Post on 12-Dec-2018
“O Ministério Público resolutivo é um canal
fundamental para o acesso a uma ordem jurídica
realmente legítima e justa. Os membros dessa
instituição democrática devem encarar suas
atribuições como verdadeiros trabalhadores sociais,
cuja missão é o resgate da cidadania e a efetivação
dos valores democráticos.”
Gregório Assagra de Almeida
Agenda 1. Introdução
1.1. Interlocução entre Academia e Ministério Público.
1.2. Bem-estar animal
1.3. Proteção do Estado aos animais no Brasil
1.4. Diretriz da atuação do Ministério Público
2. O MP Curador dos Animais: Tutela Difusa da Fauna brasileira
2.1. Ministério Público brasileiro - Desenho Institucional
2.2. Instrumentos legais e administrativos
2.3. A busca por efetividade das suas ações: O Ministério Público Resolutivo
3. Fauna Silvestre: Bem de Uso Comum
4. O Ministério Público e a proteção da fauna no Brasil
5. Resolutividade das Ações do MP
6. Conclusão
Ao lado do desenvolvimento da ciência do bem-estar animal,
mostra desse Congresso, a proteção do Estado aos animais no
Brasil decorre da própria Constituição Federal quando preconiza
que todos tem direito a um meio ambiente ecologicamente
equilibrado, devendo este ser preservado para as atuais e
futuras gerações (art. 225, CF):
“proteger a fauna e a flora, vedadas na forma da lei, as práticas que
coloquem em risco a sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais à crueldade.” (§ 1º, VII);
As condutas e atividades lesivas ao meio ambiente sujeitarão as pessoas
físicas e jurídicas a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados (§ 3º);
Também as leis ordinárias federais, estaduais ou municipais,
preconizam essa proteção, com destaque para a Lei dos Crimes
Ambientais (Lei nº9605/98);
Diretriz - Toda a atuação do Ministério Público deve se
orientar pelo princípio de tutela difusa do meio ambiente,
preconizado na CF, e pela diretriz da ciência do bem-estar
animal moderna que se traduz em promover uma melhor
qualidade de vida aos animais, viabiliza a vida aos animais,
o crescimento sustentável e agrega o valor econômico.
2. O MP Curador dos Animais: Tutela Difusa da Fauna brasileira
O Ministério Público, pelo seu desenho institucional
traçado na CF, tem papel fundamental nas demandas
ambientais.
Funções institucionais
Art. 129
I – ação penal pública
III – promover o inquérito civil e a ação civil pública para a proteção
do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos.
O Ministério Público é um grande interlocutor entre a
sociedade civil organizada e o Estado na defesa de um
meio ambiente sadio e ecologicamente equilibrado.
Participação da sociedade na formulação, planejamento e
execução da política pública ambiental – conselhos;
Cabe ao Ministério Público a fiscalização de todo ciclo da
política pública, desde o planejamento, orçamento, elaboração
e execução, podendo intervir em quaisquer etapas, para
corrigir cursos, inclusive;
O MP surge sob o signo da legitimidade democrática –
ampliaram-se-lhe as atribuições e reformularam-se-lhe os
meios necessários ao alcance da sua destinação
constitucional;
O Ministério Público é instituição permanente, essencial à
função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da
ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais
e individuais indisponíveis (art. 127, CF)
Ação civil pública, prevista no art. 129, III da CF ( Lei
7.347/85), face ao princípio da precaução e visando à
obrigação de fazer ou de não fazer para a reparação
ambiental ou a condenação pecuniária (legitimidade não
exclusiva do Ministério Público concorrente com União e
entes federados, autarquias, empresas públicas,
sociedade de economia mista e associações);
Ação Penal Pública, art. 129, I da CF (crimes
ambientais contra a fauna);
Todas as medidas processuais acautelatórias e
recursais.
Instrumentos judiciais de proteção da fauna
Instrumentos extrajudiciais para a solução
dos conflitos ambientais :
Acompanhamento legislativo;
Audiências públicas – interlocução social;
Inquérito Civil Público – investigação;
Termo de ajustamento de conduta;
Recomendação – LC. 75/93. art. 6°, XX;
Requisições no bojo do Inquérito Civil Público;
Requisições de Inquérito Policial e de TCO.
“Tão mais relevante que a utilização da ação civil
pública são a formulação e acompanhamento de
projeto legislativos, o controle do exercício do poder
de polícia pelos órgãos ambientais (em especial a
expedição de licenças e a própria atividade de
prevenção como um todo)”
Ministro Herman Benjamim - STJ
3. Fauna Silvestre: Bem de Uso Comum A fauna era tida há bem pouco tempo como bem
patrimonial, algo para ter e dispor: “usar, desfrutar e gozar”. Assim, os animais silvestres eram tidos como coisas sem dono – podia o homem usar indiscriminadamente “coisas de todos e de cada um”.
Hoje, a fauna, como recurso natural é um elemento do ambiente, o animal é um ser vivo que não pode ser tratado com crueldade e a fauna silvestre, um recurso ambiental de extrema valia à biodiversidade e à vida no Planeta Terra – bem comum de uso comum do povo.
Lei da Fauna (Lei 5.197/67, art. 1
)
“Os animais de quaisquer espécies, em qualquer fase do seu
desenvolvimento e que vivem naturalmente fora do cativeiro,
constituindo a fauna silvestre, bem como seus ninhos, abrigos e
criadouros naturais, são de propriedade do Estado, sendo proibida
a sua utilização, perseguição, destruição, caça ou apanha.”
Exposição de Motivos:
“A fauna silvestre é mais que um bem do Estado: é um fator de
bem-estar do homem na biosfera. O que levou a União a tornar-se
“proprietária” da fauna silvestre foram razões de proteção do
equilíbrio ecológico, tanto o domínio não se restringe aos animais,
mas abarca o seu habitat.”
Conceito legal de Fauna Silvestre
Conjunto de animais de quaisquer espécies que
vivem naturalmente fora do cativeiro.
“A qualidade silvestre da fauna não quer dizer
exclusivamente a encontrada na selva, mas a
fauna não domesticada”
Paulo Afonso Leme Machado
O Decreto 24.645/34 previa que “os animais serão
assistidos em juízo pelos representantes do
Ministério Público”. Dispomos de rico e consistente
instrumental jurídico para atuar na tutela ambiental. O
MP é o destinatário constitucional da missão de
protetor da fauna como bem de uso comum e direito
difuso, pertencente à coletividade.
A Lei de Proteção à Fauna dispôs que os animais
silvestres seriam de propriedade do Estado. Com o
advento da CF, a fauna passou a ser bem ambiental
difuso. Tutela jurídica dos animais como seres
sensíveis, individualmente considerados, e não
somente recursos da natureza.
Casos mais frequentes de maus-tratos a
animais no Brasil e a a atuação do Ministério
Público
caça predatória – combate- controle- permissão
para fins científicos, esportivos e de subsistência;
comercialização da Fauna Silvestre e de seus
produtos/ vedação exceção – proveniência de
criadouros artificiais;
crueldade e maus tratos contra animais (art. 3°
Decreto Lei 24.645/1934) – abuso ou crueldade –
(art. 32, Lei 9.605/98) – crime ambiental.
Recolhimento de animais de rua – sacrifício;
Farra do boi, tourada, rodeio, vaguejada e rinha –
Aspectos culturais e configuração de maus tratos;
Farra do boi – Decisão do STF : Alegação de que se trata de manifestação cultural - Inadmissibilidade. Aplicação do art. 225, § 1°,
VII da CF. A obrigação de o Estado garantir a todos o pleno exercício
de direitos culturais, incentivando a valorização e a difusão das manifestações, não prescinde da observância da norma do 225, § 1°,
VII da CF, que veda a prática que acabe por submeter os animais à
crueldade, como é o caso da conhecida “farra do boi”.
Temas controversos
Toda manifestação popular que submeta os animais
à crueldade desnecessária deve ser combatida
Artigo 32, Lei 9.605/98 - Constitui crime “Praticar ato de abuso, maus-
tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou
domesticados, nativos ou exóticos:
Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.
Animais em circo - retirada dos animais do seu convívio natural -
confinamento – estresse pela perda do habitat e pelas longas viagens
– acorrentamento;
Declaração Universal dos direitos dos Animais 27/01/1978
(Bruxelas), art. 10 “nenhum animal deve ser explorado por
divertimento do homem”, pois “ as exibições de animais e os
espetáculos que utilizem animais são incompatíveis, com a dignidade
do animal”.
Rinhas de galo – Aguarda decisão do STF – Ação Direta de
Inconstitucionalidade proposta pelo MPRJ face a lei 2.845/98 que
autorizava a competição entre galos. A PGR ajuizou cautelar
incidental à ADIN, julgada procedente para proibir as brigas de galo
até que seja julgada a respectiva ADIN.
Sacrifício de Animais em Rituais, Cultos e Liturgias
de Religiões Afro-brasileiras:
A permissão desse sacrifício foi autorizada expressamente por Lei
Estadual do Rio Grande do Sul e questionada pelo MPRS, por
meio da propositura de ação direta de inconstitucionalidade,
indeferida para permitir o sacrifício ritual em cultos e liturgias das
religiões de matriz africana, desde que sem excessos ou
crueldade;
Tráfico de animais Silvestres – Risco à fauna
brasileira deve ser combatido – Crime Ambiental
Resolutividade nas ações do Ministério
Público Crueldade em rodeio – ACP - Promotoria de Cravinhos
para impedir rodeio;
Abuso em circo – ACP – Promotoria de São José dos
Campos contra exibição pública de animais em circo;
- 7ª Promotoria de Justiça de Goiânia Acompanhamento de
Projeto de lei nº 2012742, que proíbe uso de animais em
circos.
TV Animal – ACP – MPF contra exibição de imagens de
maus tratos à animais;
Abate cruel – ACP – Promotoria São Bento de Sapucaí para
a substituição arcaico de abate pelo método científico
humanitário;
Recolhimento de animais nas ruas
-TAC – Promotoria de São Vicente- para proibir a
morte dos animais que não estejam em fase terminal
de doença ou que possam ser tratados e que não
sejam nocivos à saúde e segurança do homem.
- TAC – Promotoria de Salvador - para melhoria das
condições dos animais recolhidos e proibição do
sacrifício indiscriminado destes.
- ACP – Promotoria de Justiça de Catalão, pleiteando
programa de educação em saúde, guarda
responsável e esterilização de cães e gatos.
Maus tratos a animais em zoológico – Recomendação da
15ª Promotoria de Goiânia, visando à elaboração de plano
de manejo do Parque Zoológico para o controle sanitário,
de zoonoses e de doenças infectocontagiosas.
Vivissecção – ACP - 15ª Promotoria de Anápolis –
Obrigação de não fazer para a não utilização de animais
vivos nos cursos de treinamentos em Cirurgia
Videolaparoscópica e cirurgia endoscópica transluminal –
Existência de recursos alternativos.
Mortandade de peixes – ACP – Promotoria de Sorocaba
contra indústria local pleiteando indenização pela
mortandade dos peixes no rio Sorocaba;
Apreensão em circo – ACP – Promotoria de São
Sebastião/SP pela ocorrência de maus tratos aos animais
silvestres.
5. Conclusão
Congregar diversos olhares sobre a proteção à fauna,
sob a ótica do bem-estar animal moderno, confere a
transdisciplinaridade almejada por esse evento.
Para a sociedade, os resultados desse Congresso vão
além: concita-a ao debate que é científico, legal, cultural e
ético.
O MP, após essa importante interlocução com a
Academia e Comunidade científica e no cumprimento de
sua missão constitucional, norteará suas ações na
efetivação da tutela e proteção à fauna, preconizando a
harmonia entre sua relação com o homem, a fim de
garantir o meio ambiente ecologicamente equilibrado para
as atuais e futuras gerações.
O Ministério Público reúne plenas condições para promover
efetivamente a tutela jurídica da fauna. Nenhum outro órgão
possui à sua disposição tantos instrumentos administrativos
hábeis para impedir situações de maus tratos aos animais.
“Todos os seres que possuem interesses devem ser
respeitados, e, para com eles estamos obrigados, do ponto de
vista moral, a dispensar consideração. Para a ética utilitarista, a
característica que distingue os seres que tem interesses dos
que não tem é a capacidade de sofrimento.”
Peter Singer
Obrigada!
ALICE DE ALMEIDA FREIRE
Promotora de Justiça do MP-GO
alice.freire@mp.go.gov.br
BIBLIOGRAFIA
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MILARÉ, Édis. Direito do ambiente: A Gestão Ambiental em foco: Doutrina, Jurisprudência,
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SIRVINSKAS, Luís Paulo. Manual de Direito Ambiental. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2011;
FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. 11. ed. São Paulo:
Saraiva. 2010;
AGUIAR, Roberto Armando Ramos de Aguiar. Direito do meio ambiente e participação popular.
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CHAVES, Cristiano; ALVES, Leonardo Barreto Moreira; ROSENVALD, Nelson. Temas Atuais do
Ministério Público: A Atuação do Parquet nos 20 anos da Constituição Federal. Rio de Janeiro:
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LECEY, Eladio; CAPPELLI, Sílvia (Coord). Revista de Direito ambiental. 12 – nº 48 - Out-Dez,
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LEVAI, Laerte Fernando. Direito dos Animais.2. ed. São Paulo: Mantiqueira, 2004.