Post on 31-Jul-2020
1
O “EMPODERAMENTO” DOS GOVERNOS LOCAIS E A CONSTITUIÇÃO DAS SECRETARIAS MUNICIPAIS DE
RELAÇÕES INTERNACIONAIS (SMRI): UM MAPEAMENTO DA REGIÃO SUDESTE DO BRASIL
Giovana Scotini Moreno1 Gabriel Norde Santos2
RESUMO: Esta pesquisa é um recorte do projeto desenvolvido pela Prof.ª Dr.ª Regina Laisner, desde 2011, intitulado “O ‘Empoderamento’ dos Governos Locais e a Constituição das Secretarias Municipais de Relações Internacionais: Um Mapeamento no Brasil”. Tal trabalho se propõe a analisar a atuação das Secretarias Municipais de Relações Internacionais (SMRIs) e órgãos semelhantes no campo internacional. A pesquisa ora apresentada e ainda em desenvolvimento vincula-se a um debate acerca do rearranjo, no pós Guerra Fria, dos atores subnacionais atuantes nas políticas públicas regionais, considerando a intensificação da atuação global municipal. Na investigação desta atuação busca-se avaliar se esse meio privilegia o empoderamento político, nos termos de John Friedman, da população tangida pelas políticas públicas e se estas são maximizadas a partir destas iniciativas. O objetivo geral desta pesquisa é realizar um mapeamento e uma análise das Secretarias Municipais de Relações Internacionais da região sudeste do Brasil, considerando as políticas públicas locais implementadas. PALAVRAS-CHAVE: paradiplomacia, secretarias de relações internacionais, políticas públicas, empoderamento, relações internacionais. Parte-se do contexto de realocação dos órgãos públicos ativos nas relações
internacionais no Brasil, e logo explicita-se de imediato a carência de notas oficiais e
produções empíricas que abordem a temática, sobretudo que contenham como objeto
de estudo os órgãos municipais de relações internacionais. Posto este quadro, emerge
o trabalho aqui apresentado cuja proposta contempla a compreensão da formação
desses órgãos e do impacto de suas respectivas atuações.
Este trabalho se manifesta como um recorte de uma pesquisa desenvolvida
desde 2011 pela Prof.ª Dr.ª Regina Laisner e intitulada “O ‘Empoderamento’ dos
Governos Locais e a Constituição das Secretarias Municipais de Relações
Internacionais: Um Mapeamento no Brasil” que se propõe a analisar a atuação das
Secretarias Municipais de Relações Internacionais (SMRI) e órgãos semelhantes
1 Graduanda de Relações Internacionais pela UNESP, giscotini@hotmail.com. 2 Graduando de Relações Internacionais pela UNESP, gabrielnorde@gmail.com.
2
atuantes no campo internacional. Ao longo do trabalho, estes órgãos foram
selecionados pela sua contribuição para a descentralização do poder político brasileiro
desde 2009 até o ano de 2012, não incluindo, portanto, dados e informações cedidas
por gestores que tenham assumido a partir de janeiro de 2013. Em suma, visa-se a
partir da reflexão teórico-metodológica, da coleta de dados e dos resultados sobre o
surgimento e a atuação das SMRI elaborar uma análise empírica consistente e com
alicerces críticos acerca da criação e da gestão selecionada das secretarias
mapeadas.
John Friedman (1992) em Empowerment – The Politics of Alternative
Development, articula suas análises conceituais sobre o empoderamento, ressaltando
a capacidade decisória dos governos locais e sua participação direta na democracia e
circulação de capital. O “empoderamento” de uma comunidade seria um meio para
buscar um desenvolvimento alternativo diferente do que privilegia os grandes centros
urbanos e marginaliza as regiões periféricas. Esse meio privilegia as condições de
vida da população, da subsistência familiar e do espaço de desenvolvimento da
sociedade civil sem perspectivas restritivas. Friedman discorre também sobre
conhecer a essência do desenvolvimento genuíno como um construto social. “(…)
centralized states tend to be unresponsive to local needs.” (FRIEDMAN, 1992, p. 79).
“Trata-se do método de aumentar a capacidade de indivíduos ou grupos para tomar decisões e transformar aquelas escolhas em ações ou consequências desejadas (...) As pessoas investidas de poder têm liberdade de escolha e ação, o que lhes permite influenciar melhor o curso de suas vidas e as decisões que as afetam.” (LOPES, 2005, p. 178.)
Após a Guerra Fria a logística político-social e econômica foi explicitamente
modificada pelo rearranjo dos canais de comunicação e manutenção das interações
em instâncias nacionais, internacionais e subnacionais. Esse rearranjo promoveu a
intensificação da atuação global municipal. Todavia a inserção internacional desses
atores que agem paralelamente ao governo central não foi concomitante ao
desenvolvimento de estudos e levantamentos referentes a essas competências
subnacionais.
Portanto, tem-se esse trabalho como ampliação da composição do material
disponível referente à paradiplomacia e “empoderamento”. Considera-se ainda, este
material como reconhecimento e estímulo à continuação de tal alternativa dentro das
políticas públicas e auxílio ao trabalho de entidades como FONARI (Fórum Nacional
dos Gestores de Relações Internacionais) e a CNM (Confederação Nacional dos
Municípios) e gestores municipais.
3
Baseando-se em Cooperação e desenvolvimento humano: a agenda
emergente para o novo milênio de Carlos Lopes, entende a globalização como um
processo multidimensional de identificação das relações entre a sociedade que
carrega consigo uma crise de valores. Em suma, ressalta-se a interação demográfica
juntamente com a evolução do conceito de desenvolvimento, e, por conseguinte, os
atores responsáveis por este processo. Meio a estes câmbios, o conhecimento deve
ser visto como uma dimensão criativa em atividade. Infelizmente, a comunidade
internacional é marcada por órgãos deliberativos com poderes desiguais, contudo a
dinâmica da globalização reformula o fluxo de informações e a efetividade destes
meios. A internet cria uma “nova arquitetura social mundial, mas também uma nova
ética, tal como uma cibercultura” (LOPES, 2005, p. 32).
Uma nova agenda de desenvolvimento emergente foi elaborada pautada na
transformação da sociedade, de forma a considerar toda a complexidade da realidade
social e política que atinge a cada meio. Outrora, havia uma agenda primária que
considerava o desenvolvimento somente com caráter técnico, o que impedia a
identificação de barreiras, e, consequentemente, impedia refazer o planejamento sócio
político de acordo com as dificuldades locais. E seguindo essa matriz internacional,
ainda é deficiente a clareza nos debates sobre desenvolvimento e conceituação de
cooperação técnica. “O Estado não pode mais ser o único interlocutor para as
iniciativas de desenvolvimento, mas a falta de reconhecimento do seu papel cria
tensão, confusão e crise de liderança.” (LOPES, 2005, p. 122).
Dessa maneira, a investigação da atuação das SMRIs busca avaliar, nos
termos de John Friedman, o empoderamento político da população. É de grande
relevância entender como as políticas públicas podem maximizar o empoderamento e
qual é a influências das SMRIs localizadas na região sudeste do Brasil contemplando
somente a gestão 2009-2012. Para conseguir atingir os objetivos propostos foi
necessário entrar em contato com os órgãos de Relações Internacionais e, para isso,
foi desenvolvido um questionário para destrinchar suas características e em alguns
casos houve a entrevista direta com os gestores e participantes. Em muitas situações
o contato não foi possível, pela indisponibilidade do gestor, pelo fim da secretaria e até
pela falta de conhecimento de outros servidores do próprio município sobre a
existência da SMRI.
No que tange a metodologia utilizada, na primeira parte pode-se salientar a
aplicação dos questionários. Estes questionários enviados contavam com quatro
partes e seus subitens, cada parte destinava-se a aprofundar o conhecimento dentro
dos objetivos propostos. Primeiramente: o histórico da criação do órgão, partidos
envolvidos, elementos fundamentais e organização do órgão. Inicialmente, intenção
4
dessas perguntas é identificar o ambiente mais propício para a criação de uma
secretaria e saber qual o partido que possui ideários que se assemelham a ação
descentralizada de entes subnacionais. E por fim, visa-se identificar como a SMRI se
enquadra dentro da prefeitura e qual é seu nível de autonomia e/ou subordinação ao
gabinete do prefeito.
No segundo ponto são feitas perguntas sobre o quadro de funcionários:
número de funcionários, se são concursados - caso não sejam como é feita a seleção
-, a formação exigida, a existência de capacitação e qual é a infraestrutura que abriga
as ações dos membros da secretaria. Busca-se compreender ainda a influência do
conhecimento sobre a área de Relações Internacionais: se o conhecimento específico
é realmente necessário, e caso seja, qual o nível de influência deste sobre o
aproveitamento do trabalho. Reiteira-se aqui a necessidade de identificar como a
comunicação entre as cidades acontece e a influência do fluxo de informações para o
desenvolvimento local. E em outra instância, almeja-se saber se os funcionários
percebem a importância do órgão: para isso, no questionário é feita uma única
pergunta de opinião pessoal para os gestores sobre a função da Secretaria e a opinião
sobre quais caminhos secretaria poderia e deve tomar3.
A próxima sequência de perguntas é sobre a atuação em si: áreas prioritárias,
atividades realizadas, origem da verba, captação de recursos, projetos desenvolvidos,
o nível e modo de divulgação do trabalho, opinião da população sobre os projetos,
existência de canais comunicação para atender a demanda da população, relação
com a Prefeitura e vereadores, e se há comunicação com outros órgãos
internacionais. Nota-se que devido a contemporaneidade da ação das cidades no
ambiente internacional não se sabe com profundidade as possibilidades que este novo
campo porta. Portanto, meio a esta nova temática explicita-se alguns questionamentos
mesmo no âmbito acadêmico: de que tipo de verba parte as políticas públicas no ramo
da cooperação; se a intenção é captar recursos ou participar de encontros
internacionais, produção de acordos e tradução; e ainda questionamentos derivados
destas perguntas. E desse modo, como objetivo central deste artigo, procura-se
identificar se o empoderamento da sociedade acontece e com que frequência; e se
este é de fato o interesse das gestões selecionadas.
Ao versar sobre os principais resultados obtidos até o presente momento,
deve-se destacar que por um lado, devido aos recessos municipais no final de 2013
3 Como será explicitado nos resultados, a maioria dos gestores enxergam inúmeras possibilidades de atuação para suas secretarias, mas não conseguem atingi-las por inúmeros motivos como a falta de tempo entre uma gestão e outra, de funcionários, de verba e de conhecimento da própria sociedade que não traz suas demandas por não conhecerem essa possibilidade.
5
até início de 2014 e consequentemente estagnação temporária do desenvolvimento de
projetos e movimentação de verbas, houve limitada disponibilidade dos gestores e
tempo hábil para coleta de novos resultados. Por outro lado, obteve-se novos
resultados.
Quadro 1: Quadro comparativo dos órgãos identificados
Fonte: relatório de pesquisa de Lucas P. M. Saifi, ex-bolsista PIBIC/CNPq.
Primeiramente, foi possível a análise do município de Santos, visto que a
Marcela Garcia Fonseca, atual Coordenadora de Pesquisa da Assessoria Especial
para Assuntos Internacionais do Governo do Estado de São Paulo e ex-Assessora
Técnica de Relações Internacionais (2005-2008) e Assessora de Relações
Internacionais da Secretaria de Assuntos Portuários e Marítimos (2008-2009) de
Santos se apresentou solícita e respondeu ao nosso questionário. Segundo as
informações passadas por ela, a formação do órgão se deu com muita persistência e
persuasão da equipe de Relações Internacionais diretamente para com o chefe do
Executivo. A existência do Porto foi o elemento decisivo para a criação da Assessoria,
pois esta despertou sensibilidade perante à necessidade de se internacionalizar uma
cidade vista como naturalmente internacional. Assim, inicialmente, os objetivos
anunciados foram tanto a atração de investimentos quanto a busca por cidades-irmãs.
6
A composição de tal órgão é restrita a dois profissionais, nenhum concursado e
requisito básico restrito a fluência em idioma estrangeiro e formação superior. Em
relação a capacitação dos funcionários, refuta-se a existência de qualquer que seja. A
infraestrutura é declarada precária, como de praxe em grande parte das prefeituras.
São colocadas por Marcela como áreas prioritárias para a SMRI, o fomento ao turismo
histórico na cidade, atividades de tradução, versão e interpretação, protocolo
internacional, correspondência internacional, além da atenção à demanda proveniente
das secretarias. O questionário enviado a Marcela interroga sobre as atividades
realizadas pela Assessoria, e por conseguinte, ela nos permitiu acesso à parte do
Relatório de Atividade de 2007 cujo aporta o seguinte conteúdo:
“Art. 39. Compete à Assessoria de Relações Internacionais: I – desenvolver o intercâmbio permanente de políticas públicas e acordos de cooperação técnica com órgãos, entidades e cidades no exterior, focados no desenvolvimento econômico e na inclusão social; II – apoiar a elaboração e encaminhar projetos que envolvam a participação internacional; III – captar, estimular e induzir investimentos de empresas estrangeiras no Município; IV – ampliar a parceria com outras cidades do exterior, atuando em conjunto com secretarias e empresas municipais; V – executar outras tarefas correlatas, a critério do Secretário – Chefe de Gabinete do Prefeito Municipal.”
A Assessoria apresentava outro agravante comum: não havia orçamento
próprio, dependia da verba do gabinete do prefeito e tampouco captava ou capta verba
para manutenção, obras e/ou investimentos. Desse modo, a relação de projetos já
executados é restrita ao fomento à cooperação bilateral, cidades-irmãs e parcerias
com instituições de ensino. Paralelo aos projetos apresentava-se uma página
eletrônica (indisponível atualmente) para divulgação das atividades e participação em
eventos. Por fim, é possível declarar que a assessora se manifestou consciente em
relação a relevância desses órgãos para a internacionalização dos entes subnacionais
e da necessidade de profissionais capacitados dentro destes.
Em suma, conclui-se criticamente que a Assessoria de Santos se manifesta
como um órgão sem autonomia e más condições de estrutura. Como problemas
agravantes emerge a falta de membros qualificados para a equipe e dificuldades de
orçamento. Quanto a atuação, demonstra-se muito burocrática e de assistência; pouca
iniciativa em projetos e falta participação em redes.
Na sequência, prontifica-se a análise de Vitória, já que o assessor de Relações
Internacionais Luiz Sérgio Moreira Henriques Filho foi proativo em responder o
questionário e começa relatando que o papel inicial da assessoria, em 1998, se
7
restringia ao suporte ao gabinete do prefeito em assuntos internacionais. Logo, o fator
fomentador da criação do órgão na época foi o próprio perfil da cidade: forte comércio
exterior e recepção constante de delegações estrangeiras. Posteriormente, em 2005, a
assessoria passa por uma reestruturação. Entretanto, esta continua vinculada ao
gabinete e apresenta com um dos objetivos fornecer suporte a este, além de fornecer
também a todas outras secretarias, elaborar a prospecção de projetos e parcerias com
entes subnacionais. Ademais, elenca-se como áreas prioritárias a cooperação
multinível e projetos de cooperação bilateral. Infelizmente, a assessoria não possuía
recurso próprios, assim dependia da verba vinda do gabinete. Em relação a estrutura
do órgão, conta-se com cinco funcionários, sendo um concursado. Como exigência
mínima na formação dos funcionais declara-se somente o domínio de duas línguas
estrangeiras. E em relação a formação acadêmica do assessor, Luiz é graduado em
Relações Internacionais e Direito. Declara-se haver capacitação dos funcionários
mesmo que pouco frequente.
As atividades realizadas se restringem a uma parceria com a cidade francesa
de Dunkerque para reabilitação do centro histórico de Vitória, outro projeto de
cooperação técnica com Xai-Xai de Moçambique e um projeto econômico sobre o qual
não discorre-se o suficiente para que se possa analisar sua profundidade. Para
ponderar a pró atividade da Assessoria em suas relações públicas nota-se que por um
lado, a divulgação mais um vez limita-se ao site do município, relatórios e
esporadicamente ao Portal Federativo do Governo Federal e não existe nem coleta de
feedback da população sobre o órgão nem promulgação de um canal que propicie
envio de sugestões e avaliações. Por outro lado, Vitória é membro do FONARI (Fórum
Nacional de Secretários e Gestores Municipais de Relações Internacionais) e já
presidiu a FNP (Frente Nacional de Prefeitos).
Desse modo, a partir do questionário a aludida assessoria se apresenta sem
autonomia, sem orçamento próprio e sem estrutura própria; equipe com qualificação
média; atuação focada em projetos de cooperação; participação ativa em redes de
cidades e projetos internacionais.
A cidade de Guarulhos foi a mais receptiva à pesquisa desenvolvida. Fernando
Santomauro foi o gestor que respondeu o questionário, sua formação é de Relações
Internacionais pela PUC (Pontifícia Universidade Católica) e em Ciências Sociais pela
USP (Universidade de São Paulo), sendo coordenador da secretaria desde 2008. Em
2005, na gestão de Elói Pietá membro do Partido dos Trabalhadores (PT), criou-se a
Coordenadoria de Relações Internacionais (CRI), na época da pesquisa o prefeito
vigente era o Sebastião Almeida. O gestor afirma que há subordinação apenas ao
gabinete do prefeito e bom relacionamento com as outras secretarias. A CRI é
8
composta pelo gestor e por mais quatro assessores, os últimos são realocados de
outas áreas de prefeitura, não havendo nenhum concursado, seus membros são
responsáveis pelo desenvolvimento de projetos, redes de cidades e organismos
multilaterais.
Os principais meios de comunicação para com a população são a internet e
jornais. O orçamento destina-se a pagar os funcionários e a manutenção da CRI, para
conseguir mais verba recorre-se a captação de recursos internacionais, curiosamente
é o único órgão a atrair mais do que gastar. As considerações de Santomauro sobre o
papel de um órgão de Relações Internacionais são que todos os municípios deveriam
tê-los, pois isto qualificaria a gestão com novas ideias que fluam no mesmo sentido
das proposta do prefeito. Também ressalta que o Brasil não está juridicamente
preparado para cooperação internacional devido a ineficiência na gestão do dinheiro.
Dentro da mesma área metropolitana existe a Secretaria de Relações
Internacionais de São Paulo, criada em 2004 pela Marta Suplicy do PT. Neste caso
foram três assessoras responderam à pesquisa, seus nomes não serão revelados pela
falta de uma carta de consentimento. O fato de pertencer a uma metrópole global
possibilita o acesso a temas internacionais e apesar de agregar estrutura, capacidade
técnica e equipe preparada não foi possível superar as expectativas. As assessoras
afirmam que o foco do órgão é o comércio e realizam trabalhos extremamente
burocráticos e defasados dentro das possibilidades da área de Relações
Internacionais e, apesar de tentativa, a demora de resposta para cooperação entre
secretarias impossibilitou o trabalho em conjunto.
Houve o projeto de cooperação entre São Paulo e região de Île-de-France, na
França, contudo a constante mudança da equipe responsável pelo projeto dificultou
sua execução. É sugerido que umas das principais falhas é a gestão de informação, o
único documento registrado dos projetos é o de prestações de contas.
A próxima entrevistada foi com Alex Silva da Diretoria de Relações
Internacionais de Campinas, na qual tem a posição de diretor. Seu partido fundador foi
o Partido Social Democracia Brasileira (PSDB) na década de 80 e está inserida dentro
da Secretaria de Desenvolvimento Econômico e Social e é composta por mais um
assistente e dois estagiários. Suas dificuldades são a falta de verba e o recente caso
de corrupção dentro da prefeitura. As atividades são divulgadas no Portal da
Prefeitura, encartes em jornais, jornais e não há nenhum dado sobre o impacto desses
meios na população. Os objetivos da Diretoria de Relações Internações são entrar em
contato com Embaixadas e Consulados, Cidades-irmãs, participar de reuniões com
comitivas internacionais e captar empresas que estejam interessadas em se instalar
em Campinas, sendo esta a prioridade.
9
As duas próximas secretarias se localizam no estado do Rio de Janeiro e
Minas Gerais. Há uma predisposição para se internacionalizar na cidade do Rio de
Janeiro: em 1986 foi criada a Assessoria Internacional do Rio de Janeiro e após isso
nomeou-se Coordenadoria de Relações Internacionais e Cerimonial (CRI), a resposta
veio do Embaixador Stelio Marcos Amarante, bacharel em Direito pela Faculdade
Nacional de Direito, formado pelo Instituto Rio Branco onde também se especializou
em Altos Estudos em Política Internacional e foi o primeiro órgão de Relações
Internacionais do Brasil. A CRI é extremamente autônoma e o contato com o prefeito
só ocorre quando os gastos envolviam seu gabinete. Mesmo que o número de
funcionários seja insuficiente, compõe o quadro por volta de dez funcionários.
A atual gestão do coordenador voltou-se para o assessoramento do Prefeito
em viagens, acompanhamento de visita de autoridades e a criação de um site. O
Embaixador relata que o contato com outros órgãos internacionais em nível municipal,
que se limita a participação de algumas reuniões e o envio de funcionários para
capacitação, conhecendo a realidade o gestor diz que a especialização dos
funcionários é essencial para a eficiência das SMRI.
Na última secretaria o questionário foi respondido pelo Rodrigo Perpétuo,
secretário da Secretaria Adjunta das Relações Internacionais, alocada na Secretaria
do Desenvolvimento. A secretaria foi criado em 2005, pelo Partido dos Trabalhadores,
é autônoma em relação ao gabinete do prefeito, mas isso é classificado como um
empecilho, pela falta de verba e falta de comunicação com o prefeito. Sua esfera de
trabalho abrange a atração de investimentos, promoção comercial, cooperação
internacional para o desenvolvimento e marketing internacional. O órgão é
representada Secretaria Executiva da Rede de Mercocidades e sediam eventos de
mesmo caráter como o Congresso Mundial do International Council of Local
Environmental Initiatives (ICLEI).
A política proposta no plano de governo do prefeito é respeitada, além disso o
secretário é incentivado a ajudar na busca pelas mesmas propostas. O quadro de
funcionários é escasso, pois Rodrigo só pode indicar uma pessoa, contando com
estagiários e convênio com o Instituto Brasileiro de Mercados de Capitais (IBMEC). O
apoio do município faz com que poucos projetos sejam negados e a consolidação da
atuação global internacional municipal se concretize.
Ao sistematizar os estudos teóricos e contrapô-los à prática, foi possível
algumas conclusões abordando os caminhos e desafios da paradiplomacia no Brasil.
Para formulação de uma nova reflexão teórica acerca destes caminhos e desafios,
retoma-se dois conceitos-chave: o empoderamento (já definido na introdução) e a
paradiplomacia.
10
Noé Cornago Prieto desenvolve o conceito de paradiplomacia no livro
Paradiplomacy in Action: The Foreign Relations of Subnational Governments:
“A paradiplomacia pode ser definida como o envolvimento de governo subnacional nas relações internacionais, por meio do estabelecimento de contato, formais e informais, permanentes ou provisórios, com entidades estrangeiras públicas ou privadas, objetivando promover resultados socioeconômicos ou políticos, bem como qualquer outra dimensão externa da sua própria competência constitucional.” (PRIETO apud VIGEVANI, 2004: 252)
Desse modo, ao focar na reinvenção do território é notável que este é o pilar
que contextualiza a globalização, a emersão da atuação das cidades, unidades
federadas e províncias como atores internacionais. De acordo com Maria Inês Barreto
em seu artigo A inserção internacional das cidades enquanto estratégia de
fortalecimento da capacidade de gestão dos governos locais, o protagonismo de
governanças locais na dimensão econômica, política e cultural é relacionada por
Ohmae diretamente com cinco aspectos: perda relativa da autonomia tradicional e
função mediadora dos Estados Nacionais; diluição entre questões domésticas e
exteriores; mudança no quadro de divisão de responsabilidades internas; dissipação
externa das culturas nacionais; e “enfraquecimento da importância do território como
condicionante para a produção de bens, serviços e também para a comunicação e sua
recuperação recente enquanto elemento de reestruturação econômica” (BARRETO,
2005: 5). Posto isso, é plausível afirmar que os aludidos aspectos são parte de um
cenário prospectivo favorável à atuação subnacional, porém há outras partes deste
cenário a serem analisadas.
À luz de Barreto, evidencia-se algumas dificuldades para que a paradiplomacia
vigore no Brasil, uma vez que a hierarquia interna sustentada pela cooperação
horizontal externa só funcionará nas instâncias subnacionais quando os gestores,
prefeitos e respectivos líderes locais responsáveis por esses vínculos forem capazes
de mantê-los. Portanto, como principais desafios elenca-se:
1) Problemas relacionados as exigências burocráticas intrínsecas a
manutenção dos projetos, contemplando excessos ou inoperâncias.
2) Financiamento: sendo este o alicerce de toda e qualquer cooperação
horizontal, depara-se com a desproporção entre os meios de financiamento de
projetos e a demanda, o que faz com que a cooperação horizontal no Brasil se
desenvolva a passos curtos.
11
3) Carência de institucionalização: ou seja, carência da implementação de um
órgão legítimo que possa regulamentar as atuações subnacionais (tópico a ser
debatido posteriormente).
4) Sintonia entre líderes locais: nota-se que ao almejar a sintonia de agenda
erroneamente pressupõem-se a necessidade de uma padronização de projetos,
planos de governo e afins. Contudo, o ponto aqui em questão é mais precisamente
versado para um contexto da desordem prática, ou seja, as corriqueiras disputas
internas entre gestores de uma mesma prefeitura; comunicação deficiente;
conturbações hierárquicas; e ausência de clareza nos projetos políticos. Tais
abordagens podem parecer de pequeno impacto, porém estas se manifestaram ao
longo desta de investigação serem de extrema relevância para o bom funcionamento
da engrenagem do setor público recortado.
5) Mudança de gestões: as transições de um prefeito para outro, sobretudo
quando são de partidos distintos, costumam ser um grande empecilho para a
continuidade dos projetos, logo, muitos acabam não alcançando resultados
satisfatórios.
6) Formação acadêmica dos gestores: implica não somente na qualidade como
na quantidade da equipe, visto que dependendo da região a oferta de mão de obra
pode não ser bem qualificada e diversa. Ademais, a formação muitas vezes é uma
determinante para a pró atividade do órgão.
Para que esses problemas sejam amenizados conta-se com a colaboração de
órgãos que alinhem os principais pontos que tangem a esse setor, como a
Mercocidades, FNP (Frente Nacional de Prefeitos), a CNM (Confederação Nacional de
Municípios) e o FONARI (Fórum Nacional de Secretários e Gestores Municipais de
Relações Internacionais). O FONARI é uma associação civil sem fins lucrativos,
constituída por secretários, assessores e coordenadores de Relações Internacionais
dos municípios do Brasil, e nas palavras de Rodrigo Perpetuo, ex-coordenador do
órgão, suas ações se concentram na intensificação e qualificação do debate e das
ações que concorram para o desenvolvimento das atividades internacionais ao nível
municipal, em consonância com a Política Externa Brasileira. Sendo assim, é
imprescindível que a relação de parceria e respeito com o Governo Federal seja
mantida.
12
De acordo com os projetos da SMRI de Guarulhos, o tempo para obtenção da
aprovação do projeto com financiamento externo é de no mínimo um ano e meio.
Desse modo, nota-se a dependência tramitária dos projetos de das SMRI em relação
aos outros setores. Um ponto ressaltado no mapeamento realizado até o presente
momento é a dependência de muitas secretarias, assessorias ou coordenadorias do
gabinete do prefeito. Esse ponto pode ser abordado como favorável, tendo em vista a
proximidade de contato para que se obtenha a assinatura de aprovação. Entretanto,
aborda diretamente outro desafio: a mudança de gestão. Os projetos da secretarias
devem estar sintonizados com a agenda da gestão vigentes para que possa
prosseguir sem maiores dificuldade, logo, a mudança de gestão faz com este setor se
mantenha estático até que sejam definidas as prioridades e se os projetos antigos
correspondem as metas traçadas.
Ao analisar o relatório da II Reunião de Cooperação Internacional Federativa
do Brasil fica notável a fortificação das queixas em torno do marco legal. Daniel da
Fundação Palmares declara que “a falta de institucionalidade é uma condição para
não se progredir na cooperação federativa”. Há gestores que consideram que as
atividades internacionais exercidas pela municipalidades são postas em situação
clandestina perante a ausência do marco. Na sequência, debate acerca de como seria
tal marco, pois considera que os modelos de cooperação da Associação Brasileira de
Cooperação (ABC) são burocráticos e contrapõe a França como um dos países mais
avançados do mundo no quesito de cooperação descentralizada, fazendo com que os
munícipes usufruam com facilidade da cooperação. Ele alega ainda que a Fundação
Palmares juntamente com a Universidade de Brasilia (UnB) trabalham pela construção
de uma base para se financiar pesquisas e intercambiar alunos e professores com
universidades africanas, e com isso, sugere um exemplo de parceria no âmbito
subnacional acadêmico. “As fórmulas não prestaram atenção ao princípio básico de
economia: as pessoas respondem a estímulos.” (EASTERLY, 2001).
Ademais, inclui-se os resultados as notas tomadas na última reunião4 do
FONARI, sediada pela prefeitura de Belo Horizonte. Em primeiro lugar, desprendeu-se
das pautas debatidas o chamado para a visualização dos novos desafios dentro do
tracejado da paradiplomacia no Brasil, contemplando o espectro de um possível marco
constitucional que possa ser um meio para se comunicar internacionalmente. Em
contrapartida, os presentes gestores e representantes enviados se manifestaram um
tanto quanto inseguros perante a possibilidade de que este órgão engesse a atuação
4 O FONARI enviou um convite direcionado ao grupo de graduandos da pesquisa maior aqui mencionada
e a orientadora responsável pelo projeto e estes estiveram presentes no dia 11 de dezembro de 2013 para
assistir a reunião e apresentar o trabalho que desenvolvido.
13
paradiplomática, enquanto a expectativa é de que, a priori, este possa fomentar as
iniciativas. O limiar deste tópico dividiu os presentes: Belo Horizonte diz pensar na
criação de um decreto e tem a institucionalização sob seu ponto de vista como forma
de preservar as ações. E do mesmo lado, Porto Alegre também confessa crer no
marco jurídico como fundamental para a formalização da atividade. Consensualmente,
propôs-se amadurecer a ideia tendo em consideração quais seriam os objetivos
dessas normas e qual o objetivo final do marco, para que assim seja possível ponderar
seus efeitos colaterais.
Ao prolongar esta pauta, houve a convocação para elaboração de textos que
garantam uma normatividade aos municípios: benefício jurídico, oportunidade política,
orçamento, organização. Na sequência, o apelo dos presentes para que os
profissionais inseridos se atentem em conhecer as realidades e desafios entre os
próprios municípios brasileiros afim de aproximá-los. Como embasamento para este
apelo, declara-se que 106 municípios realizam essa atividade, mas não são todos
conhecidos ou organizados.
Para complementar as etapas dos sugeridos caminhos da paradiplomacia,
Barreto discorre sobre duas estratégias de inserção: inserção em redes de cidades ou
formação de estrutura de contatos entre instâncias de iniciativa subnacionais para que
propicie a primeira. A segunda estratégia é a ação aberta e direta das unidades
federadas, províncias e cidades no plano externo assumindo um papel ativo como
atores internacionais nas áreas de seus interesses.
Para esclarecer as conclusões obtidas acerca dos caminhos da paradiplomacia
no Brasil pode-se elencar os seguintes. Em primeiro lugar, é cabível colocar a
vinculação dos órgãos (aqui em debate) em parcerias com as universidade. O intuito é
colocar a paradiplomacia como caminho e problematizar sua aplicação. Ou seja,
adotar o pressuposto de que deve-se apostar nessa alternativa. Logo, espera-se que
as parcerias ajudem a atuar com a capacidade desejada. Diretamente relacionado
com este ponto, aponta-se a necessidade de investimentos mais densos na formação
e qualificação de gestores públicos. Como comenta Carlos Lopes, o conhecimento
deve ser visto como uma dimensão criativa em fluxo ou atividade. “Se o
desenvolvimento humano tem a ver com a expansão de oportunidades, o que se
pressupõe como explica Sen (2002), uma idêntica expansão das liberdades, então a
forma como se organiza o acesso, a divulgação e a partilha de conhecimento é
crucial.” (LOPES, 2005: 29).
Declara-se ainda de grande relevância a construção de uma secretaria (ou
similar) com um objetivo inicial bem determinado para que se tenha ao menos um
norte, e que posteriormente seja possível seu desenvolvimento profícuo. Na
14
sequência, sugere-se ir contra as políticas públicas “da catástrofe”, que só ocorre
quando algum problema implode. E a elaboração de políticas públicas planejadas
implica também na exigência de capacidades técnicas para ocupação dos cargos. Em
suma, as possibilidades de caminhos discorridas se manifestam interligadas.
“As estratégias de desenvolvimento, cujo objetivo é promover uma transformação social em termos de expansão das liberdades humanas, auxiliam na identificação de barreiras, assim como dos potencias catalisadores de mudança, além de oferecer maior apropriação e liderança locais no que se refere a esse processo.” (LOPES, 2005, p. 137).
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BARRETO, Maria Inês. A inserção internacional das cidades enquanto estratégia de fortalecimento da capacidade de gestão dos governos locais In: X CONGRESSO INTERNACIONAL DEL CLAD SOBRE LA REFORMA DEL ESTADO Y DE LA ADMINISTRACIÓN PÚBLICA, Santiago, Chile, 18-21 Oct. 2005.
BRANCO, Álvaro Chagas Castelo. Paradiplomacia & Entes não centrais no Cenário Internacional. Curitiba: Juruá Editora, 2009.
FRIEDMANN, John Empowerment – The Politics of Alternative Developement. Massachusetts, Blackwell Publishers Inc. 1992. KEOHANE, Robert O. & NYE, Joseph S. “Globalization: what’s new? What’s not? (And so what?)”. Foreign Policy, New York: Longman, Spring, 2000.
KEOHANE, Robert O.; NYE, Joseph S. Power and interdependence. New York: Longman, 1977.
LOPES, Carlos. Cooperação e desenvolvimento humano: a agenda emergente para o novo milênio. São Paulo: Ed. Unesp, 2005.
MARIANO, Marcelo Passini & BARRETO, Maria Inês: “Questão subnacional e integração regional: o caso do MERCOSUL”. In: Tullo Vigevani et al. (Org.). A dimensão subnacional e as relações internacionais. São Paulo: EDUC; UNESP; EDUSC e FAPESP, 2004. NOGUEIRA, João Pontes & MESSARI, Nizar. Teoria das relações internacionais: correntes e debates. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005.
PRIETO, Noé Cornago. O outro lado do novo regionalismo pós-soviético e da Ásia-Pacífico: a diplomacia federativa além das fronteiras do mundo ocidental. In: VIGEVANI, Tullo et al. (Org.). A dimensão subnacional e as relações internacionais. São Paulo: Ed. PUC-SP : Ed UNESP; Bauru: Ed. USC, 2004. SEITENFUS, Ricardo. Relações Internacionais. Barueri, SP: Manole, 2004.
SOLDATOS, Panayotis. An Explanatory Framework for the Study of Federated States as Foreign-policy Actors. In MICHELMANN, Hans J; SOLDATOS, Panayotis.
15
Federalism and International Relations: The role of subnational units. Oxford University Press, 1990.