Para morder os grandes lábios desta hora, por Jonatas Onofre

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Jonatas Onofre (Paulista, 91) é editor do fanzine “Telégrafo da Noite”, gravou um “Zine/Disco” – em parceria com Zizo e Carlos Nascimento – guarda alguns textos no laminalucida.blogspot.com.br, no deberna.blogspot.com.br e nas revistas: Zunái, Mallarmargens, O mutum, Jornal Relevo, Portal Interpoética e Portal Vermelho. Está nas antologias: Miniantologia do CCSP, Desvio para o vermelho: treze poetas contemporâneos, Poemas para a Palestina e nos fanzines do Coletivo Lambadaria. Escreveu “Opusfabula” (Cepe, 2015), “Entre o Tigre e o Eufrates” (inédito) e “Li tuas mãos na fumaça de um atentado” (inédito). É um dos curadores do selo La Bodeguita

Transcript of Para morder os grandes lábios desta hora, por Jonatas Onofre

para morder os

grandes lábios

desta hora

para morder os grandes lábios

desta hora

(por jonatas onofre)

1.

o sim está próximo,

dizem os primeiros loucos

o sim está chegando,

algo muito parecido com

uma profecia, mas é só

um recado mofando numa porta

carcomida ,

2.

aqui não é lugar

pra sonhar com

chuva e sóis de LSD,

eu penso

demais em paralisia

cerebral - disse uma pessoa

dentro da mesma

sombra em que a outra

respondeu - quero gritar,

façam como eu,

esqueçam de mim.

Não tem como saber quem fala

agora.

Lábios no escuro se movem

sobre lábios no escuro.

Nunca quem fala se sabe.

3.

[soletre qualquer palavra

só pra não esquecer como se diz,

como se faz pra conversar

e morrer ao mesmo tempo,

há outra boca ainda,

está muito perto e

quase morta, faça ela

dissolver-se num gemido,

faça tudo o que não quiser]

4.

minha geração - não haja

mas permaneça, esse

solene rebanho

pastando seus medos

entre doses de

alcatrão e tragos de ganja

entre leituras beat e surtos

de concretismo pornô

entre crises de ciúme e

minuciosos ménage a trois

5.

todos gostamos de dançar

enquanto a bad vibe chega até nós

dance até que tudo seja histeria

e gemidos de fratura exposta

dance até que nada mais esteja

no maldito lugar em que você antes

se encontrava

dance até que teu nome seja

legião ou jurema

6.

[não, nunca o ar ensolarado

de quando se abre um biscoito

da sorte, um poema assim

nem cabe na minha ausência de

bolsos,

nunca me salvaria

e vou aceitando

minha camisa frágil

desmanchando-se

no íntimo do breu]

7.

[nesses tempos nada

mais se pode querer

além de uma vida

súbita

nesses tempos tudo

mais se pode perder

antes de uma morte

estúpida]

[Qualquer metrópole suplica pelos suicídios de seus

poetas: seja com gás, com navalhas ou com

sintagmas.

Está escancarada a caça ao que ainda não tem

feições nem nome.

Eis nossa primeira persona non grata.]

la bodeguita edições –março de 2016

“killing horses since 2016”

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