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OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE
Artigos
Versão Online ISBN 978-85-8015-080-3Cadernos PDE
I
A CRÔNICA COMO INSTRUMENTO DIDÁTICO- PEDAGÓGICO
Leonor Brito de Oliveira1
Carlos da Silva2
RESUMO Este resumo relata o desenvolvimento do Projeto de Intervenção Pedagógica no Colégio Estadual de Iporã Pr-EFMP com alunos do 9ºano do Ensino Fundamental no ano de 2015. O objetivo foi desenvolver uma proposta de incentivo à leitura e a produção textual, utilizando o gênero discursivo: as crônicas. O gênero foi proposto por ser discursivo e atrativo, pois envolve ações do cotidiano e facilita a compreensão de seu conteúdo por apresentar linguagem cotidiana e estar presente em jornais, revistas e livros didáticos, tornando o ato de ler e produzir prazeroso. A metodologia aplicada se caracterizou como uma pesquisa-ação, tendo como requisito o aprofundamento de estudos das crônicas, através de leituras, considerando a sua expansão para o aprimoramento de todas as práticas discursivas, com o propósito de investigar as dificuldades e a falta de interesse para a leitura e à produção textual em Língua Portuguesa. Como fundamentação teórica para a construção deste trabalho, o apoio veio do quadro teórico-metodológico do Interacionismo Sócio-discursivo (ISD), desenvolvido por Bronckart (1999, 2006) e outros pesquisadores como: (SOLÉ, MARCUSCHI, BAKHTIN, KOCH, GERALDI). Para fundamentar o trabalho com a sequência didática (SD) os pesquisadores que deram apoio foram (BRONCKART, 2009; DOLZ; NOVERRAZ; SCHNEUWLY 2004[u1]. Na coleta de dados inicial foi aplicado um questionário simples, cuja finalidade seria investigar as causas do desinteresse dos alunos pela leitura e pela produção de textos, além dos conhecimentos sobre a crônica. O Projeto de Intervenção Pedagógica foi concluído satisfatoriamente, absorvendo, inclusive, as contribuições vindas dos participantes do GTR.
Palavras-chave: Língua Portuguesa, Gêneros discursivos, Crônicas.
INTRODUÇÃO
Este artigo é resultado do projeto de implementação, em atendimento às
exigências do PDE, sobre o uso do gênero Crônica como instrumento
pedagógico para o trabalho com a língua materna e com a leitura de textos
literários, considerando a preferência que os jovens têm para utilizar o celular
quase como exclusiva forma de leitura, a chamada leitura instantânea.
Diante desse problema, fez-se necessário buscar formas que
despertassem nos educandos o gosto pela leitura literária, e isso não é tarefa
fácil. Sendo assim, nasceu a ideia de trabalhar com o gênero textual “crônica
1Graduada em Língua Portuguesa (UNIOESTE), Especialista em Metodologias Inovadoras
Aplicadas à Educação a Distância e ER) e Gestão do Trabalho Pedagógico pela (FACINTER). 2Professor da Universidade Estadual do Paraná – UNESPAR – Campus de Paranavaí. Mestre
em Teoria da Literatura e Literatura Comparada pela Unesp.
literária” em sala de aula, na disciplina de Língua Portuguesa. Essa escolha
surgiu por tratar-se a crônica de um gênero de leitura rápida, um texto curto e
de caráter popular, o que pode despertar no aluno o prazer da leitura.
Assim, esse Artigo foi baseado no Projeto de Implementação
Pedagógica com o Titulo: “A Crônica como Instrumento Didático-
Pedagógico: Aprendendo a gostar de ler” que foi desenvolvido no Colégio
Estadual de Iporã-PR, com as crônicas de Luís Fernando Veríssimo com o
propósito de conseguir dos alunos o interesse por textos de natureza literária,
particularmente a crônica, pelas razões já expostas.
Espera-se, portanto, que o presente artigo consiga mostrar, com clareza
de propósito e maior objetividade possível, os resultados da implementação
realizada com os alunos que integraram o projeto de intervenção.
2 A CRÔNICA [u2]
2.1 Origens, estrutura e aspectos
A palavra crônica se origina do grupo chronos e significa tempo. Vale
salientar que esse termo evoluiu muito com o passar dos anos, porém nunca
perdeu seu sentido etimológico. Aqui no Brasil, o documento que marca isso é
a Carta de Pero Vaz de Caminha ao rei D. Manuel e é considerada por grandes
estudiosos como a criação de cronista no sentido literário desse termo.
Segundo Sá (1985, p.5) “[...] ele recria com engenho e arte tudo o que
registra no contato direto com os índios e seus costumes, naquele instante de
confronto entre a cultura europeia e a cultura primitiva”. Pode-se afirmar que
Pero Vaz de Caminha mostra uma crônica de conceito antigo, registrando fatos
históricos, podendo ainda ser uma crônica no sentido atual da palavra.
A crônica surgiu de um filão na França, no século XIX, sendo
posteriormente transplantada para o Brasil. Esse filão denominava-se folhetim
que nada mais era do que um espaço livre no rodapé do jornal, com o objetivo
de entreter o leitor, dando a ele um descanso em meio às notícias mais graves.
O folhetim passou a fazer sucesso nessa época. Havia diferentes tipos
de folhetins tais como: Folhetim-romance, publicado num espaço do jornal que
se destinava a textos de ficção, romances em capítulos, pelos quais o leitor
esperava ansioso a fim de acompanhar a continuação da história. Folhetim-
variedades, publicado num espaço correspondente ao rodapé do jornal,
abordando matérias que registravam e comentavam a vida cotidiana do país e
do mundo. Foi este que deu origem ao gênero crônica, no sentido de como se
conhece atualmente.
Bender e Laurito, (1993, p.23) afirmam: “A crônica é um folhetim que
encurtou”, concluindo, é um espaço literário reservado para fazer os registros
dos acontecimentos do cotidiano do povo brasileiro.
Ainda segundo Bender e Laurito(1993):
A crônica existe para o mísero mortal, ou seja, para nós, homens menores, isso é bom, pois desperta a humanidade que há em nós e que as misérias do mundo tentam adormecer, matar talvez. A crônica acaba sendo a realidade que o leitor queria e, ao mesmo tempo, seu elemento transformador (BENDER E LAURITO, 1993, p.45).
O escritor Luís Fernando Veríssimo mistura humor e ironia no universo
da Literatura. Disso surge um dos elementos mais envolventes de suas
histórias, ou seja, o prazer por suas leituras e esse trabalho foi baseado nisso.
Ele é considerado um dos maiores cronistas da atualidade. Escreve para
jornais, revistas e produz muitos livros, sempre com a comicidade marcando
suas narrativas, passando uma visão descontraída e menos crítica dos fatos do
cotidiano.
Já Konzen, (2002, p. 96) afirma: “A comicidade está em falar de
qualquer tema, é uma visão sólida sobre os fatos, revelam análises inteligentes
e precisas na vida cotidiana”, pois o riso sempre esteve presente na vida do ser
humano, seja nas piadas ou numa situação engraçada, afinal, rir faz parte da
pessoa humana. De acordo com Paes (apud, KONZEN, 2002, p. 47), “a
capacidade de rir está ligada intimamente à capacidade de pensar privativa do
homem, único animal racional”.
Bakhtin, citado por Talau (2009), mostra-se um defensor do riso na
linguagem)
A palavra patética mostra-se totalmente suficiente para si mesma e para seu objeto. Pois o falante, na palavra patética, está implicado
totalmente, sem nenhum distanciamento e sem nenhuma reserva (BAKHTIN, Apud TALAU, 2009, p.30).
2.2 Leitura: interação entre os sujeitos.[u3]
Segundo as Diretrizes Curriculares da Educação Básica do Paraná
(DCEs) de 2008, no que se referem às funções do professor de língua materna,
estes devem assim proceder:
Os professores de Língua Portuguesa e Literatura têm o papel de promover o amadurecimento do domínio discursivo da oralidade, da leitura e da escrita, para que os estudantes compreendam e possam interferir nas relações de poder com seus próprios pontos de vista, fazendo deslizar o signo-verdade-poder em direção a outras significações que permitam sua emancipação e autonomia em relação ao pensamento e as suas práticas de linguagem imprescindíveis ao convívio social (PARANÁ, 2008, p.(64-65)
Portanto, é nesse contexto que o desenvolvimento desse artigo se
sustenta, pois o ensino da língua materna que antes era normativo e cheio de
conceitos que deviam ser decorados passou a ser uma forma de interação
entre os sujeitos, ou seja, o texto é a ponte para essa interação.
O educando precisa compreender como funciona um texto escrito, ou
seja, saber que ele se faz a partir de elementos importantes, como:
organização, unidade temática, coerência, coesão, intenções, interlocutor (es),
além de outros. Marcuschi (2005) ainda cita que, além disso, “[...] a escrita
apresenta elementos significativos próprios, ausentes na fala, tais como o
tamanho e tipo de letras, cores e formatos, elementos pictóricos, etc.”
(MARCUSCHI, 2005, p. 17).
Quanto se pensa no motivo que levam crianças e jovens a se afastarem
da leitura, Yunes (2003) questiona:
[...] O que se deve fazer para despertar numa criança o gosto de ler? Eu antes me pergunto o que fizemos para que ela deixasse de ter prazer em ler, em alargar seus horizontes de mundo, porque todas elas a princípio viajam para os mundos extraordinários que as narrativas lhes oferecem, até que, começando a ler solitários e constrangidos, seja pelo código que vem a palavra, seja pela imposição da travessia, se afastam e desgostam de ler. (YUNES, 2003, p. 44).
Marchuschi (2008, p. 228) diz que “ler é um ato de produção e
apropriação de sentido que nunca é definitivo e completo”. Produção e
apropriação que não podem ser comparadas com uma simples extração de
conteúdos ou identificação de significados, ou seja, o ler é compreender o que
se está lendo, não é apenas decodificar.
Ele ainda diz que a leitura é uma experiência ligada a “esquemas
cognitivos internalizados, mas não individuais e únicos” (MARCHUSCHI, 2008
p.228).
Assim, entende-se que a linguagem é uma forma de interação entre os
sujeitos, e o texto é resultado dessa interação, o que contribui para a realização
de uma série de estudos, pretendendo não somente aos enunciados
linguísticos, como também as relações entre eles e o contexto no qual
estiverem inseridos.
Segundo Solé (1998, p. 22), “sempre lemos para algo ou alguém, ou
seja, para alcançar alguma finalidade”, pode ser para obter uma receita, se
certificar de uma notícia, enfim, não se lê por ler.
Assim, entende-se que a leitura é indispensável na vida dos seres
humanos e, por isso, o professor tem como parte importante de seu trabalho,
desenvolver no aluno o gosto pelos diversos gêneros discursivos.
Segundo Bakhtin (2003), ao tratar da diversidade dos gêneros
discursivos:
a riqueza e a diversidade dos gêneros do discurso são infinitas porque são inesgotáveis as possibilidades da multiforme atividade humana e porque em cada campo dessa atividade é integral o repertório de gêneros do discurso, que cresce e se diferencia à medida que se desenvolve e se complexifica um determinado campo. Cabe salientar em especial a extrema heterogeneidade desses gêneros (orais e escritos), nos quais devemos incluir as breves réplicas do diálogo do cotidiano. (BAKHTIN, 2003, p.262)
Para ele, o estudo na natureza do enunciado e da diversidade de formas
de gênero dos enunciados nos diversos campos da atividade humana é de
enorme importância, e quanto mais se tem o domínio desses gêneros, mais
livremente eles podem ser empregados no uso cotidiano da comunicação.
Baseando na fala de Bakhtin, ensinar o aluno a dominar os gêneros
discursivos é de suma importância, pois é na escola que ele tem a chance de
conseguir isso, e cabe ao professor da língua materna desenvolver bem esse
trabalho.
Também para Koch (2006) o ensino de leitura assume nas aulas de
língua materna particular relevância. A mesma importância a isso dá Paulo
Freire (1994), quando diz que o aluno necessita ser preparado para tornar-se o
sujeito do ato de ler. Para tanto, é preciso que ele se torne apto a apreender o
que está sendo lido, capacitando-se a reconstruí-los e a reinventá-los.
Portanto, é preciso ensinar aos alunos que as pistas que lhes são
oferecidas servem não somente para o entendimento do texto, como também
para sua recriação, a partir do conhecimento de mundo do mesmo, ajudando
assim a selecionar melhor suas leituras, aproveitando delas o que mais lhe for
interessante e necessário.
Para Solé (1998, p. 23), “a leitura é um processo entre o leitor e o texto;
neste processo tenta-se satisfazer (obter uma informação pertinente para) os
objetivos que guiam sua leitura”. De acordo com ela, sempre se lê para algo,
não se lê por nada, e isso foi discutido ao extremo no desenvolvimento do
Projeto, pois era preciso ficar claro aos alunos que no desenvolvimento dos
trabalhos escolares em todas as disciplinas, em especial na Língua
Portuguesa, a leitura bem feita, iria auxiliá-los a realizar boas interpretações e
com isso obterem bons resultados em todos os seus trabalhos escolares.
Para ela, o professor deve usar a leitura como instrumento de
aprendizagem, e afirma que “se ensinarmos um aluno a ler
compreensivamente e a aprender a partir da leitura, estaremos fazendo com
que ele aprenda a aprender”, Solé (1998, p. 47), ou seja, para que ele tenha
autonomia de leitura, é preciso que a escola e os professores de língua
materna desenvolvam em seus alunos o gosto pela leitura, em diversas
situações em que ela aparece na vida de cada um dos educandos.
Entende-se, portanto, que a leitura não é um ato simplesmente verbal,
mas que envolve também todas as relações interpessoais e sociais presentes
no cotidiano das relações humanas. O aluno precisa perceber a leitura como
uma atividade significativa, prazerosa e interessante, capaz de fazer a
diferença em sua vida, entendendo-a como condição imprescindível para o
exercício da cidadania, emancipação e autonomia em relação às práticas
discursivo-sociais.
Sabe-se que a mudança da sociedade provoca muitas transformações,
inclusive a cultural, pois o indivíduo passa a ter com isso uma maior
compreensão do mundo e de seu meio, percebendo com maior atenção todos
os acontecimentos que o envolvem.
Martins (2003,) lembra que:
[...] devido a inúmeras manifestações culturais originárias das camadas mais ignorantes, há necessidade de se compreender tanto a questão da leitura quanto a da cultura para além dos limites que as instituições impuseram. Então, é necessário considerar a leitura como um processo de compreensão de expressões formais e simbólicas, não importando por meio de que linguagem. Assim, o ato de ler pode ser tanto algo escrito, quanto outros tipos de expressão do fazer humano, caracterizando-se também como acontecimento histórico e estabelecendo uma relação igualmente histórica entre o leitor e o que é lido [...] (MARTINS, 2003, p. 29)
Para Duarte (1994, p.14), tomando as crônicas de Luís Fernando
Veríssimo como ponto de referência sobre o interesse dos jovens para a leitura
de textos curtos, como a crônica, observa-se que tanto o riso, quanto a ironia
são usados pelo autor para chamar a atenção da sociedade e na escola isso
ajuda no interesse aos seus textos.
Nas crônicas de Luís Fernando Veríssimo, percebe-se o riso em duas
vertentes. Primeiro, é visto como forma de punir os maus costumes da
sociedade, chegando à ironia. Depois, as brincadeiras com a linguagem,
apresentam o riso como uma liberação de prazer. Ele ainda vale-se da “ironia”
em seus textos como forma de zombaria, ou seja, por meio dos seus
personagens ele mostra o cotidiano do brasileiro, ironizando seus
comportamentos (TALAU, 2009 p. 32)
2.3 O trabalho com a Crônica e seus procedimentos[u4]
O trabalho com a crônica e seus procedimentos foi desenvolvido com os
alunos do 9ºano do Colégio Estadual de Iporã-Pr, procurando fazer com que os
mesmos se tornem leitores capazes de interagir com o meio, num processo de
reflexão e crítica social, oportunizando a eles o poder de observar e ponderar
sobre o seu espaço físico e social e, a partir de suas inferências, desenvolver
competências e habilidades de formular hipóteses sobre outros assuntos que,
indiretamente, afetam sua vida e pertencem a formações discursivas
instauradas pelos meios de comunicação e pelas mídias digitais em uso por
eles e por toda a sociedade.
Assim, o desenvolvimento desse trabalho teve início com um texto
científico definindo a palavra “Crônica”.
Na sequência, foi apresentado a eles um pouco do trabalho de Luís
Fernando Veríssimo, buscando despertar o interesse pelo projeto mostrando
que o mesmo dispunha de todos os componentes importantes e decisivos na
formação dos alunos, e que o mesmo respeitou e prestigiou o espaço e os
costumes locais.
Foi aplicado um questionário buscando possíveis conhecimentos desse
gênero, onde todos responderam que já tinham ouvido falar, porém, não
sabiam defini-lo. Sendo assim, foi apresentada a todos os alunos a intenção da
pesquisa, juntamente com o material e o objetivo pretendido, visando com isso,
buscar a concepção e compreensão das teorias, práticas e aprendizagem das
crônicas.
O primeiro texto a ser trabalhado foi “O lixo” de Luís Fernando
Veríssimo, onde foi explorada a estrutura textual buscando levá-los a entender
que trata de um texto narrativo onde o diálogo impera em sua construção.
Feito isso, iniciei a interpretação oral e escrita o que evidenciou a
dificuldade em entender o texto, embora o mesmo parecesse fácil. Frente a
isso, foi sugerido à turma a pesquisa de novos textos dialogados. Em seguida,
realizaram a leitura dos mesmos, o que proporcionou uma melhor
compreensão do texto inicial.
Também foram bem explorados os recursos linguísticos, a pontuação e
as características da análise sintática, como (adjetivos, verbos, pronomes), e
produção textual.
A produção textual partiu de um recorte feito no texto inicial, o que
resultou em bons textos.
Esse foi um trabalho muito bom, pois os alunos gostaram da história do
texto, interagiram, propuseram novas formas de trabalho, como fazer teatro
com o texto, além das boas produções.
Na sequência, eles assistiram a um vídeo que explicava tudo sobre as
crônicas e em seguida houve debate e interpretação escrita com alguns
questionamentos como:
1- Após assistir ao vídeo, o que você aprendeu de diferente do que já sabia
sobre as crônicas?
2- Qual a principal mensagem do vídeo sobre as crônicas literárias?
3- Você acha que é possível produzir um vídeo com um texto literário
escolhido por vocês?
Analisar é "desmontar" o texto, vídeo, filme; enfim, verificar quais são as
partes que o compõem e como elas se articulam. Cada obra literária tem
inúmeros elementos que, articulados a constituem. A ideia não é investigar
todos - nem seria possível - mas apenas alguns. Quais? A análise deve
construir argumentos que sustentem a interpretação. É ela que vai conduzir o
leitor através do seu raciocínio.
Na análise do vídeo, a maioria dos alunos disse que agora já estavam
aptos a dizer o que era uma crônica, que entenderam a intenção do mesmo e
quase todos achavam possível produzir um vídeo novo com texto escolhido por
eles, pois usar a tecnologia para eles é bem fácil. Numa segunda etapa, foi
desenvolvido o 2º texto, e com ele foi trabalhada a questão dos vícios na fala,
numa tentativa de melhorar o conhecimento e o uso da língua materna.
Para esse trabalho foi usado o texto: “Vício na fala” de Luís Fernando
Veríssimo.
Após a leitura, os alunos receberam um pequeno texto informativo sobre
os vários tipos de discurso usado pelos falantes e que foi muito importante para
que percebessem que o discurso ora proferido revela a não uniformidade da
língua, em que os “telhados” vão sendo construídos a partir das relações
sociais demarcadas por diversos fatores, entre eles os regionais, culturais,
sociais e, por que não dizermos, contextuais.
A Leitura desse texto foi o ponto alto do desenvolvimento da
intervenção, pois os alunos se divertiram muito dialogando sobre a diversidade
de “falares” existente na sociedade atual. Perceberam que estes continuam
presente em nossa sociedade, além dos „vícios‟ contidos no texto, apontaram
outros que provocam grandes confusões, principalmente entre os jovens, pois
cada grupo cria uma linguagem que tem como finalidade confundir outros
grupos, professores, pais e até patrões, visto que alguns alunos já trabalham.
Foram constatações surpreendentes e divertidas no decorrer do trabalho com
esse texto.
Após toda discussão foi proposto aos alunos uma pesquisa sobre o
assunto, para observarem as várias formas de falar que o povo usa nos
diversos cantos do Brasil e o uso da variedade também com o nome de
plantas, objetos, comidas, etc.
Com o resultado dessa pesquisa produziram cartazes com a diversidade
de plantas que recebem nomes diferentes nas diversas regiões de nosso país.
Percebeu-se assim um grande abismo linguístico entre os falantes das
mais diversas variedades de nossa língua. No caso da escola onde o projeto foi
aplicado, há grande necessidade de instruí-los quanto à norma padrão
destacando o valor que a variedade que eles trazem de casa possui, pois se
deve ter um grande cuidado ao impor uma variedade diferente a vivenciada por
eles, pois a maioria mora na cidade, no entanto a relação com a vida do campo
é muito grande, visto que boa parte sobrevive com o resultado do trabalho
realizado na lavoura e criação de animais.
Para reforçar o entendimento das diversidades linguísticas foi lido e
interpretado oral e escrito o texto Pechada de Luís Fernando Veríssimo. Nesse
trabalho ficou claro que no Brasil a Língua Portuguesa é usada de várias
formas, no entanto, todos se entendem e ainda brincam com isso, pois é
grande o número de piadas e também de programas televisivos com grande
audiência onde o foco principal é a variedade linguística brasileira. Ainda foi
desenvolvido um trabalho de interdisciplinaridade com interpretação de
propaganda televisiva, no qual os alunos afirmaram que o preconceito racial
brasileiro continua forte, apesar de todos os esforços da sociedade para tentar
reverter isso.
Esse trabalho também foi bastante estudado e aprovado no Grupo de
Trabalho em Rede (GTR), onde vários cursistas deixaram algumas
considerações, importantes como as que são expostas a seguir, evidenciando
o acerto e a importância do projeto de implementação com a Crônica como
estratégia para o incentivo da leitura de textos literários:
(A) A opção pela crônica foi acertada, pois a literatura deve sempre permear o ambiente escolar, Antônio Candido (1980) defende que a obra literária só cumpre sua função quando repercute e atua sobre a sociedade, pois a mesma é um sistema simbólico de comunicação e não apenas uma fonte de prazer estético e é por meio do discurso artístico que o homem passa a ter consciência de si e da realidade que o rodeia, pois a literatura é a expressão do próprio homem.(cursista A GTR 2015
(B) O estudo trouxe a certeza de que é possível reverter a situação de desinteresse pela leitura, que é um maiores problemas da educação brasileira. Aqui caberia a conhecida frase: “Quem não lê, mal ouve, mal fala e mal vê”.
(C) As concepções teóricas e práticas da língua portuguesa têm como principais eixos norteadores a oralidade, a leitura, a escrita e interpretações de textos, sendo função do professor desta disciplina ajudar seus alunos a ampliarem seus domínios de uso das linguagens através do contato direto com textos dos mais variados gêneros, engendrados pelas necessidades humanas enquanto falantes do idioma. Desta forma, a disciplina de Português cumpre seu papel de multiplicar as possibilidades de leitura, possibilitando o conhecimento do mundo e sendo instrumento de aquisição desse conhecimento. No entanto, é visível a crise de leitura a qual nossos alunos estão passando, refletindo isso diretamente na escrita. Com a vasta tecnologia todos possuem livre acesso a um mundo da escrita informal, rápida, evitando “perder tempo”. Com tudo isso, agrava-se a situação de fazê-los ler espontaneamente, pois sabemos que na grande maioria das vezes é realizada uma leitura forçada, em que os olhos passam pelas palavras, mas não se absorve nada. A crônica, por ser um gênero curto e com fatos cotidianos, torna-se uma opção eficaz de resgate dos alunos, pois podemos explorar o dia a dia deles, de uma forma bem humorada, despertando assim interesse pela produção textual. Gosto muito de trabalhar esse gênero já logo no 6° ano, trazendo para a sala de aula o livro Festa de criança (Luís Fernando Veríssimo), tentando explorá-lo ao máximo. Já a partir do 7°, e até mesmo Ensino Médio, gosto muito da crônica “Os certinhos e os Seres do Abismo”, de Veríssimo também, a qual retrata bem uma sala de aula, que é um tema próximo a eles. Cabe ressaltar que a partir desta leitura, surgem temas como a tão esperada hora do recreio e suas consequências, ou a entrada da diretora em sala de aula com aquela cara que só ela tem temas que tornam-se opções de
interação do aluno com a produção textual, no caso, sua própria crônica.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
As crônicas de Luís Fernando Veríssimo são de grande importância para
o incentivo à leitura por se tratar de textos moldados no humor e na ironia, o
que agrada leitores de diferentes idades. Assim, é importante refletir sobre o
tipo de leitura que a escola oferece ao aluno, pois apesar dos clássicos de
renome da literatura brasileira, as obras pós-modernas, como as crônicas de
Veríssimo, oferecem elementos atraentes para o estudante brasileiro, tão
avesso à prática da leitura. Os elementos que constituem os textos do autor,
falam de pessoas em diversas situações, tratados com maestria, construídos a
partir de tipos tão conhecidos de todos os leitores, que acabam por trazer
identificações e discussões amplas, sobretudo se estimulados em sala de aula.
Com a leitura de algumas crônicas desse autor, pode-se observar a
opinião dos alunos acerca dos textos, expressas em frases carregadas de
espontaneidade, pois os mesmos conseguiam situar o texto na sua vivência
cotidiana. As atividades propostas consistiram em leituras coletivas e
individuais das crônicas, seleção das mesmas para leitura oral e dramatizada
e, posteriormente, interpretações orais e escritas, análise sintáticas, produções
textuais e teatro em sala de aula.
[u5]Conclui-se que formar leitores através de textos é de relevante
importância para desenvolver e tornar vasto o meio cultural do educando. E
utilizar o gênero textual crônica, foi de fundamental importância para incentivar
os alunos a poderem praticar a leitura e a escrita bem como levá-los do mundo
real para um universo totalmente fantástico e prazeroso.
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