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ALINE CAMILLO CAMILLATO
PARQUE DAS CULTURAS DO VALE DO AÇO
Trabalho de Conclusão de Curso apresentada ao Curso de
Arquitetura e Urbanismo do Centro Universitário do Leste
de Minas Gerais, como requisito parcial para obtenção do
título de Arquiteto e Urbanista.
Orientador: Cássio Lucena
CORONEL FABRICIANO, DEZEMBRO DE 2014
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AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus por sempre estar ao meu lado direcionando meus passos. Aos meus pais, Nilce
e Paulo César, por sempre me ensinarem a ver significado nas coisas simples da vida e por cuidarem
tão bem de mim. Aos meus irmãos, Amanda e Paulo César Jr., que são os melhores presentes que
tenho na vida. Ao meu amor e amigo, Maycon, que esteve ao meu lado em todos os momentos
sendo a minha força e motivação. Aos meus familiares por me encorajarem. Agradeço aos meus
coordenadores do PDDI, Roberto Caldeira e Kênia Barbosa, pela oportunidade de conhecer uma
nova forma de olhar para minha futura profissão e pelo conhecimento compartilhado, e também
aos meus colegas de PDDI pelas experiências cotidianas. E, de forma especial, agradeço ao meu avô
Cyrineo que infelizmente não esta mais aqui para me contar suas histórias.
“No fundo, vejo a arquitetura como serviço coletivo e como
poesia. Alguma coisa que nada tem a ver com ‘arte’; uma
espécie de aliança entre ‘dovere’ [dever] e ‘prática científica’. É
um caminho meio duro, mas é o caminho da arquitetura.”
LINA BO BARDI
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RESUMO
Sabendo que a arquitetura e o urbanismo são processos de materialização da cultura de um
povo, pretende-se com essa pesquisa analisar a questão cultural no Vale do Aço como meio de
produzir uma arquitetura capaz de valorizar a identidade regional. Buscou-se compreender as
variáveis que compõe a questão cultural no Vale do Aço através de pesquisas teóricas, diagnósticos,
visitas in loco e pela aplicação de questionário com alunos e professores do Curso de Arquitetura e
Urbanismo do Unileste MG. O questionário selecionou fotos de 30 lugares relacionados com a
história e cultura do Vale do Aço e teve como objetivo avaliar quais desses despertaram maiores
índices de apropriação pelos entrevistados. Com base nas análises proporcionadas pelo referencial
teórico e pelo resultado do questionário percebeu que os espaços culturais edificados no Vale do
Aço não despertaram um senso de identificação significativo, sendo que os espaços livres de uso
público foram aqueles com maiores percentuais de apropriação. Ao longo da pesquisa percebeu-se
que a arquitetura de espaços culturais representa uma forma particular de materializar as
significações culturais para a própria valorização do exercício cultural. Portanto, pretende-se a
criação de um espaço cultural que seja capaz de fortalecer a identidade cultural da Região
Metropolitana do Vale do Aço através da valorização da história e cultura regional.
Palavras-chaves: Região Metropolitana do Vale do Aço. Identidade Cultural. Arquitetura. Espaços
Culturais.
SUMÁRIO
CAPÍTULO 1 | |INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 08
CAPÍTULO 2 | O PASSADO RECENTE DO VALE DO AÇO .............................................................. 13
2.1 | O VALE ANTES DO AÇO ....................................................................................................................................... 13
2.2 | A CHEGADA DO AÇO NO VALE ........................................................................................................................ 24
2.3 | REGIÃO METROPOLITANA DO VALE DO AÇO ............................................................................................ 39
CAPÍTULO 3 | IDENTIDADE E INDIVIDUALIDADE ......................................................................... 46
3.1 | IDENTIDADE METROPOLITANA ................................................................................................. 55
CAPÍTULO 4 | MULTICULTURAS NO VALE DO AÇO ...................................................................... 61
4.1. | MANIFESTAÇÕES DA DIVERSIDADE ......................................................................................... 68
CONGADO E MARUJADA .............................................................................................................................................. 71
FESTAS RELIGIOSAS ......................................................................................................................................................... 73
CAVALGADAS ..................................................................................................................................................................... 75
GRUPOS DE TEATRO ....................................................................................................................................................... 77
GRUPOS DE DANÇA ........................................................................................................................................................ 79
GRUPOS MÚSICAIS .......................................................................................................................................................... 81
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FEIRAS E EVENTOS GASTRONÔMICOS .................................................................................................................... 82
CARNAVAL .......................................................................................................................................................................... 85
ARTESANATO ..................................................................................................................................................................... 87
ARTES .................................................................................................................................................................................... 89
GRUPO DE CICLISTAS ..................................................................................................................................................... 91
FUTEBOL É CULTURA ...................................................................................................................................................... 93
CAPÍTULO 5 | HERANÇA DO VALE VERDE PARA O VALE DO AÇO.............................................. 95
CORONEL FABRICIANO .................................................................................................................................................. 98
IPATINGA .......................................................................................................................................................................... 100
SANTANA DO PARAÍSO .............................................................................................................................................. 102
TIMÓTEO .......................................................................................................................................................................... 104
CAPÍTULO 6 | VALOR DA CULTURA NAS CIDADES CONTEMPORANEAS ................................ 105
CAPÍTULO 7 |DESAFIOS DA CULTURA NO BRASIL ..................................................................... 113
7.1 | O CONSUMO DE BENS CULTURAIS NO BRASIL ...................................................................................... 116
7.2. | EDUCAÇÃO COMO ELEMENTO TRANSFORMADOR ............................................................................ 123
7.2.1 | OBRA ANÁLOGA: CENTRO EDUCACIONAL BURLE MARX ................................................................ 127
CAPÍTULO 8 | TRANSFORMAÇÕES NOS ESPAÇOS CULTURAIS ................................................ 133
8.1 | CONTRIBUIÇÃO DE LINA BO BARDI PARA CULTURA BRASILEIRA ................................................... 145
8.1.1 | OBRA ANÁLOGA: MASP ................................................................................................................................. 152
8.2 | MUSEUS E ESPAÇOS CULTURAIS NO VALE DO AÇO ............................................................................ 162
CAPÍTULO 9 | TCC 2 ........................................................................................................................ 171
9.1.1 | ESCOLHA DO NOME ....................................................................................................................................... 174
9.1.2 | DIRETRIZES DO PROJETO .............................................................................................................................. 174
9.1.3 | PROGRAMA DE NECESSIDADES .................................................................................................................. 174
9.1.4 | ESCOLHA DO LUGAR..................................................................................................................................... 1748
9.2 | ETAPAS DE DESENVOLVIMENTO PARA O TCC2....................................................................................... 180
CAPÍTULO 10| CONCLUSÃO ........................................................................................................... 185
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................................................... 187
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CAPÍTULO 1 | INTRODUÇÃO
Sabendo que a arquitetura e o urbanismo são produções culturais, este trabalho foi desenvolvido
pelo desejo de intender como a identidade cultural pode beneficiar a produção arquitetônica,
buscando perceber questões pertinentes à cultura no Vale do Aço como forma de propor uma
arquitetura contemporânea passível de ser assimilada como parte da identidade regional.
Durante o período que a autora trabalhou como estagiária no Plano Diretor de Desenvolvimento
Integrado da Região Metropolitana, além de conhecer a região sobre os diversos aspectos que a
compõe, desenvolveu-se um interesse pela valorização do Vale do Aço. Dentro das fragilidades que o
funcionamento pleno da região metropolitana enfrenta, por diversas vezes ouviu-se dizer sobre falta
de uma identidade metropolitana - questão que dificulta a gestão compartilhada dos municípios para
equipamentos de interesse comum.
Durante o curto período de elaboração desta pesquisa ouviu-se dizer “Por que você não faz algo
específico para Coronel Fabriciano? As outras cidades já estão com a questão da cultura
encaminhada” ou então “Por que não faz alguma coisa apenas para Timóteo? A história da cidade é
muito rica, e o fato de existir ‘duas cidades dentro de uma só’ daria uma boa discussão” e “Por que
não faz algo para Ipatinga? Só a diversidade daqui renderia uma boa discussão”. O que se pretende
nesta pesquisa é justamente desenvolver uma análise conjunta da região, fortalecendo através de um
espaço arquitetônico o sentimento de pertencimento a região.
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A decisão de abordar a Região Metropolitana do Vale do Aço de maneira integrada tornou
necessário que as análises arquitetônicas fossem condicionadas por elementos de uso público,
especificamente aqueles que estivessem relacionados com a cultura local, buscando diagnósticos e
pesquisas que pudessem dar um panorama sobre a questão cultural nos municípios.
Primeiramente, será feita uma análise histórica da região buscando entender aspectos pertinentes
a cultura local. Nesta etapa será abordado o fato da região ter se desenvolvido tardiamente, mas com
grande impulso pela implantação das siderúrgicas. Além disso, se discutiu sobre dicotomias no
espaço urbano causadas pelo alto nível de urbanização. Serão apontadas características desde a
transformação do Vale Verde até a presente condição de Região Metropolitana do Vale do Aço.
Para entender como poderia ser analisada a questão da identidade cultural apontou-se o estudo
de Peter Hall (2006) sobre os desdobramentos da identidade perante o indivíduo como sendo algo
constantemente mutável, refletindo em um processo constante de formação de identidade. Hall
ainda aponta para a força que a identidade nacional desempenha ao produzir símbolos passíveis de
serem associados de forma coletiva. Diante da importância que a identidade representa como forma
de vincular os indivíduos ao seu espaço, levantou-se a questão da identidade metropolitana no Vale
do Aço.
No quarto capítulo serão apontadas as principais manifestações da cultura local, que em função da
ausência de um mapeamento oficial das prefeituras, baseia-se em análises encontradas nos materiais:
“Cidades e políticas públicas de cultura: diagnóstico, reflexão e proposições” que apresenta o
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mapeamento da cultura em Ipatinga e Santana do Paraíso; o “Mapeamento de Lideranças e Recursos
Culturais” elaborado pela APERAM em parceria com o SEBRAE sobre os agentes culturais de Timóteo
e Coronel Fabriciano; e o diagnóstico desenvolvido pelo Eixo de Desenvolvimento Social do
PDDI/RMVA. Além de aspectos apontados pelas pesquisas, serão abordados outros conforme análise
da autora.
No quinto capitulo além da valorização histórica e cultural, aponta-se para outro potencial
inexplorado da região: os recursos naturais, muito associados à existência do Parque Estadual do Rio
Doce. Apesar da existência do Circuito Mata Atlântica que engloba os quatro municípios da Região
Metropolitana - além de outros do Colar Metropolitano - a questão do turismo na região ainda é
insipiente. Sabendo das transformações ocorridas no meio ambiente do Vale do Aço durante o seu
período de ocupação, pretende-se apontar a necessidade de valorizar os aspectos naturais da região.
No sexto capitulo pretende-se abordar como o valor simbólico tem interferido nas produções
arquitetônicas contemporâneas, apontando aspectos da economia mundial que tornaram a cultura
em um diferencial econômico. Além disso, são levantados discussões sobre como podemos perceber
a “Imagem das Cidades” influenciadas pelo “City Marketing”.
Sabendo da forma como a cultura tem se tornando em um ativo econômico, buscou-se encontrar
explicações para a fragilidade que a questão cultural sob os olhos públicos no Brasil representa. Ao
longo deste capítulo são apontadas dificuldades herdadas pelo contexto histórico brasileiro,
sobretudo, sobre a questão da arte e cultura como sendo algo exclusivo das elites. Posteriormente,
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será apontado como os novos meios de comunicação têm contribuído para a desvinculação do
espaço arquitetônico a fim de propor espaços capazes de estimular essa permanência nos espaços
culturais. Sabendo da dificuldade do acesso a cultura ter-se tornado um ‘problema cultural’
ressaltasse a importância da educação como forma de estimular o desenvolvimento social de crianças
e jovens.
No oitavo capítulo são apresentadas modificações nos espaços culturais como forma de levantar
questões sobre os aspectos pertinentes à produção desses espaços na contemporaneidade. Também
será apontada a contribuição importante de Lina Bo Bardi para a valorização da cultura brasileira
através de seus estudos e projetos para espaços culturais no Brasil. Após analisar sobre as
transformações dos ‘museus’ de forma geral, aponta-se os equipamentos dessa tipologia no Vale do
Aço.
OBJETIVO | Sabendo que a arquitetura e o urbanismo são processos de materialização da cultura
de um povo, pretende-se com essa pesquisa analisar a questão cultural no Vale do Aço como
norteadora para produção arquitetônica contemporânea capaz de fortalecer a identidade regional.
Para isso, pretende-se analisar o processo de formação da região buscando entender a origem de
aspectos da cultura local; buscar quais são as principais manifestações culturais que acontecem na
região; verificar quais são os espaços edificados de uso-público destinados à valorização da cultura
regional; entender como a questão cultural vem sendo abordada nas produções arquitetônicas
contemporâneas.
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CAPÍTULO 2 | O PASSADO RECENTE DO VALE DO AÇO
O Vale do Aço teve sua formação recente quando comparado com cidades próximas
territorialmente que já datam alguns séculos de existência, como exemplo, Ouro Preto e Sabará. A
ocupação efetiva do território que corresponde hoje ao Vale do Aço ganhou expressividade apenas
no início do século XX, mas o que levou a essa ocupação tardia do território e como essa ocupação
influenciou as manifestações culturais observadas no presente contexto dessa região? Vale destacar a
abordagem simplificada sobre a formação da Região Metropolitana do Vale do Aço a que esse
capítulo se pretende, sendo preconizados os indícios que possam contribuir para um entendimento
subjetivo sobre a condição atual da cultura regional.
2.1 | O VALE ANTES DO AÇO
Antes de se tornar o vale do aço, a região era conhecida como Vale Verde em função da presença
abundante de Mata Atlântica em toda porção do território que hoje corresponde a Região
Metropolitana do Vale do Aço (RMVA) e que se estendia ao longo de todo Rio Doce. A presença dos
índios botocudos combinado com a mata densa, relevo acidentado e falta de pedras preciosas -
principal foco de exploração pela Coroa Portuguesa no século XVIII, intimidou os exploradores
durante o período colonial, conforme diz BARBOSA (2010):
“Nessa época, a região do vale verde acabou assumindo o papel de barreira do
contrabando do ouro das minas. Além da proibição da Coroa de abertura de novos
caminhos, a presença dos índios, sobretudo, os botocudos, aliado à topografia
montanhosa, contribuíram para a restrita ocupação da região.” (BARBOSA, 2010)
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Os índios botocudos foram os mais temidos e resistentes às invasões dos colonizadores, em função
das habilidades como guerreiros e pela a cultura da antropofagia12 em suas tribos. O termo
“botocudo” foi-lhes atribuído pejorativamente pela caracterização desses indígenas com ‘botoques’
nos lábios e orelhas. Em diversos mapas que datam o período colonial a porção do território ocupado
por essas tribos é demarcada por expressões como “bárbaros gentios botocudos” ou “índios
botocudos antropófagos”, apontando que a presença deles dificultou o processo de ocupação ao
longo do rio Doce.
As expedições em busca de ouro na região do rio Doce não tiveram êxito, o que aliado aos outros
fatores que dificultavam a ocupação do território fizeram a região permanecer distante dos interesses
dos colonizadores. Por volta de 1773, a Coroa Portuguesa proibiu a navegação do rio Doce, em
função da sua ligação entre o interior da então capitania de Minas Gerais com o litoral capixaba, e
buscou impedir a abertura de novos caminhos como forma de evitar o contrabando das pedras
preciosas. Enquanto o caminho das minas de pedras preciosas se tornavam um importante eixo de
crescimento de vários povoados e cidades de Minas Gerais, o Vale Verde permanecia inexplorado,
1 Antropofagia é o ato de comer uma parte ou várias partes de um ser humano. Os povos que praticavam a antropofagia a faziam
pensando que, assim, iriam adquirir as habilidades e força das pessoas que comiam. Por sua realização em contexto mágico cerimonial
ou patológico, não deve ser classificada ou compreendida como um hábito alimentar.
2 “Esse negócio de a literatura dizer que os "Botocudo" eram antropófagos é um ato falho, é um truque da má consciência
neobrasileira formadora do Brasil. Eles tinham de dizer que minha gente era antropófaga para nos aniquilarem.” Ailton Krenak, líder da
comunidade Krenak e assessor para assuntos indígenas do governador Aécio Neves, foi concedida em setembro de 2008, em Belo
Horizonte (MG). Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-40142009000100014>. Acesso em 31
de Outubro de 2014.
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conforme pode ser visualizado no mapa a seguir. Pode-se analisar a existência de cidades e
ocupações mais complexas nas áreas próximas aos locais de exploração de pedras preciosas.
A partir do século XIX com a decadência das explorações do ouro e pedras preciosas a Coroa
incentivou a ocupação de novas terras em especial ao longo do Rio Doce, refletindo diretamente em
uma guerra contra os índios Botocudos e em uma tímida ocupação da região onde foram
desmatadas grandes áreas florestais. Nesse período começam a existir os primeiros registros do
povoamento da região que hoje corresponde ao Vale do Aço conforme é dito por BARBOSA, 2010:
O governo colonial declarou guerra aos indígenas. Ofereceu benefícios fiscais e concedeu
terras àqueles interessados em explorá-las. Os colonizadores, imigrantes e soldados, em
busca de novas riquezas, destruíam as tribos indígenas e devastavam as florestas para se
apossar das terras (BRITO; OLIVEIRA; JUNQUEIRA; 1997 apud BARBOSA, 2010).
A Coroa Portuguesa promoveu uma verdadeira chacina contra as várias aldeias indígenas que
habitavam a mesorregião do Rio Doce, restando poucas tribos em algumas cidades de Minas Gerais
(MG) e Espírito Santo (ES). Na região do Vale do Aço, especificamente, existem hoje poucos indícios
sobre a ocupação dessas tribos sendo que algumas produções artesanais demonstram essa
influência, como exemplo os objetos feitos através do trançado de palha e a cobertura de edificações
que também utilizavam a palha de coqueiro - típico da Mata Atlântica.
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Sobre as primeiras ocupações no Vale Verde, pode-se perceber conforme ilustrado pelo mapa
(1821) que as primeiras ocupações na região que hoje corresponde especificamente a RMVA situam
se na porção do território que hoje constitui o município de Timóteo. O mapa acima indica a
presença da ocupação do Alegre em Timóteo e do Porto de Canoas confirmado por QUECINI, 2007:
Foi neste contexto que, em 1847, Francisco de Paula e Silva solicitou a posse de uma
sesmaria na região, onde organizou a Fazenda do Alegre. Situada em local deslocado das
principais rotas de colonização, às margens do córrego denominado “Thimóteo”, um
afluente da margem direita do rio Piracicaba a poucos quilômetros do ponto onde este
deságua no rio Doce, esta fazenda cresceu e passou a englobar três sesmarias: Alegre,
Limoeiro e Timóteo, possuindo pastos para criação de gado, mulas e cavalos, além de
produzir açúcar.
No mapa podem ser observadas as ocupações mais antigas na região destacando-se o povoado
de Alegre e o Porto de Canos, ambos em Timóteo. Além desses, podem ser observados pequenos
povoados ainda existentes como é o caso de Cubas – atualmente Distrito de Ferros, mas com sua
ocupação tangenciando a área rural de Coronel Fabriciano - e Perpétuo Socorro – atualmente Distrito
de Belo Oriente. Também podem ser observados núcleos próximos mais estruturados como é o caso
de Antônio Dias e São Domingos do Prata.
O Rio Piracicaba e os caminhos que passavam tangenciando a região provavelmente foram dois
fatores que propiciaram a ocupação efetiva do território do Vale do Aço. Em nível de hipótese aqui
levantada, a localização do vilarejo de Cuba, pode revelar o ponto por onde as ocupações na Serra
dos Cocais em Coronel Fabriciano e Pedra Branca em Ipatinga iniciaram. No caso de Timóteo, além
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do Rio Piracicaba, o caminho ao sul do território que passavam pela Ponte Queimada, pode ter sido
um dos fatores que influenciaram essas ocupações.
Já no mapa abaixo que data de 1855, período do Brasil Império, já pode ser percebido uma rede um
pouco mais complexa de desenvolvimento na região, podendo ser observado a freguesia de S. Anna
de Alfié (Timóteo), sendo a primeira em um território pertencente à RMVA – conforme é registrado
pelo mapa - , e outros próximos como é o caso de Joanésia, Prata, Antônio Dias, S. Anna de Ferros.
Também pode ser observada a condição de Itabira elevada à condição de cidade; muito em função
da descoberta do minério de ferro. Outro ponto que cabe ser ressaltado é a inexistência de aldeias
indígenas na região.
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Como já foi dito anteriormente a decadência da exploração do ouro resultou em novas formas de
exploração do território, e posteriormente a descoberta do minério de ferro deu início a uma nova
fase de desenvolvimento de Minas Gerais. “Em função da descoberta do minério de ferro algumas
pequenas fábricas foram se instalando no interior de Minas Gerais, o que pode ser considerado o
embrião da vocação siderúrgica do estado”.3 (ACERVO Parque Estadual do Rio Doce, 2014)
A ocupação efetiva do território que hoje corresponde ao Vale do Aço começa a ganhar relevância
após a chegada da Estrada de Ferro Vitória - Minas (EFVM) que margeando o Rio Doce liga o interior
de Minas Gerais a zona portuária no Espírito Santo, uma medida que visava o escoamento rápido de
produtos e teve como consequência a formação de vários povoados ao longo da ferrovia e um
significativo crescimento populacional na região. Essa medida começa a influenciar diretamente a
ocupação do, até então, Vale Verde conforme diz COSTA, 1995:
A estrada de ferro, ao correr continuamente em paralelo com o Rio Doce, divide com este
o papel de espinha dorsal do Vale de mesmo nome, transformando seu meio-ambiente
original, diversificando e incorporando mercados e produtos, fazendo surgir e
consolidando entrepostos comerciais, embriões das atuais áreas urbanas, estabelecendo
ao longo do tempo as condições necessárias à produção industrial”. (COSTA, 1995 apud
BARBOSA, 2010)
3 Conforme acervo disponível no Parque Estadual Do Rio Doce a região: “Em 1864 – Relatório do Governo de Minas
Gerais registra a existência de 120 fabricas de ferro em Minas Gerais, a maioria na região do rio Doce.” FONTE: ACERVO
Parque Estadual do Rio Doce, 2014.
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A disponibilidade do minério de ferro combinada à localização estratégica que a região passava a
representar com a chegada da ferrovia resultou na instalação de grandes empresas siderúrgicas na
região por volta dos anos 1930. A região, que até o inicio do século XX permanecia com grandes
reservas de Mata Atlântica de Minas Gerais, foi transformada em uma ‘mina’ de carvão vegetal
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(principal fonte de combustível para as indústrias no momento) que junto à ferrovia formava uma
localização estratégica para empresas siderúrgicas.
A primeira a chegar à região foi a Companhia Siderúrgica Belgo-Mineira. A empresa adquiriu
muitas terras na região para exploração de carvão vegetal, transformando a paisagem natural da
região e alterando as dinâmicas de ocupação do território. Instalou seu escritório no Calado - no
momento distrito de Antônio Dias, e hoje corresponde ao Centro de Coronel Fabriciano - criando um
poder de polarização comercial à medida que uma infraestrutura local era formada. Desde o período,
o comércio e a prestação de serviços se tornaram um forte traço da cultura em Coronel Fabriciano.
A presença da estrada de ferro combinada com a descoberta de minério de ferro na região de
Itabira e a produção do carvão vegetal no distrito de Coronel Fabriciano ganhou destaque no cenário
estadual tornando a região uma combinação perfeita para a instalação das siderúrgicas, sendo
inaugurada em 1949 a ACESITA (Companhia Aços Especiais Itabira) e em 1956 a USIMINAS (Usinas
Intendente Câmara), em Timóteo e Ipatinga, respectivamente.
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2.2 | A CHEGADA DO AÇO NO VALE
Com a chegada das indústrias na região, um intenso processo de modificação das dinâmicas
sociais, econômicas e territoriais começou acontecer. A região que durante o século XIX passou
despercebida, no inicio do século XX teve um desenvolvimento expressivo no cenário estadual e,
mais tarde, federal quando a indústria de base foi tomada como principal ferramenta do progresso
econômico.
Ao analisar o mapa que data de 1821, Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, apresentados na
seção anterior, e as ocupações urbanas do século XX, que serão apresentadas neste, temos os
núcleos históricos especulados da região separados inicialmente do processo intenso de urbanização
dessas cidades com a chegada das indústrias siderúrgicas.
Vale ressaltar que antes mesmo da chegada da ferrovia, o pequeno povoado São Sebastião do
Alegre de Timóteo já possuía uma estrutura social com “uma economia baseada na produção rural,
seja de gêneros alimentícios, seja de carvão, o núcleo “urbano” possuía pouco mais que seis ruas
organizadas em torno da capela de pau-a-pique e seu pequeno cemitério nos fundos.” (QUECINI,
2007).
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A implantação da Companhia Siderúrgica Belgo-Mineira na região do Calado associado à ferrovia
tornou Coronel Fabriciano (até ao momento distrito de Antônio Dias) um importante polarizador de
atividades relacionadas à prestação de serviços para as ocupações próximas. A exportação das
madeiras nobres provindas do desmatamento da Mata Atlântica e a produção do carvão vegetal
trouxe prosperidade para o distrito, conforme diz BARBOSA, 2010:
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Com a chegada da Belgo-Mineira no distrito de Coronel Fabriciano houve a expansão do
seu pequeno núcleo urbano, com aberturas de ruas e novas construções. Foram
construídos escritórios, ambulatórios médicos, residências para os funcionários e também
o primeiro hospital da região (Hospital Siderúrgica), inaugurado em 1938. (BARBOSA,
2010)
A logística favorável da região que surgia da combinação do minério de ferro, ferrovia e a
produção de carvão vegetal resultavam em uma localização estratégica para as indústrias
siderúrgicas. ACESITA iniciou sua implantação em 1944 e além da construção da indústria foi a
responsável pela construção de uma infraestrutura que condicionasse o seu funcionamento
provocando profundas modificações na paisagem natural e nas dinâmicas sociais existentes do
povoado de São Sebastião do Alegre de Timóteo, conforme é citado por QUECINI, 2007:
“E, enquanto as fazendas iam se agrupando e a produção agrícola ia minguando, a pouco
menos de cinco quilômetros, uma extensa planície às margens do rio Piracicaba
começava a ser desmatada. Nesse local, destino de homens, máquinas e mercadorias que
constituíam quase toda a carga desembarcada na estação do Calado, começavam a ser
plantadas as sementes da moderna cidade de Timóteo, relegando à pequena vila o papel
de abrigar parte desse contingente de estranhos.”(QUECINI, 2007)
A primeira fase de urbanização da “Cidade da Acesita” se deu sem um planejamento específico,
sendo priorizado inicialmente o projeto da planta industrial, “as casas eram edificadas em pau-a-
pique ou com a madeira dos caixotes dos equipamentos importados dos Estados Unidos”.
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À medida que a indústria ia tomando forma, uma tomada nacionalista fez com que a indústria
tomasse a “sua cidade” como sua extensão, fazendo investimentos para garantir que a imagem da
ACESITA fosse condizente com seu papel no cenário nacional 4. Em 19585 a ACESITA já havia
edificado 2.734 residências. Além da igreja, do armazém, do açougue e da farmácia, a cidade possuía
4 Após o Banco Central assumir o controle da empresa, a ACESITA passa a ser vista como um exemplo do
desenvolvimento industrial do país, sendo a única a produzir aços especiais com autossuficiência energética. Assim cidade
deveria refletir esses conceitos e tornar-se um exemplo de desenvolvimento urbano para o Brasil, a ACESITA “passará a
marcar, no mapa do Brasil, um novo núcleo de vida, de trabalho”. 5 Em 27 de dezembro de 1948, depois de longo processo tramitado na Assembleia Legislativa do Estado de Minas
Gerais, o Governador Milton Campos assina a Lei nº. 336, criando o Município de Coronel Fabriciano, emancipando-se de
Antônio Dias. Por essa lei, Ipatinga é elevada a distrito do novo município. DRUMMOND, 2012 (org.)
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um centro comercial com lojas, agência bancária e cinema, dois clubes, hospital, quatro escolas
primárias e um colégio técnico (ACESITA, 1959 apud BARBOSA, 2010).
Em um processo semelhante ao que ocorreu em Timóteo o pequeno vilarejo - formado em função
da estrada de ferro - em Ipatinga também viu seu cenário mudar radicalmente com a chegada da
indústria. Tal como a Acesita, também foi necessário a criação de uma cidade operária para abrigar os
funcionários da USIMINAS - empresa siderúrgica implantada em parceria com japoneses, que se
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implantou em 1956, na região que hoje representa o município de Ipatinga. Diferente da Acesita,
Ipatinga teve o desenvolvimento prévio de seu plano urbanístico, desenvolvido por Hardy Filho, que
conforme o modelo modernista estendia o funcionamento da indústria para a cidade.
Os bairros da cidade operária da USIMINAS foram criados conforme a ocupação dos cargos
desempenhados dentro da indústria, buscando atender aos requisitos básicos da Carta de Atenas:
trabalho, moradia e lazer. Em função da setorização em função da posição dos funcionários dentro
das empresas criou-se um processo de
diferenciação entre as pessoas em
função do bairro que estas moravam,
um aspecto que é relatado por
moradores da cidade como uma prática
recorrente.
Durante o processo de elaboração
do plano urbanístico da cidade
operária, Hardy Filho já fazia
prospecções sobre o futuro da região.
Ele já observava que a existência dos
eixos lineares favoreceria o
desenvolvimento conjunto da região conforme é citado por Barborsa (2010) “Segundo ele, as três
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cidades viriam a formar um “complexo urbano único linear e contínuo.” Além de prever essa condição
de interdependência entre as cidades, ele previa que a cidade operaria não conseguiria absorver
sozinha a projeção populacional ao longo dos anos.
Em função das notícias de prosperidade econômica da região um grande contingente imigrante
chegou à região, que sem emprego direto nas indústrias ocuparam as áreas “fora das cidades
operárias” (em Timóteo e Ipatinga) e na cidade de Coronel Fabriciano, conforme apontado pelo
diagnóstico “CIDADES E POLÍTICAS PÚBLICAS DE CULTURA: diagnóstico, reflexão e proposições”:
A implantação da indústria provocou profundas transformações socioeconômicas na
região. Além da explosão demográfica, registrou-se a transformação das antigas fazendas
em loteamentos para a construção das moradias para os trabalhadores e a rápida
urbanização e instalação de infraestrutura para atender às necessidades da empresa e da
população que chegava a cada dia. (DRUMMOND, 2012)
Como já era previsto por Hardy Filho, esse processo de interdependência das cidades contribuiu para
o processo de conurbação que culminaria na criação da Região Metropolitana do Vale do Aço6. É fato
que cada uma dessas cidades desenvolveu características específicas, no entanto, muitos aspectos
tornaram-se comuns a região de uma maneira geral e à medida que as dinâmicas iam tornando-se
6 No ano de 1998 foi instituída a Região Metropolitana do Vale do Aço – RMVA, composta por quatro municípios:
Coronel Fabriciano, Ipatinga, Santana do Paraíso e Timóteo. O colar metropolitano que circunda a RMVA, em 1998 era
constituída por 22 municípios, e em 2014 passou a ser formada por 28. metropolitano que circunda a RMVA, em 1998 era constituída
por 22 municípios, e em 2014 passou a ser formada por 28.
32
mais complexas os vínculos dos moradores (trabalho, relacionamentos, lazer, etc.) iam se ampliando
para as outras cidades.
Outro ponto marcante do desenvolvimento
dessas cidades que se reflete na cultura local: a
existência de ‘duas cidades dentro do mesmo
território’. Esse dualismo ocorreu de forma mais
significativa nas cidades sedes das siderúrgicas,
que de um lado construíram cidades providas de
planejamento e infraestrutura, e de outro, cidades
espontâneas eram geridas por um poder público
ainda imaturo tornando possível a diferenciação
entre essas duas ocupações distintas no mesmo território.
Além das já citadas Belgo-Mineira, Acesita e Usiminas, outro fator que contribuiu para a formação da
dinâmica existente hoje na malha urbana dessa região foi a CENIBRA. Produtora de celulose, ao se
implantar na região passou a adquirir grandes quantidades de terras para o plantio de eucalipto
fazendo que a área das ocupações rurais fosse limitada territorialmente, sendo a malha urbana a
responsável por incorporar esse contingente rural.
33
34
Conforme é discutido por Monte-Mor no texto “Cidade e campo, urbano e rural: o substantivo e o
adjetivo” o sentido de campo e cidade passou por profundas transformações conforme as relações
de trabalho começaram a ser alteradas no período industrial. Antes a cidade era tida como o espaço
de produção intelectual e o campo como o espaço de produção braçal, mas com o surgimento das
cidades-industriais, a produção tanto intelectual quanto braçal passou a concentrar-se no espaço da
cidade tornando o campo dependente das inovações e produtos oferecidos pelas cidades. No caso
do Vale do Aço, trata-se do campo como um “espaço industrial não construído” conforme é citado
por QUECINI, 2007:
“Este descompasso entre campo e cidade foi visto por Heloisa COSTA (1995: 75) como
uma relação que nasce adulterada, uma vez que “as cidades se abastecem e realizam suas
trocas com outros centros” e a monocultura do eucalipto transforma o campo numa
extensão da fábrica, transformando o campo num “espaço industrial não construído” e
fazendo desaparecer a diferenciação entre rural e urbano.”.
A dicotomia entre o campo e cidade após essa revolução passa a ser dissolvido perdendo seu
sentido enquanto substantivo e prevalecendo o sentido adjetivo de urbano e rural - passando por
uma abordagem cultural que vale ser ressaltado neste trabalho devido ao esclarecimento sobre
alguns traços da cultura local, que embora se encontre num território altamente urbanizado7, permite
a identificação com um contexto rural conforme explica MONTE-MÓR (2007):
7 Em 2010, a taxa de urbanização da RMVA representava 98,69%, conforme apresentado pelo diagnóstico do Plano
Diretor de Desenvolvimento Integrado da Região Metropolitana do Vale do Aço (PDDI/RMVA). Disponível em:
35
“O termo urbano, etimologicamente, diz respeito à qualificação da cidade, ligado também
ao afável, ao cortês; o rural, por sua vez, diz respeito ao campo, ao campestre, ao rústico.
[...] O rural, tomado no seu sentido campestre, rústico, no seu sentido cultural,
evidentemente continua existindo. É o sentido do que chamamos de roça, a simplicidade
da autonomia em oposição à sofisticação da vida citadina; a ruralidade em oposição à
urbanidade.” (MONTE-MÓR, 2007)
A formação de uma malha urbana de forma rápida e desigual junto à chegada de muitos
imigrantes tornava esse novo cenário - que Monte-Mór chama de “simulacro da cidade” referindo-se
as vilas operárias das cidades mono-industriais - onde o processo de apropriação simbólica, capaz de
produzir uma identificação da sociedade com o lugar onde se insere, ainda não era relevante.
De um lado os moradores das fazendas viam seu ambiente, relações sociais e econômicas
mudarem rapidamente, enquanto para os estrangeiros a nova cidade não refletia os laços de
identificação existente com o lugar que eles haviam deixado. Além disso, o dualismo entre o rural e
urbano, o existente e novo, modificavam rapidamente a identidade da região.
Japoneses, franceses, árabes, brasileiros de diversos estados, entre tantos outros. As indústrias
foram e continuam sendo grandes responsáveis pelo contato das cidades com culturas diversas.
Nenhum outro elemento tem tanto poder dentro da cultura local quanto a cultura operária que se
instaurou na região. A história dessas empresas além de se confundir com a história de formação
<http://www.unilestemg.br/pddi/arq/doc/documentos-oficiais/2014/PDDI_DIAGNOSTICO_VOL1.pdf>. Acesso em 01 de
outubro de 2014.
36
dessas cidades confunde-se com histórias individuais de gerações que tem as siderúrgicas como
elemento intrínseco as suas próprias histórias.
Logo, podemos perceber que a sobreposição de culturas diversas surgindo quase
simultaneamente com uma região nova culminou numa grande variedade de significações, que talvez
por isso tenha dado origem a equivocada afirmativa de que “o Vale do Aço não tem cultura”, seria
mesmo a falta de uma cultura ou apenas a falta de reconhecimento dessa multiplicidade cultural? Ou
ainda, seria a dificuldade de digerir e incorporar essas novas culturas como sendo legitimas ao Vale
do Aço? Ao longo dos próximos capítulos serão investigados quais são as principais manifestações da
cultura do Vale do Aço, a fim de prever estratégias arquitetônicas capazes de fortalecer a identidade
cultural da região.
Logo, podemos perceber que a sobreposição de culturas diversas surgindo quase
simultaneamente com uma região nova culminou numa grande variedade de significações, que talvez
por isso tenha dado origem a equivocada afirmativa de que “o Vale do Aço não tem cultura”, seria
mesmo a falta de uma cultura ou apenas a falta de reconhecimento dessa multiplicidade cultural? Ou
ainda, seria a dificuldade de digerir e incorporar essas novas culturas como sendo legitimas ao Vale
do Aço? Ao longo dos próximos capítulos serão investigados quais são as principais manifestações da
cultura do Vale do Aço, a fim de prever estratégias arquitetônicas capazes de fortalecer a identidade
cultural da região.
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2.3 | REGIÃO METROPOLITANA DO VALE DO AÇO
A formação de ocupações urbanas de forma interdependente e a existência de eixos lineares de
desenvolvimento da região (a ferrovia e BR381) resultaram na formação de uma malha contínua,
culminando no processo de conurbação entre as cidades de Timóteo, Coronel Fabriciano, Ipatinga e
Santana do Paraíso.
Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a Região Metropolitana “é uma
região estabelecida por legislação estadual e constituída por agrupamentos de municípios limítrofes,
com o objetivo de integrar a organização, o planejamento e a execução de funções públicas de
interesse comum”. 8
Na década de 1970 foram realizados diversos estudos pela FJP sobre o Aglomerado Urbano do
Vale do Aço – AUVA, que inicialmente era constituído apenas por Coronel Fabriciano, Ipatinga e
Timóteo. À medida que as dinâmicas sócias e econômicas iam se tornando mais complexas e a região
começava a exercer uma força polarizadora sobre outros municípios e, depois de um longo processo
legislativo, foi criada em 1998 a Região Metropolitana do Vale do Aço - assumindo outros formatos
antes de sua formatação atual - constituindo-se dos municípios de Coronel Fabriciano, Ipatinga,
Timóteo e Santana do Paraíso.
8 O que é região metropolitana? Disponível em: <http://www.brasilescola.com/brasil/regioes-metropolitanas-brasil.htm>.
Acesso em 05 de Agosto 2014.
41
“Ao final de 1998, após um longo processo de tramitação na Assembleia Legislativa, o
Estado de Minas Gerais institui a Região Metropolitana do Vale do Aço, através da Lei
Complementar nº 51, de 30 de dezembro de 1998, composta por quatro municípios –
Coronel Fabriciano, Ipatinga, Santana do Paraíso e Timóteo – e circundada por um Colar
Metropolitano formado por outros 22 municípios9.” (DIAGNÓSTICO ORDENAMENTO
TERRITORIAL PDDI/RMVA, 2014)
O mais jovem município a integrar a RMVA foi Santana do Paraíso, que se emancipou de Mesquita
em 28 de abril de 1992, e por sua relação profunda de conurbação com o município de Ipatinga e
território quase inexplorado, passou a representar o território mais favorável à expansão urbana da
RMVA. No entanto, se a questão da identidade metropolitana do Vale do Aço já é frágil, o caso de
Santana é ainda mais fragilizado dentro deste processo de apropriação simbólica pelos moradores
dos outros municípios.
O Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado da Região Metropolitana do Vale do Aço que vem
sendo desenvolvido pelo Unileste MG é uma importante ferramenta de gestão da RMVA, que busca
promover o desenvolvimento integrado da região através das funções públicas de interesse comum.
Com base nos diagnósticos elaborados pelos eixos estratégicos10 do PDDI/RMVA pode-se ter um
panorama sobre região do Vale do Aço no presente contexto sobre seus diversos aspectos.
9 Os municípios do Colar são: Açucena, Antônio Dias, Belo Oriente, Braúnas, Bugre, Córrego Novo, Dionísio, Dom Cavati, Entre
Folhas, Iapu, Ipaba, Jaguaraçu, Joanésia, Mesquita, Marliéria, Naque, Periquito, Pingo D'Água, São João do Oriente, São José do Goiabal,
Sobrália e Vargem Alegre. (DIAGNÓSTICO ORDENAMENTO TERRITORIAL PDDI/RMVA, 2014. PÁG 35). 10 Os eixos que constituem o PDDI/RMVA são: Ordenamento Territorial, Mobilidade, Meio Ambiente, Recursos Hídricos
e Saneamento, Desenvolvimento Social, Desenvolvimento Econômico e Arranjo Institucional.
42
“A RMVA é uma aglomeração urbana com quase 451.351 habitantes, segundo dados do censo
demográfico de 2010. Se considerarmos os municípios da RMVA e do Colar Metropolitano, a
população ultrapassa 700.000 habitantes. A RMVA tem uma população predominantemente urbana,
com um grau de urbanização de 98,69%, em 2010. Já o Colar Metropolitano apresentou um grau de
urbanização de 75,51%”.(DIAGNÓSTICO ORDENAMENTO TERRITORIAL PDDI/RMVA, 2014).
Conforme já foi apresentado sobre a formação histórica do Vale do Aço, o processo de
urbanização acelerado trouxe impactos que podem ser sentidos até hoje nas dinâmicas urbanas da
região, em função de uma organização desigual do território. “A formação e o crescimento do
aglomerado foram se constituindo espaços desiguais, resultado da divisão injusta da receita pública e
das oportunidades de trabalho, refletindo também na distribuição desigual do acesso à infraestrutura
urbana e aos serviços e equipamentos públicos.” (idem)
De um lado as cidades que foram amparadas pelas siderúrgicas (Ipatinga e Timóteo) tiveram um
crescimento expressivo em função da receita gerada para os municípios resultando na criação de
uma boa infraestrutura urbana, referente as áreas relacionada a essas. Enquanto isso, as áreas que
surgiam espontaneamente nesses municípios e nos de Coronel Fabriciano e Santana do Paraíso,
tornaram-se responsáveis por absorver o contingente que não era atendido dentro das “cidades-
operárias” propiciando o surgimento de ocupações com infraestrutura insatisfatória, e como as
indústrias tornaram-se as principais empregadoras da região, as cidades que não usufruíam
diretamente dos benefícios gerados por elas passaram a ser denominadas como ‘cidades dormitórios’
43
– onde pessoas trabalham e consomem serviços em outros municípios, criando dificuldades de
arrecadação para os municípios.
A desigualdade também pode sentida sobre o aspecto social - o que não representa uma
exclusividade da região e sim um fator histórico do desenvolvimento urbano no País. De um lado a
concentração de equipamentos e serviços nas áreas onde a população possui as maiores
concentrações de renda, enquanto a população com menor renda tem o acesso dificultado aos
equipamentos públicos de uso comum.
Se a presença das indústrias siderúrgicas na RMVA representa todo esse processo de
desenvolvimento intenso pelo qual a região passou desde início do século XX, hoje elas passam a
representar uma incógnita sobre o desenvolvimento futuro da região. A crise mundial que afetou o
setor da siderurgia em 2008 impactou a dinâmica dessas cidades apontando para o risco da “mono
economia” e alertou para o empobrecimento da região.
No diagnóstico do eixo de Desenvolvimento Econômico do PDDI/RMVA as siderúrgicas são
apontadas como fundamentais para o desenvolvimento regional - assim como aponta outras
questões que não serão apresentadas integralmente neste trabalho – no entanto, são levantadas
novas possibilidades para o desenvolvimento econômico regional. Cabe ressaltar aqui a questão da
falta de um caráter empreendedor nos moradores da região que conforme apresentado pelo Eixo de
Desenvolvimento Econômico PDDI/RMVA (2014) “Na visão dos representantes da sociedade local, a
44
presença das grandes empresas gerou uma cultura nas pessoas de serem empregadas e não de
empreender”.
Um fator que foi observado em quase todos os diagnósticos dos eixos estratégicos e também
levantados pela sociedade durante as audiências públicas é a questão do potencial turístico da
região, muito associado com a presença do Parque Estadual do Rio Doce, que permanece
inexplorado como uma nova vertente para o desenvolvimento da região. Vale frisar, conforme
apresentado pelo eixo de Meio Ambiente, Saneamento e Recursos Hídricos, a existência do risco
ambiental que o turismo de forma desordenada pode acarretar para os recursos ambientais da
região.
45
46
CAPÍTULO 3 | IDENTIDADE E INDIVIDUALIDADE
Ao analisar a produção arquitetônica e urbanística ao longo dos séculos percebe-se que esta é
uma produção tridimensional que reflete a cultura de diferentes comunidades em diferentes tempos
históricos e, portanto, é um elemento capaz de reproduzir um sistema de significações com que essa
sociedade se identifica.
Utilizar o termo “identidade cultural” nunca foi tão complexo desde que o processo de
globalização modificou as percepções de tempo-espaço e permitiu um rápido processo de troca e
permeabilidade entre culturas. Portanto, esse capítulo tem como objetivo fazer uma breve análise
relacionando a questão da identidade cultural à arquitetura.
Conforme aponta o Ministério da Cultura do Brasil:
”Tendo sido por muito tempo vista pelo ângulo das belas artes e da literatura, a cultura é
agora tomada como um campo muito mais amplo: ‘a cultura deve ser vista como um
conjunto distinto de elementos espirituais, materiais, intelectuais e emocionais de uma
sociedade ou de um grupo social. Além da arte e da literatura, ela abarca também os
estilos de vida, modos de convivência, sistemas de valores, tradições e crenças’”.
(PREÂMBULO da Declaração Universal de Diversidade Cultural da UNESCO, 2001 apud
MINISTÉRIO da Cultura, Brasil).
Antes de abordar a questão da identidade cultural, deve ser ressaltado como o conceito de cultura
será abordado ao longo deste trabalho - tendo como principal foco de análise os produtos, serviços e
manifestações culturais, conforme é apresentado por REIS, 2010:
47
“Em uma abordagem antropológica, cultura engloba os conhecimentos, crenças, línguas,
artes, leis, valores, morais, costumes, atitudes e visões de mundo. É a chamada Cultura
com “c” maiúsculo, o amálgama e o diapasão da sociedade. Em um sentido mais estreiro
(cultura com “c” minúsculo), refere-se aos produtos, serviços e manifestações culturais, ou
seja, que trazem em si uma expressão simbólica da Cultura em sentido amplo.” (REIS,
2010)
No livro “Cultura: um conceito antropológico” as transformações culturais são abordadas como um
processo inerente à vida humana, sem que a globalização seja sua única causa. Para isso o autor
utiliza como exemplo as tribos indígenas “isoladas”, apontando a existência das transformações
culturais mesmo que essas ocorram de forma mais lenta. “Podemos agora afirmar que existem dois
tipos de mudança cultural: uma que é interna, resultante da dinâmica do próprio sistema cultural, e
uma segunda que é o resultado do contato de um sistema cultural com outro”. (LARAIA, 2001)
Sabendo desse aspecto dinâmico da cultura, nenhum processo modificou tanto as percepções da
cultura quanto o processo de globalização. “As fronteiras são extintas e ninguém pode eximir-se de
gerar ou sofrer interferências. Com isso, a homogeneização das culturas tornou-se uma preocupação
e a globalização a possível promotora do declínio das identidades e da desconstrução do local.”
(PICHLERA; MELLO)
Sobre a questão da identidade, Hall (2006) aponta uma transformação na percepção da identidade
pelo indivíduo, analisando três diferentes sujeitos históricos: o sujeito do Iluminismo; sujeito
sociológico; e o sujeito pós-moderno, sendo este o principal elemento em questão. Entender a forma
48
como essa identidade tornou-se dinâmica e complexa permite compreender melhor os espaços
produzidos pelo homem. Sobre o sujeito do Iluminismo HALL, 2006 descreve:
“O sujeito do Iluminismo estava baseado numa concepção da pessoa humana como um
indivíduo totalmente centrado, unificado, dotado das capacidades de razão, de
consciência e de ação, cujo "centro" consistia num núcleo interior, que pela primeira vez
quando o sujeito nascia e com ele se desenvolvia, ainda que permanecendo
essencialmente o mesmo — continuo ou "idêntico" a ele — ao longo da existência do
indivíduo.” (HALL, 2006)
Diferente do caráter da identidade imutável do sujeito do Iluminismo - correspondente ao século
XVII, o sujeito sociológico passa a ser um reflexo da complexidade da vida em sociedade e diante
dessas relações é que o sujeito desenvolve essa formação da identidade que nesse contexto passa a
ser o reflexo da interação entre o “eu” e a sociedade, sendo um processo contínuo de formação,
fazendo com que a identidade como sendo algo imutável seja substituída por uma percepção
contínua. A partir do surgimento deste “sujeito sociológico” a questão da identidade torna-se mais
condizente se tratada com um processo contínuo de identificação.
“O fato de que projetamos a "nós próprios" nessas identidades culturais, ao mesmo
tempo que internalizamos seus significados e valores, tornando-os "parte de nós",
contribui para alinhar nossos sentimentos subjetivos com os lugares objetivos que
ocupamos no mundo social e cultural. A identidade, então, costura (ou, para usar uma
metáfora médica, "sutura") o sujeito à estrutura.” (HALL, 2006)
Tomando como base essa identidade cultural como meio vincular a sociedade ao lugar que ela se
insere, nenhum movimento arquitetônico teve tanta influência social como o Estilo Internacional
49
Moderno. Diante do desejo de tornar a arquitetura e o urbanismo em um objeto capaz de ser
intercionalizado, toda a simbologia própria do local passa a ser desconsiderado produzindo uma
“crise de identidade” onde as pessoas não se vinculavam as cidades.
“(...) um quadro mais perturbado e perturbador do sujeito e da identidade estava
começando a emergir dos movimentos estéticos e intelectuais associado com o
surgimento do Modernismo. Encontramos, aqui, a figura do indivíduo isolado, exilado ou
alienado, colocado contra o pano-de-fundo da multidão ou da metrópole anônima e
impessoal (HALL, 2006)”.
A individualidade das significações pessoais passa a ser reduzida a um modulor, a casa transformada
em uma máquina de morar e o traçado das cidades em uma setorização que priorizava a máquina
como centro de seu funcionamento. Todas essas intervenções homogeneizadoras do Movimento
Moderno tornaram as cidades assépticas ao desconsiderar o que Walter Benjamin aponta como
“texto inscrito nas cidades” (ORTEGOSA, 2000) que representa o vínculo subjetivo estabelecido da
sociedade com seus espaços.
Entretanto, no Brasil a modernidade foi sentida de forma particular quando comparada ao dos
países europeus. O inicio do século XX trouxe transformações nas dinâmicas econômicas em função
da II Guerra Mundial. Com a diminuição das importações, o Brasil precisou aumentar sua capacidade
de produção o que refletiu diretamente no processo de industrialização, e consequentemente,
urbanização.
50
A Semana de Arte Moderna de 1922 dentro do contexto existente nesse período tornou-se
propício para a discussão de uma produção cultural brasileira, que representava o desejo de afirmar a
brasilidade como sendo essa identidade nacional, que por muito tempo esteve subjugada aos
modelos internacionais. Além da Semana de Arte Moderna de 22, o Manifesto Antropófago escrito
por Oswald de Andrade em 1928, tornou legitima essa necessidade de uma produção artística com
identidade brasileira. Enquanto a arte era abordada dentro de uma abordagem elitista de assimilação
das produções estrangeiras, ele propunha uma “deglutição antropofágica” conforme apresentado a
seguir:
51
Se Oswald de Andrade teve a lucidez de ridicularizar com o mimetismo que tanto seduz o
intelectual solene e bacharel, ele não caiu no equívoco de fechar as portas do País do
ponto de vista cultural. Ao contrário, sua formulação em torno da "deglutição
antropofágica" exige o remanejamento das ideias mais avançadas do Ocidente em
conformidade com a especificidade de nosso contorno social e político.” (O SARAMPO
ANTROPOFÁGICO).
Para o Brasil o estilo moderno significou um grande marco para a identidade nacional, sendo a
arquitetura uma importante forma de reconhecimento da identidade nacional. Diferente dos outros
países, a produção modernista apropriava-se de elementos vernáculos e dos postulados do
movimento moderno, passando a produzir uma arquitetura única passível de identificação pela
sociedade, talvez por isso, a produção arquitetônica brasileira tenha se solidificado nessa vertente.
De volta ao cenário internacional, as cidades sem história, tornavam-se espaços anônimos
incapazes de despertar o sentimento de pertencimento nas pessoas, tornando as cidades num
ambiente asséptico. Como resposta a essa produção, na década de 60 em diante, a revisão das
doutrinas legadas pelo Modernismo abriram espaço para novas formulações e uma produção
artística crítica passou a advogar pelas necessidades subjetivas regionais, impulsionando a
redescoberta dos símbolos culturais no ambiente construído (ORTEGOSA, 2000).
“Contra a uniformização, emerge um renovado interesse pela especificidade do regional e dos
estilos históricos, e pela diversidade das subculturas urbanas” (ORTEGOSA, 2009). A partir da década
de 70 ocorreram intensos processos que modificaram a percepção da identidade, como exemplo: a
globalização e descobertas científicas, que reforçavam o individualismo, potencializando o
52
surgimento de “múltiplas identidades culturais no indivíduo”, dando origem ao chamado sujeito pós-
moderno, conforme argumenta HALL, 2006:
“Esse processo produz o sujeito pós-moderno, conceptualizado como não tendo uma
identidade fixa, essencial ou permanente. A identidade torna-se uma "celebração móvel":
formada e transformada continuamente em relação às formas pelas quais somos
representados ou interpelados nos sistemas culturais que nos rodeiam (Hall, 1987). [...] A
identidade plenamente unificada, completa, segura e coerente é uma fantasia. Ao invés
disso, à medida em que os sistemas de significação e representação cultural se
multiplicam, somos confrontados por uma multiplicidade desconcertante e cambiante de
identidades possíveis, com cada uma das quais poderíamos nos identificar — ao menos
temporariamente.”
Se agora os indivíduos passavam a apresentar esse caráter multicultural, essa complexidade foi
refletida nas cidades demandando novas metodologias para atuação no espaço urbano. Assim como
o sujeito do pós-modernismo deixou de ser apenas uma identidade para tornar-se o conjunto de
várias, as cidades e edificações também refletiram esse processo. Além disso, as intervenções urbanas
pontuais passaram a ser amplamente utilizadas, levando em consideração as particularidades de cada
fragmento da cidade que compõem esse tecido multicultural. Além disso, as novas vertentes
arquitetônicas passam a buscar no valor simbólico novas formas de produzir arquitetura, tornando-se
este “valor simbólico na nova economia urbana”.
Se Hall aponta três sujeitos em seu estudo, será que podemos analisar o “Sujeito Contemporâneo”
como sendo um sujeito diferente do sujeito pós-moderno? São visíveis os problemas que o
individualismo - que foi uma solução eficiente para manipulação das massas ao segrega-las tanto do
53
ponto de vista político quanto econômico – gerou no espaço urbano, como a falta de um senso de
comunidade e, consequentemente, de um pertencimento a ela alterando a forma como as pessoas
vivenciam o espaço público. Concomitantemente, a tecnologia vem ocupando de maneira
onipresente a vida em sociedade, modificando as relações de tempo e espaço, permitindo que as
pessoas estejam desconectadas de seu entorno imediato.
Portanto, do ponto de vista da arquitetura e urbanismo a criação de espaços eficientes tornasse
cada vez mais um desafio diante dessa dissociação do homem com o ambiente construído a sua
volta. Além disso, as práticas de consumo induzem a assumir várias identidades e constituem-se em
outro desafio para arquitetura, no sentido de ser capaz de incorporar e ressignificar essas múltiplas
culturas individuais. Vale ressaltar que a valorização da cultura local esta diretamente relacionada
com o fortalecimento de uma identificação com o contexto local, relegando aos espaços culturais a
capacidade de despertar processos de identificação cultural.
54
55
3.1 | IDENTIDADE METROPOLITANA
Diante das múltiplas identidades possíveis de serem assimiladas pelo indivíduo, as culturas
nacionais constituem em uma das principais fontes de identidade cultural. Segundo Hall (2006)
quando nos referimos como sendo brasileiros, franceses ou ingleses, estamos nos expressando de
forma metafórica, pois essas identidades não estão literalmente impressas em nossos genes,
entretanto, nós efetivamente pensamos nelas como se fossem parte de nossa natureza essencial.
A partir do momento que a globalização influência nas dinâmicas espaciais, “a ideia de um homem
sem uma nação parece impor uma tensão à imaginação moderna” (GELLNER, 1983). A nação não é
apenas uma entidade política, mas algo que produz sentidos — um sistema de representação
cultural. (HALL, 2000) No Brasil, em especial, essa identidade nacional é responsável por englobar a
diversidade cultural resultante do processo de formação histórica, sendo que cada região possui seus
traços culturais específicos.
Com base no conhecimento que essa identidade nacional produz no imaginário de seus cidadãos,
desenvolvesse a partir daqui uma narrativa empírica tentando estratificar as camadas do imaginário
coletivo, capazes de produzir os símbolos que tornam possíveis os processos identificação. Além da
identidade nacional, espera-se apontar os aspectos simbólicos dentro de esferas que serão aqui
estratificadas conforme o aspecto global, nacional, estadual e regional.
Dentro da esfera global, temos aspectos que são comuns à maioria da população mundial. Como
aspecto mais relevante dessa esfera temos as transformações proporcionadas pelas inovações
56
tecnológicas que modificam a forma como podemos nos relacionar independente dos fatores tempo
e espaço, tornando o significado de “instantâneo” no norteador desta comunidade global.
Do ponto de vista da esfera nacional, são várias as caraterísticas marcantes do imaginário
brasileiro. Por muito tempo a identidade cultural do povo brasileiro era tida como inexpressiva em
função do conceito de cultura estar restrito as produções da elite associado à estratificação social
proveniente do processo de colonização. A partir desse momento a busca por uma brasilidade
começa a tornar-se uma necessidade, justamente como forma de fortalecimento dessa identidade
nacional. A principal característica nacional refere-se à diversidade cultural, além disso, a vinculação
de um país receptivo e alegre fortalecido por símbolos da cultura brasileira como as festas e o
futebol.
Quando analisamos a influência desses elementos no Vale do Aço percebe-se uma presença quase
igualitária no território da RMVA dos campos de futebol, muito diferente dos equipamentos culturais.
Outro fator que permite analisar a influência desses símbolos imagéticos na região é a presença dos
blocos carnavalescos na cidade de Timóteo.
Já dentro da esfera estadual, percebe-se a forte herança de elementos da sociedade colonial
remetendo ao importante período de prosperidade de Minas Gerais. O telhado colonial e as
varandas, que são uma adaptação portuguesa ao clima brasileiro em geral, permanecem fortes no
imaginário mineiro, tal como as edificações e festas religiosas que são elementos fortemente
associadas a esse período de maior prosperidade de Minas Gerais. As montanhas e cachoeiras
57
completam o imaginário de uma paisagem bucólica. Além disso, a existência de um fazer rústico e
artesanal está diretamente associada à imagem simbólica de Minas Gerais.
Extraindo de todas essas esferas suas particularidades o regional deve ser aquilo que é exclusivo a
determinada região. No caso do Vale do Aço, salvo todas as características que são comuns ao
imaginário dos brasileiros e mineiros, existe uma caraterística que julgasse ser intrínseca a região: as
indústrias siderúrgicas onipresentes nas dinâmicas sociais das cidades. Responsáveis por influenciar
diretamente as paisagens da região, elas são as responsáveis por estabelecer horários, fluxos,
relações sociais, movimentos culturais e influenciar até mesmo condicionantes biológicos, tendo um
alcance que vai muito além de suas cercas, influenciando toda vida das cidades.
Dentro dessa esfera regional, a identidade metropolitana no Vale do Aço ainda constitui-se em um
elemento insólito a ser fortalecido representando a chave do processo efetivo de apropriação
simbólica, potencializando a expressividade de sua imagem simbólica.
No decorrer do processo de elaboração do Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado da Região
Metropolitana, um dos gargalos apontados frequentemente nas reuniões e audiências públicas é a
ausência de uma identidade metropolitana.
Se dentro das análises imagéticas que se pode assimilar das esferas de identidade, temos a
identidade metropolitana como elemento aglutinador de identidades das diferentes cidades que as
constitui. Uma relação de interdependência, onde as características próprias de cada cidade não se
anulam, mas se complementam.
58
É nítido que as pessoas reconhecem a interdependência entre as cidades através dos
deslocamentos diários em função de trabalho, estudo, moradia, entretenimento. No entanto, o que
se pretende frisar aqui é a ausência de uma identidade metropolitana com força semelhante a da
“identidade nacional”.
É nítido que as pessoas do Vale do Aço se relacionam subjetivamente com suas cidades de origem,
como exemplo podem ser citados: o recente documentário “Um sentimento chamado Ipatinga”, de
Savio Tarso, que buscou relatar através da história da cidade através de cidadãos comuns que
chegaram a cidade e transformaram-na em suas cidades de coração; a doação de cidadãos comuns
para a criação do acervo do recém inaugurado Museu Municipal José Avenilo Barbosa, em Coronel
Fabriciano; a mobilização da sociedade em Timóteo para proteger a história simbolizada pela Igreja
de São José Operário; entre tantos outros fatores que reforçam a identidade dos moradores com seus
municípios, pretende-se frisar ações que desempenham essa abordagem independente dos limites
municipais.
A falta de reconhecimento e, consequentemente, do sentimento de pertencimento torna frágil à
questão da RMVA, que não deve existir apenas no papel, mas deve ser sentida e vivenciada por seus
cidadãos.
“(...) apesar da instituição da RMVA existir formalmente a 16 anos, da denominação
comum, da relativa identidade regional, de vocações econômicas bem próximas e das
mesmas questões a resolver e potencialidades, ainda é tênue a visão de conjunto no
núcleo metropolitano que permita uma abordagem integrada dos assuntos que afetam a
59
mais de um Município.” (DIAGNOSTICO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO PDDI/RMVA,
2014).
Dentro do diagnóstico do eixo do Ordenamento Territorial do PDDI/RMVA é frisada a importância
que os equipamentos metropolitanos desempenham como meio de fortalecer a identidade regional,
o que valoriza o papel da arquitetura neste contexto. Como exemplos podem ser citados: o Shopping
do Vale do Aço, Estádio “Ipatingão”, USIPA, Hospital Marcio Cunha, entre outros. Vale ressaltar que o
porte desses equipamentos tal como sua singularidade potencializa o seu caráter metropolitano.
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CAPÍTULO 4 | MULTICULTURAS NO VALE DO AÇO
Como já foi apresentado anteriormente o rápido processo de formação do Vale do Aço
impulsionado pela prosperidade econômica que a região passou a partir do século XX, promoveu a
chegada de vários imigrantes na RMVA permitindo o contato entre diversas culturas.
Ao olhar para as cidades sobre lentes fragmentadas, diversos símbolos rementem a diferentes
períodos da história tornando possível “ler o texto inscrito nas cidades”. Entretanto, a grande
diversidade torna a análise desses símbolos em uma escala metropolitana quase impossível pensando
que cada elemento construído têm suas particularidades, reflexo dessas identidades mutáveis
próprias do sujeito pós-moderno.
Para possibilitar uma análise sobre a arquitetura com alcance metropolitano na região foi realizado
um questionário com o objetivo de perceber quais são os lugares que desempenham maior
influência sobre a identidade cultural do Vale do Aço. Buscou-se, através das relações subjetivas dos
entrevistados, encontrar qual desses espaços possui mais visibilidade no contexto regional para
posteriormente extrair características relevantes.
A intenção do questionário foi de perceber o Vale do Aço por um ponto de vista que não é apenas
da autora, buscando a interação com outras pessoas. Foram expostas fotos de 30 lugares que estão
vinculados com a história do Vale do Aço sendo alguns equipamentos culturais, outros de lazer e
patrimônios históricos. A escolha desses locais se baseou na possibilidade de sintetizar aspectos que
sejam recorrentes as questões culturais das quatro cidades como forma de identificar principalmente
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se a arquitetura dessas edificações era um aspecto relevante da identificação das pessoas com a
região metropolitana.
O questionário foi aplicado durante a Semana Integrada no curso de Arquitetura e Urbanismo do
Unileste MG de forma interativa, através de um quadro para exposição das informações e cédulas de
respostas. As duas questões solicitavam ao entrevistado que diferenciasse os locais que apenas
conheciam daqueles que vivenciavam.
A primeira questão abordava os espaços que as pessoas apenas conheciam, utilizando das
palavras IDENTIFICAR no sentido de “Conhecer a natureza de algo | Provar ou reconhecer a
identidade de”; e CONHECER com o sentido de “Ter noção de, saber | Distinguir”. Com base nisso
esperava-se avaliar quais são os elementos que possuem uma maior visibilidade regional. Já na
segunda questão pretendia-se avaliar esses elementos com base nos aspectos simbólicos muito
relacionados com a história individual utilizando as palavras no sentido de IDENTIFICAR-SE Quando
outro elemento desperta o autoconhecimento*; e RECONHECER “Examinar, explorar | Declarar legal,
ter por legítimo | Conhecer a própria imagem”. Essas análises permitiram formulação de estatísticas
que servirão de referência para as estratégias do projeto a ser desenvolvido.
As análises foram distribuídas em duas partes: primeiro por município da RMVA (Coronel
Fabriciano, Ipatinga, Timóteo e Santana Do Paraíso) e de outras cidades fora da região metropolitana;
e segundo agrupando todos os resultados. Foram 120 entrevistados sendo: 41 de Coronel Fabriciano,
29 de Ipatinga, 29 de Timóteo e 11 de outros municípios (Belo Oriente, Inhapim, Itabira, Ipaba, João
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Monlevade, Rio Piracicaba e Santana do Paraíso11), quase em sua totalidade, alunos e professores do
curso de Arquitetura e Urbanismo, do Unileste MG.
Tomando os resultados específicos por município a identificação com o Parque Ipanema foi
unânime em: Coronel Fabriciano com 59% (foi apontado por alguns entrevistados a falta da Praça da
Estação), Ipatinga com 72% e nos outros municípios 64%; apenas em Timóteo o resultado foi
diferente: 72% tendo a Praça 29 de Abril como o principal elemento de identificação; e conforme uma
análise geral do resultado, o Parque Ipanema aparece com 67,5% dos resultados como o lugar com
que as pessoas mais se identificaram.
Essa interpretação é muito importante, pois quando analisamos a baixa capacidade de
identificação das pessoas com os patrimônios culturais construídos podemos perceber que ou seu
uso não seja abrangente ou que as pessoas não reconheçam a história desses lugares e por isso não
se apropriem simbolicamente destes. Já os espaços que foram capazes de produzir nos entrevistados
uma maior identificação correspondem aos espaços livres de uso público que tem maior flexibilidade
para assumir usos diversos.
11 Santana do Paraíso foi incluído em outros municípios por possuir apenas um representante.
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4.1. | MANIFESTAÇÕES DA DIVERSIDADE
Conforme o material “Cidades e políticas públicas de cultura: diagnóstico, reflexão e proposições”
que apresenta o mapeamento da cultura em Ipatinga e Santana do Paraíso e o “Mapeamento de
Lideranças e Recursos Culturais” elaborado pela APERAM em parceria com o SEBRAE sobre os
agentes culturais de Timóteo e Coronel Fabriciano pode-se delinear os elementos de maior relevância
para a cultura local.
Conforme o diagnóstico apontado por esses materiais já é possível perceber como o cenário
cultural é abordado na região: de um lado as grandes empresas siderúrgicas são as responsáveis por
incentivar grande parte dos equipamentos e grupos de cultura em suas cidades sedes, enquanto nas
cidades de Coronel Fabriciano e Santana do Paraíso o apoio é basicamente por via da administração
pública.
A Fundação APERAM (antiga Fundação Acesita) e o USICULTURA são equipamentos que buscam
promover as atividades culturais na região incentivadas por suas empresas, respectivamente, Aperam
e Usiminas, através de espetáculos de teatro, música, exposições artísticas e acervo próprio sobre a
história da empresa que se confunde com a das próprias cidades. Além de seus próprios centros
culturais essas empresas são responsáveis por incentivar alguns grupos de cultura nas cidades.
Vale ressaltar que no município de Ipatinga um Mapeamento Cultural mais aprofundado vem
sendo realizado por uma empresa terceirizada neste ano de 2014 e tem como objetivo “servir de
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base para a criação de um banco de dados atualizado visando à formação do Sistema Municipal de
Informações e Indicadores Culturais (SMIIC)”. O Mapeamento Cultural deve ser realizado em todos os
municípios brasileiros, a fim de abastecer uma base de dados nacional referente à cultura no Brasil,
que serão disponibilizadas no site http://sniic.cultura.gov.br/. A seguir serão apresentadas as
principais formas de manifestação cultural observadas na região, onde poderá ser notado que de um
lado existem as manifestações típicas das primeiras ocupações do território e as que foram
incentivadas pelas empresas.
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CONGADO E MARUJADA
O congado é “uma das manifestações mais típicas do interior do Brasil, e especialmente do povo
mineiro [...] uma manifestação que sempre esteve relacionada à Festa do Rosário, é praticado em
Minas Gerais desde o século XVIII.” (TIMÓTEO: um município brasileiro). A presença dos grupos de
Congado e da Marujada no Vale do Aço, assim como em boa parte das cidades de Minas Gerais, é
marcante. A presença desses grupos está relacionada diretamente às ocupações mais antigas do
território, como a comunidade da Serra dos Cocais em Coronel Fabriciano, Ipaneminha em Ipatinga, e
aos núcleos históricos de Santana do Paraíso e Timóteo.
Conforme documentário realizado sobre a Marujada na Serra dos Cocais são apontadas diferenças
básicas entre a Marujada e o Congado. Segundo o mestre do grupo de Marujos da Serra do Cocais,
as roupas e os ritmos são o que diferem a tipologia dos grupos. Ainda segundo relato, durante as
festas que reuniam grupos de Congado, Marujos e de Capoeira podiam ser notadas letras de músicas
iguais entre ambos, diferentes apenas pelo ritmo dessas. Este relato reforça a relação dessas
manifestações com a cultura afro.
Vale ressaltar que é comum que as guardas de diferentes cidades reúnam-se durante festividades.
Na Festa de Nossa Senhora do Rosário de Timóteo, de 2014, reuniram-se guardas de 14 municípios.
O fato de que diferentes guardas se reunirem em diferentes cidades também foi confirmado pelos
membros do Congado de São Domingos do Prata, durante a Semana Integrada do Curso de
Arquitetura e Urbanismo do Unileste MG.
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FESTAS RELIGIOSAS
A presença das festas é bastante significativa no Vale do Aço, sendo que boa parte dos
patrimônios históricos e culturais dessas cidades estão relacionados com a prática religiosa. Vale
ressaltar que essas atividades religiosas desde o inicio de formação das cidades foram responsáveis
pela criação de um senso de comunidade.
Durante diferentes épocas do ano, as comunidades se movimentam em prol da realização das
festas realizadas aos santos padroeiros das cidades da região. Além das festas juninas, elemento
marcante da cultura popular brasileira, realizadas por escolas e comunidades católicas, acontece
também a Coroação de Nossa Senhora Aparecida, Festa de Nossa Senhora do Rosário, Festa de Sant’
Anna, Festa de São Sebastião, entre outras.
Durante as comemorações de Corpus Christi são criados tapetes que alteram a percepção das
cidades. Conforme o documentário produzido pela Prefeitura de Coronel Fabriciano, a produção de
tapetes para a procissão de Corpus Christi foi inventariada como patrimônio histórico no município.
Em algumas paroquias de Ipatinga também podem ser observados a elaboração dos tapetes para a
procissão pela comunidade. Ainda sobre a influência dos aspectos religiosos sobre a produção
cultural na região, também se pode destacar o grupo de teatro formado exclusivamente para a
Encenação da Paixão de Cristo, em Coronel Fabriciano.
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CAVALGADAS
A presença das cavalgadas nas cidades do Vale do Aço reforça a presença do aspecto rural, em seu
sentido adjetivo. Conforme apontado sobre o processo de formação histórica do Vale do Aço, apesar
da alta taxa de urbanização são notáveis as influências da ruralidade nos municípios.
As cavalgadas representam um aspecto cultural relacionado às festividades religiosas e cívicas da
região. O dualismo entre rural e urbano, apesar de sentida em diferentes proporções é inerente às
cidades do Vale do Aço. Dentre elas vale ressaltar que além da realização de cavalgadas pelas
avenidas das cidades existe a tradicional Romaria Ecológica Diocesana Dom Helvécio, que reúne
grande número de cavaleiros de cidades da RMVA e Colar Metropolitano, existente desde a criação
do Parque Estadual do Rio Doce. A festa de caráter religioso e cívico envolve os municípios que
abrangem o entorno do Parque, que neste ano comemora 70 anos de criação da unidade de
preservação.
“A Romaria Ecológica tem o objetivo de resgatar os fatos históricos do século XX, relembrando o
esforço do Bispo de Mariana, Dom Helvécio Gomes de Oliveira para a criação do Parque e o
fortalecimento da participação das comunidades na proteção da unidade de conservação. Na década
de 1930, preocupado com a grande exploração da Mata Atlântica na região, o religioso registrou no
livro de tombos da arquidiocese de Mariana, a área do Parque com o objetivo de preservá-la”. (IEF,
2011)
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GRUPOS DE TEATRO
A presença dos grupos de teatro é um elemento marcante no Vale do Aço, tendo sido apontado
pelos diagnósticos referenciados cerca de 26 grupos de teatro, sendo aqui destacados: o Grupo de
Teatro Tralha, Grupo de Teatro Bramila, Grupo de Teatro Rizoma, Grupo de Teatro da Paixão de Cristo
– em Coronel Fabriciano; o Grupo Perna de palco, Grupo Entreatros, Grupo de Teatro Farroupilha, Cia.
Bruta, Grupo de Teatro e Dança GRUCON, Grupo de Teatro Esterco, Grupo de Teatro das Agentes
Comunitárias de Saúde do Nova Esperança, Grupo de Teatro Cleyde Yáconis, Grupo Lainha e Grupo
Boca de Cena – em Ipatinga; o Grupo Pirilampo, Grupo Atempus, Usina Dramática Alzira Alcantario,
Animarte, Trupe da Alegria – em Timóteo; e em Santana do Paraíso não foi referenciado o nome do
único grupo de teatro.
Existem cinco teatros na região: Centro Cultural Zélia Olguin e teatro do USICULTURA, em Ipatinga;
Teatro da Fundação APERAM, em Timóteo; Teatro João Paulo II e Centro de Arte e Cultura em
Coronel Fabriciano. Além dos teatros, ressaltasse a existência das sedes de alguns desses grupos e
também a existência ociosa do Teatro Arena do Timirim. É importante ressaltar que além dos
espetáculos no espaço físico dos teatros, existem eventos para popularização do teatro levando
espetáculos para praças e parques da região. É notável a participação das siderúrgicas para o
incentivo do teatro na região tanto pelo incentivo a alguns grupos quanto pela divulgação dos
artistas regionais durante os eventos promovidos por essas, como exemplo, Festival Arte Viva.
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GRUPOS DE DANÇA
São também diversos os grupos de dança no Vale do Aço, desde dança de salão até dança
contemporânea. São realizados eventos como: o Encontro de Dança do Vale do Aço – Endança,
desde 1985; Encontro de Dança Contemporânea de Ipatinga – ENARTCi –, desde 2003, e Enartcinho,
edição para crianças; Festivais Arte Viva e Roda Viva; e espetáculos de dança realizados ao longo do
ano pela Fundação APERAM e USICULTURA como forma de promover o contato do público com
trabalho de artistas locais.
Cabe destacar a atuação do grupo Hibridus que no trabalho "Corpo-Cidade: Território de
Relações" torna as relações entre corpo, cidade e paisagem em espetáculos nos espaços públicos.
“Corpo-cidade: Território de Relações busca compreender a natureza dos contrastes de des-
territorializações e re-territorializações, ordem/desordem, planejamento/informalidade,
massificação/individualidade, através do corpo.”
Conforme apontado pelo diagnostico tido como referencia podem ser citados os grupos: Bia
Antunes Centro de Dança, Núcleo de Dança Compasso, Academia de Dança na Trilha da Arte, Cia
Núcleo de Dança, Balé da Educação Integral – em Coronel Fabriciano; Hibridus Dança, Cia. Flux,
Haggios Dança Contemporânea, Novo Proceder, Academia Olguin, Meia Cia.de Dança, Ailton
Amâncio Studio de Dança e Grupo Hélia Barbuto – em Ipatinga; Thiago Barbosa, Grupo Afoxé,
Mahatma, Grupo Orfeu Cia. De Dança, Jorge Soares – em Timóteo; e em Santana do Paraíso foi
apontado a existência de um grupo de teatro, mas não teve o nome referenciado.
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GRUPOS MÚSICAIS
A presente diversidade na região, tal como as múltiplas identidades próprias do individuo
contemporâneo favorecem a existência de diversos estilos musicais na região. Sertanejo, Jazz, samba,
musica erudita, reggae, MPB, rock, entre outros. Dada sua diversidade não se pretende aqui
referenciar os artistas da região, mas os eventos que refletem essa diversidade.
As manifestações dos grupos musicais possuem maior abrangência devido à flexibilidade dessas
apresentações que ocorrem tanto em eventos em espaços públicos quanto eventos promovidos
pelos espaços culturais da região. Os artistas regionais apresentam-se em bares, boates, shows,
rádios, entre outros. Uma das questões pertinentes aos eventos musicais na região do Vale do Aço
refere-se à falta de um espaço para fins musicais de grande porte, já que o espaço dos centros
culturais não tem capacidade para atender grandes públicos. O problema maior dos espaços hoje
utilizados para realização desses eventos diz respeito à proximidade com áreas residências.
Os corais tem presença marcante em Timóteo e Ipatinga nas Cantatas de Natal; os coletivos em
Ipatinga promovem eventos como: Grito do Rock, a Noite do Vinil, a Noite Fora do Eixo e o Rock
Matinê; Festival Arte Viva em Timóteo e a Rota dos Sabores em Coronel Fabriciano que além de
promover os artistas regionais trazem shows de nomes importantes da música nacional; eventos
tradicionais como os festivais: Roda Viva, Arte Viva, Armazém da Viola, Ipatinga Live Jazz, Fest
Country, além de shows de artistas diversos ao longo do ano.
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FEIRAS E EVENTOS GASTRONÔMICOS
As feiras livres têm sua origem relacionada com a troca de excedentes. As feiras ao redor do
mundo possuem suas peculiaridades, sendo que no Brasil, assim como no Vale do Aço, os produtos
relacionam-se diretamente com a cultura local.
Assim como aconteceu com diversas cidades industriais, onde o solo urbano deixa de suprir as
necessidades de produção de alimentos, na RMVA o processo de ocupação do território marcado
pela utilização industrial do campo diminuiu a produção agrícola, que embora ainda exista de forma
tímida, torna necessário que a produção venha de produtores de outras localidades.
As feiras hoje representam mais do que um espaço destinado à venda de produtos variados, mas
um local de convívio social e lazer. De acordo com as necessidades, foram surgindo diversos tipos de
feiras pelas cidades, sendo que apesar de semelhanças possuem características próprias. Entre essas
feiras destacam-se: Feira de Coronel Fabriciano localizada no Melo Viana e a Feira Orgânica no bairro
Floresta; em Ipatinga destacam-se: a Feira do Ipatingão que assume diversos usos ao longo da
semana (de “CEASA” à feira de carros), Feira do Veneza, e a Feira de Artesanato Feirart, no Centro; e a
Feira do Timirim, em Timóteo. Dentre os eventos gastronômicos destacam-se: Rota dos Sabores,
Comida di Buteco, Festival da Cachaça, Festival da Banana – que além dos moradores da região
metropolitana atraem visitantes de outras localidades.
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CARNAVAL
Uma das festas mais antigas da humanidade tornou-se comum nas casas de bailes também no
Vale do Aço, mas em Timóteo o carnaval extrapolou o limite dos clubes privados e tomou as ruas. No
Brasil, a tradição carnavalesca veio de Portugal - onde o Entrudo era bastante popular- e à medida
que sofreu transformações deixou de ser uma festividade burguesa transformando-se em uma das
mais fortes expressões da cultura popular brasileira.
As festas de carnaval que aconteciam nos clubes e salões ganharam mais representatividade nas
ruas. Em Coronel Fabriciano e Ipatinga, por alguns anos o carnaval tomou as avenidas com foliões
fantasiados, mas a prática durou poucos anos. Mas na cidade de Timóteo o carnaval, passou a
representar um aspecto cultural da cidade. Tal como boa parte dos aspectos culturais, o carnaval em
Timóteo surgiu do incentivo da Acesita. Membros das escolas da cidade foram enviados para o Rio
de Janeiro onde aprenderam as técnicas sobre a festa. Associado a toda atmosfera lúdica que o
carnaval possibilita o carnaval representou um exercício de liberdade da cidade em relação à indústria
conforme diz QUECINI, 2007:
Mas se, como a cidade, o carnaval timotense não se formou, mas foi implantado, ele
preservou o espírito original da festa, constituindo-se numa celebração que ao
reconhecer as mazelas da realidade, busca contestá-la. [...] carnaval de Timóteo é uma
manifestação cultural que demonstra quão tênue é linha que separa aqueles que pensam
e fazem a cidade, daqueles que nela vivem. Mais do que isso, ele é a expressão legítima
da identidade de um grupo, de uma identidade que, sem negar sua origem industrial,
mostra-se livre da tutela empresarial. (QUECINI, 2009)
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ARTESANATO
O artesanato tem representado uma discussão ascendente no Vale do Aço. Uma produção no
impasse entre a arte e o design que através do seu valor simbólico tem capacidade para transformar
a vida de comunidades.
É fato que desde as transformações no período pós-moderno o valor simbólico tornou-se o
principal diferencial entre produtos. Sabendo disso, algumas produções ditas artesanais apresentam-
se “com produção cada vez mais homogênea e pasteurizada, os objetos apresentados estão
carregados de um falso tradicional e com produção em série.” (ROQUE, Bruna) É fato que algumas
produções artesanais ainda passam por questões de simples repetição, mas percebe-se a realização
de trabalhos que busquem a valorização da identidade regional.
Dentro dessas organizações podem ser citados: Associação dos Artesãos de Timóteo (ASSOARTT),
Casa do Artesão, a Feira de Artesanato e Gastronomia (FEIRACEL), a FEIRART (Feira de Artesanato de
Ipatinga), entre outros. Recentemente, aconteceu a primeira “Feira Metropolitana de Artesanato” na
Feira do Timirim, em Timóteo, em parceria entre a Prefeitura e o Circuito Mata Atlântica de Minas. “A
feira teve como objetivo fortalecer a divulgação do que vem sendo produzido pelos artesãos do Vale
do Aço e, além disso, incentivar o turismo na região”. (PREFEITURA Municipal de Timóteo, 2014)
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ARTES
Em relação às artes plásticas, a Fundação APERAM e o Centro Cultural USIMINAS, apesar de não
serem as únicas, desempenham papel fundamental como curadoras de exposições dos artistas locais
com as mais variadas temáticas.
Ao longo do ano esses espaços apresentam diversas exposições buscando valorizar artistas e
projetos desenvolvidos na região. Alguns artistas plásticos da região tiveram seus trabalhos
reconhecidos internacionalmente. São diversas técnicas, materiais e focos de atuação desenvolvidos
por artistas do Vale do Aço, exemplo dessa diversidade são as Oficinas de Cultura Japonesa no Vale
do Aço – Yoshiko, que transmitem um pouco da cultura nipônica presente em Ipatinga através das
técnicas japonesas como o Raku12 e Origamis.
Vale destacar a presença das esculturas de aço inox presente nos espaços públicos da região. Além
das técnicas tradicionais, um ponto positivo para as artes visuais no Vale do Aço é a presença delas
nos espaço urbano, através de obras de artistas plásticos e dos grafites. O grafite tem ganhado força
como expressão artística tipicamente urbana, sendo potencializado através das oficinas realizadas nos
projetos sociais pelo Vale do Aço reforçando o caráter inclusivo da arte.
12 Técnica conhecida da arte japonesa de fabricação de peças cerâmicas através de técnicas de cozedura e pós-
cozedura das peças que lhes garantem uma estética muito característica.
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GRUPO DE CICLISTAS
Um elemento culturalmente relevante é o uso da bicicleta seja como instrumento de deslocamento
ou de lazer. Os deslocamentos urbanos através das bicicletas tem ganhado relevância mundialmente,
em função de ser um modelo de transporte sustentável, favorecendo tanto quem a utiliza quanto a
cidade.
No período da formação das cidades do Vale do Aço, a bicicleta representava um dos poucos
meios de transporte disponíveis, já que naquelas condições poucas pessoas podiam ter acesso ao
carro. No entanto, esse deslocamento tornou-se um hábito na região sendo comum uma quantidade
expressiva de ciclistas na paisagem das cidades no Vale do Aço. Mas à medida que o tecido urbano
tornou-se mais extenso e complexo, as bicicletas vão diminuindo sua relevância muito em função da
vulnerabilidade por falta de ciclovias e pela necessidade de movimentos pendulares constantes.
Em Coronel Fabriciano, os registros fotográficos de Sete de Setembro de 1964 relatam a
importância que anos mais tarde pode ser comprovada pelos estudos do Plano Diretor de Coronel
Fabriciano. O Plano Diretor desse município aponta diretrizes exclusivas sobre as ciclovias no
município, ressaltando o fato do deslocamento por meio de bicicletas já ser um aspecto cultural na
cidade. Enquanto cidades caóticas tentam introduzir esse modelo de deslocamento, as cidades do
Vale do Aço deveriam aproveitar para potencializar o deslocamento por bicicletas como alternativa
de mobilidade e lazer.
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FUTEBOL É CULTURA
No Vale do Aço, além do imaginário nacional, a cultura operária contribuiu para a ampla difusão
do futebol nas cidades. O processo de formação dessas fez com que o senso de comunidade fosse
desenvolvido de forma gradual, quase sempre influênciado pelas indústrias. Os times de futebol
podem ser relacionados como um aspecto cultural do Vale do Aço porque representam um marco na
formação expontânea de organização social dessas novas cidades.
Reflexo dessa representatividade que os clubes de futebol desempenharam para desenvolver o
senso de coletividade nas cidades, a presença dos campos de futebol na região metropolitana
merece destaque, pois apresentam-se distribuídos de forma ‘igualitária’ no território, bem diferente
dos equipamentos de cultura que concentram-se no centro das cidades. Diferente dos anos que os
primeiros times do Vale do Aço foram criados, o futebol tem representado uma forma de transformar
e incluir, preservando o seu sentido de comunidade.
Além dos vários times de bairros, escolinhas de futebol e dos times de clubes da região, o Acesita
Esporte Clube, Social Futebol Clube, e Ipatinga Futebol Clube (passando este em 2013 a ser chamado
Betim Esporte Clube) contam uma parte da história dessas cidades desenpenhando não apenas uma
prática de lazer, mas uma referência do senso de coletividade.
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CAPÍTULO 5 | HERANÇA DO VALE VERDE PARA O VALE DO AÇO
Aspecto que merece a atenção do Vale do Aço como potencial para a diversificação econômica
das cidades é o potencial turístico proporcionado principalmente pelo relevo acidentado e pela maior
reserva contínua de Mata Atlântica em Minas Gerais: o Parque Estadual do Rio Doce. Essa localização
privilegiada do Vale do Aço culminou na criação do Circuito Mata Atlântica de Minas, que será objeto
de estudo deste capítulo.
O Circuito Mata Atlântica de Minas foi criado em 2001, com objetivo de potencializar o
desenvolvimento regional nos municípios constituintes através dos potenciais turísticos desses
municípios ligados aos segmentos do ecoturismo, turismo de aventura, turismo rural e o turismo
religioso, sendo estes: Açucena, Coronel Fabriciano, Ipatinga, Marliéria, Santana do Paraíso, São
Domingos do Prata e Timóteo.
O diagnóstico turístico desenvolvido em 2011 sobre o “Projeto ‘Turismo no Vale do Aço’ Circuito
Mata Atlântica de Minas” realizado pela Impactur Consultoria Turística, em atendimento à parceria
firmada entre o SEBRAE-MG e o Circuito para a implantação do Projeto Turismo no Vale do Aço
aponta as potencialidades e fragilidades para o funcionamento efetivo do Circuito na região paralelo
ao programa “Vale além do Aço”13. Embora o diagnóstico aponte os sete municípios constituintes,
13 “Conhecendo o Vale Além do Aço” é uma ação estratégica do Circuito para envolver e sensibilizar a rede de
prestadores de serviços turísticos, despertando o interesse, o empreendedorismo e o conhecimento da atividade turística
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serão abordados apenas os quatro municípios da Região Metropolitana do Vale do Aço – Coronel
Fabriciano, Ipatinga, Santana do Paraíso e Timóteo.
Uma fragilidade comum a todos os municípios integrantes
do circuito apontam para ausência de uma ação integrada
entre os municípios, o que enfraquece o potencial do programa
enquanto “circuito”. Outro ponto recorrente às fragilidades dos
municípios é a ausência de um centro de atendimento aos
turistas e o desconhecimento da população sobre a existência
do Circuito Mata Atlântica de Minas, além da baixa cultura do
turismo na região seja pela população, seja pela administração
pública.
A seguir serão apresentados os dados encontrados nesse
diagnóstico, com foco de análise sobre os recursos naturais
como forma de verificar quais são os elementos apontados
como potenciais para o desenvolvimento do turismo na região
do Vale do Aço.
regional e promovendo o intercâmbio de conhecimento e fomento às parcerias. (CIRCUITO MATA ATLÂNTICA DE MINAS,
2011).
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CORONEL FABRICIANO
Segundo a avaliação do diagnóstico do Circuito Mata Atlântico o município de Coronel Fabriciano
apresenta a melhor conscientização para o turismo de todos os municípios integrantes.
O principal destaque natural e cultural na região refere-se a Serra dos Cocais, localizado na zona
rural do município. Além desse, a APA da Biquinha localiza-se na área urbana do município, mas é
visível a falta de uma infraestrutura para visitação. Embora as atividades econômicas sejam apontadas
como comércio e indústria, o primeiro historicamente tem uma participação muito mais significativa
na economia da cidade, já possuindo a sensibilização do turismo como uma oportunidade do
desenvolvimento econômico. Avaliação do Potencial Turístico conforme o diagnóstico:
O município apresenta a melhor estrutura turística do Circuito. Os
investimentos públicos e privados têm trazido resultados satisfatórios para o
setor e proporcionando visibilidade ao município. Entretanto, deve-se
priorizar investimentos nos atrativos locais, tornando-os capazes de motivar os visitantes
oriundos dos negócios gerados pela indústria e pelo comércio local e regional. O
município tem potencial para os segmentos do Ecoturismo, Turismo de Aventura, Turismo
Rural, Turismo Cultural, Turismo Religioso e Turismo Solidário, entre outros.
(DIAGNÓSTICO TURÍSTICO, 2011)
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IPATINGA
Apesar de ser apontado o potencial para atividades características ao restante do circuito como o
Ecoturismo, Turismo de Aventura, Turismo Rural e Turismo Religioso – esses mais associados à área
rural do município - a presença de outros equipamentos e eventos permitem o desenvolvimento de
setores do turismo como Turismo de Negócios e de Eventos Esportivos, conforme avaliação do
potencial turístico apresentado pelo diagnóstico.
É evidente o potencial do município para ampliar o Turismo de Negócios e de
Eventos Culturais e Esportivos. Esses fluxos, motivados pela indústria, pelo
comércio, pelos acontecimentos culturais e tecnológicos encontram uma boa
infraestrutura de apoio e bons serviços e equipamentos turísticos. No entanto, é preciso
direcionar recursos para o planejamento do destino e criar uma cultura para o turismo,
através da sensibilização do setor público, dos moradores e do empresariado local. Em
menor escala, outros segmentos complementares poderão ser incentivados como o
Ecoturismo, o Turismo de Aventura, Turismo Rural, Turismo Religioso, e outros. O destino
é também, um indutor de fluxos turísticos para o Circuito. (DIAGNÓSTICO TURÍSTICO,
2011)
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SANTANA DO PARAÍSO
O diagnóstico realizado em Santana do Paraíso parece carecer de informações significativas sobre
os recursos naturais, históricos e culturais. É preciso ressaltar que além de recursos naturais como
cachoeiras e morros, a cidade possui vários clubes aquáticos e espaços destinados ao lazer. Além
disso, o Morro da Viúva muito utilizado para prática de esportes de aventura também não aparece no
diagnóstico. Por ser uma das cidades mais jovens da região, Santana ainda possui uma infraestrutura
insipiente. A seguir a avaliação do potencial turístico apresentado pelo diagnostico:
O município tem grande vocação para o Turismo Religioso e para o Turismo
de Lazer e Entretenimento, legitimado, respectivamente, pelas manifestações
da fé e pelas Cachoeiras estruturadas para receber visitação, pelo Park Hotel
Fazenda e por um Parque Temático. Contudo, os serviços e equipamentos turísticos são
muito precários e há muita dependência dos demais municípios da Região Metropolitana
do Vale do Aço. Além desses, segmentos tem potencial para o Ecoturismo, o Turismo de
Aventura, o Turismo Rural, entre outros. (DIAGNÓSTICO TURÍSTICO, 2011)
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TIMÓTEO
Apesar de ser o município com mais força dentro do Circuito Mata Atlântica de Minas - por abrigar
o Parque Estadual do Rio Doce e ser mais bem provido de serviços (se comparado com Marliéria, que
abriga uma área do maior do Parque), o município parece não estar tão organizado para implantar
medidas de desenvolvimento do turismo na cidade. Além do PERD, o Oikós e o Pico do Ana Moura
representam marcos importante do Circuito.
A cidade desde sua fundação tem a ACESITA (atualmente APERAM) como principal fonte de
recursos, entretanto, a crise econômica mundial de 2009 afetou a siderurgia e refletiu diretamente
sobre a cidade provando ser necessária a diversificação econômica para garantir o desenvolvimento
da cidade, sendo que o turismo poderia ser tratado como um desses caminhos, conforme é
apresentado na avaliação do potencial turístico do Circuito:
O município possui um fluxo efetivo de viajantes de negócios, motivados
pela indústria e pelo comércio. Apresenta uma boa oferta de serviços e
equipamentos turísticos e, seu território, abriga recursos naturais e culturais
relevantes à atividade turística. Tem atrativos turísticos aptos a receber visitação, como o
Parque do Rio Doce e, outros, estão degradados, como o Pico do Ana Moura. A alta
dependência da cadeia produtiva do aço/inox torna-o vulnerável às crises econômicas
mundiais, todavia, o turismo poderá ser uma boa alternativa. O município é propício a
desenvolver o Ecoturismo, o Turismo de Aventura, o Turismo Rural, o Turismo Religioso, e
o Turismo Tecnológico e Científico. (DIAGNÓSTICO TURÍSTICO, 2011)
105
106
CAPÍTULO 6 | VALOR DA CULTURA NAS CIDADES CONTEMPORANEAS
Com as transformações do sistema capitalista, uma nova lógica sobre o desenvolvimento
econômico e, consequentemente, urbano passou a interferir a forma como percebemos a “imagem
da cidade”.
Primeiramente, vale ressaltar que a economia e vida das cidades sempre estiveram indissociáveis,
podendo ser citado desde as primeiras formações de cidade onde o capital excedente permitiu o
surgimento dessas, ou o período industrial quando a lógica do modelo de produção taylorista
extrapolou o limite do interior das fábricas e influenciou o planejamento urbano, representam
relações entre a economia e o urbanismo conforme é abordado por REIS, 2008:
“Basta, para isso, lembrar que a própria denominação ‘economia’ refere-se a organização
da casa (do grego, oikós = casa; nomia = organização). A economia, filha da ciência
moral, volta-se assim à administração da casa, das propriedades, dos recursos, das
prioridades e também das relações humanas que se estabelecem. Ora, não é a cidade,
essa grande casa na qual se desenrolam as mesmas relações, justamente o objeto do
urbanismo?” (REIS,2008)
Percebendo a influência dos aspectos econômicos sobre a vida urbana em especial, é preciso ater
para as principais transformações ocorridas neste século que vem transformado as dinâmicas sociais
rapidamente, são elas: “a globalização, as novas mídias, a falência dos modelos econômicos
tradicionais em promover desenvolvimento e inclusão e valorização do conhecimento como ativo
econômico diferencial. (idem, 2008)”.
107
Dentro desse contexto da globalização, a reprodução de produtos de qualidade idêntica em
grande escala passou a ser aspecto fundamental, tornando a inovação e valor simbólico nos
principais elementos de diferenciação para valorização econômica. “A inovação pode estar no apelo
original, na emoção e nos sentimentos que se desperta nos consumidores através de signos e
símbolos de sua cultura, aproximando-o do objeto em questão.” (PICHLERA, MELLO).
Enquanto algumas empresas se mantiveram em seu território de origem e desenvolveram centros
internos de pesquisas, outras migraram para lugares próximos a universidades conceituadas, ou ainda
aquelas especializadas em softwares que se localizaram próximas a centros urbanos capazes de
oferecer “serviços financeiros e um ‘meio de informação’ criativo, capaz de gerar novas ideias e
técnicas pelo intercambio e interação de elementos centrados espacialmente em uma rede própria de
relações sociais” (ROSE, 1999). Diferente do modelo industrial novas estratégias de localização das
empresas modificaram a dinâmica das cidades conforme apontado por ROSE, 1999:
“Contrariamente ao modelo industrial tradicional, verticalizado, em que os fatores de
localização eram custo de transporte e abundância de matéria-prima, a segmentação
interna do processo produtivo proporcionado pelas novas tecnologias da informação
permite às novas indústrias operarem em escala mundial por meio de redes telemáticas.”
(ROSE, 1999)
Essa descentralização própria das transformações ocorridas pela ‘Era da Informatização’ culminou
na transformação dos elementos estratégicos que interferem na escolha do território a serem
implantadas essas empresas, sendo aspectos cruciais: qualidade de vida e acessibilidade. Uma rede
108
de telecomunicações e transporte eficiente, aliado a concentração de mão de obra especializada
permite a descentralização da produção visando o aumento da rentabilidade propiciada pela
ampliação de mercados.
Essa transformação do sistema econômico, como é de praxe, interfere diretamente no modo de se
pensar as cidades. Sabendo da busca dessas empresas por cidades com redes de comunicação e
transportes eficientes, além de taxas altas de escolaridade, as cidades passaram a pensar o seu
planejamento também como uma estratégia de mercado, existindo a necessidade de haver uma
“imagem-síntese” passível de ser vendida.
Desde então, o termo apresentado no livro “Imagem da Cidade” de Kevin Lynch passou por
profundas modificações, sendo que a percepção dos mapas mentais ‘se ampliou para uma esfera
global’ e conceitos como a visibilidade passaram a serem representados por grandes obras de
arquitetura e infraestrutura urbana, os pontos nodais passaram a serem representados pelas cidades
globais e a legibilidade tornou-se elemento de uma estratégia de manipulação de imagens passível
de ser vendida, transformando-se numa importante ferramenta de gestão e desenvolvimento urbano.
“Dentro desta lógica espetacular de criação de imagens e construção de consensos, os espaços
públicos contemporâneos, assim como a cultura, também são vistos como estratégicos para a
construção e a promoção destas imagens de marca consensuais, ou seja, são pensados enquanto
peças publicitárias, para consumo imediato. Marilena Chauí é categórica: ‘o fenômeno mais
109
importante é a passagem do espaço público à condição de marketing, merchandising e
midiatização”. (CHAUÍ, 2007 apud JACQUES, 2009)
Sob essa ótica do novo desenvolvimento urbano, as intervenções urbanas passaram a representar
estratégias de valorização e construção dessas imagens-sínteses, capazes de tornarem essas cidades
em exemplos de “cidades-modelo” a serem seguidas por outras cidades pelo mundo, exemplo disso
são os casos de Barcelona e Curitiba. Através de seus processos de revitalização urbana, associados à
divulgação na mídia, essas cidades passaram a representar um novo conceito de cidades, se
enquadrando como: cidades para pessoas ou cidades sustentáveis ou cidades criativas.
Essas transformações ocorridas, sobretudo nos anos 90, desencadearam transformações sobre a
forma de pensar as cidades, podendo ser apontados diferentes conceitos, sendo aqui abordado o
City Marketing e as Cidades Criativas.
Nas cidades do Vale do Aço é possível perceber algumas influências, embora frágeis, do ponto de
vista do city marketing. Sobretudo na década de 90, quando Timóteo se intitulava como a “Capital do
Inox” e Ipatinga como “Cidade Jardim” o que se pretendia era vincular essa imagem-síntese às
cidades como estratégia de desenvolvimento dessas, entretanto, sem muitos resultados.
A capacidade de representação dos espaços urbanos constitui uma das principais estratégias do
city marketing, onde o valor simbólico transforma-se no principal elemento de diferenciação desses.
“Há um complexo intercâmbio entre a transformação material e o simbolismo cultural, entre a
110
reestruturação de lugares e a construção de identidades. Desse modo, a cultura é o meio que
relaciona a textura da paisagem ao texto social”. (ROSE, 1999)
Conforme já foi apresentado ao longo deste trabalho sobre a questão da identidade cultural, é
possível perceber a intenção dessas intervenções em fortalecer a identidade das cidades frente ao
contexto globalizado, inserindo-as diretamente no contexto global, sem intermediações nacionais.
O grande problema desta mercantilização da imagem da cidade é o fato de que o marketing, ou
branding, elege apenas fragmentos do território que sejam mais adequados a transmitir a mensagem
que se pretende passar das cidades. Diante disso, as múltiplas identidades e diferentes formas de
vivência social, que coexistem na cidade, são simplificadas, depurada numa única identidade que se
pretende sintética. Ai o grande poder midiático de criar consensos sobre o consumo torna possível a
manipulação.
Quando se despertou para o interesse no valor simbólico como indutor do desenvolvimento no
espaço urbano, a arquitetura e o urbanismo reafirmou seu poder como transformadores do espaço
urbano sendo capaz de transformar as imagens subjetivas em elementos sólidos, passíveis de serem
vistos e vivenciados, codificando as formas construídas em códigos de consumo para receptores que
irão reinterpretá-los através do valor simbólico.
Sabendo da valorização dessa imagem simbólica no planejamento urbano contemporâneo, a
criação de uma imagem ilusória fundamentada apenas na intenção de atrair turistas, investimentos e
prosperidade econômica tornasse falha se essa abordagem é excludente, no sentido de preconizar
111
apenas as áreas da cidade que se pretende ‘ver’. É nesse sentido que as cidades criativas se diferem
de simples marketing urbano, preconizando o desenvolvimento criativo de maneira transversal em
todas as camadas que formam a complexidade das cidades. Nesse caso o turismo e os investimentos
externos ocorrem como consequência do que é feito na cidade e não como causa.
Portanto, vale destacar que para um projeto arquitetônico de fim cultural tornar-se expressivo
dentro do contexto urbano não basta apenas que este altere a ‘imagem da cidade’. É primordial o
desenvolvimento de estratégias projetuais - que vão desde a implantação até o programa - que
garantam a participação efetiva de toda sociedade, formando uma “rede” que une iniciativas públicas,
privadas e sociedade civil, capaz de alterar a dinâmica social refletindo diretamente no
desenvolvimento econômico.
112
113
CAPÍTULO 7 | DESAFIOS DA CULTURA NO BRASIL
Antes de analisar as principais características e transformações do espaço cultural é preciso
perceber as transformações ocorridas sobre a questão do consumo cultural no Brasil, a fim de prever
estratégias de implantação e programa arquitetônico capazes de subverter as dificuldades existentes
sobre o uso desses espaços.
Primeiro, vale ressaltar que o processo de formação do Brasil em função da sua colonização e
grande diversidade cultural significou um entrave quanto as questões culturais. Desde um processo
de aculturação compulsivo de povos como os índios e negros, até relacionar a arte e a cultura como
sendo algo exclusivo das elites do país.
Desde a Semana de Arte Moderna de 22, surgia um sentimento ansioso pelo desenvolvimento de
uma identidade cultural que de fato expressasse a brasilidade. A primeira iniciativa a tomar grandes
proporções envolvendo aspectos políticos para valorização da cultura brasileira refere-se a “Missão
de Pesquisas Folclóricas” realizada em 1935, por sugestão dos intelectuais Mário de Andrade e Paulo
Duarte, sendo um marco para a valorização da cultura nacional. “O então prefeito Fábio Prado cria o
Departamento Municipal de Cultura. Até onde se sabe, com essa medida ele foi o primeiro
governante brasileiro a criar um órgão destinado exclusivamente a cuidas das questões culturais
dentro do aparelho estatal.” (BORGES; BARRETO, 2010)
Durante os anos de 1930 a necessidade da valorização da cultural efervescente no país, fez com
que a cultura se tornasse uma “política a ser desenvolvida pelo Ministério de Educação e Saúde,
114
passando a compor o Ministério de Educação e Cultura, em 1953. Esta situação só se modificou em
meados dos anos 1980 com a organização de um ministério específico, independente e autônomo”.
(DIAGNÓSTICO Desenvolvimento Social PDDI/RMVA, 2014)
Embora a Constituição de 1988 atribuísse ao Estado a garantia do “pleno exercício dos direitos
culturais e acesso às fontes da cultura nacional” a subordinação das políticas de cultura a outros
ministérios e períodos de flutuações entre a existência e desativação do Ministério da Cultura
tornaram as politicas culturais em uma fragilidade do país.
Com a reestruturação do Mistério da Cultura, em 2005, foi criado o Sistema Nacional de Cultura
(SNC) e reestruturado o Conselho Nacional de Política Cultural e, além disso, a revisão da Lei
Rouanet14 tornou-se uma importante ferramenta de incentivo a projetos culturais no país. “O SNC é
um sistema de articulação, gestão, informação e promoção de políticas de cultura, pactuado entre os
entes federados, com participação da sociedade civil”. (idem, 2014)
A falta de dados efetivos sobre a situação da cultura e a falta de organização dos municípios sobre
as politicas públicas referentes à cultura no país, fez com que, em 2005, fosse criado o Plano Nacional
de Cultura (PNC) buscando a integração dos entes federados e a sociedade civil a fim de garantir “o
14 “Lei Federal de Incentivo à Cultura - Lei Rouanet. Esta é conhecida principalmente por seus mecanismos de
incentivos fiscais, possibilitando a pessoas físicas e jurídicas aplicarem parte do Imposto de Renda devido em ações
culturais. Assim, esses apoiadores além de ter benefícios fiscais sobre o valor do incentivo, podem fortalecer iniciativas
culturais que não se enquadram em programas do Ministério da Cultura (MinC).”
115
desenvolvimento humano, social e econômico com pleno exercício dos direitos culturais”. (BRASIL,
2012 apud PDDI/RMVA)
Conforme a análise realizada pelo Eixo de Desenvolvimento Social do PDDI/RMVA sobre a
organização dos municípios em relação à cultura é possível perceber a imaturidade da questão
cultural na região. Ipatinga é o município mais organizado em relação as suas politicas de incentivo a
cultura, “sendo o único a possuir Lei Municipal de Incentivo à Cultura – Lei Nº 1.414/95, de 19 de
outubro de 1995, que dispõe sobre incentivo fiscal para a realização de projetos culturais no âmbito
do município e dá outras providências.” (DIAGNÓSTICO Desenvolvimento Social PDDI/RMVA, 2014)
Em 2013 o município aderiu ao “Sistema Nacional de Cultura (SNC) por meio de acordo de
cooperação Federativa entre Ministério da Cultura e a Prefeitura Municipal, firmado no dia 06 de
setembro de 2013” (PDDI/RMVA, pág. 116). Como resultado desse processo, são realizadas
discussões participativas, incluindo as pessoas relacionadas às atividades culturais no município, para
a criação do Sistema e da Política Municipal de Cultura. Neste ano de 2014, a prefeitura de Ipatinga
contratou uma “empresa para realizar o mapeamento cultural da cidade, o que segundo os gestores
locais se constitui requisito fundamental para criação do Plano Municipal de Cultura.” (idem, 2014)
116
Embora Timóteo, Coronel Fabriciano e Santana do Paraíso não possuam Lei de Incentivo à Cultura,
a existência de Conferências Municipais de Cultura15 nesses municípios já representam um indicador
de que a adesão ao Sistema Nacional de Cultura possa ser efetivada de forma gradual. A falta de
organização dos municípios reflete-se diretamente na falta de reconhecimento dos agentes culturais
do município, tal como fragiliza o reconhecimento e acesso da população aos seus bens culturais.
7.1 | O CONSUMO DE BENS CULTURAIS NO BRASIL
Com base na pesquisa realizada pela Diretoria de Estudos Sociais (Disoc), do Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada (Ipea), em parceria com a Unesco e o Ministério da Cultura (MinC) sobre “O
Consumo Cultural das Famílias Brasileiras” pretende-se analisar quais são os aspectos a serem
considerados sobre o consumo de bens culturais no Brasil, apontando quais são os mais influentes na
cultura das famílias brasileiras, o que reflete diretamente em diretrizes a serem consideradas para
elaboração de um programa de seja de fato inclusivo.
O ato de consumir algo diz respeito à identificação com um determinado grupo social, tornando
passível a diferenciação entre esses grupos diferentes. Portanto, quando uma pessoa consome algo
ela esta se afirmando perante a sociedade, como forma de comunicar sobre suas preferências e
aspirações. Portanto, o consumo de bens culturais acontecesse de forma semelhante dentro de
15 A Conferência Municipal de Cultura é um dos cinco elementos básicos que compõem o Sistema Nacional de Cultura,
sendo estes: órgão executivo; Conselho; Fundo; Plano; e a já citada, Conferência Municipal.
117
determinados grupos sociais, sendo possível a diferenciação de características, tal como nível de
escolaridade e faixa de renda.
“Os bens culturais são aqueles que se relacionam com necessidades materiais e culturais, úteis
para proporcionar informações, entretenimento e posicionar social e estruturalmente as pessoas
umas em relação às outras. [...] Também se relacionam com a cidadania ao expressarem o direito de
acesso e qualificação de informações úteis.” (SILVA; ARAÚJO; SOUZA, 2007)
Sobre o mercado das trocas simbólicas, no qual a cultura tem papel fundamental, Bourdieu aponta
esclarecimentos sobre o ato do consumo como sendo reflexo não apenas das condições econômicas,
mas do habitus que essas condições criam:
“A noção de habitus, que Bourdieu entende como o processo de socialização
incorporado pelo indivíduo na forma de sua linguagem, seus hábitos cotidianos e modos
de agir, seu estilo de vida e seu gosto. Bourdieu evidencia que “a classe social não é
definida somente por uma posição nas relações de produção, mas pelo habitus de classe
que, ‘normalmente’, está associado a essa posição””. (BOURDIEU, 2001 apud KAPP;
NOGUEIRA; BALTAZAR, 2007)
Quando analisamos a influência do valor simbólico entre as classes da sociedade como forma de
afirmação das relações de poder, podemos resgatar o caráter excludente da cultura erudita em
relação às camadas menos favorecidas da sociedade.
Talvez por essa trajetória histórica de caráter elitista o consumo de bens culturais ainda seja frágil
no Brasil, sendo possível perceber os problemas quanto à distribuição de equipamentos culturais no
118
território, como exemplo, o caso dos teatros que por muito tempo estiveram limitados às cidades
mais importantes economicamente e em pontos que favoreciam a exclusão dos que não pertenciam
aos grupos sociais elitizados.
Sabendo da exclusão social cunhada ao longo da história no Brasil, o governo lançou um
programa para incentivar o consumo de bens culturais para família com baixa renda, o Programa
Vale-Cultura. “O cartão magnético pré-pago, válido em todo território nacional, no valor de R$50,00
(cinquenta reais) mensais, vai possibilitar maior acesso do publico ao teatro, cinema, museus,
espetáculos, shows, circo ou mesmo na compra de CDs, DVDs, livros, revistas e jornais. O Vale
também poderá ser usado para pagar a mensalidade de cursos de artes, audiovisual, dança, circo,
fotografia, música, literatura ou teatro.” (BRASIL, 2014)
Entretanto, conforme é apontada no Diagnóstico do Desenvolvimento Social do PDDI/RMVA, a
questão da utilização efetiva de espaços culturais vai muito além de apenas construir e estimular o
uso a esses espaços a que antes esse público era excluído. É preciso levar em consideração as
diferenças do público em função de sua localização, bagagem cultural, condição de classe, conforme
é abordado por Botelho, 2006:
“A questão se torna mais complexa ainda quando se compreende que não basta mais
construir centros de cultura ou incentivar o acesso e a frequência a museus ou teatros,
como mecanismo para se alcançar uma resposta positiva da população antes excluída
desses bens. A experiência mostrou a necessidade de se promover, em lugar disso, uma
mudança fundamental de paradigma, pois não há público no singular e um padrão de
119
resposta a qualquer mudança que se promova na oferta.” (BOTELHO, 2006 apud
PDDI/RMVA, pág. 167)
Por volta dos anos 70, diante das dificuldades do acesso democrático aos equipamentos culturais a
difusão dos meios de comunicação através do consumo em massa de aparelhos de telecomunicação
e as próprias transformações que as manifestações artísticas passaram nesse período, permitiram o
acesso a conteúdos de forma homogeneizadora no território brasileiro, conforme é abordado por
REQUENA, 2004:
“Com o gigantesco crescimento dos meios de comunicação em massa, durante o século
XX, foram crescendo também as dificuldades em se distinguir cultura erudita, popular e
massiva. A partir dos anos 80, novas formas de consumo cultural surgem a partir das
novas tecnologias disponíveis, como as fotocopiadoras, videocassetes, gravadores de
áudio, etc, possibilitando aos novos usuários destas mídias o início de uma interação e de
uma forma mais personalizada de absorver a informação.” (REQUENA, 2004)
A possibilidade de consumir equipamentos que possibilitam o contato com informações diversas
de forma quase instantânea só veio reforçar o caráter de individualismo da sociedade, tornando o
espaço do lar em uma ‘bolha’, resultando numa desvinculação com o espaço público.
Essas transformações socioeconômicas permitem explicar o fato de que 82% dos gastos com
cultura se referem às práticas realizadas dentro do domicílio, ou seja, com televisão, vídeo, música e
leitura, enquanto apenas 17,8% correspondem ao consumo de bens culturais fora dos domicílios,
incluindo teatro, cinema, shows, zoológicos, etc.
120
Somando a essa capacidade do espaço residencial prover as necessidades de consumo cultural
alguns problemas urbanos como a insegurança em relação ao espaço público, a má distribuição dos
equipamentos culturais no território e, consequentemente, os problemas de mobilidade, podem
explicar os resultados da pesquisa.
A análise dos índices apresentados permite confirmar a função dos canais de TV como elemento
de presença unânime nos lares brasileiros. Quando analisado o consumo dos itens culturais de forma
estratificada o audiovisual representa 41,2%16 sendo que a televisão representa 13,7% enquanto o
cinema apenas 3,8%.
16
121
Assim como em grande parte do país, no Vale do Aço os cinemas viram seu declínio na
oportunidade das pessoas terem seu entretenimento dentro de suas residências. Por exemplo: o Cine
Marabá em Timóteo, o Cine Marrocos em Coronel Fabriciano e o Cine Ipanema em Ipatinga, nos anos
80 e 90 foram levados a fecharem as portas pela diminuição do público, sendo que agora apenas a
cidade de Ipatinga possui salas de cinema dentro do espaço do Shopping do Vale.
O
período de difusão da televisão no Brasil coincide com o período intenso de urbanização do país,
portanto, de aparente perda de controle do espaço público pelo Estado. Diante de uma urbanização
TABELA 2 – CONSUMO DE BENS CULTURAIS NO BRASIL,2001.
122
em ritmo acelerado, e na maior parte das cidades, caótica, a televisão se tornou elemento capaz de
permear as conversas cotidianas e influenciar as necessidades de consumo em todo país, e mais do
que isso, foi responsável por criar uma Identidade Nacional.
A televisão durante o período da Ditadura Militar (1964/1985), sobretudo, os telejornais e
telenovelas, tornou possível forjar uma identidade nacionalista capaz de “garantir a integração
nacional e fazer prevalecer a doutrina de segurança e o modelo de desenvolvimento estabelecidos
pela ditadura, [a televisão] conseguiu uma hegemonia incontestável nas décadas de 1970 e 1980 do
século passado.” (MUSSE, 2013)
A democratização dos canais de TV aberta permite que os lares em todo o Brasil tenham acesso ao
mesmo conteúdo diariamente, criando esse caráter homogeneizador do território. No entanto,
retrata-se, principalmente, a vida e costumes dos locais onde estão instaladas essas emissoras (Rio de
Janeiro e São Paulo), com exceção apenas dos jornais locais, o que representa um problema para um
país de extrema diversidade cultural que essas emissoras são incapazes de representar.
“Mais interessante é que essa universalização se dá, ironicamente, em relação a
conteúdos de gosto e informação em geral duvidosos, e a narrativas limitadas e sem
profundidade analítica. A mídia mais “democrática” apresenta então a menor
diversificação de estilos e conteúdos e essas são acessíveis àqueles de menor renda,
enquanto as classes A/B e parte da C podem diversificar suas fontes de informações”.
(SILVA; ARAÚJO; SOUZA; 2007)
Se a televisão já transformou a lógica nacional de vivenciar o espaço das cidades, o que dizer
sobre a vasta difusão da internet e de aparelhos como smartphones? Progressivamente esses
123
equipamentos tecnológicos tornam-se extensões do corpo, e permeiam as relações humanas por
relações entre homem e máquina. Gradualmente a percepção do corpo no espaço fica cada vez mais
diminuta enquanto as pessoas se localizam grande parte do tempo nos “espaços virtuais”.
Uma prova sobre a desvinculação do lugar para o consumo de bens culturais é o “Google Art
Project”. “O Google quer levar o mundo das grandes galerias mundiais de arte aos lares, com um
novo site que oferece visitas virtuais usando a tecnologia do serviço Street View aliada à capacidade
de construir coleções privadas e imagem de altíssima resolução.” (FOLHA DE S. PAULO,2011)
É notável a existência de duas variáveis a serem consideradas sobre a produção de espaços
culturais no Brasil: o primeiro é o aspecto histórico traçado pelo passado, onde o acesso aos espaços
culturais era uma exclusividade da elite; e o segundo diz respeito às transformações na forma como a
Era da Informação tem transformado as relações entre corpo e espaço. Portanto, é preciso que esses
espaços levem em consideração transformações tecnológicas incorporando-as - ou subvertendo-as -
a fim de valorizando as experiências do corpo no espaço através desses recursos, tornando-os mais
dinâmicos e convidativos à apropriação do público.
7.2. | EDUCAÇÃO COMO ELEMENTO TRANSFORMADOR
Outro fator importante levantado pela pesquisa realizada pela Diretoria de Estudos Sociais (Disoc),
do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), em parceria com a Unesco e o Ministério da
Cultura (MinC) sobre “O Consumo Cultural das Famílias Brasileiras” é a influência da educação na
diversificação do consumo dos bens culturais.
124
“ a educação é a área que mais se articula com todas as demais, estando diretamente
relacionada à geração de trabalho e renda, à superação de situações de pobreza e
vulnerabilidade, à redução da criminalidade, além de possibilitar ao sujeito o acesso
efetivo e democrático aos serviços básicos, como parte constituinte de sua vida cidadã”.
(PDDI/RMA DIAGNÓSTICO EIXO DE DESENVOLVIMENTO SOCIAL, 2014)
Analisa-se que determinadas obras exigem do expectador um nível de entendimento sobre
diálogos e temas, é possível verificar diferenças entre as preferências do público com mais anos de
escolarização.
“A política educacional liga a experiência cotidiana com tecnologias específicas e formais,
que facultam às pessoas o acesso ao patrimônio simbólico das sociedades. Portanto,
trata-se de uma política capaz de dotar as pessoas dos recursos que permitem a
apropriação sistemática e universal dos recursos culturais.” (CADERNO TERRITÓRIOS
EDUCATIVOS PARA EDUCAÇÃO INTEGRAL.)
Sabendo disso, é comum que a maior parte dos espaços de fins culturais desenvolva parcerias
junto às instituições de ensino. Essa prática de aliar o ensino aos museus, muito comum às
instituições culturais na contemporaneidade, começou a ser desenvolvida pelo Museu de Arte de São
Paulo (MASP) - que será objeto de estudo a seguir – reflexo das percepções desses espaços culturais
limitados ao uso das elites, o que por meio do ensino permitiu a participação de públicos diversos.
Diante dessa influência da educação na valorização da cultura vale ressaltar o potencial da política
de Educação Integral, o Programa Mais Educação, como forma de expandir as práticas de ensino para
125
o espaço da cidade. No Vale do Aço, segundo o cadastro do MEC, 32 escolas fazem parte do
programa atendendo a 6.782 alunos17. Um dos problemas sobre a educação em tempo integral é a
adequação do espaço físico das escolas ao número maior de alunos durante todo o período escolar
(não mais dividido entre matutino e vespertino).
“O espaço físico da escola não é determinante para a oferta de Educação Integral. O
reconhecimento de que a escola não tem espaço físico para acolher as crianças,
adolescentes e jovens nas atividades de Educação Integral não pode desmobilizar. O
mapeamento de espaços, tempos e oportunidades é tarefa que deve ser feita com as
famílias, os vizinhos, enfim, com toda a comunidade.” 18
(idem)
Sabendo dessa dificuldade territorial aliado a implantação de um novo modelo de ensino que
preza pelo vínculo educativo entre alunos e sociedade foi lançada uma série de cadernos
pedagógicos que servem de orientação para as escolas que participam do programa, cabendo
destacar aqui o “Caderno 12: Territórios Educativos para Educação Integral” que em resposta a
dificuldade que a falta de espaço passou a representar para o funcionamento do programa, trata dos
“espaços do ‘Mais Educação’ como: o lugar-escola e o lugar-cidade”.
Ao estimular a apropriação desses espaços da cidade como locais de aprendizado e formação
social desses alunos, estimula-se o desenvolvimento de novas formas de conhecimento que
17 Retirado da Tabela de Cadastro de escolas e secretarias do MEC. Disponível em:
<http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=16728&Itemid=1120>. Acesso em 20 de Outubro 2014.
18 Bairro-Escola passo-a-passo. Item 8, p.18. Disponível em:
<http://portal.mec.gov.br/dmdocuments/passoapasso_maiseducacao.pdf>. Acesso em 10/08/2010.
126
extrapolam o limite das escolas e vinculam-se diretamente ao contexto regional. Entretanto, é preciso
apontar que mesmo os espaços urbanos apontados como potenciais ao desenvolvimento dessas
atividades apresentam limitações - que no caso específico do Vale do Aço serão apontadas a seguir.
Essa mudança no processo de formação dessas crianças reflete diretamente num processo de
apropriação do espaço público19 e, consequentemente, fortalecimento da cultura local e do
sentimento de pertencimento capaz de transformar o exercício de cidadania.
“As dinâmicas promovidas pelo Programa Mais Educação no chão da escola, vêm
alterando percursos e possibilitando práticas conectivas culturais-educativas entre os
sujeitos, suas ações e os territórios onde elas se dão (escola e cidade), criando percursos
que intensificam a produção de sentidos (de apropriação, de pertencimento, de
identidade, de participação) e de registros simbólicos pouco comuns no ambiente
escolar.” (ibidem)
Percebe-se que as transformações no ensino através do resgate das relações das crianças com a
cidade são um importante meio de subverter as dificuldades tanto de acesso à cultura quanto
possibilitam o fortalecimento de leituras subjetivas capazes de desencadear transformações no
espaço urbano.
19 Além dos espaços pedagógicos formais (escolas, creches, faculdades, universidades, institutos) é proposta a articulação com os
espaços pedagógicos informais (teatros, praças, museus, bibliotecas, meios de comunicação, repartições públicas, igrejas, além do
trânsito, do ônibus, da rua). (PAG 45 DO CADERNO).
127
7.2.1 | OBRA ANÁLOGA: CENTRO EDUCACIONAL BURLE MARX
“Inhotim é um lugar em formação, onde arte contemporânea e natureza se relacionam de forma
especial. O Centro de Arte Contemporânea é uma instituição comprometida com a educação e o
desenvolvimento cultural da comunidade. Situado no município de Brumadinho, Minas Gerais,
Inhotim ocupa uma área de 35 hectares de jardins – parte deles criada pelo paisagista Roberto Burle
Marx– e abriga extensa coleção botânica de espécies tropicais, bem como um [expressivo] acervo
artístico.” (ARCHIDAILY, 2012)
Recentemente classificado como o segundo melhor museu da América Latina, em termos de
análise preponderante para esta pesquisa serão ressaltados os trabalhos sociais desenvolvidos pelo
INHOTIM com a comunidade. Dessa forma, destaca-se o potencial de transformação dos lugares
onde esses equipamentos culturais são implantados:
“Desde a valorização de manifestações culturais populares, ao incremento de negócios
das redes gastronômica e hoteleira, passando pela mobilização social e pesquisas de
resgate histórico, o Inhotim se afirma como um ator relevante nas relações da cidade.
Segundo empregador do município, o Inhotim tem sido fundamental na formação
profissional dos jovens de Brumadinho que têm no Instituto o seu primeiro emprego e a
abertura de incontáveis e inovadoras perspectivas de futuro.”20(INHOTIM)
20 http://www.inhotim.org.br/inhotim/desenvolvimento-humano/comunidade/#nosso-inhotim
128
Em consonância com o papel desempenhado pelo instituto, são desenvolvidos projetos que
estimulam a formação de jovens e adolescentes através do ensino de arte e educação ambiental. O
programa “Escola Integrada” em parcerias com as escolas do município e de Belo Horizonte busca
integrar o ensino as atividades multidisciplinares que acontecem nos jardins e galerias do Inhotim.
Os programas “Escola de Cordas”, “Coros Inhotim” e "Brumadinho pelos Caminhos da Educação
Musical" representam iniciativas para transformar, através da música, a vida das crianças de
Brumadinho e de outras cidades próximas; o ‘Laboratório Inhotim’ busca através do ensino das artes
para alunos das escolas municipais de Brumadinho, incentivar a formação de um olhar “que extrapola
sua condição de espectador e passa a participar efetivamente deste universo”. Em conjunto com a
arte, busca-se o fortalecimento do potencial ambiental que o espaço representa através do programa
‘Jovens Agentes Ambientais’ que “prevê o conhecimento do acervo do Jardim Botânico Inhotim, além
de atividades relacionadas à conservação da biodiversidade”.
Além do ensino para crianças e adolescentes, outros projetos são desenvolvidos com objetivo de
fortalecer o mutualismo entre instituto e cidade. O programa ‘Nosso Inhotim’ oferece para os
moradores da cidade a mais de três anos a meia-entrada, uma iniciativa que serve como “estímulo
para que o cidadão frequente o parque e se aproprie do lugar”; a ‘Rede de Artesãos’ busca incentivar
129
o fortalecimento de grupos de artesãos locais, em parceria com o SEBRAE, incentivando o
aprimoramento de produtos manuais e alimentícios; e a ‘Rede de Empresários’ busca o
fortalecimento das empresas que tenham suas atividades voltadas ao turismo, oferecendo
“capacitação de pessoal de hotelaria e gastronomia para a oferta de serviços de qualidade”.
Do ponto de vista arquitetônico, são diversos os pavilhões e instalações premiadas que podem ser
encontradas no Inhotim. Em função dessa multiplicidade, pretende-se aqui destacar aquele que
reforça o potencial educacional das instituições culturais, o Centro Educativo Burle Marx.
“Essencialmente um espaço de trabalho e conhecimento, o Centro de Educação e Cultura Burle
Marx é a sede dos programas educativos do Instituto, que atuam nos eixos Arte e Educação e
Educação Ambiental. Com 1.704 m², o edifício contempla uma biblioteca e ateliês para a realização
de workshops, além do Teatro Inhotim, com capacidade para 214 pessoas e o Café do Teatro”.
(INHOTIM)
O projeto desenvolvido pelo escritório mineiro Arquitetos Associados, de Paula Zasnicoff e
Alexandre Brasil, buscou através da implantação sutil estabelecer um mutualismo entre arquitetura e
paisagismo.
130
“O exíguo espaço disponível e a
vontade de mimetizar o edifício na
paisagem sugeriram a conformação
de um extenso pavilhão horizontal,
em apenas um pavimento, sobre o
lago, levemente rebaixado em
relação ao entorno. Sua cobertura
atua como ponte unindo diferentes
partes do museu além de conformar
ampla praça elevada com espelho
d’água ajardinado, destinada ao
encontro e a contemplação,
promovendo forte integração entre
arquitetura e paisagismo”.
(ARQUITETOS ASSOCIADOS)
131
A premissa de valorizar as relações entre o espaço construído e a paisagem, além de soluções de
conforto térmico, permitiu que os espaços de circulação se tornassem espaços de convívio e, ao
mesmo tempo, permitissem a integração entre interior e exterior, subvertendo a lógica comum às
galerias. “É um programa diferente do de uma galeria de arte, onde ou você está dentro ou está
fora", compara Zasnicoff.
132
133
CAPÍTULO 8 | TRANSFORMAÇÕES NOS ESPAÇOS CULTURAIS
Quando pensamos no conceito de cultura como sendo algo mutável resultante do constante
processo de evolução do homem e a arquitetura como produto cultural, um gênero mais específico
da arquitetura é responsável por abrigar outras formas de manifestação cultural: o edifício cultural.
“Os museus são tão antigos quanto a própria história da humanidade. Pode-se considerar que eles
existem desde que o ser humano começou a colecionar e guardar, para si ou seus deuses, objetos de
valor em salas construídas especialmente para esse fim. [...] Entretanto, são as coleções reais ou
privadas, como a reunida no palácio dos Médici, formadas a partir da Renascença, que vão constituir
o núcleo inicial dos museus nacionais no século XVIII.”(KIEFER, 2000)
As primeiras coleções particulares de monarcas destinavam-se a guardar objetos de arte,
relacionado diretamente com o caráter ostentador da nobreza, tanto pela adornação dos espaços
quanto pelo consumo de belas artes. A burguesia a fim de mostrar o seu poder começou a investir na
criação de espaços destinados exclusivamente às exposições de arte, passando esses espaços a serem
denominados de galeries (galerias). A partir do século XVIII começou a surgir um efervescente desejo
de criação desses espaços como forma de se afirmar poder socialmente, sendo que pelo motivo a
que eram criados resultavam em uma tipologia excludente.
“Os primeiros museus tomaram a tipologia dos palácios como sua primeira forma de expressão
arquitetônica, antigas sedes de monarquias se transformaram em espaço de coleção e exposição de
arte e cultura”. (TAVARES; COSTA, 2013). O período do surgimento desses primeiros edifícios
134
coincidiu com o período do neoclassicismo, que resgatava a essência do estilo grego. A partir do
século XIX começaram a surgir teorias que influenciaram a produção e organização dos museus,
sendo aqui destacadas as teorias que nortearam a criação desses espaços durante o período do
neoclassicismo, desenvolvidas por: Durand, Klenze e Schinkel.
De acordo com Durand (1819) esses espaços de exposição cultural deveriam transmitir uma
sensação de segurança – o que estava diretamente ligado à concepção simétrica dos espaços – e
previa uma variação da escala e programa conforme a cidade que abrigaria essa edificação. Além do
espaço de exposição era previsto a criação de gabinetes destinados aos artistas.
Klenze (1830) “propôs a eliminação de todo o espaço secundário, organizando os espaços de
forma interligada entre si, privilegiando a luz zenital para iluminar as rotundas, e as galerias através
do pátio interno, essas não sendo abertas para o exterior, que apenas detém falsas janelas que
compõem a fachada” (TAVARES; COSTA, 2013) o que reforça um aspecto excludente desses museus.
Já na concepção de Schinkel o caráter excludente da arte se confirma pela estratégia de
diferenciação entre o que se percebe no interior e exterior dos edifícios. Havia um espaço único de
exposição, e o aspecto primordial de sua produção foi à criação de um circuito sequencial de
visitação, conforme é citado por TAVARES; COSTA, 2013:
135
“No Altes Museum de Berlim, projeto de Karl Friedrich Schinkel, que diferentemente de
Klenze, optou por um único espaço central, uma rotunda, no eixo geométrico do edifício,
o colocando como o clímax da composição. Esse espaço, de pé-direito triplo, não tem sua
existência revelada na perspectiva exterior da edificação, que o disfarça com muros
dispostos em forma quadrada” (TAVARES; COSTA, 2013).
Embora houvesse uma efervescência crítica a esses monumentos culturais, o período de Guerras
adiou essa discussão até ao período de produção modernista. O projeto do Musée de la
Connaissance ou “Museu Sem Fim” de Le Corbusier em Saint Die, Paris, 1939, “assume um caráter
revolucionário, disposto em uma forma espiral quadrada, que oferece um possível crescimento
indefinido.” (TAVARES; COSTA, 2013). Apesar de sua concepção da forma arquitetônica estritamente
modernista, fica evidente a influência dos circuitos e da iluminação zenital enfocando o espaço ápice
da edificação.
136
Em 1959, esses mesmos conceitos abordados por Le Corbusier tornam-se a própria descrição da
arquitetura de Frank Lloyd Wright para o Museu de Guggenheim de Nova York, onde os circuitos e a
iluminação zenital tornaram-se a própria obra.
“Wright manteve sempre firme a ideia de que ‘um museu deve ser extenso, contínuo e
bem proporcionado, desde o nível inferior até o superior; que uma cadeira de rodas
possa percorrê-lo, subir, baixar e atravessá-lo em todas as direções. Sem interrupção
alguma e com suas seções gloriosamente iluminadas internamente desde cima, de
maneira apropriada a cada grupo de pinturas ou a cada quadro individual, segundo se
queira classificá-los.’”. (PFEIFFER, 1995 apud KIEFER,2000)
137
O período de possibilidades do concreto armado possibilita novas criações inclusive sobre novas
preocupações quanto ao projeto arquitetônico de museus. A Fundação Maeght, idealizada por Josep
Luis Sert e construído entre 1959 e 1964, mostrava novas possibilidades capazes de potencializar a
iluminação e ventilação dos museus.
138
No Brasil, duas produções expressivas da
produção de museus dizem respeito ao Museu
de Arte Moderna do Rio de Janeiro, em 1954, por
Affonso Eduardo Reidy, e, ao MASP, por Lina Bo
Bardi, em 1957. A criação de grandes vãos livres
possibilitou a liberdade e fluidez nesses lugares,
dando uma contribuição significativa à produção
de tipologias do gênero cultural pelo mundo. É
preciso ressaltar que os grandes vãos e a
utilização do vidro favoreceram a permeabilidade
entre o espaço cultural e seu entorno.
Portanto, o período moderno traz como
importante contribuição à fluidez e transparência
desses edifícios culturais e simplificação dos
espaços internos, resultante da possibilidade de
grandes vãos pelo uso do concreto armado.
Já a produção desses espaços no período pós-
moderno foi incentivada quando o consumo de
arte tornou-se mais difuso, tanto pelas
FIGURA 3 | MASP,
LINA BO BARDI
FIGURA 2 | MAM RJ,
REIDY.
139
transformações nas expressões artísticas
quanto pela difusão de novos meios de se
consumir cultura, induzindo a transformação
dos espaços culturais para que fossem
capazes de absorver a demanda desse novo
público, diversificando as possibilidades de
uso, integrando cafés, praças, jardins,
restaurantes, etc, o que deu origem ao
chamado Centro Cultural.
Em consonância com a efemeridade da
arte pós-moderna e da efervescência cultural
próprias das transformações sociais vigentes
no período, esses espaços passaram a
modificar a forma de expor arte, incluindo exposições temporárias, performáticas e festivais. Esses
espaços passaram a incorporar programas muito mais complexos e a formação sobre museografia
influenciaram diretamente na produção arquitetônica desses espaços, e vale ressaltar a produção
desses novos centros culturais em extensões do espaço público.
Um dos principais ícones do edifício cultural no período pós-moderno é o Centro Cultural Georges
Pompidou, projetado por Richard Rogers e Renzo Piano, em 1977, que “tornou-se um marco pós-
FIGURA 4 | CENTRE POMPIDOU,
RICHARD ROGERS E RENZO PIANO
140
moderno por sua arquitetura, pluralismo funcional não só contendo áreas de exposição, e
proporcionando um grande espaço de domínio público, mas também por gerar um pólo de
convivência, o que veio a ser uma característica marcante nessa nova tipologia”. (TAVARES; COSTA,
2013).
Um exemplo claro das transformações que os museus passaram durante o período pós-moderno
dizem respeito à reforma feita no Louvre, em 1988. O Museu do Louvre passou por intervenções que
tinham como “principal objetivo a renovação do espaço do Museu, tornando-o mais dinâmico e
acessível aos visitantes, abrindo também espaços novos para exposição. Além disso, outro objetivo
mais ousado seria reintroduzir o Louvre às atividades e ao cotidiano pulsante da cidade de Paris” (21).
O Louvre sendo um dos principais representantes da tipologia museu-palácio do século XVIII, através
do projeto do arquiteto Ieoh Ming Pei, permitiu um relacionamento mais direto do espaço do museu
com o espaço urbano.
"Formalmente, é o mais compatível com a arquitetura do Louvre (...) [a pirâmide] é
também uma das formas estruturalmente mais estáveis, garantindo sua transparência,
uma vez que é construída de vidro e aço, significando uma ruptura com tradições
arquitetônicas do passado. É um trabalho do nosso tempo." (PEI, I.M in ARCHIDAILY)
21 http://www.unicamp.br/chaa/PDFTrabs/MI-LouvrePei.pdf
141
Dentro de uma abordagem mais contemporânea, são diversas questões que envolvem a produção
dessa tipologia. Sobre um desses aspectos referem-se às construções de espaços culturais com o
intuito de produzir arquitetura como intervenções artísticas capazes de despertar processos de
renovação urbana - já abordado em capítulos anteriores. Como é o caso do Museu Guggenheim de
142
Bilbao de Frank Gerry, que se tornou uma imagem-síntese do desenvolvimento da cidade e,
consequentemente, o expoente de um novo modelo de desenvolvimento urbano. A preocupação é
que a produção formalista atenha-se apenas a criação de imagens de impacto para a imagem das
cidades desconsiderando a função social que foram sendo atribuídos a esses espaços.
Outro aspecto pertinente aos museus e espaços culturais refere-se as transformações sociais
próprias da Era da Tecnologia. As pessoas priorizam a absorção informações de forma instantânea,
sendo que a maior parte do tempo suas relações sociais estão intermedidas por aparelhos
tecnológicos. Recentemente um serviço específico do Google desperta a curiosidade sobre o futuro
dos espaços culturais na contemporaneidade: o Google Art Project. “O Google quer levar o mundo
143
das grandes galerias mundiais de arte aos lares, com um novo site que oferece visitas virtuais usando
a tecnologia do serviço Street View aliada à capacidade de construir coleções privadas e imagem de
altíssima resolução.” (FOLHA DE S. PAULO,2011) Isso significa que não seria mais necessário que a
pessoa visitasse um museu para ter acesso a informação, transformando-se em uma forma de
reforçar a desvinculação entre as experiências entre corpo e espaço - sabendo que não as substituem.
144
Sobre o aspecto das produções arquitetônicas na contemporaneidade podem ser observadas duas
vertentes distintas: de um lado a utilização da tecnologia como forma de dinamizar a experiência dos
visitantes, podendo ser citado o Museu das Telecomunicações, em Belo Horizonte, que busca através
da tecnologia transmitir conhecimento de forma interativa; e, por outro, a arquitetura como principal
recurso para estimular novas experimentações entre corpo e espaço, como exemplo o Museu Hergé,
de Christian de Portzamparc, que busca através da arquitetura produzir diversos estímulos aos
visitantes, impossíveis de serem sentidos sem que haja a inserção do corpo no espaço.
No ano de 2013, foi realizado no Rio de Janeiro a 2conferência do Conselho Internacional de
Museus, ICOM, que tinha como tema “Museus (história + criatividade) = mudança social”. Nesta
buscava-se discutir sobre o futuro dos museus, apostando que a criatividade dos espaços é mais
eficiente que a tecnologia, frisando que para que um museu seja de fato utilizado ele deve ser o
reflexo da sociedade à qual ele serve. “Já imaginar que a tecnologia, por si só, é fator de atração inclui
sério risco, pois, se ela é uma mediação, pode também converter-se em objetivo. Ela deve servir aos
propósitos e compromissos do museu e não, como pode acontecer, servir-se dele — avalia o
professor da USP22”.(OGLOBO, 2013.)
22 Ulpiano Bezerra de Meneses, professor emérito da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo.
Disponível em: <http://oglobo.globo.com/cultura/futuro-dos-museus-esta-na-criatividade-nao-na-tecnologia-dizem-especialistas-
reunidos-no-rio-9455603#ixzz3Jp46Otms>. Acesso em 22 de Nov. 2014
145
8.1 | CONTRIBUIÇÃO DE LINA BO BARDI PARA CULTURA BRASILEIRA
Quando falamos da questão da cultura no Brasil, nenhum arquiteto soube interpretar tão bem a
identidade do povo brasileiro quanto Lina Bo Bardi. A arquiteta italiana, que chegou ao Brasil em
1946, com seu olhar estrangeiro e sensível soube reconhecer a cultura popular contribuindo de forma
imensamente significativa para a valorização da brasilidade.
Dentre suas contribuições para a arquitetura, design, arte, pretende-se destacar aqui sobre a
importância de Lina Bo Bardi para a valorização da arte popular e posteriormente analisar sua
produção arquitetônica que teve tanto êxito principalmente pelo olhar sensível que entendia as
necessidades reais do público que o utilizaria.
Quando chegou ao Brasil, Lina e seu marido viveram em São Paulo, num período onde o país havia
se tornado, recentemente, em uma República Federativa e esse cenário de novas possibilidades
despertou o seu interesse por uma criação livre, diferente do contexto vivido na Itália. Durante o
período que Lina viveu em São Paulo podemos citar importantes contribuições para a produção
artística e arquitetônica brasileira: o MASP, o Studio Palma e a Casa de Vidro.
Sobre o primeiro MASP - que será objeto de estudo posteriormente - Cosulich cita:
“Juntamente com o marido e Assis Chateaubriand fundaram o Masp da rua 7 de Abril, em
um andar do edifício dos Diários Associados, de propriedade do próprio Chateaubriand,
onde além de montar um belo acervo de quadros e constantes mostras, coordenaram
cursos de arte e música para adultos e crianças. A visitação era bastante intensa e os
146
eventos, que frequentemente eram transmitidos pela TV Tupi, atraíam um grande
público.” (COSULICH)
Ainda durante o período que esteve em São Paulo, Lina Bo Bardi em sociedade com o arquiteto
italiano Giancarlo Palanti fundaram o “Studio d´Arte Palma”. Segundo Aline Coelho, em palestra para
o Museu da Casa Brasileira, O Studio Palma iniciou suas atividades em 1948 e perdurou até meados
de 1951, dedicando-se ao desenho industrial com departamento de projeto e criação dos
mobiliários23, “realizando uma série de móveis e projetos de interiores”.
Os mobiliários do Studio Palma ao invés de basearem-se em
referências colônias - como era de praxe - traziam inspirações das
referências sertanejas, indígenas, africanas e com isso o uso de
materiais como o “couro, do sisal, fibras e tecidos naturais” e,
principalmente, dedicaram-se a valorização das madeiras nacionais. “Ao
lado do desejo de atualização e renovação da produção de móveis,
segundo os preceitos do movimento moderno internacional, os
arquitetos buscavam, a seu modo, assegurar uma especificidade local,
expressa por meio da preocupação com o clima, com a investigação
23 “Para fabricar a mobília, projetada no Studio pelos arquitetos Lina Bo Bardi e Giancarlo Palanti, os sócios fundaram
também a Fábrica Pau-Brasil.” Disponível em: <
http://www.mcb.org.br/mcbItem.asp?sMenu=P005&sTipo=4&sItem=299&sOrdem=2> . Acesso em 05/11/2014.
147
dos materiais nacionais e com a atenção aos modos de vida e de produção de objetos do povo.”
(COELHO apud MCB)
Ainda em São Paulo, Lina ao criar sua residência
no Morumbi criava um ícone da arquitetura
brasileira. Embora sua produção revelasse caráter
modernista pelos pilotis, vão e fachada livre, ao
fazer uma análise sobre a implantação e partido
arquitetônico pode-se notar semelhanças com a
arquitetura vernácula brasileira para a Casa de
Vidro. Essa influência dos aspectos regionais não
ficou apenas em sua arquitetura, como também no
projeto de seus mobiliários.
Um período muito significativo para a produção de Lina Bo Bardi refere-se ao período que ela
passou estudando de forma antropológica as produções do nordeste brasileiro. Com base no livro
‘Pavilhão das Culturas Brasileiras: Puras Misturas’ pretende-se analisar brevemente os caminhos
percorridos até chegar ao conceito da Cultura Popular no qual Lina Bo Bardi tem grande contribuição.
Os primeiros estudos de forma efetiva sobre as manifestações populares iniciaram pelas Missões
de Pesquisas Folclóricas. “Em 1935, por sugestão de Mario de Andrade e Paulo Duarte, o prefeito [de
São Paulo] cria pela do Departamento Municipal de Cultura.” Até onde se sabe, este foi o primeiro
148
“órgão destinado a cuidar das questões culturais dentro do aparelho estatal.” Durante as Missões os
integrantes percorreram o Norte e Nordeste do Brasil buscando registrar as manifestações populares
do Brasil.
No final dos anos 50, a convite do reitor da
Universidade da Bahia, Lina vai para o nordeste
brasileiro onde aprofunda seu conhecimento
sobre a arte e artesanato locais. Durante seus
estudos, faz uma análise antropológica daquele
povo observando o caráter puro daquela cultura,
livres de influências do capitalismo como já
acontecia em São Paulo.
Durante esse período Lina Bo faz contribuições
importantes para dar visibilidade à cultura popular e subverter o caráter de arte como exclusividade
da elite. Lina escreve o livro “Tempos de Grossura: o design no impasse”; realiza a “mostra antológica,
denominada Bahia, para a 5ª Bienal Internacional de Arte e Arquitetura de São Paulo” que segundo
ela relatava “toda a violência poética de um mundo ainda intacto” (BARDI, 1994 apud BORGES;
BARRETO, 2010); assume a direção do Museu de Arte Moderna da Bahia, no Solar do Unhão,
transformando-o em Museu de Arte Popular representando uma ruptura do conceito de folclore,
conforme é apresentado por Lina:
149
“Está fora de causa o folklore, que serve aos turistas e às senhoras que acreditam na
beneficência. Folklore é uma palavra que precisa ser eliminada, é uma classificação em
‘categorias’, própria da grande cultura central, para eliminar, colocando no devido lugar,
incômodas e perigosas posições da cultura popular periférica. Quando a produção
popular se petrifica em folklore, as verdadeiras e suculentas raízes culturais de um país
secam: é sinal de que ‘interesses’ internos ou de importação tomaram o poder central, e
as possibilidades de cultura autóctone são substituídas por ‘frases feitas’, pela ‘supina
repetição’ e pela definitiva sujeição a esquemas esvaziados. [...] Procurar com atenção as
bases culturais de um país (sejam quais forem: pobres, míseras, populares) quando
reais não significa conservar as formas e os materiais, significa avaliar as
possibilidades criativas originais. Os materiais modernos e os modernos sistemas de
produção tomarão depois o lugar dos meios primitivos, conservando não as formas, mas
a estrutura profunda daquelas possibilidades”. (BARDI, 1994 apud BORGES; BARRETO,
2010)
Durante o período da ditadura todos os movimentos em prol da valorização da cultura popular são
paralisados. O Museu de Arte Moderna, no Solar do Unhão é fechado. Durante este período, os museus
estiveram ligados à valorização apenas de grandes feitos políticos, reforçando o processo de valorização das
elites do país.
Entretanto, durante a inauguração da nova sede do MASP na Avenida Paulista (signo e emblema das elites
econômicas do país) em 1969, Lina e Pietro Bardi realizam a exposição ‘A mão do Povo Brasileiro’. “Esta grande
exposição de Arte Popular não era destinada apenas ao Nordeste, mas a todo o Brasil. Montada nos moldes da
comunicação teatral coletiva, não apresentava peças de arte ‘isoladas’ mas ‘acontecimentos’: a possibilidade
criativa, quando livre, do Povo do Brasil”. (BORGES; BARRETO, 2010).
150
É perceptível que os anseios de Lina em promover o reconhecimento da Cultura Popular interferiram
diretamente nas suas produções arquitetônicas. O conhecimento dos saberes e fazeres da cultura
popular aliado ao seu desejo por uma arquitetura simples refletiu-se diretamente em estratégias para
151
tornar os espaços culturais
em espaços verdadeiramente
sociais, sendo destacados o
Solar do Unhão(BA), MASP
(SP) e o Sesc Pompeia (SP)
constituindo espaços
“pautados na convivência
humana, na ocupação criativa
e na relação com o caráter
público da cidade, [e]
ressaltam o cunho
eminentemente político do
trabalho de Lina Bo Bardi”.
(BARATTO, 2014)
152
8.1.1 | OBRA ANÁLOGA: MASP
Mais do que analisar um grande referencial arquitetônico, pretende-se aqui explorar a
preocupação de Lina Bo Bardi em produzir museus com verdadeira função social, refletindo esses
anseios na produção desses espaços.
O MASP antes de funcionar na Avenida Paulista
funcionava em um prédio da Rua Sete de Abril, também
em São Paulo. Por meio da iniciativa do empresário Assis
Chateaubriand, Pietro Bardi foi convidado para formar um
acervo significativo e inaugurar um Museu de Arte, sendo
Lina Bo a responsável pela “instalação e curadoria de uma
nova instituição artística para a disposição destas obras”.
(ORTEGA, 2008)
Diferente de outros museus que funcionavam no Brasil que estiveram ligados a relatar feitos
históricos e expressões artísticas da elite do país, o MASP surgia do anseio de criar um museu que
exercesse, realmente, uma função social. Baseados nas discussões sobre um museu que fosse capaz
de incluir os públicos mais diversos, o casal Bardi percebem no ensino das artes uma forma de incluir
novos públicos.
153
“Conforme Pietro Maria Bardi,
neste período não se ensinava
história da arte do Brasil, nem havia
publicações sobre este tema em
português, apesar do crescente
interesse sobre as artes por um
público cada vez mais amplo.”
(Museum, 1948 apud ORTEGA, 2008)
Portando, desde a sua fundação, o
MASP mais do que um espaço
expositivo tem uma preocupação
pela instrução do público.
Sabendo das discrepâncias entre a
elite e as camadas mais populares,
Lina com sua sensibilidade,
“considera o fato de que a maioria
dos brasileiros necessita de meios
para se favoreces das artes. Esta ação
permite, às classes menos favorecidas
154
culturalmente, a oportunidade de melhor acesso perante as obras. E é a partir desta perspectiva, que
Lina cria recursos espaciais para possibilitar as exposições didáticas”. (ORTEGA, 2008)
Conforme a análise realizada por Cristina Garcia Ortega (2008) sobre os mobiliários e espaços de
Lina Bo Bardi, pode-se organizar a produção dos espaços do MASP em três momentos distintos: em
1947, quando o MASP funcionou no Edifício Guilherme Guinle; em 1950, quando um novo andar do
mesmo Edifício foi incorporado ao museu; e a primeira instalação no MASP da Avenida Paulista.
Em 1947, o MASP foi inaugurado no segundo pavimento do Edifício Guilherme Guinle, na Rua Sete
de Abril, onde também funcionava a sede das revistas O Cruzeiro e dos Diários Associados, ambas
pertencentes a Chateaubriand. O Edifício projetado por Jacques Pillon teve seu projeto inicial
modificado e as paredes deram lugar a um espaço mais amplo e fluído.
155
Inicialmente, a área do espaço era de 1.000m² “espacialmente dividida em três áreas distintas, além
das obras em exposição permanente, são instaladas duas áreas para exposição didática, exposições
temporárias e auditório”. (ORTEGA, 2008) Uma das preocupações da arquiteta foram as instalações
para exposição dessas obras. Baseada na necessidade de transformação constante do acervo a
medida que chegassem novas obras, Lina criou instalações que permitissem a facilidade de troca das
obras.
Foram desenvolvidos estruturas de tubos de alumínio do chão ao teto ao longo do perímetro do
museu. Essas estruturas possuíam braços articuláveis permitindo a adaptação a obras de diferentes
tamanhos e, vale ressaltar, que ao criar essas estruturas ela tirava as obras do contato direto com o
edifício, em função da eventual umidade da edificação. Para o espaço de exposição didática, foram
utilizados suportes para a fixação de duas folhas de vidro que permitiam a exposição de duas obras
de forma simultânea potencializando o uso do espaço.
Além do mobiliário expositivo, que rompia com o que era usual, “Lina Bo Bardi procura ‘por todos
os meios, não tornar solene o Museu, usando materiais simples, cores neutras, plantas que alegram o
ambiente’.” (HABITAT,1950 apud ORTEGA,2008)
Em 1950, o museu tem sua capacidade ampliada ao incorporar mais um pavimento ao seu
programa, passando a ter aproximadamente 2.300m². Durante o período, Lina fazia parte do Studio
d’ Arte Palma, junto com Giancarlo Palanti, onde desenvolvia projetos de mobiliários influenciando na
concepção dos novos espaços e mobiliários do MASP. O espaço existente foi
156
readequado, e o programa tornou-se mais complexo incorporando novas áreas conforme é citado
por Ortega,2008. “Neste espaço são acrescentados o balcão de informações e a venda de
publicações [...]. Em ambientes desprovidos de paredes, restando apenas a estrutura do edifício, o 3º
andar conta com a pinacoteca, a vitrina das formas, mais uma sala para exposições temporárias, a
sala das tapeçarias e a sala das gravuras.” (idem, 2008)
157
Um dos aspectos que reforçam o caráter visionário do MASP diz respeito a Vitrina das Formas, que
pela primeira vez expunha objetos cotidianos entre as obras de arte.
“Na ‘Vitrina eram expostos objetos antigos e modernos de design tanto de caráter
artesanal como de produção industrial, sendo esta a primeira vez que um museu oferecia,
à apreciação estética, uma maquina de escrever, a Lexicon Ollvetti. Um visitante, não
entendendo a inicitativa, comentou que a máquina fora esquecida na Pinacoteca e dentro
da Vitrina.” (P.M. BARDI, 1978 apud ORTEGA, 2008)
158
O fato do MASP estar localizado no interior de um edifício longe do contato visual do público aliado
ao público crescente refletiu a necessidade de criação de uma nova sede para o museu. A escolha da
nova sede localizada na Avenida Paulista, estava diretamente relacionada com a elite cafeicultura da
cidade de São Paulo. “Principalmente entre 1940 e 1970, ocorre a decadência dos casarões e
institutos frequentados por esta elite, que acabam por demolir o próprio edifício Trianon, em 1950.”
(ibidem, 2008)
A arquiteta italiana que mais que qualquer outro arquiteto brasileiro se interessou principalmente
pelo ‘povo’ do Brasil teve a sua arquitetura influenciada e como influenciadora da valorização e
democratização da cultura popular. O MASP que desde o princípio de sua inauguração pretendia ser
um museu de arte que não estivesse vinculado aos anseios de uma elite, expressava agora os seus
conceitos em uma escala maior através da arquitetura de Lina.
O projeto da sede do MASP na Avenida Paulista, idealizado Lina explicita o seu desejo de uma
arquitetura social principalmente pelo grande vão possibilitado pela estrutura de concreto
protendido que contrastando com as edificações ao longo da avenida, tornou-se um convite à
experimentação do público. Conforme é colocado por Cristina Ortega (2008) “Lina Bo Bardi cria três
volumetrias distintas: duas edificadas e um vácuo entre estas”.
Com a ampliação do espaço do museu, seus espaços ficaram mais amplos e o seu programa mais
complexo. Com a criação da área do vão livre que possibilita uma apropriação diversa, o MASP
159
passava a representar uma nova tipologia de museus destinada ao convívio do público e permanente
diálogo com a cidade.
Mantendo um programa semelhante àquele que funcionava na Rua Sete de Abril, mas com uma
área bem mais generosa que o anterior, aproximadamente 10.000m². O bloco suspenso é composto
pela “pinacoteca, com seus escritórios, salas de exposições temporárias, salas de exposições
particulares, e arquivos fotográficos, filmográficos e videográficos” (ARCHDAILY, 2012) e no bloco
160
inferior, com acesso para a Avenida 9 de Julho, encontram-se o hall para exibições temporárias,
auditório, espaço destinado ao depósito para acervo e salas de administração.
É importante ressaltar que novamente a preocupação com o interior de suas obras promoveu uma
ruptura com o que era convencional. Lina ao desenvolver sua maneira própria de expor desfazia o
caráter impositivo da lógica dos museus nacionais, permitindo que os visitantes circulassem
livremente pelos espaços.
161
Mesmo com o caráter modernista, as formas simples do museu foram o reflexo da “experiência de
simplificação” durante o período que ela passou observando o nordeste brasileiro, conforme cita:
Uma premissa. Na projetação do Museu de Arte de São Paulo, na Avenida Paulista,
procurei uma arquitetura simples, uma arquitetura que pudesse comunicar de imediato
aquilo que, no passado, se chamou de “monumental”, isto é, no sentido do “coletivo”, da
“Dignidade Cívica”. Aproveitei ao máximo a experiência de cinco anos vividos no
Nordeste, a lição da experiência popular, não como romantismo folclórico, mas
como experiência de simplificação. Através de uma arquitetura popular cheguei àquilo
que se poderia chamar de Arquitetura Pobre. Insisto, não do ponto de vista ético. Acho
que no Museu de Arte de São Paulo eliminei o esnobismo cultural tão querido pelos
intelectuais (e os arquitetos de hoje), optando pelas soluções diretas, despidas. (BARDI
apud FERRAZ, 1993 apud ORTEGA, 2008)
Para fins de análise nesta pesquisa, apesar do caráter estrutural espetacular propiciado pelo
grande vão livre, o que será aqui reconhecido como a maior contribuição de Lina Bo Bardi é a
preocupação social da arquiteta refletida na concepção de suas criações, sejam nos objetos utilizados
para expor obras de arte até a poesia consolidada na sua arquitetura. Lina conseguiu propor espaços
que são referências de boa arquitetura porque bem mais do que preocupar-se com estilos e formas,
ela teve a sensibilidade para entender o ‘povo’ e produzir estratégias capazes de incluir através de
sua arquitetura.
162
8.2 | MUSEUS E ESPAÇOS CULTURAIS NO VALE DO AÇO
Conforme a pesquisa realizada in loco nos museus cadastrados no IBRAM na região do Vale do
Aço e aos centros de cultura mantidos pelas instituições privadas percebe-se que a questão da
preservação da história local tem sido uma preocupação dos municípios e das empresas.
Quando observado as transições que a tipologia dos espaços culturais vem passando, é perceptível
que os museus municipais ainda preservam a logica dos ‘museus nacionais’ muito em função da área
limitada desses espaços. Sabe-se que os museus - assim como as ações culturais - vêm sendo
incentivados pelo governo por meio de incentivos fiscais, o que faz com que instituições públicas e
privadas organizem suas políticas culturais.
Durante as visitas puderam ser notadas diferenças entre os espaços mantidos pelas empresas
siderúrgicas da região e pelos municípios, tais como área, programa de necessidades, técnicas de
preservação e exposição do acervo. As prefeituras enfrentam dificuldades para manter esses espaços
em funcionamento, sendo que houve períodos de desativação de alguns desses, e, além disso, a área
reduzida desses espaços delimita um programa enxuto com capacidade para pequenos grupos de
visitantes, com exceção do Parque da Ciência que possui maior área, grande nível de atratividade por
ser o único dessa tipologia na região e implantação favorecida pelo Parque Ipanema. Dessa forma,
esses museus seguem uma lógica distante dos ideais de centro cultural. Já os espaços das instituições
tanto do Centro Cultural Usiminas quanto a Fundação Aperam são grandes responsáveis pela
realização de constantes eventos das mais variadas formas de manifestações artísticas ao longo do
163
ano, valorizando principalmente os artistas regionais, sendo que além das áreas de exposição,
existem teatros e áreas livres.
Vale frisar que alguns dos espaços culturais funcionam em edifícios tombados a nível municipal,
preservando a memórias dos municípios através da preservação de um bem arquitetônico. Percebe-
se que apesar dos centros culturais promoverem eventos de alcance metropolitano e receberem
visitantes de vários lugares, não existe um lugar destinado a contar a história do Vale do Aço de
forma unificada.
A seguir serão apresentados os espaços tidos como referencias para as expressões culturais no
Vale do Aço. É fato que os espaços livres de uso público desempenham um papel extremamente
relevante para o Vale do Aço, podendo ser citados a Praça do Coreto, Praça da Estação, Parque
Ipanema, ou ainda aqueles que são adaptados para receber eventos como é o caso do Kartódromo e
do Campo do Jabaquara. Mas para analise desta etapa pretendeu-se avaliar os espaços construídos
observando se existia uma demanda por esses lugares, além de analisar aspectos que interfiram no
uso efetivo ou não desses espaços.
Foram relacionados: Casa da Memória e Pesquisa do Legislativo e Fundação Aperam, em Timóteo;
Museu Joseph Maria de Man e Museu Municipal José Avelino Barbosa, em Coronel Fabriciano;
Estação Memoria Zeza Souto, Parque da Ciência de Ipatinga e Centro Cultural Usiminas, em Ipatinga.
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PROJETO DO ESPAÇO JK
Durante a visita ao Museu Histórico Municipal
José Avelino Barbosa, em Coronel Fabriciano, é
possível visualizar a maquete do “Espaço JK”. O
projeto da criação de um Espaço Cultural
Multiuso foi “idealizado pelo Instituto JK em
parceria com a Administração Municipal,
contemplará a construção do Museu de Tecnologia, Ciência e Tecnologia, do Museu Histórico Municipal e de
uma área para exposição e eventos. A construção será feita pelo Instituto e a gestão do Espaço pelo
município”. (PREFEITURA Municipal de Coronel Fabriciano, 2013)
A notícia publicada do site da prefeitura de Coronel Fabriciano no dia 06 de nov. 2013, não teve mais
repercussões. “O espaço cultural tem como objetivos promover o incentivo à Ciência e Tecnologia; motivar os
jovens para a cultura, história e ciência, através de visitas programadas; gerar Congressos, Seminários,
Exposições e Eventos. Além disso, no local funcionará o Museu Histórico da cidade que incluirá acervo da
Prefeitura e outros. Ainda não há data para início das obras, que tem previsão de ser concluída em quatro
meses.” (IDEM)
Não foi possível ter acesso ao projeto, mas através da visualização da maquete percebe-se que
apesar de ser dito como Centro Cultural o projeto arquitetônico é equivocado por ter aspecto
genérico e um partido arquitetônico e programa de necessidades que não favorece o que se espera
do espaço. Mas vale ressaltar o interesse do município em possui um espaço cultural.
172
173
CAPÍTULO 9 | TCC 2
Baseando-se nas análises realizadas sobre a região metropolitana do Vale do Aço percebe-se que,
apesar de um contexto histórico rico, ela ainda esteja por consolidar o seu processo de construção
identitária, muito provavelmente em função de sua formação recente.
Está fora de questão falar sobre “falta de cultura” no Vale do Aço. O que pode ser apontado é a
existência de uma grande diversidade cultural causada pelo grande contingente de migrantes que
formaram a região associada à sua formação rápida e recente. Sabendo disso, buscou-se uma
estratégia capaz de fortalecer o processo de valorização da história e cultura local, garantindo a sua
preservação e valorização através da criação de um equipamento cultural de caráter metropolitano.
É preciso relembrar que o processo de apropriação simbólico ocorre de forma natural à medida
que os moradores vão se apropriando de partes da cidade como sendo parte de suas estórias
individuais. É nítido que apesar de uma formação semelhante e de forma quase simultânea cada
cidade desenvolveu características muito específicas - sejam elas sob o ponto de vista cultural,
econômico, ambiental, urbano, etc -, mas o que pretende-se com esse projeto arquitetônico de
caráter cultural é ressaltar o que elas tem de comum sendo uma forma de elevar o sentimento de
pertencimento de um cidadão a essa região como um todo.
O que se pretende aqui é tornar tangível o processo de formação da identidade metropolitana
através da materialização arquitetônica, incentivando através desse o conhecimento e valorização dos
aspectos da região. É fato que o PARQUE DAS CULTURAS DO VALE DO AÇO tem um caráter
174
eminentemente politico buscando através da arquitetura potencializar a ligação entre ensino, história,
cultura, meio ambiente, lazer e inovação tornando acessível o contato com novos meios de
desenvolvimento social e econômico para região.
ESCOLHA DO NOME
O nome PARQUE DAS CULTURAS DO VALE DO AÇO surgiu como resposta aos ‘preconceitos’ que
a própria sociedade possa desenvolver caso fossem adotados nomes como “museu ou centro
cultural” por serem tipologias que representam uma utilização limitada na região, como foi abordado
ao longo desta pesquisa.
Ao denominar esse espaço como PARQUE DAS CULTURAS pretende-se esclarecer o programa
diversificado que o espaço abrigará. Pretende-se a criação de um espaço híbrido, com um programa
diverso e áreas livres que permitam conhecer e vivenciar a diversidade cultural regional, mas sem
uma estrutura formal, incentivando o uso de públicos e finalidades diversificados.
DIRETRIZES DO PROJETO
Baseando-se nos estudos sobre a Região Metropolitana do Vale do Aço aliado as questões
culturais pertinentes as produções contemporâneas buscou-se a criação de um equipamento cultural
capaz de subverter possíveis estereótipos passíveis de serem associados às tipologias culturais
existentes na região.
175
Sabendo que os espaços livres no Vale do Aço tem uma maior representatividade sobre o contexto
metropolitano em função da diversidade e liberdade de usos pelas pessoas, buscou-se integrar uma
tipologia forte na região aliado a uma inexistente. Pretende-se que o PARQUE DAS CULTURAS DO
VALE DO AÇO se torne um espaço destinado a valorização a cultura local sem a rigidez que a
tipologia dos museus na região tem adotado. Busca-se, através de parcerias com instituições de
ensino da região, criar um mutualismo entre o Parque das Culturas e um novo momento de
desenvolvimento do Vale do Aço
São quatro os principais aspectos a serem cumpridos pelo projeto:
Valorização da história do Vale do Aço;
Valorização da cultura local, que além de espaços de exposição buscará aliar o ensino de
atividades culturais à formação social de públicos diversos (idade, faixa etária);
Valorização dos recursos naturais, promovendo educação ambiental e servindo como apoio
ao Circuito Mata Atlântica;
Criação de um território metropolitano desvinculando o espaço de um município específico,
a fim de fortalecer o reconhecimento da identidade metropolitana, além de incentivar a
organização dos municípios da região para a gestão compartilhada;
Criar parcerias com instituições educacionais possibilitando que o espaço seja um novo
território de aprendizado na região.
176
PROGRAMA DE NECESSIDADES
Descriminação inicial do programa:
1. PAVILHÃO DA HISTÓRIA (acervo interativo + memorial dos botocudos*)
2. PAVILHÃO DAS CULTURAS (auditório híbrido+exposição+oficinas)
3. PAVILHÃO MATA ATLÂNTICA (educação ambiental+circuito mata atlântica)
4. PARQUE NOVO VALE (espaço multiuso: grande eventos+lanchonte)
5. FOYER (grande foyer unificado para acesso aos pavilhões+ café-bar+ loja)
6. RESTANTE DA GASTRONOMIA BRASILEIRA
7. ESPAÇOS ADMINISTRATIVOS
8. ESTACIONAMENTO
9. CIRCUITOS DE MOBILIDADE
PAVILHÃO DA HISTÓRIA
O Pavilhão da História tem como objetivo relatar a história do processo de formação do Vale do Aço
de forma unificada e forma interativa. Pretende-se que diferente da história individual contado pelos
museus municipais, seja contada a história comum ao Vale do Aço. Pretende-se a criação de um
acervo interativo, em resposta as mudanças na forma como são absorvidas as informações na
contemporaneidade.
177
Outro ponto importante é a criação
do MEMORIAL DOS “BOTOCUDOS”.
Sabendo da influência que a
presença dos índios “botocudos”
representou para região do Rio
Doce, inclusive no Vale do Aço,
pretende-se preservar e valorizar as
manifestações da cultura indígena.
As tribos indígenas na região do Rio
Doce sofreram com o genocídio
causado durante o período de ocupação de seus territórios. Em função disso no Vale do Aço,
especificamente, pouco restou sobre a cultura indígena refletindo em reduzidos relatos sobre sua
existência, podendo ser citado a produção de trançado de palha como herança da cultura indígena.
No entanto, em algumas cidades do Colar Metropolitano e em alguns pontos ao longo da
mesorregião do Rio Doce podem ser encontrados aspectos da cultural indígena.
* Pelo fato da denominação “Botocudo” ter sido pejorativamente atribuída pelos colonizadores aos nativos da região,
pretende-se descobrir qual seria a melhor forma de denominar essas diversas tribos que ocupavam a região através de
pesquisa com tribos existentes em Resplendor (MG), Aimorés (MG), Aracruz (ES) e Serra do Caparaó. – Cabe ressaltar que
existem outras além dessas apontadas.
178
PAVILHÃO DAS CULTURAS
Sabendo da diversidade cultural presente na região pretende-se a criação de um espaço híbrido
capaz de atender a usos diversos. Um dos principais aspectos a serem reforçados sobre este pavilhão
é o desenvolvimento de oficinas buscando o desenvolvimento e formação de públicos diversos no
Parque das Culturas.
Sabendo da dificuldade que algumas escolas de ensino integral têm enfrentado pela concentração da
quantidade de alunos, não mais divididas entre turnos, buscou-se o desenvolvimento de parcerias
com as instituições de ensino, como forma de permitir a formação transversal desses alunos
possibilitando a formação de um olhar mais propositivo, além de permitir o fortalecimento do
sentimento de pertencimento dessas crianças com a região onde vivem.
Estimasse a criação de auditórios híbridos capazes de atender demandas do cinema e do teatro; salas
para realização de oficinas; espaços para exposição de produtos de artistas locais.
PAVILHÃO MATA ATLÂNTICA
Este Pavilhão busca desenvolver uma consciência de valorização dos aspectos naturais da região. A
presença do Parque Estadual do Rio Doce e de outros bens naturais fica limitada pela falta de
reconhecimento e de investimento em infraestrutura capaz de promover o desenvolvimento do
potencial turístico da região.
179
Historicamente, a região do Vale do Aço sofreu profundas modificações do seu ambiente natural em
função dos desmatamentos de áreas de Mata Atlântica para posteriormente serem substituídos pelo
eucalipto, processo de transformou o Vale Verde em Vale do Aço. Entretanto, é eminente o potencial
turístico da região, o que confirmasse pela existência do Circuito Mata Atlântica, do qual os
municípios da RMVA e Colar Metropolitano fazem parte.
Conforme estudos realizados pelos diferentes eixos do PDDI/RMVA o turismo pode representar
um novo aspecto de desenvolvimento local, mas vale frisar, conforme apresentado pelo eixo de Meio
Ambiente, Saneamento e Recursos Hídricos, a existência do risco ambiental que o turismo de forma
desordenada pode acarretar para os recursos ambientais da região.
Portando, pretende-se que o PAVILHÃO MATA ATLÂNTICA sirva para promover ações de
educação ambiental, ao mesmo tempo em que sirva de apoio para o Circuito Mata Atlântica e como
estratégia para dar maior visibilidade aos recursos naturais da região.
PARQUE NOVO VALE
O PARQUE NOVO VALE corresponde aos espaços livres destinados a exposições e eventos ao ar livre
através da criação de um espaço multiuso, incentivando a utilização livre dos visitantes associados
com práticas esportivas e de lazer.
O espaço do parque representa uma estratégia para captar públicos que talvez não se relacionem
diretamente com o consumo de bens culturais, introduzindo através do espaço livre práticas de lazer
como estratégia para envolver este novo público.
180
Uma das preocupações do projeto é o de fortalecer o que já acontece na região servindo como
espaço destinado a atividades antes não existentes por falta de espaço no contexto urbano. Sabendo
da dificuldade que eventos de grande porte têm enfrentado em função das divergências entre
espaço disponíveis e implantação próximos a áreas residenciais, estima-se que sejam absorvidos pelo
Parque das Culturas do Vale do Aço.
ESCOLHA DO LUGAR
A premissa da implantação do projeto surge da expectativa de criar um equipamento
metropolitano que não possa ser associado diretamente a apenas um município, reforçando o senso
de identidade metropolitana. No entanto, a premissa da escolha desse lugar representa um dualismo:
utilizar uma área que seja provida de toda infraestrutura dentro da malha das cidades ou propor a
criação de um ‘novo território’?
Quando analisamos a transformação da malha urbana das cidades, é visível o processo de
constante renovação do solo urbano, seja através da criação de novos bairros ou de novas
articulações viárias que estimulam o desenvolvimento em áreas antes inóspitas. Sabendo disso, julga-
se que construir o Parque das Culturas do Vale do Aço em um lugar que não seja associado
diretamente com um município especificamente, reforce o caráter metropolitano através da
administração compartilhada dos municípios e, principalmente, do reconhecimento pela sociedade
como um espaço do Vale do Aço.
181
Com base no diagnóstico do eixo de
Ordenamento Territorial do PDDI/RMVA, são
apontadas novas áreas estratégicas para o
desenvolvimento da região metropolitana,
sendo que uma dessas áreas denominada Área
de Interesse Metropolitana Central (AIM-Central)
é formada pela junção das áreas definidas pelos
zoneamentos municipais de Coronel Fabriciano -
Zona de Interesse Econômico (ZIE-2) - e Ipatinga
- Zona de Grandes Equipamentos (ZGE), ambas
destinadas à implantação de equipamentos de
caráter metropolitano.
A área é privilegiada por representar uma convergência entre os municípios do Vale do Aço e por
ser alvo de proposições para uma nova fase de desenvolvimento do Vale do Aço. Cabe destacar aqui
o caso peculiar de Santana do Paraíso, pois se a questão da região metropolitana ainda é frágil para
os municípios que se desenvolveram simultaneamente (Coronel Fabriciano, Ipatinga e Timóteo), no
caso desse os vínculos com o Vale do Aço ainda são recentes – verificadas principalmente pelo
processo de conurbação decorrente do transbordamento da população de Ipatinga. O município de
Santana por ser o mais jovem representa o maior potencial para expansão urbana da RMVA,
182
portanto, estima-se que as maiores contribuições de Santana do Paraíso dentro do contexto
metropolitano ainda estejam por acontecer.
A área estimada como um dos territórios destinados a uma nova fase do desenvolvimento regional
possui um aspecto simbólico a ser potencializado pela arquitetura do complexo. O relevo acidentado
permite a visualização da Mata Atlântica densa preservada do Parque Estadual do Rio Doce,
representado um pouco do que restou do Vale Verde, reforçando o caráter de educação ambiental
que será abordado em conjunto com a promoção do Circuito Mata Atlântica.
Decidiu-se implantar o “Parque Das Culturas do Vale Do Aço” ao lado da área considerada como
Área de Interesse Metropolitana Central (AIM-Central). Englobando uma Zona de Proteção Ambiental
definida pelo Plano Diretor de Coronel Fabriciano acredita-se que a área do programa não precise de
grande potencial construtivo e que as diretrizes do plano diretor sejam condizentes com as premissas
de valorização ambiental do projeto. A área demarcada pela poligonal engloba 604.282 m² sendo
que 30.214 m² poderiam corresponder à taxa ocupada pela edificação (5%). Desde já se aponta que
os ‘terraços’, como tipologia característica do Vale do Aço, possam representar um potencial para
ampliar o aproveitamento de áreas sem que se altere o potencial construtivo.
183
184
ZONEAMENTO DEFINIÇÃO
TX. PERMEABILIDADE 90%
COEF. APROVEITAMENTO 0,1
TAXA DE OCUPAÇÃO 5%
LOTE MÍNIMO 5.000 m²
CX. CAP DRENAGEM OBRIGATÓRIO
TX. PERMEABILIDADE 90%
COEF. APROVEITAMENTO 0,1
TAXA DE OCUPAÇÃO 5%
LOTE MÍNIMO 5.000 m²
CX. CAP DRENAGEM OBRIGATÓRIO*
PLANO DIRETOR DE CORONEL FABRICIANO, LEI 3.789
PARÂMETROS URBANÍSTICOS
Zona de Proteção Ambiental (ZPA) é o conjunto das áreas de encostas e topos de morro), nas
quais predomina o interesse público na preservação ambiental por meio da retenção e
desaceleração das águas pluviais, aumentando tempo de chegada destas nos cursos d’água
principais. É vedada a pecuária e são adimitidos apenas usos compatíveis com a preservação
ambiental. Ocupação dos terrenos mediante a aprovação da secretaria de meio ambiente.
ZPA
ARIA-1
Áreas de Relevante Interesse Ambiental 1 são áreas destinadas à preservação de bacias,
encostas e topos de morro. | * Obrigatório a construção de bacias de detenção para
compensar toda área impermeabilizada.
185
Satisfatoriamente, a testada Sul do terreno
corresponde a visada para o Parque do Rio
Doce, Rio Piracicaba, ferrovia e contorno
rodoviário. Entretanto, deverão ser
desenvolvidas técnicas para controle do ruído
na edificação. A porção da fachada Norte será
utilizada para a criação do Parque Novo Vale,
garantindo a preservação das áreas com maior
declividade e protegendo a fachada dos
pavilhões orientados para essa posição.
Se por um lado o espaço atende as premissas quanto à localização em um “território inexplorado
do Vale do Aço” por outro, são necessárias estratégias para garantir o acesso democrático que este
projeto tem como objetivo cumprir. Em função da localização desvinculada da malha urbana
existente, prevê-se a criação de circuitos para o acesso dos visitantes. Sabendo da proposta de
criação dos Terminais Intermodais e do Sistema de Integração das Linhas de Ônibus para o Vale do
Aço pelo eixo de Mobilidade Urbana do PDDI/RMVA, propõe-se uma linha específica que leve os
passageiros dos terminais para o complexo. Além disso, a área correspondente estará localizada
imediatamente diante da nova MG 760, facilitando a criação de um acesso para o Parque das
Culturas do Vale do Aço.
186
187
ETAPAS DE DESENVOLVIMENTO PARA O TCC2
Ao longo deste trabalho puderam ser percebidas algumas técnicas referentes a diferentes períodos
pelos quais passaram o Vale do Aço, sendo que esses materiais tornaram-se determinantes para o
partido arquitetônico das edificações.
Ao longo da história da região puderam ser observados sistemas que se apropriavam de materiais
disponíveis tais como: a taipa de mão, tijolos de adobe produzido pelas olarias, e até a madeira dos
caixotes de equipamentos que chegavam às siderúrgicas edificaram casas por bairros das cidades.
Sabe-se que a cultura de um povo está condicionada aos recursos e materiais disponíveis, portanto,
serão investigados materiais e técnicas que possibilitem o fortalecimento da identidade regional. É
preciso ressaltar que essa investigação deve ser desenvolvida em consonância com as estratégias de
projeto, portanto, tornou-se necessário o desenvolvimento dessa análise durante o TCC2.
Deverá ser desenvolvida, além do projeto arquitetônico, a viabilização dos acessos ao Parque das
Culturas considerando as proposições para a mobilidade urbana no elaboradas pelo PDDI/RMVA.
Além da viabilização dos acessos, serão discutidas estratégias de viabilização do projeto através de
parcerias com programas federais e estaduais. É preciso premeditar que o espaço deverá ser
construído através de operação urbana consorciada, buscando a parceria entre a iniciativa privada e o
poder público. As grandes empresas que tem influência direta na história dos municípios poderiam
ser parceiras do Parque das Culturas do Vale do Aço, podendo ser citadas como exemplo: Aperam,
Usiminas, Vale do Rio Doce, Cenibra. Apesar de algumas dessas empresas já possuírem seus próprios
188
centros de cultura, estima-se que a Lei de Incentivo a Cultura e a visibilidade dada às empresas
através desses incentivos possa servir de estímulo.
189
10| CONCLUSÃO
Ao buscar conhecer a cultura do Vale do Aço como forma de direcionar uma produção
arquitetônica capaz de retratar essa identidade cultural foram percebidos as diversas variáveis que o
aspecto cultural tem englobado na contemporaneidade, desde entender os conceitos até em como
eles tem interferido no funcionamento das cidades neste século.
Enquanto muitas cidades mineiras se desenvolviam durante o período da mineração a região do
Vale Verde (como era conhecido o Vale do Aço) representava uma barreira contra o contrabando do
ouro. A presença dos índios botocudos, o relevo acidentado e a mata densa fizeram que a região só
fosse ocupada plenamente no final do século XIX. A chegada do aço no Vale transformou totalmente
a paisagem da região, passando a representar um novo território tanto para os moradores dos
pequenos vilarejos existente na região quanto para os migrantes que chegavam a uma ‘terra de
ninguém’, sendo que o sentimento de pertencimento foi sendo consolidados à medida que as
cidades também iam se estruturando.
As indústrias siderúrgicas influenciaram – e continuam influenciando- as cidades do Vale do Aço,
seja através da economia, emprego ou de iniciativas culturais. No entanto, é dessa relação de
dependência que se criou uma incógnita sobre o futuro da região. Em 2009, com a crise enfrentada
pelo setor siderúrgico, as cidades do Vale do Aço viram-se acuadas pelo medo do “E SE...” as
indústrias deixassem a cidade. Diante disso, analisa-se o fortalecimento da cultura e dos recursos
naturais da região como primeiro passo para diversificação da sustentação da região.
190
Foi perceptível a complexidade que o termo “identidade cultural” passou a representar na
sociedade contemporânea, principalmente no campo da arquitetura. Ao analisar o conceito de
identidade e de cultura têm-se ambos como sendo algo mutável, refletindo um processo constante
de formação através das interações do indivíduo com o mundo ao redor. Ao falar sobre cultura na
contemporaneidade é preciso avaliar o processo de globalização como principal modificador das
percepções desse individuo, permitindo o contato com diversas culturas de forma instantânea.
Peter Hall (2006) aponta para a influência da “identidade nacional” como formadora de
significações para o indivíduo passando a assumir características próprias a essa nação. Conforme
Hall, ao afirmar serem brasileiros, argentinos ou italianos os indivíduos assumem sua nacionalidade
como sendo parte de sua essência. Baseado nos conhecimentos sobre a “identidade cultural” buscou-
se fortalecer o processo de identificação com a Região Metropolitana do Vale do Aço, a identidade
metropolitana, como forma de tornar tangível o sentimento de pertencimento a essa região - e não a
apenas uma cidade.
Além de apresentar o contexto de formação histórico recente do Vale do Aço buscou-se analisar
de se a arquitetura na região tem despertado o senso de identificação em seus moradores. Através
de um questionário foram apresentados 30 lugares da região buscando avaliar quais eram aqueles
com que as pessoas mais se identificavam, como forma de produzir informações que sirvam de
diretrizes para o desenvolvimento do projeto. Concluiu-se que os espaços livres de uso públicos são
191
aqueles com que as pessoas mais se identificam, muito em função da liberdade e multiplicidade de
usos que esses podem assumir.
Além da cultura, é abordado o potencial turístico na região. Devido ao processo de formação da
região os recursos naturais foram devastados e a consciência ambiental, assim como o
desenvolvimento de atividades turísticas, ainda é insipiente. Foi abordado o fato das cidades do Vale
do Aço fazerem parte do Circuito Mata Atlântica de Minas como um aspecto positivo para o
desenvolvimento dessas atividades turísticas, entretanto, falta conhecimento da própria população
sobre o Circuito. Acredita-se que essa situação que possa ser subvertida pela criação de um espaço
de apoio a esse programa, como forma de tornar tangível a existência desse circuito.
Tanto a cultura quanto o turismo tem representado novos modelos estratégicos de
desenvolvimento econômico. É preciso avaliar que as transformações nos sistemas de produção
promovidos pela Era da Informação, em detrimento a lógica industrial, mudaram a percepção das
cidades e transformaram o valor simbólico em estratégia de desenvolvimento de cidades. As grandes
obras de arquitetura e urbanismo se tornaram a reificação dos modelos de desenvolvimento a serem
implantados pelas cidades ao redor do mundo. É preciso ressaltar que a arquitetura como simples
“imagem da cidade” tornasse espetacularização do espaço urbano quando destinada puramente ao
marketing urbano. É fato que as obras de arquitetura exponenciais aumentam a visibilidade das
cidades pelo mundo, entretanto, é preciso pensar em obras que possam ser de fato apropriada pelo
192
público de forma igualitária sendo mais que uma imagem a ser vendida, mas como um espaço a ser
experimentado.
Já com foco maior sobre a arquitetura de ‘espaços culturais’ buscou-se avaliar as dificuldades que
a questão cultural representa no Brasil. Foram abordados dados que apontam para uma
desvinculação do individuo com esses espaços em função da democratização de bens culturais,
citando como exemplo a televisão como manipuladora do consumo cultural no país. Se a questão do
acesso à cultura por muito tempo representou uma exclusividades das elites, a democratização das
tecnologias surgiu como forma uniformizar esse acesso ao mesmo tempo em que permitiu a
desvinculação do espaço publico para o consumo de lazer e cultura.
É preciso perceber que a não utilização dos espaços culturais tornou-se um aspecto da própria
cultura brasileira. Em meados dos anos 40, Lina Bo Bardi percebe a falta de estímulo para o consumo
de arte para as camadas mais populares da sociedade, buscando desenvolver estratégias que
aliassem o ensino as novas técnicas de experimentação desses espaços, tornando-se essa uma das
principais vertentes adotadas por centros culturais no Brasil. Sobre a produção de Lina Bo Bardi
destacam-se suas produções como uma das maiores contribuições para a valorização da cultura
popular brasileira. Prova de que a boa arquitetura é capaz de subverter a cultura de não utilização
dos espaços culturais é a arquitetura de Lina que por seu caráter politico tornou-se um marco da
produção de espaços dessa tipologia. Sua arquitetura baseava-se principalmente nas observações
quase antropológicas da arquiteta para intender a cultura desse povo brasileiro.
193
Com base nos estudos relacionados com aspectos pertinentes a cultura regional e as produções
arquitetônicas contemporâneas percebe-se que a região possui diversos potenciais para serem
explorados. Sabendo da formação recente da região percebe-se a importância de fortalecer, através
de uma produção arquitetônica, o processo de identificação com a região. Vale ressaltar que algumas
iniciativas de grupos culturais já existem, no entanto, acredita-se que através da materialização dessas
iniciativas através da arquitetura as apropriações simbólicas através das experimentações sensoriais
do corpo no espaço possam ter um significado maior. Diante disso, acredita-se que o Parque das
Culturas do Vale do Aço seja um símbolo de uma nova fase de desenvolvimento da região buscando
valorizar os aspectos favoráveis ao desenvolvimento regional, assim como pretende incentivar a
transformação sobre aspectos sociais na região.
194
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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