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Revista Lugares de Educao, Bananeiras/PB, v. 1, n. 2, p. 325-346 , jul.-dez. 2011 ISSN 2237-1451
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REFLETINDO SOBRE A DIFICULDADE DE LEITURA EM ALUNOS DO ENSINO
SUPERIOR: DEFICINCIA OU SIMPLES FALTA DE HBITO?
Cleber Tourinho1
RESUMO: Este trabalho tem como objetivo realizar uma reflexo a respeito da prtica da leitura por alunos da Educao Superior. Destacam-se aspectos sociais e histricos, bem como um panorama da leitura no Brasil, em que se expe o avano do livro e da leitura, com destaque para seus conceitos e suas funes. Estuda-se tambm a importncia da leitura no processo educacional, salientando a interpretao, a compreenso e a intertextualidade, abordando-se nesse item o perfil do leitor brasileiro, principalmente quando ele cursa o nvel superior. Relata-se a importncia de um maior envolvimento dos graduandos no processo de leitura, aps a reflexo sobre o pouco hbito desta entre eles e o porqu da distncia entre o livro e o leitor. Observa-se que a preocupao quanto ao acesso leitura global, contudo, no Brasil, entre vrias dificuldades, esto as questes de formao do leitor desde o mbito familiar e escolar e a massificao e perda de qualidade do Ensino Superior atual, redundando em prticas acadmicas de leitura mecanizadas e foradas. Conclui-se que a criao de hbitos de leitura perpassa um iderio no apenas sociopoltico, mas tambm cultural, por isso fundamental, para a construo de cidados crticos, que esses sujeitos-leitores sejam capazes de tornar a leitura uma constante, no apenas no nvel acadmico, mas enquanto objeto de fruio de prazer, informao e conhecimento, permitindo a eles a reflexo e modificao da realidade a sua volta. Palavras-chave: Leitura. Hbitos de leitura. Ensino Superior.
1 INTRODUO
A leitura vista como parte essencial na educao do indivduo. No entanto, o
hbito de ler do aluno brasileiro um grande ponto de interrogao. S nos Estados
Unidos entre 1975 e 1977 foram publicadas 1.588 pesquisas voltadas para a rea de
leitura vinculada somente em uma revista especializada (SILVA, 2005). No Brasil,
apesar de serem comuns os comentrios sobre a crise da leitura que atravessa o
pas, no se tem uma verdadeira dimenso deste problema, simplesmente porque
no h pesquisas publicadas em nmero suficiente sobre este tema, e as que
existem, na maior parte das vezes, so referentes alfabetizao. Aps a incluso
da redao no vestibular, surgiram alguns estudos, mas apenas no mbito da
escrita. No nvel universitrio, no qual h uma insatisfao geral dos professores em
relao leitura por parte dos seus alunos, ainda no existem pesquisas
1 Mestrando em Letras e Lingustica (PPGLL/UFBA). Pesquisador do Projeto Vertentes
UFBA/CNPq. Licenciado em Letras Vernculas (UFBA). Professor da rede municipal de Pitimbu/PB. E-mail: clebertourinho@gmail.com
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significativas que mostrem a natureza do aluno-leitor ou dos livros a eles
apresentados.
No obstante, apesar dos poucos dados encontrados, pode-se afirmar com
segurana que o atual estudante de nvel universitrio no pas, em sua maioria,
despreza a leitura como fonte de entretenimento, informao e crescimento pessoal,
limitando-se, na maior parte das ocasies, a apenas ler aquilo que obrigado por
necessidade das disciplinas cursadas, como atividades, apostilas e livros passados
pelos professores. Ou seja, mesmo dominando os rudimentos da leitura e da escrita,
e sendo capazes de entender um texto de forma razovel, possuindo um nvel de
escolarizao acima da mdia, essas pessoas no se sentem bem em praticar a
leitura. Passam, por isso, ao largo do que se considera Alfabetizao Funcional 2.
O reflexo dessa realidade histrica do povo brasileiro se projeta na educao,
desde a estrutura familiar, passando pelo Ensino Fundamental e estendendo-se at
o Ensino Superior. diante de tantos questionamentos sobre a atual conjuntura a
respeito da leitura, do pouco interesse ou da falta de incentivo s pesquisas sobre o
tema, principalmente entre as prprias Instituies de Ensino Superior, que se torna
vital um aprofundamento em relao perspectiva de ser esta uma deficincia ou,
caso seja necessrio se utilizar de outro expediente terminolgico, o simples pouco
hbito da leitura (algo volitivo) por parte dos estudantes universitrios.
Tais inquietaes relativas ao tema advm da crena de que um bom leitor
pode criar melhores condies para a diversificao e ampliao das informaes
que so veiculadas a ele. Saber ler uma exigncia das sociedades modernas. H,
porm, uma importante diferena entre saber ler e praticar efetivamente a leitura: se
aquela uma necessidade pragmtica e permite a realizao individual de
atividades bsicas, como executar tarefas cotidianas, a esta um importante
instrumento para o exerccio da cidadania e para a incluso social do indivduo.
2 O conceito de alfabetizao funcional indica quo bem os indivduos adultos usam a informao
escrita para funcionar em sociedade e prestar sua contribuio econmica. Trata-se de uma particular capacidade e modo de comportamento das pessoas. Sua definio mais amplamente aceita origina-se de um levantamento norte americano denominado YALS - Young Adult Literacy Survey, de 1985. De acordo com o YALS (1986, apud MOREIRA, 2005), a alfabetizao funcional [...] a habilidade (de um indivduo adulto) de usar informao escrita e impressa para funcionar em sociedade, para atingir seus objetivos e para desenvolver seu conhecimento e potencial.
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RELEVNCIA SCIO-HISTRICA DA LEITURA
Historicamente, a leitura tem sido reconhecida como uma atividade elitista,
sinnimo de erudio, de saber. Cada perodo da histria, por conseguinte, teve sua
espcie de leitura, a depender das necessidades do povo e de cada indivduo. Na
realidade, a prpria noo de Histria tem a ver com a gnese da escrita, do
momento que o homem artificializou sua fala e registrou-a, codificando e esperando
que outros semelhantes seus entendessem esse mesmo cdigo. Porm, muito antes
da criao da escrita e da leitura, o ser humano expressava suas ideias, desejos e
necessidades em desenhos e sinais gravados nos lugares em que habitava ou por
onde passava, para se comunicar, garantir a propriedade, expressar suas
conquistas, etc.
As relaes do homem com o mundo esto mediadas por sua percepo e
construdas pela linguagem. Esta de carter social, pois a condio de sua
existncia a troca e a comunicao. Para Orlandi (1998, p. 220), a leitura no
uma questo de tudo ou nada, uma questo de natureza, de modos de relao, de
trabalho, de produo de sentido, em uma palavra: de historicidade. Assim, o ato de
ler implica participar do processo coletivo de construo dos sentidos, ou seja,
quando estamos lendo, o fazemos de um lugar e com uma direo histrica
determinada.
Em que pese a grande evoluo que acompanhou a leitura desde o incio da
Histria, foi apenas nos ltimos dois sculos que esta atividade passou a estar
indissociavelmente ligada escrita, pois a concepo de leitura do passado era bem
diversa do conceito abraado pela contemporaneidade, variando em funo das
prticas sociais e das tcnicas de impresso da escrita de cada poca. Portanto, a
leitura foi assumindo novas dimenses, estabelecendo parmetros hodiernos para a
constituio do leitor atual.
Autores contemporneos ressaltam veementemente a importncia do ato de
ler. Freire (2006), por exemplo, defende que a leitura deve ser vista como uma
conquista do ser humano em seu processo de evoluo. Toda sociedade produz
uma memria cultural, e a leitura um meio importante para o conhecimento e a
transformao das ideias, dos instrumentos e tcnicas produzidos pelo homem. E se
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esta for levada para o mbito crtico e reflexivo, cumpre o papel de combater a
alienao e promove a libertao de um povo. Todos os membros de uma sociedade
civilizada so obrigados a utilizarem e repassarem vrias formas de leitura e
interpretao de livros, jornais, revistas, relatrios, resumos, cartas, material digital
(com o auxlio dos computadores) de forma crtica e consciente. Nesse sentido,
Freire (2006, p. 59) apresenta um enfoque interessante:
Um texto para ser lido um texto para ser estudado. Um texto para ser estudado um texto para ser interpretado. [...] No podemos interpretar um texto se o lemos sem ateno, sem curiosidade. [...] Estudar exige disciplina [...] criar e recriar e no repetir o que os outros dizem. Estudar um dever revolucionrio.
No Brasil, boa parte da leitura no feita em livros, mas em jornais e revistas,
no obstante o papel dos mediadores sociais, tais como a biblioteca, a editora, as
instituies de ensino, a imprensa, a livraria, os eventos culturais, etc. Esses
mediadores de leitura assumem o papel responsvel pela constituio ou no do
dilogo entre o autor, a obra e o leitor.
Ainda assim, o fato incontestvel que o brasileiro informa-se mais pela
televiso. Nem mesmo o advento da internet aumentou a dimenso da leitura no
pas, pois muitos, ao invs de utilizar essa ferramenta importantssima a seu favor,
como fonte infinita de possibilidades de acesso ao conhecimento humano escrito,
preferem alienar-se com as piores opes oferecidas pela rede mundial de
computadores. Infelizmente, essa situao uma ameaa aos desenvolvimentos
social, econmico e poltico do pas.
SOBRE A NOO DE LEITURA
Definir leitura, em um sentido amplo, vista como atividade intelectual humana,
no tarefa das mais fceis. Complicado e limitador tentar conceituar e descrever
as interfaces que compem o todo da atividade, analisar os elementos que integram
seu campo de ao, procurando ainda circunstancializar as situaes em que se
realiza e determinar os papis que desempenha durante sua produo, bem como
estudar e entender os autores componentes de tal realizao (FREIRE, 2006).
Por leitura entende-se aquele processo no qual o sujeito realiza ativamente
um trabalho de construo do significado do texto. Segundo Coelho (2002), a leitura,
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no sentido de compreenso do mundo, condio bsica do ser humano. A
compreenso e o sentido daquilo que o cerca inicia-se na tenra infncia, quando os
sons, os odores, os toques, os sabores so interpretados ou lidos pelo beb,
quando a criana comea a interagir com seu meio, sendo-lhe oportunizadas
condies de aprendizagem (MARTINS, 1994). O processo simblico, contudo,
inicia-se efetivamente quando a criana tem acesso e oportunidade de usar o
material escrito, como tambm estando em contato com ambientes favorveis
leitura, na presena de livros, jornais, revistas etc.
Conforme Andraus Jnior e Santos (1999), as condies ambientais so
determinantemente incentivadoras para o desenvolvimento na criana pelo prazer
em ler. Entretanto, a realidade do prospectivo leitor brasileiro , em geral, pouco
estimulante: a maioria dos pais no l e pouqussimos se preocupam em fazer com
que os filhos leiam, sendo outorgado escola o papel de incentivar a leitura nos
seus alunos. Assim, para a formao de leitores, so considerados elementos
fundamentais a escola e a famlia. A mtua relao dessas instituies favorece o
desenvolvimento da leitura e, sobretudo, o gostar de ler. Segundo Zilberman (1988,
p. 56):
O processo de formao do leitor est vinculado num primeiro momento caracterstica fsica (dimenses materiais) e sociais (interao humana) do contexto familiar, isto , presena de livros, de leitores e situaes de leitura que configura um quadro especfico de estmulo scio cultural.
Portanto, caberia famlia a iniciao da leitura entre as crianas, habituando-
as desde a mais tenra idade a ouvir cantigas de ninar, rimas, adivinhaes, lendas,
fabulaes. As histrias lidas ou contadas oportunizam o contato com livros e
revistas, incentivando-as a folhe-los e a l-los atravs de ilustraes. Esse ato leva,
frequentemente, a criana a visitar livrarias, bibliotecas e feiras de livros infantis.
Alm do mais, se existe em casa um ambiente favorvel para leitura, elas, por sua
vez, procuraro reproduzi-lo.
Por outro lado, a realidade da famlia brasileira mediana no reflete uma
atmosfera propcia para a leitura, em funo de uma variedade enorme de causas; a
maioria dos pais vive em condies desfavorveis, seja financeira ou culturalmente,
e no tem ambiente adequado que fomente o hbito de ler. Poucos so aqueles que
tm uma pequena biblioteca em casa, ou que costumam trazer livros e revistas para
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o lar, o mesmo presentear os filhos e parentes com novidades literrias, entre outros
aspectos. Na realidade, a famlia transfere para a escola toda a responsabilidade da
formao do leitor. Por sua vez, a escola (principalmente a pblica) no est
preparada para desenvolver eficazmente o processo de leitura, por ser uma
instituio tambm problemtica, porm, ainda o espao que oferece oportunidade
concreta de atuao em favor da leitura, incentivando na criana e no jovem o hbito
de ler. Segundo Silva (2005, p.32):
Seria difcil conceber uma escola onde a ato de ler no estivesse presente isto ocorre porque o patrimnio histrico, cultural e cientfico da humanidade se encontra fixado em diferentes tipos de livros [...]. O acesso aos bens culturais, proporcionados por uma educao democrtica, pode muitas vezes significar o acesso aos veculos onde bens se encontram registrados, entre ele os livros.
A leitura j foi analisada como um ato solitrio, porm, hoje se sabe que ela
no se constitui como um ato isolado, nem como uma atividade monolgica do
indivduo, pois este, ao decifrar um texto de qualquer espcie, interage com os
leitores virtuais criados pelo autor e tambm com esse prprio autor. O texto passa a
exercer uma mediao entre sujeitos, tendo a incumbncia de estabelecer relaes
plurais entre leitores reais e virtuais, que so plurais tambm. Assim, Orlandi (1998,
p. 29) explica:
O ato de ler s se d verdadeiramente entre um leitor virtual, que constitudo no prprio ato da escrita e um leitor real, na medida em que esse leitor imaginrio, criado pelo autor, dialoga com esse leitor real, com esse leitor que l o texto e dele se apropria.
A partir dessa interao, institui-se a atividade fundamental da leitura, o jogo
entre leitores, que so os atores do referido processo, realizando-o de forma a
permitir enlaar e atravessar os diversos sentidos do texto, num desafio que se
mostra como atividade social e histrica aparentemente tomada por individual, j que
todo sujeito-leitor sempre produz sua leitura em determinadas condies e em
determinado lugar social. Leitor e leitura se constituem, pois, como elementos vitais
de interlocuo contnua a alargar indefinidamente as possibilidades de atribuies
de sentidos, atuando na construo de um processo social de mo dupla,
desenvolvendo um tipo de ao que se d em espao amplo, visto que os diversos
sentidos atribudos a um texto e dele tambm absorvidos entram em consonncia
com a histria de vida de cada um.
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Conforme Martins (1994, p. 31), existem muitas concepes de leitura, e
estas podem restringir-se a duas caracterizaes, a saber:
[...] 1) Como uma decodificao mecnica de signos lingusticos, por meio de aprendizado estabelecido a partir do condicionamento estmulo-resposta (perspectiva behavorista-skinneriana); 2) Como um processo de compreenso abrangente, cuja dinmica envolve componentes sensoriais, emocionais, intelectuais, fisiolgicos, neurolgicos, bem como culturais, econmicos e polticos (perspectiva cognitivo-sociolgica).
De fato, o processo de leitura composto por etapas: a primeira seria a
decodificao de sinais, sendo apenas o momento inicial do processo, quando
acontece a decifrao dos sinais grficos; a segunda seria a atribuio de
significaes, pela qual o indivduo apreende uma acepo de superfcie e promove
uma desmontagem do texto para atingir o significado do discurso.
Silva (2005, p. 45) explica: compreender a mensagem, compreender-se na
mensagem, compreender-se pela mensagem eis a os trs propsitos
fundamentais da leitura. Ou seja, a leitura uma forma pela qual o leitor
compreende e interpreta o que est escrito, mas sua funo vai muito alm da
comunicao leitor-texto. Para esta autora, a leitura uma ponte para a tomada de
conscincia crtica de mundo.
Kleiman (1989, p. 77) afirma que conhecimento prvio o conhecimento
anterior que o leitor possui e que se utiliza na hora de compreender um texto
qualquer. Isto significa que, para ler, o leitor utiliza o que j sabe, um conhecimento
adquirido ao longo de sua vida. Portanto, so nveis de conhecimentos prvios
leitura: conhecimentos lingusticos, que abrangem o conhecimento implcito da
lngua materna, as regras internalizadas, os significados usuais, o vocabulrio, o
conhecimento textual que embarca noes e conceitos que o leitor possui como
tipos variados de textos, formas de discurso, estrutura peculiar dos gneros; e
conhecimento do mundo, que compreende o conhecimento do contedo do assunto
tratado no texto lido, envolvendo situaes eventuais com que j nos deparamos e
que entram em ao no momento da leitura.
Todos esses nveis de conhecimento participam do processo de compreenso
de um texto qualquer, da a importncia de as instituies de ensino proporcionarem
leituras diversas, capazes de ampliar o universo cognitivo que o aluno adquire
quando exposto escolarizao. Alm disso, precisa-se verificar se h no
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processo de leitura a compreenso do leitor diante do texto, pois este constitui o elo
entre o autor e o leitor. De fato, para chegar universidade, o aluno j deveria ter
este entendimento de como ler e compreender um texto, pois preciso que ele seja
independente, criativo, capaz de buscar alternativas, formular hipteses, estabelecer
proposies originais, recombinar elementos textuais, estabelecer novas relaes do
texto com experincias vividas e, assim, ter uma compreenso crtica e criativa da
leitura em questo.
Para Orlandi (1998), h dois tipos de leitura: a parafrsica e a polissmica. A
primeira limita-se a repetir o que o autor diz, no h anlise do que lido, o leitor
no atribui significado ao texto, ele apenas decodifica o que est escrito. O segundo
tipo, a polissmica, atribui mltiplos significados ao texto, ou seja, o leitor, medida
que l, vai tirando suas concluses e formando um juzo de valor. No se trata
apenas de absorver as palavras escritas, mas de captar a mensagem enviada por
estas palavras.
A leitura assim considerada como um processo constante de elaborao e
verificao de previses que levam construo de uma interpretao. Considera-
se que este processo de previso deve ser ensinado e aprendido em sala de aula, e
o professor tem o papel fundamental de formular prognsticos diante do texto
trabalhado, explicar aos alunos em que ele se baseou para formul-las, e deve
tambm articular previses que no se realizem para que o aluno verifique o que
aconteceu. A inteno desta atividade induzir o aluno a participar, elaborando
tambm suas prprias antevises durante a leitura de um texto, lembrando que o
tema e os objetivos estipulados para serem lidos so extremamente importantes
porque oferecem ao leitor maior garantia de xito na construo da sua
interpretao.
Atravs das definies at aqui expostas, fica claro que as diversas
abordagens de leitura esto dependentes e interligadas, ou seja, uma necessita da
outra para que a leitura seja realizada. H, entretanto, uma reciprocidade de
necessidades entre tais categorias. Martins (1994) tem muito cuidado ao apresentar
sua viso de leitura, pois muito subjetiva esta questo. Cada indivduo a v de
maneira diferente, e isto dificulta uma reflexo concreta. Ademais, Paulo Freire
imortalizou-se defendendo o ensino da leitura a partir do universo vocabular do
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alfabetizando. Nesta perspectiva, acerca da importncia do ato de ler, o educador
afirma que a leitura do mundo precede a leitura da palavra (FREIRE, 2006, p. 11).
Para Freire (2006, p. 11), o ato de ler no se esgota na decodificao pura
da palavra escrita ou da linguagem escrita, mas se antecipa e se alonga na
inteligncia do mundo. O educador pernambucano explica ainda que a leitura da
palavra no implica na ruptura do contexto com seu mundo imediato. Pelo contrrio,
ele percebeu que, ao longo da escolarizao, nem sempre a leitura da palavra foi a
leitura da palavra mundo, e por isso ele prope um conceito de leitura dinmica,
contnua, capaz de inter-relacionar palavra e mundo, teoria e prtica.
Concordemente, o ato de ler uma atividade que implica no somente a
decodificao de smbolos; envolve uma srie de estratgias que permitem ao
indivduo compreender o que l. Neste sentido, relatam os Parmetros Curriculares
Nacionais PCNs (1997, p. 54):
Um leitor competente algum que, por iniciativa prpria, capaz de selecionar, dentre os trechos que circulam socialmente, aqueles que podem atender a uma necessidade sua. Que consegue utilizar estratgias de leitura adequada para abord-los de forma a atender a essa necessidade.
Assim, pode-se observar que a capacidade para aprender est ligada ao
contexto pessoal do indivduo. Lajolo e Zilberman (2002) afirmam que cada leitor
entrelaa o significado pessoal de suas leituras de mundo com os vrios significados
que ele encontrou ao longo da histria de um livro, por exemplo. O ato de ler, ento,
no deve representar apenas a decodificao, j que esta no se liga imediatamente
a uma experincia, fantasia ou necessidade do indivduo. De acordo com os PCNs
(1997), a decodificao apenas uma das vrias etapas de desenvolvimento da
leitura. A compreenso das ideias percebidas, a interpretao e a avaliao so as
outras etapas que, segundo Bamberger (2000, p.23), fundem-se no ato da leitura.
Desta forma, espera-se que o leitor competente trabalhe com a diversidade textual,
desenvolvendo pessoal e significativamente as etapas de leitura a fim de atingir sua
excelncia.
Santos (1998) explica que a falta de motivao para a leitura tem sido
apontada como a causa de vrios contratempos, pois muitos que tm dificuldades
para ler evitam situaes em que seja preciso faz-lo. Ademais, como esses sujeitos
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no conseguem desenvolver a prtica de ler, ocorre a diminuio da motivao e a
instalao lenta e gradual da relutncia para realizar essa atividade.
Com base nas noes apresentadas, no h dvidas de que o estudante
universitrio precisa ter bem em mente o que de fato significa a leitura. No basta
apenas decodificar o texto, ler por ler. Necessita-se de uma preparao prvia, de
um conhecimento anterior de mundo, que permitir ao discente relacionar suas
atuais leituras com outras vises j internalizadas. Talvez a esteja uma das
problemticas para o baixo interesse pela leitura e seus respectivos efeitos: falta ao
graduando um cabedal de conhecimentos anteriores, fornecido pela convivncia em
sociedade, pelo debate, pela discusso e observao do mundo ao seu redor, que o
permita fazer uma ponte com os temas a serem escolhidos para se ler. Faltam
subsdios epistemolgicos necessrios para a ativao subjetiva do interesse pelo
ato de ler, os quais serviriam de degraus condutores ao entendimento do texto e,
consequentemente, do aumento do interesse pessoal pela leitura.
A FORMAO E O PERFIL DO LEITOR BRASILEIRO
Orlandi (1998) traa os seguintes perfis para os leitores em geral:
a) O leitor visto como uma posio vazia, sem que se leve em conta a sua
histria de leitura, a qual moldada pela instituio de ensino a que faz parte;
b) O leitor visto enquanto agente da prpria leitura, sendo responsvel por
sua histria, manifestando sua posio de sujeito-leitor;
c) O leitor em uma posio intermediria. Aqui, a instituio na qual ele se
insere aceita as regras de dominao, mas, mesmo sem expor sua leitura,
desenvolve um discurso de resistncia.
Witter (1997) faz referncia a uma pesquisa que visava a caracterizar o leitor
universitrio, investigando seu envolvimento com a leitura tanto no nvel acadmico
como no nvel extra-acadmico. Os resultados revelam que, embora a leitura esteja
presente nas atividades dos universitrios, no se prioriza a leitura acadmica de
cunho cientfico, mas a prosa de fico e revistas. Foi identificado ainda, nesta
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pesquisa, que a prtica da leitura dos universitrios est estreitamente ligada
frequncia e ao nvel de escolaridade dos pais.
Orlandi (1998) se props a estudar o perfil do leitor brasileiro no contexto
escolar, tendo realizado vrias pesquisas, nas quais analisou diversos aspectos
responsveis pela formao do perfil do leitor brasileiro. Ao abordar a questo da
interpretao, a autora percebeu que o estudante geralmente adere leitura do
professor e deixa silenciar a sua prpria, at por uma questo de necessidade, j
que ele depende da aprovao da instituio de ensino, necessitando das notas
para progresso serial. As avaliaes servem para mostrar que no existe um leitor
modelo, e este se adapta ao padro das instituies por onde passa. Assim, a
escola contribui para que o lugar do leitor fique vazio no contexto da realidade
brasileira, porque o educando geralmente no tem a oportunidade de mostrar sua
interpretao frente s leituras realizadas. A histria de leitura do aluno apagada
porque o seu posicionamento em relao s outras leituras ignorado at por ele
mesmo, muitas vezes por comodismo.
Martins (2002) deixa claro que os estudantes das Instituies de Ensino
Superior devem ter um compromisso maior com a sociedade e consigo mesmos,
porque na fase adulta que a leitura de textos mais complexos e narrativas com
interpretaes mais amplas e mais complicadas enriquece o vocabulrio, desenvolve
ainda mais a capacidade de reflexo e interpretao e dinamiza o raciocnio lgico.
Portanto, o graduando deve se conscientizar do seu papel de ser um agente de sua
prpria leitura e demonstrar o seu ponto de vista, provando que um leitor
competente, ou seja, no encarando o ato de ler apenas como simples
decodificao. Ele deve assimilar estruturas gramaticais complexas, aprimorar a sua
linguagem, se expressar bem, aprender a dizer o que pensa e ser crtico. Alm
disso, o leitor universitrio competente deve ter a capacidade de praticar a
intertextualidade, ou seja, deve ser capaz de inter-relacionar a temtica e as teses
de um texto que tratam do mesmo assunto com abordagens diferentes ou
semelhantes.
PANORAMA DO ATUAL ENSINO SUPERIOR BRASILEIRO
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Pode-se afirmar com segurana que existe uma significativa relao entre
leitura e Universidade, pois aquela ajuda a melhorar o desempenho dos estudantes
academicamente, assim como contribui para a qualidade no desempenho e
quantidade avaliativa dos leitores. A Universidade, enquanto instituio formadora,
assume o lugar privilegiado para desenvolver, induzir e favorecer mudanas,
assumindo um compromisso com a formao adequada s exigncias da
qualificao profissional, dando nfase leitura e formao de leitor (ALVES,
2007).
Em uma pesquisa relacionada ao Exame Nacional de Desempenho (Enade)
do ano de 2006, constatou-se que 43,6% dos universitrios brasileiros ou seja,
menos de metade deles estuda entre uma e duas horas por semana alm do
horrio de aula, 34% leem no mximo dois livros por ano, excetuando os escolares,
e 41,3% se informam mais pela televiso. A pouca dedicao leitura e ao estudo
busca sua justificativa na falta de tempo dos alunos. Segundo o Enade 2006, 68,2%
dos universitrios brasileiros estudavam noite e 73,2% trabalhavam durante o dia
(OLIVEIRA, 2007).
A profuso do nmero de Instituies de Ensino Superior tambm colabora
com esse panorama. A partir da poltica educacional brasileira, adotada entre 1995 e
2002, houve um crescimento exacerbado no nmero de faculdades privadas, com
excesso de estmulo expanso da rede particular e pouco investimento na
universidade pblica desde aquele perodo. Segundo Kostman (2004):
Nos ltimos anos, o nmero de faculdades particulares no Brasil cresceu freneticamente. Entre novembro de 2001 e julho de 2003, 544 novos estabelecimentos de Ensino Superior foram autorizados a funcionar pelo Ministrio da Educao. D quase um por dia. Desde 1995, o nmero de estudantes cursando o Ensino Superior dobrou, num setor que movimentou 15 bilhes de reais no ano passado.
Por isso, o MEC vem tentando reverter o quadro, sendo mais rigoroso no
processo de abertura de instituies e cursos, alm de exigir qualidade no ensino
oferecido. Apesar de o crescimento do nmero de instituies privadas ser benfico,
por democratizar em certa medida o acesso ao Ensino Superior, h efeitos
colaterais, pois muitas instituies abriram as portas sem um compromisso com a
qualidade do ensino (ESPAM, 2004).
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Atualmente, o mercado de acesso ao Ensino Superior no consta mais de
provas que visam a submeter o aluno a um teste pessoal de seu conhecimento
adquirido nos anos de escolaridade no ensino mdio, selecionando-se aqueles mais
preparados. Na realidade, de acordo com Kostman (2004), por todo o pas,
faculdades [particulares] disputam alunos em outdoors e na televiso. Alm disso,
[...] o mercado universitrio para as classes A e B j est saturado. Para crescer, as
faculdades precisam atrair a classe C, o que s possvel com mensalidades mais
baixas no mximo 256 reais por ms.
A partir do cruzamento de dados dos grupos do Enade 2006, observou-se que
a maioria dos estudantes da rea de sade veio de escolas particulares. Os de
licenciatura, por seu turno, vieram quase todos do ensino pblico. No caso de
Medicina, por exemplo, apenas 8,2% estudaram em escola pblica. No curso de
Letras, esse percentual sobe para 70% (OLIVEIRA, 2007).
Ademais, no custa lembrar que o Ensino Superior brasileiro quase que
totalmente noturno, privado e pago, visto que esta modalidade atrai especialmente o
aluno que precisa trabalhar para pagar a mensalidade e os gastos da faculdade e se
sustentar ao mesmo tempo. Logo, quem estuda noite e trabalha durante o dia
certamente no tem muito tempo para estudar, muito menos para ler textos diversos.
Assim, notamos que o Ensino Superior nacional, nas suas bases relacionadas
aos alunos que nele ingressam, demonstra uma clientela alijada, em sua maioria, de
hbitos costumeiros de leitura e produo textual. A maioria dos que estudam opta
pelas instituies privadas e pagas, sendo pessoas interessadas primariamente em
possuir um diploma universitrio, trabalhadores diurnos, impossibilitados de cursar
uma faculdade pblica, quer pela dificuldade em conciliar os horrios do seu labor
profissional com os estudos, quer pela incapacidade de enfrentar a concorrncia
com outros mais bem preparados para um vestibular em Universidade pblica, que
gastaram somas impensveis em excelentes cursinhos. So majoritariamente alunos
egressos de uma escola pblica de ensino bsico defasada e praticamente falida,
que no prepara o cidado para fazer uso mnimo da cultura letrada, qui do ensino
cientfico mais especializado, obrigando-os a se submeterem a uma realidade na
qual se tornam apenas mais um tijolo no muro, um simples membro da grande
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massa de educandos a engrossar as estatsticas das novas IES que todos os dias
surgem no Brasil.
A LEITURA NO ENSINO SUPERIOR UMA VISO CRTICA DA QUESTO
Os estudos mais recentes envolvendo a leitura demonstram que a maioria
dos estudantes brasileiros apresenta dificuldade de expresso oral e escrita e so
praticamente incapazes de dar sentidos aos textos. Vivem em um mundo quase sem
palavras, esvaziados de ideias, e com isso perdem a capacidade de pensar. Essa
situao catastrfica ocorre porque o aluno brasileiro costuma apenas ler
decodificando e no consegue entender o significado, isto porque a escola quase
nunca trabalha as informaes no visuais, nas quais o aluno consegue, ao mesmo
tempo em que l, compreender o sentido dos escritos.
Na concepo de Witter (1999), o aluno, ao chegar Universidade, j deveria
possuir uma capacidade de se adaptar aos diferentes contedos, possuindo tambm
um bom desempenho em leitura. No entanto, o que se observa que os novos
universitrios no esto ingressando no nvel superior como leitores plenamente
desenvolvidos, sendo por isso considerados ainda imaturos literrios.
Uma ligeira observao sobre os cursos superiores em geral demonstra um
panorama em que a leitura dos universitrios se processa como em um trabalho de
garimpo. Os estudantes buscam com dificuldade o ponto focal dos textos, divagam,
demoram a compreender o que leem, e muitas vezes se perdem entre tantos
escritos, no porque sejam extensos, mas porque no conseguem dominar os
rudimentos que conduziriam a um processamento inteligente e a uma separao
consciente dos escritos das variadas disciplinas. Assim, observamos muitos alunos
se queixarem de que tm muitos textos para ler, ou que os professores passam
textos que no entendem, no conseguem encaixar na disciplina, quando na
realidade sua capacidade de leitura morosa e desabituada que os fazem acumular
os contedos a serem lidos e a no realizarem uma intertextualidade produtiva.
Os estudantes, em qualquer parte do Brasil, ingressam no Ensino Superior
trazendo consigo uma quantidade significativa de dificuldades tanto na linguagem
em geral, como tambm naquelas relacionadas s prticas de leitura. Alguns
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autores, como Santos (1998) chegam mesmo a dizer que muitos entram na
Universidade sem compreender sequer um texto, tanto de fico quanto de no
fico. No conseguem interagir com o texto, ou seja, no so capazes de
compreender significativamente o contedo que leram, no conseguem buscar e
selecionar as informaes do texto; no apresentam uma atitude crtica e criativa em
relao ao texto lido; a maioria no gosta de ler, seja livros da prpria rea que
estuda, seja outro tipo de leituras (ALVES, 2007, p. 08).
O pouco hbito da leitura apresenta reflexos considerveis na escrita e,
consequentemente, na fala mais monitorada. comum observarmos alunos com um
vocabulrio restrito, temerosos de apresentar argumentos e raciocnios em um
debate ou seminrio, at mesmo diante de seus outros colegas, o que
extremamente preocupante no Ensino Superior, quando preciso estar com a
linguagem mais adequada. Tratando-se em especial dos alunos na rea de
Humanas, a leitura muito mais recomendada, enquanto nas reas de Exatas e
Biolgicas temos uma leitura mais tcnica. Mesmo assim, qualquer que seja seu
curso, o universitrio ter que se tornar um destro leitor, principalmente porque o
conhecimento que ele precisar absorver a partir dos tempos iniciais na
Universidade no se circunscrever somente a quatro ou cinco anos de ensino, mas
sim em uma gama de outras informaes que sero apenas adquiridas por uma
leitura aprofundada e cuidadosa. Traduzindo: no importa o curso, sempre
importante ler, e muito, e no apenas o material proposto para a sala de aula.
A discusso quanto s origens dessa deficincia (ou falta de hbito), tem
levado alguns estudiosos a interessantes consideraes. Silva (2004), aps citar
vrias pesquisas, conclui afirmando que tornar-se um bom leitor envolve as
primeiras vivncias com a leitura e a escrita, o processo pelo qual o indivduo foi
alfabetizado, o domnio que adquiriu da prpria relao ler/escrever com a
sociedade e de como aprendeu a ver a leitura como forma de conhecer o mundo.
Witter (1997, p.11) afirma: certamente as contingncias de vida anterior ao ingresso
na Universidade, o nvel de desempenho em leitura com que nela ingressa e as
condies atuais de vida do estudante so variveis que influenciam na leitura do
universitrio.
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Quando relacionamos essa realidade com a constatao do mbito
socioeconmico e poltico do Brasil, deparamo-nos com profundas questes
presentes no cotidiano de todos e que determinam suas condies materiais e
existenciais, entre elas, a desigualdade social resultante da diferena de classes,
que estabelece a relao de poder entre o explorador e o explorado, entre o rico e o
pobre, o dominante e o dominado. Nesse contexto de classes determinadas e
determinantes, surge o grande problema que fortalece a estrutura vigente e priva o
indivduo de ir ao encontro de uma leitura (do livro e do mundo) mais rica, alm da
postura crtica diante da realidade: o acesso financeiro a esse bem humano. Nem
todos conseguem dinheiro para comprar livros, jornais ou revistas, e mesmo quando
acham material de leitura gratuitamente, no tm tempo de ler, dedicando suas
horas produtivas ao estafante trabalho, que por sua vez redunda na necessidade de
descanso e lazer distantes da leitura mais simples.
Ainda para Witter (1997), o fator socioeconmico extremamente
determinante na formao do sujeito-leitor. Isso se d porque um ambiente favorvel
e motivador (o qual inclui o lugar, os pais, a escola...), serve de base precpua para
um bom desempenho em leitura. No que se refere Universidade, os lugares
tambm so importantes, assim como uma boa biblioteca com uma variedade de
livros relacionados tanto aos estudos acadmicos quanto vida pessoal dos alunos.
Alves (2007, p. 03), argumenta:
Existe um ciclo vicioso de responsabilidade no ensino da leitura na escola. Em geral, os professores das sries iniciais acusam os pais por no colaborarem no processo da leitura, os professores das sries seguintes, por sua vez, acusam os anteriores. A Universidade culpa os professores de ensino mdio que ela prpria formou pela falta de habilidades que muitos estudantes apresentam no desenvolvimento da leitura. Enfim, cada um passando a responsabilidade pela deficincia de leitura dos estudantes.
Mesmo com o discurso vlido e progressista de que os estudantes devem ler
mais para se tornarem leitores crticos e criativos, as metodologias aplicadas na
Universidade primam pela prtica de leitura solitria, dispersa e no planejada, o que
conduz a mais desinteressante. Ou seja, l-se por obrigao, como um exerccio
obrigatrio e maante que valer pontuao, como atividade-fim, desprovida de
prazer e, em muitos casos, secundarizada, apenas mais uma tarefa a ser cumprida.
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O prprio desenvolvimento pedaggico de muitas Instituies de Ensino
Superior contribui para o aumento do abismo entre o aluno e a leitura. raro o
fomento ao debate de textos diversos e de obras inteiras, enquanto chovem as
fotocpias de captulos de livros e trechos retirados da internet, descontextualizados
e mastigados pelos professores. No se faz nenhum tipo exerccio de correlao
entre os diversos textos absurdamente tcnicos e as principais obras do cnone
universal, especialmente em reas tecnolgicas e de sade. Alis, amide os
universitrios demonstram um desinteresse preocupante frente aos textos indicados
para anlise e discusso em conjunto, frequentando as aulas sem apresentarem
uma leitura prvia dos assuntos a serem debatidos.
Observamos, tambm, uma frequncia extremamente baixa de estudantes
indo s bibliotecas, ou seja, muitos no tm o hbito de usar diretamente essas
instituies, de ter contato franco com livros e peridicos de suas reas, mas apenas
esporadicamente, utilizando, quase sempre, a internet como fonte nica de suas
pesquisas (ALVES, 2007).
Interessante a observao de Freire (2006, p. 17) quanto a este aspecto.
Diz o educador:
Creio que muito de nossa insistncia, enquanto professoras e professores, em que os estudantes leiam, num semestre, um sem-nmero de captulos de livros, reside na compreenso errnea que s vezes temos do ato de ler. Em minha andarilhagem pelo mundo, no foram poucas as vezes em que jovens estudantes me falaram de sua luta s voltas com extensas bibliografias a ser muito mais devoradas do que realmente lidas ou estudadas. [...] A insistncia na quantidade de leituras sem o devido adentramento dos textos a ser compreendidos, e no mecanicamente memorizados, revela uma viso mgica da palavra escrita. Viso que urge ser superada. A mesma, ainda que encarnada desde outro ngulo, que se encontra, por exemplo, em quem escreve, quando identifica a possvel qualidade de seu trabalho, ou no, com a quantidade de pginas escritas.
Em outras palavras, entendemos que o estudante de nvel superior assusta-
se diante de uma realidade que no sua, a de ter que estar s voltas com enorme
quantidade de leituras exigidas, seguidas de uma extensa labuta com a escrita
interpretativa dessas leituras. Novamente, a formao escolar, anterior a esse
momento, detrai do ato de absorver o conhecimento cientfico, ocasionando a
retrao de leitores e pensadores, que o que deve ser o resultado dos estudos
universitrios.
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Realmente, na atualidade, cada vez mais comum observarmos estudantes
abandonarem o curso superior por sentirem que seus anseios no esto sendo
atendidos, sobretudo quando no respondem ao ensino com a aprendizagem
esperada. Sem levar em conta a possibilidade de no identificao com o curso, e
descartando outras questes de ordem socioeconmica ou at pessoal, o problema
com a absoro simples de conhecimentos do curso atravs da leitura tem se
mostrado um fator relevante para a evaso no Ensino Superior, uma vez que a
dificuldade de compreenso de textos por parte dos universitrios evidente quando
da realizao de tarefas que exigem interpretao, sntese, vocabulrio etc.
As observaes de vrios estudiosos indicam que um dos grandes
empecilhos para o satisfatrio desempenho do universitrio ao longo do curso a
falta de habilidades para compreender o discurso textual, a ponto de tornar pouco
eficiente a utilizao de textos como ferramenta de informao para ele. Dizem ainda
que muitos estudantes universitrios que possuem defasagem com relao leitura
se acomodam, arrastando-se pelas diversas disciplinas, enfrentando dificuldades
que atribuem, por exemplo, ao ensino, ao currculo, ao professor etc. (WITTER,
1997; SANTOS, 1998).
Assim, o panorama observado nos estudantes de nvel superior no Brasil
apresenta-se como um caleidoscpio de dificuldades quanto compreenso de
textos, alm do baixo nvel de habilidade de leitura entre os mesmos. Por isso,
tomando como base as consideraes de Alves (2007), defendemos que se deve
pesquisar mais sobre o tema, de maneira efetiva e cientfica, a fim de conhecer o
comportamento de leitura e a compreenso de textos em universitrios, pois estes
se constituem em elementos fundamentais no Ensino Superior. De fato, delinear
claramente a realidade e as atuais dificuldades de leitura apresentadas pelos
estudantes universitrios pode servir de subsdios para aes aplicadas na melhoria
dos profissionais que so lanados aos milhares todos os anos no mercado de
trabalho.
CONSIDERAES FINAIS
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A preocupao com a leitura e evidentemente com a escrita sempre esteve
muito presente na histria do homem, requerendo, portanto, um olhar crtico para
sua utilizao, a fim de acompanhar as tendncias sociais numa perspectiva
dialtica com a realidade. Por isso, faz-se mister que os professores das instituies
de Ensino Superior tenham conscincia do potencial transformador de cada uma de
suas disciplinas para que, atravs delas, se possa vislumbrar o leque de
possibilidades necessrio para que seus alunos sejam os principais agentes do
processo de leitura, interpretao e ao social, colocando-os na condio de
prolongamento das ideias do autor, numa perfeita sintonia, fazendo da leitura um
fato argumentativo e sincrnico.
Com base na reflexo apresentada, torna-se claro que a escassa leitura por
parte dos universitrios no pode ser simploriamente atribuda a algum critrio
volitivo, seja por m vontade ou desapego insensato dos estudantes, pois existe
um real dficit em nvel socialmente determinado, que limita o xito acadmico
desses discentes. As motivaes negativas so mais profundas do que aquilo que
est visivelmente aparente. Em geral, espera-se que eles j sejam leitores
plenamente aptos, que apresentem as vrias habilidades de absoro integral da
mensagem de um texto, pois, ao final no ensino fundamental e mdio, o aluno/leitor
j deveria ter adquirido as habilidades essenciais em termos de competncias e
motivaes para que se tornasse um bom leitor. No entanto, a realidade observada
de pessoas despreparadas para conviver no mundo da leitura, determinadas por
fatores de origem familiar, escolar e social, que no foram incitados em seu gosto
pelo ato de ler, muito menos foram levados a perceber a importncia disso na vida
como cidados plenos.
As Instituies de Ensino Superior tm consigo uma grande responsabilidade
no s para com os seus discentes, mas envolvendo toda a sociedade. Trata-se da
oportunidade de quebrar um crculo vicioso de formao de pessoas (ALVES, 2007,
p. 03) que influenciaro outros a serem da mesma forma, de fazer com que a leitura
se torne um dos principais recursos para a realizao plena da cidadania, visto ser
ela essencial a qualquer rea de conhecimento. No se trata de corrigir erros da
formao bsica dos alunos e sim represar uma situao calamitosa, evitando que
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tal fluxo de problemas continue, que sejam reproduzidos os males nos novos
profissionais em relao ao ato de ler.
Atravs da leitura com entendimento completo, ser possvel ao estudante
universitrio (re)descobrir seus talentos, despertar curiosidades e construir
atividades com fundo acadmico, aproveitando muito bem o contato com a
comunidade, podendo, assim, desenvolver projetos significativos, at para manter ou
resgatar a cultura do lugar em que vive e estender a to sonhada tomada de
conscincia crtica.
Portanto, importante conhecer melhor o aluno-leitor desde o momento em
que este ingressa na Universidade, assim como ao longo do curso, pois saber ler e
compreender o que se l so atributos essenciais para estudantes universitrios. Por
isso, com tal entendimento, consideramos necessria a realizao de pesquisas que
verifiquem o desempenho e as habilidades dos estudantes universitrios quanto
leitura, sobretudo a fim de diagnosticar, estimular, corrigir e prevenir possveis falhas
e inadequaes no ato de ler.
ABSTRACT: This article aims at reflecting on the reading practice of university students. Social and historical aspects as well as a panorama of reading in Brazil are highlighted in order to show the advance of reading with an emphasis on its concepts and functions. Also, one studies the importance of reading within educational process by pointing out some aspects, such as: interpretation, understanding and intertextuality surveyed among Brazilian university students. One reports the importance of a larger involvement in reading process of undergraduate students due to the lack of the reading habit. One observes that the concern with reading access is global; however, in Brazil, among several difficulties, questions such as readers formation in both family and school contexts, by highlighting the spread and deficiency of university education based on academic practices of forced and mechanized reading. One concludes that the creation of reading habits regards as a sociopolitical and cultural ideal. Thus, for the formation of critical citizens, readers should perform reading activity constantly not only in the academic level as well as a way of pleasure, and an acquisition of information and knowledge, by permitting them to reflect and to transform their reality. Key words: Reading. Reading Habits. University Education.
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