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UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTACAMPUS DE PRESIDENTE PRUDENTE
FACULDADE DE CINCIAS E TECNOLOGIA
RURAL E URBANO NOS MUNICPIOS DE PRESIDENTE PRUDENTE, LVARES MACHADO E MIRANTE DO
PARANAPANEMA: DOS MITOS PRETRITOS S RECENTES TRANSFORMAES
PRISCILLA BAGLI
Presidente Prudente2006
unesp
UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTACAMPUS DE PRESIDENTE PRUDENTE
FACULDADE DE CINCIAS E TECNOLOGIA
RURAL E URBANO NOS MUNICPIOS DE PRESIDENTE PRUDENTE, LVARES MACHADO E MIRANTE DO
PARANAPANEMA: DOS MITOS PRETRITOS S RECENTES TRANSFORMAES
PRISCILLA BAGLI
Dissertao apresentada ao Departamento de Geografia da Faculdade de Cincias e Tecnologia de Presidente Prudente da UNESP para obteno do ttulo de Mestre em Geografia.
Apoio : Fapesp Fundao de Apoio a Pesquisa do Estado de So Paulo.
Orientador: Bernardo Manano Fernandes.
Presidente Prudente2006
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unesp
PRISCILLA BAGLI
RURAL E URBANO NOS MUNICPIOS DE PRESIDENTE PRUDENTE, LVARES MACHADO E MIRANTE DO
PARANAPANEMA: DOS MITOS PRETRITOS S RECENTES TRANSFORMAES
COMISSO JULGADORA
DISSERTAO PARA OBTENO DO GRAU DE MESTRE
Presidente e orientador: Bernardo Manano Fernandes
2 () examidador (a): Maria Encarnao Beltro Spsito
3 () examinador (a): Jlio Csar Suzuki
Presidente Prudente, 12 de Abril de 2006.
3
Ao meu pai, Jos Haroldo, a minha me, Ana
Maria, aos meus irmos, Ricardo e Fabrcio, a minha cunhada, Silvia, e, especialmente ao meu
sobrinho, Caio Vincius: pessoas queridas das quais estive distante (por diversas vezes) em razo da
dedicao vida acadmica.Eis o resultado, enfim.
A vocs, dedico com todo amor e carinho.
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AGRADECIMENTOS
A minha me Ana pelo carinho e seu jeito coruja de ser.
A alguns professores mais do que especiais: Prof. Srgio Braz Magaldi,
porque a confiana em mim depositada durante os anos de graduao solidificou as bases da
minha caminhada; Prof. Antonio Nivaldo Hespanhol, pois suas disciplinas sempre
contriburam para aprofundar minhas reflexes; Prof. Joo Osvaldo Rodrigues Nunes, que
com ateno se ocupou em ler minha dissertao e dar contribuies; Antonio Thomaz Jnior,
que, embora distante no momento da dissertao (o homem foi para a terra das touradas),
sempre esteve presente em minha vida acadmica, seja nas disciplinas, nos trabalhos de
campo, nas bancas de monografia e projeto de mestrado. Essa dissertao como um
mosaico: tem um pedacinho de cada um deles.
Aos amigos: Sandro Rodrigues (Sandro), Rones e Robson (os
inseparveis), Jean talo (esse, o apelido no posso revelar), Simone (Casadei), Eduardo (Du),
Moiss (Moisa), Solange (cobrssima), Cristiane Ramalho (Cris), Juliana (Criartura), Evandro
(n-cego, doidinho), Jovelino (Zumbi dos Palmares), Antonio Carlos (Tonho), Clves (esse
nem precisa de apelido, porque todo mundo conhece), Anderson (Boca), Alexandre
Bergamim (Miss Simpatia, Z Buscap, Sr. Bronca), Elaine Branco (Saudade!), Silvinha,
Fernando (Palhao), Mafer (o figura), Rusvnia (Rus), Marli (minha companheira de trabalho
de campo), Sade (se ele tem nome eu desconheo), Fransrgio (com esse nome nem precisa
de apelido), Tatiana (Tati), Juliana (Ju) e a todos os outros que, na Geografia do Bar,
discutiram, conceitualizaram e teorizaram sobre a temtica em questo. Alguns deles, hoje,
to distantes fisicamente, mas sempre presentes em minhas lembranas.
Aos amigos que levarei para sempre comigo, mesmo que em lembranas:
Diana, minha eterna confidente; Roberto Frana, meu companheiro de casa, onde fizemos
muitas discusses acaloradas; Patrcia Artuza, amiga de farra e trabalho; Joo Fabrini, meu
quase co-orientador, sempre disposto a contribuir em minhas reflexes.
A trs pessoas mais do que especiais, daquelas que a gente s encontra uma
vez na vida (que sorte a minha ter conhecido logo trs!): Matuzalm, Elias Noronha e Vitor
Miazaki. Se outras pessoas tambm no os conhecessem, pensaria que eram apenas meus
amigos invisveis (desses que a gente s possui em devaneios e por isso so to completos).
A trs pessoas que salvaram minha dissertao por problemas tcnicos em
dois momentos: Gardim (NAPEGe), Jos Roberto (Ceget) e Fabrcio (meu irmo). Se no
fossem eles, eu no teria conseguido abrir aqueles malditos arquivos!
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bibliotecria Ftima pela ateno, pacincia e dedicao que valorizam a
cada dia o seu excelente trabalho.
FAPESP pelo apoio financeiro, sem o qual o trabalho teria ficado muito
mais difcil de ser realizado.
A todos os entrevistados: prefeitos, assistentes, trabalhadores do campo e da
cidade que contriburam direta e indiretamente para o desenvolvimento da pesquisa.
Ao Marcos Olmpio, para mim simplesmente Quinho, namorado, marido,
eterno amante, pela fora e, principalmente, pela pacincia e companheirismo, pois sem ele, a
minha vida no estaria completa. E tambm s cobranas, pois tantas foram as vezes que ele
me disse: voc no vai escrever no?
Ao meu sobrinho Caio Vincius, porque a luz dos seus olhos, a doura do
seu sorriso e a aparente fragilidade fortalecem a cada dia todas as minhas esperanas. E
tambm desculpas, pois tantas foram as vezes que lhe neguei ateno em funo dos trabalhos
acadmicos. Agora, Caio, a Tia Pi vai poder binc com voc!
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Vivendo agregado
Sujeito explorao
Enquanto imensas terras
Esto sem produo
Latifundirios e o prazer de possuir
Assassinam camponeses
Que tentam invadir
Sem terra para plantar
Sem terra para morar
Sujeito a humilhao
No resta outra opo
Invadir...
Abuso Sonoro
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RESUMO
Este trabalho surge da necessidade de compreender as atuais transformaes
ocorridas no campo e na cidade. Transformaes que tm refletido de forma direta na
reorganizao dos espaos, na redefinio de relaes, na constituio de novas
territorialidades (rurais e urbanas). As reflexes aqui contidas foram realizadas no sentido de
compreender o momento atual, sem, contudo, desvincul-lo do processo histrico. O ponto de
partida foi a busca pelas origens do processo de dicotomizao entre campo e cidade, rural e
urbano. Dicotomia fundamentada em mitos que ora consolidou a supremacia da cidade e do
modo de vida urbano, e ora fortaleceu a idealizao do campo e do modo de vida rural. Mitos
historicamente construdos e que contriburam para consolidar ideologias ainda presentes nos
dias atuais. O trabalho aponta para a necessidade destituir de tais mitos ao analisar as
mudanas recentes para que idealizaes e depreciaes no impulsionem novos equvocos. O
territrio um dos aportes para a compreenso da realidade em transformao. Obviamente
que os desdobramentos do processo de construo do territrio tambm so analisados:
territorializaes, territorialidades, desterritorializaes, reterritorializaes. So esses
processos que permitem compreender a existncia de ruralidades no interior das cidades e de
urbanidades no campo. So eles tambm que contribuem para o entendimento da nova
realidade em construo que coloca em xeque interesses contraditrios, relaes conflitantes.
Os municpios de lvares Machado, Presidente Prudente e Mirante do Paranapanema foram
tomados como base emprica do trabalho. A anlise comparativa realizada nesses municpios
apresentou diferenas no tipo de relao estabelecida entre campo e cidade. Diferenas que,
sobretudo, apontam para a necessidade de considerar os desdobramentos de lgicas
diferenciadas: uma impulsionada pelo processo de constituio de novas ruralidades do
campo (o rural como espao de lazer), e outra impulsionada pela implantao dos
assentamentos rurais. O trabalho finda com a tentativa de reconceituar rural e urbano frente s
mudanas atuais, procurando ressaltar as diferenas existentes entre ambos e as
complementaridades estabelecidas por tais diferenas.
Palavras-chave: rural urbano campo cidade territorialidades - novas ruralidades
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ABSTRACT
The present work seeks to understand the transformations occurring in the country and city
because these changes reflect a reorganization of space, a redefinition of the rural and urban relation and the
constitution of new territories. While analyzing current changes, the dissertation also reflects on the historical
processes creating these transformations. The starting point was a search for the origins of the country-city and
rural-urban dichotomies. The dissertation argues that these dichotomies were often based on myths that either
sought to advance the supremacy of the city and the urban way of life or fortify the idealization of the country
and the rural way of life. These representations were constructed historically, consolidating ideologies that
continue to the present day.To avoid mistakes based on the idealization and depreciation of rural and urban space
in the future, the dissertation deconstructs the myths. Analisis of the territory contributed to understanding the
reality in transformation. In the unfolding process of construction of territory it was also necessary to examine
the processes of des-territorialization, re-territorialization and territorialities. This form of analysis permitted
understanding the existence of ruralities inside cities and of urbanities in the country. They also helped
comprehend the continuity of contradictory interests and conflicting relations in the construction of new realities.
The cases analyzed empirically are the municipal districts of lvares Machado, President Prudente and Mirante
do Paranapanema in Sao Paulo state, Brazil. Comparative analysis of these three areas presented interesting
differences in the type of relation established between country and city. Differences that, over all, demonstrate
the importance of considering the distinctive logic of the unfolding process in different places. In one case, the
process resulted in the constitution of new ruralities in the country- the rural as leisure space - and in other cases,
stimulated the implantation of the rural nestings in urban space. The work concludes with an attempt to re-
conceptualize the rural and urban characteristics of current transformations in Brazil, creating concepts that can
help us understand the differences between the country and the city and how they complement each other.
Key-words: rural urbain country city territorialities - new ruralities
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SUMRIO
INTRODUO............................................................................................................................... 14
1 CONHECENDO OS MUNICPIOS ESTUDADOS...................................................................... 22
2 CAMPO E CIDADE: A CONSTRUO DOS MITOS................................................................ 42
2.1 Supremacia urbana: a idealizao das cidades.......................................................................... 42
2.2 Romantismo: a idealizao do campo e do modo de vida rural............................................. 47
2.3 Contra-ataque aos romnticos:... e a dicotomia se perpetua................................................... 53
2.4 Passado e presente: dos mitos pretritos s discusses atuais................................................ 55
3 TERRITRIO E SEUS DESDOBRAMENTOS: REFLETINDO AS TRANSFORMAES .............................................................................................................
61
3.1 Territrio e territorialidades: repensando conceitos .......................................................... 62
3.3 Repensado o rural e o urbano a partir do territrio e das territorialidades.......................... 67
4 PARA ALM DA CIDADE E DO CAMPO ................................................................................. 70
4.1 A lgica da negao-afirmao.................................................................................................. 72
4.2 Entre e campo e a cidade: a periferia urbano-rural............................................................. 75
4.3 Periferia: o elemento mediador da trade............................................................................ 79
5 URBANIZAO DO CAMPO: FATO OU MITO?...................................................................... 85
5.1 Do rural ao agrcola: a setorizao redutora....................................................................... 93
5.2 O novo velho atributo: a ressurreio dos mortos.............................................................. 96
5.3 Novas ruralidades: a fetichizao da mercadoria verde...................................................... 102
5.4 Definio indefinida: o decreto obsoleto e a negao como critrios................................ 116
5.5 Sobre o agronegcio e o negcio campons....................................................................... 130
5.6 Esboando um breve eplogo.............................................................................................. 150
6 AO E REAO: CONTRADIES DAS NOVAS TERRITORIALIZAES E TERRITORIALIDADES.......................................................................................................
152
6.1 Em busca do outro:suprimindo as ausncias pelas estratgias territoriais.......................... 153
6.2 Reao: as outras estratgias territoriais............................................................................. 155
7 RURAL E URBANO REPENSANDO AS DEFINIES A PARTIR DE CINCO ELEMENTOS: TEMPO, RELAO COM A TERRA, HBITOS, FUNES E PAISAGEM...............................................................................................................................
159
10
7.1 Tempo e temporalidades: a cadncia do movimento nos espaos urbanos e rurais.............................................................................................................................................
160
7.2 Cho e vida: a funo da terra na construo das relaes cotidiana................................. 163
7.3 Hbitos urbanos e rurais: diferencialidades e similitudes..................................................... 170
7.4 Funes urbanas e rurais: harmonia e conflito......................................................................... 175
7.5 Paisagem rural e paisagem urbana: formas, sonoridade e colorido....................................... 179
CONSIDERAES FINAIS.......................................................................................................... 186
BIBLIOGRAFIA ............................................................................................................................ 199
11
LISTA DE GRFICOS, QUADROS E FIGURAS
Figura 1 Limite de municpio entre Presidente Prudente e lvares Machado 81
Figura 2 Eixo de urbanizao 88
Figura 3 Planta urbana de lvares Machado 117
Grfico 1 Evoluo populacional do municpio de Presidente Prudente 27
Grfico 2 Evoluo populacional do municpio de lvares Machado 27
Grfico 3 Coronel Goulart Fonte de Renda 124
Grfico 4 Coronel Goulart Renda Familiar 125
Grfico 5 Coronel Goulart Quantidade de moradores por residncia (em %) 126
Quadro 1 Origem e significado das palavras 43
Quadro 2 Anncio nos classificados do jornal O Imparcial Online 114
12
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 Comparao entre os censos demogrficos de 1991 e 2000 26
Tabela 2 Variao populacional nos censos demogrficos de 1991 e 2000 28
Tabela 3 Escolas estaduais e municipais em lvares Machado 31
Tabela 4 Deficit educacional no municpio de lvares Machado 33
Tabela 5 Assentamentos rurais no municpio de Mirante do Paranapanema 36
Tabela 6 Escolas estaduais e municipais em Mirante do Paranapanema 39
Tabela 7 Dficit educacional no municpio de Mirante do Paranapanema 40
Tabela 8 Produo agrcola no municpio de lvares Machado: lavouras permanentes e temporrias
110
Tabela 9 Produo pecuria no municpio de lvares Machado 111
Tabela 10 lvares Machado Crescimento e variao populacional 118
Tabela 11 Produo agrcola no municpio de Mirante do Paranapanema: lavouras permanentes e temporrias
139
Tabela 12 Produo pecuria no municpio de Mirante do Paranapanema 140
Tabela 13 Comparao ente populao rural e assentada 142
Tabela 14 Pontal do Paranapanema: variao demogrfica e estimativa da populao assentada
144
Tabela 15 Pontal do Paranapanema: assentamentos rurais 146
13
LISTA DE FOTOS
Foto 1 e 2 Propriedades rurais no interior do permetro urbano 118
Foto 3 Cel. Goulart Vista parcial da Avenida Brasil 120
Fotos 4 e 5 Cel. Goulart Meios de locomoo mais utilizados 121
Fotos 6 e 7 Cel. Goulart A rua e seus usos 121
Fotos 8 e 9 Cel. Goulart As caladas e seus usos 122
Fotos 10 e 11 Cel. Goulart Agricultura nos lotes 127
Fotos 12 e 13 Cel. Goulart Que urbano esse? 128
Foto 14 Restaurante do Pesqueiro Guarino 166
Foto 15 Restaurante do Pesqueiro Zio Dgua 166
Fotos 16 e 17 Vista parcial das rodovias de acesso aos pesqueiros 167
Foto 18 Vista parcial do Pesqueiro Zio Dgua 167
Foto 19 Vista parcial do pesqueiro Guarino 167
Fotos 20 e 21 Propriedades rurais dentro do permetro urbano de Presidente Prudente 176
Fotos 22 e 23 Vista parcial do Bairro So Joo 177
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INTRODUO
Impressionante o sentido pejorativo que uma palavra pode adquirir no uso
popular. Mais impressionante ainda como, s vezes, sentido e uso originais so substitudos,
tornando-se praticamente esquecidos.
H algum tempo atrs, nas palavras cruzadas publicadas pela Folha de
S.Paulo, havia na coluna horizontal a seguinte indagao: aquele ou quem procedente do
campo. Poderia ser campons, campnio, agricultor, lavrador, mas no era. A descoberta de
palavras na vertical foi formando letras que no batiam com nenhuma das conceituaes
dadas acima. Intrigada com a palavra, pois s faltava ela, olhei na resposta para descobrir qual
era. Para minha surpresa era mocorongo. No satisfeita, olhei no dicionrio para conferir a
validade da resposta. Mocorongo: santareno, caipira, mulato quase escuro da regio serrana,
segundo o Dicionrio Aurlio. Quando criana, usava mocorongo como sinnimo de tolo,
bobo e tonto, sempre para ofender ou agredir outrem. Jamais para se referir origem ou ao
modo de vida. E para mim, esse era o significado da palavra e continuou sendo at dias atrs.
Ah, se no fossem as palavras cruzadas!
Recentemente me deparei com outro fato interessante. Em uma de minhas
constantes viagens, resolvi ler aquelas letrinhas midas que ficam atrs dos bilhetes de
passagem. Nunca me interessei por ver o que nelas estava escrito, talvez pelo tamanho
diminuto da fonte. Mas naquele dia, resolvi ler e descobri que elas se referem aos direitos dos
usurios. Descobri que um de nossos direitos ser atendido com urbanidade pelos prepostos
da transportadora e pelos agentes de fiscalizao (Decreto 2.521/98)
Comecei a refletir sobre o que seria ser atendido com urbanidade.
Obviamente esse adjetivo se referia a ser tratado com educao, ateno e respeito. Recorri
novamente ao Aurlio: urbanidade (s.f.) qualidade de urbano, civilidade, cortesia,
afabilidade. Logo me questionei: ser que se formos tratados com desrespeito e falta de
educao, estaremos sendo tratados com ruralidade? Seria a urbanidade sinnimo de bons
modos e costumes?
Confuses como essas ainda permeiam nosso cotidiano. Palavras tm seu
verdadeiro sentido alterado, influenciado por idealizaes e depreciaes, sejam elas
construdas na atualidade ou buscadas no passado. Quando aprendi na escola que o Brasil, a
partir da dcada de 60, havia se tornado um pas urbano, deixando de ser rural, me senti
aliviada. Torcia para que o pas se urbanizasse logo, para que todos se tornassem urbanos,
pois, para mim, na urbanizao estaria a salvao do nosso subdesenvolvimento. Quanto mais
urbanos, mais desenvolvidos seramos. No sei de onde tirei essa idia, mas ela existiu em
15
LviaUnderlinemim. E por um bom tempo. E continua a existir em tantas outras pessoas, causando
confuses, idealizaes e depreciaes.
Campo e cidade so visualizados como conceitos antagnicos, plos
extremos de uma dicotomia. Rural e urbano so entendidos como estgios de
desenvolvimento. Confuses promovidas por mitos que, construdos preteritamente, ora
consolidaram a idealizao do campo e tudo o que a ele estava ligado (o rural), e ora
fortaleceram a supremacia da cidade e o que a ela se relacionava (o urbano).
Este trabalho uma busca no apenas para redefinir os conceitos campo e
cidade, rural e urbano frente s transformaes atuais. tambm uma tentativa de retomar as
vises construdas preteritamente sobre tais conceitos, procurando entender como elas
influenciaram e ainda influenciam, contribuindo para mascarar a realidade dos fatos.
Mudanas atuais trazem elementos imprescindveis ao enriquecimento da
discusso. As novas funes existentes no campo e na cidade tm contribudo para redefinir a
diviso territorial clssica existente entre ambos. Todavia, as mudanas no culminam com a
homogeneizao dos espaos. As diferenas se mantm, fortalecendo a relao de
complementaridade entre campo e cidade. A realidade se pluraliza, ressaltando as
contradies. Rural e urbano so redefinidos, mas at que ponto o novo traz a ruptura com o
pensar pretrito e as confuses por ele formuladas?
Embora mudanas tenham contribudo para romper com mitos, muitos deles
permanecem (e se fortalecem), criando representaes que no contemplam as contradies.
H algo que no se extinguiu. Vivemos o inacabado, uma ao incompleta, um fato passado
que se mantm contnuo, permanente. Nesse sentido, nota-se um carter de continuidade pela
permanncia dos mitos. De um lado, o campo idealizado pelos atributos naturais; de outro, a
cidade idealizada pela poder centralizador. Indeterminadas ficam as definies que se
fundamentam nas negaes, ou seja, os espaos passam a ser visualizados pelo no-ser. A
existncia do rural entendida pela contraposio ao urbano, e assim tambm inversamente.
Ao buscar aquilo que os espaos no contm, ou seja, o que no so pela negao do que h
no outro, impossibilitada fica a visualizao daquilo que eles de fato so. Perdidos ficam seus
verdadeiros significados e representaes.
O objetivo deste trabalho no negar a supremacia da cidade em
determinados aspectos, como a capacidade de centralizar e orientar aes, em virtude da
concentrao de recursos (humanos, econmicos, polticos, etc.). Entretanto, amputar a
capacidade do campo em originar mudanas torna-se um equvoco. O olhar unilateral nega o
prprio mtodo dialtico, ou promove a sua transformao em materialismo caolho.
16
LviaUnderlineSahlins (1997, p.57) afirma que existem sempre tendncias operando em
direes contrrias. Embora, insistamos em no v-las, elas esto l. A unilateralidade
impede o pensar plural. Destarte, perdidas ficam as heterogeneidades e cegas as anlises da
dimenso das transformaes. H o que muda e o que permanece. Se o essencial invisvel
aos olhos, conforme disse a raposa ao Pequeno Prncipe, cabe a ns encontrarmos uma forma
de torn-lo visvel. Talvez os antolhos tenham impedido a visualizao daquilo que
essencial. Retir-los ponto de partida para compreender as heterogeneidades. Como?
Removendo tais vises maniquestas que contrapem campo e cidade, ora pelo bucolismo
idealizador, ora pela supremacia das urbanidades.
Incorporar a dinmica das mudanas s vises de mundo configura-se um
grande desafio. A problemtica se alicera sobre o seguinte questionamento: pensar as novas
relaes entre cidade e campo, e suas respectivas conseqncias para o rural e o urbano em
suas contradies. Para tanto, trs municpios foram escolhidos com o objetivo de embasar as
reflexes: Presidente Prudente, lvares Machado e Mirante do Paranapanema.
As escolhas de tais municpios foram realizadas com o objetivo de captar
realidades diferenciadas com lgicas territoriais distintas e tambm apreender as semelhanas
existentes entre elas. Um dos desafios foi compreender as diferenas entre municpios
aparentemente semelhantes e as semelhanas entre municpios aparentemente diferentes. Por
exemplo, Presidente Prudente e lvares Machado, embora apresentando diferenas em
relao s dimenses espaciais e a quantidade de habitantes, possuem mais semelhanas entre
si que lvares Machado e Mirante do Paranapanema. Mais do que captar as diferenas
visveis, procuramos refletir sobre aquilo que est alm do visvel. Os questionamentos aqui
levantados contm o esforo de pensar as contradies da relao aparncia-essncia,
captando o que, por vezes, se encontra mascarado ou escondido pelo vu do aparente.
Destarte, nosso objetivo foi compreender a relao campo-cidade. Partimos, portanto, de duas
realidades distintas: uma caracterizada pelo intenso processo de urbanizao e conurbao, e
outra caracterizada pelo desdobramento do processo de luta pela terra.
O primeiro captulo apresenta as caractersticas dos municpios estudados.
Nele so apresentados dados dos censos do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatstica) sobre economia, sade, educao, lazer e dinmica populacional. Numa anlise
comparativa, semelhanas e diferenas foram ressaltadas, procurando levantar os principais
problemas encontrados em cada municpio.
No perodo inicial da pesquisa bibliogrfica, percebemos que as reflexes
de alguns autores sobre campo e cidade, rural e urbano foram construdas consolidando a
dicotomia estabelecida entre ambos, reforando antagonismos. Resolvemos, frente a esse fato,
17
iniciar nossas reflexes tericas partindo da pergunta inicial: qual a origem das dicotomias
campo-cidade, rural-urbano? Dessa forma, o segundo captulo foi elaborado com o objetivo
primordial de buscar as origens desse processo de dicotomizao. Procuramos desconstruir o
processo ideolgico que consolidou campo e cidade como realidades antagnicas, explicando
como fatos aparentes influenciaram a construo de ideologias e, estas, por sua vez,
construram mitos que permanecem nas anlises atuais. Mitos fundamentados na aparncia
que contriburam ora para consolidar o campo como representante do atraso e de um modo de
produo em extino (feudalismo), ora para consolidar a cidade como representante do novo
e das transformaes oriundas do modo de produo que emergia (capitalismo). Mitos que
tambm contriburam para promover o processo de idealizao do campo, consolidado,
sobretudo, entre os romnticos, em que o bucolismo se contraps ao aparente caos das
cidades. Procuramos discutir como tais mitos mascararam (e continuam mascarando) a
realidade dos fatos, encobrindo problemas no campo e na cidade, e impedindo as anlises das
relaes estabelecidas entre ambos. Para compreender o processo histrico de dicotomizao,
recorremos a estratgias variadas: desde a procura pela etimologia das palavras em
dicionrios de latim para compreender a origem e as possveis derivaes e significaes, at
leituras realizadas por diversos pensadores para entender a formao histrica das cidades e
do processo de construo dos mitos.
No terceiro captulo, conceitos essenciais foram discutidos, sendo eles
territrio e territorialidade. A compreenso das contradies expressadas pelos processos de
territorializao, desterritorializao e reterritorializao de atividades e relaes frente s
novas demandas foi a forma encontrada para entender as estratgias construdas pelas
necessidades de consumo e de sobrevivncia. Como a luta no e pelo territrio apresenta
desdobramentos para a redefinio dos conceitos rural e urbano. Nesse sentido, a
compreenso do rural e do urbano para alm dos limites do campo e da cidade teve como
fundamento a anlise dos processos territoriais e das novas territorialidades imbudas na
construo dessa realidade. Jogo contnuo e contraditrio em que territorializaes e
desterritorializaes so realizadas pelo movimento histrico determinado pela expanso
capitalista e tambm contestadas pelo processo de reterritorializao daqueles que por ele so
excludos. Eterna luta pelo e no territrio, com a formao e destruio de territorialidades.
Territorialidades que, por vezes, permanecem como estratgias de vida, embora mutiladas
pelo processo de desterritorializao (perda do territrio).
O quarto captulo contempla as anlises que procuram demonstrar a
importncia de entender o rural para alm do campo e o urbano para alm da cidade. Frente s
mudanas recentes, equvoco seria continuar preso aos limites tradicionais impostos,
18
restringindo a amplitude das anlises. A realidade se transforma e o pensamento deve
acompanhar no mesmo ritmo as transformaes. As anlises realizadas por alguns autores
contriburam para aprofundar os questionamentos suscitados frente s recentes transformaes
dos espaos rurais e urbanos, bem como suas respectivas funes.
Nosso ponto de partida para a interpretao das mudanas foi o pensamento
tridico. Compreender as semelhanas e as diferenas existentes em cada espao sem,
contudo, suprimir o elemento que intensifica as similitudes e aprofunda as peculiaridades: a
mediao estabelecida na relao entre campo e cidade, entre rural e urbano, entre as
diferenas e as semelhanas. Relao que se fundamenta na busca pelo outro para suprimir
possveis ausncias. Busca que contm, de forma concomitante, a valorizao e a
desvalorizao dos espaos de origem. Diferenas que so procuradas e reforadas, contudo
que tambm contribuem para ampliar as similitudes. Duplo processo: de negao e afirmao,
que se firma sobre a interligao, fundamentando a contradio expressa pela valorizao e
desvalorizao. Valorizao impulsionada pela afirmao do outro, quando este buscado,
mas tambm desvalorizao, pois a busca momentnea e as estratgias de vida continuam
presas realidade cotidiana. A busca pelo outro apenas uma estratgia de encontrar alhures
aquilo que est ausente no cotidiano, por isso ocorre apenas de forma momentnea,
apresentando-se como alternativa para suprir possveis ausncias. Dessa forma, por meio da
compreenso da relao campo-cidade, rural e urbano puderam ser mais bem entendidos. No
apenas como modo de vida, mas tambm como espaos que se modificam e so modificados
pela dinmica do desenvolvimento do modo de produo.
Com o intuito de compreender a relao estabelecida entre campo e cidade
aprofundando as anlises, o sentido do conceito periferia foi resgatado. Do ponto de vista da
localidade, a periferia se constitui como elo entre essas duas realidades, pois nela as
contradies se expressam, as heterogeneidades se apresentam, rural e urbano se encontram
num continuo processo de negao e afirmao. na periferia que os opostos de cruzam o
luxo e o lixo e onde os limites de cada espao se tocam. Nesse captulo, o crescimento
expressivo de lvares Machado ocorrido em funo da expanso de dois bairros perifricos
foi discutido, servindo de base emprica para as reflexes tericas. Ressaltamos os dois lados
da periferia: um lado composto por bairros precrios (Jardim Panorama e Parque dos
Pinheiros) e outro formado por moradias bem estruturadas (Chcaras Cobral) utilizadas nos
finais de semana para o desenvolvimento de atividades ligadas ao lazer. A periferia, portanto,
foi compreendida como elemento mediador da trade: campo cidade periferia.
No quinto captulo, a teoria que sustenta o processo de urbanizao do
campo foi discutida, buscando origem e possveis desdobramentos para o entendimento da
19
realidade. Como essa viso monoltica e linear impede as anlises das contradies em seu
processo de mudana e permanncia. Com o objetivo de refutar tais simplificaes que
pregam o fim do rural e suas ruralidades, inserimos questionamentos para contestar o
paradigma1 que defende a urbanizao como fato irreversvel. Para tanto, procuramos
desvendar os fatos que no so apreendidos em sua complexidade, ora porque os paradigmas
construdos moldam a realidade, procurando adapt-la a teoria e impedindo, assim, a
apreenso do movimento; ora porque o fundamentalismo do novo se impe, mascarando parte
da realidade por se apresentar como possibilidade nica. Nesse sentido, as anlises foram
construdas com o objetivo de questionar tais vises de mundo, procurando captar o
movimento das transformaes e as distores promovidas por leituras parciais. Buscamos
tambm questionar quais as principais idias que norteiam o paradigma da urbanizao
completa da sociedade e suas fundamentaes.
A questo da queda da populao agrcola e o crescimento das atividades
no agrcolas nos espaos rurais iniciaram a discusso. O objetivo principal foi questionar as
vises setoriais sobre o rural na tentativa de desconstruir a viso reducionista que o restringe
ao agrcola. No sentido de completar as anlises, o segundo ponto discutido foi a
pluriatividade. Buscamos demonstrar como o rural, desde o incio, configurou-se como um
espao plural e que as estratgias camponesas sempre estiveram fundamentadas em sua
capacidade de ser pluriativo. Outro ponto questionado se refere incorporao de atividades
de lazer nos espaos rurais. Como tais atividades impulsionam a procura pelo rural sem,
contudo, torn-lo urbano.
A realidade demonstra-se plural e contraditria, devendo, portanto, ser
entendida destituda da linearidade da viso progressista. Rural e urbano no so estgios de
desenvolvimento inicial e final, respectivamente. Por isso, realizamos leituras no sentido de
construir um referencial que contrapusesse a idia de expanso progressiva do urbano e
extino do rural. O rural no est desaparecendo. Ao contrrio, as peculiaridades de cada
espao so cada vez mais ressaltadas pelo movimento dialtico da histria. Nesse sentido,
questionamos as delimitaes oficiais utilizadas para a contagem da populao, na tentativa
de demonstrar que constantes equvocos so cometidos pela rigidez dos critrios que
determinam o que rural e o que urbano. Nesse caso, o municpio de lvares Machado
contribuiu para exemplificar e fundamentar nossas reflexes, demonstrando a existncia de
1 Compreendemos que existem formas de enxergar a mesma realidade em construo e que tais formas variam de acordo com o recorte realizado, seja ele econmico, social, cultural, poltico. Entendemos por paradigmas essas diferentes vises de mundo, ou seja, essas formas de leitura da realidade que so construdas com base em determinado referencial terico. Sendo assim, os paradigmas acabam gerando conflitualidades que so expressas nos debates, nas publicaes, nas polticas pblicas (ou privadas), nos eventos e manifestaes atravs de suas respectivas ideologias (FERNANDES, 2005, p.22).
20
reas rurais no interior de espaos definidos como urbanos. Com o objetivo de contestar as
classificaes oficiais, procuramos demonstrar como reas consideradas urbanas possuem
relaes que reproduzem o modo de vida rural. Modo de vida este que pode ser visualizado no
cotidiano dos moradores do Distrito de Cel. Goulart, nos usos diferenciados das ruas e
caladas, nas relaes estabelecidas entre as pessoas e no trato com a terra. Mesclamos
observaes empricas constatadas no perodo de estgio, realizado no ano de 2001, com os
dados coletados na pesquisa de campo, realizada em Maio de 2004.
Tambm fizemos questionamentos sobre o agronegcio e o negcio
campons, de forma a contestar as vises legitimadoras de um Brasil que d certo em
detrimento de um outro Brasil, esquecido por ser considerado atrasado e invivel do ponto de
vista da lgica do capital. O municpio de Mirante do Paranapanema serviu de base emprica
para as reflexes. Os desdobramentos do processo de luta pela terra foram questionados com
o objetivo de analisar as conseqncias para a relao campo-cidade.
No sexto captulo, o processo de territorializao de novas atividades e seus
respectivos desdobramentos foi analisado. Procuramos compreender as contradies inerentes
aos processos de construo, destruio e reconstruo de territrios e territorialidades. A
forma como as estratgias territoriais asseguram a satisfao de necessidades e a
sobrevivncia das populaes urbanas e rurais. Como as lutas criam e recriam situaes
inexistentes em seu cotidiano (suprindo necessidades), ou reconstroem relaes pretritas de
vida.
Por fim, no ltimo captulo, buscamos redefinir os conceitos rural e urbano.
Cinco elementos foram considerados na tentativa de compreender o processo contraditrio
que se expressa nas mudanas realizadas, embalando o incessante movimento de construo,
destruio e reconstruo de territrios. Movimento contraditrio que s pode ser entendido
se interpretado pela relao aparncia essncia. Procuramos compreender as mltiplas faces
das mudanas que, por vezes, se apresentam de forma aparente, por outras, se encobrem sobre
a face da permanncia. Realidades que mudam, ora apresentando a mudana na aparncia, ora
escondendo-a, atingindo apenas a essncia dos fatos. Cinco elementos fundamentaram o
questionamento sobre os espaos rurais e urbanos, sendo eles: o tempo, a relao com a terra,
os hbitos, as funes e a paisagem. Procuramos entender como as transformaes (e as
permanncias) possuem implicaes diferenciadas para ambos os espaos, sem, contudo,
descartar a relao estabelecida entre eles. Para exemplificar alguns questionamentos
realizados, o municpio de Presidente Prudente serviu de base emprica.
Esta dissertao uma tentativa de compreender as contradies existentes
entre a relao estabelecida entre campo e cidade. Nossos esforos foram no sentido de
21
aprimorar determinadas discusses tericas, relacionando-as realidade emprica dos
municpios escolhidos para a pesquisa. Pensar o campo e a cidade no como espaos
dicotmicos, mas sim como espaos diferenciados que se complementam justamente pelas
diferenas que possuem. Obviamente que a relao construda entre campo e cidade tem
passado por inmeras mudanas. Mudanas que impulsionam uma nova forma de refletir o
rural e o urbano. Eis o desafio.
22
1 CONHECENDO OS MUNICPIOS ESTUDADOS
Presidente Prudente est localizado a sudoeste do Estado de So Paulo. Foi
fundado em 1917 e emancipado em 1921. Possui, segundo o ltimo censo do IBGE (Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatstica), 189.104 (cento e oitenta e nove mil, cento e quatro)
habitantes. De acordo com a diviso do SEADE (Sistema Estadual de Anlise de Dados), o
municpio pertence a 13 Regio Administrativa. Est localizado em uma regio, do ponto de
vista econmico, considerada estagnada. Paulino (1998) relata que o potencial da regio de
Presidente Prudente frente s demais regies do estado apresentou, nos anos de 1980 a 1995,
comportamento pouco dinmico. Um quadro econmico estabilizado, diferindo-se muito, em
termos de participao econmica, de regies como Campinas, So Jos do Rio Preto e
Ribeiro Preto.
O municpio de lvares Machado est localizado prximo a Presidente
Prudente. Fundado em 1917, emancipado em 1948, possui, de acordo com o Censo/2000 do
IBGE, 22.673 (vinte e dois mil, seiscentos e setenta e trs) habitantes. Tambm pertence a 13
Regio Administrativa (SEADE). Em virtude da intensificao do processo de urbanizao,
as duas cidades esto quase conurbadas, tanto pela Rodovia Raposo Tavares, que d acesso a
entrada principal de lvares Machado, quanto pela Estrada da Amizade, Rodovia Arthur
Boigues, via de acesso exclusiva entre os dois municpios. lvares Machado se configura
como uma cidade satlite do municpio de Presidente Prudente.
Fundado em 1938 e emancipado em 1954, o municpio de Mirante do
Paranapanema tambm est localizado a sudoeste do estado. Possui 16.209 (dezesseis mil,
duzentos e nove) habitantes, fazendo parte da 13 Regio Administrativa. Caracteriza-se por
ser palco de intensos conflitos fundirios, em que o processo de luta pela terra ganhou fora se
territorializando. At o ano de 2000, foram implantados no municpio 28 assentamentos
rurais, conforme dados do DATALUTA-2004. Fato que promoveu o crescimento da
populao rural e propiciou transformaes na dinmica municipal.
Em comum, os trs municpios tm a mesma origem histrica: todos eles
foram formados a partir da expanso cafeeira para o oeste do Estado de So Paulo e do
processo de grilagem de terras, ambos iniciados no final do sculo XIX.
Presidente Prudente foi escolhido por ser a sede da 13 Regio
Administrativa, configurando-se, portanto, como o municpio de maior importncia
econmica, poltica e cultural. lvares Machado foi selecionado pela proximidade com
Presidente Prudente e pelas semelhanas apresentadas em relao dinmica populacional.
Tanto Prudente quanto Machado apresentaram, de acordo com os dados do IBGE,
23
crescimento da populao urbana e decrscimo da rural. Dinmica que vem se manifestando
em ambos os municpios desde a dcada de 1970.
As causas que motivaram a escolha de Mirante do Paranapanema so
diferenciadas. A dinmica populacional, caracterizado pelo decrscimo da populao urbana e
aumento da populao rural, j seria algo suficientemente forte para justificar a escolha do
municpio. Todavia, o principal motivo est na existncia dos assentamentos rurais, fruto do
processo de luta pela terra. Enquanto em lvares Machado e em Presidente Prudente no
existe assentamento rural, at o ano 2.000, em Mirante do Paranapanema existiam 28.
Um breve olhar na paisagem denunciaria de imediato uma parte razovel
das diferenas existentes em cada um dos municpios escolhidos: a quantidade de prdios, a
intensidade dos fluxos (de pessoas e automveis), a dinmica local, os servios pblicos
disponveis, a infra-estrutura existente. Tantas seriam as diferenas a enumerar captadas em
poucos instantes.
Presidente Prudente se diferencia dos demais municpios pesquisados por
vrios aspectos: pelas verticalidades, pelas universidades e faculdades existentes, pelos
shopping-centers e reas de lazer, pelo comrcio expressivo e variado. O municpio possui
quatro instituies de ensino superior: Unesp Universidade Estadual Paulista, Unoeste
Universidade do Oeste Paulista, Iespp Instituto de Ensino Superior de Presidente Prudente e
Associao Educacional Toledo, que atendem aproximadamente vinte mil estudantes. H dois
shopping-centers: Americanas e Prudenshopping, com lojas variadas, cinemas, hipermercados
(Carrefour, Super Muffato, Lojas Americanas) e praa de alimentao. H tambm duas
grandes reas pblicas de lazer em espao aberto: o Parque do Povo, com pista de skate,
quadras poliesportivas, pistas de Cooper, playground e espaos com bares e lanchonetes; e a
Cidade da Criana, onde h telefrico, planetrio, kartdromo, lagos, parque infantil e mata
aberta para passeios ecolgicos.
Presidente Prudente um municpio que se destaca no setor comercial e de
servios. De acordo com o Cadastro Central de Empresas do IBGE Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatstica, h mais de 5.100 estabelecimentos comerciais, distribudos pelas mais
diversas atividades (mveis, calados, vestimentas, eletrodomsticos, eletroeletrnicos,
reparao de veculos automotores, etc.). Em relao ao setor tercirio, h 627
estabelecimentos que oferecem servios de alojamento e alimentao; 246 empresas de
transporte, armazenagem e comunicao, 729 empresas prestadores de servios imobilirios,
assessoria contbil e aluguis em geral, alm de 131 estabelecimentos educacionais e 163
empresas no ramo da construo civil. No setor secundrio, existem 633 estabelecimentos
industriais de pequeno e mdio porte, com destaque para a produo de bens de consumo no-
24
durveis2. Em 2002, segundo os dados do IBGE, o PIB industrial do municpio foi de R$
365.644.000,00, enquanto o PIB de servios foi de R$ 861.271.000,00 e o agropecurio de R$
58.224.000,00.
Presidente Prudente se caracteriza, portanto, por ser um municpio que
concentra funes. E justamente por concentr-las, acaba por atrair diariamente centenas de
pessoas que buscam lazer, trabalho, atendimento mdico-hospitalar, educao, mercadorias e
servios em geral. Os fluxos so intensos: de automveis e de pessoas. Fluxos de carros e de
nibus intra-urbano que deslocam moradores da cidade e de seus distritos. Fluxos de nibus
intermunicipais que, todos os dias, chegam cidade repletos de pessoas, trabalhadores e
estudantes, em sua maior parte. E tambm de ambulncias que vm dos municpios vizinhos
em busca de atendimento mdico-hospitalar. O vaivm dos moradores se confunde com o
vaivm daqueles que vm de fora, mas que l esto, porque l trabalham, compram, estudam.
Intensos fluxos pendulares de pessoas que transitam para l e para c
especialmente pela manh, na hora do almoo e ao entardecer. Fluxos que no deixam de
acontecer nos finais de semana, porm que se amenizam, seguem outros ritmos e horrios,
porque so motivados por outros interesses. Tantos so aqueles que se deslocam para
Presidente Prudente em busca de diverso: cinema, shopping, shows, boates, bares,
restaurantes. Mesmo concentrando funes e recebendo diariamente centenas de pessoas de
municpios vizinhos, Presidente Prudente pouco tem se destacado em relao aos demais
municpios do Estado de So Paulo. Apresentou crescimento populacional abaixo da mdia
do estado (15%) e comportamento pouco dinmico em termos de participao econmica,
comparado com outros municpios, como So Jos do Rio Preto.
lvares Machado possui, de acordo com o ltimo censo demogrfico,
22.661 habitantes. No municpio no existem grandes indstrias. O comrcio pouco
expressivo, atendendo apenas as necessidades imediatas de seus moradores. Mercadorias e
produtos mais variados e especficos so comprados em Presidente Prudente. No h
faculdades, universidades ou shopping-center. Tampouco possvel dizer que o municpio se
caracteriza por suas verticalidades, salvo um nico prdio que possui.
Mas lvares Machado tambm possui seus fluxos. Um vaivm intenso que
pode ser notado especialmente pela manh e ao entardecer. Todavia, esse vaivm no
manifesta em razo da lgica interna do municpio. A intensidade dos fluxos dada
principalmente pela movimentao de pessoas que seguem para Presidente Prudente, porque
l trabalham e/ou estudam, l compram e/ou vendem, l se divertem. O leva e traz de pessoas
diariamente realizado por nibus, carros e ambulncias. Poucos so os empregos gerados no 2 Fonte de dados: Cadastro Central de Empresas, IBGE, 2001. Disponvel em IBGE Cidades: http://www.ibge.gov.br/cidadesat/default.php.
25
http://www.ibge.gov.br/cidadesat/default.phpmunicpio. Por isso, a extrema dependncia em relao a Presidente Prudente. Tantos so os
fluxos de trabalhadores, estudantes, consumidores, pacientes e visitantes em geral. A
intensidade dos fluxos entre os dois municpios to grande que a Estrada Intermunicipal
Arthur Boigues Filho, de acordo com a pesquisa de Miazaki (2004), possui um fluxo mdio
dirio de aproximadamente cinco mil veculos.
O municpio apresenta problemas nos setores de sade e educao. H
apenas um hospital (Santa Casa de Misericrdia) que funciona de forma precria. H tambm
poucas escolas. Por isso, uma parcela considervel das crianas e adolescentes em idade
escolar se desloca diariamente para estudar em Presidente Prudente. Embora com os
problemas citados, lvares Machado apresentou crescimento populacional acima da mdia do
estado, superior, inclusive, ao municpio de Presidente Prudente.
Mirante do Paranapanema possui, de acordo com o ltimo censo
demogrfico, 16.213 habitantes. Semelhante ao Municpio de lvares Machado, no se
caracteriza pelas verticalidades, nem tampouco por concentrar funes. No municpio no h
universidades, faculdades nem shopping-center. O comrcio concentra uma variedade
razovel de lojas (mveis, calados, roupas, supermercados, bares, restaurantes, papelarias,
padarias, entre outros).
H fluxos, embora nem to intensos, de moradores da cidade que se
deslocam cotidianamente da casa para o trabalho e do trabalho para casa, ou em busca de
mercadorias e servios. Fluxos pendulares que se caracterizam especialmente pela
movimentao interna dos muncipes e que apresentam uma especificidade: o ir e vir
intramunicipal marcado pelo vaivm cotidiano de moradores do campo que procuram as
funes concentradas na cidade e que para o campo retornam. Essa intensa movimentao (do
campo para a cidade, da cidade para o campo) facilmente percebida pela quantidade que
nibus que chegam dos assentamentos rurais pelas manhs e retornam antes do entardecer
(especialmente nos dias prximos ao pagamento). Eis uma outra caracterstica: o municpio se
destaca pelo intenso processo de luta pela terra. At o ltimo censo demogrfico, Mirante do
Paranapanema possua 28 assentamentos rurais fruto desse processo. Fato que possibilitou
crescimento expressivo da populao rural.
Porm, o desafio no est apenas na capacidade de captar as diferenas
visveis, mas aquelas que esto alm dos olhos, por trs das cortinas das formas e das funes.
Tambm em desvendar as semelhanas de realidades que num primeiro momento se
apresentam to distantes pelas diferenas do plano visvel. A tabela abaixo apresenta dados
referentes aos dois ltimos censos demogrficos (1991 e 2000) dos municpios em questo e
da regio como um todo.
26
Tabela 1 Comparao entre os censos demogrficos de 1991 e 2000.
MUNICPIOS Populao 1991 Populao 2000Total Urbana Rural Total Urbana Rural
lvares Machado 18.865 15.387 3.478 22.661 20.096 2.565Mirante do Paranapanema 15.179 10.545 4.634 16.213 9.833 6.380Presidente Prudente 165.484 160.227 5.257 189.186 185.229 3.957Pontal do Paranapanema 510.411 425.756 84.655 565.396 483.866 81.530Fonte: IBGE Censo Demogrfico 1991 e Censo Demogrfico 2000. Org: BAGLI, Priscilla. Maio/2005.
Vejamos, portanto, as diferenas e semelhanas apresentadas. lvares
Machado e Presidente Prudente apresentaram padres de crescimento populacional
semelhantes. Ambos tiveram aumento da populao urbana e decrscimo da populao rural.
O padro de crescimento desses municpios acompanhou o desempenho da regio como um
todo. Dos 33 municpios que compem a regio do Pontal do Paranapanema, alm dos dois j
citados, outros 14 apresentaram desempenho populacional smiles. So eles: Alfredo
Marcondes, Anhumas, Caiabu, Estrela do Norte, Indiana, Joo Ramalho, Martinpolis,
Pirapozinho, Presidente Epitcio, Quat, Rancharia, Santo Expedito, Taciba e Tarabay.
Juntos, esses municpios possuem 372.139 habitantes, ou seja, 65,8% da populao do Pontal
do Paranapanema. Nmeros que representam 71,2% (344.593 habitantes) da populao
urbana e 33,8% (27.546 habitantes) da populao rural de toda a regio.
Analisando os dados de censos anteriores, nota-se que o crescimento
populacional dos municpios de Presidente Prudente e lvares Machado j apresentava
desempenho semelhante, com decrscimo acentuado da populao rural e aumento gradual da
populao urbana. Nos grficos abaixo, possvel analisar a evoluo populacional desses
municpios desde o Censo Demogrfico de 1970.
27
Grfico 1 - Evoluo populacional do municpio de Presidente Prudente
0
50.000
100.000
150.000
200.000
1970 1980 1991 2000
Populao Total Populao Urbana Populao Rural
Grfico 2 - Evoluo populacional do municpio de lvares Machado
0
5.000
10.000
15.000
20.000
25.000
1970 1980 1991 2000
Populao Total Populao Urbana Populao Rural
Fonte: Censo Demogrfico, IBGE, 1970, 1980, 1991 e 2000.Org. BAGLI, Priscilla. Maio/2005.
O censo demogrfico de 1970 j havia registrado forte declnio da
populao rural em Presidente Prudente. Desempenho que, nos anos posteriores, se manteve.
Em trinta anos, a populao rural do municpio, que j era reduzida, caiu de 13.250 para 3.957
habitantes, ou seja, o decrscimo foi superior a 70%. Em lvares Machado, at o censo de
1970, a populao rural era superior urbana. A partir da dcada de 1980, houve uma
reverso nesse quadro. A populao rural entrou em declnio, diminuindo de 10.904 para
2.565 habitantes, ou seja, mais de 76% em trinta anos. Em funo do crescente xodo, a
paisagem rural desses municpios tem se transformado. A tendncia atual a territorializao
de reas de lazer, como pesque-pague, chcaras de recreio, segundas residncias, hotis-
fazendas.
Desempenho inverso apresentou a populao urbana dos municpios citados.
Em Presidente Prudente, houve crescimento superior a 103%, enquanto em lvares Machado
esse crescimento esteve acima de 234%. Destarte, considerando o expressivo aumento da
28
populao urbana desses municpios, possvel afirmar que boa parte daqueles que migraram
do campo tiveram como destino final as cidades.
Mirante do Paranapanema apresentou padro diferenciado de crescimento.
Contrariamente ao ocorrido nos municpios citados acima, houve crescimento da populao
rural e decrscimo da urbana. Mirante do Paranapanema foi o nico municpio de todo o
Pontal do Paranapanema que, de acordo com os dados do Censo Demogrfico 2000 do IBGE,
apresentou esse desempenho. Outros municpios tambm tiveram crescimento da populao
rural (Caiu, Marab Paulista, Narandiba, Piquerobi, Presidente Venceslau e Sandovalina).
Entretanto, no apresentaram decrscimo da populao urbana, mas sim acrscimo. A tabela
abaixo apresenta a variao no crescimento populacional dos municpios pesquisados e da
regio.
Tabela 2 Variao populacional nos censos demogrficos de 1991 e 2000
MUNICPIOS Variao 1991/2000 Variao 1991/2000 (%)Total Urbana Rural Total Urbana Rural
lvares Machado 3.796 4.709 -913 20,1 30,6 -26,3Mirante do Paranapanema 1.034 -712 1.746 6,8 -6,8 37,7Presidente Prudente 23.702 25.002 -1.300 14,3 15,6 -24,7Pontal do Paranapanema 54.985 58.110 3.125 10,8 13,6 -3,7Fonte: Censo Demogrfico, IBGE, 1991 e 2000.Org: BAGLI, Priscilla. Maio/2005.
O municpio de Presidente Prudente, segundo os dados dos dois ltimos
censos demogrficos, apresentou queda de 26,3% da populao rural, ou seja, 913 pessoas
deixaram o campo. Nota-se que lvares Machado apresentou crescimento populacional acima
da mdia da regio. Enquanto a regio do Pontal do Paranapanema obteve uma variao
positiva de quase 11%, o municpio de lvares Machado apresentou variao superior a 20%.
Outros municpios apresentaram crescimento maior que a mdia do Estado de So Paulo
(15%), sendo eles: Caiu (25,5%), Joo Ramalho (25,7%), Narandiba (19,3%), Sandovalina
(28,5%) e Tarabay (22,7%).
Cinco municpios no existiam at o censo de 1991: Emilianpolis, Euclides
da Cunha Paulista, Nantes, Ribeiro dos ndios e Rosana. Eram distritos e foram emancipados
posteriormente. Por essa razo, equvoco seria considerar a variao negativa dos municpios
que tiveram seus distritos emancipados, como no caso de Teodoro Sampaio, que apresentou
29
decrscimo populacional de 59,4%, em razo da emancipao de Euclides da Cunha Paulista;
e de Iep, que apresentou decrscimo populacional de 27,5%, em funo da emancipao de
Nantes.
Em dois municpios que apresentaram crescimento populacional acima da
mdia estadual houve a implantao de assentamentos rurais. Fato que justifica, em parte, o
crescimento populacional expressivo. Em Caiu, dois assentamentos com 193 famlias foram
implantados no ano de 1998: Maturi (172 lotes) e Santa Rita (21 lotes) 3. Tais assentamentos
contriburam com um acrscimo de aproximadamente 900 pessoas ao municpio4. Em
Sandovalina, um assentamento com 130 lotes (Bom Pastor) foi implantado, somando
aproximadamente 600 pessoas. Em municpios maiores, o impacto provocado pelo acrscimo
dessa quantidade de pessoas poderia nem ser notado. Todavia, considerando a reduzida
populao dos municpios de Caiu e Sandovalina (4.192 e 3.089 habitantes,
respectivamente), seria praticamente impossvel no sentir os impactos da chegada dessas
pessoas.
Os municpios de lvares Machado, Joo Ramalho, Narandiba e Tarabay
apresentaram crescimento populacional elevado, sem, contudo, ter havido a implantao de
assentamentos rurais. Atentemos para o municpio de lvares Machado, foco da pesquisa5.
No possvel afirmar que o crescimento expressivo, superior mdia regional e do estado,
tenha se efetivado em funo das inmeras qualidades existentes no municpio. Afinal, tantas
so as deficincias existentes e as dificuldades encontradas cotidianamente pelos moradores
de lvares Machado, em razo da falta de infra-estrutura para atender as necessidades bsicas
(educao, sade, emprego, lazer).
Vejamos. O setor industrial do municpio de lvares Machado
caracterizado por empresas de pequeno porte. O valor do Produto Interno Bruto da indstria,
em 2002, segundo o IBGE, foi de R$ 21.165.000,006. De acordo com o Cadastro Central de
Empresas do IBGE, h, no municpio, 2 indstrias extrativas e 54 indstrias de transformao.
O comrcio pouco expressivo, possuindo apenas, conforme j comentado, o bsico para
atender as necessidades imediatas da populao. Um dos motivos que explica o pouco
3 Atualmente, h em Caiu outros dois assentamentos (Santa Angelina e Vista Alegre), com 23 e 22 lotes respectivamente (DATALUTA, 2004). Porm, esses assentamentos s foram implantados no ano de 2002 e seus impactos s podero ser analisados a partir dos dados do prximo censo.4 Para calcular a populao assentada, posto que a contagem realizada por lote e que cada lote dado a uma famlia, estima-se que cada famlia possua em mdia cinco pessoas.5 Para os outros municpios (Joo Ramalho, Narandiba e Tarabay), ver LENARDON, Marli Batista. 2004. A autora realizou pesquisa de campo nos municpios considerados atraentes, levantando as hipteses do crescimento populacional elevado em comparao mdia da regio e do estado. Tambm analisou as causas da evaso populacional ocorrida em alguns municpios do Pontal do Paranapanema.6 Fonte de dados sobre o PIB: Produto Interno Bruto dos Municpios, IBGE, 1999-2002. Disponvel em http://www.ibge.gov.br/cidadesat/default.php.
30
http://www.ibge.gov.br/cidadesat/default.phpdinamismo do comrcio a proximidade com Presidente Prudente. A maior parte da
populao machadense opta por realizar suas compras nesse municpio, em razo da
variedade e dos preos mais acessveis. Opo que acaba por gerar um impasse na economia
local, freando o desenvolvimento do setor comercial. O setor de servios tambm pouco
significativo, embora seja o que mais se destaca no municpio. O PIB desse setor atingiu R$
61.361.000,00 no ano de 2002. A pouca expressividade fora as pessoas a buscar fora do
municpio os mais variados tipos de servios, especialmente quando se trata de atendimento
tcnico especializado.
Em 2001, segundo o Cadastro Central de Empresas do IBGE, havia em
lvares Machado 382 empresas, considerando estabelecimentos de atividades comerciais em
geral, reparao de veculos automotores, objetos pessoais e domsticos; 97 estabelecimentos
de alojamento e alimentao; 13 empresas de transporte, armazenagem e comunicaes; 24
estabelecimentos de atividades imobilirias, aluguis e servios prestados empresa; alm de
8 estabelecimentos de educao e 6 de sade e servio social. Juntos, os trs setores
(industrial, comercial e servios) no conseguem gerar a quantidade necessria de empregos
para atender a populao local. por isso que boa parcela dos moradores de lvares
Machado trabalha no municpio de Presidente Prudente.
O atendimento mdico-hospitalar realizado no municpio precrio.
Segundo os dados fornecidos pela Assistncia Mdica Sanitria (2002), h 6 estabelecimentos
de sade em lvares Machado, sendo 4 pblicos e 2 privados. Desses estabelecimentos, 5
prestam servio ao SUS Sistema nico de Sade. Ao todo, existem 24 leitos para
atendimento de pacientes do municpio e apenas 10 equipamentos para manuteno da vida.
Nos estabelecimentos pblicos, alm da escassez de equipamentos, faltam
medicamentos, materiais de consumo e pessoal especializado, tanto no Hospital da Santa
Casa, como nos postos de sade. H, no municpio, apenas dois eletrocardigrafos, um ultra-
som e um raios-X7. Casos mais graves so impossveis de ser atendidos, em razo da falta de
mdicos especializados e da ausncia tecnologias para a realizao de cirurgias e tratamentos
mais detalhados, sendo encaminhados para a Santa Casa de Misericrdia ou para o Hospital
Universitrio Dr. Domingos Leonardo Cervolo, ambos em Presidente Prudente.
O funcionamento precrio do hospital da Santa Casa de lvares Machado
ocorre em razo de dois principais motivos: o primeiro a falta de verbas, que inviabiliza os
investimentos necessrios em materiais, equipamentos, contratao de mdicos
especializados, entre outros. Mas h tambm um segundo motivo: a preferncia da populao
em ser atendida nos hospitais de Presidente Prudente. Fato que tem elevado ainda mais a 7 Fonte de dados: Assistncia Mdica Sanitria, IBGE, 2002. Disponvel em http://www.ibge.gov.br/cidadesat/default.php.
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http://www.ibge.gov.br/cidadesat/default.phpprecariedade do atendimento mdico-hospitalar no municpio. Os recursos que seriam
destinados ao hospital e aos postos de sade acabam sendo revertidos para a compra de
ambulncias, que, por sua vez, so utilizadas para o transporte dos enfermos aos hospitais de
Presidente Prudente. Sendo assim, a situao, que j ruim, acaba por ficar cada vez mais
precria, gerando um crculo vicioso: quanto mais precria fica a situao, mais as pessoas
optam por buscar fora atendimento mdico-hospitalar, quanto mais buscam fora tal
atendimento, mais recursos que seriam destinados melhoria do hospital e dos postos de
sade so revertidos para a compra e manuteno de ambulncias e gastos com o transporte
de pacientes, e assim sucessivamente8.
O setor educacional tambm possui seus problemas, em relao falta de
vagas, a quantidade de alunos por sala e a qualidade do ensino pblico. A tabela abaixo
contm as escolas existentes no municpio e a quantidade de alunos e salas de aulas.
Tabela 3 Escolas estaduais e municipais em lvares Machado
ESCOLAS ESTADUAIS QUANTIDADE DE ALUNOS QUANTIDADE DE SALAS
CrechePr-
escolaEnsino Fundam
Fundam(1a4) (5a8)EnsinoMdio Creche
Pr-escola
Ensino FundamFundam(1a4) (5a8)
Ensino Mdio
E.E. Cel. Goulart 78 4E.E.Prof.Anglica de Oliveira 582 751 15 19E.E. Mrcio de Souza e Mello 451 11E.E. Jardim Horizonte 305 268 9 7
ESCOLAS MUNICIPAIS
EMEIF Aparecida Marques Vaccaro 421 15C.M. Eva Soares Boigues 47 4C.M. Nossa Senhora da Paz 40 3C.M.Jos Loureno da Silva 16 2EMEIF lvares Machado 12 1016 1 38EMEIF Gov. Franco Montoro 253 613 8 20TOTAL 686 1629 1416 1019 9 24 58 39 26Fonte: Secretaria de Estado da Educao, Censo Escolar 2004. Disponvel em http://escola.edunet.sp.gov.br/Download/downloads.htm. Org: BAGLI, Priscilla. Maio/2005.
O municpio de lvares Machado possui 4 escolas estaduais e 6 municipais
que atendem 4.853 alunos, desde a educao infantil (creches e pr-escolas) at o ensino
mdio. Duas escolas (1 estadual e 1 municipal) e 1 creche esto localizadas no distrito de Cel.
Goulart e atendem tanto a populao do distrito quanto a populao das reas rurais prximas. 8 O municpio possui 5 ambulncias para a remoo de pacientes. Inmeras so as viagens realizadas diariamente por cada ambulncia ao municpio de Presidente Prudente. H tambm um micro nibus que leva pacientes que realizam tratamentos especficos em hospitais de So Paulo e de outras cidades, como Marlia. Entretanto, isso s ocorre a cada 15 dias ou mais, dependendo da periodicidade do tratamento e da quantidade de pessoas a ser deslocadas.
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http://escola.edunet.sp.gov.br/Download/downloads.htmA prefeitura disponibiliza diariamente micronibus para o transporte escolar dos moradores
da zona rural. H tambm salas de aulas destinadas especialmente para a educao de jovens e
adultos. O projeto EJA Ensino Mdio atende 81 alunos, enquanto o EJA 1 a 4 atende 18
alunos. importante ressaltar que uma boa parcela desses alunos composta por adolescentes
em idade escolar, mas que esto atrasados nos estudos. Existem tambm os telecursos, projeto
de alfabetizao exclusivo para adultos. Os telecursos atendem 85 pessoas no ensino
fundamental e 57 no ensino mdio.
Um dos principais problemas em relao falta de recursos. O repasse de
verbas para o setor educacional, tanto municipal quanto estadual, no suficiente para realizar
os investimentos necessrios em infra-estrutura e melhorias em geral. Isso tem acentuado o
quadro de precariedade das escolas pblicas em lvares Machado. Precariedade que atinge de
forma direta a qualidade do ensino pblico do municpio. Outro problema que tambm afeta a
qualidade educacional a quantidade de alunos por sala de aula. No ensino fundamental
existem em mdia 36 alunos por sala, enquanto no ensino mdio as salas chegam a ter quase
40 alunos. Esse problema mais explcito na E.E. Mrcio de Souza e Mello, localizada no
Jardim Panorama, onde a mdia de 41 alunos por classe. Na E.E. Prof. Anglica de Oliveira,
situada no centro da cidade, existem aproximadamente 38 alunos por classe no ensino
fundamental, enquanto no ensino mdio o nmero sobe para 39 alunos.
A precariedade tem motivado muitos pais colocar os filhos em escolas
(pblicas ou privadas) de Presidente Prudente por consider-las de melhor qualidade. Mas no
apenas a precariedade do ensino pblico municipal e estadual que tem motivado a procura
por escolas em Presidente Prudente. A falta de vagas tem se constitudo como principal
motivo dessa prtica. Comparando os dados da Secretaria de Estado da Educao e do Censo
Demogrfico 2000 do IBGE (Projeo 2004), possvel visualizar o dficit educacional
existente no municpio. Faltam vagas em todos os nveis de ensino do fundamental ao mdio,
sendo que o dficit maior est no ensino fundamental (ver tabela abaixo).
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Tabela 4 Dficit educacional no municpio de lvares Machado
Faixa etria Qtde. de pessoas Matrculas em escolas pblicas
Dficit educacional
5 a 6 anos 928 686 2427 a 14 anos 3784 3035 74915 a 17 anos 1493 1019 474
Total 6205 4740 1465Fonte: Secretaria de Estado da Educao Censo Escolar 2004; Censo Demogrfico, IBGE, 2000 (Projeo 2004). Org.: BAGLI, Priscilla. Maio/2005. Clculos realizados com base no cruzamento de dados do Censo IBGE (por faixa etria) e da Secretaria do Estado da Educao (nmero de crianas em idade escolar).
Segundo dados do INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais do Ministrio da Educao, no municpio de lvares Machado h
aproximadamente 800 pessoas matriculadas em escolas privadas, sendo que o maior nmero
de matrculas concentra-se no ensino fundamental. H, no municpio, 8 escolas privadas,
sendo 3 de ensino pr-escolar, 4 de ensino fundamental e 1 de ensino mdio. Mesmo somando
as matrculas dos ensinos pblico e privado, o dficit educacional do municpio chega a
atingir mais de 600 crianas e adolescentes. Dficit que leva centenas de pessoas a se deslocar
diariamente para estudar em escolas pblicas ou privadas de Presidente Prudente, acentuando
os fluxos pendulares entre os dois municpios.
Ocorre que nem todos podem arcar com os custos dos deslocamentos
dirios, mesmo considerando o desconto de 50% no valor das passagens das linhas
intermunicipais concedido aos estudantes. Num efeito cascata, o problema da falta de verbas
desemboca na falta de vagas que, por sua vez, cria uma despesa extra para o municpio. O
dficit educacional gera, portanto, um nus para o poder pblico municipal. Para atender os
estudantes de baixa renda, o municpio tem que arcar com as despesas de transporte escolar,
como forma de compensar a falta de vagas nas escolas pblicas municipais e estaduais. Em
lvares Machado, h um nibus que realiza diariamente o deslocamento desses alunos at as
escolas de Presidente Prudente9. Contudo, essa medida no soluciona o problema para o
municpio que continua sem investir em escolas de boa qualidade.
9 Diariamente h um nibus que leva e traz os alunos que estudam em Presidente Prudente. O nibus realiza quatro viagens: de manh (leva os alunos para as escolas), no almoo (leva os alunos que estudam no perodo da tarde e traz os que levou pela manh), tarde (traz os que levou no almoo e leva o pessoal que estuda no perodo noturno), e a noite (traz os alunos do perodo noturno de volta para o municpio). Segundo Adriana Zangirolami, Secretria de Planejamento, o nibus para o transporte de alunos foi promessa de governo realizada durante as eleies que o prefeito fez questo de cumprir. importante ressaltar que o uso de nibus no exclusivo aos alunos carentes. H alunos de escolas particulares que dele se utilizam para ir escola.
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Nota-se que, tanto no que diz respeito sade quanto educao, as
solues buscadas pelos governantes municipais so sempre paliativas. Solues que no
contribuem de nenhuma forma para a autonomia do municpio de lvares Machado. Ao
contrrio, apenas acentuam a relao de dependncia com Presidente Prudente.
Outro problema enfrentado pelo municpio o expressivo xodo rural.
Comparando os dados dos dois ltimos censos demogrficos, nota-se que mais de 26% da
populao rural deixou o campo (ver tabela 2). Provavelmente, uma grande parcela desses
26% migrou para a cidade, posto que a populao urbana de lvares Machado cresceu mais
de 30%. Atualmente, o municpio possui cerca de 200 pequenas propriedades rurais,
conforme informou o Prefeito Luiz Antnio Lustre.
Considerando os problemas enfrentados pelos muncipes, no que diz
respeito a educao, sade, emprego e a questo agrria, lvares Machado teria fortes
motivos para justificar desempenho inverso ao constatado nos dois ltimos censos, ou seja, se
ao invs de crescimento, o municpio tivesse apresentado perda de populao. No entanto, o
crescimento populacional do municpio foi altamente expressivo, destacando-se entre os
demais. Um dos objetivos propostos foi justamente compreender a causa desse crescimento
mesmo com aos problemas enfrentados pelo municpio em diversos setores e a dependncia
existente em relao ao municpio de Presidente Prudente.
Vejamos agora o caso de Mirante do Paranapanema. Em 2002, segundo o
Cadastro Central de Empresas, o municpio de Mirante do Paranapanema possua 233
empresas de comrcio, incluindo estabelecimentos de reparao de automveis, objetos
pessoais e domsticos; 52 empresas de alojamento e alimentao; 12 estabelecimentos de
transporte, armazenagem e comunicao; 9 estabelecimentos de atividades imobilirias,
aluguis e servios prestados empresas; alm de 6 estabelecimentos educacionais e 9 de
sade e servios sociais. Em 2002, de acordo com os dados do IBGE, o PIB do setor de
servios foi de R$ 35.122.000,00. Em relao ao setor secundrio, existem 28 indstrias de
transformao, a maioria de pequeno porte, e 2 indstrias extrativas. O PIB industrial, em
2002, foi de R$ 6.700.000,00.
O municpio tambm apresenta problemas no setor de sade e educao.
Todavia, a anlise deve ser realizada de forma a considerar as diferencialidades existentes no
municpio em questo. O ponto crucial est na existncia dos assentamentos rurais, fruto do
intenso processo de luta pela terra. O desafio, portanto, est em compreender as contradies
oriundas desse processo e as respectivas conseqncias para o municpio.
Desde a dcada de 1990, o municpio de Mirante do Paranapanema tem se
destacado por conflitos agrrios. O primeiro enfrentamento entre sem-terra e fazendeiros
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ocorreu em 23 de Maro de 1991, quando as famlias que estavam acampadas s margens da
Rodovia SP-613 ocuparam a Fazenda So Bento. Na poca, essa fazenda com 5.106 ha.
estava sob o domnio de Antnio Sandoval Neto (FERNANDES, 1999)10. Enormes foram os
desdobramentos dos conflitos por terra em Mirante do Paranapanema: enfrentamentos diretos
(ocupaes e reocupaes e terras) ou via aes judiciais (liminares e concesses de
reintegrao de posse, prises), despejos (com o uso de fora policial). No dia 10 de junho de
1991, ocorreu o primeiro conflito armado entre os trabalhadores sem-terra e jagunos
contratados pelos fazendeiros para defender o domnio das terras11.
Desde o princpio, a maior parte da populao se posicionou contrria s
manifestaes e reivindicaes dos trabalhadores sem terra. O principal motivo era que as
reivindicaes via ocupao de terras atacavam o direito propriedade12. Isso acontecia, em
parte, por as pessoas desconheciam o carter devoluto das terras ocupadas. Ignoravam,
portanto, o fato de que o verdadeiro dono das terras que estavam sob o domnio dos
fazendeiros era o prprio Estado. Quando os conflitos se acirraram, a insatisfao aumentou,
pois as pessoas acreditavam que esse tipo de conflito funcionava apenas como propaganda
negativa para o municpio. Raros eram os que se posicionavam a favor das manifestaes.
Aps muitos impasses e enfrentamentos, os primeiros assentamentos foram criados (So
Clara e So Bento). At o censo de 2000, Mirante do Paranapanema possua 28 assentamentos
rurais. A tabela abaixo contm a relao desses assentamentos e suas principais
caractersticas.
10 Segundo Fernandes (1999), o Municpio de Mirante do Paranapanema possua, de acordo com a Ao Discriminatria ajuizada em 01 de Dezembro de 1938, 66.608, 95 ha. de reas devolutas. Todavia, o estado s registrou essa deciso em 1958 e apenas cinqenta anos mais tarde comeou a legitimar ou no os ttulos de domnio. Fato que s se consumou em razo da presso exercida pelo processo de luta pela terra. 11 Para maior detalhes sobre os conflitos e seus desdobramentos, ver Fernandes, Bernardo Manano. MST: formao e territorializao em So Paulo. So Paulo: Hucitec, 1999. 12 Direito esse que para muitos considerado sagrado. Para saber mais detalhes sobre a origem e os desdobramentos da propriedade privada da terra, ver BAGLI, Priscilla. Conflitos no campo: as faces da violncia na luta pela terra. Monografia de bacharelado. Presidente Prudente, 2001.
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Tabela 5 Assentamentos rurais no municpio de Mirante do Paranapanema
Nome do Assentamento Nmero de Lotes
Ano de implantao
rea total(ha)
Domnio da terra
Estrela D'Alva 31 1995 785 Estadual So Bento 182 1995 5.191 EstadualChe Guevara (Santa Clara) 46 1995 976 EstadualArco-Iris 105 1995 2.607 EstadualCana 55 1995 1.224 EstadualFlor Roxa 39 1995 954 EstadualHaroldina 71 1995 1.965 EstadualKing Meat 46 1995 1.135 EstadualSanta Carmem 37 1995 1.043 EstadualSanta Cruz 17 1995 294 EstadualSantana 12 1995 212 EstadualLua Nova 17 1996 375 EstadualNovo Horizonte 57 1996 1.541 EstadualPontal (Santa Rosa 2) 14 1996 232 EstadualSanta Cristina 35 1996 838 EstadualSanta Isabel 1 70 1996 492 EstadualSanta Lcia 24 1996 597 EstadualSanta Rosa 1 24 1996 692 EstadualSanto Antonio1 17 1996 532 EstadualVale dos Sonhos 23 1996 618 EstadualWashington Lus 16 1996 343 EstadualSanta Apolnia 104 1996 2.658 EstadualAlvorada 21 1997 565 EstadualMarco II 9 1997 243 EstadualNossa Senhora. Aparecida 9 1997 175 EstadualSanto Antonio II 21 2000 515 EstadualAntonio Conselheiro 65 2000 1.079 FederalPaulo Freire 62 2000 1.196 FederalFonte: DATALUTA Banco de dados da luta pela terra, 2004. Org: BAGLI, Priscilla. Maio/2005
A insatisfao que j era grande por parte da populao local aumentou com
a implantao dos assentamentos rurais. Alguns setores foram sobrecarregados com a chegada
dos assentados ao municpio. O atendimento mdico-hospitalar que j era ruim ficou ainda
mais precrio, em razo do excesso de pessoas. Em 2002, o nico hospital que o municpio
possua foi fechado. A prefeitura Municipal passou a disponibilizar ambulncias para a
remoo de pacientes em casos mais graves aos hospitais de Presidente Prudente e de
Teodoro Sampaio. Mas essa medida no solucionou o problema principal: o municpio
continuou sem ter como atender seus muncipes.
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Segundo o Assessor de Relaes Pblicas Domingos Machado Vasconcelos
a chegada da populao assentada sobrecarregou o atendimento, tornando-o mais precrio.
Entretanto, culp-la exclusivamente pelo fechamento do Hospital Municipal seria grande
equvoco. A Prefeitura de Mirante do Paranapanema, h anos vinha acumulando dvidas em
razo dos sucessivos desfalques realizados nos cofres pblicos do municpio13. O Hospital
Municipal tornou-se uma despesa impossvel de ser mantida. Optou-se, portanto, por fech-lo,
j que no havia recursos suficientes para mant-lo em bom funcionamento.
O atendimento emergencial realizado nos Postos de Atendimento de
Sade (PAS), organizados pelo Programa de Sade da Famlia (PSF), vinculados ao SUS
(Sistema nico de Sade). O PSF resultado de um convnio entre os governos federal,
estadual e municipal. H cinco deles no municpio. Alm dos PSF's que atendem pelo SUS, o
municpio tambm possui um estabelecimento de sade com atendimento privado.
Vale destacar a forte presso exercida pelo MST (Movimento dos
Trabalhadores Sem Terra) para melhorar as condies de vida da populao assentada.
Presso que trouxe resultados positivos em relao ao atendimento mdico no municpio.
Graas s reivindicaes, os assentados passaram a contar com atendimento ambulatorial no
interior dos prprios assentamentos, facilitando os deslocamentos e deixando de sobrecarregar
os postos de sade localizados na cidade. Vasconcelos informou que, dos cinco PSF's
existentes no municpio, trs esto situados na zona rural nos assentamentos So Bento, Santa
Rosa e Che Guevara. O PSF situado no Assentamento Che Guevara foi o ltimo a ser
implantado, resolvendo o impasse existente entre os municpios de Mirante do Paranapanema
e de Teodoro Sampaio. Anterior a existncia do PSF, a maioria da populao dos
assentamentos Che Guevara, Paulo Freire e Antonio Conselheiro procurava assistncia
mdica em Teodoro Sampaio, em razo das facilidades de deslocamento e da distncia,
superlotando o atendimento mdico desse municpio. Atualmente, a proximidade do PSF
amenizou essa relao e apenas os casos mais graves so repassados ao Hospital de Teodoro
Sampaio.
Existe tambm, nos assentamentos, o trabalho dos agentes de sade que
realizam visitas peridicas aos assentados com o objetivo de fazer um pr-diagnstico,
encaminhando, se necessrio, os casos mais graves para o mdico do PSF mais prximo.
Quando um paciente necessita de atendimento mdico especializado encaminhado ao posto
de sade da cidade. A importncia dos agentes de sade est no trabalho preventivo que
realizam com os assentados, orientando e informando sobre endemias locais, preveno de
doenas, higiene pessoal, aproveitamento dos recursos naturais, alm de realizar 13 Para se ter uma idia do endividamento municipal, no foi impossvel agendar a visita prefeitura por telefone, posto que as linhas estavam cortadas em funo da falta de pagamento.
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acompanhamento a gestantes (pr-natal, alimentao) e orientar as mes nos cuidados com as
crianas (aleitamento materno, vacinao, crescimento e desenvolvimento do beb).
Embora a instalao de PSF's no interior dos assentamentos tenha facilitado
a vida da populao assentada, no possvel afirmar que o municpio de uma forma geral
adquiriu autonomia no setor de sade. O atendimento desses postos fica restrito a casos mais
simples, como, primeiros socorros, curativos, pequenas suturas, fraturas, diagnsticos
simplificados, tratamento de viroses, entre outros. No Posto de Atendimento de Sade
localizado na cidade, h atendimento mdico especializado. Todavia, casos mais graves, como
cirurgias, diagnsticos detalhados e exames laboratoriais so realizados nos hospitais de
Presidente Prudente e de Teodoro Sampaio. A presso exercida pelos movimentos sociais foi
importante, mas ainda h muito que se fazer para melhorar o atendimento mdico e hospitalar
do municpio.
Outro setor que ficou sobrecarregado com a chegada da populao
assentada foi o educacional. Enquanto o nmero de crianas e adolescentes em idade escolar
aumentou consideravelmente, as vagas permaneceram as mesmas. A falta de vagas e as
dificuldades de deslocamento impossibilitaram muitas crianas de estudar. Novamente vale
destacar que a atuao do MST foi fundamental para amenizar esse quadro de dficit
educacional no municpio. Aps intensa presso, o movimento conseguiu levar para os
assentamentos seis escolas pblicas (trs municipais e trs estaduais) que atendem 842
crianas e adolescentes da pr-escola ao ensino mdio (ver tabela abaixo).
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Tabela 6 Escolas estaduais e municipais em Mirante do Paranapanema
ESCOLAS ESTADUAIS
QUANTIDADE DE ALUNOS QUANTIDADE DE SALAS
CrechePr-
escola
Ensino Fundam.
(1a4) (5a8)Ensino Mdio Creche
Pr-escola
Ensino Fundam.
(1a4) (5a8)Ensino Mdio
E.E. Prof.Joana Costa Rocha 427 16E.E. Kosuke Endo 102 119 87 5 5 4E.E. Jos Quirino Cavalcante 417 403 14 12E.E. Maria Aparecida de Azeredo Passos 186 79 8 4E.E. Prof. Zulenka Rapchan 162 178 127 7 7 5E.E. Prof. Shizuo Nishikawa 54 4E.E. Fazenda So Bento 187 284 133 8 10 5E.E.Assentados da Fazenda Santa Clara 65 4
ESCOLAS MUNICIPAIS
EMPSG Zenobia Gregrio Campelo Cabral 102 84 5 4E.M. Prof. Shizuo Nishikawa 27 2C.M. N.Sra. de Ftima 40 4C.M. Santa Isabel 30 4C.M. Prof. Lcia Lcia Vasconcelos Kasae 57 97 3 4EMR Assentamento Sta. Rosa 29 2EMEIF de Costa Machado 70 3EMEIF Cuiab Paulista 18 1EMEIF Assentamento S.Bento 27 1TOTAL 127 314 1083 1238 829 11 14 48 48 30Fonte: Secretaria de Estado da Educao, Censo Escolar 2004. Disponvel em http://escola.edunet.sp.gov.br/Download/downloads.htm. Org: BAGLI, Priscilla. Maio/2005. Em destaque, as escolas localizadas nos assentamentos rurais.
Atualmente, o municpio de Mirante do Paranapanema possui 8 escolas
estaduais e 9 escolas municipais que atendem aproximadamente 3.600 alunos. H escolas na
sede do municpio, nos assentamentos e nos distritos. O Distrito de Costa Machado possui
duas escolas municipais e uma escola municipal. Situao semelhante ocorre no Distrito de
Cuiab Paulista. Alm do ensino normal, destinados s crianas em idade escolar, existem, no
municpio, projetos educacionais especficos a adolescentes e adultos que pararam de estudar
ou que esto, em relao idade, atrasados nos estudos. O projeto EJA (Educao de Jovens e
Adultos) atende 20 alunos de 1 a 4 e 27 alunos de 5 a 8, enquanto o EJA Ensino Mdio
atente 68 alunos. Ao todo, so 115 alunos atendidos pelo projeto. H tambm o projeto
Telecurso, destinado alfabetizao especfica de adultos. Em 2004, 215 alunos estavam
matriculados no Telecurso, sendo 139 no ensino fundamental (55 s nos assentamentos) e 76
no ensino mdio. Analisemos, portanto, o dficit educacional no municpio.
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http://escola.edunet.sp.gov.br/D