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Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa Lato Sensu em Direitos Humanos e Proteção
Trabalho de Conclusão de Curso
SER JOVEM É FATOR DE RISCO PARA A VIOLÊNCIA?
Brasília - DF
2010
Autor: Sueli Maria Gabriel
Orientadora: Anelise Pereira Sihler
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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE BRASÍLIA UCB VIRTUAL
CURSO DE DIREITOS HUMANOS E PROTEÇÃO SUELI MARIA GABRIEL
SER JOVEM É FATOR DE RISCO PARA A VIOLÊNCIA?
BRASÍLIA – DF 2010
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SUELI MARIA GABRIEL
SER JOVEM É FATOR DE RISCO PARA A VIOLÊNCIA?
Monografia apresentada ao curso de Direitos Humanos e Proteção na Universidade Católica de Brasília como requisito parcial para a obtenção do título de Especialista em Direitos e Humanos e Proteção Orientadora: Anelise Pereira Sihler
BRASÍLIA – DF 2010
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FOLHA DE APROVAÇÃO
Monografia de autoria de SUELI MARIA GABRIEL, intitulada “SER JOVEM É FATOR DE RISCO PARA A VIOLÊNCIA?”, apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de Especialista em Diretos Humanos e Proteção da Universidade Católica de Brasília, em 19/11/2010, defendida e aprovada pela banca examinadora abaixo assinada: Prof. Msc Anelise Pereira Sihler
Orientadora CURSO DE DIREITOS HUMANOS E PROTEÇÃO – UCB VIRTUAL
BRASÍLIA – DF 2010
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AGRADECIMENTOS
A minha mãe Maria Benedita, minha filha Fernanda Cristina, meu genro Uilson e
meus netos, Filippe Gabriel e Valentina
A todos aqueles que, direta ou indiretamente, acreditam e me incentivam a correr
atrás dos meus ideais.
A todos os componentes da equipe do PPCAAM/SP, que me permitiram tomar
contato com o tema, o que despertou em mim além do interesse, o compromisso
social. Especialmente, a Andréia e Maura, que garantiram a tranqüilidade necessária
durante as pesquisas sobre o tema.
Agradeço também a tolerância da minha amiga Cacilda que durante meses permitiu
que eu me instalasse em sua residência nos finais de semana para elaborar meu
tcc.
A UCB – Universidade Católica de Brasília, a equipe de coordenação e apoio, em
especial à Professora Anelise, que me abriu as portas e o coração para que eu
desse mais este passo.
A Luciana por sua dedicação em auxiliar-me nas pesquisas pertinentes ao tema.
A mim mesma, pela iniciativa e dedicação.
Luz e Energia a todos vocês! Sueli Maria Gabriel
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DEDICATÓRIA
A minha Orientadora Professora Anelise Pereira Sihler, por sua generosidade, por
sua compreensão, carinho, tolerância e crença na certeza de que o trabalho seria
concluído.
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“Não, não tenho caminho novo, o que tenho novo é o jeito de caminhar”
Thiago de Mello
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RESUMO Referência: SUELI MARIA GABRIEL . Título: SER JOVEM É FATOR DE RISCO PARA A VIOLÊNCIA. Curso de Administração. Universidade Católica de Brasília, Brasília – DF, 2010. Os números oficiais nacionais existentes sobre violência, bem como pesquisas quantitativas e qualitativas pontuais, confirmam que são jovens as maiores vítimas da violência no Brasil. Isto se manifesta de maneira mais exacerbada no caso de homicídios, sendo que as taxas deste crime entre jovens do sexo masculino no Brasil se comparam às de regiões conflagradas. Este trabalho objetiva discorrer sobre a importância da interação do adolescente com seu contexto familiar, fundamentalmente em referência ao problema das toxicomanias e fatores de risco iminente de morte. O Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados de Morte (PPCAAM) tem como objetivo, a preservação de vida de crianças, adolescentes e jovens egressos do Sistema Sócio-Educativo ameaçado de morte (conforme estabelecido no artigo 2º, parágrafo único, da Lei nº 8.069/99) exposto à coação ou grave ameaça no Município de São Paulo. O caso fora acolhido no PPCAAM no ano de 2008, sendo incluso o adolescente Pedro e seus familiares, a genitora e um irmão mais novo. Um programa compreensivo e voltado à promoção da saúde precisa entender essa quase inevitabilidade com a qual convive o ser humano de buscar algum tipo de prazer em substâncias que produzem algum tipo de sensação. E entender também que a prevenção do abuso de drogas é sinônimo de vida saudável, empreendimento tão importante para os jovens que deve incluir a família, a escola, o grupo de pares, a comunidade e a mídia. É necessário promover um crescimento e desenvolvimento saudáveis, maior igualdade social e de oportunidades, atuar contra a pobreza e o racismo, voltar-se para o desenvolvimento do protagonismo juvenil são propostas que convergem para o cumprimento do ECA e a favor da democracia.
Palavras-chave: juventude, drogas, proteção pessoa humana, políticas públicas
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ABSTRACT Official figures on existing domestic violence and specific quantitative and qualitative research confirms that young people are the biggest victims of violence in Brazil. This manifests itself in a more exacerbated in the case of homicide, with rates of crime among young men in Brazil are comparable to those in conflict regions. This paper aims to discuss the importance of the interaction of adolescents with their family background, primarily in reference to the problem of addiction and risk factors for imminent death. The Program to Protect Children and Adolescents Threatened with Death (PPCA) is aimed at the preservation of life of children, adolescents and young graduates System Socio-Educational threatened with death (as defined in Article 2, paragraph, of Law No. 8.069/99) exposed to coercion or serious threat in São Paulo. The case was dismissed in PPCAAM in 2008, and included the teenage Peter and his family, the progenitor and a younger brother. And a comprehensive program aimed at health promotion must understand that almost inevitability with which the human lives to seek pleasure in some sort of substances that produce some kind of sensation. And also understand that the prevention of drug abuse is synonymous with healthy living, new development so important for young people should include family, school, peer group, community and media. It is necessary to promote a healthy growth and development, greater social equality and opportunity, to act against poverty and racism, turning to the development of youth participation are proposed that lead to the fulfillment of the ECA and for democracy. Keywords: youth, drugs, human protection, public policy
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SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ........................................................................................... 14
1.1 Justificativa ............................................................................................. 15
1.2 Vitimização Juvenil ................................................................................. 15
1.3 Objetivos ................................................................................................. 17
1.3.1 Objetivo Geral ...................................................................................... 17
1.3.2 Objetivo Específico .............................................................................. 19
1.4 Metodologia e Métodos ........................................................................... 19
2 CENÁRIO DE RISCO PARA O JOVEM NA CIDADE DE SÃO PAULO ... 21
2.1 Risco e fatores de risco .......................................................................... 21
2.2 Proteção e fatores de proteção ............................................................... 27
2.3 Estratégias de prevenção ....................................................................... 33
3 O QUE É O PROGRAMA DE PROTEÇÃO À CRIANÇAS E
ADOLESCENTES AMEAÇADOS DE MORTE (PPCAAM) .........................
36
3.1 Objetivos do Programa de Proteção à Crianças e Adolescentes
Ameaçados de Morte (PPCAAM) .................................................................
36
3.2 Histórico do Programa de Proteção à Crianças e Adolescentes
Ameaçados de Morte (PPCAAM) .................................................................
36
3.3 Responsabilidades do Programa de Proteção à Crianças e
Adolescentes Ameaçados de Morte (PPCAAM) ...........................................
36
3.4 Recursos Humanos envolvidos no Programa de Proteção à Crianças e
Adolescentes Ameaçados de Morte (PPCAAM) ...........................................
38
3.5 Atuação do Programa de Proteção à Crianças e Adolescentes
Ameaçados de Morte (PPCAAM) .................................................................
39
3.6 Perfil dos casos atendidos ...................................................................... 40
3.7 Balanço dos usuários assistidos pelo Programa de Proteção à
Crianças e Adolescentes Ameaçados de Morte (PPCAAM) ........................
42
4 ESTUDO DE CASO: PEDRO (*) ............................................................... 44
4.1 Repercussões do caso na mídia.............................................................. 47
4.2 Resultados Esperados............................................................................ 47
5 CONCLUSÃO ............................................................................................ 51
11
6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................... 53
Anexos .......................................................................................................... 58
12
LISTA DE ANEXOS
Anexo 1 – Reportagem ................................................................................. 59
Anexo 2 – Reportagem ................................................................................. 61
Anexo 3 – Reportagem ................................................................................. 63
13
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1 – Homicídios não-jovens: período 1980-2007 ............................... 15
Gráfico 2 – Homicídios na população em geral: período 1997-2007 ............ 16
Gráfico 3 – Mortes por homicídios nas capitais: período 1997-2007 ............ 16
Gráfico 4 – Casos atendidos considerando o sexo ...................................... 40
Gráfico 5 – Casos atendidos considerando a etnia ...................................... 40
Gráfico 6 – Casos atendidos considerando a porta de entrada .................... 41
Gráfico 7 – Casos atendidos considerando a modalidade de proteção ....... 41
Gráfico 8 – Proteção: período – 2003 a 2010 ............................................... 42
Gráfico 9 – Proteção: Ano de 2009 ............................................................... 42
Gráfico 10 – Proteção: Ano de 2010 ............................................................. 43
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1 INTRODUÇÃO
Os números oficiais nacionais existentes sobre violência, bem como
pesquisas quantitativas e qualitativas pontuais, confirmam que são jovens as
maiores vítimas da violência no Brasil. Isto se manifesta de maneira mais
exacerbada no caso de homicídios, sendo que as taxas deste crime entre jovens do
sexo masculino no Brasil se comparam às de regiões conflagradas.
Os dados sobre agressores também confirmam a predominância dos
jovens em alguns crimes tipificados em nosso Código Penal, em especial homicídios
e lesões corporais. Cabe lembrar, entretanto, que os crimes que chegam a ser
registrados e tipificados correspondem somente a uma parcela, em muitos casos,
bem pequena da sociedade, do que de fato o que ocorre na sociedade.
O tema risco é eminentemente juvenil. Aos jovens costuma-se associar a
inconseqüência, a paixão pelas emoções fortes, os excessos impulsivos, a
vulnerabilidade psicoemocional ou a disposição ao individualismo narcísico que
ensejariam “comportamentos de risco”. Algo desta percepção certamente se deve ao
teor conservador, no sentido de preservador, da retórica da estabilidade e da
responsabilidade do mundo adulto. Outra parte, no entanto, está referida à própria
condição juvenil e a imprevisibilidade contida na passagem de uma experiência de
vida majoritariamente pautada pelas relações que se estabelecem no espaço
protegido e controlado da convivência familiar para às múltiplas vivências possíveis
no cenário mais amplo dos espaços públicos, nos quais tem lugar a efetiva
construção da autonomia.
É interessante observar que os próprios jovens percebem a convivência
com riscos como aspecto inerente a condição juvenil, tendo sido este o principal
aspecto negativo de ser jovem identificado pela pesquisa Perfil da Juventude
Brasileira – 2003. Mas o que seriam estes riscos? Segundo a opinião dos jovens, as
principais questões associadas a esta noção são as drogas, a violência e as más
companhias, sendo os riscos iminentes as possibilidades de dependência química,
de vitimização por agressões ou de envolvimento em situações perigosas por
influência do grupo de amigos.
Talvez mais do que falar na juventude como fator de risco, faça sentido
pensar nos fatores de risco para os jovens hoje. Além do claro recorte de sexo, pois
15
são os jovens do sexo masculino os que mais se vitimam e mais incorrem em
delitos, Soares (2004: p. 138) menciona outros fatores trabalhados por autores em
suas pesquisas.
Portanto diante das altas taxas de violência e violações de direitos
existentes na sociedade brasileira, é da maior importância que uma política nacional
com foco na prevenção da violência se consolide, incluindo ações locais para o
enfrentamento de fatores de risco e a potencialização de fatores de proteção,
principalmente em relação às crianças, aos adolescentes e suas famílias.
1.1 Justificativa
Para a pesquisa e o estudo de caso alguns aspectos foram relevantes:
O Brasil ocupa a 5ª posição no ranking de 91 países que registram as
maiores taxas de homicídios entre crianças e adolescentes;
A faixa etária com maior crescimento nos índices de violência letal é entre 14
e 16 anos, apresentando elevação de mais de 30% (1997-2007);
Entre os jovens do sexo masculino, o índice é de 93,9% (2007);
O índice de vitimização negra foi de 107,6% (2007);
1.2 Vitimização Juvenil
Após levantamento em pesquisa foi possível evidenciar os seguintes
dados quantitativos:
Em 1980 as taxas de homicídio entre não-jovens foram de 21,1 a cada 100
mil. Já em 2007, essa taxa cai para 19,8.
16
19
19,5
20
20,5
21
21,5
1980 2007
Homicídios não-jovens
Gráfico 1 – Homicídios não-jovens: período 1980-2007
Entre os jovens de 15 a 24 anos de idade em 2007 chegou a
50,1 para cada 200 mil.
Isso revela, de forma inequívoca, a exclusiva participação juvenil no
drama do crescimento da violência letal do País. Pode-se afirmar, portanto, que a
história recente da violência homicida no Brasil é a história do desenvolvimento de
sua questão juvenil. Uma não terá solução sem a outra.
Entre 1997 e 2007, o número de homicídios na população em geral passou
de 40.507 para 47.707; em todo período, foram 512 mil vítimas de violência
letal.
36.000
38.000
40.000
42.000
44.000
46.000
48.000
1997 2007
Homicídios napopulação emgeral
Gráfico 2 – Homicídios na população em geral: período 1997-2007
Registra-se uma queda de 19,8% nas mortes por homicídio nas capitais e
25% nas regiões metropolitanas (1997-2007);
17
0,00%
5,00%
10,00%
15,00%
20,00%
25,00%
1997 2007
Mortes porhomicídio nascapitais
Gráfico 3 – Mortes por homicídios nas capitais: período 1997-2007
Considerando 11 das 27 Unidades Federadas tiveram crescimento
negativo na década, com valores bem significativos para São Paulo, cujas taxas, na
década, regridem 69,4% (menos de um terço do que eram em 1997). Maceió, Recife
e Vitória lideram, em 2007, as capitais pelas suas taxas de homicídio. Salvador teve
crescimento de 45% entre 1997-2007.
1.3 Objetivos
1.3.1 Objetivo Geral
Este trabalho objetiva discorrer sobre a importância da interação do
adolescente com seu contexto familiar, fundamentalmente em referência ao
problema das toxicomanias e fatores de risco iminente de morte.
No Brasil, notadamente nas cidades do Rio de Janeiro e São Paulo, o
golpe militar que submeteu o país durante cerca de 20 anos, contribuiu de forma
decisiva para este incentivo ao consumo de drogas, na medida em que incentivava a
um não questionamento da sociedade, ao reprimi-la até a morte, levando ao jovem
como proposta idealizada a aliança com o trabalho, o Brasil grande, do futebol, do
não pensar, do não questionar.
A década de 1990 foi decisiva para o desenvolvimento do narcotráfico.
Ele instalou-se definitivamente nas favelas e nos conjuntos habitacionais de classe
baixa.
Essa comercialização das drogas e o seu conseqüente uso foram, pouco
a pouco, tornando-se assunto diário e comum entre o chamado povão e que passou
18
a ser tratado de forma corriqueira nas novelas e programas de televisão, filmes e
jornais.
O tráfico, também denominado nas favelas de movimento, assumiu
controle do local em virtude principalmente da incapacidade de o estado prestar
serviços básicos e ao incutir a noção de perigo permanente para justificar a ação
policial violenta. Este estado de coisas levou à criação de uma nova rede de
relações clientelistas. O frágil equilíbrio de forças entre líderes comunitários e os
chefes da droga foi pouco a pouco desaparecendo. Hoje, os chefes dos grupos do
narcotráfico dominam e comandam parcela considerável de comunidades.
A imagem dos traficantes sempre foi ambivalente. Se, por um lado, eles
ofereciam segurança, eliminando ou expulsando da comunidade os que roubassem
trabalhadores ou estuprassem mulheres, por outro geravam um clima de ameaças e
de terror.
Este clima era estabelecido em virtude da forma com que incentivavam os
jovens recrutados para o trabalho com o narcotráfico a cometerem crimes e se
tornarem violentos.
Estabeleceu-se um pacto perverso, pois em troca de proteção a
comunidade da favela oferece o silêncio sobre as atividades dos membros do tráfico.
Na maioria das favelas e conjuntos populares, delitos como roubo, estupro, etc.
Costumam ser debelados com ações violentas por parte dos chefes, que impõem
uma forma de justiça pessoal e draconiana. O poder que emana deste tipo de
postura absolutista, impondo código de conduta próprio.
“As exigências sociais que pesam sobre os ombros dos adolescentes são especialmente intensas: desempenhando em diversos campos, novos papéis, renúncias e frustrações constantes, trata-se de um ambiente hostil que oferece muito poucas possibilidades de realização. O confronto do ideal do eu com este contexto leva, em geral, a um choque em que o resultado principal é um intenso sentimento de impotência. O uso de droga, neste caso que pretendo discorrer tem um sentimento de capacitação, poder, que, no limite, equivale à vivência de onipotência, de coloração maníaca, já que procura magicamente anular a insuficiência, a incapacidade e a depressão” (GURFINKEL, 1993: p. 134).
19
Para dar suporte ao caso que pretendo analisar, iremos examinar o
quanto o estudo da família moderna ganhou relevância no século XX,
particularmente no tocante à questão da juventude.
1.3.2 Objetivo Específico
O objetivo específico desta monografia é problematizar sobre o título
central: Ser jovem é fator de risco para a violência? Tomando-se o risco
estritamente como uma ameaça à integridade e ao desenvolvimento do individuo,
com repercussões diretas sobre si e sobre a sociedade.
Enfrentar essas questões e minimizar seus efeitos para os brasileiros
requer levar a sério as dificuldades e as demandas destes, e não adotar uma
perspectiva catastrófica sobre a condição juvenil.
Neste aspecto pretende-se levar a reflexão sobre o tema dos riscos
considerando-se as dificuldades e as estratégias de que os jovens lançam mão na
trajetória que lhes dará acesso ao mundo adulto, de modo que as ações que visam a
prevenção de danos façam algum sentido para os próprios jovens e sejam realmente
efetivas.
Como nos alerta Abramo, cabe lembrar, ainda a importância de inserir os
jovens nas discussões sobre sua situação, sua posição na sociedade, suas
vontades, seus interesses e, conseqüentemente, no desenho das políticas. As ações
que os tenham como foco serão mais eficientes se incorporarem suas visões de
mundo e perspectivas, de maneira democrática.
1.4. Metodologia e Métodos
Para que o objetivo da pesquisa seja alcançado, utilizaram-se três formas
de pesquisa – bibliográfica, documental, estudo de caso – conforme as informações
foram sendo estruturadas.
Enquanto pesquisa bibliográfica vale mencionar Severino (2002: p. 122)
onde é aquela que se realiza a partir do registro disponível, decorrente de pesquisas
anteriores, em documentos impressos, como livros, artigos, teses dentre outros.
20
Segundo Gil (2007: p. 45) a pesquisa documental assemelha-se muito à
pesquisa bibliográfica. A diferença essencial entre ambas está na natureza das
fontes. A pesquisa documental utiliza-se de materiais que não recebem ainda um
tratamento analítico, ou que ainda podem ser reelaborados de acordo com os
objetos da pesquisa..
O estudo de caso, que pertence ao tema central da pesquisa, conforme
estabelece Severino (2002) deve ser significativo e bem representativo, de modo a
ser apto a fundamentar uma generalização para situações análogas, autorizando
inferências.
Neste sentido, além do levantamento do conteúdo, ocorrerá o
levantamento bibliográfico em revistas e livros que tratam do tema, bem como
dissertações e monografias sobre o tema, a partir de 2000.
Os descritores que servirão de base para a pesquisa são: violência,
fatores de risco para os jovens, violência x juventude.
21
2 CENÁRIO DE RISCO PARA O JOVEM NA CIDADE DE SÃO PAULO
2.1 Risco e Fatores de Risco
Risco é uma conseqüência da livre e consciente decisão de se expor a
uma situação na qual se busca a realização de um bem ou de um desejo, em cujo
percurso se inclui a possibilidade de perda ou ferimento físico, material ou
psicológico. De acordo com Pieper e Pieper (1999) o ser humano que possui a
virtude cardeal da fortaleza, expõe-se ao perigo da morte por um bem.
Segundo McCrimmond e Werhrung (1986) existem três condições para a
definição de risco:
Possibilidade de haver perda;
Possibilidade de ganho;
Possibilidade de aumentar ou de diminuir a perda ou os danos.
Segundo grandes filósofos como Heidegger (1980), o risco é inerente à
vida, ao movimento e à possibilidade de escolha. Viver é correr risco e por isso a
incerteza é um componente essencial da existência e igualmente do conceito de
risco.
Giddens (1994) faz uma distinção interessante entre risco e perigo.
Comenta o autor que esses dois termos não são sinônimos embora seu significado
se aproxime. Perigo diz respeito a ameaças que rondam a busca dos resultados
desejados. Risco constitui uma estimativa acerca do perigo.
Na área de saúde, risco é um conceito que envolve conhecimento e
experiência acumulada sobre o perigo de alguém ou de a coletividade ser acometida
por doenças e agravos. Sendo um termo central da epidemiologia, diz respeito a
situações reais ou potenciais que produzem efeitos adversos e configuram algum
tipo de exposição. Definidos a partir de análises coletivas, os alertas trazidos à
população pela epidemiologia se aplicam a cuidados e evitação.
A expressão consagrada fatores de risco designa condições ou variáveis
associadas à possibilidade de ocorrência de resultados negativos para a saúde, o
22
bem-estar e o desempenho social2. Alguns desses fatores se referem a
características dos indivíduos; outros, ao seu meio microssocial e outros, ainda, a
condições estruturais e socioculturais mais amplas3. Mas, geralmente, estão
combinados quando uma situação considerada social, intrapsíquica e
biologicamente perigosa se concretiza4. Como exemplo, podemos mencionar o uso
de drogas: ao fumar maconha, o adolescente pode aumentar a probabilidade de
desenvolver uma doença pulmonar, e também sofrer conseqüências psicossociais
ou sanções legais, conflitos com os pais, perda de interesse na escola ou culpa e
ansiedade.
Sobretudo quando se trabalha com adolescentes, o conceito de risco tal
como visto pela epidemiologia não é suficiente, uma vez que nessa ótica é
entendido, apenas, segundo suas conseqüências negativas. No exemplo dado
acima, está claro que um adolescente que usa maconha em princípio busca prazer e
não dor e sofrimento. Em geral está a cata de extroversão, prazer, novas sensações,
compartilhamento grupal, diferenciação, autonomia e independência em relação à
família, dentre outros efeitos. E nessa procura faz um cálculo do perigo a que se
expõe. Os profissionais que atuam na prevenção precisam saber desse outro lado
da questão, sob pena de não desenvolverem uma compreensão suficientemente
ampla e profunda do fenômeno do uso de drogas.
O lado negativo do desejo juvenil de obter prazer com o uso de drogas é
o risco que ele corre de se tornar dependente e comprometer a realização de tarefas
normais do desenvolvimento; o cumprimento dos papéis sociais esperados; a
aquisição de habilidades essenciais; a realização de um sentido de adequação e
competência e a preparação apropriada para a transição ao próximo estágio na
trajetória da vida: o adulto jovem. O termo comportamento de risco aqui, portanto, se
refere às ameaças ao desenvolvimento bem-sucedido do adolescente. Uma
preocupação básica da educação para a saúde seria, pois, discutir com os
adolescentes os riscos associados aos comportamentos nos quais se engajam mas
tendo o cuidado de não desconhecer o lado prazeroso desse engajamento.
A necessidade de se olhar os dois lados, o do desejo e o do dano, no
caso do uso de drogas, leva a considerar alguns aspectos citados a seguir:
2 NEWCOMB et al, 1986; JESSOR, 1991; JESSOR et al., 1995 3 JESSOR, 1991. 4 ZWEIG et al., 2002.
23
a) Efeitos cumulativos: o que diz respeito aos efeitos cumulativos das
substâncias tóxicas e sua relação com a vulnerabilidade do indivíduo, sabe-
se, de um lado, que a probabilidade de desenvolvimento de determinado
distúrbio aumenta em função do número, da duração e da "toxicidade" dos
fatores de risco envolvidos5, por isso, quanto mais intenso o uso de drogas,
mais fatores de risco existirá6. Por outro lado, vários estudos mostram que o
perigo difere de acordo com os indivíduos e seu contexto.7 enfatizam que os
adolescentes em certo estágio e freqüência de consumo não
necessariamente irão usar drogas mais pesadas. Essa constatação vai contra
a idéia de que haveria certa seqüência na gravidade do risco, indo do
envolvimento sucessivo com substâncias mais leves para uma escalada rumo
às mais nocivas. Alguns estudos chegam a sugerir que cigarro e álcool
funcionariam como ponte (gateway) para um caminho progressivo de
envolvimento com drogas cada vez mais pesadas8 Essa teoria tem
conseqüência para a prática educativa que busca dissuadir os adolescentes
de usar substâncias mais leves, visando a prevenir o uso de outras9. No
entanto, na atualidade, mesmo os estudiosos que continuam a afirmar o risco
de exposição crescente, dizem que a relação é de probabilidade e não
causal10.
b) Família: este aspecto é importante a ser considerado, por ser o risco que
constitui a atitude positiva da família com relação ao uso de drogas,
reforçando a iniciação dos jovens 11. Hoje se sabe que as relações familiares
constituem um dos fatores mais relevantes a ser considerado, mas de forma
combinada com outros. Por exemplo, Schor (1996) aponta que não há uma
relação linear entre o abuso de álcool dos pais e de seus filhos. Sugere que
os padrões de comportamento dos pais e as interações familiares, e não só o
fato de eles beberem, são em boa parte responsáveis pelas atitudes dos
filhos. O alcoolismo tem uma influência destrutiva no funcionamento familiar e
essa disfunção desempenha um papel mediador na transmissão
5 COIE et al, 1993.
6 BRY et al, 1982; NEWCOMB et al, 1986.
7 Kandel et al (1978).
8 DE MICHELLI; FORMIGONI, 2002.
9 BOTVIN, 1986.
10 ELLICKRON; MORTON, 1999.
11 KANDEL et al, 1978.
24
intergeracional de comportamentos. Mas, o que está em questão não é a
droga em si, e sim, a relação que o indivíduo estabelece com ela, que, por
sua vez, influencia e é influenciada fortemente pelo universo de interações.
Embora o consumo de drogas pelos pais esteja relacionado a maior risco de
os filhos se tornarem usuários, uma vez que o comportamento parental lhes
serve de modelo, é a atitude permissiva dos genitores o que mais pesa nessa
equação12. Estudos têm mostrado que os fatores parentais de risco para o
uso de drogas pelo adolescente incluem, de forma combinada:
Ausência de investimento nos vínculos que unem pais e filhos13;
Envolvimento materno insuficiente14;
Práticas disciplinares inconsistentes ou coercitivas15;
Excessiva permissividade, dificuldades de estabelecer limites aos
comportamentos infantis e juvenis e tendência à superproteção;
Educação autoritária associada a pouco zelo e pouca afetividade nas
relações16;
Monitoramento parental deficiente17;
Aprovação do uso de drogas pelos pais18;
Expectativas incertas com relação à idade apropriada do
comportamento infantil19;
Conflitos familiares sem desfecho de negociação20.
c) Envolvimento Grupal: o envolvimento grupal tem sido visto como um dos
maiores prenúncios do uso de substâncias21. No entanto, essa relação
interpares também precisa ser qualificada. Ela se configura como fator de
risco quando os amigos considerados modelo de comportamento22
12
HAWKINS et al, 1 992; BROWN et al, 1993. 13
HAWKINS et al, 1992; PATTON, 1995; KODJO; KLEIN, 2002. 14
TARTER et al, 2002. 15
FRIEDMAN,1 FRIEDMAN, 1989; BROOK et al, 1990; HAWKINS et al, 1992; PATTON, 1995989; BROOK et al, 1990; HAWKINS et al, 1992; PATTON, 1995. 16
TUTTLE et al, 2002; PATTON, 1995. 17
HAWKINS et al, 1992 18
FRIEDMAN, 1989; HAWKINS et al., 1992.
19 TARTER et al., 2002
20 HAWKINS et al., 1992; PATTON, 1995; KODJO; KLEIN, 2002.
21 KAND
21EL et al, 1978; BOTVIN, 1986; BROOK et al, 1990; HAWKINS et al, 1992; OETTING;
DONNERMEYER, 1998; FERGUSSON; HORWOOD, 1999; SWADI, 1999; HOFFMANN; CERBONE, 2002. 22 JESSOR et al, 1995;
22 HOFFMANN; CERBONE, 2002; SWADI, 1999.
25
demonstram tolerância, aprovação23 ou consomem drogas24. Observam os
estudiosos que há uma sintonia, no caso dos pares: os adolescentes que
querem começar ou aumentar o uso de drogas procuram colegas com valores
e hábitos semelhantes25. Ou seja, mesmo no caso de amigos e colegas, a
questão não pode ser vista de forma simplista, pois o desenvolvimento de
afiliações a pares tolerantes e que aprovam as drogas representa o final de
um processo onde fatores individuais, familiares e sociais adversos se
combinam de forma a aumentar a probabilidade do uso abusivo26. O mito que
supervaloriza a influência dos pares durante a adolescência provavelmente
decorre, em algum nível, de certa desresponsabilização, sobretudo por parte
dos pais e dos educadores, de problemas freqüentes nas relações
intrafamiliares ou institucionais. É muito difícil, portanto, como já se referiu,
tomando por base outros fatores, separar e isolar os efeitos que o grupo de
pares tem sobre os adolescentes, embora se saiba que seu poder é
importante no caso do uso de drogas27.
d) Papel da Escola: muito se tem falado também no papel da escola seja como
agente transformador, seja como lócus propiciador do ambiente que exacerba
as condições para o uso de drogas. Ninguém desconhece que essa
instituição é hoje alvo do assédio de traficantes e repassadores de
substâncias proibidas, prevendo-se o aliciamento por pares. Pois a escola é o
espaço privilegiado dos encontros e interações entre jovens. No entanto,
mesmo no âmbito educacional, existem fatores específicos que predispõem
os adolescentes ao uso de drogas, como por exemplo, a falta de motivação
para os estudos, o absenteísmo e o mau desempenho escolar28, a
insuficiência no aproveitamento e a falta de compromisso com o sentido da
Educação, a intensa vontade de ser independente, combinada com o pouco
interesse de investir na realização pessoal29, a busca de novidade a qualquer
23
KODJO; KLEIN, 2002. 24
BEMAN, 1995. 25
TUTLE et al., 2002. 26
FERGUSSON; HOWOOD, 1999 27
SCHOR, 1996 . 28
KANDEL et al, 1978. 29
FRIEDMAN, 1989.
26
preço e a baixa oposição a situações perigosas, a rebeldia constante
associada à dependência a recompensas30.
e) Comunidade de Convivência: a disponibilidade e a presença de drogas na
comunidade de convivência têm sido vistas como facilitadoras do uso de
drogas por adolescentes, uma vez que o excesso de oferta naturaliza o
acesso31. Quando a facilidade da oferta se junta à desorganização social e
aos outros elementos predisponentes no âmbito familiar e institucional,
produz-se uma sintonia de fatores32. A observação sobre esse elemento,
privilegiando-o e ao mesmo tempo associando-o aos outros é importante, pois
permite correlacionar fatos como gravidez precoce e evasão escolar33,
acidentes de carro, homicídios e suicídios34.
f) Mídia: outra tendência muito comum quando se fala de drogas é a
absolutização do papel da mídia como fator de risco. É certo que, sobretudo
no caso das drogas lícitas, os meios de comunicação geralmente mostram
imagens muito favoráveis. O uso do álcool e do tabaco costuma vir
associado, por meio da publicidade, a imagens de artistas, ao glamour da
sociabilidade e à sexualidade. Freqüentemente os anúncios glorificam as
substâncias, retratando-as como mediadoras de fama e sucesso35. Mas não
se pode, teoricamente, demonizar a mídia: de um lado ela reflete e refrata a
cultura vigente. E, de outro, seria um erro menosprezar a capacidade crítica
dos jovens e a sinergia de vários outros elementos com os meios de
comunicação. Nenhuma propaganda por si só atinge efeito demoníaco de
persuasão, quando fatores protetores atuam em direção contrária. O
desenvolvimento de um espírito crítico e reflexivo na família, na escola e com
os pares serve de base para uma atitude criteriosa do adolescente quanto às
mensagens relativas às drogas lícitas, veiculadas pelos meios de
comunicação.
Os diversos elementos tratados acima levam a concluir que não se pode
pensar os fatores de risco de forma isolada, independente e fragmentada.
30
SWADI, 1999. 31
JESSOR, 1991; PATTON, 1995; WALLACE JR, 1999. 32
KODJO; KLEIN, 2002. 33
HAWKINS et al, 1992. 34
KODJO; KLEIN, 2002. 35
PATTON, 1995; KODJO; KLEIN, 2002; MINAYO et al, 1999 ; NJAINE, 2004.
27
Determinado fator de risco raramente é específico de um distúrbio único, porque
seus contextos formadores tendem a espalhar os efeitos dele derivados sobre uma
série de funções adaptadoras ao longo do desenvolvimento. E a exposição ao perigo
que potencializa os riscos ocorre de diversas formas e em vários contextos, como
por exemplo: exacerbando fatores individuais, educação infantil insatisfatória,
fracassos escolares, relações sociais problemáticas entre os pares ou com
desorganização da comunidade36. Mesmo a mais elevada carga genética é menos
provável de se constituir em alto fator de risco numa sociedade na qual a exposição
ao álcool seja severamente restrita37. A postura uni causal, tão freqüente, é
responsável por práticas, orientações e criação de instituições inócuas ou nocivas,
às quais falta uma lógica compreensiva e sistêmica.
Ressaltando a necessidade metodológica de levar em conta a
complexidade das formas de adesão ao uso abusivo de drogas na adolescência é
relevante pensar que há uma estrutura e uma organização dos diferentes fatores,
formando uma síndrome do comportamento de risco, o que remete às premissas do
paradigma sistêmico: os comportamentos de risco co-variam e estão inter-
relacionados. Nessa perspectiva, os esforços preventivos devem visar a modificar as
circunstâncias que sustentam tais síndromes: o estilo de vida que sintetiza um
padrão organizado de comportamentos inter-relacionados, dentro de uma ecologia
social38 e em relações complexas com distúrbios clínicos.
2.2 Proteção e fatores de proteção
Proteger é uma noção que faz parte do contexto das relações primárias e
do universo semântico das políticas sociais. Significa, sobretudo, oferecer condições
de crescimento e de desenvolvimento, de amparo e de fortalecimento da pessoa em
formação. No caso brasileiro, a doutrina da proteção integral se encontra no Estatuto
Brasileiro da Criança e do Adolescente (ECA), que a resume definindo esse grupo
social como:
Cidadão;
36
NEWCOMB et al, 1986; COIE et al, 1993; HAWKINS et al, 1992; PATTON, 1995. 37
Swadi (1999). 38
JESSOR, 1991.
28
Sujeito de Direitos;
Capaz de Protagonismo;
Merecedor de Prioridade de Atenção;
Cuidados.
Dentro dessa premissa de proteção, uma das tarefas de quem atua na
atenção aos adolescentes que usam drogas é determinar que fatores podem ser
evidenciados pela técnica e pela experiência como relevantes para promover seu
crescimento saudável e evitar que corram riscos de dependências e de acirramento
de problemas sociais39
. Cabe ressaltar que os fatores de risco e de proteção devem
ser tratados como variáveis independentes, pois podem afetar o comportamento
sem que haja, necessariamente, uma complementaridade entre eles40.
O desenvolvimento dos estudos sobre fatores protetores, tende,
atualmente, a enfatizar o processo de formação da resiliência, num progressivo
abandono das abordagens centradas nos fatores de risco. Busca-se dar ênfase aos
elementos positivos que levam um indivíduo a superar as adversidades. Esse novo
paradigma é certamente otimista, principalmente porque leva a acreditar que é
possível, por meio de ações e programas, promover o bem-estar do adolescente,
atuando no fortalecimento e no desenvolvimento de habilidades pessoais e sociais41.
Embora as definições de resiliência sejam ainda bastante variadas, toda a
discussão a respeito desse conceito está relacionada aos fatores ou processos
intrapsíquicos e sociais que possibilitem o desenvolvimento de uma vida sadia,
apesar de experiências de vida traumáticas. A compreensão do conceito envolve o
entendimento da interação entre a adversidade e fatores de proteção internos e
externos ao sujeito, assim como do desenvolvimento de competências que permitam
a uma pessoa obter sucesso diante da adversidade42.
Diante de eventos traumáticos, os elementos de proteção assumem papel
facilitador no caminho da construção da resiliência. Os estudiosos têm identificado
três categorias de fatores de proteção em crianças e adolescentes resilientes
:
39
HAWKINS et al, 1992; COIE et al, 1993; JESSOR et al, 1995; PETTIT et al, 1997. 40
JESSOR et al, 1995. 41
MUNIST et al, 1998; BLOOM, 1996; ASSIS, 1999; ASSIS; CONSTANTINO, 2001. 42
RUTTER, 1987; ASSIS, 1999.
29
a) Individuais: temperamento que favoreça o enfrentamento do problema, auto-
imagem positiva e a capacidade de criar e desenvolver estratégias ativas na
forma de lidar com problemas. Esses atributos denotam auto-eficácia,
autoconfiança, habilidades sociais e interpessoais, sentimentos de empatia,
controle emocional, humor e relacionamento com os pares. Os estudos
mostram que existem especificidades de gênero, de idade e de raça nas
formas de demonstração da resiliência;
b) Familiares: que se traduzem em suporte, segurança, bom relacionamento e
harmonia com pais e no ambiente de relações primárias;
c) Extrafamiliares ou Ambientais: quando se referem ao suporte de pessoas
significativas e experiências escolares positivas43.
A forma como o indivíduo lida com as adversidades, em psicologia, é
chamada coping, termo que agrega o conjunto de estratégias utilizadas pelas
pessoas diante de circunstâncias adversas ou estressantes. O coping positivo é
construído ao longo do tempo e do processo de crescimento e desenvolvimento
individual. Tal como a resiliência, as estratégias de coping dependem de atributos
individuais, familiares e ambientais para se consolidarem no indivíduo. Uma vez
estabelecidas, as estratégias funcionam como importante fator de proteção ao risco,
proporcionando resiliência, caso sejam predominantemente ativas no sentido da
resolução dos problemas44
. Ao contrário, quando o indivíduo vai consolidando
estratégias de fuga e evitação dos problemas, elas se tornam fatores prejudiciais ao
seu desenvolvimento saudável. Ambos dizem respeito a como os fatores familiares,
micro e macrossociais e estruturais atingem o indivíduo e o tornam em mais
suscetível às influências adversa, ou mais resistente a seus influxos. No caso do uso
de drogas, essa perspectiva de resiliência deve ser adotada para buscar formas de
reduzir a vulnerabilidade do indivíduo45.
Identificação de estudos que46 abordam mecanismos através dos quais os
fatores de proteção reduziram o risco do uso de drogas pelo adolescente: O primeiro
é um mecanismo risco/proteção por meio do qual a exposição aos fatores de risco é
43
EMERY; FOREHAND, 1996; WERNER, 1996; ASSIS, 1999; ASSIS; Constantino, 2001. 44
GARMEZY; RUTTER, 1988. 45
HAWKINS et al, 1992; SWADI, 1999. 46
Brook e et al (1990).
30
moderada pela presença de fatores de proteção. Em estudo empírico, os autores
mostram que o risco colocado por amigos que usavam drogas foi moderado pela
forte inter-relação entre os pais e os adolescentes e pelo comportamento
convencional e formal dos pais. O outro é um mecanismo de proteção segundo o
qual um fator potencializa outro, tornando o seu efeito mais forte. Por exemplo, os
autores observaram que o vínculo entre o adolescente e seu pai intensificou os
efeitos protetores, tais como o comportamento formal do adolescente, as
características maternas positivas e a harmonia marital, atuando positivamente na
prevenção ao uso de droga.
Fatores de proteção são identificados nos seis domínios da vida já
tratados, quando se discutiu a questão dos riscos: Individual (atitudes e
predisposições); Meio Familiar (relações familiares e atitudes parentais); Escola
(clima seguro ou inseguro); Amigos (envolvimento ou não com drogas); Sociedade
(tendências econômicas, falta de emprego); Comunidade (organização ou
desorganização47.
Olhando os aspectos da individualidade, é preciso ressaltar que os
adolescentes não são um recipiente passivo ou objeto controlado por influências
familiares ou sociais e nem por determinações externas. São participantes ativos do
processo de formação de vínculos e de transmissão de normas. Suas características
físicas, emocionais e sociais interagem na dinâmica de socialização48, permitindo a
metabolização subjetiva dos fatores externos. Por exemplo: em geral as crianças
com nove ou dez anos valorizam a companhia dos amigos, as atividades de grupo, o
sucesso na escola, a boa relação com os pais. Porém, cada menino ou menina
avalia de forma diferente a rejeição dos amigos ou sua exclusão de um grupo. Para
uma criança, a experiência da rejeição pode ter efeitos deletérios imediatos na
cognição social, na auto-imagem e na auto-estima. Para outra, a mesma experiência
pode ter efeitos saudáveis no ajustamento de longo prazo, motivando-a a se
posicionar de forma a ser aceita no futuro49.
Os adolescentes que têm objetivos definidos e investem no futuro
apresentam probabilidade menor de usar drogas, porque o uso interfere com os
47
ZWEIG et al, 2002. 48
OETTING et al, 1998. 49
PARKER; ASHER, 1987; TARTER et al, 2002.
31
seus planos50. Igualmente, a elevada auto-estima, os sentimentos de valor, orgulho,
habilidade, respeito e satisfação com a vida podem servir de proteção aos jovens
contra a dependência de drogas quando combinada com outros fatores protetores
do seu contexto de vida51. Sendo assim, conclui-se que crianças e adolescentes
que vivem em ambientes familiares ou em comunidades onde há uso abusivo de
drogas e conseguem não se deixar influenciar por esse contexto apresentam
características individuais protetoras conjugadas ao convívio com outros adultos
cuidadores escolhidos por eles, fora do ambiente familiar. Os programas de
prevenção devem levar em conta a importância das atividades de mentores e de
outros programas de desenvolvimento da juventude52.
O âmbito familiar tem um efeito potencialmente forte e durável para o
ajustamento infantil. O vínculo e a interação familiar saudável servem de base para o
desenvolvimento pleno das potencialidades das crianças e dos adolescentes.
Inúmeros estudos mostram que os padrões de relação familiar, a atitude e o
comportamento dos pais e irmãos são modelos importantes para os adolescentes,
inclusive no caso do uso de drogas53. Tec (1974) descobriu que uma interação
familiar gratificante é um forte fator protetor, mesmo no caso dos pais adictos,
quando esses são capazes de prover um contexto amoroso, afetuosos e de cuidado.
No âmbito da família, estudos evidenciam como fatores que protegem o
adolescente do uso de drogas: a relevância dos vínculos familiares fortes54, o apoio
da família ao processo de aquisição da autonomia pelo adolescente55
, o
monitoramento parental aos diversos processos de crescimento e
desenvolvimento56, o estabelecimento de normas claras para os comportamentos
sociais, incluindo-se o uso de drogas57.
Raramente os estudos sobre drogas dão realce às amizades entre os
jovens como protetoras, uma vez que, em geral, todas as intervenções focalizam a
superação das influências negativas das amizades e não o estabelecimento ou
50
KODJO; KLEIN, 2002. 51
HOFFMANN; CERBONE, 2002. 52
KODJO; KLEIN, 2002. 53
KANDEL et al, 1978; BROOK et al, 1990; HAWKINS et al, 1992; PATTON, 1995; SCHOR, 1996; KODJO; KLEIN, 2002. 54
KANDEL et al, 1978; SWADI, 1999; WERNER et al, 1999; HOFFMANN; CERBONE, 2002; SCHENKER; MINAYO, 2003. 55
TUTTLE et al, 2002. 56
STEINBERG et al., 1994; CHILCOAT;ANTHONY, 1996; SWADI, 1999; PATTON, 1995; WERNER et al, 1999; BROOK et al, 1990. 57
OETTING; DONNERMEYER, 1998.
32
manutenção de influências positivas dos amigos58. No entanto, sabe-se que grupos
de amigos com objetivos e expectativas de realização na vida e movimentos que
levam ao protagonismo juvenil e à solidariedade têm papel fundamental numa etapa
existencial em que as influências dos pares são cruciais.
A escola é um poderoso agente de socialização da criança e do
adolescente, ressaltando-se certa mística e identidade do tipo de educandário com o
comportamento daqueles que o freqüentam59. Por juntar em seu interior a
comunidade de pares e por ter fortes instrumentos de promoção da autoestima e do
autodesenvolvimento em suas mãos, o ambiente escolar pode ser um fator
fundamental na potencialização de resiliência dos adolescentes.
No que concerne aos fatores estressantes da vida, como morte, doenças
ou acidentes entre membros da família e amigos; mudanças de escola ou de
residência; separação, divórcio ou novos casamentos dos pais; problemas
financeiros na família60, muitos estudos mostram que eles podem influenciar o uso
abusivo de drogas quando associados a outros fatores predisponentes, incluindo-se
disposições individuais. No entanto, conforme as circunstâncias individuais e
ambientais, eles permitem elaboração e crescimento interior dos jovens,
constituindo-se em elementos de fortalecimento e de amadurecimento.
Os adolescentes são consumidores ávidos da mídia escrita e audiovisual.
As mensagens recebidas desses meios geralmente influenciam sua tomada de
decisão a respeito de vários assuntos em sua vida. Entretanto, a reflexão crítica
deles entre pares e com pais e educadores moderam o risco potencial da exposição
e potencializam a comunicação e o amadurecimento em relação aos vários
problemas, inclusive sobre o uso de substâncias ilícitas.
Por tudo o que foi dito até então, é preciso refletir sobre a inocuidade, do
ponto de vista protetor, do slogan que se repete por toda parte "diga não às drogas".
A falta de adesão dos jovens torna evidente a falha em reconhecer a inadequação
das propostas moralistas e autoritárias que não se fundam na visão complexa dos
fatores de risco e de proteção analisados. É preciso não esquecer que as drogas
cumprem funções importantes para os adolescentes, tanto do ponto de vista pessoal
quanto social. Pesquisas mostram que os comportamentos de enfretamento de risco
58 TUTTLE et al, 2002. 59 KANDEL et al, 1978. 60 HOFFMANN; CERBONE, 2002.
33
são funcionais, intencionais, instrumentais e dirigidos para o desenvolvimento
normal do adolescente. Fumar, beber, dirigir perigosamente ou exercer atividade
sexual precocemente podem ser atitudes tomadas pelo jovem visando a ser aceito e
respeitado pelos pares; conseguir autonomia em relação aos pais; repudiar normas
e valores da autoridade convencional; lidar com ansiedade, frustração e antecipação
do fracasso; afirmação rumo à maturidade e à transição da infância para um status
mais adulto. Não há nada de perverso, irracional ou psicopatológico nesses
objetivos: eles são característicos do desenvolvimento psicossocial. A campanha
"diga não às drogas", por não oferecer alternativas à promoção de comportamentos
saudáveis, revela-se moralmente cínica (SHEDLER; BLOCK, 1990; JESSOR, 1991)
e teoricamente contraditória, na medida em que omite as normas sociais que
favorecem o uso de drogas (BEMAN, 1995).
2.3 Estratégias de prevenção
O adolescente que faz uso de drogas responde bem às intervenções
contextualizadas. Os contextos dominantes para ele são seus pares e a escola e,
numa proporção menor, o entorno da comunidade. Para crianças menores, o
contexto principal é a família, que continua igualmente importante na adolescência61.
O uso ocasional de droga por adolescentes pode ser entendido como
manifestação de uma experimentação apropriada para sua etapa de
desenvolvimento e busca de direção para a vida. Ao diferençar entre adolescentes
que se abstém que experimentam e que abusam de drogas, conclui-se que, dada a
quase onipresença e certa aceitação da maconha na cultura dos pares, não é
surpreendente que, com 18 anos, indivíduos psicologicamente saudáveis, sociáveis
e curiosos se sintam tentados a experimentar o produto62
, Não se espera que
adolescentes saudáveis abusem da droga, porque apresentam baixa necessidade
de utilizá-la para aplacar a angústia emocional ou como meio de compensar a falta
de relações importantes. Os autores comparam o sentido do uso da maconha entre
adolescentes de hoje com o significado social e psicológico que a bebida alcoólica
61
SCHOR, 1996. 62
Estudo de Shedler e Block (1990).
34
teve para gerações anteriores63. Levando em conta essa reflexão, os esforços
preventivos precisam ser muito mais abrangentes e voltados para os precursores
dos riscos e da resiliência64.
Estudos indicam que as condições de formação de uma personalidade
resiliente são: colocar expectativas claras relativas ao comportamento, monitorar e
supervisionar as crianças, reforçar com consistência atividades que favoreçam a
socialização, criar oportunidades para o envolvimento familiar, promover o
desenvolvimento das habilidades acadêmicas e sociais dos jovens65.
No entanto, as habilidades para a formação de crianças e jovens
freqüentemente deveriam fazer parte de um processo de formação de pais e
educadores. A aquisição e o uso dessas habilidades na administração da família ou
dos contextos educativos reduzem problemas de comportamento das crianças nos
primeiros anos, promove o bom desempenho escolar e as fortalece para lidarem
com condições adversas66.
Pela força da escola e da família nessa etapa da vida, para os pré-
adolescentes e adolescentes é fundamental que pais e educadores estejam atentos
a alguns parâmetros relacionais:
uma comunicação livre e fluente com os pais ou com adultos que lhes servem
de modelo fortalece emocionalmente o jovem e evita o engajamento em
comportamentos de risco67
;
os elogios dos pais às conquistas dos filhos e dos educadores a seus
estudantes são o alimento da auto-estima;
a colocação de expectativas claras por parte dos pais e professores, aliada a
uma educação com autoridade, que envolve afeto, controle e trato
democrático, favorece o desenvolvimento psicológico saudável e o sucesso
escolar do adolescente68;
o monitoramento das atividades dos jovens, seja por pais ou educadores,
mostra que eles estão investindo na segurança dos jovens;
63
SHEDLER; BLOCK, 1990. 64
COIE et al, 1993. 65
HAWKINS et al, 1992. 66
HAWKINS et al, 1992. 67
FRIEDMAN, 1989; KODJO; KLEIN, 2002; TUTTLE, 2002. 68
STEINBERG et al, 1989; 1992.
35
o compartilhamento de valores, atitudes e crenças sobre as drogas (caso em
pauta aqui) é fundamental para o amadurecimento das decisões e da
responsabilização;
conhecer os amigos e os pais dos amigos dos filhos é crucial, uma vez que a
pressão dos pares é uma das principais influências para o uso de drogas;
exigências e expectativas quanto ao desempenho na escola funcionam como
um tipo de monitoramento e de proteção, na medida em que se juntam ao
encorajamento de atividades em que o jovem possa ter sucesso;
o incentivo ao engajamento nas atividades da escola, da comunidade e de
movimentos sociais ou de solidariedade é um potente fator protetor.
Os69 quatro elementos do vínculo social que se mostram inversamente
correlacionados com o uso de drogas são: vínculo forte com os pais, compromisso
com a escola, envolvimento regular com atividades da igreja ou de outros
movimentos e crença nas expectativas gerais, normas e valores da sociedade.
Metodologicamente, essas intervenções requerem intercomunicação com
a criança, os pais, a família e a comunidade. Já que a influência dos pais diminui à
medida que as crianças crescem, o dito popular quanto mais cedo melhor deve guiar
os programas de intervenção. A ênfase no estilo de vida nunca deve ser traduzida
como se esse estilo fosse de responsabilidade exclusiva do indivíduo: tal abordagem
tenderia a culpar a vítima70. O risco precisa ser entendido, como já foi dito, de forma
a incluir a complexidade dos fatores e, portanto, a redução do risco requer tanto
mudanças subjetivas quanto sociais.
Pode-se esperar um maior sucesso dos programas de prevenção que
explicitamente maximizam o ajuste adaptativo entre indivíduos e contextos. Para tal,
é necessário ter sensibilidade para compreender e valorizar a história pessoal, o
estágio de vida do indivíduo, as normas culturais, as crenças e práticas no que
concerne ao uso de drogas71, bem como os contextos sociais e da comunidade onde
esse uso ocorre ou é proscrito72.
69
Hawkins et al (1992). 70
JESSOR, 1991. 71
TEC, 1974; JOHNSON et al., 1984; COIE et al., 1993. 72
WALLACE JR, 1999.
36
3. O QUE É O PROGRAMA DE PROTEÇÃO À CRIANÇAS E ADOLESCENTES
AMEAÇADOS DE MORTE (PPCAAM)?
O Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados de
Morte (PPCAAM) é um dos Programas da Subsecretaria Nacional de Promoção dos
Direitos da Criança e do Adolescente, pertencente a Secretaria Especial de Direitos
Humanos, da Presidência da República
3.1 Objetivos do Programa de Proteção à Crianças e Adolescentes Ameaçados de
Morte (PPCAAM)
O Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados de
Morte (PPCAAM) tem como objetivo, a preservação de vida de crianças,
adolescentes e jovens egressos do Sistema Sócio-Educativo ameaçado de morte
(conforme estabelecido no artigo 2º, parágrafo único, da Lei nº 8.069/99) exposto à
coação ou grave ameaça no Município de São Paulo.
O Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados de
Morte (PPCAAM) procura garantir a doutrina de proteção integral, através de uma
medida protetiva especial, visando à preservação dos vínculos familiares e
comunitários e a inserção social segura.
O PPCAAM/SP atende ainda casos oriundos de outros estados que
possuem o programa através do sistema de permuta.
Cabe ressaltar que quase a totalidade dos assistidos pelo programa é
oriunda das camadas menos favorecidas sócio-economicamente da população,
marcadas por um contexto de violação de seus direitos fundamentais.
O programa tem como princípios básicos o “trabalho em rede”, o “respeito
às características do ameaçado” e sua condição peculiar em desenvolvimento, a
gestão e sua continuidade. Além disso, através da prática cotidiana buscar
sensibilizar os órgãos que compõe o Sistema de Garantias de Direitos no sentido do
enfrentamento deste contexto marcado pelo alto índice de homicídios de crianças e
adolescentes.
É necessário fomentar e trazer à tona a discussão qualificada a respeito
da temática homicídios de crianças e adolescentes a partir da experiência no
37
atendimento ao público assistido pelo programa e a partir dos dados
colhidos/obtidos com a pratica para se produzir conhecimento a respeito desta
realidade e buscar alternativas de prevenção e enfrentamento.
Essa interlocução que tem por princípio fundamental a defesa dos Direitos
Humanos tem envolvido o Poder Judiciário, os Conselhos Tutelares, Promotorias de
Justiça e órgãos dos Poderes Executivos e Legislativos. Tal discussão se dá de
forma protagonista/ inovadora tendo em vista que vivenciamos um contexto em que
nunca as taxas de homicídios de crianças e adolescentes foram tão expressivas e
as formas de prevenção tão inócuas.
3.2. Histórico do Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados de
Morte (PPCAAM)
O Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados de
Morte (PPCAAM) criado em 2003 e instituído oficialmente por meio do Decreto nº
6.231 de 11 de outubro de 2007. Constitui-se em uma das estratégias do Governo
Federal de enfrentamento à letalidade de crianças e adolescentes ameaçados de
morte em território nacional.
A execução do Programa se dá diretamente pela Subsecretaria Nacional
de Promoção dos Direitos da Criança e do Adolescente em parceria com Secretarias
de Estado e ONGs.
A partir do Guia de Procedimentos e Fluxo Metodológico prioriza-se o
atendimento direto ao ameaçado e prevenção em seus três níveis: primária,
secundária e terciária (articulação/sensibilização, pesquisa e responsabilização).
Como exemplo, neste Guia de Procedimentos temos o Programa de Redução da
Violência Letal e Redes de Valorização da Vida, denominado Observatório de
Favelas, apoiado pela Unicef.
O acompanhamento e monitoramento dos casos do PPCAAM são
realizados por uma equipe técnica interdisciplinar das áreas de Direito, Serviço
Social e Psicologia. Cabe mencionar que tal monitoramento é feito através com a
colaboração/parceria do Poder Judiciário, Ministério Público, Conselhos Tutelares e
demais membros do Sistema de Garantias de Direitos.
38
3.3 Responsabilidades do Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes
Ameaçadas de Morte (PPCAAM)
O Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçadas de
Morte (PPCAAM) possuem algumas responsabilidades, tais como:
Verificar se a situação é pertinente à proteção PPCAAM;
Identificar o local de proteção adequado;
Realizar permuta quando necessário;
Realizar o acompanhamento técnico e avaliar a execução do PIA;
Acompanhar junto à rede sobre os impasses e os facilitadores no trabalho da
proteção;
Inserir os envolvidos nos equipamentos públicos da rede de atenção de
cuidado e de proteção num contexto integral;
Auxiliar financeiramente, caso haja necessidade, o ameaçado e sua família;
Acompanhar o caso no período pós-desligamento;
3.4 Recursos Humanos envolvidos no Programa de Proteção a Crianças e
Adolescentes Ameaçadas de Morte (PPCAAM)
Para que o Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados
de Morte (PPCAAM) possa desenvolver e acompanhar suas atividades são
necessários:
Um Coordenador Executivo;
Um Coordenador Técnico do PPCAAM
Um Assistente Técnico Administrativo
Dois Psicólogos;
Dois Assistentes Sociais;
Seis Educadores;
Quatro motoristas
39
No total a execução do Programa possui 17 (dezessete) pessoas
diretamente envolvidas no seu desenvolvimento e acompanhamento.
3.5 Atuação do Programa de Proteção à Crianças e Adolescentes Ameaçadas de
Morte (PPCAAM)
Existe dentro do PPCAAM um roteiro comumente seguido para que as
crianças e adolescentes ameaçadas de morte possam ser atendidos juntamente
com seus funcionários:
a) As crianças e adolescentes sobre risco de ameaça de morte são
encaminhados para atendimento no Programa através das portas de entrada
(Varas da Infância e Juventude, Conselhos Tutelares, Ministério Público) com
o Relatório Social, preferencialmente direcionado a Secretaria Municipal de
Direitos Humanos, repassando-os ao Programa.
b) Posteriormente é agendado atendimento do jovem e sua família pelas
equipes técnicas do PPCAAM.
c) Diagnosticada a necessidade de inserção ou não, elabora-se relatório
descritivo do caso, apresentando-o ao Juiz Administrador do Programa.
d) Retirada da criança ou o adolescente do local onde existe a ameaça de
morte, preferencialmente com seus familiares.
e) Inserção em local seguro na perspectiva de proteção integral (Sistema de
Garantia de Direitos).
f) A inclusão como última alternativa de proteção a crianças e adolescentes que
estejam com o direito de vida ameaçado.
g) Todas as alternativas de proteção convencionais devem ser esgotadas.
A meta principal do Programa é o atendimento efetivo e ágil e inserção
em rede social e comunitária pelo menor tempo possível.
40
3.6 Perfil dos Casos Atendidos
Dentro do Programa de Proteção à Crianças e Adolescentes Ameaçadas
de Morte (PPCAAM) encontramos como perfil de casos atendidos:
Sexo Masculino: 76%
Sexo Feminino: 24%
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
70%
80%
Masculino Feminino
Casos Atendidos
Gráfico 4 – Casos Atendidos: considerando o Sexo
Raça Negra: 75%
Outras etnias: 25%
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
70%
80%
Raça Negra Outras Etnias
Etnias
Gráfico 5 – Casos Atendidos: considerando a Etnia
Idade: 15 – 17 anos (58%)
Escolaridade: Ensino Fundamental Incompleto (95%)
Residentes na capital (63%)
Principal referência familiar: mãe (75%)
Renda familiar: até 1 salário mínimo (56%)
41
Porta de Entrada
Ministério Público (40%)
Judiciário (30%)
Conselho Tutelar (30%)
0%
5%
10%
15%
20%
25%
30%
35%
40%
Ministério
Público
Judiciário Conselho
Tutelar
Porta de Entrada
Gráfico 6 – Casos Atendidos: considerando a porta de entrada
Protegido na modalidade:
o Grupo familiar (42%)
o Institucional (de forma individual) (34%)
o Outras modalidades (24%)
0%
10%
20%
30%
40%
50%
Grupo
Familiar
Outras
Modalidades
Protegido na Modalidade
Gráfico 7 – Casos Atendidos: considerando a modalidade de proteção
Permanência por cerca de seis meses (53%)
Desligado por inserção social e cessação da ameaça (50%)
Ameaçado devido a envolvimento com o tráfico de drogas (60%)
42
3.7. Balanço dos Usuários Assistidos pelo Programa de Proteção à Crianças e
Adolescentes Ameaçados de Morte (PPCAAM)
Segundo levantamento, o Programa de Proteção à Crianças e
Adolescentes Ameaçadas de Morte (PPCAAM) tiveram como balanço de usuários
assistidos os dados abaixo discriminados:
De 2003 a 2010 – Proteção
- 1.592 crianças e adolescentes - 2.920 familiares Total: 4.512 pessoas (incluídos)
0
1.000
2.000
3.000
4.000
5.000
Proteção
Crianças eAdolescentes
Familiares
Total
Gráfico 8 – Proteção: período – 2003 a 2010
Ano: 2009 – Proteção
- 538 crianças e adolescentes - 845 familiares - Total: 1.383 pessoas
43
0
200
400
600
800
1.000
1.200
1.400
Proteção - 2009
Crianças eAdolescentes
Familiares
Total
Gráfico 9 – Proteção: Ano de 2009
Ano: 2010 – Proteção - 246 crianças e adolescentes - 395 familiares - Total: 641 pessoas
0
100
200
300
400
500
600
700
Proteção - 2010
Crianças eAdolescentes
Familiares
Total
Gráfico 10 – Proteção: Ano de 2010
44
4 ESTUDO DE CASO: PEDRO (*)
O caso fora acolhido no PPCAAM no ano de 2008, sendo incluso o
adolescente Pedro e seus familiares, a genitora e um irmão mais novo.
A atuação no programa teve seu inicio em um hospital do municÍpio de
São Paulo, em que o adolescente fora encaminhado após ter sido vítima de tentativa
de homicídio, atingido por projéteis de arma de fogo a queima roupa.
Para melhor compreensão do quadro exposto acima, descreverei seu
histórico para entendermos os acontecimentos que antecedem a chegada do
adolescente em uma (UTI) unidade de terapia intensiva.
Pedro, adolescente, oriundo de família de baixa renda, morador de um
conjunto habitacional de um bairro considerado de alta vulnerabilidade social,
cresceu como todo jovem de sua faixa etária sonhando em “ter” e “ser” valorizado
pela comunidade e também pelas adolescentes que disputavam entre si a emoção
de estar com alguém que lhe inspirasse relação de status.
Nesta ânsia de busca pelo poder o jovem envolveu-se com uma
adolescente afetivamente, sendo este o inicio deste enredo de ameaça iminente de
morte.
A jovem com quem Pedro iniciou um relacionamento era enteada de um
suposto professor de capoeira, que desconte com o envolvimento dos jovens, levou
o caso para os irmãos de uma determinada facção criminoso PCC, a fim de intimidá-
lo a desistir do namoro com a sua protegida.
Vale ressaltar que Pedro freqüentava as aulas de capoeira e, mantinha
bom relacionamento com a família da jovem, até tomarem ciência do envolvimento
afetivo dos jovens.
O jovem Pedro conhecia os irmãos da facção criminosa que atuava
naquela comunidade e também fazia uso de substâncias psicoativas que eram
comercializadas no local.
A trama contra o jovem tivera seu ponto culminante, após decisão
deliberada pelos irmãos do PCC, para que o próprio professor executasse o jovem
que já possuía comprometimento com o crime organizado na região.
45
O professor seguindo as ordens que receberá, convidou o jovem para um
determinado evento, contando com presença da namorada; um amigo do
adolescente e o motorista.
Durante o percurso o professor, segundo relato do adolescente mostrara-
se muito nervoso, mas seguiu em frente com o contrato que fizera com os irmãos,
desferindo tiros a queima roupa contra o adolescente, porém arrependeu-se e
encaminhou Pedro para um hospital.
Neste período de internação o adolescente recebeu visita de uma pessoa
considerada idônea na comunidade, onde o jovem relatou o que ocorrera, gerando
comoção e revolta, chegando a pedir justiça para os irmãos do PCC dada a violência
ocorrida.
Embora o hospital fosse de grande porte, a segurança é privada, não
estando preparada para atender este tipo de demanda que envolve escolta imediata.
O PPCAAM em sua atuação reuniu-se com o serviço social e diretoria do
hospital, solicitando restringir o acesso de pessoas não autorizadas, sigilo e
vigilância intensiva.
Mesmo com as orientações e devidas providências, o hospital fora
invadido por pessoas desconhecidas para efetivar a execução do adolescente, tendo
que ser retirado e encaminhado para local seguro mesmo com estado de saúde
inspirando cuidados.
Em represália ao não cumprimento da ordem que recebera o professor
passou a vítima de sua própria trama, ou seja, fora pego pelos irmãos do PCC, que
o torturaram e tentaram assassiná-lo sem sucesso, sendo este encaminhado para o
hospital, onde novamente ocorreu invasão de pessoas desconhecidas que o
executaram dentro da instituição hospitalar.
Diante da repercussão do caso, temendo-se represálias, a família do
adolescente, foi encaminhada para local seguro, fora do município de São Paulo.
Após convalescença do adolescente, ainda temendo represálias, foi
encaminhado pelo PPCAAM em regime de permuta para outro estado.
Em local seguro o jovem por estar distante de suas referências afetivas,
passou a agredir fisicamente e verbalmente assistidos e profissionais da instituição
em que fora acolhido.
46
Na ocasião as equipes envolvidas com a permuta, após avaliação
criteriosa, retornou com o jovem para o município de São Paulo, encaminhando-o
para um abrigo próximo a região de moradia de membros da família.
Neste período a genitora e o irmão mais novo, já estavam acolhidos na
residência de uma tia materna, com facilidade de acesso para visitar Pedro em local
neutro, previamente agendado e monitorado pelo Programa.
A genitora, portadora de distúrbio bipolar, tendo que ser assistida desde
sua higiene pessoal até a ingestão de medicação, fora vítima do cunhado que
passou a assediá-la sexualmente, além de oferecer-lhe drogas.
Em decorrência deste fato o filho mais novo passou a apresentar
comportamento agressivo e o jovem Pedro, passou a agredir fisicamente assistidos
e profissionais da instituição.
O PPCAAM de posse destas informações retirou imediatamente mãe e
filho deste convívio, culminando no retorno da genitora para residência da avó
materna e seu filho mais novo para abrigamento, junto a seu irmão.
Ainda dentro das pertinências das intervenções o PPCAAM se reuniu com
Centro de Referência e Assistência Social (CRAS) para melhor possibilidade de
assistir a genitora, porém o que podia ser disponibilizado já estava sendo executado
pela saúde mental, além de ser assistida pelo Programa de Saúde da Família (PSF)
com consultas psiquiátricas, entre outros profissionais envolvidos.
A avó materna, juntamente com sua irmã que reside em outro Município
da Cidade de São Paulo, juntamente com o Programa pensou em estratégias que
favorecessem a genitora em sua rotina diária, porém a mesma agia de acordo com
seu estado emocional, passando a permanecer a maior parte do tempo na rua em
busca de “namoro”, expressão usada por ela.
Como o caso é considerado tratamento ambulatorial, não seria possível
intervenção mais contundente.
Após diversas tentativas de fuga do abrigo para uso indevido de drogas, o
adolescente Pedro passou a ser assistido por psicólogo e psiquiatra, especialidades
que se recusava terminantemente a aceitar.
Dada a complexidade do caso e também o histórico de saúde mental da
genitora, as intervenções do Programa continuam presentes e estão focadas em
47
trabalhar a autonomia e independência do adolescente que hoje está mais centrado
e pensa em se estruturar para residir futuramente com sua mãe e seu irmão.
Encerro este caso ressaltando o amor, carinho e o respeito de Pedro e de
seu irmão por conhecer a condição de saúde mental de sua mãe e querem estar
próximos para evitar que ela se exponha a situação de risco e futuramente possam
vir a ter a condição de vida em família.
4.1. Repercussão do caso na mídia
Chamou-me atenção o estudo de caso do adolescente Pedro por ter sido
sua referência no PPCAAM
4.2 Resultados Esperados
O adolescente que faz uso de drogas responde bem às intervenções
contextualizadas. Os contextos dominantes para ele são seus pares e a escola e,
numa proporção menor, o entorno da comunidade. Para crianças menores, o
contexto principal é a família, que continua igualmente importante na adolescência73.
O uso ocasional de droga por adolescentes pode ser entendido como
manifestação de uma experimentação apropriada para sua etapa de
desenvolvimento e busca de direção para a vida74. Ao diferenciar entre adolescentes
que se abstém, que experimentam e que abusam de drogas, conclui que, dada a
quase onipresença e uma certa aceitação da maconha na cultura dos pares, não é
surpreendente que, com 18 anos, indivíduos psicologicamente saudáveis, sociáveis
e curiosos se sintam tentados a experimentar o produto. Não se espera que
adolescentes saudáveis abusem da droga, porque apresentam baixa necessidade
de utilizá-la para aplacar a angústia emocional ou como meio de compensar a falta
de relações importantes. Os autores comparam o sentido do uso da maconha entre
adolescentes de hoje com o significado social e psicológico que a bebida alcoólica
teve para gerações anteriores75. Levando em conta essa reflexão, os esforços
73
SCHOR, 1996. 74
Estudo de Shedler e Block (1990). 75
SHEDLER; BLOCK, 1990.
48
preventivos precisam ser muito mais abrangentes e voltados para os precursores
dos riscos e da resiliência76.
Estudos indicam que as condições de formação de uma personalidade
resiliente são:
Colocar expectativas claras relativas ao comportamento;
Monitorar e supervisionar as crianças;
Reforçar com consistência atividades que favoreçam a socialização;
Criar oportunidades para o envolvimento familiar;
Promover o desenvolvimento das habilidades acadêmicas e sociais dos
jovens77.
No entanto, as habilidades para a formação de crianças e jovens
freqüentemente deveriam fazer parte de um processo de formação de pais e
educadores. A aquisição e o uso dessas habilidades na administração da família ou
dos contextos educativos reduzem problemas de comportamento das crianças nos
primeiros anos, promove o bom desempenho escolar e as fortalece para lidarem
com condições adversas78.
Pela força da escola e da família nessa etapa da vida, para os pré-
adolescentes e adolescentes é fundamental que pais e educadores estejam atentos
a alguns parâmetros relacionais:
Uma comunicação livre e fluente com os pais ou com adultos que lhes servem
de modelo fortalece emocionalmente o jovem;
Evita o engajamento em comportamentos de risco79;
Elogios dos pais às conquistas dos filhos e dos educadores aos seus
estudantes é o alimento da auto-estima;
A colocação de expectativas claras por parte dos pais e professores, aliada a
uma educação com autoridade, que envolve afeto, controle e trato
76
COIE et al, 1993. 77
HAWKINS et al, 1992. 78
HAWKINS et al., 1992 79
FRIEDMAN, 1989; KODJO; KLEIN, 2002; TUTTLE, 2002.
49
democrático, favorece o desenvolvimento psicológico saudável e o sucesso
escolar do adolescente80;
O monitoramento das atividades dos jovens, seja por pais ou educadores,
mostra que eles estão investindo na segurança dos jovens;
O compartilhamento de valores, atitudes e crenças sobre as drogas (caso em
pauta aqui) é fundamental para o amadurecimento das decisões e da
responsabilização;
Conhecer os amigos e os pais dos amigos dos filhos é crucial, uma vez que a
pressão dos pares é uma das principais influências para o uso de drogas;
Exigências e expectativas quanto ao desempenho na escola funcionam como
um tipo de monitoramento e de proteção, na medida em que se juntam ao
encorajamento de atividades em que o jovem possa ter sucesso;
O incentivo ao engajamento nas atividades da escola, da comunidade e de
movimentos sociais ou de solidariedade é um potente fator protetor.
Para81, Quatro elementos do vínculo social que se mostram inversamente
correlacionados com o uso de drogas:
Vínculo forte com os pais;
Compromisso com a escola;
Envolvimento regular com atividades da igreja ou de outros movimentos;
Crença nas expectativas gerais, normas e valores da sociedade.
Metodologicamente, essas intervenções requerem intercomunicação com
a criança, os pais, a família e a comunidade. Já que a influência dos pais diminui à
medida que as crianças crescem, o dito popular quanto mais cedo melhor deve guiar
os programas de intervenção. A ênfase no estilo de vida nunca deve ser traduzida
como se esse estilo fosse de responsabilidade exclusiva do indivíduo: tal abordagem
tenderia a culpar a vítima82. O risco precisa ser entendido, como já foi dito, de forma
80
STEINBERG, 1989; 1992. 81
Hawkins et al (1992). 82
JESSOR, 1991.
50
a incluir a complexidade dos fatores e, portanto, a redução do risco requer tanto
mudanças subjetivas quanto sociais.
Pode-se esperar um maior sucesso dos programas de prevenção que
explicitamente maximizam o ajuste adaptativo entre indivíduos e contextos. Para tal,
é necessário ter sensibilidade para compreender e valorizar a história pessoal, o
estágio de vida do indivíduo, as normas culturais, as crenças e práticas no que
concerne ao uso de drogas83, bem como os contextos sociais e da comunidade onde
esse uso ocorre ou é proscrito84.
83
TEC, 1974; JOHNSON et al, 1984; COIE et al., 1993. 84
WALLACE JR, 1999.
51
5 CONCLUSÃO
O uso de drogas é uma questão complexa que perpassa inúmeros
subsistemas da vida individual e social. Quanto mais distante a complexidade esta
dos laços de afeto e respeito, firmes exigências morais, uso do raciocínio e razão
além de responsabilidades entre pais/responsáveis e seu respectivo adolescente,
maiores serão as chances de perda do jovem para a criminalidade oriunda da
utilização das substâncias tóxicas. As representações sociais podem e devem
interferir sempre que possível de forma coerente, persistente, com regras
disciplinares e motivadoras para adolescente diante de sua incapacidade
involuntária para aderir às normas e códigos de conduta impostos pela sociedade
nos níveis familiares, escolares e comunitários de um modo geral. Então é
necessário compreender os códigos do contexto e a rede de signifiados que
envolvem a sociedade que levam à adesão ou à condenação, dependem do
contexto sociocultural. Os constrangimentos impostos numa determinada cultura são
diversos em outras.
Então, é necessário compreender os códigos do contexto e a rede de
significados que envolvem a sociedade em geral. Ao mesmo tempo é preciso
ensinar aos adolescentes que, por mais difícil e inconveniente que seja seguir as
regras sociais e morais, não se pode ignorá-las. Se o adolescente não adquirir
respeito pela manutenção da confiança, da ajuda mutua e de justiça dos grupos
específicos dentro de determinado tempo histórico a adolescência poderá ser fator
de risco para a violência. Muitos estudos têm mostrado como a atribuição de valor
positivo ou proscritivo depende de mudanças ou estágios de consciência de uma
pessoa apontados por julgamento morais.
Esta monografia inicialmente privilegiou o papel da família na prevenção e
na promoção da resiliência, porque ela é a célula mater responsável pela
socialização dos indivíduos. O jovem considerado muitas vezes anti-soial recebe
muitas mensagens adversas, críticas e exclusão dos demais membros da família,
sendo de se esperar que há certo tempo, seja desenvolvida a imagem negativa de si
mesmo e dos outros. E por outro lado da policia e da sociedade em si.
Mas como se viu neste texto, a problemática não se reduz ao contexto
familiar. O jovem inserido em numa rede de relações, vive um contexto sociocultural
52
e histórico, que apresenta situações conflitivas que envolvem figuras de autoridades
que de certa forma podem contribuir para a delinqüência juvenil além da violência.
Mas a família tem um papel crucial enquanto cuidadora, afetiva, amorosa e
comunicativa, podendo promover condições e possibilidades saudáveis de seus
jovens.
Por isso, os programas preventivos para o uso de drogas precisam prever
aplicações práticas de orientação familiar, bem como ter novo olhar para os fatores
de risco iminentemente juvenil, pois que aos jovens associa-se: a inconseqüência,
os excessos impulsivos, a paixão pelas fortes emoções, vulnerabilidade, fatores
estes de risco. A violência ocasiona uma sobremortalidade nos adolescentes e
jovens adultos do sexo masculino na faixa etária entre 15 a 29 anos, considerada
alto risco. (CASTRO, AQUINO, ANDRADE, 2009).
A idéia, quase uma ideologia subentendida no slogan "diga não às
drogas", é um americanismo que não condiz com a proposta de redução de danos e
de promoção da resiliência. Experimentar drogas lícitas ou ilícitas e usá-las
socialmente são atitudes que fazem parte de culturas milenares e é um fato na
atualidade.
Um programa compreensivo e voltado à promoção da saúde precisa
entender essa quase inevitabilidade com a qual convive o ser humano de buscar
algum tipo de prazer em substâncias que produzem algum tipo de sensação de
prazer ainda que momentâneo. E entender também que a prevenção do abuso de
drogas é sinônimo de vida saudável, empreendimento tão importante para os jovens
que deve incluir a família, a escola, o grupo de pares, a comunidade e a mídia com
medidas preventivas que vislumbrem minimizar seu uso.
Tal abordagem requer uma difícil, mas factível articulação dos serviços
social, educacional, saúde e segurança, numa visão multidisciplinar e, como
responsabilidade, também, da sociedade. O "combate às drogas", termo militarista
proveniente da ideologia americana e, na maioria das vezes, único e obsessivo foco
da ação, não deve prevalecer. Promover um crescimento e desenvolvimento
saudáveis, maior igualdade social e de oportunidades, atuar contra a pobreza, o
racismo, a baixa estima, voltar-se para o desenvolvimento do protagonismo juvenil
são propostas que convergem para o cumprimento do ECA e a favor da democracia,
53
promovendo a inserção social do jovem nos âmbitos de circulação e atuação dos
adultos com solidez validada, das normas e valores sociais com os quais passara a
lidar frequentemente.
54
6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Assis SG. Traçando caminhos em uma sociedade violenta. Fiocruz, Rio de Janeiro. 1999. Assis SG, Constantino P. Filhas do mundo: infração juvenil feminina no Rio de Janeiro. Fiocruz, Rio de Janeiro. 2001. Hebert, Martin. Convivendo com adolescentes, tradução de José Eduardo Ribeiro Moretzsohn – 2 ed.- Rio de Janeiro: Bertrand Brasil 2002. Juventude e políticas sociais no Brasil/organizadores Jorge Abrahão de Castro, Luseni Maria C. de Aquino, Carla Coelho de Andrade - Brasilia:Ipea, 2009. Minayo et al. Fala galera: juventude, violência e cidadania no Rio de Janeiro. Editora Garamond, Rio de Janeiro. 1999. Njaine K. Violência na mídia sob a ótica dos adolescentes. Tese de doutorado defendida na Escola Nacional de Saúde Pública, Fiocruz, Rio de Janeiro. 2004. Schenker M, Minayo MCS. A implicação da família no uso abusivo de drogas: uma revisão crítica. Ciência & Saúde Coletiva. 2003. 8(1):299-306. Tarter RE, Sambrano S, Dunn MG. Predictor variables by developmental stages: a center for substance abuse prevention multisite study. Psychology of Addictive Behaviors. 2002. 16(4S):S3-S10. Tec N. Parent-child drug abuse: generational continuity or adolescent deviancy. Adolescence. 1974. 9:351-364. Velho G. Nobres e anjos: um estudo de tóxicos e hierarquias. Editora FGV, Rio de Janeiro. 1998. Schenker M, Minayo MCS. Centro Latino-Americano de Estudos da Violência e Saúde. Núcleo de Estudos e Pesquisa em Atenção ao Uso de Drogas. UERJ. Pós Graduação em Saúde da Criança e da Mulher do Instituto Fernandes Figueira, Fiocruz. Rio de Janeiro.
55
ANEXOS
56
ANEXO – 1
REPORTAGEM
Professor de capoeira morto em UTI foi condenado por “tribunal clandestino”
Plantão/publicada em 23/06/2008
SPTV, O Globo Online
SÂO PAULO – A polícia esclareceu o assassinato de um paciente do Hospital Cidade Tiradentes, na zona leste da capital, no começo de junho. Um professor de capoeira foi baleado e esfaqueado dentro da UTI do hospital. A decisão de matar pó professor Ludimar Aparecido de Andrade, de 29 anos, foi tomada em um “tribunal clandestino”, formado por criminosos afirma a polícia. Andrade foi morto na madrugada do dia e de junho. Dois dias antes, havia sido encontrado pela polícia baleado com seis tiros, dentro do porta-malas de um Monza, inconsciente.
De acordo com as investigações, Andrade foi executado por vingança. Ele teria, ao lado de outras duas pessoas, agredido e baleado um adolescente de 14 anos no dia 14 de maio, acusado de ter tentado violentar uma menina. Para vingar o garoto, Luiz de França Silva Neto, conhecido como Celebridade; José Carlos Arlindo Junior e Rafael Aparecido dos Santos teriam condenado o professor à morte.
- Teria sido uma vingança. A enteada do professor de capoeira teria dito que esse adolescente teria tentado manter relação sexual com ela de forma forçada – diz o delegado Marcos Carneiro Lima.
Andrade, a companheira dele, Rosana Soragge, e o pai-de-santo Francisco Teves Neto teriam então participado da tentativa de homicídio contra o adolescente. O adolescente sobreviveu e Andrade começou a ser perseguido por criminosos do bairro que conheciam o rapaz. No fim de maio, professor encontrado ferido, seis tiros, no porta-malas do carro. Dois dias depois cinco homens invadiram o hospital. Eles renderam os vigilantes e trancaram os funcionários na farmácia do hospital. Um enfermeiro foi obrigado a levar os homens até a UTI. O capoeirista foi morto e os homens fugiram.
Moradores de Cidade Tiradentes contaram à polícia que Andrade foi condenado à morte por um tribunal clandestino, depois de ser dominado na porta do prédio em que moravam. De acordo com a investigação, Silva Neto, que é chefe de quadrilha, se passou por juiz. Segundo a polícia, trinta pessoas presenciaram o julgamento. A sentença saiu deppois de uma hora. Arlindo Junior, de 31 anos, e Santos, de 19 anos, também participaram do julgamento. A justiça decretou a prisão dos três, que estão foragidos.
-É uma coisa absurda, que o estado de direito e uma sociedade civilizada não podem aceitar em hipótese alguma – diz o delegado.
57
Soragge e Teves Neto foram presos e denunciados à Justiça pela tentativa de homicídio contra o adolescente. A polícia ainda tenta identificar os outros homens que invadiram o hospital e executaram o professor de capoeira.
(fonte:HTTP//g1.com/sptv)
58
ANEXO - 2
REPORTAGEM
04/06/2008 - 08h40
Familiares de professor morto em hospital de SP pedem proteção
Publicidade do agora
Familiares do professor de capoeira Ludmar Aparecido de Andrade, 29 anos, morto a tiros e facadas na madrugada de anteontem na UTI (Unidade de Terapia Intensiva) do Hospital Municipal de Cidade Tiradentes (zona leste de São Paulo), entraram no serviço de proteção da Polícia Civil, segundo apurou a reportagem. Ontem, a polícia procurava suspeitos do crime.
Segundo a polícia, membros da família estão com medo devido ao grau de violência do crime. A SSP (Secretaria de Estado da Segurança Pública) não confirmou a informação. Andrade havia sofrido uma tentativa de homicídio na madrugada do último sábado, quando foi encontrado ferido com seis tiros e as mãos e os pés amarrados dentro do porta-malas de seu Monza.
O capoeirista foi socorrido ao hospital de Cidade Tiradentes, onde havia sido operado e estava internado em estado grave desde sábado. Por volta das 3h de anteontem, porém, seis homens armados e encapuzados renderam funcionários do hospital e três deles entraram no prédio. Os bandidos seguiram para o leito em que Andrade se recuperava e o mataram com pelo menos oito tiros e vários golpes de faca, de acordo com a polícia. As câmeras de vigilância do hospital registraram parte da ação, que durou cerca de 15 minutos.
O motivo do assassinato ainda é desconhecido. Ontem, a polícia procurava suspeitos, mas até o fechamento desta edição, às 23h30, ninguém havia sido detido.
O Agora apurou que uma das hipóteses investigadas, conforme relato de familiares da vítima, é de que o assassinato teria sido motivado por vingança, pois o professor teria agredido e atirado no rosto de um aluno de 15 anos que teria assediado sua enteada de 11 anos.
Devido às características do crime, a polícia verifica também se o homicídio pode ter sido executado por membros da facção criminoso PCC (Primeiro Comando da Capital), que tem forte atuação em Cidade Tiradentes, segundo informou a polícia. As impressões digitais deixadas na faca e na pistola 380 encontradas no local do crime ainda não foram identificadas.
Ao menos dez pessoas, entre familiares da vítima e funcionários do hospital, foram ouvidas pelo DHPP (Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa), que investiga o caso.
59
Tumulto no velório
Houve confusão durante o velório de Andrade em Piracicaba (160 km de São Paulo). A reportagem apurou que membros da família da vítima tentaram agredir a mulher do capoeirista porque acreditavam que ela pudesse ser culpada pela morte.
Por telefone, uma cunhada de Andrade disse que não comentaria o assunto. Ele era casado havia cinco anos, tinha uma filha de cinco anos e três enteados. O corpo será enterrado hoje, às 10h, no Cemitério da Saudade, em Piracicaba.
60
ANEXO – 3
REPORTAGEM Acusado de matar professor capoeira é preso Um foragido da justiça foi preso em flagrante, portando documentos falsos, por volta das 16 horas de sexta-feira (04). Após um minucioso trabalho de investigação, a Polícia Civil surpreendeu o acusado no cruzamento das avenidas Governador Carvalho Pinto com São Miguel, no bairro da Penha, na zona leste da capital. Ele era procurado pelo homicídio de um professor de capoeira, dentro do Hospital municipal Cidade Tiradentes. O acusado possui tatuagens de palhaços nos dois braços, cujo significado é matador de policial. Com um mandado de prisão preventiva, expedido pelo 1º Tribunal do Júri em 14 de julho do ano de 2008, policiais civis realizaram um detalhado trabalho de investigação e, após diversas campanas pela região, conseguiram localizar o foragido da justiça, J.C.A.J., de 32 anos. Segundo o chefe dos investigadores do 19º DP Distrito Policial (Vila Maria), Marcelo Rocha , o foragido é de alta periculosidade. “Ele tem diversas passagens pela policia por roubo e, além disso, é suspeito de ser integrante de uma facção criminosa”, afirma. J. foi preso em flagrante e encaminhado para o 19º DP. Ele responderá por uso de documento falso e pelo homicídio do professor de capoeira, de 29 anos, morto a tiros na UTI do Hospital Municipal de Cidade Tiradentes, no dia 2 de junho de 2008. O foragido foi transferido ao Centro de Detenção Provisória (CDP) Independência, onde permanece preso, à disposição da Justiça. (Fonte: HTTP://www.ssp.sp.gov.br)