir embora.

— Você pensou nas pessoas paraquem vai dar sua metade dos filhotes?— ela perguntou, a fim de quebrar osilêncio.

— Não.

— Acho... que minha amiga, Jeanne,vai ficar com um. — Seu olharacompanhava o movimento da mão deJack correndo o pelo macio de Cléo. Otoque de seus dedos era leve e delicado.O toque de um amante. Ele devia ser umamante terno, ela pensou.

Lacey balançou a cabeça, tentandolimpar a mente antes que a imagem de simesma fazendo amor com ele seconcretizasse. Deus do céu, isso eramais do que ela podia suportar!

— Lacey! — A voz arrastada e sexyvoltou. — Venha aqui.

— P... por quê?

— Quero que sinta a barriga de Cléo.

— Ainda é cedo demais para sentir osfilhotes — ela protestou e praticamentepulou da cadeira. Ele sabia exatamente oque estava fazendo com ela e estavagostando da situação. O rosto de Laceycorou.

Ela correu até a cozinha. Abriu atorneira, encharcou uma esponja elimpou o balcão, que já estava limpo. Seao menos ele fosse embora! Mas seriaum milagre. Ele a tinha em suas mãos enão estava disposto a desistir.

Jack foi até a cozinha e ela fechou osolhos, pedindo a Deus que lhe desseforças.

— Foi gentil de sua parte passar aqui.— Ela esperava que ele fosse emboraantes que fizesse papel de boba.

— Por que você recusou meu convitepara jantar? — ele perguntou.

Ela podia jurar que ele estava atrásdela, a apenas alguns centímetros dedistância, mas não ousou se virar.

— Lacey?

Ela abriu o armário e pegou uma latade comida para gatos.

— Acho que não é uma boa ideia nosenvolvermos.

— Por que não?

— Tudo bem sermos amigos, mas...

— Não amigos demais.

— Exatamente. — Seu coraçãocontinuava batendo em velocidademáxima, bradando alto em seus ouvidos.Ela não tinha coragem de olhar para ele.Não conseguia, não sem que elepercebesse que ela não estava muitodiferente de como Cléo estava com Cão.

— Olhe para mim — ele pediudelicadamente. Ela não obedeceu; elecolocou as mãos em seus ombros elentamente a virou de frente para ele.Então, correu o dedo pela face de Lacey.

— Olhe para mim — ele repetiu.

Lacey fechou os olhos e abaixou acabeça.

— Acho que é melhor você irembora.

Usando o polegar, Jack levantou oqueixo dela.

— Abra os olhos.

Ela não tinha outra escolha a não serfazer o que ele pedira. Relutantemente,os olhos de Lacey se abriram e seu olharencontrou o dele.

— Eu me lembro do dia em que vocêse mudou para cá — ele disse suave eclaramente. Seu olhar estava sombrio eintenso. — Percebi naquele momento oquanto queria conhecê-la. Havia algo devulnerável em você. Algo que me diziaque eu teria de ser paciente. Então,

esperei. Já faz um ano e ainda estouesperando, mas estou começando aperder a paciência.

A garganta de Lacey estava seca e eladuvidava que conseguisse falar aindaque quisesse. E não falou mesmo. O quepoderia ter dito? Que uma vez confiouem alguém que destruiu sua fé em todosos homens?

— Quem machucou você? — eleperguntou.

Ela abanou a cabeça, indicando quenão queria responder.

Ele então a envolveu, atraindo-a paraum círculo de proteção, consolando-aem seus braços. Seu abraço era leve,

reconfortante e sedutor.

Lacey queria resistir, tentou juntarforças para se afastar e então percebeuque não conseguia.

— Quero beijar você — elesussurrou, como se sentisse queprecisava avisá-la de cada passo quetomaria, por medo de que ela se soltassee fugisse como um coelho assustado.

— Não — disse e chacoalhou acabeça de um lado para o outro bemrápido. De alguma maneira, elaconseguiu resistir, apoiou suas mãos nosbraços dele e se afastou.

Ele a soltou no mesmo momento, comcerta hesitação.

— Por que não? — perguntou. —Jamais machucaria você, Lacey. Jamaisfaria algo que não quisesse ou para oqual não estivesse preparada.

— Você deve achar que sou ingênua— ela disse ofegante, por causa doesforço que fizera para se afastar.

— Ingênua?

— Você ama Sarah.

— Claro que a amo.

Pelo menos ele não negou.

— Quantas outras mulheres você temem suas mãos? Não responda. Nãoquero saber. Só entenda uma coisa. Merecuso a ser uma delas.

— Lacey...

— Por favor, vá embora. — Elacruzou os braços e levantou o queixo,desafiadora.

— Não sem que você me ouça.

— Não há nada que possa dizer queme faça mudar de ideia.

O sorriso de Jack zombava de Lacey.

— Nem mesmo se eu lhe disser queSarah é minha irmã?

Quatro

— Sua irmã! — Lacey repetiu,pasma. Por um momento, perguntou-sese poderia acreditar em Jack, e decidiuque sim. A intimidade entre ele e Sarahfoi o que mais havia chamado sua

atenção na primeira vez em que os virajuntos. Fazia sentido serem irmãos.

— O que você achou que ela fosse?— Jack perguntou. — Você presumiuque Sarah e eu fôssemos amantes? Comopôde pensar isso?

— Vocês estão sempre brigando e...

— Claro que brigamos, somosirmãos! Sarah está morando com umhomem e eu não aprovo. Queria que elausasse a cabeça que Deus lhe deu esaísse dessa.

— Você não apoia o fato de moraremjuntos ou o homem com quem ela estámorando? — Lacey quis saber.

— Os dois. Em minha opinião, elaestá cometendo o maior erro de suavida. Minha mãe e meu pai não sabem, eeu me recuso a esconder essa históriapor mais um segundo.

— É por isso que você viveinsistindo para ela vir morar com você!— Lacey havia ouvido a essência dadiscussão entre eles várias vezes e,inclusive, havia ficado empolgadaquando Sarah dissera categoricamenteque não moraria com Jack.

— Como sabe sobre o quediscutimos? — ele perguntou, olhando-aintrigado.

— Você realmente acha que não dá

para ouvir vocês dois? Essas paredessão feitas de papelão! — Um filmepassava na mente de Lacey. Se Sarah erairmã de Jack, isso respondia a umaampla gama de perguntas inadequadas.

Jack enfiou as mãos nos bolsos eandou até o outro lado da cozinha.Franziu as sobrancelhas como seestivesse absorto em seus pensamentos.

— Não sabia que falávamos tão altoassim.

— Vocês dois parecem ter opiniõesfortes sobre o assunto.

— Esse tempo todo você achou queeu estivesse enganando Sarah?

— O que mais eu poderia pensar? —ela perguntou na defensiva. — Alémdisso, havia todas aquelas outrasmulheres.

— Que outras mulheres?

— Aquela que vi com você na caixade correio outro dia, por exemplo.

— Glória?

— Não ouvi o nome dela... Escuta,nada disso importa. Você pode sair comquem quiser. Não me deve nenhumaexplicação.

Ele pareceu não ouvi-la.

— Glória é uma amiga, nada mais.Até saímos alguns anos atrás, mas não

virou nada. Ela está saindo com outrapessoa agora.

— E sua assistente? — Laceyperguntou, antes de poder impedir que apergunta saísse de sua boca.

— A Sra. Blake? — ele riu àsgargalhadas. — Ela tem cinquenta anose já é avó.

Lacey queria desesperadamenteacreditar nele.

— Cinquenta?

Ele fez que sim.

— Só há uma mulher para quem tenhoolhos nos últimos meses, e essa mulher évocê.

— Você sempre sabe o que dizer, nãoé, Jack Walker? Mas já ouvi isso antes.— E havia perdido as contas de quantasvezes.

Ele arqueou uma sobrancelhaenquanto avançava alguns passos nadireção de Lacey.

— Se me deixar beijá-la, quem sabemude de ideia?

A tentação era forte, mais forte do queLacey queria que fosse.

— Outro dia — ela disse, o coraçãoecoando intensamente nos ouvidosenquanto ela se afastava dele.

Jack parecia desapontado.

— Tudo bem, Lacey, fui paciente atéagora. Posso esperar mais um pouco. —Ele olhou para o relógio e suspirou. —É melhor eu voltar para meuapartamento. Passo por aqui mais para ofim da semana para ver Cléo. — Eleficou parado, esperando, como se desseum tempo para ela mudar de ideia.

Mas ela não o fez, embora devesse. Avida lhe ensinara a não confiar noshomens. O que Jack havia dito eraverdade, mas ela se recusava a acreditarque ele estivesse interessado nela hátantos meses. Nenhum homem tinha essapaciência toda. Pelo menos, nenhumhomem que ela havia conhecido.

Antes de sair, ele segurou os ombros

dela e beijou seu rosto.

— Você vai sair com Jack? — Jeanneperguntou, quando se encontraram namanhã seguinte. Lacey estavacarregando vários catálogos de amostrasde carpete. Ela podia jurar que cada umpesava quase dez quilos. Sentia que seusbraços iam desmontar.

— Não sei.

Jeanne olhou para ela, pensativa.

— Lacey, você não pode deixar essaoportunidade passar. Como já disse, ocara é um pedaço de mau caminho.

— Beleza não é tudo.

— Verdade, mas é um bom começo.Além disso, gosto de Jack.

— Você só o viu uma vez.

— Verdade, mas gostei do que vi.

Lacey não sabia o que responder.Elas ficaram em silêncio por algunsminutos.

— Vi que trouxe trabalho para casaoutra vez. — Jeanne olhou comdesaprovação na direção dos catálogos.

— Estamos preparando um orçamentopara o escritório de um contador, entãopassei por lá ontem à noite para que eledesse uma olhada nas cores e nosdiferentes tipos de carpete.

— Mais hora extra que você não estárecebendo! — Jeanne murmurou. —Você já parou para pensar no que o Sr.Sullivan faria sem você?

Lacey já havia pensado bastante sobreisso. Toda vez que fazia uma cotação outinha de lidar com um cliente difícilporque o Sr. Sullivan “não seencontrava no escritório naquelemomento”, ela pensava exatamentenisso.

— Ele acharia outra trouxa paraassumir meu lugar.

— Não seja ridícula — Jeanne disse.— Ele precisa de você. Ele sabe disso evocê também. O que deve fazer, minha

amiga, é usar isso a seu favor. Nós duassabemos que você deveria estarganhando o dobro do que ganha agora.

— O dobro?

— Não sei o quanto esse sovina lhepaga, mas sei que não é o suficiente. Senão disser algo para ele, eu direi.

— Jeanne!

— Relaxa. Não direi nada. Mas essasituação me irrita. Você o deixa seaproveitar da sua boa vontade. Não seipor que ele sai ileso disso. Ah! Poracaso você gosta de se fazer de vítima?

— Não!

Jeanne deu de ombros.

— Então, faça algo a respeito.

Sua amiga estava certa. Mais quecerta. Lacey estava mesmo se fazendo devítima. Ela saiu da estação de metrôindignada, mas essa indignação durouaté a chegada ao escritório.

Infelizmente, o único elevador doprédio estava quebrado. Levandoconsigo as amostras de carpete, Laceybufou pelos três lances de escada eliteralmente cambaleou para dentro doescritório.

O Sr. Sullivan lançou-lhe um olharpreocupado. Com quase 50 anos, eleestava ficando careca e seus olhos azuisperdiam o brilho. No entanto, seus

ternos eram meticulosamente ajustados eele insistia que os dois mantivessemuma imagem extremamente profissional.

Lacey pôs a mão no peito e sentou-sebruscamente sobre a primeira cadeiraque achou.

— Lacey, você está bem?

Ela fez que não. Ela não haviapercebido o quanto estava fora de formaaté subir as escadas carregando doiscatálogos de dez quilos.

O Sr. Sullivan foi até o bebedouro epegou um copo de água.

— Beba isso e se sentirá melhor.

— Sr. Sullivan... — Ela estava tão

ofegante que sua voz mal podia serouvida. — Precisamos... conversar...sobre... o meu cargo aqui.

— Claro. Você tem feito um ótimotrabalho. Tenho muito a lhe agradecer.Percebi que nos últimos tempos destineias tarefas mais desagradáveis a você eespero que me perdoe por isso.

Ele era um homem gentil, elapercebeu. Insatisfeita com seu salário,acabou por concebê-lo, em sua mente,como um ogro, com poucas qualidadesque o salvavam. Da mesma maneiracomo havia feito com Jack... até poucotempo atrás.

— Hora extra. — Seus pulmões

doíam; caso contrário, discorreriamelhor sobre o assunto.

Ele franziu a testa como se não aestivesse entendendo.

— Você está dizendo que fazendohora extra você se tornará umadecoradora experiente?

Ela fez que sim, mas era mais queisso.

— Você é incrivelmente talentosa,Lacey. Dentro de poucos anos, tenhocerteza de que conseguirá. — Dito isso,ele levantou os catálogos pesados,colocou-os apoiados contra a parede evoltou para sua mesa.

Resmungando em voz baixa, Lacey foiaté sua mesa. Nem bem tirou a jaqueta, oSr. Sullivan anunciou que ficaria fora oresto da manhã. Não disse aonde ia, oque era típico.

Quando Lacey voltou para seuapartamento naquela noite, a primeiracoisa que fez foi mergulhar na banheira.Estava uma delícia.

O dia havia sido agitado. Comcerteza, não estava a fim de companhia,quando ouviu alguém bater na porta.Correu para vestir um moletom eatender, enquanto resmungava:

— Por favor, que seja rápido!

Jack estava com Sarah do lado defora.

— Achei que era hora de vocês duasse conhecerem — ele disse.

— Sou Sarah — a morena atraentedisse, estendendo a mão. Agora queLacey sabia que eram irmãos, era fácilperceber as semelhanças entre eles.Sarah tinha os mesmos olhos castanho-chocolate e o mesmo cabelo espesso eescuro de Jack.

— Jack me disse que houve um mal-entendido. — Sarah abriu um sorriso,como se estivesse se divertindo com ofato.

— Por favor, sintam-se à vontade —Lacey disse, apontando para a sala deestar.

Jack não fez cerimônia. Sentou-se nosofá e Cléo imediatamente seaconchegou em seu colo, como seestivesse aguardando ansiosamente seuretorno.

Lacey e Sarah também se sentaram.

— Me desculpe pelo estardalhaçoque Jack e eu fazemos — Sarah disse.— Ele é muito teimoso, sabe.

— Eu? — Jack protestou.

— Tudo bem, nós dois somos. Desdeque mamãe e papai se mudaram para

Flagstaff, ele é a única família que tenhoem São Francisco. Brigamos bastante,mas somos bem próximos também.

— Brigaríamos bem menos se nãofosse Mark — Jack disse, franzindo atesta e olhando para a irmã.

O maxilar de Sarah ficou tenso.

— Jack, por favor, você prometeu nãofalar sobre ele! De qualquer modo —ela continuou —, queria esclarecerqualquer ideia errada que pudesse tersobre mim. Jack é mesmo meu irmão.

— Eu deveria ter percebido. Vocêssão muito parecidos.

Sarah se levantou.

— Bem, preciso ir embora mesmo.Vou encontrar Mark para jantar, masqueria passar por aqui para meapresentar. Jack já falou várias vezes devocê e, bem, espero que tudo dê certo...com a Cléo! — Corrigiu-serapidamente.

Sarah foi embora, mas Jack ficouexatamente onde estava; no sofá, comCléo cochilando em seu colo.

— Ok! — ele disse, depois que Laceylevou Sarah até a porta. — O que foi?

— O que quer dizer?

— Tem algo que a está incomodando— ele respondeu calmamente,estudando-a.

Desconfortável com o exameminucioso de Jack, pensou se lhecontava a verdade. O banho quente não ahavia acalmado como esperava e nãoconseguia parar de pensar no que Jeannelhe havia dito sobre gostar de se fazerde vítima.

— Sou uma molenga! — elaconfessou, sentando-se abruptamente emuma cadeira.

— Uma molenga — Jack repetiulentamente, como se não tivesse certezado sentido da palavra. — Em quesentido?

Ela jogou as mãos para o alto semquerer falar sobre o assunto. Quanto

mais reclamava, pior se sentia. Se fossepara se lamuriar sobre o trabalho, que ofizesse com o Sr. Sullivan. Até então,ele era a única pessoa que não sabiacomo ela se sentia e só podia culpar a simesma por isso.

— Tudo bem, você é uma molenga —Jack disse. — Mas até mesmo umamolenga precisa comer. O que acha dejantarmos?

— Fora?

— Podemos pedir pelo telefone, sequiser. Mas aposto que uma noite emChinatown[2] faria muito bem a nósdois.

Lacey tentou conter sua surpresa. Jack

a estava convidando para jantar e elapercebeu que fazia tempo não queriatanto algo quanto queria isso agora. Eantes que pudesse pensar em uma longalista de objeções, aceitou.

O sorriso de Jack se abriu porcompleto.

— Ótimo! — Ele colocou Cléo delado delicadamente. — Você gosta decomida chinesa?

— Adoro. Picante, apimentada e emgrandes quantidades.

— Eu também. Quanto maisapimentada, melhor.

— Nunca é picante demais para mim

— ela disse.

Ele ergueu uma sobrancelha e disse:

— Quer apostar?

Lacey não quis. Jack insistiu parapegarem um táxi para evitar a caça poruma vaga para estacionar namovimentada Chinatown. Para Lacey, ometrô já seria suficiente. Ela não tinhacarro e seu único meio de locomoçãoera o transporte público. Felizmente,São Francisco tinha um sistemametroviário excelente.

O táxi os deixou na Avenida Grant.Lacey amava andar pelas ruas deChinatown. Produtos das pequenas lojasespalhados pelas calçadas, expostos em

longas mesas estreitas. Os cheiros ainstigavam. Os incensos se misturavamcom o cheiro de pato cozido e seconfundiam com o aroma penetrante dostemperos, tomando conta do ar. Aslanternas chinesas iluminavam asesquinas.

Jack a conduziu até o que dizia serseu restaurante favorito, de mãos dadascom ela. Lacey gostou de estar ligada aele; gostou tanto que estava um poucoassustada com a sensação.

Quando se aproximaram de um lancede escadas íngreme, que parecia algoconstruído pelos maias no México,Lacey hesitou.

— Não é tão ruim quanto parece. —Jack colocou um braço ao redor de suacintura. Lacey conseguiu lidar melhorcom o lance de escadas do que com essanova intimidade. E não ajudou tersubido e descido os três lances deescadas de seu trabalho várias vezesnaquele dia. Ela explicou o que haviaacontecido com o elevador do trabalho eJack foi apropriadamente compreensivo.

O jantar começou com uma sopapicante e ácida, seguida por guioza[3]em óleo quente. Jack fez o pedido einsistiu que ela experimentasse o frangoszechuan,[4] camarões com molho dechili e o filé apimentado. De tempos em

tempos, ele olhava para ela para ver sehavia aprovado suas escolhas.

— Nunca conseguiremos comer issotudo — ela insistiu, inclinando-se nadireção dele até seu estômagopressionar a lateral da mesa.

— Eu sei — ele disse,despreocupado. — Vai sobrar bastantecoisa para levar para casa.

Ela ficou surpresa com o quantotinham para conversar.

Ele respeitou sua privacidade e nãoinsistiu nos assuntos que ela não queriacomentar. Ouviu-a com atenção e suarisada era natural, e, antes que elapudesse perceber, estava completamente

relaxada. Seus problemas pareciam bemmenos importantes.

Lacey até conseguiu provar todos ospratos que Jack pedira, todos novos paraela. Estavam tão bons que era difícilparar de comer.

Quando deixaram o restaurantecarregando as sobras, Lacey estavasatisfeita e feliz. Eles andaram pelasruas movimentadas, parando às vezespara olhar os artigos de uma loja ououtra. Jack comprou para ela umsabonete com aroma de jasmim e, paraCléo, um brinquedo.

— Diga a ela que foi Cão quemmandou — ele disse.

Ela sorriu.

— Pode deixar. É o mínimo que elepode fazer.

— É mesmo — Jack concordou.

Ela teve dificuldade em parar deolhar nos olhos de Jack. Fazia muitotempo que não se divertia tanto assimcom um homem.

— É melhor voltarmos — Jack dissesubitamente, chamando um táxi.

— Tão cedo? — ela protestou, sementender a mudança repentina em seuhumor. Em um momento estavamgostando da companhia um do outro e,no momento seguinte, Jack parecia estar

com muita pressa para voltar para casa.Ele se virou para ela, seus olhos fitandoavidamente os dela.

— Também não quero ir.

— Então, por que estamos indo?

— Porque não aguento ficar mais umminuto sem beijar você. E fazer isso nomeio de Chinatown pode deixá-laconstrangida.

Cinco

Nenhum dos dois falou nocaminho de volta ao prédio. Jack pagouo taxista, pegou a mão de Lacey e alevou até o saguão. O elevador osaguardava com a porta aberta e, assim

que os dois entraram, Jack a tomou emseus braços.

No momento em que seus lábios setocaram, Lacey percebeu que estavalouca de desejo por ele. A boca de Jackera firme e ávida, tão ávida quanto adela. Na ponta dos pés, Lacey pôs osbraços ao redor do pescoço de Jack.

Quando suas bocas se separaram, elaenterrou o rosto no ombro de Jack, que amanteve junto de si, passando o queixosobre a cabeça dela. O toque de Jack eratão delicado quanto ela imaginava. Cléoconfiou nesse toque, saboreou-o. Agoraera sua vez.

Ela queria que ele a beijasse de novo,

precisava disso, para ter certeza de queera real. Como se lesse sua mente, eleusou o polegar para levantar o queixodela. Seus olhos se encontraram e, porum momento, sua respiração parou, eJack desceu os lábios até os dela. Aboca dele era molhada, quente esedutora. Lacey suspirou enquanto suasemoções se reviravam como a neblinadensa que circula ao redor da PonteGolden Gate.

Era real, ela se deu conta. Eraimpossível ser mais real. Em ummomento ela se agarrava a ele, semfôlego de tão maravilhada, e, nomomento seguinte, lutava contra aslágrimas.

— Lacey...

Ela não respondeu, mas se soltou deleo suficiente para apertar o número doandar, na intenção de escapar daquelasituação o mais rápido possível. Nãoqueria conversar nem explicar asemoções que nem ela mesma entendia.Tremendo por causa do impacto de seutoque, percebeu o quanto estavaaterrorizada.

Depois que Peter a deixara, ela ficouem choque. Se tivesse examinado a dorlogo após o divórcio, teria dereconhecer o quanto ele a haviamachucado.

E agora havia Jack, doce e paciente,

que despertava nela uma riqueza desensações. Mas ela não conseguiaaceitar essa promessa de alegria semantes lidar com a dor perturbadora eobscura de seu passado.

— Lacey — ele sussurrou mantendoos braços em volta da cintura dela. — Oque há de errado?

Ela fez que não. Não era capaz deencontrar uma explicação.

— Estou bem. — Não era verdade.Não se sentia bem desde que souberaque Peter estava com outra mulher.Sentiu-se destruída e inadequada. Nuncahavia se recuperado da perdadevastadora do sonho que havia

carregado consigo desde criança,brincando de casinha com suas bonecasde papel.

Não era para ser assim. O casamentodeveria ser para sempre. O amordeveria durar mais que uma só noite. Ocompromisso deveria durar mais quepoucos meses.

Tudo o que Lacey tirou de seus anoscom Peter foi uma amargura enterradatão profundamente em sua alma que foinecessário a ternura de outro homem,que ela mal conhecia, para perceber oque estava fazendo consigo mesma nosúltimos dezoito meses.

Em silêncio, Jack a acompanhou pelo

corredor. Parando do lado de fora doapartamento dela, ele tirou um cacho decabelo de seu rosto. Seu toque era leve edelicado.

— Obrigado — ele sussurrou,pressionando suavemente seus lábioscontra os dela.

Ela piscou. Duas vezes.

— Por que está me agradecendo?

Um sorriso surgiu no canto da boca deJack.

— Você saberá em breve.

A mão de Lacey tremia enquantocolocava a chave na fechadura. Cléoestava lá para recebê-la, descontente

por ter sido deixada sozinha por tantotempo. Lacey precisou de um pouco detempo para se livrar de seuspensamentos.

Depois de colocar a bolsa de lado,foi até a cozinha. Podia ouvir Jack semovimentando do outro lado, guardandoas sobras do jantar na geladeira. Ela seserviu de um copo de água e sorriu,quando ouviu uma batida leve vinda daparede.

Foi até lá e bateu de volta,divertindo-se com a brincadeira.

— Boa noite, Lacey — ela o ouviudizer.

— Boa noite, Jack — ela sussurrou e

pressionou a palma aberta de sua mãocontra a parede, sentindo que precisavadessa pequena conexão com ele e, aomesmo tempo, temendo o que poderiaacontecer. Ela estava feliz por ele nãopoder ver o que estava fazendo.

Lacey não poderia ter ficado maissurpresa quando Sarah Walker entrou naSullivan’s Decoração dois dias depoisde seu jantar com Jack.

— Sarah, oi! — Lacey disse selevantando para cumprimentar a irmã deJack.

— Espero que não esteja

incomodando você. Desculpe passar poraqui sem avisar. — Sarah examinou,ansiosa, a loja bagunçada ao seu redor.Cada canto estava tomado por catálogose amostras de materiais.

— Imagine!

— Queria saber se podemos nosencontrar para almoçar e conversar umatarde dessas.

Lacey gostou da ideia, emboraestivesse surpresa.

— Seria um grande prazer.

Concordaram em se encontrar nasemana seguinte e Sarah escolheu umrestaurante de frutos do mar em

Fisherman’s Wharf[5], um dos favoritosde Lacey.

Lacey encontrou-se com Jack quasetodas as noites daquela semana, masnunca por muito tempo. Ele tinha umalonga lista de desculpas convenientespara aparecer sem aviso e, aos poucos,foi abrindo caminho na vida de Lacey.Ela sabia o que ele estava fazendo, masnão se importava. Jack não tentou beijá-la novamente e ela estava grata por isso,mas, ao mesmo tempo, não esperava quea paciência dele durasse muito.

— Me divorciei há pouco mais de umano — ela mencionou de um jeitocasual, uma noite, sem olhar para ele.

Com Cléo em seu colo, Lacey se sentiasegura para lidar com a verdade.

Jack estava sentado de pernascruzadas, sereno e relaxado no sofá,com uma caneca de café nas mãos.

— Foi o que imaginei — ele disse. —Quer falar sobre isso?

— Agora não. Você se importa?

Ele levou um tempo para responder.Parecia o momento mais longo da vidade Lacey.

— Não. Mas acho que deveríamos.Um dia. Quanto antes, melhor.

Ela sabia que ele estava certo. Nosúltimos dias, andou reescrevendo seu

diário. Era a única maneira de colocarseus sentimentos em ordem. O hábito demanter um registro dos eventos de suavida começou ainda na escola e duranteanos ela escrevera um ou doisparágrafos ao final de cada dia.

Depois que Jack a beijou, ela voltouao diário escrito durante os dolorososmeses anteriores ao divórcio. O que aimpressionou foi a falta de emoçãonaquelas breves linhas. Era como se elahouvesse feito uma rápida anotação dosdetalhes de um relatório policial.Apenas os fatos, nada mais. Pequenasinformações inúteis, enquanto o mundodesabava diante dela.

Ela leu um dia de cada vez e então,

cheia de coragem, reescreveu aquelassemanas traumatizantes, revivendo cadadia, recusando-se a atenuar a dor. Ficousurpresa com a incrível quantidade deódio que sentiu. Em relação a Peter e aMichelle, a mulher por quem ele adeixou e com quem se casou poucodepois.

A amargura jorrou de sua caneta atésua mão começar a doer e seus dedoslatejarem, e, mesmo assim, nãoconseguia parar. Era como se a canetainsistisse para que ela escrevesse tudo omais rápido possível, porque só assimficaria bem, só assim poderia seguircom sua vida.

Achou que ia explodir. Até mesmo

Cléo sabia que não deveria seaproximar. Segurando uma caixa delenços, ela chorava, andava de um ladopara o outro e, então, voltava a chorar.Enxugava os olhos, assoava o nariz ejogava o lenço no chão, na cama, namesa, na cozinha, no banheiro... Pelamanhã, descobriu um rastro de lençosque se espalhava por todos os cômodosdo apartamento.

O sono lhe fugiu. Não era justo. Elahavia purificado sua alma. Mas já erabem depois da meia-noite quando caiuem um sono inconstante.

Lacey não estava a fim de companhiana noite seguinte, quando Jack chegou,mas estava feliz com a visita. Sua

presença era agradável, ele não exigianada dela e, ainda, oferecia todo seuapoio.

Cléo pulou do colo de Lacey e foi atéo quarto, como se não tivesse uma únicapreocupação no mundo. Quando a gatasaiu, Jack se levantou e foi até Lacey,estendendo a mão para ela.

Ela olhou para ele e piscou. Então,sem questionar, lhe deu a mão. Ele aapertou firme e a levantou da cadeira.Com bastante habilidade, mudou deposição, pegando o lugar dela etomando-a em seu colo.

— Parece cansada. — Seu olhar eraterno e preocupado.

— Estou exausta! — Deveria mesmoestar, depois daquela noite de insônia.Não importava o quanto tentasse, nãoconseguia enterrar o passado. Ele aincomodava como uma pedra no sapato.

Jack deitou a cabeça de Lacey em seuombro.

— Você está pronta para falar sobreseu casamento?

Levou bastante tempo para elaresponder e, quando conseguiu, viu-setentando conter as lágrimas.

— Ele se apaixonou por outra. Estavatendo um caso havia meses. Ah, Jack,como pude ser tão burra a ponto de nãosaber, de não perceber o que estava

acontecendo? Fui tão cega, tão ingênua!

A mão de Jack estava sobre oscabelos dela.

— Ele foi um tolo, Lacey. Você sabedisso, não sabe?

— Eu... só sei que Peter está feliz eeu estou um caco. Não é justo. Queroque ele sofra como me fez sofrer. — Elaenterrou o rosto no peito de Jack.

Quando os soluços cessaram, Laceypercebeu que Jack estava emitindo sonssuaves e acalentadores. Limpando aslágrimas do rosto, ela levantou a cabeçae tentou abrir um sorrisinho.

— Você conseguiu entender alguma

coisa do que eu disse?

— Consegui ouvir sua dor e foi osuficiente.

Ela se encheu de gratidão. Não sabiacomo lhe dizer o que havia em seucoração. O quanto estava grata por suaamizade, por mostrar que ela haviaanestesiado sua própria vida, bloqueadoqualquer chance de ter outrorelacionamento. Aos poucos, ele esgotousua resistência. Ela só conseguia pensarem agradecê-lo com um beijo.

Fazia tanto tempo que um homem nãoa abraçava daquele jeito! Fazia anos queninguém acendia aquele fogo dentrodela. Suas bocas se encontraram,

tímidas de início, mas logo ganharamintensidade. Depois de apenas algunssegundos, Lacey estava submersa em umrio de sensações.

Um tipo assustador de excitaçãotomou conta dela. Foi parecido quandoJack a beijou pela primeira vez, masagora era mais forte ainda. Ela se abriupara ele e suspirou, com surpresa eprazer, enquanto os braços dele, aoredor de seu corpo, a apertavam maisforte. Sua reação inicial foi acanhada.

— Lacey — ele disse —, você fazalguma ideia do quanto me sinto atraídopor você?

— Mesmo? — Sentiu-se lisonjeada

diante daquelas palavras. Depois dePeter, estava convencida de que nenhumhomem jamais a acharia desejávelnovamente.

— Temos de parar agora.

Lacey nunca teve a intenção de queaquele beijo chegasse a esse ponto, masagora que chegara, não se sentia muitoarrependida.

— Obrigada — ela sussurrou e beijoulevemente seus lábios, enquantoabotoava a blusa.

— Você não me contou muita coisasobre o divórcio — ele disse.

— Contei sim — ela afirmou. —

Contei quase tudo.

Ele franziu as sobrancelhas.

— E eu fui um bom ouvinte?

— O melhor de todos — ela disse,com um sorriso terno. — Você fez comque eu me sentisse desejável, quandoestava convencida de que nenhum outrohomem iria me querer outra vez.

Jack fechou os olhos como se tentasseimaginar uma coisa dessas.

— Ele devia estar louco.

— Não tenho como saber isso.

— Você ainda o odeia?

Ela baixou os olhos, não queria que

ele percebesse o que se passava dentrodela. Ela achava que o odiava. Mas jánão tinha tanta certeza.

— Não sei. Por muito tempo fingi queo divórcio não importava. Dizia a mimmesma que tive sorte de saber o tipo demarido que tinha antes de termos filhos.Só quando conheci você percebi quehavia me enterrado na própria negação.O divórcio me machucou demais, Jack.Foi a experiência mais dolorosa daminha vida! — Ela passou os braços aoredor do pescoço de Jack. — Toda vezque penso em Peter, fico triste demais.

— É um começo — Jack disse,passando o queixo na lateral de seurosto. — Um ótimo começo.

Seis

— Estou tão feliz por termosconseguido nos encontrar! — Sarahdisse, quando Lacey chegou aorestaurante. Gaivotas voavam no alto,perseguindo os corvos. Os corvos

retaliavam, correndo atrás das gaivotasem uma batalha pelo território rico emalimentos. Da janela de onde estavamsentadas, Lacey conseguia ver uma focapreguiçosa tomando sol no píer. O diaestava lindo e ela sentia o início dafelicidade brotar em sua alma. Haviasido um período longo e sombrio. Suavida andava seca e sem graça desde odia em que Peter anunciou que queria odivórcio.

— Queria falar com você sobre Jack— Sarah disse, olhando fixamente parao cardápio.

Lacey já esperava algo do tipo e, paradizer a verdade, concordou em almoçarcom Sarah pela mesma razão. Queria

muito saber mais sobre ele. Ele era umexecutivo atraente e bem-sucedido.Tinham quase a mesma idade, elaacreditava, e não conseguia entendercomo ele havia chegado aos 33 anossem se casar.

— Percebi que você e Jack têm seencontrado bastante ultimamente.

Lacey não sabia por que a verdade adeixava tão incomodada, mas se viumexendo em seu guardanapo,embolando-o em suas mãos, ansiosa.

— Ele vai visitar a Cléo.

A risada suave de Sarah revelou oquanto ela havia achado aquiloengraçado.

— Não é na Cléo que ele estáinteressado, e nós duas sabemos disso.Ele está de olho em você há mais de umano. O problema é que o meu queridoirmão não sabe ser sutil.

Lacey discordou.

— Ele tem sido bastante paciente.

— Verdade — Sarah disse, relutante.— Ele não queria assustar você.Falamos de você várias vezes. Elequeria minha opinião. Fui eu quemsugeri que ele lhe enviasse flores. Eleestava completamente desanimadodepois que você o recusara tantas vezes.Quem diria que aquele gato sem-vergonha seria responsável por fazer

com que vocês dois se aproximassem?

Lacey ajeitou o guardanapo de tecidosobre o colo. Não era hora de se fazerde tímida.

— Gosto muito de seu irmão.

— Ele é maravilhoso mesmo. —Mais uma vez Sarah admitiu, relutante.— Ele gostou de você na primeira vezque a viu.

— Mas por quê? — Quando Lacey semudou para o prédio, estava um caco.Não fazia nem um mês que o divórciohavia saído. Naquela época ela nãohavia percebido, mas parecia um zumbi.

O olhar de Sarah era sugestivo.

— Jack é assim. Ele sabia que alguéma havia machucado muito e que vocêprecisava de ajuda, assim como Cão.Ele o encontrou em um beco escuro,desnutrido e tão perturbado que nãodeixava que ninguém se aproximasse.Várias semanas se passaram até que elereconhecesse Jack como amigo — elapausou, inclinou-se para frente e apoiouos cotovelos sobre a mesa. — Mas Jackfoi paciente. Ele também tem sidopaciente com você e está sendorecompensado por isso. Não me lembroda última vez em que o vi tão feliz.

— Não sou uma gata de rua — Laceydisse, na defensiva. Ela não haviagostado da comparação, mas não pôde

deixar de perceber as semelhanças.

— Não, claro — Sarah falourapidamente. — Não foi isso que quisdizer. Jack me mataria se eu insinuasseuma coisa dessas. Mas você estavamachucada e ele percebeu isso. Se quersaber a verdade, acho que ele deveriater virado médico. É parte de suanatureza querer ajudar os outros.

— Entendo. — Lacey não estavaachando essa conversa nem um poucolisonjeira, mas não podia negar o queSarah havia dito. Durante o ano que sepassou, ela se fechara para o mundo. Sóquando Jack surgiu em sua vida que elaentendeu o quanto era importante lidarcom o divórcio.

Sarah suspirou e colocou o cardápiode lado.

— Jack é maravilhoso. E é por issoque é tão difícil entender por que ele étão irracional em relação a Mark.

— Não sabia que Jack podia serirracional.

— Mas pode — Sarah disse,mantendo a cabeça baixa como seestivesse prestes a chorar. — AmoMark. Queremos nos casar um dia. Sónão podemos nos casar agora, pordiversas razões. Às vezes acho que Jacko odeia.

— Tenho certeza de que isso não éverdade. — Lacey achava impossível

Jack odiar qualquer pessoa, mas elapodia entender com facilidade o porquêde ele ser superprotetor.

— É verdade — Sarah disse exaltada.— Jack se recusa a ter qualquer coisa aver com Mark e sabe por quê? — Laceynão teve a chance de responder. —Porque Jack acha que ele está meusando. Nada que eu diga podeconvencê-lo do contrário. É a coisamais ridícula que já ouvi e é só porqueestamos morando juntos. Meu irmãoprecisa acordar para a vida!

O garçom chegou com copos de águagelada e uma cesta cheia de pãesquentes. Lacey lhe agradeceu com umsorriso, aliviada pela interrupção. O

aroma do pão fresco era divino, mas aconversa a estava deixandodesconfortável. Ela não sabia bem o quedizer para Sarah. Preferia lhe fazerperguntas sobre Jack a brincar depombo-correio entre os irmãos. Jackpodia ser superprotetor, mas ela nãoconseguia imaginá-lo odiando Mark semuma razão concreta.

— O que eu queria mesmo era quevocê falasse com Jack para mim —Sarah disse, com os olhos suplicantes.— Ele vai escutar você porque...

— Não posso fazer isso, Sarah —Lacey interrompeu.

— Esperava que você ao menos

pensasse no assunto. Pensei que, se vocêconhecesse Mark, poderia constatar oquanto ele é maravilhoso. E entãocontaria a Jack. Não se importa se ele sejuntar a nós, se importa?

Mais uma vez, Lacey não teve chancede escolher. Sarah se levantou só umpouco de sua cadeira e acenou.

Um jovem sofisticado saiu do bar efoi na direção das duas, levando umdrinque consigo. Lacey o estudou,tentando manter a mente aberta. Noquesito aparência, era um homematraente. Ele beijou o rosto de Sarah,mas seus olhos se moveram lentamenteaté Lacey e se demoraram em sinal deaprovação. Trocaram um breve aperto

de mão enquanto Sarah os apresentava.

— Espero que não se importe de eume sentar com vocês — Mark disse,puxando uma cadeira. — Embora todosos homens aqui possam pensar que souganancioso por estar sentado com asduas mulheres mais lindas dorestaurante.

Mark não precisava dizer mais nemuma palavra para que Lacey entendessepor que Jack não gostava dele. Eramuito bajulador. E ela não gostou decomo ele a olhava, um poucointeressado demais. O que não entendiaera como Sarah podia ser tão cega.

— Sarah e eu estamos diante de um

pequeno dilema. — Mark pegou a mãode Sarah.

— Precisamos de ajuda com Jack —Sarah explicou. — Mark sugeriu que nosencontrássemos com você paraconversarmos sobre isso. Não sei se éuma boa ideia, mas Mark parece acharque você...

— Isso — Mark interrompeu. —Achei que você poderia dizer algo queacalmaria os ânimos entre Sarah e oirmão dela para mim.

— Você quer que eu converse comJack em seu favor? — ela perguntou.Aparentemente Mark não tinha nenhumreceio em confiar a ela essa função. O

que ele não entendeu era que Jackreagiria negativamente a isso. O poucode respeito que Jack tinha por elepoderia ir por água abaixo.

— Só diga que conheceu Mark —Sarah tentou persuadi-la. — Não precisafazer nenhuma tempestade em copod’água. Tenho certeza de que eleescutaria você. Sabe, Jack vive na IdadeMédia. Mark acha que ele tem ciúme.Meu irmão e eu costumávamos ser muitounidos. Eu lhe contava tudo sobre minhavida. — Um olhar melancólico ofuscouseus belos traços. — Mas as coisasmudaram entre nós. É muito tristebrigarmos tanto assim. Não posso deixarde concordar que pareça ciúme.

Lacey se perguntava se isso eraverdade.

— Jack já se encontrou com Mark?

— Sim, várias vezes. E desde aprimeira vez implicou com ele.

— Não começamos muito bem —Mark admitiu friamente.

— O que aconteceu? — Laceyperguntou.

— Nada — Sarah respondeu, nadefensiva. — Absolutamente nada. Masnunca havia tido uma relação séria comalguém e Jack não consegue aceitar isso.

Lacey não queria tomar partido, masacabou dizendo:

— Não conheço Jack tão bem assim,mas não consigo imaginá-lo sendo dotipo ciumento.

— Eu sei, mas, sabe, sou louca porMark e Jack sabe disso, e, na concepçãode Mark, e na minha também, Jackprecisa aceitar o fato de que a irmãzinhadele cresceu. Mas ele simplesmente serecusa. — Absorta, Sarah partiu umpedaço de pão e o segurou com as mãos,como se não soubesse o que fazer comele. — Você pode nos ajudar, Lacey?

— Duvido — ela disse da maneiramais direta e honesta que conseguiu.

— Jack escutaria você — Sarahdisse.

Lacey sorriu ao perceber o quantoSarah acreditava que ela tinha algumainfluência sobre Jack.

— Sou apenas a vizinha.

— É aí que se engana — ela disse,com voz mais exaltada pela força de suaconvicção. — Jack realmente gosta devocê; mais que de qualquer pessoa hámuito tempo.

Lacey também não tinha certeza disso,mas deixou passar.

— Você quer que eu diga a seu irmãoque você é uma mulher madura e capazde tomar as próprias decisões, quer eleconcorde, quer não.

— Exatamente — Sarah disse.

— É isso que ele precisa ouvir —Mark concordou.

— Como é uma mulher adulta, é livrepara amar quem quiser — Laceycontinuou.

— Isso mesmo. — O volume da vozde Sarah aumentou. Ela se sentia maisconvencida ainda disso.

Mark sorriu para Sarah e ela sorriuem resposta.

— Sabemos o que estamos fazendo.Não é, querida?

— Já sou maior de idade e vacinada— Sarah anunciou.

— Vocês dois são capazes de julgar ocaráter das pessoas — Laceyacrescentou.

— É claro. — O sorriso de Sarah seabriu. — Eu mesma não poderia ter ditomelhor.

Eles foram momentaneamenteinterrompidos pelo garçom, que voltoupara anotar os pedidos.

— Jack não é irracional — Laceycontinuou. — Se é assim que pensam,não precisam de mim para dizer isso aele. Façam isso vocês mesmos, juntos.

— Mas ele não vai nos ouvir! —Sarah protestou.

— Vocês já tentaram?

Mark partiu o pão em dois e baixou acabeça.

— Não exatamente, mas também nãotivemos muitas oportunidades.

— É o fato de morarem juntos que oestá incomodando? — Lacey perguntou.

— Isso não é permanente — Sarahdisse.

— Pretendemos nos casar um dia —Mark disse. — Mas não agora.Queríamos nos casar do nosso jeito enão como o irmão mais velho dela quer.

Lacey ficou em silêncio, pois sentiaque seu ponto de vista sobre o assunto

não seria bem-vindo. Com o passar dosanos, várias amigas suas optaram porapenas morarem com os namorados.Pode ter sido coincidência, mas todassaíram desses relacionamentosarrependidas.

— Amar meu Mark não é um erro! —Sarah insistiu, com certo exagero na voz.— Somos perfeitos juntos.

O garçom serviu as saladas, mas,nessa altura, Lacey já havia perdido oapetite.

— E Sarah é perfeita para mim —Mark completou antes de pegar o garfo eespetar o camarão suculento quedecorava o topo de sua enorme salada.

— Mark me ama e eu o amo — Sarahconcluiu. — Em minha opinião, isso é omais importante.

Lacey percebeu que os dois achavamque podiam fazê-la mudar de ideia. Eraimportante deixar tudo bem claro.

— Espero que entendam por que nãoposso falar com Jack em favor de vocês.

— Sim — Sarah disse decepcionada.— Só queria que Jack não fosse tãohostil.

— Sarah? — A voz masculina e roucavinha de trás de Lacey. — Lacey? O quevocês duas estão fazendo aqui?

Era Jack.

Sete

— Olá, Jack — Sarah dissedepois de se recuperar do choque. Elanão parecia feliz. Lacey sabia que ascoisas entre eles não andavam bem equeria ajudá-los, mas não conseguia

pensar em uma maneira de aliviar atensão entre os dois. Jack ignorou Mark.E Mark não deu o braço a torcer.

— Como estão minhas duas meninasfavoritas? — Jack perguntou, ignorandoa saudação fria de Sarah. Ele puxou umacadeira e se sentou, sem esperar umconvite.

— Por favor, sente-se — Sarahresmungou em tom irônico.

— Olá, Jack — Lacey disse, com ocoração cheio de felicidade, apesar darecepção amarga de Sarah e Mark. Elaabaixou a cabeça rapidamente quandoele focou os olhos nela. Lacey não tinharazão para se sentir culpada, mas, ainda

assim, era o que sentia. Ela não estavafazendo nada pelas costas de Jack.

— Lacey e eu só estávamos batendoum papo — Sarah disse, depois de umminuto constrangedor. — É isso quevocê quer saber, não é?

— Não perguntei nada, Sarah. O quevocê e Lacey conversam não é da minhaconta. — Jack pediu uma xícara de cafée se virou para Lacey e Sarah, dando ascostas para Mark.

— Se quer mesmo saber, estávamosdiscutindo sobre Mark e eu — Sarahdisse, bem mais na defensiva do que onecessário.

Jack deu um gole em seu café sem dar

nenhuma indicação de que o tópico daconversa o incomodava.

— Vamos mudar de assunto. O queacham?

— Aposto que você estava torcendopara que Lacey pusesse algum juízo emminha cabeça — Sarah dissefirmemente. — Bem, então, você errou.

Jack se virou para a irmã com umolhar espantado e desaprovador.

— Não precisa se preocupar — Sarahcontinuou com o mesmo tomexageradamente sensível. — Ela serecusou a falar com você em nossofavor.

— Mark pediu a ela?

— É claro — Sarah respondeu,agressiva. — O que mais ele pode fazerse você se recusa categoricamente afalar com ele?

— Não gosto nada de você colocá-lanessa situação — Jack disse sem sepreocupar em esconder suadesaprovação.

— Não precisa se preocupar — Sarahretrucou. — Isso não se repetirá.

Lacey ficou chateada ao assistir àdiscussão, sabia o quanto amavam um aooutro. Mas não havia nada que pudessefazer a não ser escutar.

— Como está Cléo? — Jack olhoupara Lacey em um esforço óbvio deencontrar um tópico mais agradável.

Lacey pegou seu café.

— Está engordando.

— Que bom — ele disse, um poucoausente.

— Como pode ignorar Mark dessejeito? — Sarah reclamou. — Você agecomo se ele não estivesse aqui.

Jack, por teimosia, permaneceu emsilêncio por um momento, antes deperguntar:

— Você já perguntou a ele por queme comporto assim? — Deu outro gole

em seu café. — Seria muito interessantese ele admitisse a verdade.

— Vamos embora. — Mark selevantou abruptamente e pegou a mão deSarah. — Não precisamos dele, Sarah,nunca precisamos. Vamos viver só nósdois e muito bem.

— Mas, Mark... — Sarah olhou paraseu amante e então para seu irmão, osolhos tomados de indecisão.

— Você vem ou não? — Markperguntou irritado, soltando a mão deSarah.

— Você poderia tentar conversar comJack — Sarah sugeriu, em um tomindeciso e patético. Lacey sentiu

compaixão por ela.

— Faça o que quiser. — Mark sevirou e começou a ir embora.

Sarah hesitou, dividida pelaindecisão, e suspirou profundamente.

— Mark, espere — ela o chamou,correndo de forma obediente atrás dele.

O silêncio após a saída de Sarahpairava pesado no ar. O rosto de Jackficou sombrio, com o que parecia serarrependimento, antes de ele olhar paraLacey de novo. Pareceu, por ummomento constrangedor, que ele haviaesquecido que ela estava lá.

— Jack — ela disse e tocou em sua

mão.

— Sinto muito. — Ele abanou acabeça como se quisesse limpar suamente. — Espero que Sarah e Mark nãotenham sido inconvenientes.

— Nem um pouco — Lacey garantiu aele. — Ela é uma garota adorável, masestá um pouco confusa. — Embora nãofosse da conta dela, queria saber. — Porque você o odeia tanto assim?

— Há várias razões — ele disse demaneira direta. — Mas você não precisase preocupar comigo ou com minhairmã. Não é problema seu.

— Entendo — ela respondeu e nãopôde deixar de se sentir magoada pela

maneira rude que ele falou a últimafrase. — Eu não deveria ter perguntadomesmo.

Jack suspirou.

— Eu o vi com outra garota poucodepois que Sarah foi morar com ele.Estava bem claro que os dois eram maisque meros conhecidos, mas quandodisse isso para Sarah, ela me disse queeu estava mentindo, que estava tentandosepará-los. É claro que Mark negoutudo. É como se minha linda einteligente irmã tivesse sido hipnotizada.Ela parece incapaz de perceber o queestá bem embaixo de seu nariz.

— Deve ser difícil para você, não é?

— O quê? — Jack quis saber.

Lacey gentilmente apertou sua mão.

— Vê-la cometer um erro e saber quenão há nada que possa fazer paraimpedi-la.

Jack a estudou por um longo momentoe concordou.

— É horrível. E a pior parte é perdero que tínhamos entre nós. Não sei comoela pode ser tão cega!

— Sarah não consegue ver o que elanão quer ver. — Também fora assimcom Lacey. As provas estavam lá, masela se recusou a perceber o que eraevidente para todo mundo.

Quando Lacey voltou ao escritório, sópensava em Jack e Sarah. Queria quehouvesse alguma maneira de poderajudá-los, mas sabia que era impossível.

O Sr. Sullivan estava esperando porela, andando impacientemente peloescritório apertado. Quando ela entrou,ele olhou para o relógio.

— Está atrasada — ele anunciou.

— Cinco minutos — ela dissecalmamente, enquanto se sentava à mesa.Depois de todas as vezes em que chegoumais cedo e ficou até tarde, certamentenão se sentia culpada por estender seuhorário de almoço em cinco minutos.

— Você sabia que a Sra. Baxterestava marcada para vir esta tardeanalisar papéis de parede? — eleperguntou, com uma irritação maldisfarçada.

— Sim — Lacey respondeu, sementender por que seu patrão estava tãoirritado.

— Bem, a Sra. Baxter chegou àcidade antes do esperado e passou poraqui. Você não estava. — Sua vozindicava claramente um tom deacusação. — Tive eu mesmo que lidarcom ela e, não me importo de dizer issoa você, Lacey: aquela mulher me dá nosnervos. Era sua obrigação estar aqui.

Lacey se endireitou na cadeiranegando-se a aceitar a reprimenda deseu patrão.

— Sr. Sullivan — ela dissecalmamente, recusando-se a permitir queele a atormentasse —, tenho direito ameu horário de almoço.

Ele apertou os lábios e foi até aprópria mesa.

— Você é a especialista em papéis deparede — ele disse, de um jeitopetulante.

— Sou? — Se realmente achasseisso, deveria pagá-la de acordo. Nãohaveria momento melhor para chamar aatenção de seu chefe para isso.

— Claro que é — ele disserispidamente. — Sempre que os clientesestão interessados em papel de parede,encaminho-os a você.

— Que legal — Lacey disse.

Ele estava facilitando demais ascoisas e, para a surpresa de Lacey, elanão estava nem um pouco nervosa.

— Há quanto tempo trabalho para osenhor?

— Hum... — Ele pegou um papel eanotou alguns números em umbloquinho, como se sua perguntaexigisse algum cálculo muito complexo.— Acho que um ano ou mais.

— Há exatamente um ano. O senhorlembra que, quando me contratou,fizemos um acordo?

— Sim, claro. — Ele se endireitoucomo se soubesse o que estava por vir.

— Haveria uma reavaliação de meusalário depois de seis meses e, outra,depois de um ano. Os meses sepassaram, assumi uma boa quantidadede responsabilidades e praticamentegerencio o negócio para o senhor. Eagora o senhor me diz que sou suaespecialista em papéis de parede! Possolhe garantir que nenhum especialistaganha essa mixaria que ganho. Acho, Sr.Sullivan, que o senhor me deve umaumento significativo ou talvez até dois.

— Seu fôlego acabou depois de dizertudo isso sem nenhuma pausa.

Ela finalmente conseguira! Depois detodas aquelas semanas se lamentandopelos cantos, reclamando e semartirizando, enfim pedira o aumentoque merecia. E nem havia sido difícil!Então, observou o patrão e esperou aresposta.

— Eu devo um aumento a você? — OSr. Sullivan parecia chocado, como se aideia nunca tivesse passado por suacabeça. — Terei de checar meusregistros. Você pode estar certa. Voudar uma olhada e lhe dou um retornoamanhã de manhã. — Depois de dizerisso, o Sr. Sullivan desapareceu, algo

que andava fazendo com mais frequêncianos últimos tempos e a deixava comtodo o fardo de lidar com o negóciosozinha.

Lacey sentiu como se houvesse tiradoum grande peso das costas. Era como sesuas amarras tivessem sido rompidas.

A primeira pessoa que procurounaquela tarde foi Jack. Ela saiu doelevador e foi direto para o apartamentodele. Bateu várias vezes na porta,ansiosa para lhe contar a novidade. Parasua decepção, ele não estava em casa.Foi então que percebeu o quanto elehavia se tornado importante para ela. É

como se o fato de contar para eletornasse tudo real.

Entrando em seu apartamento, saudousua gata e então pegou o telefone. Jeanneatendeu no segundo toque.

— Pedi o aumento ao Sr. Sullivan —ela disse, sem ao menos dizer “olá”. —Jeanne, estou tão feliz que poderiachorar! Simplesmente aconteceu. Ele fezum comentário espontâneo dizendo quesou uma especialista em papéis deparede e eu disse que, se este fosse ocaso, deveria ser paga de acordo.

— Isso é ótimo! E já era hora... Meusparabéns!

Lacey sabia que Jeanne ficaria feliz

por ela, simplesmente por terconseguido juntar coragem e pedir oaumento.

— Devo tanto a você! — Lacey dissecom as emoções aflorando em sua voz.— É verdade. Há pouco tempo você medisse que só poderia me ajudar se euparasse de me fazer de vítima. E percebique estava certa. E Jack também, ele temsido...

Ela parou, pensando no quanto Jack ahavia ajudado. Não da mesma maneiraque Jeanne, mas com sua docecompreensão. Ele a incentivara e aajudara a se encontrar. Ela entendeu,pela primeira vez, o quanto suadificuldade em confrontar o Sr. Sullivan

estava ligada ao divórcio. Ela saiu deseu casamento destruídaemocionalmente, carregando consigomuita mágoa e insegurança, quepassaram a ser um grande peso em suavida.

— Você não tem falado muito de Jackultimamente — Jeanne comentou. —Como estão as coisas entre vocês?

— Eu não tenho falado muito dele? —Lacey se esquivou. — Está tudo bem, sóisso.

— “Tudo bem” me diz que está tudoótimo.

Cléo passou pelas pernas de Lacey,exigindo atenção. Com a ponta do

sapato, Lacey chutou um brinquedo até agata para distraí-la. Cléo correu atrásdele.

— Agora — Jeanne disse, soltandoum suspiro intenso —, me diga o quantode aumento o seu chefe vai lhe dar.

— Ele não disse o quanto. Só disseque pensaria no assunto até amanhã.

— Não deixe que ele saia pelatangente — Jeanne a alertou.

— Não se preocupe — Lacey disse.— Ele não se atreveria. — Nessemomento, ela se sentia invencível, capazde lidar com qualquer coisa ou pessoa.

Assim que desligou o telefone, Lacey

deu a Cléo a atenção que ela queria.

— Como você está, garota? — Laceyperguntou. — Aposto que está ansiosapara ter esses gatinhos. — Ela acariciousuas costas e Cléo ronronou contente. —Jack e eu encontraremos bons lares paraseus bebês. — Lacey garantiu. — Vocênão precisa se preocupar com nada.

Jack só chegou em casa depois dasseis. Assim que ela ouviu umamovimentação vinda do outro lado daparede da cozinha, correu até seuapartamento. Deu batidas marcadas naporta e ficou feliz ao ouvi-locantarolando do outro lado.

— Quem é? — ele gritou.

— Lacey.

A porta se abriu e ela correu paraseus braços, espalhando beijos pelo seurosto. Ele a olhou como se não soubesseao certo o que estava acontecendo.

— Lacey? — Seus olhos estavamarregalados de surpresa e encanto. —Qual a razão disso tudo?

— Um agradecimento. — Ela colocouos braços ao redor do pescoço de Jack eo beijou mais uma vez. — Estou tãofeliz!

— Meu palpite é que algo aconteceudepois do almoço.

Ela recompensou sua inteligência

beijando-o mais demoradamente,saboreando seus lábios. Do fundo docoração, ela agradecia a Deus porcolocar Jack em sua vida, antes solitáriae infeliz.

— Estou quase com medo de lheperguntar do que se trata. Seja o que for,não pare o que está fazendo. — Elefechou a porta e a carregou até a sala.

Ela o abraçava com força. A camisade Jack estava aberta. Ou ele estava sevestindo ou estava se despindo, ela nãosabia ao certo. Seu corpo trêmulo semovia contra o dele.

— Você vai me dizer o que estamoscomemorando? — ele perguntou,

ofegante.

— Um aumento — ela disse. — Emuito atrasado. Sabe, eu tinha de pedi-loe fazer isso era uma experiência decrescimento para mim. — Ela pausou eesfregou o nariz contra o dele. — Seique deve parecer bobo, mas eu nãoconseguia pedir esse aumento e isso setornou um grande problema, um monstro,fiquei apavorada.

— Mas você conseguiu?

— Sim. E devo tudo isso a você. E aminha amiga Jeanne. Conhecer você meajudou tanto, Jack! Você trouxe minhaconfiança de volta. Não sei como fezisso, mas desde que nos tornamos...

amigos, parece que tudo começou a darcerto para mim.

— Eu não poderia estar mais feliz. E,naturalmente, aceitarei o crédito — eledisse afetuosamente.

— O Sr. Sullivan vai pensar noassunto até amanhã, mas, sabe, a questãonão é o dinheiro, e sim eu mesma.

— Você com certeza não tevenenhuma dificuldade em me confrontarquando Cão tirou a virgindade de Cléo.Pelo que me lembro, você estava bempreparada, com uma lista detalhada deexigências.

— Aquilo era diferente. Não fui eu aafetada, e sim Cléo. Não tive nenhuma

dificuldade em defender minha gata.

— Gostaria de reclamar, mas não vou— Jack disse. — Estou muito feliz peloCão ter ido atrás dela. Caso contrário,não sei quanto tempo levaria até que euconseguisse quebrar essas suasbarreiras.

Então ele a beijou lentamente, fazendoseu corpo tremer.

— Vamos celebrar! Jantar, dançar,passar uma noite na cidade. Vamos...

Ele parou de repente e fechou osolhos.

— O que foi?

— Tenho outro daqueles jantares de

negócio idiotas hoje.

— Não tem problema. — Ela ficoudecepcionada, mas entendeu. — Nãoavisei com antecedência. Podemoscomemorar outro dia. Não temproblema. Mesmo. — Nada conseguiriafrustrar sua alegria. — Daqui a quantotempo precisa ir?

Ele olhou para o relógio e franziu atesta.

— Dez minutos.

— Então, é melhor eu ir embora.

— Não. — Ele a beijou avidamente.

— Jack! — Ela conseguiu protestar,mas não com muita veemência. — Você

vai se atrasar.

— É, eu sei.

— Jack!

Ele beijou seu nariz.

— Estraga-prazer! Mas lembre-se:vamos jantar na cidade amanhã à noite.

— Vou me lembrar.

Lacey voltou a seu apartamentoentorpecida. Quando se jogou no sofá,Cléo se aninhou em seu colo e elaacariciou suas costas, pensando no diaque tivera. Lacey não sabia ao certoquanto tempo ficou ali, até que alguémbateu na porta. Olhando pelo olhomágico, Lacey ficou chocada ao ver

quem era.

— Sarah! — ela disse, destrancandoa porta.

A irmã de Jack olhou para ela e caiuem prantos.

— Ah, Lacey, como fui ingênua!

Oito

— Sarah, o que aconteceu? —Lacey colocou a irmã de Jack paradentro de seu apartamento. Sarah sejogou no sofá e cobriu o rosto com asmãos. Vários segundos se passaram

antes de ela conseguir falar.

— Descobri que Mark está envolvidocom outra mulher. Encontrei os doisjuntos, em nossa cama. Fiquei com oestômago embrulhado de tanto nojo. Nãoacreditei. Como pude ser tão burra?

— Ah, Sarah! — Lacey a abraçou. —Sinto muito!

— Jack me disse que Mark estavacom outra, mas não acreditei. Eu oamava. Eu realmente o amava. Comopude ser tão burra? — Ela enterrou orosto no ombro de Lacey.

Ver Sarah arrasada desse jeito eraquase como ver um reflexo de si mesmano espelho. Lacey entendia a sensação

devastadora de traição que Sarah estavasentindo.

— Sei exatamente pelo que estápassando — Lacey disse quando ossoluços de Sarah diminuíram. Ela lhetrouxe uma xícara de chá com bastanteaçúcar, para ajudá-la a sair do choque.

— Como assim? — Sarah perguntou eolhou para Lacey, o rosto semmaquiagem. Seus olhos transpareciamuma dor profunda e familiar. A manta decrochê que a mãe de Lacey havia feitocomo presente de Natal cobria osombros da irmã de Jack, como se elaestivesse morrendo de frio. Parecia queSarah tinha 6 anos de idade.

— É como se seu mundo inteirotivesse virado de cabeça para baixo.Mas é muito mais que isso. A sensaçãode traição é a pior dor emocional queexiste.

— Você também?

Lacey fez que sim.

— Meu marido, ex-marido agora, medeixou por outra mulher. Aparentemente,eram amantes havia meses, mas eu nãofazia ideia. Quando Peter pediu odivórcio, pensei que fosse morrer. —As lembranças daquele último confrontovoltavam à cabeça de Lacey. Mas elapercebeu, para sua surpresa, que,embora essas lembranças a

entristecessem, não sentia mais a agoniaesmagadora que sentiu durante um ano emeio.

— O que... o que você fez depois?

Lacey pegou na mão de Sarah.

— Depois que o divórcio saiu, junteitudo o que tinha e me mudei para SãoFrancisco.

— Então não deve fazer tanto tempoassim.

— O divórcio saiu no fim do anopassado, mais ou menos nesta época doano.

Sarah deu um gole em seu chá.

— Não percebi o que estava

acontecendo. Confiei em Mark deverdade. E quase deixei que eledestruísse meu amor por meu irmão.

— Não é culpa sua.

— É minha culpa sim! — Sarahchorava. — Olhando para trás, nãoacredito que fui contra meu irmão. Elenunca mentiu para mim e, mesmo assim,acreditei em tudo o que Mark me diziasobre meu irmão ser ciumento e todasaquelas outras besteiras.

— Eu também acreditei — Laceydisse. — Mas quando amamos umapessoa, a confiança é automática. Porque suspeitar que um homem está nostraindo se fazer o mesmo jamais se

passaria pela nossa cabeça? A própriaideia de trair o Peter era repugnantepara mim.

Sarah segurou a xícara com as duasmãos.

— Você acha que um dia conseguiráconfiar novamente em outro homem?

— Sim — Lacey respondeu depois dealguns segundos. — Mas não serei tãocega quanto antes. Não suportaria viverdesconfiada. Este fardo arruinariaqualquer relacionamento futuro. Não soua mesma mulher de dezoito meses atrás.A traição de Peter me marcou parasempre. — Ela hesitou, sem saber aocerto o quanto deveria admitir sobre as

mudanças que Jack havia trazido parasua vida. — Até pouco tempo atrás,achei que jamais diria isso, mas achoque essa situação toda fez com que eumudasse para melhor.

— O que quer dizer?

— Foi uma longa e dolorosaprovação. Só no mês passado confronteia realidade e passei a entender o queaconteceu. Por muito tempo achei queodiava meu ex-marido, mas não eraverdade. Como poderia odiá-lo se nãotinha deixado de amá-lo?

— O que você sente por ele agora?

Lacey teve de pensar na resposta.

— No geral, não sinto nada. Eu operdoei.

— Você? Ele deveria ter imploradopelo seu perdão!

Lacey sorriu, conhecia Peter muitobem.

— Eu poderia esperar uma eternidadee isso jamais aconteceria. Ele acha quefui eu quem fracassei com ele, e talvezeu tenha fracassado mesmo, de certaforma. Ele precisava de uma desculpapara justificar o que estava fazendocomigo.

— Mark também me culpou. Comopôde perdoar o Peter? Não consigoentender.

— De fato, ele não pediu meu perdão.Mas não fiz isso por ele, eu o fiz pormim. Caso contrário, sua traição teriame destruído.

— Mesmo assim, não consigoentender.

— No início, não conseguia lidar coma dor, então fingia que não estavamachucada. Mas no último mês, percebique precisava superar Peter e o fim domeu casamento. E a única maneira defazer isso foi admitindo minhas falhas eo perdoando. Se não fizesse isso, talvezjamais me livrasse da mágoa que sentia— disse Lacey.

Novas lágrimas correram o rosto de

Sarah.

— Nunca serei tão sábia quanto você.

Lacey riu.

— Ah, Sarah! Se ao menos vocêsoubesse quanto tempo levei paraaceitar esse divórcio. Devo isso a Jacke a minha amiga Jeanne. Até mesmoCléo teve um papel importante nisso.

— Jack é maravilhoso — Sarahadmitiu e mordeu o lábio inferior. —Fui horrível com ele.

— Esta é a vantagem dos irmãos: elesconseguem perdoar. Podemos confiarque Jack vai perdoá-la. Ele é especial,Sarah, e acho que vocês não terão mais

problemas depois de se acertarem.

Elas se sentaram e conversaram, e,conforme as horas iam se passando,Lacey percebeu o quanto tinham emcomum. Eram quase dez horas da noitequando a campainha tocou. As duas seentreolharam.

— Não precisa se preocupar. Tenhocerteza de que não é Mark — disseSarah.

Lacey olhou pelo olho mágico mesmoassim. Era Jack. Removendo a correnteda porta, ela a abriu e o abraçou. Ele abeijou como se não se vissem haviasemanas e não apenas algumas horas.

— Jack! — A voz de Sarah

interrompeu a neblina de paixão quecercava Lacey.

Jack parou de beijá-la, surpreso coma presença da irmã, mas manteve obraço ao redor de sua cintura. Elaobservou o rosto dele enquanto ele viasua irmã no sofá, embrulhada na mantade Lacey. Seu olhar foi de Sarah paraLacey e, então, de volta para a irmã.

— Sente-se — Lacey disse, soltando-se de seus braços. — Sarah tem algopara lhe contar.

Então, como sabia o quanto seriadifícil, inclinou-se no ouvido de Jack esussurrou:

— Seja gentil com ela.

— Lacey! — Jack disse irritado. —Não levante isso. É pesado demais paravocê.

— Não se preocupe — ela insistiu,tirando a caixa de papelão do porta-malas da van alugada. Estava pesada,mas ela aguentava. Sarah haviaencontrado um apartamento e Jack eLacey estavam ajudando com amudança. Foi um mês repleto deacontecimentos. Sarah moroutemporariamente com Lacey e as duasconversaram muito, geralmente noiteadentro.

— Acho que já deu — Sarah disse,

enquanto Lacey colocava a caixa sobreo balcão da cozinha.

Ela olhou por cima do ombro deLacey e sussurrou:

— O que Jack tem? Ele ficou mal-humorado demais a manhã inteira e,ontem à noite, também não estava muitolegal. Você percebeu?

Lacey havia percebido, mas não quisdizer nada.

— Não sei o que ele tem. — Mas defato havia acontecido alguma coisa.

— Se alguém pode fazer com que elefale, esse alguém é você.

Lacey se perguntou se aquilo era

verdade. Depois do último mês, ela eSarah eram como irmãs. E, nesse meiotempo, ela chegou a outra, e maisprofunda, conclusão: estavacompletamente apaixonada por Jack.

Para alguém que estava convencidade que jamais seria capaz de seapaixonar outra vez, essa era uma ótimanotícia.

— Devo tanto a vocês dois! — Sarahdisse quando Jack voltou da van. — Nãosei o que teria feito sem vocês nessasúltimas semanas. — Ela os abraçou eentão se virou em uma tentativa deesconder as lágrimas, que faziam seusolhos escuros brilharem. — Estou bemagora. Podem ir e se divertir. Não quero

que se preocupem comigo.

Jack hesitou.

— Tem certeza?

— Absoluta. — Sarah começou aarrumar as coisas, removendo váriositens da caixa mais próxima ecolocando-os sobre o balcão. O tempotodo de costas para eles. — Por favor— acrescentou.

Lembrando-se de sua própriaexperiência, Lacey sussurrou:

— Ela ficará bem. Só precisa detempo.

Juntos, Lacey e Jack saíram do prédiode Sarah e foram até onde Jack havia

estacionado a van. Ele abriu a porta dopassageiro e a ajudou a entrar.

Lacey removeu sua bandana echacoalhou a cabeça para soltar asmechas de cabelo que estavam grudadasno rosto. Jack se sentou no banco domotorista. Ela percebeu que suas mãosestavam tensas, segurando o volante. Porvários segundos ele simplesmente ficouali, sentado. Então, deu a partida e saiucom o carro. Mas ainda parecia absortoem seus pensamentos. Havia algoerrado.

— Jack — ela disse —, estápreocupado com alguma coisa?

Sua voz o tirou do devaneio e ele

sorriu como se não estivessepreocupado com nada.

— Com absolutamente nada. Que taldividirmos um sundae com calda quentedepois de devolvermos a van?

Parecia uma ótima ideia, mas Laceyhavia descoberto, nas últimas semanas,que quase todos os minutos que passavana companhia de Jack eram especiais.Ele era especial.

— Você está preocupado com suairmã? — Lacey perguntou com cuidado,preocupada com seu ar triste. Ela nãopodia forçá-lo a dizer o que estavaacontecendo. Ele falaria com ela quandoestivesse pronto, decidiu.

— Não tanto como quando ela estavamorando com Mark. Embora tenha sidodifícil para ela, descobrir exatamenteque tipo de homem ele é foi a melhorcoisa que poderia ter acontecido.

— Ela ficará bem — Lacey disse,confiante.

— Graças a você.

— Imagine. Ela sairá dessaexperiência um pouco mais madura ebem mais esperta. Foi assim comigo.Mas leva tempo, Roma não foiconstruída em um dia.

— Eu que o diga. Olha o tempo quelevei para conseguir me aproximar devocê.

— Mas valeu o esforço, não valeu?

Ele tirou uma mão do volante e bateude leve no joelho dela. Estavamsentados tão próximos um do outro queseus quadris se tocavam. A manhãestava quente e úmida, mas nenhum dosdois se mexeu, apreciando essa leveintimidade.

— Valeu cada segundo de espera —ele concordou. E então completou, comos olhos escuros e sérios: — Sou loucopor você, Lacey. Há meses sou loucopor você.

— Também sou louca por você — elarespondeu.

Mas o que era definitivamente louco

era que eles estavam admitindo seussentimentos um pelo outro em uma vanem movimento, no meio do fluxo intensodas ruas de São Francisco.

Depois de falarem tão abertamente, osdois pareciam um pouco constrangidos,e bastante apaixonados. Lacey se sentiacomo se estivesse de volta à faculdade.Os anos de casamento e asconsequências do divórcio haviam seesvaído, como se nunca tivessemacontecido.

Deixando o carro de Jack noestacionamento subterrâneo, elespegaram o elevador. No instante em queas portas se fecharam, Lacey caiu nosbraços de Jack. A boca dele procurou

pela dela com o desespero de umhomem trancado em um quarto escuro,incapaz de encontrar a saída. Os braçosdele a levantaram levemente do chão,dando a ela a desculpa perfeita paraabraçá-lo mais forte ainda.

— Sou louca por você — ela disse.Sentia-se embriagada, como se tivessepassado as últimas horas em um bar, enão os últimos minutos em seus braços.

Ele pegou o rosto dela com as mãos ea beijou até ela estremecer e gemer. Eletambém gemeu.

— Jack! — De algum lugar em seuâmago, conseguiu tirar forças paraprotestar, mesmo que minimamente. —

Ainda estamos no elevador.

Ele levantou a cabeça e olhou aoredor.

— Ah, é?

Ela pôs os braços na cintura dele einclinou a cabeça para trás, sorrindo.

— Onde está seu lado aventureiro? —ele a provocou beijando seu nariz. Elese esticou e apertou o botão do quartoandar.

O sentimento intenso de desejo eranovo para ela. Lacey achou que morreriase em algum momento ele parasse debeijá-la, amá-la ou tocá-la. Era como seanos de espera contida se libertassem

dentro dela, tomando conta de todos osseus sentidos.

Ele a beijou novamente e ela seapoiou no corpo dele assim que oelevador se abriu no quarto andar.

— No seu apartamento ou no meu? —ele perguntou e então tomou a decisãopor ela. — No seu.

A mão de Lacey tremia enquanto davaas chaves a Jack. Ela ficou satisfeita aover que os dedos dele também nãoestavam lá muito firmes. Naquelemomento, ela o amava tanto que achavaimpossível esperar mais um únicosegundo. Os braços dela circularam acintura de Jack e ela beijou seu pescoço,

logo abaixo do maxilar, provocando-ocom sua língua, descendo-a e entãobeijando suavemente a cavidade na basedo pescoço.

— Lacey, pare — ele protestou.

— É isso mesmo o que você quer? —ela sussurrou levantando o rosto.

— Não. Nunca pare de me amar. — Aporta se abriu e eles entraramcambaleantes.

Foi quando ela ouviu o miadochoroso de Cléo. Jack também ouviu.Ele olhou para trás e, então, voltou orosto para Lacey com os olhos bemfechados.

— Cléo está tendo os filhotes — eleanunciou e então se afastou de Lacey.

Nove

— Cléo está tendo os filhotesagora!

Lacey correu para dentro doapartamento.

— Ai, meu Deus! — Ela cobriu aboca com as mãos e olhou para oarmário, onde Cléo havia seaconchegado em um canto escuro.

A gata soltou outro miado choroso.

— Ah, Cléo! — Lacey sussurrou.

Cléo a ignorou, levantou-se do ninhoe foi até Jack, entrelaçando-se em suaspernas, o longo rabo deslizando emvolta da panturrilha dele. Então, elavoltou para o armário e miou mais umavez, em súplica.

— Parece que ela quer você — Laceymurmurou, incapaz de disfarçar oespanto. Não fazia sentido Cléo se sentirmais confortável com Jack. Afinal de

contas, era Lacey quem a alimentava ecuidava dela.

— Eu?

— Não era para mim que ela estavachoramingando agorinha mesmo. — Poracaso ninguém mais entendia osignificado de compromisso? Até suagata foi atrás de outra pessoa quando emdificuldade.

Cléo se levantou mais uma vez,buscando a atenção de Jack. Ele seagachou em frente à porta aberta doarmário e a acariciou devagar, enquantosussurrava palavras de conforto.

— Será que eu preciso ferver água oualgo do tipo? — Lacey perguntou,

ansiosa. O momento havia finalmentechegado, mas ela não fazia ideia do quefazer. Achava que Cléo um dia iriacalmamente dar à luz seus filhotesenquanto ela estivesse no trabalho.

— Ferver água? — Jack perguntou.— Para quê?

— Eu... sei lá. Para fazer café, acho.— Ela andava de um lado para outro,pelo carpete, atrás de Jack, a passoscurtos e rápidos. Segundos atrás, os doisestavam envolvidos em um momentoapaixonado e, agora, fazer amor era aúltima coisa que passava pela cabeçadeles.

— Como ela está? — Lacey

perguntou, olhando por cima dos ombrosde Jack.

— Até agora, ótima. Parece que oprimeiro gatinho está prestes a nascer.

— Como está a Cléo? — Laceyperguntou novamente, com as pontas dosdedos pressionadas contra os lábios. —Ela está com medo? Acho que não vouaguentar vê-la sofrendo.

Jack olhou para Lacey, pegou sua mãoe beijou seus dedos.

— Ela está bem. Pare de sepreocupar, vai acabar passando mal.

Foi Jack dizer isso que o estômago deLacey começou a doer. Ela colocou as

mãos na cintura, sentou-se na beirada dacama e se inclinou para frente.

— Jack, não estou me sentindo muitobem.

— Vá preparar aquele café do qualestava falando — ele sugeriu. — Nestemomento, Cléo está se saindo melhorque você.

Cléo choramingou e Jack voltou suaatenção para dentro do armário.

— Ela acabou de dar à luz o primeirofilhote — ele anunciou satisfeito. —Boa garota, Cléo! — ele disseempolgado. — Meu Deus! Venha ver! Ofilhote da Cléo é igualzinho ao Cão.

Lacey saiu rapidamente da cama paraolhá-lo. O estômago não estava melhor,mas ela entendia a fonte de seudesconforto. Estava sofrendo dores departo solidárias.

— Ele se parece mesmo com Cão. —Ela se agachou ao lado de Jack eestudou a criaturinha feiosa. — Nãotenho problemas em lhe dizer, Jack, masisso me aborrece um pouco.

— Uma xícara de café seria perfeita— ele disse. — Cléo e eu estamos indobem.

Lacey correu para a cozinha. Quandochegou lá, decidiu que não tinha motivopara correr. Como Jack havia dito de

maneira tão eloquente, ele tinha tudo sobcontrole.

— Como estão as coisas? — elaperguntou quando voltou com o café.

— Ótimas. Acho que Cléo está quasepronta para dar à luz o segundo filhote.

Lacey não estava interessada emassistir ao processo de nascimento,então se sentou na cama e deixou Jackbrincar de parteira.

— Aí vem ele! — ele disse, depoisde alguns minutos, sua voz elevada deempolgação. — Esse também é a carado Cão. — Ele se virou com um sorrisoorgulhoso, como se ele próprio tivessedado à luz o filhote.

Murmurando, Lacey se sentou nocarpete ao lado de Jack.

Cléo estava ocupada lambendo aspequenas crias. Para Lacey, os filhotesnão eram maiores que uma bola de peloe eram feios de doer, mas isso nãoimpediu que seu coração fosse inundadopor uma enxurrada de emoções.

— Você acha que ela acabou?

— Não sei — Jack respondeu. —Quanto tempo duram essas coisasgeralmente?

Lacey riu.

— E como é que eu vou saber?

— Você não pretendia cruzá-la?

— Sim, antes do mal-educado do Cãointerromper meus planos.

Jack levantou apenas umasobrancelha.

— Você está feliz por ele ter feitoisso, não está?

Lacey não estava disposta a admitirisso.

— Você tem de admitir que assim queCão conseguiu o que queria, ele seguiutranquilamente com sua vida.

— Talvez, mas com a Cléo tendo osfilhotes do Cão... Bem, foi isso queconsolidou nosso relacionamento, nãoacha?

Ela reprimiu um sorriso.

— Acho que sim.

— Você pode cruzá-la uma próximavez, se essa for realmente sua intenção.

Ele estava certo. Seria tolo negar.

— Vou pegar o panfleto que o Dr.Christman me deu. Deve ter algumacoisa nele sobre o tempo que esseprocesso leva para acabar. — Ela odeixou por um momento e voltou, lendoo material que o veterinário havia lhedado.

— Acho que Cléo já deve terterminado — Jack anunciou, quandoLacey voltou para o quarto e se sentou

na beira da cama. — Ela está dandotoda a atenção aos filhotes e não estámais agindo como antes.

— Aqui diz que o processo denascimento geralmente leva algumashoras — ela recitou e olhou para orelógio em seu pulso. Cléo não levouesse tempo todo nem de perto.

Antes que ela pudesse ler maisalguma coisa, Jack disse:

— Não sabemos quanto tempo faziaque ela estava em trabalho de partoantes de chegarmos.

— É. Poderia muito bem ser umasduas horas. — Ela sentiu uma enormesensação de alívio por tudo haver

terminado. — Ela só teve dois filhotes,mas aqui diz que os gatos da raçaabissínia geralmente têm ninhadasmenores e os siameses, maiores. Queinteressante!

— Acho que temos de agradecer aoscéus por Cléo ter tido apenas dois.

— Falando nisso — Lacey disse emtom de superioridade —, você nunca medeu o nome da família que vai ficar comsua metade da ninhada.

— Vou dar um para Sarah — Jackdisse, confiante. — Um animalzinho farábem a ela. Além disso, ela está medevendo uma.

— Mas Sarah quer um gato? — Lacey

podia considerar a irmã de Jack comoparte da família, mas não queriaempurrar um animal para ela caso nãoquisesse.

— Claro que quer! Os filhotes do Cãoe da Cléo são especiais. Além do mais,um gatinho fará companhia a elaenquanto tenta superar o tal do Mark. —Ele franziu a testa como se achasserepulsivo dizer o nome daquele homem.— Não deve demorar muito para elaesquecer aquele desgraçado.

— Não tenha tanta certeza assim —Lacey disse. — Fui casada com umhomem que apresentava vários traçossemelhantes aos dele. Seja paciente comela — ela aconselhou e então completou

com um sorriso dócil: — assim comofoi comigo.

— Você falou tão pouco do seucasamento.

— Se você pegar o que aconteceucom Sarah e só mudar os nomes, ahistória é a mesma, com apenas algumasdiferenças — ela complementou. — Aprincipal diferença é que eu era casadacom Peter. Poucos meses depois que memudei para cá, ouvi de um amigo bem-intencionado, que achava que eu deveriasaber que ele havia se casado com sualinda loura e que estavam esperando umbebê.

— Belo amigo!

O sorriso de Lacey era triste.

— Foi o que pensei na hora. Essanotícia acabou comigo. Não porque elehavia se casado de novo, mas porque elefora tão resistente quanto a termos umbebê quando eu queriadesesperadamente formar uma família.

Jack deu um gole em seu café epareceu estar refletindo sobre asinformações.

— Você já o esqueceucompletamente?

Lacey não sabia ao certo comoresponder a essa pergunta. Sua hesitaçãopareceu deixar Jack um poucopreocupado. Ele olhou para ela e franziu

a testa.

— Sim, eu o esqueci e, não, não oesqueci.

O canto da boca de Jack subiu, em ummeio sorriso.

— Não entendi nada!

— Não o amo mais, se é isso que estáperguntando. A parte mais difícil foi terde abrir mão do sonho de como poderiater sido nossa vida juntos.

— E você conseguiu? — Suaspalavras eram duras e nãodemonstravam nenhum traço de emoção.

— Sim. — Ela queria agradecer aJack pelo grande papel que ele teve em

seu processo de cura, mas ele nãoparecia receptivo. Embora ele mesmotivesse perguntado a ela sobre Peter eseu casamento, ele parecia achardesagradável escutar os tristes detalhesda vida dela com o ex-marido.

Jack se levantou e foi até a sala,levando a xícara de café nas mãos. Ela oseguiu e se deparou com ele em frente àpequena janela que tinha vista para arua. Ele não se virou. Era quase como setivesse se esquecido de que ela estavaali.

— Jack?

Ele se virou e deu um sorriso fugaz.

— Você fica incomodado em falar

sobre meu ex-marido?

Ele fez que não e colocou a xícara delado.

— Nem um pouco. Fui eu queperguntei, lembra?

— Sim, mas você pareceu... sei lá,chateado, acho. Peter fez parte de minhavida, e foi uma parte importante pormuitos anos. O divórcio foi difícil paramim, mas aprendi com ele. Amadureci.Culpar Peter já não é o que quero. Hojeentendo que também contribuí para o fimde nosso casamento. Não era a esposaperfeita.

— Você disse que não o ama mais?

Ela gesticulou, sem forças.

— Vou colocar desta maneira: não oodeio. Minha felicidade não depende doque está acontecendo na vida dele nestemomento. Ela depende de mim e dasescolhas que faço, e eu decidi ser feliz.— E ela esperava que essa vida fosseao lado de Jack. No fundo do coração,pedia a Deus que ele sentisse por ela omesmo que ela sentia por ele.

Ele sorriu. Lacey podia jurar quenunca havia visto alguém tão bonito. Eraestranho, ela sabia, sentir-se daquelamaneira por um homem. Não era aaparência dele, embora ele fosse muitoatraente. Mas o que ela achava tãofascinante em Jack era quem ele era

como pessoa. Era confiável e generoso.Ele a havia ajudado a recuperar sua féno amor e na vida. O amor dele haviasido uma dádiva preciosa pela qual elasempre seria grata.

— Jack — ela sussurrou —, o quefoi? — Algo ainda o estavaincomodando.

Ele foi até Lacey e a abraçou comcarinho. Descansou o queixo sobre acabeça dela e ela ouviu um suspiroretumbar em seu peito.

— Você conseguiu o aumento com oSr. Sullivan? — ele perguntou.

— Sim. — Lacey tinha certeza de quehavia lhe contado, mas os dois andavam

tão envolvidos em ajudar Sarah que eledevia ter se esquecido. — Um aumentomuito bom.

— Que bom...

Lacey se afastou do peito de Jack eolhou para ele.

— Por que você está me perguntandodo Sr. Sullivan?

— Você ama seu trabalho, não ama?Principalmente agora que está ganhandoo respeito e o dinheiro que merece?

— Sim, mas o que isso tem a verconosco?

Ele voltou a abraçá-la.

— Também amo meu trabalho.

Trabalho para o California Fidelity háquase dez anos. Na quinta-feira passada,fui promovido. Trabalhei durante anospor essa promoção, mas nunca imagineique aconteceria tão rápido. Isso mepegou de surpresa.

— Jack, isso é maravilhoso! — Naponta dos pés, ela o beijou, cheia deorgulho. — Por que não me contou issoantes? Podíamos ter comemorado.

— Minha promoção significa maisuma coisa, Lacey.

— Tenho certeza de que terá maisresponsabilidades. Ah, Jack, nãopoderia estar mais feliz por você!

— Significa — ele disse, com as

mãos nos ombros de Lacey — que tenhode me mudar.

O sangue desceu do rosto de Laceytão rapidamente que ela achou que iadesmaiar.

— Mudar? Para onde?

Ele suspirou e olhou para o outrolado.

— Seattle.

Dez

— Seattle! — Lacey repetiu,pasma. — Quando você pretendia mecontar, antes ou depois de conseguir oque queria comigo? — Afastando-sedele, empurrou o cabelo para trás,

deixando as mãos caírem, os braçosestendidos. — Você é igual ao Cão!

— O que Cão tem a ver com isso?Você está sendo ridícula!

— Não estou, não. Você ia fazer amorcomigo e então, como se nãosignificasse nada, ia mencionar que foitransferido? — Tudo estava claro paraela agora. Claro como a luz do sol.Assim como seu gato de rua, eleconseguiria o que queria e, então, iriaembora.

— Eu não pretendia fazer nada disso.Você não tem motivo para ficar brava.E, além disso, não aconteceu nada.

— Graças à Cléo. E para sua

informação, eu... tenho todo o direito deestar brava. — Sua voz frágil oscilavade emoção, mas ganhava força a cadapalavra. — É melhor que você váembora.

— Não enquanto não resolvermosisso. — Ele firmou os pés no chão comose sugerisse que nem mesmo umguindaste o tiraria de lá, até queestivesse pronto para sair.

Ela apontou o dedo indicador para eleenquanto colocava os pensamentos emordem, os quais, infelizmente,espalhavam-se como gado sedento emdireção a um rio.

— Já ouvi falar de homens como

você.

— O quê? — Ele olhou fixamentepara ela, como se precisasse examiná-lade perto. — Lacey, pelo amor de Deus,pare agora mesmo antes de dizer algo doqual possa se arrepender.

— Com certeza direi algo. — Elaandou até a porta e a abriu para ele. —Você... você não pode soltar uma bombacomo essa e esperar que eu não reajaassim. Quanto a arrependimentos,acredite, Jack Walker, tenho vários. Elevará anos para resolvê-los.

— Tudo bem. Tudo bem. — Elelevantou as mãos, rendendo-se. Naverdade, ele agia como se ela estivesse

apontando uma arma para ele. — Porfavor, feche a porta. Vamos nos sentar econversar sobre isso como duas pessoascivilizadas.

— Você está querendo dizer que eunão sou civilizada? Porque já voudizendo, para mim, chega!

— Sente-se — ele disse calmamentee indicou o sofá. — Por favor!

Lacey pensou se deveria fazer o queele havia pedido. Ela cruzou os braços eolhou para ele.

— Prefiro ficar de pé.

— Você pode fechar a porta?

Ela não havia percebido que seu pé

estava segurando a porta aberta.

— Tudo bem — ela disse comfirmeza, como se fosse uma grandeconcessão. Com o queixo erguido, saiudo lugar e a porta se fechou com umestalo alto.

— Eis o que acho que nós devemosfazer... — Jack disse, andando de umlado para outro, em frente à janela pelaqual estava olhando pouco tempo antes.

— Nós? — ela perguntou, querendoque ele achasse que ela não estavagostando de como ele automaticamente aincluía em seus planos.

— Eu — ele corrigiu, lançando a elaum olhar aborrecido. — Vou aceitar a

promoção, Lacey. Pensei muito sobreisso e não posso deixar a oportunidadepassar. Não é o melhor momento, masnão posso fazer nada. Trabalheiarduamente para chegar até aqui e só porcausa...

— De mim? — Lacey terminou afrase para ele. — Não precisa sepreocupar, Jack, eu não ia pedir paravocê recusar uma oportunidademaravilhosa como essa. — Apesar dochoque e do sentimento de traição,manter a indignação estava se tornandodifícil. Sua voz se abrandouconsideravelmente. — Eu jamais pediriauma coisa dessas para você.

— Achei que poderia vir para cá uma

vez por mês no fim de semana — elesugeriu.

“Uma vez por mês”, ela pensou, seucoração tão pesado que parecia quehavia caído até os joelhos. Depois de terfeito tanta questão de ficar de pé, sentiuuma necessidade repentina de se sentar.

Sentando-se na beira do sofá, mordeuo lábio inferior. Então, esse era o futurodeles. Encontros uma vez por mês.Lacey não era ingênua o suficiente paraacreditar que seria de outro jeito.Relacionamentos a distância sãodifíceis. Os dois começariam com boasintenções, mas ela notou que ele nãodisse aonde esses encontros chegariam.

Jack gesticulou.

— Diga alguma coisa. Qualquercoisa. Sei que não é a solução ideal.Também será difícil para mim.

— E uma solução cara, também —disse. Ela já sabia como essa históriaterminaria. Ele viria visitá-la nosprimeiros meses, então não conseguiriavir um mês e ela só saberia dele no mêsseguinte.

— Podemos fazer isso dar certo,Lacey.

Tentando conter as lágrimas, ela selevantou, foi até Jack e parou diantedele. Os traços de Jack ficavamembaçados à medida que as lágrimas

afloravam dos olhos de Lacey. Elapressionou as mãos nas faces dele,inclinou-se e o beijou. A eletricidadeentre eles praticamente crepitava evários minutos se passaram até Laceyencontrar forças e coragem para seafastar.

— Perguntei para Sarah por que vocêqueria ficar comigo. — Era quaseimpossível, para ela, falar normalmente.— Ela me disse que você sempre foiassim. Você acha alguém ferido e emsofrimento, alguém que precisa de umpouco de carinho, e então você dá todoo amor que pode dar para essa pessoa.O que ela não disse foi que, assim queessa pessoa retoma suas forças, você se

afasta e se despede.

Jack franziu a testa.

— Não estamos falando da mesmacoisa. Se quiser saber, você até que foium desafio quando nos conhecemos.Antes de você, nunca tive muitadificuldade em fazer com que umamulher concordasse em sair comigo.Quanto a essa outra questão, você estábem por fora.

— E Cão?

Ele franziu a testa mais ainda.

— O que tem ele?

— O gato do beco, solitário eperdido, que você encontrou e amou.

Um pequeno sorriso surgiu no rostode Jack.

— Acho que Cão não gostaria muitodessa descrição. Nós nos tolerávamosno começo. Hoje em dia,compartilhamos uma tentativa deamizade.

— Você o acolheu, deu-lhe um lar e...

— Espere só um minuto — Jack disseseveramente. — Você não estásugerindo que minha relação com Cãotem alguma coisa a ver conosco, está?

Era evidente que ele não entendia nempercebia as semelhanças. Despedir-sede Jack seria uma das coisas maisdifíceis que ela teria de fazer, mas,

apesar do que havia dito pouco tempoantes, faria isso sem arrependimentos.Ele deu a ela bem mais do que elepróprio imaginava. Com o amor e oapoio de Jack, ela aprendeu a esquecero passado. Seu amor havia dado a ela acoragem para seguir em frente.

— Obrigada — ela sussurrou. Deixouas mãos caírem e se afastou.

— Por que está me agradecendo? —ele perguntou. — E por que estáparecendo uma outra maneira de dizeradeus?

Ela nem ao menos hesitou.

— Porque é.

Ele ficou visivelmente abatido.

— Não é isso que você quer — elemurmurou.

Lacey não sabia mais o que dizer.Diversos argumentos passavam por suacabeça. Seria fácil fingir que nadamudaria depois que Jack fosse paraSeattle, mas isso não era verdade.

Dentro de poucos meses, Lacey nãopassaria de uma mera lembrança dealguém de quem ele gostara. Como elemesmo disse, não tinha problemas emencontrar mulheres interessadas nele.

Lacey percebeu que, com toda essaconversa de encontros uma vez ao mês,Jack não lhe prometera nada. Mas, para

ser justa, ele também não havia pedidoque ela prometesse nada.

— Então acabou, simples assim? —ele disse em um tom seco. — Foi legalconhecer você, tenha uma vida bacana etodas essas bobagens?

Parecia frio e estúpido, masbasicamente era isso mesmo. Incapaz deolhá-lo nos olhos, Lacey fez que sim eabaixou a cabeça.

— Em outras palavras, assim que eusair pela porta está tudo acabado entrenós?

— É melhor assim — ela sussurrou.As palavras mal passavam pelo nó emsua garganta. Ela pediu a Deus que ele

fosse embora antes que seenvergonhasse ainda mais quandodesatasse a chorar.

— Mais fácil, no fim das contas.Prefiro terminar agora e acabar logocom isso. A mulher que eu amo está mecolocando para fora de sua vida. Nãofaz nenhum sentido.

— O que você está me oferecendoexatamente, Jack? — ela perguntou,desafiando-o. — Um fim de semana pormês... por quanto tempo? Dois ou talveztrês meses? Não vai durar...

— Por que não? Para sua informação,espero que não dure mesmo mais que umou dois meses.

As palavras dele doeram como umtapa na cara.

— Talvez até lá você esteja infeliz osuficiente para querer se casar comigo...

— Casar com você? — Lacey nãosabia se havia escutado direito e, se emalgum momento na vida as coisasprecisavam estar bem claras, este era omomento.

— É claro — ele falou. — Você poracaso não pensou que eu estavaplanejando fazer essa viagem todo mêspara o resto da vida? Ou achou?

— Bem, sim. Foi exatamente o quepensei — ela murmurou.

— É que eu imaginei que, separados,levaria uns dois meses para vocêperceber que me amava.

— Sei que amo você agora mesmo,seu idiota! Por que você acha querecusei um sundae com calda quente?Disse hoje mesmo o que sentia porvocê!

Ele a encarou com ar de suspeita.

— Não, você não disse.

— Jack — ela falou, impaciente —,você estava dirigindo a van de voltapara a loja e eu olhei bem em seus olhose disse.

— O que você disse foi que era louca

por mim. Ser louco por alguém écompletamente diferente de amaralguém. Se você me ama, precisa deixarisso claro, para não haver duplainterpretação. Você já sabe que eu amovocê.

— Não sei, não — ela protestou. —Você nunca me disse o que sente pormim.

Ele fechou os olhos como se estivesseprestes a perder a paciência.

— Um homem não diz esse tipo decoisa à toa, principalmente se a mulheradmitiu estar apenas louca por ele. Alémdisso, não é possível que não saiba oque sinto por você. Um cego na rua

saberia que a amei desde o momento emque bateu em minha porta e exigiu queCão honrasse Cléo.

— Você... nunca disse nada.

— E como poderia? Você era maisarisca que um gato de rua! Leveisemanas para conseguir que você pelomenos saísse comigo. E assim quecomecei a achar que estava fazendoalgum progresso, veio essa promoção. Oque mais eu poderia fazer a não sertorcer para que você sentisse tanto aminha falta que aceitasse se casarcomigo?

— Aceito — Lacey sussurrou.

Aparentemente, Jack não ouviu.

— Outra coisa — ele disse. — Vocêacabou de conseguir seu aumento enunca a vi tão feliz. Você não vai quererdeixar a vida que tem agora, justoquando conseguiu o que tanto queria.

— Acho que não ouviu direito, Jack.Eu disse que aceito. Outra coisa, setenho andado feliz ultimamente, jápassou pela sua cabeça que pode serporque me apaixonei por você?

— Você aceita o quê? — eleperguntou, impaciente.

— Aceito me casar com você.Imediatamente. Amanhã. Ou daqui a doismeses, o que você quiser.

Ele a olhou de soslaio e a encarou,

como se não soubesse ao certo sedeveria confiar no que ela dizia.

— E seu trabalho?

— Dou aviso-prévio de duas semanasamanhã de manhã, assim que chegar lá.

— Seu aluguel.

— Posso sublocar o apartamento.Escuta aqui, Jack Walker, se acha quevai dar para trás na sua oferta agora,tenho umas coisas a lhe dizer.

Ele se levantou e foi até ela.

— Você está falando sério? Vocêestaria mesmo disposta a se casarcomigo rápido assim?

Ela abriu um sorriso largo e estalou

os dedos.

— Rápido assim. Você não acha quevou deixar um homem maravilhosocomo você escapar, acha? Não possodeixar você ir embora, Jack. — Elajogou os braços nos ombros dele eespalhou beijos alegres e ávidos emtodo seu rosto.

Jack envolveu a cintura de Lacey comos braços e a levantou do chão. O beijofoi lento, delicado e perfeito. Quandoterminaram, Lacey estava com as pernasbambas e sem fôlego.

— Nunca deixarei você ir embora,Jack Walker.

— Agora sim! — ele disse com um

toque de arrogância e mais uma vez apuxou para si.

Era exatamente onde ela queria estar.Perto do coração de Jack o tempo todo.

Petiscos CaseirosPara Seu Gato[6]

Os pet shops estão cheios deguloseimas para gatos. Masvocê sabia que pode prepararalguns petiscos saudáveis emcasa? Eis algumas receitasque conquistarão o coração deseus gatinhos.

PETISCOS DE QUEIJO

¾ de xícara (chá) de farinha de trigo

¾ de xícara (chá) de queijo cheddarem pedaços

5 colheres (sopa) de queijo parmesãoralado

¼ de xícara (chá) de iogurte integralou coalhada

¼ de xícara (chá) de fubá

Preaqueça o forno a 180 °C. Mistureos queijos com o iogurte. Adicione afarinha e o fubá. Se for necessário,acrescente um pouco de água paradeixar a massa mais uniforme. Faça umabola com a massa. Abra a massa,deixando-a com uma espessura de

aproximadamente 0,5 cm. Corte-a empedaços de cerca de 2,5 cm e coloque-os em uma assadeira untada commanteiga e farinha de trigo. Asse por 25minutos. Rende 24 unidades.

BISCOITOS DE FRANGO

1½ xícara (chá) de frango cozido edesfiado

½ xícara (chá) de caldo de galinha

1 xícara (chá) de farinha de trigointegral

1/3 de xícara (chá) de fubá

1 colher (sopa) de margarina

Preaqueça o forno a 180 °C. Junte ofrango, o caldo e a margarina e misture-os bem. Adicione a farinha e o fubá.Faça uma bola com a massa. Abra amassa, deixando-a com uma espessurade aproximadamente 0,5 cm. Corte-a empedaços de 2,5 cm e coloque-os em umaassadeira sem untá-la. Asse a 180 °Cpor 20 minutos. Rende 18 biscoitos.

PEDAÇOS DE FÍGADOCROCANTES

½ xícara (chá) de fígado de frangocozido

¼ de xícara (chá) de água

1¼ xícara (chá) de farinha de trigointegral

¼ de xícara (chá) de cenouras cozidase amassadas

1 colher (sopa) de margarina mole

Preaqueça o forno a 160 °C. Coloqueos pedaços de fígado bem passado emum liquidificador com ¼ de xícara deágua. Em uma tigela, junte a farinha e amargarina. Adicione a mistura feita como fígado mais as cenouras e faça umabola com a massa. Abra a massa,deixando-a com uma espessura deaproximadamente 0,5 cm. Corte-a empedaços de aproximadamente 2,5 cm ecoloque-os em uma assadeira untada

com manteiga e farinha de trigo. Asse a160 °C por 10 minutos. Rende 12biscoitos.

PETISCOS DE ATUM

1 lata de 170 g de atum

¼ de xícara (chá) da água tirada doatum

3 colheres (sopa) de clara de ovocozida e picada

¼ de xícara (chá) de fubá

½ xícara (chá) de farinha de trigointegral

Preaqueça o forno a 180 °C. Junte oatum, a clara de ovo e a água. Adicioneo fubá e a farinha e misture tudo atéformar uma massa. Abra a massa,deixando-a com uma espessura deaproximadamente 0,5 cm. Corte-a empedaços de aproximadamente 2,5 cm.Asse a 180 °C por 20 minutos. Rende 12biscoitos.

Notas[1] Oliver Twist é umpersonagem de Charles Dickens,costuma-se dizer que alguém éum Oliver Twist quando essapessoa nunca está satisfeita esempre quer mais (N. T.).

[2] Região onde há uma grandepopulação de chineses. Nestecaso, a Chinatown de SãoFrancisco (N. T.).

[3] Massa recheada com carneou legumes, que pode ser fritaou cozida (N. T.).

[4] Frango empanado e frito compimentões, cebola, chili egengibre (N. T.).

[5] Fischerman’s Wharf é umaantiga região de pescadores deSão Francisco conhecida porsuas atrações turísticas e pelosrestaurantes especializados emfrutos do mar (N. T.).

[6] Estas receitas são umacortesia do site PetPlace.com(www.petplace.com), fonte on-line de notícias, saúde e bem-estar para seu animal.

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N

Capítulo 1

a noite passada eu sonhei comPaul.

Ele nunca está longe dos meuspensamentos — não se passa um dia emque ele não esteja comigo —, mas Paulnão havia participado dos meus sonhosaté agora. É irônico, imagino, que eletenha me deixado, porque antes defechar os olhos eu fantasio sobre asensação de ter seus braços à minha

volta. Enquanto pego no sono, finjo queminha cabeça está descansando em seuombro. Infelizmente, nunca mais terei aoportunidade de estar outra vez com meumarido, pelo menos não nesta vida.

Até a noite passada, se eu sonhavacom Paul, os sonhos estavam há muitoesquecidos na hora em que eu acordava.Este sonho, contudo, ficou comigo,permanecendo em minha memória e mepreenchendo com partes iguais detristeza e alegria.

Quando soube que Paul fora morto, ador me consumiu por inteira, e eu nãopensei que fosse capaz de seguir comminha vida. Mas esta continua seucaminho, e eu tive que fazer o mesmo,

arrastando-me de um dia para outro atédescobrir que podia respirarnormalmente.

Estou em meu novo lar, agora, apousada que comprei há menos de ummês na Península Kitsap, em umaaconchegante cidade litorânea chamadaCedar Cove. Decidi batizá-la dePousada Rose Harbor. “Rose” vem dePaul Rose, meu marido por menos de umano; o homem que sempre vou amar epor quem vou chorar pelo resto deminha vida. “Harbor” (porto), porqueeste é o lugar em que joguei minhaâncora no momento em que a tempestadeda perda me abateu.

Isso parece tão melodramático, mas

não há outro jeito de dizê-lo. Embora euesteja viva, funcionando normalmente,às vezes me sinto meio morta. Paulodiaria me ouvir dizer isso, mas éverdade. Eu morri com Paul, abrilpassado, em uma encosta de montanhanum país a meio mundo de distância,enquanto ele lutava pela segurança denossa nação.

A vida que eu conhecia acabou notempo de uma batida de coração. Ofuturo com o qual eu sonhava foiroubado de mim.

Os conselhos dados a quem está deluto diziam que eu devia esperar um anoantes de tomar grandes decisões. Minhasamigas me disseram que eu me

arrependeria de largar o emprego, sairde minha casa em Seattle e me mudarpara uma cidade estranha.

O que elas não compreendiam era queeu não encontrava conforto nafamiliaridade, nem alegria na rotina.Mas como respeito a opinião delas, eume dei seis meses. Nesse tempo nada meajudou, nada mudou. Mais e mais eusenti a necessidade de ir embora, decomeçar uma vida nova, certa de quesomente assim encontraria paz, e a dorhorrenda dentro de mim diminuiria.

Comecei minha busca por uma vidanova na internet, procurando em váriasregiões dos Estados Unidos. A surpresafoi encontrar exatamente o que eu

procurava no meu próprio quintal.

A cidade de Cedar Cove fica do outrolado do Estreito de Puget, oposta aSeattle, e é uma cidade da Marinha,situada bem em frente ao estaleiro deBremerton. No minuto em que encontreiessa charmosa pousada à venda, meucoração começou a bater em ritmoacelerado. Eu, proprietária de umapousada? Não pensara em assumir umnegócio, mas instintivamente sabia queprecisaria de algo para preencher meutempo. Como benefício adicional,sempre gostei de receber hóspedes.

Com varanda à volta toda e a incrívelvista da enseada, a casa eraarrebatadora. Em outra vida eu

conseguiria me imaginar sentada navaranda com Paul, após o jantar,tomando café quente e conversandosobre nosso dia e nossos planos. Comcerteza a fotografia colocada na internetfora tirada por um profissional quesoubera mascarar seus defeitos. Nada,aparentemente, poderia ser tão perfeito.

Ou poderia. No momento em queencostei o carro, acompanhada pelacorretora, fui envolvida pelo encanto dapousada. Ah, sim, com a brilhanteiluminação natural e as grandes janelascom vista para a enseada, aquelapousada já tinha cara de lar. Era o lugarperfeito para começar minha vida nova.

Embora eu deixasse Jody McNeal, a

corretora, me mostrar o imóvel, nãorestava uma única dúvida na minhacabeça. Era meu destino ser aproprietária daquela pousada; era comose ela tivesse ficado todos aquelesmeses no mercado esperando por mim.Tinha oito quartos espalhados pelosdois pisos superiores, e no térreo haviauma cozinha, grande e moderna, ao ladode uma espaçosa sala de jantar.Originalmente construída no início doséculo 19, a casa se debruçava sobre umdeslumbrante panorama marinho. CedarCove ficava abaixo, disposta ao longoda Rua do Porto, que serpenteava pelacidade com lojinhas dos dois lados darua. Eu me senti atraída pela cidadeantes mesmo de poder explorá-la.

O que mais me chamou a atenção napousada foi a sensação de paz queexperimentei assim que entrei nela. Opeso no coração, que era meucompanheiro constante, pareceu ficarmais leve. A dor que eu carregava hámeses comigo diminuiu. Naquele lugarveio serenidade, uma paz difícil dedescrever.

Infelizmente, o contentamento nãodurou muito; meus olhos se encheram delágrimas, deixando-me constrangida,quando terminamos a visita. Paultambém teria amado aquela pousada.Mas eu a administraria sozinha. Acorretora teve a delicadeza de fingir quenão reparara nas emoções que eu lutava

para disfarçar.

— Bem, o que você acha? —perguntou Jody, ansiosa, enquantosaíamos pela porta da frente.

Eu não dissera palavra algumadurante toda a visita, nem fizera umapergunta sequer.

— Eu fico com ela.

Jody se inclinou na minha direção,como se não tivesse escutado direito.

— Desculpe?

— Eu gostaria de apresentar umaproposta. — Eu não hesitei. Àquelaaltura não tinha dúvida. O preço pedidoera mais do que justo e eu estava pronta

para seguir adiante.

Jody quase deixou cair a pasta repletade informações detalhadas sobre apropriedade.

— Não é bom você pensar melhor?— sugeriu ela. — Essa é uma decisãoimportante, Jo Marie. Não me entendamal; eu quero muito fazer esta venda; sóque nunca vi alguém tomar uma decisãotão importante de forma tão... rápida.

— Vou pensar até amanhã, se vocêdeseja, mas não preciso. Eu soube queeste é o lugar assim que o vi.

No momento em que minha famíliaouviu que eu pretendia deixar meuemprego no Columbia Bank e comprar a

pousada, todos tentaram me dissuadir,principalmente meu irmão Todd, oengenheiro. Eu tinha conquistado ocargo de gerente-assistente na agênciaDenny Way, e ele receava que euestivesse jogando fora uma carreirapromissora. Todd sabia que eu acabariame tornando gerente. Eu dedicara quasequinze anos ao banco, sempre fora umaboa funcionária e meu futuro nainstituição parecia brilhante.

O que as pessoas ao meu redoraparentavam não compreender era que avida que eu conhecia, do jeito que eu aqueria e como a sonhava, tinha acabado.A única forma de eu me realizar eraencontrar uma nova vida.

Assinei a proposta pela pousada nodia seguinte e minha determinação nãofraquejou nem por um instante. OsFrelinger, proprietários do lugar,aceitaram de bom grado minha proposta,e em questão de semanas — pouco antesdos feriados — estávamos reunidos nocartório para assinar toda a aborrecida,mas necessária, papelada. Eu lhesentreguei um cheque visado e peguei aschaves da pousada. Os Frelinger nãotinham aceitado reservas para as últimassemanas de dezembro, pois pretendiampassar esse período com os filhos.

Saindo do cartório, fiz um pequenodesvio para passar na Junta Comercial,onde solicitei a mudança de nome da

pousada. Batizei-a de Pousada RoseHarbor.

Voltei para Seattle no dia seguinte eentreguei minha carta de demissão aoColumbia Bank. Passei o feriado deNatal empacotando meu apartamento deSeattle e preparando-me para a mudançaatravés do Estreito de Puget. Emboraestivesse me afastando uns poucosquilômetros, era o mesmo que ir para ooutro lado do país. Cedar Cove era ummundo totalmente diferente — umacidade pitoresca na Península Kitsap,distante da vida agitada da cidadegrande.

Percebi que meus pais ficaramdecepcionados porque não passei todo o

feriado com eles no Havaí, uma tradiçãode nossa família. Mas eu tinha tanto oque fazer para me aprontar para amudança, incluindo organizar minhascoisas e de Paul, empacotar tudo evender minha mobília. Precisava memanter ocupada — o que me ajudaria amanter a cabeça sem pensar no primeiroNatal sem Paul.

Mudei-me oficialmente para a novacasa na segunda-feira seguinte ao Ano-Novo. Felizmente os Frelinger mevenderam a pousada como umatransferência de proprietários. Assim,tudo de que eu precisava eram algumascadeiras, uma luminária que pertenceraa minha avó e coisas pessoais.

Desencaixotar a mudança não demoroumuito. Escolhi como meu quarto a suítedo andar principal — que os Frelingerusavam como seu espaço pessoal. Asuíte tinha uma lareira e um recanto comjanela para a enseada. O aposento eragrande o suficiente para acomodar amobília de um dormitório e um sofápróximo à lareira. Gostei principalmentedo papel de parede, coberto dehortênsias brancas e lilases.

Quando a noite desceu sobre apousada, eu estava exausta. Às oito danoite, enquanto a chuva batia contra asjanelas e o vento assobiava por entre assempre-vivas que cobriam um lado dapropriedade, fui para meu quarto no

andar principal. O clima tempestuosotornou ainda mais aconchegante o fogotrêmulo na lareira. Não senti nenhumaestranheza por estar me acomodando emum lugar novo. Senti-me bem-vindanaquela casa desde o momento em queentrei pela porta da frente.

Os lençóis estavam limpos eesticados quando me deitei. Não melembro de pegar no sono, mas o quelogo vem à mente é aquele sonho comPaul, tão vívido e real.

Na terapia do luto aprendi que ossonhos são importantes no processo decura. O orientador descreveu dois tiposdiferentes de sonhos. O primeiro eprovavelmente mais comum é de sonhos

com nossos amados — memórias queganham vida.

O segundo tipo é o dos sonhos devisitação, quando o ente querido cruza aseparação entre vida e morte paravisitar quem deixou para trás.Aprendemos que esses são, geralmente,sonhos reconfortantes: o falecido vemmostrar aos vivos que está feliz e empaz.

Fazia oito meses que eu recebera anotícia de que Paul morrera em umaqueda de helicóptero em Hindu Kush, acadeia de montanha que se estende entreo centro do Afeganistão e o norte doPaquistão. O helicóptero do exércitofora abatido pela Al-Qaeda ou por um

de seus aliados do Talibã; Paul e cincodos seus camaradas dos Rangersaerotransportados morreraminstantaneamente. Por causa do local daqueda, foi impossível recuperar seuscorpos. A notícia da morte dele já eramuito difícil, mas ser impossibilitada deenterrar seu corpo foi ainda mais cruel.

Durante dias após eu receber a notíciamantive no coração a esperança de quePaul tivesse, na verdade, sobrevivido.Eu estava convencida de que, de algumaforma, meu marido encontraria um modode voltar para mim. Isso era impossível.Fotografias aéreas do local da quedalogo confirmaram que ninguémsobrevivera. No final, tudo que

realmente importava era que o homemque eu amava e com quem tinha mecasado se fora. Ele nunca mais voltariapara mim, e com o passar das semanas edos meses eu vim a aceitar a notícia.

Demorei muito para me apaixonar. Amaioria das minhas amigas se casou nafaixa dos vinte anos, e com trinta epoucos já tinham começado suasfamílias. Eu fui madrinha seis vezes.

Do meu lado, permaneci solteira atémeus trinta e tantos anos. Eu tinha umavida ocupada e feliz, envolvida tantopela carreira quanto pela família. Nuncasenti a necessidade de me casarapressadamente ou de ouvir minha mãe,que insistia para que eu encontrasse um

homem bom e deixasse de ser tãoseletiva. Namorei bastante, mas nuncahouve alguém que eu sentisse quepoderia amar pelo resto de minha vida,até que encontrei Paul Rose.

Como eu demorara trinta e sete anospara encontrar minha metade, nãoimaginava que o amor pudesse meencontrar duas vezes. Francamente, eunem sabia se queria me apaixonarnovamente. Paul Rose era tudo que euesperava encontrar em um marido... emuito mais.

Nós nos conhecemos em um jogo defutebol do Seahawks. O banco me deraingressos e eu levara comigo um dosnossos melhores clientes e sua esposa.

Enquanto nos acomodávamos em nossoslugares, reparei em dois homens comcorte de cabelo militar sentados ao meulado. Durante o jogo, Paul apresentou-see também seu amigo de exército, e puxouconversa. Ele me disse que estavaestacionado em Fort Lewis. Como eu,gostava de futebol. Meus pais eramtorcedores entusiasmados do Seahawks,e eu crescera em Spokane assistindo aosjogos na televisão após ir à igreja aosdomingos com eles e meu irmão maisnovo, Todd.

Paul me convidou para tomar cervejaenquanto saíamos do jogo naquela tarde,e nos vimos praticamente todos os diasdepois disso. Descobrimos que

compartilhávamos muito mais do que oamor pelo futebol: tínhamos as mesmasinclinações políticas, líamos muitos dosmesmos escritores e adorávamoscomida italiana. Também tínhamos emcomum o vício em Sudoku. Nóspodíamos conversar durante horas, algoque fazíamos com frequência. Doismeses após nos conhecermos ele foienviado para a Alemanha, mas aseparação não conseguiu deter odesenvolvimento da nossa relação. Nãose passava um dia em que nãomantínhamos contato de um jeito ou deoutro — e-mail, sms, Skype, Twitter etodos os meios de que dispúnhamos paranos falar e ver. Sim, nós até mesmoescrevíamos cartas de verdade, com

papel e caneta. Eu ouvira pessoasafirmarem que sentiram “amor àprimeira vista”, do que zombei. Não seise posso dizer que foi isso queaconteceu com Paul e eu, mas foi algoparecido. Uma semana após tê-loconhecido eu já sabia que ele era ohomem com quem me casaria. Paul disseque sentiu o mesmo a meu respeito,embora afirmasse que bastou umencontro.

Preciso admitir isto: o amor memudou. Eu estava mais feliz do que emqualquer outro momento de queconseguia me lembrar. E todos notaram.

No Dia de Ação de Graças, há umano, Paul pegou um avião para Seattle e

me pediu para ser sua esposa. Ele atémesmo conversou com meus pais antes.Estávamos loucamente apaixonados. Eutinha esperado muito tempo, e quandolhe entreguei meu coração foi parasempre.

Logo depois de nosso casamento, emjaneiro, Paul recebeu ordens de ir para oAfeganistão. O helicóptero foi abatidoem 27 de abril e meu mundo desabou.

Eu nunca sentira esse tipo de dor ereceio ter lidado mal com a situação.Meus pais e irmão ficaram preocupadoscomigo. Foi minha mãe que sugeriu aterapia do luto. Como eu estavadesesperada para encontrar uma formade amenizar minha dor, concordei. No

fim, gostei de ter participado dassessões. Elas me ajudaram a entendermeus sonhos, principalmente o que tivena primeira noite na pousada.

Ao contrário do que me disseramsobre os sonhos de visitação, Paul nadafez para me garantir que estava em paz.Ao contrário, ele apareceu diante demim com todo o seu equipamentomilitar. Estava envolto por uma luz tãobrilhante que era difícil olhar para ele.Mesmo assim, não consegui desviar oolhar.

Eu quis correr até ele, mas tive medode que, se me mexesse, eledesapareceria. Eu não aguentaria perdê-lo novamente, mesmo que fosse apenas

uma aparição.

Ele não falou logo. Nem eu, insegurasobre o que podia ou devia falar.Lembro que a emoção encheu meusolhos de lágrimas e cobri minha bocacom medo de chorar alto.

Então ele se aproximou e me pegouem seus braços, estreitando-me epassando a mão pela minha nuca, parame confortar. Eu me agarrei a ele, paraque não fosse embora. Ele sussurrou erepetiu palavras delicadas de amor.

Quando o nó na minha gargantadiminuiu, ergui a cabeça e nossosolhares se encontraram. Senti como seele estivesse vivo e nós precisássemos

pôr o assunto em dia após uma longaausência. Havia tanto que eu queria lhecontar, tanto que eu queria que eleexplicasse. O fato de ele ter uma apólicede seguro tão valiosa foi um choque.Primeiro eu me senti culpada por aceitaruma quantia tão grande de dinheiro. Essedinheiro não deveria ir para a famíliadele? Mas sua mãe tinha morrido e o paise casara novamente e mudara para aAustrália. Eles nunca foram muitopróximos. O advogado me disse quePaul fora claro em suas orientações.

No meu sonho eu queria dizer a Paulque usara o dinheiro para comprar apousada e que a batizara com seu nome.Uma das primeiras melhorias que eu

queria fazer era um jardim com roseiras,um banco e um caramanchão. Mas nosonho eu não disse nada disso, porqueparecia que ele já sabia.

Ele afastou o cabelo da minha testa,onde me beijou suavemente.

“Você fez uma boa escolha”,sussurrou ele, os olhos calorosos deamor. “Com o tempo você reencontraráalegria.”

Alegria? Eu quis discutir com ele.Aquilo não parecia provável, nemmesmo possível. Uma pessoa não secura daquele tipo de dor. Eu me lembrode como meus familiares e amigos seesforçavam para encontrar as palavras

certas para me confortar. Mas nãoexistem palavras... simplesmente nãoexistem.

Ainda assim, não discuti com ele. Euqueria que o sonho durasse e temia quese o questionasse ele sumiria, e euqueria que Paul ficasse comigo. Umasensação de paz me envolvia, e meucoração, que carregava um peso imenso,pareceu um pouco mais leve.

“Não sei se consigo viver sem você”,disse eu, o que era verdade.

“Você consegue e viverá. Naverdade, sua vida será longa e plena”,insistiu Paul. Ele parecia o oficial quefora em vida, dando ordens que não

deviam ser questionadas.

“Você sentirá alegria novamente”,repetiu ele, “e boa parte dela virá daPousada Rose Harbor.”

Franzi a testa. Sabia que estavasonhando, mas o sonho era tão vívidoque eu queria acreditar que aquiloestava realmente acontecendo.

“Mas...” Minha cabeça estava cheiade perguntas.

“A pousada é meu presente paravocê”, continuou Paul. “Não duvide,meu amor. Deus irá lhe mostrar.” Emseguida ele desapareceu.

Eu chorei alto, implorando para ele

voltar, e meu próprio choro me acordou.Minhas lágrimas eram reais; eu sentia aumidade no rosto e na fronha.

continua...