Post on 30-Nov-2018
PROBLEMATIZANDO AS QUESTÕES DE GÊNERO E SEXUALIDADE NA
ESCOLA
Este painel, que tem por base três trabalhos, é motivado pelo interesse em discutir
questões relacionadas à diferença, gênero, sexualidade e suas implicações na maneira de
pensar a escola e o currículo a partir da perspectiva pós-estrutural e pós-colonial.
Compreendemos currículo como fluxo cultural e negociação de sentidos, no qual as
diferenças emergem continuamente e não podem ser estancadas. Acreditamos que a
escola pode ser um lugar para mudanças, porém ela ainda reverbera discursos de ódio e
de intolerância com os diferentes. A partir dessa compreensão analisamos algumas
práticas escolares que apresentam um caráter heteronormativo como hegemônico,
marginalizando as identidades rompentes dessa norma. Para entender a problemática
das identidades de gênero e como esta é pensada no ambiente escolar, a docência é
questionada através do conceito butleriano de perfomatividade, no qual o feminino
universal se torna uma característica essencial para uma “boa” prática docente.
Questionamos esse entendimento uma vez que ele marca uma representação normativa
da profissão docente, desconsiderando outras possibilidades de representação. Também
analisamos os sentidos de diferenças que são articuladas pelas licenciandas de um curso
de pedagogia e como elas percebem suas práticas nas escolas associadas a estes
sentidos. Apresentamos também os discursos de alguns professores de uma escola da
rede municipal do Rio de Janeiro acerca de comportamentos rompentes dos alunos,
evidenciando os múltiplos discursos produzidos sobre aqueles que rompem com os
padrões normativos de gênero e sexualidade. Por intermédio de nossas pesquisas
buscamos provocar reflexões que visam romper com concepções binárias e
normatizantes de ser e estar no mundo, explorando os processos de subjetivação que
contingencialmente o significam.
Palavras-Chave: Diferença, Gênero, Sexualidade.
XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira
11929ISSN 2177-336X
DIÁLOGOS ENTRE/SOBRE DIFERENÇA, CURRÍCULO E CULTURA NO
AMBIENTE ESCOLAR
Renata Leite de Oliveira
Secretaria Municipal de Educação de Nova Iguaçu/RJ
Mestranda no PPGECC – FEBF/UERJ.
Resumo: Este texto é um recorte da pesquisa desenvolvida no âmbito do curso de
mestrado em que busco compreender sentidos de diferença articulados em discursos de
licenciandas em curso de pedagogia. A investigação é motivada pelo interesse em
discutir questões relacionadas a diferença cultural e suas implicações na forma de
pensar a escola e o currículo. A investigação é realizada a partir de uma perspectiva pós-
colonial e pós-estrutural a partir das quais assumo a concepção de cultura como fluxo de
enunciação de sentidos, processo em que as diferenças emergem continuamente e não
podem ser estancadas. Essa compreensão informa a concepção de currículo como
espaço-tempo de fronteira cultural que orienta minhas análises. A pesquisa utilizou a
metodologia do grupo focal que possibilitou captar sentidos de diferença articulados
pelas participantes em uma dinâmica singular importante para a realização da pesquisa e
contribuiu para suscitar reflexões importantes para os processos de formação das futuras
docentes. Com a metodologia busquei compreender os sentidos que são articulados nos
discursos sobre as diferenças de estudantes de um curso de pedagogia e como percebem
suas práticas cotidianas na escola associadas à problemática das diferenças. Suas falas
trouxeram contribuições e instigaram reflexões sobre os sentidos de diferença que
ocupam e disputam espaço no ambiente escolar, assim como no campo curricular.
Ainda que as participantes incorporem problemáticas como a exclusão provocada pelas
práticas discriminatórias em curso nas escolas, os discursos que articulam ainda são
carregados de concepções binárias nas formas de significar o mundo. Uma lógica que
considero insuficiente se estamos comprometidos com a constituição de um projeto
democrático de educação e de escola.
Palavras-chave: Cultura, diferença, currículo.
O texto é um recorte da dissertação de mestrado em que investigo os sentidos de
diferença e os discursos de estudantes de um curso de Pedagogia. Nele apresento
algumas reflexões acerca das relações permeadas pelas tentativas de controle das
diferenças que emergem no espaço-tempo escolar. O pressuposto é de que essas
tentativas são sustentadas pela compreensão de que é possível, pelo currículo, forjar
identidades como projeto a priori.
Compreendo a escola como um local constituído pelas diferenças e apesar das
tentativas de contenção e silenciamento das mesmas é impossível contê-las tendo em
vista que elas se produzem em um processo incessante de enunciação de sentidos
(BHABHA, 2003). A partir dessa compreensão reflito sobre os sistemas de significação
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e enunciação da diferença cultural como uma forma de contribuir para o rompimento
das concepções binárias que produzem processos de exclusão na escola.
Neste texto dialogo com autores pós-coloniais e pós-estruturais, pois acredito
que as contribuições desses aportes teóricos são de grande auxílio para o
desenvolvimento desse estudo. Opero com a compreensão de diferença como fluxo no
qual as buscas são produzidas enunciações. Um processo incessante de tentativas de
produção e fixação de significados. Assim, falar em diferença cultural é compreender
que as negociações e disputas por significação estão associadas às relações de poder,
rompendo com ideia de que é possível construir uma harmonia social a partir de
reconhecimento das diferenças. Defendo que essa é uma posição idealista e que
desconsidera que, implicadas em relações de poder, esse reconhecimento sempre se dará
tomando como referência um determinado padrão identitário hegemônico e,
pretensamente considerado como o mais adequado. Logo, será sempre um
reconhecimento marcado pela subalternidade do outro.
É dessa perspectiva que Bhabha (2003) problematiza os discursos em defesa do
reconhecimento de uma diversidade cultural. Para o autor são discursos que ainda
estruturam a diferença de maneira limitada, pois trabalham com a compreensão de
costumes pré-estabelecidos, minimizando as relações de poder implicadas nessas
relações. Poder que o autor assume como descentrado. Ou seja, relações de poder que
não emergem de um centro plenamente definido, mas que se disseminam e constituem
aquilo que definimos como social (LACLAU, 2011). Bhabha (2003) considera que essa
concepção de diferença traz à tona as relações de poder e de disputas por
(re)significações, relacionando-se diretamente com o processo de enunciação cultural.
Muitas vezes no ambiente escolar é possível observar distintos discursos em
defesa da diversidade que operam com a possibilidade de uma sociedade harmonizada
em que as diferenças serão pactuadas em um processo dialógico capaz de eliminar os
conflitos. Trata-se, a meu ver, de uma posição idealista que as contribuições pós-
estruturalistas permitem questionar assumindo a concepção de diferença cultural,
compreendendo e refletindo sobre os processos de enunciação sobre o mundo, no qual
múltiplos sentidos disputam espaço e poder de significação.
Acredito que ao falarmos sobre diferenças, também falamos sobre cultura,
identidades, sistemas de significações e relações de poder. E quando relacionamos estas
temáticas ao campo educacional também abordamos o currículo. Compreendo que as
diferenças são tecidas culturalmente de maneira híbrida em uma constante busca por
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significações que são costuradas por relações de poder. Esta tessitura nunca terá fim,
sempre será um processo constante, híbrido e inacabado.
Nessa perspectiva, compreendo o currículo como produção cultural, como
“espaço-tempo de negociações que hibridizam discursos, concepções e práticas
produzidas nos diferentes contextos que concorrem para sua produção” (RAMOS;
BARREIROS, FRANGELLA, 2011, p.1). E a prática curricular como um espaço de
disputas, enunciações, hibridizações, tradução e negociação de sentidos que se
constituem por intermédio de conflitos gerando momentaneamente consensos
conflituosos.
Ao utilizar a terminologia cultura compreendo-a como um sistema de
significações. Desta forma, a cultura deixa de ser algo relacionado à erudição, o
conceito se amplia. A cultura é entendida como processos de significação sobre o
mundo, sobre as formas pelas quais enunciamos o mundo. Essa concepção de cultura
contribui para a problematização de hierarquização de diferentes culturas com a
desqualificação daquelas que escapam ao padrão hegemônico, entendendo que essa
hegemonia é precária, provisória e discursivamente construída.
A intenção de padronizar alguns sentidos como pertencentes de uma cultura
legitimada de maneira hegemônica são processos de controle social que visam silenciar
ou enquadrar o que escapa ao que foi instituído como „certo‟ ou „legítimo‟. Hall (1997)
ao falar sobre a centralidade da cultura expõe a preocupação com os sistemas de
regulação envolvidos nos processos culturais. Um processo regulatório que não ocorre
sem conflitos, nem de maneira harmoniosa. O que o autor argumenta é que ao mesmo
tempo em que a cultura regula, ela é regulada por nós em processos de significações
incessantes, mediados pela linguagem e implicados em relações de poder. Dessa forma,
como alertam Lopes e Macedo (2011, p. 198), “tanto a regulação da cultura quanto a
regulação através da cultura não conseguem podar completamente o excesso de sentidos
próprios dos sistemas discursivos que constituem a cultura. Há sempre sentidos que
escapam e garantem a possibilidade de mudança”.
Nessas reflexões a linguagem assume um importante papel rompendo com
qualquer concepção reducionista ou idealista em relação à cultura, com implicações nas
formas de conceber o currículo - e a produção de diferenças. De uma perspectiva
discursiva, apoiada nos aportes pós-estruturalistas, assumo que a cultura é produzida
pela/na linguagem em contextos que se produzem no processo de negociação e tradução
de sentidos (BHABHA, 2003).
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Essas reflexões têm me auxiliado a pensar as tentativas de controle das
diferenças no espaço-tempo escolar. Apesar de um discurso de respeito à diversidade
cultural que circula nos diferentes contextos de produção curricular, via de regra, essa
diversidade é entendida como uma dificuldade a ser superada. Ainda que essa superação
não implique em sua eliminação, em geral, trata-se de integrá-la a uma lógica
hegemônica. A um padrão de comportamento definido como ideal. As políticas
curriculares em curso são expressam dessa ambivalência em que a exaltação da
diversidade cultural convive em um contexto em que são estabelecidas metas de padrões
de desempenho requeridos das escolas, de docentes e de discentes. Uma ambivalência
que revela uma concepção de cultura como dado fixo, como condição pré-existente e
passível de ser transformado, pelo currículo, em outra coisa projetada como mais
adequada. São tentativas de adequação, de padronização que reforçam concepções
binárias de mundo (certo x errado; adequado x inadequado). Fronteiras que sempre se
estabelecem produzindo a deslegitimação do outro.
Estas perspectivas auxiliam a pensar em processos de subjetivação e em
processos de identificações provisórias, rompendo com concepções essencialistas – e
binárias- de identidade. Um processo em que nos tornamos sujeitos quando somos
convocados a tomar uma decisão (LACLAU, 2011). Um processo de diferimento, de
marcação simbólica que define quem está incluído ou excluído das práticas e das
relações sociais. Desta forma, compreendo o espaço escolar inserido em incessantes
processos de construção de identificações e de significações por mediados pela
linguagem.
Compreendo a escola como um entre-lugar onde as relações de poder estão
presentes e em constante disputa de sentidos, permeado por processos de negociação e
hibridização cultural. Ao mencionar hibridismo compreendo-o, conforme Bhabha
(2011) como uma maneira desarticuladora que visa romper com a lógica binária,
essencialista e homogeneizante. Possibilitando novas e distintas compreensões “sobre
os trânsitos ambíguos que informam as práticas discursivas e políticas nos lugares da
cultura, que são também lugares de transformação social” (SCHMIDT, 2011, p. 24).
Dessa perspectiva, assumo com Lopes e Macedo (2011), o entendimento de
currículo como espaço-tempo de fronteira. Como processo de enunciação cultural e
lanço mão das contribuições de autores como Tura (2002) e Pereira (2012), entre outros,
para sustentar a compreensão de que “o currículo, como tudo, seria cultural, na medida
em que funciona como um sistema de significações dentro do qual os sentidos são
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produzidos pelos sujeitos” (LOPES; MACEDO, 2011, p. 186). Isso implica
compreendendo currículo, cultura e diferenças inseridos em jogos de linguagem que
disputam uma hegemonia provisória.
Sustentado nessas reflexões o estudo desenvolvido no curso de mestrado teve
como objetivo analisar os sentidos de diferenças das licenciandas – o grupo era
constituído apenas por mulheres do oitavo período de um curso de pedagogia, buscando
investigar como as participantes da pesquisa articulam sentidos de diferença atribuindo
significados as suas práticas cotidianas na escola.
A pesquisa foi realizada com a realização de grupos focais com estudantes da
Faculdade de Educação da Baixada Fluminense (FEBF), unidade acadêmica da
Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), cujo campus se localiza no
município de Duque de Caxias na Baixada Fluminense, região metropolitana do Estado
do Rio de Janeiro. Nesse texto destaco os discursos produzidos nos encontros em que
emergiram discussões relacionadas às questões de gênero e sexualidade.
Diferenças, gênero, sexualidade e currículo: sentidos em disputa.
Para a realização da pesquisa foi delimitado que a investigação por meio de
grupos focais ocorresse com discentes da disciplina de Estágio Supervisionado II -
Docência do Ensino Fundamental. A escolha se justifica na medida em que entendo que
o estágio oportuniza o retorno à escola a partir de uma postura de estranhamento e de
questionamento às práticas que organizam o funcionamento escolar. Uma possibilidade
de desnaturalizar aquilo que até então, poderia ser entendido como dado, como não
problemático.
A escolha da metodologia do grupo focal favoreceu as interações e trocas
coletivas entre os participantes favorecendo a emergência de redes de significados
importantes para a pesquisa e também para as experiências formativas das alunas
(GATTI, 2012). O grupo focal possibilitou perceber os múltiplos olhares, assim como
uma pluralidade de processos emocionais que, ao longo dos encontros, reforçaram a
compreensão da dimensão contingente implicada na enunciação de sentidos.
Nos encontros foram utilizados roteiros pré-definidos com o cuidado de não
perder de vista a flexibilidade essencial para o desenvolvimento desta metodologia de
pesquisa. O roteiro serviu como uma orientação, pois cada encontro se desenvolveu com
uma dinâmica própria com muita fluidez. Os encontros foram gravados, em alguns
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encontros foi possível gravar também em vídeo o que possibilitou a organização de um
significativo material de análise. Como já informei, parte desse material foi selecionado
para a elaboração deste texto.
Durante os encontros, que variaram entre 12 a 16 participantes. Em momentos
em que foi necessária a minha intervenção para motivar a discussão (GATTI,
2012),solicitei que as participantes relatassem suas vivências como professoras em
atuação e/ou estagiárias. Nesses relatos, via de regra, emergiram situações em que
viveram e/ou presenciaram situações identificadas como tentativas de opressão e de
silenciamento das diferenças ocorridas no espaço escolar, inclusive durante o curso de
pedagogia.
Como o momento inicial da discussão é geralmente difícil, também devido a
timidez (GATTI, 2012) no primeiro encontro iniciei os trabalhos apresentando a
situação hipotética de um menino que estava brincando na escola e na hora de escolher
uma fantasia escolheu a roupa de bailarina. Nesse momento a professora interviu com a
seguinte advertência: “Não, esse aqui fica para a Carol, você não. Quer a do Superman?
Quer a do Batman?”. Apresentada a situação solicitei que as licenciandas falassem
sobre esta situação, informando se já haviam presenciado algo similar.
A situação suscitou vários relatos destacando a separação de corres associadas
ao gênero - rosa para meninas e azul para meninos- e as brincadeiras diferentes para
meninas e meninos. Uma das participantes relatou que atuava como professora em uma
instituição em que havia muitos brinquedos associados, culturalmente, ao universo
feminino e que um menino que frequentemente preferia brincar no espaço das meninas
foi motivo de conflitos:
no espaço de cabeleireiro e ele [o menino] brincava com as outras
meninas. Os pais ficaram furiosos. Diziam que tínhamos que tirar a
criança de lá senão a criança viraria homossexual. A gente explicava
que isso não tem nada a ver, mas não adiantava, se a gente não tirasse
a criança de lá eles diziam que iriam tirar a criança do
estabelecimento, mesmo conversando com a gente (fala de uma das
pessoas participantes do grupo focal).
Essa fala retratou a concepção do que é ser menina e menino. Uma visão
binarizada na qual foi instituído um padrão de conduta e de comportamento para menina
e para menino. Os sistemas de representação podem estar cada vez mais regulados
buscando a normatização das diferenças, onde há classificações que visam definições
fixas e estanques de ser e atuar no mundo (Lopes; Macedo, 2011). Tal concepção vai de
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encontro a compreensão de processos de subjetivação, assim como a impossibilidade de
fixação de sentidos, defendidas pelas abordagens pós-estruturais.
Em geral, as participantes expressaram a compreensão de que essas distinções
têm um caráter sexista e que é necessário desconstruir preconceitos. No entanto, essa
posição não implicou em um questionamento a ideia de que a diferença entre os sexos é
cultural. Via de regra o que emerge é o reconhecimento de uma diferença biológica que
reivindica igualdade de tratamento. Que se posiciona firmemente contra o preconceito,
mas que não tem clareza de como a condição biológica justifica a produção de uma
diferença que é cultural, estabelecida em jogos de linguagem sempre permeados por
relações de poder que estabelecem códigos e símbolos a serem seguidos e a serem
silenciados.
Importante destacar o comprometimento das participantes com uma prática que
favoreça a desconstrução de discursos discriminatórios cristalizados na dinâmica social,
no entanto, a mera reprodução de um discurso antidiscriminatório ainda me parece
insuficiente para que as futuras professoras possam construir ações mais efetivas de
combate à discriminação, principalmente se não forem capaz de romperem com
concepções binárias cristalizadas que podem favorecer, mesmo na luta contra a
discriminação, a emergências de novas polarizações.
Suscitadas por essa reflexão, em um novo encontro, uma segunda situação
hipotética tratada em um dos encontros do grupo focal foi pautada na seguinte questão:
“As diferenças biológicas entre homem e mulher por si só, explicam a discriminação de
gênero? A escola reproduz discriminação de gênero e de que forma?”
Mais uma vez práticas culturais rotineiras na escola emergiram destacando que a
discriminação de gênero ocorre quando é imposto que para menino é uma determinada
brincadeira e para menina outra, ou quando é designado uma cor certa para menino.
Uma das participantes mencionou que conhecia uma instituição em que na lista de
chamada os nomes das meninas estão escritos na cor rosa e o dos meninos na cor azul, e
que “as crianças já vinham de casa com essa preocupação de cor.” (fala de uma das
pessoas participantes).
Aqui, mais uma vez, a diferença biológica aparece naturalizada. No entanto,
autores que têm se dedicado ao tema, como Butler (2015), por exemplo, questionam
essa naturalização. Para a autora “o sexo é, ele próprio, uma categoria tomada em seu
gênero”, por isso, “não faz sentido definir o gênero como interpretação cultural do
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sexo” (p. 27). Ou seja, a diferença biológica entre sexo masculino ou feminino só se
produz no jogo de linguagem.
Uma das falas abordou a questão dos estereótipos principalmente quando
uma menina não se encaixa em um padrão feminino, ela é
discriminada. Quando um menino não se encaixa em um padrão
masculino, de macho, ele também é discriminado. A escola reproduz
estereótipos, preconceito e discriminação e tenta justificar através
deste determinismo biológico, através de características biológicas
(fala de uma das pessoas participantes).
Embora assumam uma postura crítica, as participantes ainda não romperam
definitivamente com o essencialismo dos discursos biológicos. A lógica pela qual
desenvolvem a crítica não é rompida. Se é fato que as atitudes preconceituosas,
conservadoras são sustentadas na produção de binarismos, se a lógica binária não é
rompida é grande o risco de que novas polarizações sejam produzidas. Muda o outro,
novos padrões de comportamento passam a ser assumidos como os mais adequados,
outros excluídos, mas a discriminação, a produção de práticas discriminatórias
permanece.
A escola como um espaço constituído pelas diferenças pode contribuir na
reflexão e problematização das relações de poder que instituem normas como algo
definido a priori. A problematização dessas relações de poder pode auxiliar no processo
de desestabilização de concepções binárias e essencializadas de ser e estar no mundo.
Neste encontro, principalmente nesta situação a escola não foi vista como um
ambiente formador ou propiciador de saberes e sentidos. Muitas falas evidenciaram a
escola como reprodutora da sociedade, desconsiderando a instituição como espaço-
tempo de produção de sentidos, como produtora de saberes, por exemplo:
A escola reproduz o que a sociedade impõe de regras, se a sociedade
diz que aquela regra é certa para algum objetivo, a escola vai
reproduzir aquilo, como ela reproduz na questão do gênero, na
discriminação de gênero, se a sociedade diz que tem que ser imposto
que azul é para o menino e rosa é pra (sic) menina ou vice e versa
(fala de uma das pessoas participantes).
Nas falas não houve alusão para o fato de que mesmo ao tentar reproduzir algo,
nunca teremos um resultado exatamente igual, considerando o processo de tradução
mencionado por Bhabha (2011) no qual qualquer tentativa de reprodução acaba gerando
sentidos que excedem o alcance do anterior.
A ideia de escola como espaço de reprodução, de conservação é pouco produtiva
e pouco favorece a possibilidade de estratégias que possam transformá-la em um espaço
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de construção democrática, construção entendida como devir e não como projeto de
futuro. Além disso, a escola significada como lugar de reprodução é uma construção
discursiva dado que “nenhum contexto pode asseverar o fechamento de suas
possibilidades de sentido, pois qualquer tentativa de codificá-lo e transplantá-lo para um
contexto outro de descrição e interpretação pode gerar um novo contexto que excede o
alcance do anterior. ” (BHABHA, 2011, p.36)
Outra situação hipotética proposta foi: Você acabou de assumir a coordenação
de uma escola de ensino fundamental e foi procurada por Rodrigo, aluno de 15 anos,
matriculado no 8º ano, que reivindica ser chamado de Simone, além de passar a utilizar
o banheiro feminino da escola. Como você lidaria com esta situação?
Algumas intervenções se aproximaram mais da questão da aceitação e respeito
(principalmente da utilização do nome), entretanto consideraram a utilização do
banheiro como algo complicado e que traria muitos conflitos para o ambiente escolar.
Quanto a situação dele, ser chamado por este nome, acho que eu teria
uma conversa com a turma e falaria para que buscassem ter respeito,
para que ele se sentisse a vontade, falaria com todos para que ele fosse
respeitado. A questão dele utilizar o banheiro feminino, eu
sinceramente não sei o que fazer, então eu penso que eu levaria
também a situação para os meus colegas, professores, para que a gente
juntos chegasse a algum acordo, com a opinião de todos (fala de uma
pessoa participante do grupo focal).
A alternativa de respeito é importante, porém, quando resume-se a mera
aceitação do outro estamos reduzindo a diferença à diversidade. A discriminação
permanece porque esse outro passa a ser aceito, mas incorporado a lógica do padrão
hegemônico. Um determinado grupo social é tão “bom”, tão “superior” que até é capaz
de aceitar a presença do outro. A convivência do outro. Mais do que “respeitar e admitir
a diferença é preciso explicar como ela é ativamente produzida. [...] Uma política
pedagógica e curricular da diferença tem a obrigação de ir além das benevolentes
declarações de boa vontade para com a diferença” (SILVA, 2014, p.100). Ainda de
acordo com esse autor, penso que uma política curricular que incorpore as diferenças
precisa “colocar no seu centro uma teoria que permita não simplesmente reconhecer e
celebrar a diferença e a identidade, mas questioná-las” (Idem).
Ao mesmo tempo que tiveram falas associadas a aceitação do diverso, outras
falas buscaram problematizar a questão, buscando atividades para abordar a temática em
sala, porque “mesmo que ele quisesse ser chamado de Simone, ele seria motivo de
chacota por elas. Porque elas [as crianças] não saberiam o que está acontecendo, o
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porquê de ele está querendo ser chamado desta forma” (fala da pessoa participante do
grupo focal) ;
E a questão do banheiro, pensaria na possibilidade de ter um banheiro
unissex, mas também levaria isso à direção e ao grupo de professores,
elaboraria uma atividade em uma sala de aula e levaria para todas as
outras turmas da instituição para poder esclarecer isso. Pois, mesmo
que os pais e a direção aceitem, ele poderá ser, ainda, motivo de
chacota pela escola inteira, se não houver esse trabalho de
conscientizar as turmas(fala das pessoas participantes do grupo focal).
A questão do estereótipose faz presente ao debater questões de gênero e
sexualidade. Recorro a Bhabha (2003) ao considerar o poder e a força que o estereótipo
possui como um “modo de representação complexo, ambivalente e contraditório”
(p.123). O estereótipo auxilia na construção de um padrão como verdade, como
reprodução discursiva de uma realidade (inexistente) que acaba por marginalizar e
segregar quem é estereotipado. Porém, podemos utilizar a ambivalência do estereótipo
para desconstruir atitudes discriminatórias e problematizar as até então ditas „verdades‟
ou „realidade‟.
De acordo com Louro (1997) é de suma importância questionar não somente o
que ensinamos, mas a maneira como ensinamos e que sentidos atribuimos aquilo que
ensinamos sem desconsiderar a singularidade daquele que aprende. “Temos de estar
atentas/os, sobretudo, para nossa linguagem, procurando perceber o sexismo, o racismo
e o etnocentrismo que ela frequentemente carrega e institui.” (LOURO, 1997, p. 64).
Ao decorrer dos encontros foi possível observar, que naquele momento, a
hegemonia, entre os discursos das participantes, de concepções essencialistas sobre a
escola, responsabilizando-a por práticas discriminatórias e excludentes, como se a
materialidade da escola enquanto espaço, fosse a causadora de todos os males,
desconsiderando nossas práticas enquanto sujeitos sociais que ocupam este espaço.
Importante destacar o quanto a discussão em torno da sexualidade ainda é
tratada como tabu, causando incômodo entre algumas participantes do grupo focal.
Percebi que ao abordar a temática emergiram concepções heteronormativas. Nesses
momentos, mais do que as falas, mas a imagens de vídeo captaram expressões de
desconforto que dizem mais do que as palavras. E, como afirmam Laclau e Mouffe
(2015), toda ação, toda manifestação social é significativa, produz significados e, nesse
caso, expressam sentidos essencialistas de diferença.
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Todas essas questões permeiam as formas como o currículo se produz na escola
(LOPES; MACEDO, 2012). Assim, pensar o currículo como prática de enunciação
cultural tem possibilitado repensar o ensino, a aprendizagem e a educação. Penso que
pensar o espaço-tempo de produção curricular perpassado por diferentes sentidos
culturais em permanente negociação/tradução me parece uma alternativa interessante
para desconstruir práticas naturalizadas que sustentam processos de discriminação e
exclusão na escola. Isso implica assumir “que toda especificidade cultural é
extemporânea, diferente em si. As culturas vêm a ser representadas em virtude dos
processos de iteração e tradução através dos quais seus significados são endereçados de
forma bastante vicária a – por meio de – um Outro” (BHABHA, 2003, p. 105).
Concordo com Lopes e Macedo (2011) ao considerar que a escola possui um
importante papel no processo de “desconstrução de hegemonias, não com a esperança
de substituí-las por contra hegemonias, mas com o objetivo de impedir que se
fortaleçam de tal maneira que se torne impossível questioná-las” (p.232).
Por fim, é importante destacar que, pelo menos entre as participantes da
pesquisa, os processos de discriminação engendrados nas práticas escolares são
percebidos como um problema a ser enfrentado. No entanto, penso que se faz necessário
ir além, fomentando reflexões que possibilitem o questionamento das lógicas de
produção de pensamento que favorecem a naturalização de práticas e de forma de
conceber a escola, a formação de pessoas. Nessa perspectiva, falar sobre diferenças
culturais possibilita suscitar reflexões sobre questões que permeiam o campo
educacional entrelaçadas por questões curriculares, identitárias e culturais. Desta
maneira, penso que os aportes pós-estruturais e pós-coloniais têm oferecido referências
importantes no apoio a essa empreitada. É dessa forma que concebo a escola como
espaço-tempo de fronteira cultural em que processos de negociação, hibridização e
tradução cultural possam ser potencializados, rompendo com a produção de binarismos
que hierarquizam e deslegitimam diferentes formas de ser e estar no mundo.
Referências:
BHABHA, H. O Local da Cultura. Belo Horizonte: EdUFMG, 2003
______. O bazar global e o clube dos cavalheiros ingleses: textos seletos de Homi
Bhabha. Rio de Janeiro: Rocco, 2011.
BUTHER, J. Problemas de Gênero - Feminismo e Subversão da Identidade. 8 ed, Rio
de Janeiro: Civilização Brasileira,2015.
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FRANGELLA, R. C. P.; BARREIROS, D.; RAMOS, A. H. Ensino e Educação: nem
um nem outro – indagações do/no entre-lugar, 2011. Disponível em
<https://www.fe.unicamp.br/gtcurriculoanped/35RA/trabalhos/TE-Anped2012-
Ensino_e_Educacao.pdf>. Acesso em: 18 fev. 2016.
GATTI, B. A. Grupo focal na pesquisa em ciências sociais e humanas. Brasília: Liber
Livro Editora, 2012.
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11941ISSN 2177-336X
A PERFORMATIVIDADE DA DOCÊNCIA E SUAS PRÁTICAS
HETERONORMATIVAS
Luciana Izis Silva de Abreu
Secretaria Municipal de Belfort Roxo-RJ
Mestranda no PPGECC- FEBF/UERJ
Resumo: Nesse texto apresento parte das reflexões produzidas na realização do curso
de mestrado em que desenvolvo uma pesquisa que tem como foco as práticas
heteronormativas associadas ao exercício da docência. No estudo essas práticas são
analisadas a partir de uma abordagem pós-colonial que buscam evidenciar as relações
assimétricas de poder implicadas nas questões que envolvem relações de gênero. No
texto aqui apresentado, discuto brevemente os processos históricos que resultaram o
exercício do magistério em uma profissão feminina, tendo em vista que o trabalho
docente é realizado majoritariamente por mulheres. Na apresentação desse histórico dou
ênfase ao fato de que a feminilização da docência é resultado de operações discursivas
em que sentidos de um feminino concebido como universal passaram a ser associados e
afirmados como padrão de qualidade da docência. No entanto, apesar da exaltação de
características pretensamente femininas atribuídas à docência, a feminilização da
profissão favoreceu a sua associação à ideia de vocação que também justificava um
processo de desvalorização que se expressa, por exemplo, nos baixos salários pagos a
essas profissionais. Para além dessas considerações, na reflexão produzida, o conceito
de perfomatividade desenvolvido por Judith Butler tem sido fundamental para pensar
como o exercício da docência, em especial aquela exercida pelas professoras
generalistas que atuam nos anos inicias de escolarização, tem sido direcionado pelas
normas padronizadas e discursivamente atribuídas ao gênero feminino. Esse
direcionamento se reflete nas práticas heteronormativas presentes no cotidiano escolar e
que precisam ser desnaturalizadas como condição essencial para o estabelecimento de
relações sociais menos discriminatórias e mais igualitárias em sala de aula.
Palavras-chave: Feminilização da docência, Práticas heteronormativas, Formação de
professores.
O debate em torno a produção de uma identidade docente tem ocupado os
pesquisadores do campo, trata-se, via de regra, de projetar o perfil do profissional que se
julga mais adequado para a realização de uma educação de qualidade. Uma discussão
que também interessa a sociedade, qual seja, a definição daquele que seria um excelente
docente, estabelecendo quais qualidades necessárias que um professor deve ter para
formar um aluno crítico e culto. Para além da impossibilidade de um consenso em torno
de um padrão identitário docente nos campos de disputa, ainda é preciso levar em conta
que, em diferentes campos do conhecimento e em abordagens teóricas diversificadas, a
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própria ideia de identidade tem sido fortemente questionada por autores como Hall
(2002); Bhabha (2007); Butler (2015) e Louro (1997), dentre outros.
Assumindo as reflexões e argumentos desenvolvidos por esses autores que
adotam uma abordagem pós-estruturalistas, nesse texto me proponho a problematizar
discursos que buscam projetar uma identidade docente destacando a dimensão
generificada da docência, na medida em que, contraditoriamente, as implicações de
gênero têm pouco destaque em uma categoria profissional constituída majoritariamente
por mulheres. Nessa perspectiva, busco analisar o processo de feminização da profissão
docente e as suas implicações no favorecimento do desenvolvimento de práticas
heteronormativas em sala de aula. O pressuposto é que as formas pelas quais as
professoras vivenciam o sexismo acabam por reforçar as práticas heteronormativas em
sala de aula.
Delimitando o problema
O trabalho docente é majoritariamente realizado por mulheres e isso tem
sustentado um discurso que busca conferir ao magistério características associadas ao
um padrão feminino de comportamento projetado idealisticamente como universal. No
entanto, conforme alerta Chamon (20015 “o magistério não nasceu como uma profissão
feminina, quer no Brasil, quer em outros países” (p. 43).
De fato, até o século XIX a docência era uma profissão marcadamente
masculina, o processo de feminização começa a ocorrer no Brasil a partir da segunda
metade deste século em função da criação de novos postos de trabalho por conta do
início do processo de industrialização que favoreceu a evasão dos homens do
magistério. Por outro lado, a consolidação do projeto nacional, de inspiração positivista
projetava a mulher como elemento essencial para garantir o bem-estar físico e moral da
família, célula fundamental da nação brasileira (CHAMON, 2005). Segundo a autora,
um discurso que destacava a superioridade moral e o altruísmo das mulheres como
ferramentas essenciais para o desenvolvimento da nação. Um processo que pressupunha
a formação de uma identidade nacional unificada, capaz de expressar o ideal de ser
brasileiro. Um projeto carregado de marcas da modernidade em que essa identidade
unitária e homogênea tinha como padrão o homem, branco europeu e cristão. Dessa
forma, o magistério “se transformou em ocupação feminina, carregando em seu bojo um
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valor peculiar: o de cumprir, estrategicamente, o papel de produzir uma nova forma de
organização escolar que surgia com os ideais republicanos” (CHAMON, 2005, p. 43)
Um modelo orientado pelo objetivo de controle das condutas de homens e
mulheres, mas com consequências ainda mais adversas para estas na medida em que são
subalternizadas frente ao masculino. As qualidades femininas exaltadas se restringiam
aquelas relacionadas à pureza e o altruísmo. A doação à família que, posteriormente vai
justificar a “vocação” para o magistério, profissão que possibilitaria às mulheres
solteiras a sublimação da maternidade, da necessidade de exercer o amor aos filhos e a
família a que estavam destinadas (LOURO, 1997). Uma atividade que se confunde com
o sacerdócio, exigindo sacrifício e abnegação, pressupondo doação desinteressada.
Essa construção discursiva continua presente socialmente sustentando a ideia de
magistério como uma profissão mais adequada às mulheres. No entanto, são vários os
estudos que denunciam esta concepção como uma construção cultural e não como
determinação natural imposta às fêmeas da espécie humana (ENGUITA (1991);
LOPES (1991a); (1991b); SACRISTAN (1991)), por exemplo. Reflexões que nos
ajudam a entender a constituição de uma categoria profissional dinâmica, afinal o papel
e a função das mulheres têm sofrido profundas transformações e introduzem novas
formas de olhar as motivações e as práticas das professoras.
Nesse quadro, sem desconsiderar a complexidade dos problemas implicados na
constituição da profissão e no exercício da docência, faço opção por enfatizar a análise
das relações de gênero acreditando que ela pode ajudar a compreender as formas pelas
quais o magistério sofre com e ao mesmo tempo tende a reproduzir práticas de
regulação e controle de comportamentos culturais significados como mais adequados.
Interessa investigar como as práticas heteronormativas projetem e favorecem o controle
identitário almejado pelas políticas curriculares em curso as demandas por formação de
um novo perfil de trabalhador-cidadão tem justificado discursos de afirmação de um
protagonismo da escola, e consequentemente, docente ao mesmo tempo em que se
intensificam os mecanismos de controle que cerceiam o exercício desse protagonismo
em um contexto em que se proliferam discursos que culpabilizam os docentes pelos
resultados obtidos pelos alunos em ranqueamentos produzidos a partir dos resultados das
avaliações em larga escala. Cito os resultados. Metas que têm por pressuposto a formação de em
identidades idealizadas e padronizadas, tanto de professora quanto de alunos, e nessa
perspectiva cabe indagar a que projeto democrático servem políticas orientadas pela lógica de
controle e padronização cultural? Uma lógica que, para além da celebração à diversidade,
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11944ISSN 2177-336X
mantém a invisibilidade de gênero ao abordar os desafios de uma profissão eminentemente
feminina.
A dimensão de gênero é um elemento a mais na complexidade que caracteriza o
fazer educativo, mas ele não define a problemática educacional. No entanto, a
desvalorização da professora, em especial a profissional que atua nos anos iniciais de
escolarização, reforça a subalternidade feminina, principalmente quando as professoras
são caracterizadas como incapazes de ensinar e que por isso mesmo devem ter a sua
autonomia controlada. Devem ser permanentemente orientadas sobre o que fazer pois só
assim poderão dar conta dos desafios posto para a educação. É esse protagonismo
cerceado que precisa ser questionado também pelo seu aspecto contraditório: da mesma
maneira que a professora é vista como promotora de conhecimento, ela tende a ser
responsável pelo fracasso de seus alunos em função de uma avaliação que, via de regra,
deprecia o seu trabalho e formação, considerada insuficiente e com pouca formação
específica e cultural. Assim, para além da imagem de professora como “salvadora”,
assistimos um processo de desvalorização profissional, assumido, inclusive, ainda que
implicitamente pelas próprias docentes.
Por outro lado, elementos da tradição que dão ênfase aos aspectos vocacionais
para definir o trabalho docente, ainda são muito presentes no cotidiano das escolas, nas
falas dos responsáveis e das próprias profissionais. São comuns discursos que projetam
a “boa professora” como aquelas que, independentemente das condições adversas, „dão
suas vidas‟ para formar seus alunos. Professoras que consideram “normal” usar seus
próprios recursos financeiros para comprar materiais para seus alunos, realizar trabalhos
que extrapolam a carga horária definida em seus contratos de trabalho. Via de regra, são
mulheres que vêm seu trabalho como uma atividade que tende a ser vista como algo que
se sustenta apenas como „compromisso e amor‟. Dessa forma, independente das
condições de trabalho e da valorização do trabalho do professor, o que se espera é que
ele supere as dificuldades e dê conta das demandas que lhes são impostas.
A realidade árdua que afeta os alunos dificultando o processo de escolarização é
esquecida e mais uma vez o professor é considerado como aquele que deve „fazer
floresta no deserto‟ alcançando seu aluno de qualquer maneira. Um discurso que se
reconfigura e mantém traços de sentidos articulados nos discursos que circulavam no
início do processo de feminização do trabalho docente acentuando características como
amor e abnegação para definir a docência como atividade feminina. Um discurso que se
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reconfigura mas continua projetando a professora como a grande artífice de um projeto
identitário nacional.
Aporte teórico
Ao pensarmos em professoras, devemos pensar em mulheres, contudo esta é
uma categoria problemática, pois não se trata apenas de uma condição biológica. Me
apoio em Laclau e Mouffe (2015) que, assumindo que toda configuração social é
significativa, concluem “que toda identidade ou objeto discursivo é constituído no
contexto de uma ação” (p. 40). Isso implica afirmar que a definição do que seja uma
mulher a partir de determinados atributos associados a feminilidade nada mais é do que
uma construção discursiva, dado que, ainda segundo os autores, não existe relação
direta e transparente entre significante e significado. Um significado não representa
alguma coisa existente na realidade. Não é possível conter o processo de significação e
definir unicamente o que é ser uma mulher.
Butler (2015) questiona a dualidade entre sexo como fator biológico e gênero
como algo construído socialmente, para a autora o sexo biológico não é algo ahistórico
e isento de relações de poder, o sexo é uma força para definir qual papel de gênero e
sexual um indivíduo pode ser coagido a exercer.
Se o sexo é, ele próprio, uma categoria tomada em seu gênero, não faz
sentido definir o gênero como interpretação cultural do sexo. O gênero
não deve ser meramente concebido como uma inscrição cultural de
significado num sexo previamente dado (uma concepção jurídica);
tem de designar também o aparato mesmo de produção mediante o
qual os próprios sexo são estabelecidos. Resulta daí que o gênero não
está para a cultura como o sexo não está para a natureza (p.27).
Todo corpo é generificado antes do nascimento: ao vemos uma gravidez e
questionamos qual o sexo do bebê esperado, ao saber da resposta, já mergulhamos o
sujeito nos discursos que permeiam seu sexo. Se o bebê tiver pênis já nos referimos a
ele como menino. Será criado num discurso generificado: provavelmente seu quarto
será azul, ela ganhará carrinhos, ao se tornar adulto, espera-se que ele seja um homem
viril e se apaixone por mulheres. Se o bebê tiver vagina nos referimos a ela como
meninas. Provavelmente terá um quarto rosa, ganhará bonecas e será iniciada a ser
cuidadora, quieta, delicada. Ao crescer espera-se que homem e mulher se relacionem
sexualmente, construindo famílias, preservando a espécie. Devemos admitir que mesmo
que não nascemos como menino (gênero masculino) ou menina (gênero feminino)
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11946ISSN 2177-336X
desde antes do nosso nascimento já estamos fomos macho ou fêmea e que a partir do
nosso sexo, nosso corpo é subjetivado à lógicas heteronormativas que irão gerir nossas
condutas.
Butler (2015) não entende que nossos corpos atingem a materialidade quando
cortamos o cabelo ou fazemos uma tatuagem, A materialidade do corpo existe quando
só podemos compreendê-lo por meio dos discursos. O corpo está inserido num contexto
cultural que impõe um conjunto de normas a cada sujeito inserido de maneira pessoal
por meio das relações de poder.
Citando Lopes (2013, p. 8),
não controlamos plenamente os sentidos do que dizemos e muito
menos sabemos o que somos, pois o que somos depende do outro, do
contexto. Nem o eu, nem o outro, nem o contexto são identidades a
priori. O sujeito – entendido como subjetivação – é um projeto
inconcluso, um significante circulando a depender de uma
significação sempre adiada.
Nessa perspectiva, o corpo generificado é aquele que abraça as possibilidades
para assumir uma „forma‟ cultural, se subordinando às normas impostas ou
transgredindo-as formando um corpo fora do padrão considerado estranho ou
inexistente.
O sexo em Butler não é um atributo fisiológico, trata-se de nossa identidade
sexualizada, de percebemos como somos convocados a assumir nosso sexo genital a
partir de uma dada posição social. O pênis e a vagina se tornam artefatos culturais pois
são significados em meio a relações de poder.
O conceito de performatividade, desenvolvido por Butler (1993) é produtivo
para a compreensão do processo de constituição das identidades de gênero. A autora
argumenta que gênero não é algo substantivo, mas algo que implica uma ação. O sujeito
„mergulha‟ em discursos generificados antes de seu nascimento e assume um gênero
que pode ser (ou não) o esperado para seu sexo. A escolha não é algo livre pois implica
com o que é esperado para o sujeito numa lógica heteronormativa, a autora se questiona
até onde as identidades de gênero se formam por conta das regulações da
heterossexualidade que todos nos evidenciamos sociocultural. Um corpo performativo
não é apenas uma descrição do que seria um homem ou uma mulher, mas um ser
constituído de papeis a desempenhar conforme o sexo que ele possui. Para Salih (2015)
“o gênero não é apenas um processo, mas um tipo particular de processo, um conjunto
de atos repetidos no interior de um quadro regulatório altamente rígido” (p. 89).
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O gênero é uma parodia pois é sempre uma imitação de algo já existente,
contudo Butler (2015) argumenta que quando uma pessoa desempenha uma
performance de gênero que não é de seu sexo esperado, ele desnaturaliza a
performatividade dos corpos. A autora cita o caso da Drag Queen como ilustração para
argumentar que quando uma Drag se veste de mulher mostra o quanto não é natural ser
mulher apenas por que se tem uma vagina. Ser mulher é uma identidade de gênero que
implica na regulação de um corpo. Este pode ser um ato subversivo pois desestabiliza
por alguns momentos a heteronormatividade existente.
Ao percebemos os gêneros como uma „roupa‟ por cima de corpos sexualizados
não podemos entendê-los como algo natural. O sexo é efeito de relações de poder que
regulam nossos corpos, poder que, de uma perspectiva pós-estruturalista, concebemos
como descentrado. Sem um centro de onde emana (LACLAU, 2011), sem alguém que o
personifique definitiva e cabalmente. Portanto, se sexo é efeito de relações de poder que
nos regulam e discriminam, não como saber quem „determinou estas normas‟, apenas
questioná-las como algo não natural, questionar as performatividades exercidas.
Também apoiada em uma abordagem pós-estruturalista afirmo que não se trata
de normas fixas. Com Laclau e Mouffe (2010) procuro entender os processos pelos
quais essas normas assumem uma dimensão de universalidade e passam a representar
uma totalidade. Trata-se de um processo de constituição hegemônica que os autores
afirmam ser sempre contingente e provisório. Os sentidos hegemônicos são
permanentemente confrontados. Por isso, os padrões heteronormativos são rompidos,
principalmente por aqueles que não se encaixam/subordinam a eles.
A docência: uma profissão para heteronormatividade
Nenhum ambiente social está distante da realidade da hetoronormatividade, a
docência quando se feminiliza assume a perfomatividade esperada para as mulheres. O
magistério após o século XIX se torna uma profissão permitida e indicada às mulheres
no momento em que se tornou uma extensão para a dimensão pública, do papel social
exercido pelas mulheres no espaço privado.
As transformações sociais que possibilitaram a entrada das mulheres no
magistério favoreceram a produção de novas performances sem que elas significassem o
rompimento com o sexismo. A ciência, por exemplo, produziu argumentos “científicos”
para justificar a adequação feminina à educação infantil. Diversas teorias passaram a
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considerar que o afeto que (característica do feminino hegemônico) era de extrema
importância para o desenvolvimento pleno das crianças. O afeto associado à condição
feminina como algo universal, como se só mulheres pudessem amar seus alunos
incondicionalmente. Louro (1997, p. 98) destaca que, dessa forma, “a representação do
magistério passa, então, a ser mais claramente feminina- pelo menos o magistério
primário ou de primeiro grau”. A profissão perfeita para as mulheres, já que o sucesso
pedagógico passa a ser associada às características do feminino hegemônico, tais como
o amor e a abnegação.
Louro (1997) também faz referência à preocupação com o comportamento
esperado dessa profissional que passou a merecer a atenção do poder público, de
políticos, de religiosos e exaltadas em poesias, músicas, alegorias, para que, ao longo do
tempo possam se constituir profissionalmente, “adquirindo contornos que permitem
reconhecê-la imediatamente” (p.98).
As professoras sofriam processos de regulação de suas condutas e sexualidade.
Deveriam ser honestas, puras. Segundo Louro (1997), era comum a normalista recém-
formada se afastar da escola quando se casava pois esta era a constatação de que tivera
atividade sexual. A pureza da mulher era significada como um elemento da ação
pedagógica.
No caso das solteiras, como já destacamos anteriormente, o magistério
possibilitava a sublimação da maternidade não realizada, a oportunidade de exercerem o
amor maternal. Casamento e a maternidade eram consideradas as verdadeiras carreiras
das mulheres e qualquer outra atividade profissional um desvio dessas funções sociais
(LOURO, 1997).
Apesar do romantismo, em geral o magistério implicava em um trabalho árduo,
com uma baixíssima renumeração, péssimas condições de trabalho e um imenso
controle sobre seus corpos e vidas. Muitas professoras se sustentavam e eventualmente
sustentavam suas casas com seus vencimentos.
É fato que as mulheres avançaram conquistam direitos fundamentais ao longo do
século XX. No entanto, o sexismo e a consequente discriminação de gênero assumem
novos contornos. Os avanços produziram novas performances que continuam a regular
comportamentos esperados de homens e mulheres. O exercício da docência continua
implicado nessas regulações mantendo rastros de uma tradição que configura as formas
pelas quais a docência e concebida. Ainda hoje as professoras consideradas como boas
profissionais são aquelas que „dão suas vidas‟ para formar seus alunos, independente
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das condições em que ele realiza este trabalho. Ainda hoje existem profissionais que
veem seu trabalho como um sacerdócio que deve ser realizado independente das
dificuldades. Uma atividade que tende a ser vista como algo que se sustenta apenas
como „compromisso e amor‟.
Elementos de uma tradição que carrega sentidos da profissão semelhantes
àqueles articulados no início do processo de feminização, quando o trabalho em sala de
aula se tornou tão precário que, considerando-o humilhante, os homens o abandonaram.
As professoras de nosso tempo ainda sofrem com a questão salarial. O mais
preocupante é que esta questão não é tão evidenciada nas agendas políticas, ao
contrário, vemos alguns políticos falarem publicamente que o professorado não deveria
se preocupar com o salário. Nessa perspectiva, independente das condições de trabalho
e da valorização do trabalho do professor, o que se espera é que ele supere as
dificuldades e dê conta das demandas que lhes são impostas. A realidade árdua que
afeta os alunos dificultando o processo de escolarização é esquecida e mais uma vez o
professor é considerado como aquele que deve „fazer floresta no deserto‟ alcançando
seu aluno de qualquer maneira.
Se a pureza deixou de ser solicitada de forma explícita, um tipo de recato, um
comportamento sexual “adequado” continua orientando as expectativas pois continua
tratando-se de ensinar valores considerados como mais adequados. Ou seja, práticas
sexistas regulam o exercício da docência.
A sala de aula e as práticas heteronormativas
Sabe-se que crenças, hábitos e opiniões circulam em uma sala de aula tanto
quanto os conhecimentos formais. Nenhuma prática social é neutra. Toda ação humana
é significativa (LACLAU; MOUFFE, 2015). Na sala de aula não acontece diferente e as
professoras podem se tornar as grandes influenciadoras na formação de crianças que
passam boa parte de suas vidas sob os seus cuidados. Mas a escola também pode ser
seletiva e exclusiva. Instituição em que são definidos os espaços de poder que cada um
irá ocupar. Definições, em grande parte simbólicas, como por exemplo, a fila para sair
da sala de aula, as brincadeiras propostas, a escolha do livro didático. Definições que,
via de regra expressam práticas sexistas, heteronormativas que tendem a ser
naturalizadas. É “natural” os meninos precisarem de mais espaço para as suas
brincadeiras, são agitados. As meninas, mais clamas, não precisam de muito espaço.
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Mas via de regra têm o seu invadidos pelos meninos. O estabelecimento sobre o tipo de
brinquedo e/ou brincadeira mais adequado a meninos e meninas também é comum: é
“natural” uma menina não brincar com um carrinho porque carrinhos são para meninos.
E meninos serem desestimulados brincarem de bonecas, brinquedo de menina. A
separação por cor azul para meninos e rosa para as meninas, idem. Toda essa
„naturalidade‟ nos revela um social marcado pelo machismo em sala de aula. Conforme
diz Louro (1997):
Currículos, normas, procedimentos de ensino, teorias, linguagem,
materiais didáticos, processos de avaliação são, seguramente loci das
diferenças de gênero, sexualidade, etnia, classe- são constituídos por
essas distinções e, ao mesmo tempo, seus produtores. Todas essas
dimensões precisam, pois, ser colocadas em questão. (p.64)
Diante da existência de práticas hetoronormativas, podemos pensar o quanto
próprio histórico da formação docente está permeado pela heterossexualidade
compulsória. O discurso de formar professoras pois elas poderiam educar as crianças
como mães revelam como a determinação do papel de gênero está presente no trabalho
docente. Uma professora que muitas vezes manda uma aluna „se sentar como uma
menina‟ não está se vendo como uma mulher que está exercendo uma prática sexista e
sim uma mulher que está „educando‟ sua aluna, ensinando aquilo que a sociedade espera
para a futura cidadã.
O debate sobre a questão das práticas heteronormativas também passa pelo
entendimento de como professoras são também atingidas por elas, é necessário
questionar o quanto o sexismo atinge o magistério. A docência dita como uma profissão
„feminina‟ é marcada por questões como baixa renumeração, falta de valorização,
assédios que as professoras vivem nas escolas, questões do controle de trabalho.
Para além de questionarmos e criticarmos as práticas heteronormativas em sala
de aula, devemos nos atentar para debates na formação e no trabalho docente, não na
perspectiva de culpabilização docente sim numa perspectiva de desconstrução de certas
práticas que são pensadas como corretas em sala de aula. Questionando o „papel
feminino‟ que uma docente desempenha questionando como a baixa renumeração e a
desvalorização profissional estão relacionadas a isso. O conceito perfomatividade está
implicado nestas problematizações: perceber o quanto a identidade sexualizada dos
alunos implica nos papeis que eles desempenham em sala de aula é um dos embates a
serem problematizados para derrubar práticas heteronormativas, quebrar fronteiras do
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que seria para meninos e meninas afim de pensar para além do binarismo
masculino/feminino.
Considerações
O processo de feminização docente foi permeada por discursos que marcavam o
feminino hegemônico como ferramenta pedagógica. Características ditas do feminino
hegemônico que passam a ser associadas a condição para o sucesso em sala de aula
negando-se outras necessidades como condições de trabalho, salário e valorização
docente. Esse processo de construção discursiva estabeleceu uma série de normas
performáticas que passaram a definir a docência e permanecem como rastros de
elementos que ainda orientam as formas pelas quais a docência tem sido pensada. A
concepção de magistério como sacerdócio é um exemplo dessa marca que prevalece em
discursos que circulam socialmente desconsiderando a complexidade envolvida na
profissão. Desconsiderando o magistério como uma profissão. Uma profissão que, em
sua constituição, incorporou sentidos associados a um padrão feminino hegemônico
como elemento importante para o sucesso da docência. Com isso, práticas
heteronormativas disseminadas socialmente tendem a ser reproduzidas na escola, em
um ciclo vicioso que pouco contribui para a emergência de relações mais democráticas.
Por isso, as práticas heteronormativas que ocorrem em sala de aula devem ser
problematizadas, sem desconsiderar o fato de que, ainda que sejam agentes nesse
processo, as professoras também são vítimas subordinadas a performances que regulam
seus comportamentos e corpos. A heterossexualidade compulsória está presente em
todos os discursos de nossa sociedade, inclusive na escola, contudo este é um ambiente
rico para debates e práticas que promovam a desconstrução. Este ambiente pode se
tornar um local em que valores como justiça, igualdade e diversidade são os pilares,
para isso devemos ter uma educação democracia em que todos devem ser ouvidos.
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11953ISSN 2177-336X
POR UMA DIDÁTICA E UMA PRÁTICA QUE DESINVIZIBILIZE AS
QUESTÕES DE GÊNERO E SEXUALIDADE NA ESCOLA
Hiller Soares Santana
Secretaria Municipal do Rio de Janeiro -RJ
Doutorando pelo PROPED/UERJ
RESUMO
O presente artigo tem por propósito, a partir de uma perspectiva pós-crítica, apresentar a
possibilidade de desinvizibilizar as questões de gênero e sexualidade no currículo, na
didática e na prática de ensino de nossas escolas, tendo por base, uma compreensão de
que as identidades de gênero e as performances de sexualidade podem ser versáteis,
flexíveis e não apenas identidades binárias, como querem fazer crer os discursos
hegemônicos heteronormativos. Inspirado por alguns discursos emitidos por professores
acerca de alunos “rompentes” da norma, indago como políticas afirmativas que
valorizam a diferença poderiam contribuir no combate à homofobia no espaço escolar
favorecendo numa redução dos casos de violência contra a população LGBT em nossa
sociedade. Intento também ressaltar que os discursos produzidos sobre “os diferentes”,
não ensejam apenas identifica-los como sujeitos vitimados, mas como sujeitos que
sobrevivem aos traumas da exclusão social, os fortalecessem e ajudam na afirmação de
suas identidades como exceção à norma. Entendo que quando estes sujeitos evidenciam
suas identidades “rompentes”, além de desafiarem os discursos hegemônicos
heteronormativos emitidos verbalmente, enfrentam também os discursos silenciados,
evidenciados por atitudes preconceituosas, que não são explicitadas nos discursos
verbalizados. Procurando romper com a lógica excludente das vozes da diferença faço
as seguintes indagações: como a formação docente, através das didáticas e das práticas
de ensino abordam a temática de gênero e sexualidade? Como lidam com os alunos
rompentes da heteronormatividade? Indago também se há uma presença de discursos e
proposições pautadas na desinvizibilização desses alunos? Acreditando que não há
respostas prontas para essas questões, faço de minhas considerações finais um convite
para que a discussão enseje a construção coletiva de políticas curriculares afirmativas e
ações efetivas de combate à homofobia no campo da didática e da prática de ensino.
Palavras-chaves: Desinvizibilização, gênero, sexualidade.
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Não luto por identidades, luto por direitos. Nunca acreditei ser uma mulher presa
num corpo de homem. Meu corpo é que sempre foi prisioneiro deste grande campo de
concentração chamado sociedade. Não é possível que no século XXI um órgão
(genital) represente o todo de uma pessoa, ou seja a sua personalidade.
Letícia Lanz1
Introdução
Apropriei-me dessa fala de Letícia Lanz, ditas numa mesa redonda no Seminário
Internacional Desfazendo Gênero, do qual participei apresentando o trabalho Políticas
de currículo como oposição ao silenciamento produtor de homofobia no cotidiano
escolar, para apresentar a discussão que eu desejo fazer neste artigo, cuja temática já
fora apresentada no próprio título.
Quero pensar numa proposição que problematize, no ensino da didática e na
formação para a pratica educativa, as identidades fixadas e como isso penso estar
contribuindo para pensarmos numa perspectiva de desinvizibilização “dos diferentes”
da escola e partir deste paradigma, combater as fobias de gênero e sexualidade ainda
muito presentes “no chão” de nossas escolas.
Acredito que a didática inspirando práticas educativas baseadas em um currículo
pensado como espaço-tempo de fronteira cultural, como defendido por Elizabeth
Macedo (2006), seja uma boa maneira para entendermos que as performances de gênero
e sexualidades tão presentes em nossas escolas, sejam encaradas como ações políticas a
garantir o direito individual e da livre expressão da diversidade de nossa sociedade
refletida no espaço escolar.
Na contemporaneidade, a subjetividade humana tem procurado buscar diferentes
significados para responder as seguintes perguntas: “quem sou eu?” e “quem somos
nós?” Na tentativa de encontrar respostas, várias identidades são inventadas
(JOHNSON; 2010, p. 27). Várias distinções são propostas: identidade de gênero,
identidade étnica, identidade de classe, identidade sexual, dentre tantas outras que são
criadas para atender às demandas e aspirações que as condutas humanas tentam
estabilizar. Entretanto, essas identidades são materializadas, ainda que apenas
circunstancialmente, na tensão entre os acordos dos diferentes grupos que empreendem
essas lutas.
Minha intenção com este texto é indagar sobre como algumas políticas
curriculares afirmativas poderiam influenciar a didática, inspirando práticas de ensino
que contemplem a diferença, através da desinvizibilização de gênero e sexualidade no
ambiente escolar.
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Ciente de que a escola é um espaço da diversidade, foco nas diferenças presentes
na escola. Reconheço que elas são múltiplas, assim como também são múltiplos os
discursos produzidos neste ambiente a cerca daqueles que rompem com os padrões
normativos de gênero e sexualidade. Por esta razão, meu maior intento neste texto é
apenas questionar discursos produzidos sobre “os diferentes”, não apenas como sujeitos
vitimados, mas como sujeitos que sobrevivem aos traumas da exclusão social, e que
mesmo com esses traumas, afirmam suas identidades rompentes. Estes sujeitos, além de
desafiarem os discursos hegemônicos heteronormativos emitidos verbalmente,
enfrentam também os discursos silenciados. Com esta atitude, penso, eles
desinvizibilizam-se e rompem com a opressão. Neste ponto quero salientar que,
produções discursivas, verbalizadas ou “silenciadas”, comprometidas com as ideologias
sexistas hegemônicas, reforçam a heterossexualidade como norma. Esse “fundamento
heteronormativo”, no meu entendimento tem como propósito manter o status quo de
uma sociedade machista e hierarquizada na questão de gênero e de performance na
representação da sexualidade.
Pensando no reverso dessa lógica, tenho pesquisado em minha pós-graduação
(especialização, mestrado e agora no doutorado) o contraponto dos discursos que a
sustentam, ou seja, pesquiso as políticas curriculares que tem desinvizibilizado os
discursos dos “diferentes”, trazendo-os à tona na arena de disputas discursivas, para que
as vozes destoantes também possam ser ouvidas.
Referencial teórico
O suporte teórico que sustenta a defesa deste estudo está ancorado basicamente
em três pilares: na centralidade da cultura como pano de fundo da discussão de gênero e
sexualidade; nas políticas curriculares e no cotidiano escolar, analisados à luz da teoria
do discurso, na perspectiva de pensadores da pós-modernidade, do pós-colonialismo e
do pós-estruturalismo, tais como Hall (2004), Bhabha (2011), Laclau (2011) e Mouffe
(2001), para indagar as construções culturais nos discursos em disputa no ambiente
escolar.
Dos estudos sobre políticas de currículo, identidade e diferença, aproprio-me dos
discursos de Alice Lopes e Elisabeth Macedo; dos estudos acerca do campo do currículo
e da investigação do cotidiano escolar me apoio na obra de Maria de Lourdes Tura. Dos
estudos de gênero, sexualidade e educação, utilizo Guacira Lopes Louro, numa
perspectiva pós-estruturalista e Butler referendando as abordagens feministas, e também
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criticando as essencializações e problematizando os dualismos embasados no modelo
binário (masculino/feminino) e no processo de inteligibilidade contido na sequência
sexo-gênero-desejo. Também me apoio em Michel Foucault, entre outros, para tratar
das questões de sexualidade e dos poderes hierárquicos a elas ligados.
Linha de pesquisa
Este trabalho se insere no conjunto de investigações desenvolvidas pela linha de
pesquisa “Currículo, sujeitos, conhecimento e cultura” do Programa de Pós-graduação
em Educação (PROPED) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e dentro desta
linha estabelece um diálogo com estudos desenvolvidos acerca do tema de políticas de
currículo, especificamente os que têm como foco o cotidiano escolar. Este estudo
aborda, na dimensão política da educação, preocupações como: práticas excludentes, a
lógica homogeneizante do sistema de ensino e a hierarquização das diferenças, mas
também apresenta a perspectiva de reconhecer a necessidade de um currículo que
contemple direitos e deveres equânimes quando se trata de pensar políticas curriculares
que incluam a diferença. Pensar a diferença dentro da diversidade social e cultural dos
indivíduos que convivem no espaço escolar, com suas múltiplas identidades, requer em
primeiro lugar que compreendamos que essa multiplicidade tem a necessidade de
realizar negociações nos “espaços de fronteiras” das inter-relações para o
estabelecimento da convivência. Este estudo está alinhado ao projeto de pesquisa
Políticas Educacionais e o Cotidiano Escolar, coordenado pela Professora Drª. Maria de
Lourdes Rangel Tura.
A diferença na diversidade
“O que difere de nós, nos causa desconforto e certa irracionalidade, tão somente porque não
sabemos analisar profundamente essas sensações, já que elas são produzidas pelos discursos
sociais em disputa”. (Luft, 2010, p.31)
Fleuri (2006) afirma que o tema da diferença e da identidade sociocultural, assim
como o reconhecimento da perspectiva intercultural aparecem com muita força no
campo da educação, no Brasil, com o desenvolvimento do Referencial Curricular
Nacional para as Escolas Indígenas, com as políticas afirmativas das minorias étnicas,
com as diversas propostas de inclusão de pessoas portadoras de necessidades especiais
na escola regular, com a ampliação e reconhecimento dos movimentos de gênero e nos
diferentes processos educativos.
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Nos últimos tempos o debate sobre os direitos civis dos homossexuais tem sido
uma constante nos principais meios de comunicação, nos movimentos sociais e nos
mais diversos segmentos das sociedades mundiais e também na sociedade brasileira.
Assim como são frequentes as manchetes sobre atos de violência (muitos resultando em
óbitos) praticados contra a população LGBT2 que comprova a intolerância e o ódio a
estas pessoas, através de práticas homofóbicas.
A expressão homofobia significa medo do homossexualismo. O medo do
homossexualismo gera, nos indivíduos que têm essa fobia, uma necessidade de forçar o
indivíduo homossexual a negar os seus desejos e de querer dirigi-los a procurar o sexo
oposto com o objetivo de que possam se “curar” da “opção” de desejo pelo mesmo
sexo, além, é claro, de incitar a reprodução como uma forma de afirmar a identidade
heterossexual como a correta. A homofobia pode se entender como típica de pessoas
que, consciente ou inconscientemente, ainda têm muitas dúvidas e angústias sobre sua
identidade sexual. Como mecanismo de defesa dessa insegurança, estas pessoas
costumam ridicularizar e agredir os homossexuais. A homofobia extrema leva os
sujeitos homofóbicos a fazerem investidas até no sentido de assassinarem
homossexuais.
Segmentos conservadores da sociedade, geralmente ligados às religiões mais
conservadoras e pessoas, escondidas atrás de uma pretensa liberdade de expressão e de
uma suposta liderança religiosa comandam uma desenfreada disseminação da
intolerância, do preconceito e da violência aos LGBTT‟s, afrontando o conceito de
Estado Laico e os direitos fundamentais previstos na Declaração Universal dos Direitos
Humanos, tão bem assimilados por nossa Constituição de 1988.
De um modo geral as sociedades modernas, desde o advento dos movimentos
LGBTT‟s, subsequentes ao movimento feminista, vem se dividindo entre os que apoiam
a causa desta população e os que a ela se opõem.
Posicionando-me no apoio problematizo este texto com as seguintes indagações:
como a formação docente, através das didáticas e das práticas de ensino abordam a
temática de gênero e sexualidade? Como lidam com os alunos rompentes da
heteronormatividade? Há uma presença de discursos e proposições pautadas na
desinvizibilização desses alunos?
Foucault (1984) nos encaminha para a percepção dos significados de algumas
análises dos múltiplos discursos produzidos sobre a diferença enquanto exercício de
sexualidade. Ele constata, baseando-se na teoria das complexas redes de poder que
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através das instituições, dos discursos, dos códigos, das práticas e dos símbolos,
constituem-se hierarquias entre os gêneros e sobre as manifestações externas ao padrão
hegemônico heteronormativo.
Chantal Mouffe (In: MENDES e SOARES, 2001) afirma “que reconhecer a
existência de relações de poder e a necessidade de transformá-las enquanto renunciamos
à ilusão de que poderíamos nos libertar totalmente do poder, é o que é específico para o
projeto da democracia radical e plural”. Neste sentido cabe também investigar se no
ambiente escolar há uma equiparação dos poderes discursivos. Caso não haja, devemos
discutir quais as formas de introduzir, por meio dos currículos ou das práticas
cotidianas, os discursos anti-homofobia nos diferentes ambientes das escolas. Esta
medida já consiste num instrumento de luta, uma vez que ao colocá-los na arena de
disputas ideológicas, os mesmos contribuirão, num médio ou longo prazo, senão para
erradicar, mas ao menos para diminuir as práticas homofóbicas e evitar índices de
violência alarmantes como os que são apresentados ultimamente pela imprensa.
A dimensão social da identidade atingida pelo gênero e pela sexualidade.
Historicamente, os sujeitos tornam-se conscientes de seus corpos na medida em
que há um investimento disciplinar sobre eles. É por meio da representação que a
identidade e a diferença passam a existir e se ligam a sistemas de poder. Meninos e
meninas aprendem desde cedo piadas e zombarias, apelidos e gestos direcionados
àqueles que não se ajustam aos padrões de gênero e de sexualidade admitidos na cultura
heteronormativa em que vivem. A escola, igreja, família e a sociedade em geral são
instituições que determinam e moldam comportamentos. A mídia, sobretudo, estabelece
padrões de personalidade. Dessa forma, separam e discriminam parte das pessoas que
não seguem rótulos estabelecidos.
Segundo Louro (1999), nossos corpos constituem nossa própria identidade e
recebem significação e alteração pela cultura continuamente. Há algumas décadas, a
sexualidade parecia não ter nenhuma dimensão social. Esse era um assunto particular
eventualmente confidenciado a um/a amigo/a próximo/a. Viver plenamente a
sexualidade era privilégio da vida adulta, a ser partilhado, segundo a norma
hegemônica, com um parceiro do sexo oposto. Hoje, as várias formas de se vivenciar
prazeres corporais são divulgadas e influenciadas socialmente de maneira (quase)
explícita pelos diferentes meios de comunicação.
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A exposição dos corpos tem importante papel persuasivo. Michel Foucault
(1988) ilustra que:
Nas relações de poder, a sexualidade não é o elemento mais rígido, mas um dos
dotados de maior instrumentalidade: utilizável num maior número de manobras, e
podendo servir de ponto de apoio, de articulação às mais variadas estratégias. (p. 98.)
As distintas possibilidades de se vivenciar desejos corporais são sempre
anunciadas socialmente, hoje com mais frequência e de forma explícita, o que interfere,
direta ou indiretamente, no modo de viver e na construção de novas identidades sexuais
e de gênero. Importante mencionar que essas “novas identidades sociais tornam-se
visíveis, provocando em seu processo de afirmação e diferenciação novas divisões
sociais e o nascimento do que passou a ser conhecido como política de identidades”
(HALL, 1997; apud LOURO; 1999, p. 10). Categorias e fronteiras sexuais consideradas
por muito tempo imutáveis e universais ganham novos sentidos e são, portanto,
definidas por relações sociais e moldadas pelas redes de poder de determinada
sociedade. Em vista disso, torna-se coerente ratificar que “a sexualidade não é apenas
uma questão pessoal, mas é social e política” (LOURO; 1999, p. 11).
A pós-identidade como possibilidade.
As identidades devem ser pensadas enquanto processos em constante formação.
Nada que seja fechado, estruturado e acabado. Elas devem estar ligadas ao
conhecimento que é constantemente construído. Por isso, a aproximação das questões
de gênero e sexualidade com o currículo, com as didáticas e com as práticas de ensino
que o implementam, não deve ser também algo fechado. Ao contrário, por apresentar
sempre uma incompletude, essa aproximação deve permitir lacunas para questionar, no
contexto da prática, o que é delimitado como normatizado, e a partir desse
questionamento reconhecer que os sujeitos buscam construir relações entre si e suas
identificações a partir de processos de hibridizações culturais.
O currículo, a didática e a pratica de ensino precisam problematizar as
estratégias normalizadoras que, no quadro de outras identidades sexuais e também no
contexto de outros grupos identitários, pretendem ditar e restringir as formas de viver e
de ser, ou seja, pôr em questão as classificações e os enquadramentos. Apreciar a
transgressão e o atravessamento das fronteiras, explorar a ambiguidade e a fluidez.
Esses instrumentos precisam reinventar e reconstruir, como práticas
pedagógicas, estratégias e procedimentos acionados pelos “diferentes”, que devem ser
incluídos.
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O combate à homofobia poderia ter avanços numa perspectiva pós-identitária.
Essa perspectiva é, para mim, uma possibilidade de desconstrução de identidades
fixadas e apresenta-se como uma forma de pensar criticamente as identidades, pois esta
seria uma pedagogia que „fala‟ a todos e não se dirige apenas àqueles ou àquelas que se
reconhecem na posição de sujeito da diferença. Essa pedagogia sugere o
questionamento, a desnaturalização e a incerteza como estratégias férteis e criativas para
pensar qualquer dimensão da existência. A dúvida deixa de ser desconfortável e nociva
para se tornar estimulante e produtiva. As questões insolúveis não cessam as discussões,
mas, em vez disso, sugerem a busca de outras perspectivas, incitam a formulação de
outras perguntas, provocam o posicionamento a partir de outro lugar. Certamente, essas
estratégias acabam por contribuir na produção de uma determinada identidade. Mas,
neste caso, longe de pretender atingir, finalmente, um modelo ideal, essas identidades
do sujeito juntamente com essa pedagogia assumem seu caráter intencionalmente
inconcluso e incompleto. A pós-identidade é então essa desrotulação dos sujeitos.
Problematização.
Como a comunidade escolar percebe e desinvizibiliza as/os alunas/os que
manifestam um comportamento de gênero diverso da norma heterossexual? Quanto
as/os profissionais sabem sobre as manifestações de gênero e sexualidade dos alunos?
Qual a intervenção das/os profissionais da educação nessa desinvizibilização?
Neste artigo, repito, importa-me particularmente discutir a relação com a
diferença na escola, materializada nas preocupações dos(as) profissionais da educação
com as/os alunos que se afastam de uma suposta normatividade de gênero. A seguir
apresento alguns desses relatos, discursivamente emitidos por alguns docentes,
elementos importantes na construção da “cultura escolar” de uma escola pública da rede
municipal do Rio de Janeiro, que denominarei ficticiamente como Escola Chico
Buarque. Estes relatos foram obtidos durante a pesquisa que culminou com a defesa da
minha dissertação do mestrado de acordo com o que se pode ler em SANTANA, 20143.
Para preservar a identidade dos professores, a eles atribuí nomes também
fictícios. São todos identificados com nomes de flores.
Relatos e considerações:
1) A aluna vestia-se e comportava-se como um homem; vivia em conflito com as meninas;
aproximava-se somente dos meninos, não participava de nada que é comum ao sexo
feminino, ao ponto de pedir à direção autorização de uso de banheiro masculino.
Atualmente, tenho outra aluna que já afirmou que não irá à formatura, pois não veste
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vestido e isso não faz parte do “real” dela. Esta aluna até pouco tempo “ficava” com
um menino, talvez tentando dar uma satisfação para a comunidade, sociedade etc.
Porém, passados alguns meses ela “indicou” através de “novas posturas” que isso faz
parte do passado e daí o fato de não usar mais vestido. Professora Açucena.
Este relato está centrado na descrição comportamental das alunas e na forma
como elas se apresentavam ou eram vistas pela professora. Nele, no que se refere às
inter-relações, há a indicação de que as alunas “provocam conflitos na convivência com
as meninas. ” Uma das alunas se apresenta, através do discurso da professora, como
alguém que não se enquadra dentro do comportamento esperado para uma menina. O
relato indica que a aluna questiona a normatização do vestuário feminino e se rebela
contra o seu uso. Em conversa posterior com a professora pude perceber que este fato
lhe causava aborrecimento, pois Açucena considera que a aluna “pode exercer sua
sexualidade, mas querer se vestir igual a um homem é um absurdo”. A professora
parece desconhecer que a forma de vestuário tanto masculino como feminino é apenas
uma convenção estabelecida social e culturalmente. Em muitos países há uma
similaridade entre as vestimentas de homens e mulheres. A cultura árabe é um exemplo
disso.
2) Um aluno com visual diferenciado dos outros alunos na mesma idade; mantinha uma
relação às vezes conturbada com os colegas e apresentava desempenho abaixo do
esperado. Professor Girassol.
O discurso do professor está focado na descrição do estereótipo da diferença, na
descrição da dificuldade do aluno em manter boas relações com os demais colegas e na
afirmação de que o desempenho acadêmico desse aluno está “abaixo do esperado”. O
professor em questão teve, em quase todos os momentos da pesquisa, atitudes de
preconceito com os homossexuais. Faz piadas o tempo inteiro sobre a sexualidade de
alguns alunos, descrevendo-os como palavras discriminatórias que, por bom senso, me
recuso a citar aqui. Para Girassol, “homem tem que ser homem e mulher tem que ser
mulher. Tudo fora disso é falta de vergonha na cara”. Embora isso tenha me parecido
assustador, desse professor não vi dissimulação discursiva, ele expressou sua opinião
claramente com base em seus princípios ideológicos e religiosos.
3) As/os alunas/os que conheci apresentavam desempenho escolar normal; mantinham
boas relações interpessoais. Porém em diversos momentos eram vítimas de
preconceitos por parte de alguns colegas de sala. Professor Crisântemo.
Este relato difere de todos os anteriores porque coloca em questão os
preconceitos sofridos pelas/os alunas/os “diferentes”, apresentando-as/os como
“vítimas”, ao mesmo tempo afirmando que essas/es alunas/os diferentes apresentam
uma semelhança com as/os demais alunas/os em seu desempenho escolar. De acordo
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com as palavras do professor, podemos inferir que o mesmo tem um olhar crítico para a
situação de vulnerabilidade das/os alunas/os rompentes.
4) Observo nestes alunos que o acompanhamento dos pais é precário ou mesmo
inexistente. Os responsáveis não frequentam as reuniões da escola e raramente
comparecem quando são solicitados em particular pelo professor. De acordo com os
relatos dos próprios alunos, eles passam a maior parte do tempo ocioso na rua com
outros colegas, seja durante o dia ou à noite. O relacionamento com os outros colegas
em sala de aula é sempre conturbado já que a grande maioria sente a necessidade de
se auto afirmar e fazem isso por meio da agressão física ou verbal. São poucos
aqueles que possuem bom desempenho escolar, pois a preocupação em sala é
principalmente serem aceitos pelo grupo e para conseguir isso eles agradam ou
agridem constantemente. Professora Orquídea.
A professora, antes de fazer uma descrição das/os alunas/os com características
rompentes da norma padrão heteronormativa, faz uma crítica à falta de
acompanhamento dos pais na vida escolar dos filhos (não somente dos alunos
diferentes). Ela também critica a falta de perspectiva dessas/es alunas/os que não
desenvolvem atividades ficando a maior parte de seu tempo na rua fora do horário
escolar. Ela registra as relações conturbadas dessas/es alunas/os com seus colegas em
função da “necessidade de autoafirmação” delas/es, inclusive com atitudes de agressão
física ou verbal. Segundo a professora elas/es “agridem ou agradam” para serem
aceitas/os. Seria esse um comportamento de negociação? Entretanto a professora não
expressou como os colegas agem com essas/es alunos. Se há uma necessidade de
negociar as relações é porque certamente existem tensões e preconceitos mediando-as.
Considerações provisórias: abrindo o diálogo.
Os relatos e as análises acima, nos quais são apresentadas algumas construções
identitárias de alunos “rompentes” por professores apenas reforçam, em mim, a crença
de que a escola precisa começar a pensar num paradigma pós identitário que contemple
a pluralidade. Creio que há a necessidade de pensarmos coletivamente em proposições
de políticas curriculares afirmativas a serem apresentadas pelas didáticas e
implementadas nas práticas de ensino que contemplem a diferença, colaborando assim
com ruptura do silenciamento de gênero e sexualidade ainda muito presente no
ambiente escolar.
Vivemos uma pós-modernidade de hibridismos ou hibridização (BHABHA,
2011), na qual conceitos diversos são reconstruídos, reinventados, recontextualizados e
rediscutidos e as Ciências Humanas devem atentar para esta realidade na construção
epistemológica do conhecimento. Se neste contexto de pós-modernidade com
predomínio de uma cultura neoliberal, na qual são relativizados todos os valores,
inclusive aqueles que visavam distinguir práticas igualitárias (pautadas por um princípio
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de justiça social) das práticas mercadológicas (pautadas pelo lucro), é fundamental,
como sugere Amorim (2003, p.13), analisarmos o argumento de defesa da diversidade,
pois em muitas vezes, ele é um modo de ocultamento da desigualdade social que está na
origem da diferença. Para além de valorizar as/os alunas/os não heterossexuais que
venceram a homofobia no cotidiano escolar, desejo identificar as diferenças internas
desses “diferentes”, para não igualar o desigual.
Discutir e combater a homofobia no contexto escolar não é tarefa fácil. Exige
criatividade, revisão dos próprios conceitos e, mesmo, questionamentos acerca das
posturas de alguns profissionais da educação. É preciso romper o pacto de silêncio ao
redor das sexualidades. O silêncio do educador diante de ofensas, maus-tratos e outras
formas de violência com conteúdo homofóbico, legitimam práticas que verdadeiramente
devem ser combatidas. A orientação sexual na escola deve ser entendida como um
processo de intervenção pedagógica que tem como objetivo transmitir informações e
problematizar questões relacionadas à sexualidade, incluindo-se mudanças de posturas,
crenças, tabus e valores a ela relacionados. Penso que assim se pode compreender o
diferente como possibilidade e não como aberração
Notas
1. Integrante da mesa redonda Biografias e resistências: narrativas trans. Em 15 de agosto de 2013, como parte da programação do Seminário Internacional Desfazendo Gênero – subjetividade, cidadania e transfeminismo, realizado na Universidade Federal do Rio Grande do Norte, em Natal, entre os dias 14 e 16 de agosto de 2013.
2. LGBT ou ainda, LGBTTs é o acrônimo de Lésbicas, Gays, Travestis, Transgêneros (o ‘s’ se refere aos simpatizantes). Embora refira a penas a seis, é utilizado para identificar todas as orientações sexuais minoritárias e manifestações de identidade de gênero divergentes do sexo designado no nascimento.
3. Dissertação apresentada, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre, ao Programa de Pós-Graduação em Educação, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Área de concentração: Currículo: Sujeito, Conhecimento e Cultura.
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