Post on 12-Apr-2017
Instituto Politcnico de Tomar
Escola superior de Gesto de Tomar
Sandra Cristina Costa Domingos
O Paleoturismo em Portugal: proposta de modelo
de enquadramento e valorizao turstica do
Patrimnio Paleontolgico
Dissertao de Mestrado
Orientada por:
Doutor Silvrio Figueiredo
Coorientada por:
Doutor Lus Mota Figueira
Dissertao apresentada ao Instituto Politcnico de Tomar para cumprimento dos requisitos
necessrios obteno do grau de Mestre em Desenvolvimento de Produtos de Turismo
Cultural
http://www.google.pt/url?sa=i&rct=j&q=&esrc=s&frm=1&source=images&cd=&cad=rja&docid=sSp2S_k1bEhTHM&tbnid=cE_uOg6AEn-DiM:&ved=0CAUQjRw&url=http://alumni.ipt.pt/~danielm/&ei=MM5mUcifDZSa1AXksoD4Cg&bvm=bv.45107431,d.ZWU&psig=AFQjCNFtSMGRX2Z9NMX55TcO9aMakJCmUQ&ust=1365777947949749
Aos meus pais.
Resumo
Apesar de existir em Portugal um vasto Patrimnio Paleontolgico de interesse
relevante, e de a Paleontologia ter uma tendncia de nicho turstico elevada, em que poder
ser associada vivncia de experincias singulares, este produto no tem sido devidamente
explorado.
Tendo em considerao este fator, apresentam-se as bases para a definio de um
novo tipo de turismo relacionado, o Paleoturismo em que se exploram as potencialidades
tursticas do patrimnio paleontolgico portugus.
Portugal tem excelentes condies para explorar este segmento de turismo, pois
possui um diversificado conjunto de formaes geolgicas de todas as eras (Paleozoico,
Mesozoico e Cenozoico), onde ocorrem vrios tipos de fsseis (somatofsseis e
icnofsseis) de organismos que viveram durante estas Eras.
Apresentam-se uma Rota Paleoturstica em territrio nacional: dois itinerrios que
correspondem s Eras Paleozoica e Mesozoica e um que inclui museus com patrimnio
paleontolgico. A Era Cenozoica no est includa, pois no apresenta stios que tenham
condies propcias sua explorao turstica. No entanto, est representada atravs de
fsseis nos museus do terceiro itinerrio, provenientes desta Era. Pela sua importncia
patrimonial e cientfica, pela sua localizao geogrfica e pela sua potencialidade turstica
so includos na rota trs circuitos isolados (Pedreira do Galinha, stios com pegadas de
dinossauros do Algarve e formaes com fsseis de invertebrados marinhos de Santa
Maria Aores).
Apesar de serem uma amostra das potencialidades do patrimnio paleontolgico
portugus, a escolha destes stios e museus refletem, na nossa opinio, uma viso de
globalidade do territrio portugus, quer a nvel geogrfico, quer a nvel temporal.
Palavras-chave: Portugal; Paleontologia; Turismo; sustentabilidade; Paleoturismo e rota.
Abstract
Although there is one in Portugal vast Paleontological Heritage of major interest and
Palaeontology have a tendency to high tourist niche, which can be associated to the
experience of unique experiences, this product has not been adequately explored .
Taking this factor into account, we present the basis for the definition of a new type of
tourism, " Paleoturismo " in which I explore the tourism potential of the Paleontological
Heritage.
Portugal has excellent conditions to explore this segment of tourism because it has a
diverse range of geological formations from all Eras (Paleozoic, Mesozoic and Cenozoic) ,
where there are several types of fossils ( somatofsseis and trace fossils ) of organisms that
lived during these ages .
They present a Route Paleoturstica in Portugal: two routes that correspond to the
Paleozoic and Mesozoic Eras and that includes museums with Paleontological Heritage.
The Cenozoic Era is not included because it does not show sites that have favorable
conditions to its tourist exploitation. However, is represented by fossils in the museums of
the third route, from this age For its equity and scientific importance, its geographical
location and its tourism potential are included in the route three isolated circuits (Quarry
Chicken Ranches with footprints dinosaurs Algarve formations and fossils of marine
invertebrates with Santa Maria - Azores).
Despite being a sample of the potentiality of Paleontological Heritage Portuguese , the
choice of these sites and museums reflect , in our view , a view of the whole Portuguese
territory , either geographically or temporal level .
Keywords: Portugal; Palaeontology, Tourism, sustentabilidade; Paleoturismo and route
XI
ndice Geral
INTRODUO ................................................................................................................1
METODOLOGIA ............................................................................................................7
1. ENQUADRAMENTO CONTEXTUAL .................................................................... 13
1.1.CONCEITO DE PALEONTOLOGIA .................................................................... 13
1.1.1.Breve histria da paleontologia e histria da paleontologia em Portugal ........... 28
1.1.1.1- Breve Histria da Paleontologia ................................................................ 28
1.1.1.2 - Breve Referncia Histria da Paleontologia em Portugal ....................... 34
1.2.CONCEITO DE TURISMO ................................................................................ 40
1.2.1.Segmentaes no Turismo pelo lado da oferta e da procura .............................. 44
1.2.3 Importncia do Turismo na Economia .............................................................. 47
1.2.4. Problemtica do Turismo contemporneo ........................................................ 49
1.2.5. Tendncias do Turismo contemporneo ........................................................... 50
1.2.6.Turismo como campo de desenvolvimento sustentvel ..................................... 53
2.TURISMO PALEONTOLGICO ............................................................................. 61
2.1.CONCEITO DE PALEOTURISMO ...................................................................... 64
2.2.CARACTERSTICAS DO PALEOTURISMO ......................................................... 71
2.3. INTERAO DO TURISMO PALEONTOLGICO COM OS RESTANTES SEGMENTOS
......................................................................................................................... 72
2.4. VALORIZAO E PRTICAS DE TURISMO PALEONTOLGICO .......................... 74
2.5. A CRIAO DE PRODUTOS TURSTICOS PALEONTOLGICOS: POSSIBILIDADES E
LIMITES ............................................................................................................. 82
2.5.1. Produtos Didticos .......................................................................................... 86
2.6. A DOUTRINA PENT ..................................................................................... 88
2.7. REFERNCIAS A CONVENES FAVORVEIS AO NICHO PALEOTURISMO ......... 92
3. PROPOSTA DE MODELO DE TURISMO PALEONTOLGICO A APLICAR
AO TERRITRIO PORTUGUS ................................................................................ 97
3.1. AGRUPAMENTO DE IDEIAS, CONCEITOS, OBJETIVOS ...................................... 99
XII
3.2. TRAADO DO MODELO PROPOSTO PARA A ROTA PALEOTURISTICA ............. 106
3.2.1. Itinerrios 1 - Paleozoico.............................................................................. 108
3.2.2. Itinerrio 2- Mesozoico ................................................................................. 113
3.2.3. Itinerrio 3 Museus .................................................................................... 119
3.2.4. Outros circuitos de interesse ......................................................................... 125
3.3. ATRATIVOS FSSEIS NO PATRIMNIO CONSTRUDO DAS CIDADES
PORTUGUESAS PERCETVEIS DE TURISTIFICAO .............................................. 130
3.4. ANLISE DAS NECESSIDADES..................................................................... 130
3.5. ANALISE SWOT ....................................................................................... 132
3.6. DEFINIO DOS OBJETIVOS ....................................................................... 133
3.7. PLANO DE SUSTENTABILIDADE .................................................................. 134
3.8. CANAIS .................................................................................................... 135
3.9. MODELO DE GESTO ................................................................................ 139
3.10. PROPOSTAS DE VALORIZAO E PROMOO DA ROTA PALEOTURISTICA ... 141
3.11. FATORES FAVORVEIS IMPLEMENTAO DA PROPOSTA ......................... 146
4. DISCUSSO E LEVANTAMENTO DAS LIMITAES E DAS
VIRTUALIDADES DO MODELO DE PALEOTURISMO ..................................... 149
5. LIMITAES A ESTE ESTUDO .......................................................................... 155
CONCLUSO ............................................................................................................. 157
BIBLIOGRAFIA ......................................................................................................... 159
ANEXOS ...................................................................................................................... 167
ANEXO I RELATRIOS DO ESTGIO CINCIA VIVA NO VERO (2013) ............. 169
ANEXO II TABELA CRONOSTRATIGRFICA INTERNACIONAL ........................ 173
ANEXO III - ARVORE FILOGENTICA COM A RELAO DE PARENTESCO DOS
ORGANISMOS. .................................................................................................. 175
ANEXO IV - CARTA GEOLGICA DE PORTUGAL .............................................. 177
ANEXO V - GLOSSRIO.................................................................................... 179
GLOSSRIO ..................................................................................................... 179
XIII
ndice de Figuras
Figura 1 - Mapa concetual acerca do paleoturismo .............................................................4
Figura 2 - Visita a arribas com fsseis ................................................................................8
Figura 3 - Visita a jazida com fsseis .................................................................................8
Figura 4 - Visita de estudo de alunos de secundrio a jazida com fsseis ............................9
Figura 5 - Momento explicativo acerca da jazida com fsseis .............................................9
Figura 6 - Atividade ldica com alunos de secundrio ........................................................9
Figura 7 - Contato dos participantes do estgio da Cincia Viva com uma jazida com
fsseis .............................................................................................................................. 10
Figura 8 - Tabela cronostratigrfica resumida ................................................................... 14
Figura 9 - Fauna Edicara .................................................................................................. 16
Figura 10 - Paisagem do Devnico, incluindo meios emersos e submersos ....................... 17
Figura 11 - Paisagem do Jurssico com dinossauros e pterossauros .................................. 18
Figura 12 - Paisagem com faunas do Plistocnico ............................................................ 19
Figura 13 - Representao simplificada da Deriva Continental entre o Cmbrico e o
Plistocnico...................................................................................................................... 20
Figura 14 - Evoluo dos Tetrpodes ............................................................................... 21
Figura 15 - Evoluo dos Tetrpodes Fonte: Imagem cedida pelo NIDAP.CPGP ............. 21
Figura 16 - Representao Esquemtica dos diferentes tipos de fsseis ............................ 23
Figura 17 - Pilares da Sustentabilidade ............................................................................. 54
Figura 18 - Motor de Busca Google - Pagina em Portugal ................................................ 65
Figura 19 - Motor de Busca Google ................................................................................. 65
Figura 20 - Mapa conceptual acerca dos principais intervenientes do Paleoturismo .......... 67
Figura 21 - Vista sobre arriba com fsseis ( zona do Cabo Espichel) ................................ 68
Figura 22 - Icnofsseis produzidos por invertebrados marinhos do Cretcico ................... 68
Figura 23 - Bases nocionais do Paleoturismo.................................................................... 70
Figura 24 - Caractersticas da atividade do Paleoturismo .................................................. 71
Figura 25 - Tipos de turismo com ligaes ao Paleoturismo mais significativos ............... 73
Figura 26 - Esqueleto fossilizado de um Parassaurolofo encontrado por estudante............ 75
Figura 27 - Fssil vegetal encontrado em Arouca ............................................................. 78
Figura 28 - Relao dos principais intervenientes da Rota Paleoturistica .......................... 79
Figura 29 - Variveis consideradas para a valorizao do patrimnio paleontolgico ....... 80
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XIV
Figura 30 - Impactos negativos do turismo a considerar no processo se turistificao ...... 81
Figura 31 - Atividades ldicas em Paleoturismo .............................................................. 87
Figura 32 - Objetivos da Carta Internacional do Turismo Cultural ................................... 96
Figura 33 - Processo de Roteirizao Paleoturistica ....................................................... 104
Figura 34 - Itinerrios e outros circuitos de interesse propostos ...................................... 106
Figura 35 - Traado proposto para a Rota Paleoturstica ................................................ 107
Figura 36 - Centro de Interpretao Geolgica de Canelas ............................................. 109
Figura 37 - Trilobites de Canelas ................................................................................... 109
Figura 38 - Cruziana em Penha Garcia ........................................................................... 110
Figura 39 - Vista sobre o Parque Icnolgico de Penha Garcia ........................................ 111
Figura 40 - Trilobite em Exposio no CIART .............................................................. 112
Figura 41 - Tronco fssil em exposio no CIART ........................................................ 112
Figura 42 - Vista sobre as Portas de Rodo .................................................................... 113
figura 43 - Trilho de pegadas de dinossauro na Praia Grande ......................................... 114
Figura 44 - Lage calcria com pegadas de dinossauro na Praia Grande .......................... 114
Figura 45 - Pegadas de Dinossauro de Carenque ............................................................ 115
Figura 46 - Painel explicativo do Monumento Natural da Pedra da Mua ........................ 116
Figura 47 - Vista geral da Pedra da Mua e do Santurio ................................................. 116
Figura 48 - Trilho com pegadas de dinossauro herbvoro na jazida dos Lagosteiros ....... 117
Figura 49 - Trilho de pegadas de dinossauro carnvoro da jazida dos Lagosteiro ............ 118
Figura 50 - Pormenor da pegada de dinossauro carnvoro na jazida dos Lagosteiros ...... 118
Figura 51 - Laje da Pedreira do Avelino ........................................................................ 119
Figura 52 - Pormenor das pegadas de dinossauro na Pedreira do Avelino ...................... 119
Figura 53 - Exterior do NIDAP.CPGP ........................................................................... 120
Figura 54 - Vitrina com fsseis na exposio do NIDAP.CPGP ..................................... 121
Figura 55 - Fachada do Museu da Lourinh ................................................................... 122
Figura 56 - Replica de um dinossauro Estegossauros no interior do Museu da Lourinh 122
Figura 57 - Vitrina do Museu Geolgico com Crocodilo de Chelas ................................ 123
Figura 58 - Coleo de fsseis no Museu Geolgico ...................................................... 124
Figura 59 - Fachada do Museu Nacional de Historia Natural ......................................... 124
Figura 61 - Segmento da pista com pegadas de dinossauro da Praia da Salema .............. 126
figura 62 - Jazida da Praia da Salema ............................................................................. 127
XV
Figura 63 - Monumento que assinala a jazida da Pedreira do Galinha ............................. 129
Figura 64 - Pegadas de dinossauro da Pedreira do Galinha ............................................. 129
Figura 65 - Analise SWOT ............................................................................................. 132
Figura 66 - Redes sociais mais utilizadas........................................................................ 138
Figura 67 - Modelo de Gesto da Rota Paleoturistica ..................................................... 140
Figura 68 - Balana de descontos ................................................................................... 142
Figura 69 - Quadro modelo de Participao dos portadores do Passaporte Paleoturistico 143
Figura 70 - Marca da Rota Paleoturistica ........................................................................ 144
Figura 71 - Prottipo para Stand Mvel .......................................................................... 145
Figura 72 - Carrinhas Volkswagem ................................................................................ 146
Figura 73 - Peas de Merchandising a venda no NIDAP.CGPG ..................................... 150
figura 74 - Mapa conceptual do modelo de Paleoturismo apresentado ............................ 158
XVII
Lista de abreviaturas e siglas
BTL Bolsa de turismo de Lisboa
CIART - Centro de Interpretao de Artes Rupestres do Tejo
CPGP Centro Portugus de Geo-Histria e Pr-Histria
CPT Confederao Portuguesa de Turismo
Fig. Figura
ICOMOS Concelho Internacional de Monumentos e Stios
IPT Instituto Politcnico de Tomar
LAP Laboratrio de Arqueologia e Paleontologia
Ma Milhes de anos
NIDAP Ncleo de Investigao e Divulgao de Arqueologia e Paleontologia
OMT Organizao Mundial de Turismo
PENT Plano Estratgico Nacional de Turismo
PNPOT Programa Nacional de Politica de Ordenamento do Territrio
UNESCO Organizao da Naes Unidas para a Educao, a Cincia e a Cultura
O Paleoturismo em Portugal: proposta de modelo de enquadramento e valorizao turstica do Patrimnio Paleontolgico
1
Introduo
Este trabalho tem por objetivo abordar e desenvolver um produto turstico pouco
desenvolvido e pouco explorado: o turismo paleontolgico. Dada a importncia do
patrimnio paleontolgico portugus, torna-se pertinente desenvolver um trabalho que
apresente propostas de valorizao turstica deste patrimnio. Considera-se o turismo
paleontolgico um nicho de mercado, especialmente dentro do turismo cultural, mas
tambm o de natureza; o cientfico; o ecoturismo e o geoturismo, com viabilidade para se
consolidar no futuro.
Este um trabalho que, recorrendo ao patrimnio paleontolgico nacional,
desenvolver uma abordagem paleontolgica a partir da lgica do turismo e para o turismo,
com o objetivo de valorizar e preservar este tipo de patrimnio cultural e natural.
A necessidade de reconhecimento para a conservao do patrimnio paleontolgico
facilita a cooperao entre este e o turismo, sob a designao de Paleoturismo. A
destruio do patrimnio paleontolgico significa normalmente um desaparecimento
irreversvel e irrecupervel, que leva perda do testemunho de alguma memria da histria
do nosso planeta.
Por isso, o patrimnio paleontolgico assume um valor intrnseco, pelo seu potencial
cientfico e educativo, pelo interesse que desperta no pblico e pela sua capacidade de
interpretao dos fenmenos que ocorreram no passado. Este conhecimento, permite a
compreenso de fenmenos fsicos atuais e a prescincia de acontecimentos futuros. O
conhecimento dos habitats, dos ecossistemas e das paisagens do passado, bem como das
suas inter-relaes despertam cada vez mais a curiosidade no ser humano.1
A sua
compreenso e interpretao so essenciais para o seu planeamento e implementao de
estratgias, medidas e aes para a sua proteo. Desta forma, o patrimnio
paleontolgico, associado ao turismo, potencializador de um desenvolvimento
socioeconmico sustentvel em determinadas zonas do pas. So recursos que podem
aumentar a atratividade de um determinado territrio e consequentemente melhorar as
1 Anexo III - Arvore filogentica com a relao de parentesco dos organismos.
O Paleoturismo em Portugal: proposta de modelo de enquadramento e valorizao turstica do Patrimnio Paleontolgico
2
condies de vida da populao local. A humanidade, a sua evoluo e a sua histria esto
intimamente ligados com a prpria histria da vida na Terra e dos recursos naturais. Por
estas razes, o patrimnio paleontolgico faz parte da cultura humana e do territrio.
O patrimnio paleontolgico constitudo pelos fsseis (conjunto de vestgios e de
restos de organismos do passado geolgico). Os vestgios (icnofsseis) so as marcas da
atividade desses organismos; os restos (somatofsseis) so os elementos que constituram
os seres vivos, como os ossos, as conchas e a madeira2.
A paleontologia d-nos informao acerca das comunidades biolgicas e ambientes
do passado geolgico. A destruio destes vestgios no s nos priva desta informao,
como tambm empobrece a cincia e o patrimnio de uma dada regio e/ou pas. Assim
importante salvaguardar este patrimnio tendo em conta a sua importncia cientfica e a
sua raridade.
A paleontologia estuda os fsseis. E qual a importncia do estudo dos fsseis? Os
fsseis, apesar de serem testemunhos do passado, esto bem presentes na atualidade, pois,
atravs deles, pode-se saber como evoluiu a vida na Terra; quais so as origens da nossa
espcie e de todas as formas de vida atuais e contribuem para o crescimento econmico
(procura de combustveis fsseis, pedras ornamentais, indstria cinematogrfica,
marchandising, turismo, entre outros)3. Assim, no difcil perceber a sua importncia.
A criao de uma rota como modelo de desenvolvimento do turismo paleontolgico
em Portugal dever resultar de uma harmonia entre o patrimnio paleontolgico e o
turismo, pois A atividade turstico-cultural requer referncias tericas para se
desenvolver cientfica e empresarialmente. 4 A elaborao de um modelo que vise a
afirmao do paleoturismo assume-se como uma tarefa proveitosa para ambas as reas.
Neste trabalho, mais do que definir, to s, uma rota paleoturstica fsica, pretende-se
tambm discutir a importncia do paleoturismo para o turismo nacional e a afirmao
2 CASSAB, 2004; FIGUEIREDO, 2008, 2013 b; MENDES, 1988
3 FIGUEIREDO,2013a
4 FIGUEIRA, 2013a
O Paleoturismo em Portugal: proposta de modelo de enquadramento e valorizao turstica do Patrimnio Paleontolgico
3
deste, atravs de uma rota que valorize e diferencie este patrimnio. Em termos nacionais,
pode constituir uma novidade, no panorama da oferta turstica nacional, no nicho de
paleoturismo a incluir nos produtos PENT5 (Plano Estratgico Nacional de Turismo).
Os temas paleontolgicos despertam grande interesse no pblico em geral,
tornando-se um elemento de explorao turstica por excelncia. So aproveitados pela
indstria cinematogrfica e so amplamente divulgados na comunicao social. Os temas
paleontolgicos despertam cada vez mais um interesse crescente na sociedade e concorrem
para uma tomada de conscincia, para a valorizao e preservao deste patrimnio atravs
do Turismo.6 Alguns locais com patrimnio paleontolgico, com o caso das pegadas de
dinossauros, um excelente local para aplicar na prtica o ensino das cincias naturais e
proporcionar o contato direto dos alunos com a cincia. As ilhas, por razes geolgicas
apresentam uma potencialidade paleontolgica baixa existindo poucos testemunhos
paleontolgicos. No arquiplago da Madeira destaca-se a ilha de Porto Santo, onde se
descobriram alguns fsseis do Quaternrio, incluindo os restos de um Pinguinnus
impennis, o pinguim do hemisfrio norte, extinto no sc. XIX, conhecendo-se no total do
territrio portugus trs exemplares fsseis desta ave, no entanto este stio no apresenta as
melhores condies para desenvolver um programa de visitas.
Pretende-se neste trabalho: fazer uma breve abordagem paleontologia; trabalhar a
temtica no mbito do turismo, apresentando algum do patrimnio paleontolgico
disponvel e expor exemplos de sucesso; enquadrar o turismo paleontolgico, nas
tendncias de turismo atuais, nos planos de turismo, como o caso do PENT e outros a
nvel internacional e perceber a sua sustentabilidade; compreender as dificuldades e
condicionantes ao exerccio de atividades tursticas nesta temtica e elaborar propostas que
viso a valorizao do turismo paleontolgico.
Este tipo de turismo, que se apoia nos mais antigos vestgios da vida do planeta, deve
ser, no presente, cada vez mais valorizado. Com este trabalho procura-se sensibilizar as
diferentes entidades, pblicas e privadas, que laboram com este tipo de produtos para que
5 Em http://www.turismodeportugal.pt
6 SILVA, 2003
O Paleoturismo em Portugal: proposta de modelo de enquadramento e valorizao turstica do Patrimnio Paleontolgico
4
criem uma rede de parcerias e potenciem cada vez mais os recursos existentes, de forma a
toma-los mais acessveis e compreensveis aos visitantes, para que estes vivam
experincias nicas e, sejam cada vez mais sensveis para a conservao e proteo do
patrimnio. Pretende-se igualmente diferenciar a arqueologia da paleontologia que,
possuem diferentes objetos de estudo.
Figura 1 - Mapa concetual acerca do paleoturismo
Fonte: Elaborao prpria
A cooperao entre as diferentes valncias do paleoturismo poder contribuir para o
sucesso deste nicho de mercado. Com o esquema, acima apresentado, pretende-se realar
os principais agentes que devem contribuir para a valorizao e implementao do
paleoturismo, no territrio nacional (Fig.1). Neste sentido, pretende-se criar uma rede que
envolva o territrio e a populao (pessoas individuais; organizaes locais e nacionais)
que contribuem para o crescimento da economia e dinamizao de atividades, integradas
Produto
Turstico
Patrimnio Paleontolgico
Atividades Economia
Pessoas
Paleontologia
+
Turismo
O Paleoturismo em Portugal: proposta de modelo de enquadramento e valorizao turstica do Patrimnio Paleontolgico
5
numa rota nacional, resultante da ligao entre a paleontologia e o turismo. Com a
implementao da rota, pretende-se fortalecer a economia e criar atividades que valorizem
o territrio e favoream as pessoas que nele habitam, atravs de um crescente nmero de
turistas ao territrio. O sucesso desta cooperao dever resultar, na afirmao das jazidas
paleontolgicas, enquanto destinos tursticos.
O Paleoturismo em Portugal: proposta de modelo de enquadramento e valorizao turstica do Patrimnio Paleontolgico
7
Metodologia
Os primeiros contatos com a paleontologia surgiram nas aulas deste mestrado, com a
unidade curricular Arqueologia e Patrimnio Regional e Local I lecionada pelos
docentes: Doutor Luiz Oosterbeek e Doutor Silvrio Figueiredo, em que o segundo fez
uma abordagem do patrimnio paleontolgico. No decorrer desta unidade, a ida ao
Laboratrio de Arqueologia e Paleontologia do Instituto Politcnico de Tomar e do Centro
Portugus de Geo-Histria e pr-Histria (LAP.IPT-CPGP) e poder contatar diretamente
com vestgios verdadeiros de um dinossauro; apreciar ainda outros vestgios fsseis que ali
se encontravam e perceber a evoluo das espcies animais atuais, especialmente das
espcies de vertebrados, relacionando-as com as que lhes deram origem, atravs das partes
sseas dos animais atuais, despertaram a ateno para este patrimnio, sem no entanto
pensar em elaborar este trabalho sobre o turismo paleontolgico.
Este interesse foi surgindo, aps sugesto daquele que viria a ser orientador, Doutor
Silvrio Figueiredo. A ideia comeou a fazer sentido quando, aps uma pequena pesquisa
acerca do patrimnio paleontolgico nacional se percebeu que, o seu potencial de
turistificao se encontra num estado ainda um pouco incipiente. O primeiro passo para a
criao de uma proposta de modelo, para o segmento do turismo paleontolgico, no
territrio nacional, foi lanado.
Antes de avanar para a elaborao de uma rota essencial perceber o seu objeto de
trabalho, a sua distribuio territorial e definir os mtodos a adotar.
Neste sentido, procedeu-se a uma busca de bibliografia acerca da paleontologia, da
qual resultou os primeiros contactos com o tema. Seria importante conhecer a disciplina
cientfica com que se iria trabalhar. A sua evoluo e importncia ajudaram a compreender
melhor o objeto de estudo desta: os fsseis, com os quais se pretende trabalhar, em termos
tursticos.
Seguidamente foi feita uma reviso bibliogrfica, e consultadas novas bibliografias a
cerca de turismo, para um melhor enquadramento / adequao com o tema a desenvolver.
O Paleoturismo em Portugal: proposta de modelo de enquadramento e valorizao turstica do Patrimnio Paleontolgico
8
Existia a necessidade de ajustar os conhecimentos em termos de turismo a este novo
conceito.
As pesquisas bibliogrficas, quer acerca da paleontologia, quer do turismo ou outros
temas que suscitaram interesse, sentiram-se necessrias durante todo o trabalho de
elaborao deste documento. Assim, serviu-se de livros, revistas cientficas e artigos
disponveis na internet, sites de diferentes instituies e materiais acadmicos.
Tambm a visitao a locais paleontolgicos, alguns j com algum reconhecimento
turstico e outros completamente alheios indstria do turismo, contriburam para uma
melhor perceo do seu potencial turstico. Esta visita ocorreu no final de fevereiro
passado, com a visita s pegadas de dinossauro do concelho de Sesimbra e s arribas com
fsseis, na zona envolvente (Fig. 2 e 3). Este constituiu o segundo contato direto com o
patrimnio paleontolgico. Se o primeiro contato, atravs da visita ao LAP teria servido
para despertar a curiosidade acerca dos vestgios dos organismos do passado geolgico,
este segundo confirmou o interesse que este tipo de patrimnio poder despertar para a
atividade turstica e, ao mesmo tempo, o que esta atividade poder interessar para o
reconhecimento deste patrimnio.
Foi tambm realizado o acompanhamento a uma visita de estudo de alunos do ensino
secundrio, do Liceu Frei Lus de Sousa, a locais paleontolgicos, com a finalidade de
Figura 2 - Visita a arriba com fsseis
Fonte prpria (02/2013)
Figura 2 - Visita a arribas com fsseis
Fonte prpria (02/2013)
Figura 3 - Visita a jazida com fsseis
Fonte prpria (02/2013)
O Paleoturismo em Portugal: proposta de modelo de enquadramento e valorizao turstica do Patrimnio Paleontolgico
9
perceber a reao e atitude dos participantes, em contato direto com os stios
paleotursticos (Fig.4 e 5).
Nesta visita, foram ainda realizadas atividades ldicas, nas quais os alunos puderam
mostrar os seus conhecimentos. Foi criada uma quadrcula na qual foram colocados fsseis
e outros objetos, para os alunos identificarem os fsseis. Percebeu-se que os alunos se
interessaram pelo desafio e rapidamente identificaram os fsseis (Fig. 6).
Figura 6 - Atividade ldica com alunos de secundrio
Fonte prpria (02/2013)
Figura 4 - Visita de estudo de alunos de secundrio a jazida com fsseis
Fonte prpria (02/2013)
Figura 5 - Momento explicativo acerca da jazida com fsseis
Fonte prpria (02/2013)
O Paleoturismo em Portugal: proposta de modelo de enquadramento e valorizao turstica do Patrimnio Paleontolgico
10
Houve a participao na organizao de um evento cientfico (I Congresso
Internacional, O Cavalo e o Touro na Pr-Histria e na Histria), onde foram abordados
diferentes temas alusivos ao Touro e ao Cavalo, mas com contedos, alguns deles,
relacionados com a paleontologia. A interao com participantes do evento mostrou-se
proveitosa para este estudo, principalmente pelo debate de ideias que se proporcionou.
Tambm fez parte deste processo de investigao, a participao na organizao e
montagem da exposio permanente no NIDAP.CPGP, a qual proporcionou um
conhecimento mais aprofundado acerca da grande variedade de fsseis, e dos seus
respetivos enquadramentos.
Foi realizado o acompanhamento e participao em trabalhos de campo realizados
pelo CPGP, na zona do Cabo Espichel. Estes trabalhos contaram com participantes do
programa Investigao de Paleontologia no Cabo Espichel, um dos projetos de vero,
promovido pela Agencia Nacional para a Cultura Cientfica e Tecnolgica, atravs da
Cincia Viva (Fig.8). Esta atividade foi essencial para, perceber as fragilidades reais do
patrimnio paleontolgico; conhecer alguns dos processos e tcnicas que se devem adotar
na extrao de um fssil; perceber a interao que pode surgir entre o pblico juvenil e os
recursos, bem como para a consciencializao do que pode ou no ser desenvolvido,
enquanto atividade turstica, nas jazidas paleontolgicas.
Figura 7 - Contato dos participantes do estgio da Cincia Viva com uma jazida com fsseis
Fonte prpria (07/2013)
https://www.facebook.com/notes/centro-cpgp/i-congresso-internacional-o-cavalo-e-o-touro-na-pr%C3%A9-hist%C3%B3ria-e-na-hist%C3%B3ria/485180321502265https://www.facebook.com/notes/centro-cpgp/i-congresso-internacional-o-cavalo-e-o-touro-na-pr%C3%A9-hist%C3%B3ria-e-na-hist%C3%B3ria/485180321502265
O Paleoturismo em Portugal: proposta de modelo de enquadramento e valorizao turstica do Patrimnio Paleontolgico
11
Durante o perodo de investigao, foram ainda proporcionadas conversas informais
com investigadores ligados paleontologia. Estas conversas permitiram, por exemplo, tirar
concluses a cerca das necessidades sentidas do lado da paleontologia, e a forma como o
turismo poderia cooperar.
A ativao do patrimnio paleontolgico para fins tursticos uma prtica de sucesso
em alguns pases. O trabalho de investigao contou com o apoio de associaes
internacionais que promovem o turismo paleontolgico. Procurou-se conhecer casos de
sucesso, no estrangeiro, que pudessem ajudar a procurar solues para o territrio
portugus. Posteriormente foi estabelecido contacto com o Geoparque Paleorrota, no
Brasil; o Paleoparque Las Ventas, do Mxico e com a Andaluca Geolgica de Andaluzia,
Espanha.
Foi refletida uma definio de um termo que melhor representasse o nicho de mercado
que se pretende abordar. Aps algumas pesquisas e conversas informais com profissionais
das reas de turismo e da paleontologia, chegou-se escolha do termo Paleoturismo.
Passado alguns meses, da experincia de campo vivida pelos participantes do estgio
da Cincia Viva, solicitou-se-lhes um pequeno texto em que relatassem a sua opinio a
cerca desta atividade.7 Estes textos permitiram perceber o impacto que este tipo de
vivncias provoca em cada participante.
A realizao de inquritos foi pensada, mas no concretizada, por vrios motivos.
Primeiro, caso os inquritos fossem realizados a visitantes de locais paleontolgicos ou que
abordem o tema, com o curto perodo de elaborao deste trabalho no seria possvel
abranger as diferentes pocas do ano, e consequentemente todos os segmentos de
mercado8. Em segundo, caso os inquritos fossem realizados com base em contactos de e-
mail ou redes sociais, considerou-se que poderia ai haver alguma imparcialidade. Os
inquiridos iriam fazer parte dos contatos pessoais dos envolvidos neste projeto, ou quando
7 Textos em Anexo I Relatrios do estgio Cincia Viva no Vero 2013.
8 Existem diferentes pblicos potenciais mediante a poca do ano, influenciados
principalmente pelas condies climatricas e pelos perodos de frias escolares.
O Paleoturismo em Portugal: proposta de modelo de enquadramento e valorizao turstica do Patrimnio Paleontolgico
12
muito, de contatos de pessoas prximas a estes, por isso os resultados poderiam no ser os
mais corretos e fiveis. Em terceiro, a informao que se poderia retirar destes, no se
considerou demasiado pertinente para a presente investigao, tendo em considerao
alguma falta de organizao e enquadramentos verificados nesta rea. Considera-se, no
entanto que, na implementao prtica deste projeto ou num futuro Doutoramento dever
ser uma questo a no descurar.
Foi utilizado na elaborao desta dissertao suportes didticos de aulas de
licenciatura (Licenciatura em Turismo e Lazer, na Escola Superior de Turismo e Hotelaria
de Seia, do Instituto Politcnico da Guarda), pois porque o que foi apreendido no meio
acadmico passado ajuda a construir os novos conhecimentos. Neste sentido, a reviso de
alguns documentos de trabalho, desenvolvidos pelos docentes, ao nvel de licenciatura
mostraram-se pertinentes. O seu rigor e a sua clareza foram assim considerandos para este
trabalho, passando desta forma a constar na bibliografia utilizada. Apesar de pertenceram a
um nvel de ensino inferir, constituem-se uma mais-valia para o grau acadmico que se
pretende obter.
O Paleoturismo em Portugal: proposta de modelo de enquadramento e valorizao turstica do Patrimnio Paleontolgico
13
1. Enquadramento Contextual
Antes de interpretar o Paleoturismo deve abordar-se os dois domnios do
conhecimento que lhe do fundamento: a paleontologia e o turismo. Desta forma, este
ponto dedicado a ambas as temticas, sua contextualizao e importncia para o
territrio nacional.
1.1.Conceito de Paleontologia
O temo paleontologia surge em 1825 por Blainville, no entanto, s em 1834
integrado na literatura geolgica por Waldheim. A palavra paleontologia deriva de trs
conceitos gregos: Palais = antigo, ntos = ser e Logos = vida. Assim pode definir-se como
a cincia natural que estuda a vida do passado da Terra desde h 3,8 milhes de anos,
atravs de restos ou marcas dos seres vivos, preservados nas rochas sob a forma de
fsseis9.
A vida na Terra tem uma longa histria, da qual os fsseis so os testemunhos. A
tabela cronostratigrfica um importante instrumento para o estudo da evoluo, com base
na investigao estratigrfica da Terra (Fig. 9). Com o auxlio desta ferramenta possvel
ordenar temporalmente os acontecimentos, posicionar as sequncias estratigrficas e
compreender as transformaes dos continentes e oceanos.
9 CASSAB, 2004
O Paleoturismo em Portugal: proposta de modelo de enquadramento e valorizao turstica do Patrimnio Paleontolgico
14
Figura 8 - Tabela cronostratigrfica resumida
Fonte: Adaptado de Anexo II - Tabela Cronostratigrfica de Internacional
Aps a identificao das quatro diferentes Eras na tabela cronostratigrfica, passamos
a enunciar as principais caractersticas de cada uma delas.
O Pr-Cmbrico (4.600 a 542 Ma)
No decurso da formao do Sistema Solar, h cerca de 4600 Ma coliso de corpos
rochosos, resultantes da condensao de poeiras csmicas e de gases originou a Terra. No
final deste processo de acreo planetria, a temperatura muito elevada e a terra
encontra-se em estado de fuso, o que promove o afundamento dos elementos mais
pesados, o que originou a no so bem conhecidos os processos que levaram atual
estrutura concntrica da Terra: Crusta, Manto e Ncleo. A desgaseificao do magma e a
atividade vulcnica so os responsveis pela formao da atmosfera primitiva, ainda
O Paleoturismo em Portugal: proposta de modelo de enquadramento e valorizao turstica do Patrimnio Paleontolgico
15
desprovida de oxignio. Este gaz s foi emitido para a atmosfera pela fotossntese,
produzida pelas cianobactrias que apareceram h 3500 Ma. Devido ao arrefecimento, o
vapor de gua da atmosfera primitiva condensou-se, originando chuva e, desta forma, tero
aparecido os oceanos primitivos. 10
A Lua formou-se h cerca de 4.530 Ma, com resultado de um provvel choque de um
planeta do tamanho de Marte com a Terra, cujos fragmentos ficaram a gravitar em torno do
nosso Planeta e sofreram um processo acreo, originando a Lua. 11
Os primeiros vestgios orgnicos conhecidos so aminocidos com mais de 3.000
Ma, encontrados no Sul de frica, mas cuja origem ainda incerta. Numa formao do
Zaire, datada de h cerca de 2.700 Ma foram encontrados estromatlitos, estruturas
laminadas, formadas por camadas de algas azuis intercaladas por incrustaes calcrias.
No entanto, os primeiros verdadeiros fsseis foram encontrados no Canad (Gunflint) em
sedimentos com cerca de 2000 Ma, so restos silicificados de algas azuis e bactrias
(clulas procariotas com ncleo e cromossomas no distintos). As primeiras clulas
eucariotas tero aparecido h 1000 Ma. Foram encontrados fsseis na Austrlia (Bitter
Springs), com uma associao de algas (incluindo algas verdes) e fungos. Na Austrlia, em
Ediacara, foram encontrados os primeiros animais pluricelulares, numa associao fssil
com Celenterados, vermes e algas, datados de h cerca de 600 Ma, j em finais do Pr-
cmbrico (Fig.10). 12
10
FIGUEIREDO, 2008; FIGUEIREDO & CARDOSO, 2010; CASTELFRANCHI &
PITRELLI, 2002; LAMBERT, 1985; PALMER, 2002; PALMER 1999
11 Idem; Idem.
12 Idem; Idem; CASTELFRANCHI, Y & PITRELLI, 2002; LAMBERT, D, (1985);
PALMER, D, (2002); PALMER, D, (1999)
O Paleoturismo em Portugal: proposta de modelo de enquadramento e valorizao turstica do Patrimnio Paleontolgico
16
Figura 9 - Fauna Edicara
Fonte: http://trabalhogeologia.blogspot.pt (Acedido a 30/10/2013)
Paleozoico (542 250 Ma)
O Paleozoico a primeira Era do Fanerozoico, divide-se em seis perodos: Cmbrico,
Ordovcio Silrico, Devnico, Carbnico e Prmico. O Paleozoico comeou com um
evento a que os paleontlogos chamaram Exploso Cmbrica (a sbita difuso de
vrios grupos organismos), resultante do grande enriquecimento do registo fssil, pelos
primeiros organismos com partes duras. O Paleozoico ficou marcado pelo aparecimento
dos principais grupos de organismos, pelo domnio das trilobites nos mares, pelo
aparecimento dos primeiros vertebrados e pelas primeiras plantas terrestres, que tero
aparecido no Ordovcico e que permitiram aos animais que sassem das guas, pelos
primeiros insetos e, um pouco mais tarde, pelos primeiros anfbios, que depois evoluram
para os rpteis, os quais conseguiram a total independncia dos meios aquticos, devido ao
desenvolvimento do ovo amnitico. A evoluo das plantas e o desenvolvimento das
formas arbreas originou, no Carbnico, grandes florestas que cobriam grande parte das
terras emersas. No Prmico, os continentes juntaram-se, formando uma grande massa
continental: a Pangeia. O Paleozoico terminou com uma extino em massa, a maior da
histria da Terra: 96% dos gneros marinhos, 50% das famlias existentes e
desaparecimento total das Trilobites.13
13
Idem; Idem; Idem; Idem; Idem; Idem
http://trabalhogeologia.blogspot.pt/2011/03/o-periodo-pre-cambriano_02.htmlhttps://lh5.googleusercontent.com/-wjq9-g82L5w/TXArZGOgKjI/AAAAAAAAAA8/VvjZIkHgixg/s1600/ediacara[1].jpg
O Paleoturismo em Portugal: proposta de modelo de enquadramento e valorizao turstica do Patrimnio Paleontolgico
17
Figura 10 - Paisagem do Devnico, incluindo meios emersos e submersos
Fonte: http://www.ediciona.com (acedido a 30/10/2013)
Mesozoico (250 65 Ma)
O Mesozoico, a segunda Era do Fanerozoico, divide-se em trs perodos: Trisico,
Jurssico e Cretcico. O Mesozoico ficou marcado pela separao dos continentes, pelo
domnio dos dinossauros, em terra, pelos rpteis marinhos e amonites, nos mares e os ares
eram dominados pelos pterossauros, que, a partir do Jurssico, tiveram a companhia das
aves. No Trisico apareceram os mamferos e os dinossauros. O clima no interior da
Pangeia era desrtico. No final deste perodo extinguiram-se vrios grupos de rpteis,
como os antepassados dos mamferos (os terapsdeos). No Jurssico, com a fragmentao
da Pangeia, o clima tornou-se mais hmido e proliferaram grandes florestas de conferas,
Os dinossauros saurpodes dominavam as faunas de herbvoros. Apareceram as aves, que
descenderam de um grupo de pequenos dinossauros carnvoros, os maniraptora, e que na
atualidade representam a continuidade destes fabulosos animais. No Cretcico apareceram
as primeiras plantas com flor e os Mamferos marsupiais e placentrios os primeiros
antepassados dos primatas (o Purgatorius). Os saurpodes estavam em declnio e
emergiam outras espcies de dinossauros herbvoros. Apareceram os maiores carnvoros de
http://www.ediciona.com/
O Paleoturismo em Portugal: proposta de modelo de enquadramento e valorizao turstica do Patrimnio Paleontolgico
18
sempre, como o Tyranosaurus e o Spinosaurus. No final deste perodo extinguiu-se cerca
de 60% dos organismos, entre os quais todos os dinossauros no avianos (Fig. 12).14
Figura 11 - Paisagem do Jurssico com dinossauros e pterossauros
Fonte: http://geografiaplanet.blogspot.pt/ (Acedido a 30/10/2013)
Cenozoico (65 Ma - Atualidade)
O Cenozoico, a terceira Era do Fanerozoico, divide-se em trs perodos: Paleognico,
Neognico e Quaternrio, a era atual. Esta Era ficou marcada pelo desenvolvimento dos
mamferos e das aves, pelo domnio dos primeiros e pelo aparecimento, no final do
Paleognico, dos principais grupos de mamferos atuais e das gramneas. O incio do
Neognico ficou marcado por um clima tropical e pelo aparecimento das faunas atuais. O
final deste perodo caracterizou-se, pelo aparecimento do nosso gnero (o Homo) e pelas
glaciaes (no Quaternrio). No Holocnico, a atual poca geolgica caracterizou-se pelo
aquecimento do clima, extino das faunas glaciares, como o mamute, e pela
domesticao, pelo Homem, de plantas e animais (Fig. 13). 15
14
Idem; Idem; Idem; Idem; Idem; Idem
15 Idem; Idem; Idem; Idem; Idem; Idem
http://geografiaplanet.blogspot.pt/
O Paleoturismo em Portugal: proposta de modelo de enquadramento e valorizao turstica do Patrimnio Paleontolgico
19
Figura 12 - Paisagem com faunas do Plistocnico
Fonte: http://moblog.whmsoft.net (Acedido a 30/10/2013)
Segundo CACHO apud GAUUDRY, foi graas aos descobrimentos realizados no
campo da paleontologia, que a histria natural histria no sentido literal da palavra. Neste
sentido podemos considerar a paleontologia como uma cincia histrica pela prestativa
temporal que lhe veio conferir16
. Os conhecimentos da paleontologia vieram possibilitar o
conhecimento da evoluo do planeta, graas s interpelaes produzidas. Neste sentido
foi possvel perceber por exemplo, porque existem fsseis de restos marinhos em
montanhas bem distantes do mar. Para alm disto, a paleontologia ajuda a compreender a
deriva continental (Fig. 14). Relativamente s indicaes paleogeogrficas dadas pela
paleontologia importante destacar os casos de duas jazidas portuguesas com fsseis de
dinossauros: Andrs, em Pombal, e Casal Novo, perto da Batalha, onde se descobriram os
primeiros restos de Allosaurus (Andrs) 17
e de Stegosaurus (Batalha) 18
no continente
europeu, o que permite inferir que no Jurssico haveria passagem de faunas entre a Europa
16
Cacho M., 2007
17 MALAFAIA, et al., 2007
18 ESCASO et al., 2007
http://moblog.whmsoft.net/
O Paleoturismo em Portugal: proposta de modelo de enquadramento e valorizao turstica do Patrimnio Paleontolgico
20
e a Amrica do Norte e que os dois continentes estariam mais prximos do que se julgava.
19
Figura 13 - Representao simplificada da Deriva Continental entre o Cmbrico e o Plistocnico
Fonte: http://www.olmar.pt (Acedido a 22/10/2013)
Como relatado na revista cientifica National Geographic,
Quando os primeiros dinossauros surgiram no Trisico, o primeiro dos
trs perodos da era geolgica mesozoica, existia sobre a Terra um nico
continente gigante, chamado Pangeia; durante o apogeu dos
dinossauros, no Jurssico, Pangeia dividiu-se em duas partes, Laursia
e Gonduana; em finais do Cretcico, os continentes tinham uma forma
parecida com a atual, embora tivessem uma dimenso inferior, porque o
nvel dos mares era mais elevado e a ndia ainda era uma ilha a caminho
da coliso com a sia, de que resultariam os Himalaia. O mundo
transformava-se ento no que hoje.20
A paleontologia permitiu assim, atravs do seu objeto de estudo, interpretar os
vestgios de forma a compreender a evoluo cronolgica do nosso planeta. As seguintes
ilustraes tentam exemplificar, de uma forma compreensvel aos diferentes pblicos esta
evoluo (Fig.14 e 15).
19
FIGUEIREDO, 2013 b.
20 UPDIKE, 2007:2
http://www.olmar.pt/index.php?option=com_content&view=article&id=886
O Paleoturismo em Portugal: proposta de modelo de enquadramento e valorizao turstica do Patrimnio Paleontolgico
21
Figura 15 - Evoluo dos Tetrpodes Fonte: Imagem
cedida pelo NIDAP.CPGP
Figura 14 - Evoluo dos Tetrpodes~
Fonte: Imagem cedida por Silvrio Figueiredo
O Paleoturismo em Portugal: proposta de modelo de enquadramento e valorizao turstica do Patrimnio Paleontolgico
22
A paleontologia, cujo objeto de estudo so os fsseis deixados por organismos do
passado, uma cincia atual e complexa: atual, porque cada vez mais uma cincia
explorada, no s por cientistas e universitrios, mas tambm por todos os que se
interessam pela histria da Terra e pelos seres que a habitaram desde os tempos mais
remotos, desvendando um pouco mais a cerca das suas prprias origens e porque,
entendendo o passado possvel conhecer melhor o presente e prever o futuro; tambm
uma cincia complexa porque cada vez mais uma cincia multidisciplinar. O estudo dos
fsseis assume uma importncia crescente quando ajuda na preservao da biodiversidade
atual.
Um crnio fossilizado de uma baleia-azul com quase 2 mil anos
poder ajudar a evitar a extino desta espcie ameaada. Os vestgios
() vo agora ser alvo de um estudo cientfico para compreender qual a
evoluo da espcie e de que forma se pode impedir o seu
desaparecimento.21
Este um exemplo de como os estudos paleontolgicos podem proteger a
biodiversidade. Esta cincia estabelece ligaes com as cincias geolgicas e biolgicas,
utilizando os seus princpios e mtodos, ao mesmo tempo que lhes fornece informaes
importantes. Coopera ainda com outros domnios do conhecimento, tais como a
Matemtica, Estatstica, Climatologia, Qumica, Ecologia entre outras, com vista a uma
maior exatido dos dados22
. Como refere GAYRARD-VALY,
A Paleontologia exerce grande influncia sobre as outras
disciplinas naturalistas. Sem os recentes progressos da Paleontologia,
faltariam dados a algumas delas para levar por diante teorias prprias;
as suas descobertas em pontos precisos so necessrios para esclarecer
ou apoiar os trabalhos das cincias biolgicas, das cincias geolgicas,
das cincias humanas.23
21
MENDES, 2013
22 GAYRARD-VALY, 1984
23 Idem:11
O Paleoturismo em Portugal: proposta de modelo de enquadramento e valorizao turstica do Patrimnio Paleontolgico
23
Podemos esquematizar o objeto de estudo da paleontologia da seguinte forma:
Figura 16 - Representao Esquemtica dos diferentes tipos de fsseis
Fonte: Elaborao prpria
A paleontologia interessa-se pela anlise descritiva e interpretativa da vida, durante
os vrios perodos geolgicos, desde as primeiras formas de vida, que se conhecem no
registo fssil. Os documentos paleontolgicos so os fsseis, que podem ser
classificados pelo tamanho. Assim, e de acordo com o esquema elaborado, o fssil pode
classificar-se quanto sua dimenso: macrofsseis, para fsseis de dimenses
centimtricas ou mesmo maiores; microfsseis, para fsseis de dimenses milimtricas
mas que em raros casos podem atingir at os 10 cm e em nanofsseis para aqueles que
assumem dimenses to nfimas que s se podem ver com recurso a microscpio
eletrnico. Os fsseis podem ainda dividir-se em duas categorias principais: somatofsseis
e icnofsseis. Os somatofsseis, que so os restos ou vestgios de estruturas somticas, ou
seja restos fossilizados dos corpos de organismos, por exemplo os ossos e as conchas
fossilizadas (Fig. 16). Os icnofsseis, podem ser definidos como os vestgios de atividade
Tipo Caracteristi-
cas
Objeto de
estudo
Fossil
Dimeno
Macrofsseis
Microfsseis
Nanofsseis
Categorias
Somatofsseis
Icnofsseis
O Paleoturismo em Portugal: proposta de modelo de enquadramento e valorizao turstica do Patrimnio Paleontolgico
24
biolgica do passado, os quais podemos exemplificar com as pegadas, os ovos ou os
excrementos fossilizados (os coprlitos). 24
Figura 17 Evoluo dos ramos da paleontologia
Fonte: Elaborao prpria
Como demonstrado no esquema anterior, a paleontologia constituda por dois
ramos principais: a paleobotnica, que estuda dos vegetais e a paleozoologia, que estuda os
animais. Por sua vez, a paleozoologia divide-se em: paleontologia dos invertebrados e
paleontologia dos vertebrados (Fig. 17).25
Com base na da anlise dos invertebrados fsseis possvel estabelecer correlaes
cronoestratigrficas entre bacias distantes. O seu estudo permite delimitar provncias
paleobiogeogrficas devido boa disperso das larvas destes seres, como o caso dos
moluscos, ao mesmo tempo que possibilitam a obteno de dados acerca das temperaturas
e salinidade dos mares (como o caso dos equinodermes). Por sua vez, a paleontologia dos
vertebrados, desperta a curiosidade de muitos leigos, o que contribui para o avano
cientfico e divulgao desta rea. O estudo desta, possibilita a obteno de dados
paleobiogeogrficos e paleoecolgicos. A paleontologia dos vertebrados do quaternrio
encarrega-se ainda de estabelecer as ligaes entre estes seres e o Homem.26
24
Idem; MENDES,1988
25 FIGUEIREDO, 2008; 2010
26 FIGUEIREDO, 2008; 2010
Paleontologia
Paleozoologia
Paleontologia do Invertebrados
Paleontologia dos Vertebrados
Paleobotnica
O Paleoturismo em Portugal: proposta de modelo de enquadramento e valorizao turstica do Patrimnio Paleontolgico
25
A paleontologia abrange ainda outros ramos, como o caso da micropaleontologia,
que estuda os microfsseis, que permitem indicar a presena de jazidas de petrleo. A
indstria petrolfera impulsionou bastante a paleontologia, em especial a
micropaleontologia, uma vez que a explorao de petrleo possibilita um retorno
financeiro imediato. Para alm da sua importncia na identificao das jazidas de petrleo,
os microfsseis so bons indicadores de dataes de camadas. Existem ramos importantes
na Paleontologia, como a Paleoiconologia, que estuda os icnofsseis, e a Palinologia, que
estuda os plenes, fundamentais para os estudos de Paleoecologia. A Paleontologia desta
forma o alicerce para diferentes reas27
.
O termo fssil surgiu na poca clssica e teve vrias definies atravs dos tempos.
Para Plnio, no sculo I A.C., definiu-o como: o que se extrai escavando, j na Idade
Moderna, nos incios do sculo XVI, Agricola28
referia-se ao fssil como sendo um objeto
extrado do solo, de origem animal, vegetal ou mineral, atualmente pode ser definido
enquanto vestgios de estruturas somticas de paleorganismos, ou traos e marcas de
atividade orgnica, protegidos por processos geolgicos. 29
A importncia dos fsseis para a sociedade atual deve-se essencialmente ao fato de:
Os fsseis continuam a fornecer indcios sobre o processo de evoluo, adaptao e
sobrevivncia dos mamferos, enquanto as tecnologias genticas proporcionam novas
respostas a perguntas antigas sobre o nosso percurso evolutivo.30
Ora, o ser humano,
enquanto mamfero, interessa-se pelas origens e evoluo destes ltimos. Numa sociedade
cada vez inquieta por querer descobrir mais a cerca de si, os fsseis assumem um papel de
relevo, pois permitem conhecer melhor a origem do Homem e testemunham a natureza do
prprio ser humano.
27
Idem; Idem
28 Georgius Agricola (1494 1555) considerado o pai da geologia como cincia
29 GAYRARD-VALY,1984
30 GORE,2003:72
http://pt.wikipedia.org/wiki/1494http://pt.wikipedia.org/wiki/1555http://pt.wikipedia.org/wiki/Geologiahttp://pt.wikipedia.org/wiki/Ci%C3%AAncia
O Paleoturismo em Portugal: proposta de modelo de enquadramento e valorizao turstica do Patrimnio Paleontolgico
26
Superfcie terrestre
Os fsseis no devem ser apenas considerados como restos de seres vivos que
habitaram a Terra h milhes de anos, estes
so impresses deixadas quando os corpos mortos das criaturas
caram na areia, barro, cinza vulcnica ou outros materiais brandos e
apodreceram, desaparecendo e deixando um molde que foi preenchido
com minerais filtrados atravs do sedimento. Milhes de anos de lenta
acumulao, transformaram o sedimento brando em rochas, tais como
arenito, calcrio e xisto."31
Os fsseis de animais que desenvolveram partes duras nos seus corpos, como conchas
ou ossos, so os que melhor fossilizaram e os melhores locais para os encontrar so em
formaes sedimentares formadas no fundo do mar. Assim sendo, os fsseis que melhor se
preservam so os dos animais marinhos, que desenvolveram conchas ou carapaas, como
o caso das trilobites ou dos moluscos32
.
Figura 18 - Representao esquemticas do processo de fossilizao
Fonte: Elaborao prpria
31
GEE, 1997:11
32 Idem
O Paleoturismo em Portugal: proposta de modelo de enquadramento e valorizao turstica do Patrimnio Paleontolgico
27
O esquema (Fig.18) apresenta a transio de um resto orgnico do mundo biolgico
para o litolgico. O ser vivo morre ou deixa a sua marca superfcie da terra,
posteriormente submerso por sedimentos nos quais fossiliza. Este processo efeito da
ao de um conjunto de processos fsicos, qumicos e biolgicos que atuam no ambiente
deposicional.33
. Atualmente, devido a fatores diversos como a eroso, ou as aes do
Homem na natureza, os fosseis so frequentemente encontrados na superfcie terrestre.
Para alm de compreender os organismos e os ambientes do passado, os estudos
paleontolgicos tambm fornecem dados para o conhecimento da evoluo biolgica;
estimam a datao relativa das camadas; fornecem dados para a coluna cronoestratigrfica;
ajudam a reconstituir os paleoambientes, a paleobiogeografia e a paleoclimatologia;
fornecem dados para a reconstituio da histria geolgica da Terra e ajudam a identificar
rochas onde possam ocorrer substncias minerais e combustveis, dando apoio geologia
econmica34
.
Nas abordagens da paleontologia existem dois mtodos principais: um ligado a uma
abordagem mais conceptual, que tem como objetivo resolver questes ligadas aos fsseis e
as suas relaes na biosfera, num determinado tempo geolgico e outro que ao utilizar os
conceitos anteriores para a identificao dos organismos, estabelece correlaes
cronoestratigrficas e reconstituies paleoambientais35
.
Em suma, a paleontologia estuda os organismos que habitaram a Terra no passado.
Preocupa-se por entender as relaes entre os seres vivos, entre estes e o meio ambiente, e
a sua ordem no tempo. Procura conhecer, o melhor possvel, os seres vivos que precederam
os atuais, desde o seu modo de vida, s condies (ambientais e biticas) em que se
desenvolveram, as causas da morte ou da sua extino, e as possveis relaes evolutivas
em cada espcie. Assume uma grande importncia para o conhecimento, uma vez que
permite fazer a reconstruo das comunidades biolgicas e da ecologia passadas. Com o
recurso paleontologia possvel fazer a reconstruo dos continentes, saber as mudanas
33
CASSAB,2004
34 FIGUEIREDO, 2013a; MENDES,1988
35 Idem; Idem
O Paleoturismo em Portugal: proposta de modelo de enquadramento e valorizao turstica do Patrimnio Paleontolgico
28
climticas, as extines em massas e alteraes da fauna e flora ao longo dos tempos
geolgicos. A paleontologia uma cincia que estuda e investiga os diversos
documentos do passado, estando desta forma intimamente ligada histria da Terra e da
Vida.36
1.1.1- Breve Histria da Paleontologia e Histria da Paleontologia em Portugal
Para uma melhor compreenso do patrimnio paleontolgico, importa conhecer os
tipos de recursos paleontolgicos disponveis; a sua compreenso ao longo dos tempos; as
suas classificaes; a sua evoluo e importncia para o conhecimento cientfico.
1.1.1.1- Breve Histria da Paleontologia
Desde a pr-histria que os humanos se cruzaram com os fsseis, dando-lhes
alguma ateno, pois foram encontrados fsseis em algumas sepulturas de Homo
Neanderthalensis. No se sabe concretamente quando que o Homem se teria comeado a
interessar pelos fsseis, pensa-se que estes pudessem ter finalidades religiosas pela sua
presena em cultos religiosos como o caso das sepulturas. percetvel que os fsseis
sempre chamaram a ateno, a curiosidade e por vezes o interesse religioso das culturas da
antiguidade. Para alm dos enterramentos dos Neandertais, atrs referidos, conhecem-se
outros sepulcrrios do Paleoltico Superior, Neoltico e da Idade do Bronze, nos quais
aparecem fsseis associados aos esqueletos humanos37
.
Em Portugal, na necrpole neoltica de Aljezur, foram encontrados dentes de
tubaro do perodo Miocnico (cerca de 24 a 5 milhes de anos). Assim, pode-se
considerar que o homem pr-histrico j identificava os fsseis, embora no se perceba
concretamente qual o significado que lhes atribua. Pela falta de conhecimento atual a
36
Idem; Idem
37 FIGUEIREDO, 2008, 2010, 2013b
O Paleoturismo em Portugal: proposta de modelo de enquadramento e valorizao turstica do Patrimnio Paleontolgico
29
cerca do assunto, pode pensar-se que os fsseis poderiam ter uma conotao de magia ou
serem apreciados como objetos de adorno38
.
Tambm a medicina tradicional chinesa vale-se dos fsseis para tratamentos
clnicos desde os tempos mais remotos. O Jesuta e Acadmico Joo de Loureiro (sc.
XVIII) d conta de que dentes de drago e outros, serviam como absorbente
interiormente nas febres, nas dysenterias, nas diarrhas, nos tenesmos, , e
externamente sa uteis nas inflamaes, e apostemas39
.
Em diferentes civilizaes do passado histrico, os fsseis foram usados como
jias, como elementos decorativos ou curiosidades, no sendo normalmente entendidos por
essas sociedades. No entanto, alguns filsofos gregos e romanos reconhecessem os fsseis
como restos da vida passada. Segundo Aristteles (384-322 a.C.), os seres vivos teriam
surgido por gerao espontnea das rochas ou da lama e que os fsseis eram os exemplos
ou as falhas incompletas deste processo. J na Idade Mdia e Moderna foram
desenvolvidos trabalhos onde eram referidos os fsseis, mas sempre interpretados luz da
religio. S no Sculo XIX, com o surgimento da geologia, estratigrafia e paleontologia,
que se comeou a compreender que os fsseis representam os vestgios de animais que
viveram no passado geolgico 40
.
Os conhecimentos acerca dos fsseis tiveram vrios avanos e recuos. Em termos
muito generalistas pode-se interpretar a histria da paleontologia em quatro etapas ou
perodos:
Perodo Clssico: da antiguidade ao sculo XVIII
O denominado Perodo Clssico no tem uma datao de incio estabelecida, uma
vez que se desconhece a data concreta em que o homem toma contacto com os fsseis e os
comea a interpretar. Sabe-se, no entanto, que j na antiguidade, os egpcios e a Escola
Pitagrico Grega estavam sensibilizados para a temtica e encontraram uma interpretao
38
FIGUEIREDO, 2010
39 Idem, ANTUNES, 1986, 1992
40 Idem
O Paleoturismo em Portugal: proposta de modelo de enquadramento e valorizao turstica do Patrimnio Paleontolgico
30
dos fsseis marinhos, e dos processos de transformao, muito contempornea. No seculo
IV a.C., Xenfanes de Colofon, confirmou a verdadeira natureza das impresses vegetais
fsseis e, Herdoto interpretava um seculo depois os fsseis marinhos do vale do Rio Nilo.
Mais tarde, a Escola Platnico-Aristotlica desenvolveu novas interpretaes a cerca dos
fsseis. Para estes, existia a interveno de uma virtude plstica (vis plstica ou virtus
formativa) que atravs de uma semente, se formava e desenvolvia os fosseis na terra.
Defendiam existir um sumo lapidfico (sucus lapidescens) ou um sopro vindo do betume
terreste (aura betuminosa) que petrificaria os organismos. Este fenmeno resultaria da
ao que os raios solares provocavam na Terra.41
No incio do Cristianismo, o aparecimento de restos de animais marinhos longe do
mar, eram associados ao Dilvio e s suas vtimas, constituindo uma clara demonstrao
dos acontecimentos. Para Eusbio de Cesareia (263-339) os fsseis de peixes encontrados
em sedimentos no Lbano, eram considerados como uma prova da grandeza do Diluvio,
que teria coberto as grandes montanhas. O discpulo de Santo Agostinho, Paulo Osrio
(385?-423), defende a mesma interpretao, quando confrontado com molsculos, como
ostras, em serrarias afastadas do mar.
A retoma ideia da Escola Aristotlica s se d no seculo X, pelo mdico rabe
Abu Ibn Sinna, conhecido na Europa crist por Avicenna (980-1037), atravs da obra De
congelatione e conglutinatione lapidum, na qual explica a formao dos fsseis utilizando
o mesmo princpio. Nesta obra, defende que a vis plstica seria capaz de dar s pedras
formas semelhantes a animais e plantas, no conseguindo contudo dar-lhes vida. Os fsseis
resultariam de ensaios mal sucedidos da natureza para criar os seres vivos, conseguindo
unicamente imitar-lhes a forma.42
Na Renascena (seculos XV e XVI), permanecem as interpretaes que consideram
os fsseis um resultado de jogos da natureza (ludus naturae) no lhes atribuindo qualquer
valor cientfico, somente alvo de curiosidade. O naturalista da renascentistas Georg Bauer
(Agrcola) (1494-1555) admitiu que os fsseis resultariam de seres vivos que petrificavam
por ao do suco lapidificante (succus lapidescens). O espirito renascentista desperta, em
41
WEBSTER, 2000, FIGUEIREDO, 2010
42 Idem
O Paleoturismo em Portugal: proposta de modelo de enquadramento e valorizao turstica do Patrimnio Paleontolgico
31
mentes mais livres de preconceitos e providas de sentido critico, interpretaes acertadas
acerca dos fsseis, como foi o caso de Da Vinci e Palissy no sculo XVI. Para Leonardo
Da Vinci (1452-1519) as conchas fsseis encontradas pertenciam a seres vivos marinhos,
que tinham habitado tais terrenos antes ocupados pelo mar, retomando desta forma s
ideias pitagricas. O naturalista suo Konrad Gesner, contemporneo de Palissy, e autor
da obra De Rerum Fossilium, descreveu, figurou e organizou colees de fsseis, no
se manifestando, no entanto, de forma clara acerca da sua natureza.43
j no sculo XVII se prope uma origem biolgica dos fsseis, para interpretar o
aparecimento de grandes ossos de mamferos antigos. O maior contributo para esta
mudana de pensamento, surgiu do dinamarqus Niels Stensen, mais conhecido pelo seu
nome latinizado Nicols Stenon (1638-1686). Este, aps dissecar um gigantesco tubaro,
chegou concluso que as glossopetrae anteriormente imaginadas lnguas de serpente, no
eram mais do que dentes de tubaro verdadeiros que teriam vivido h muito tempo e cujos
restos teriam sido enterrados no fundo marinho primitivo. O ingls Robert Hooke,
contemporneo de Stenon, submetia os restos de organismos a processos de petrificao
para assim interpretar os fsseis. o comeo da explicao biolgica dos fsseis que ter o
seu desenvolvimento pleno no sculo XVIII. 44
Surge nesta poca uma nova justificao teolgica da extino das espcies,
resultado de uma associao do mito do Dilvio Universal Bblico interpretao
biolgica. Assim, os achados de fsseis marinhos em terra eram testemunhos da grande
catstrofe diluvial. Esta era uma ideia defendida, entre muitos autores, por Martinho Lutero
(1483-1546). Em hningen, perto do Lago Constana, na Sua, foram descobertos fsseis
do Miocnico superior (5 a 11 Ma), dos quais se destaca um esqueleto descrito em 1726
por Johann Jakob Scheuchzer (1672-1733), naturalista de Zurique. Este identificou-o como
uma testemunha do Dilvio o Homo Diluvii testis: filho da danao, por causa de cujos
pecados a catstrofe (o Dilvio) atingira o Mundo inteiro. Este possivelmente mais
caricato a que se abordou. A existncia deste fssil chegou ao conhecimento de Georges
Cuvier (1769-1832), um dos principais fundadores da Anatomia Comparada e da
43
Idem
44 Idem, FIGUEIREDO, 2010
O Paleoturismo em Portugal: proposta de modelo de enquadramento e valorizao turstica do Patrimnio Paleontolgico
32
paleontologia moderna, imediatamente o classificou, correlacionando-o com as atuais
salamandras gigantes. O Diluvialismo ia desta forma perdendo validade. 45
O Nascimento da Paleontologia: do sculo XVIII ao incio do sculo XIX
No sculo XVIII, o desenvolvimento cientfico assume importncia crescente.
Destacam-se na biologia o naturalista sueco Carl von Linn (1707-1778) que inicia a
sistemtica dos seres vivos na sua obra Systema Naturae, 1758; e Georges-Louis Leclerc,
conde de Buffon (1707-1788). Tambm Buffon, autor da Histoire Naturelle, apresentou
um amplo conhecimento dos animais. Cuvier, destaca-se neste processo de descodificao
dos fsseis, aliando os conhecimentos da zoologia e da botnica da poca ao estudo dos
animais e plantas fsseis encontrados, atravs da anatomia comparada. Aproveita ainda as
ideias de William Smith (1768-1839), iniciador da paleontologia estratigrfica, para os
situar num determinado perodo de tempo geolgico passado. Cuvier que laborou no
Museu de Histria Natural de Paris dedicou-se sobretudo investigao dos vertebrados.
No seu estudo, deparou-se com alguns fsseis de dimenses extraordinrias, muito maiores
do que as espcies atuais. Para explicar tais dimenses e o seu desaparecimento, Cuvier
apontou que a Terra sofria de poderosas convulses peridicas (as revolues do globo).
Nestas ocorreriam extines de muitos animais, e seriam seguidas por perodos de calma,
onde se surgiria uma nova criao.46
No foi s Georges Cuvier que nesta poca se dedicou ao estudo dos invertebrados,
Jean-Baptiste Lamarck (1744-1829), na sua obra "Historie Naturelle des Animaux sans
Vertbres" de 1802, lana a paleontologia dos invertebrados. Foi Lamarck quem lanou a
primeira teoria fundamentada sobre a evoluo dos seres vivos, que foi contestada pelo
prprio Cuvier, pois defendia uma viso catastrofista da Histria da Terra.47
45
Idem; FIGUEIREDO, 2013b;
46 Idem; Idem
47 Idem
O Paleoturismo em Portugal: proposta de modelo de enquadramento e valorizao turstica do Patrimnio Paleontolgico
33
Os ramos fundamentais da paleontologia surgiram na primeira metade do sculo
XIX com Brongniart na investigao da paleobotnica, Lartet na paeloantropologia,
Ehremberg na micropaleontologia e Alcide D'Orbigny no desenvolvimento da
paleontologia estratigrfica em toda a sua dimenso.48
O Evolucionismo e o Darwinismo: do sculo XIX a meados do sculo XX
Este perodo marcado por dois investigadores: Charles Lyell (1797-1875) e
Clarles Darwin. O gelogo Lyell defende a geologia moderna com o seu princpio do
uniformitarismo. Neste, sustenta que a natureza sempre manteve as mesmas leis, desta
forma os processos geolgicos desenvolvem-se de forma natural, devido a processos
fsicos, qumicos e biolgicos que atuam de forma lenta, gradual e continuada ao longo dos
tempos geolgicos. Lyell ps em causa o catastrofismo associado ao Dilvio, e estabeleceu
as bases para o desenvolvimento das ideias evolucionistas de Darwin. Os fsseis eram um
poderoso auxiliar do gelogo de campo que lhe permitiam datar os terrenos, pois
acreditava que estes correspondiam a unidades estveis com uma variabilidade muito
limitada e bem adaptados a um lugar prprio na natureza. 49
Darwin no se preocupou tanto pelo valor estratigrfico dos restos fossilizados, mas
sim pelo seu valor como testemunhos da seleo natural, e especialmente pela evoluo
das espcies. Na sua obra "On the Origin of Species", 1859, Darwin responsvel por
iniciar uma ligao muito proveitosa entre os aspetos biolgicos e geolgicos dos fsseis.50
No Perodo Atual
Atualmente os fsseis assumem um papel muito abrangente. No s continuam a ser
elementos importantes para o estudo da biostratigrafia, como tambm so essenciais para a
reconstituio de ecossistemas (paleoecografia); na organizao da distribuio espacial de
organismos antigos (paleobiogeografia) como nos estudos sobre Evoluo.51
48
Idem, FIGUEIREDO, 2008
49 Idem; Idem
50 Idem
51 Idem
O Paleoturismo em Portugal: proposta de modelo de enquadramento e valorizao turstica do Patrimnio Paleontolgico
34
1.1.1.2 - Breve Referncia Histria da Paleontologia em Portugal
Em Portugal, pode considerar-se que a mais antiga referncia a vestgios fsseis
conhecida remonta ao sculo XIII ou XV52
. Conta a lenda que um velho de Alcabideche
(localidade perto de Sintra) e uma velha da Costa da Caparica, ao dirigirem-se para o Cabo
Espichel, convictos de uma apario da virgem, tiveram uma viso: avistaram, Nossa
Senhora que vinha do mar para o topo do cabo, montada numa mula que subia a arriba,
assim esta ficou conhecida como a Pedra da Mua (ou Pedra da Mula), as pegadas que
ainda hoje se podem contemplar, so segundo a lenda, as marcas deixadas pela mula
montada pela Nossa Senhora e que afinal no so mais que as pegadas de dinossauros
saurpodes53
. As imagens abaixo retratam uma pequena descrio deste monumento
religioso e a sua imagem (Fig.18 e 19).
Figura 18 - Painel Informativo acerca da
"Ermida da Memria" - Cabo Espichel
Fonte prpria (07/2013)
52 Conforme a verso
53 FIGUEIREDO, 2008, 2010, 2013b; FERNANDES, 2005
Figura 19 - Ermida da Memoria - Cabo Espichel
Fonte prpria (07/2013)
O Paleoturismo em Portugal: proposta de modelo de enquadramento e valorizao turstica do Patrimnio Paleontolgico
35
Joo de Loureiro foi dos primeiros portugueses a descrever fsseis, sem fazer
qualquer relao de cariz religioso. Na sua pstuma de 1799, chega a comparar o homem
com o orangotango, animal que estudou enquanto viveu no Oriente. Loureiro tem uma
preocupao constante de carcter mdico e procura realar a utilidade como
medicamentos dos fsseis por si descritos54
.
Apesar da divulgao dos ndulos com fsseis de peixes do Cear, no Brasil, ter
sido feita por naturalistas alemes, provvel que a descoberta da jazida tenha sido feita
por portugueses, no final do sculo XIX. O naturalista portugus Alexandre Rodrigues
Ferreira (1765 1815) fez vrias recolhas de fsseis no Brasil. Apesar de no ter estado no
Cear55
.
Jos Bonifcio de Andrade e Silva (1777 1855) apresenta as primeiras
referncias, de cariz cientfico, feitas a fsseis, em Portugal. O naturalista nascido no
Brasil, efetuou variadas investigaes na rea da paleontologia, das quais resultaram
recolhas de fsseis, no entanto, descreveu-os muito sucintamente e, por isso, constituem-se
como investigao de pouca relevncia56
.
Aps os trabalhos de Jos Bonifcio, distinguem-se as figuras de fsseis publicadas
pelo baro Wilhelm Ludwig Von Eschwege (1777-1855), em 1831, de que se destacam
alguns rudistas (bivalves do Jurssico e do Cretcico que viviam em colnias recifais e que
possuam concha cnica) do Cretcico, dos arredores de Lisboa. Tambm de salientar
Alexandre Antnio Vandelli, pela publicao de desenhos e pela classificao (com boa
aproximao) de restos de cetceos e de peixes miocnicos, e que representam o incio da
paleontologia dos vertebrados em Portugal. O chamado ciclo ingls, da paleontologia em
Portugal foi iniciado por Daniel Sharpe (1806-1856) que ter vivido em Lisboa entre 1835
e 1838, observou e recolheu vrios fsseis em Portugal. Em 1853, Sharpe publica a obra
On the Carboniferous and Silurian Formations of the neighborhood of Bussaco in
Portugal, uma das suas obras de referncia acerca do Buaco. Nesta obra, entre vrios
54
Idem; Idem; Idem; Idem; ANTUNES, 1986, 1992
55 Idem; Idem; Idem; Idem; Idem
56 Idem; Idem; Idem; Idem; Idem
O Paleoturismo em Portugal: proposta de modelo de enquadramento e valorizao turstica do Patrimnio Paleontolgico
36
colaboradores estrangeiros, distingue-se o portugus Carlos Ribeiro, que viria a tornar-se
um dos mais notveis gelogos portugueses. James Smith, foi outro dos ingleses que se
distinguiu no estudo dos fsseis portugueses ao descrever novas espcies, a partir de
fsseis de miocnicos que recolheu na regio de Lisboa e que apresentou numa
comunicao, em 184157
.
S em 1848 surge a Comisso Geolgica e Mineralgica, criada pelo Estado
Portugus para o conhecimento geolgico do pas, por sugesto da Real Academia das
Cincias de Lisboa. No entanto, esta comisso chefiada pelo francs Charles Bonnet
obteve fracos resultados conduzindo sua extino uma dcada depois. A geologia e a
paleontologia em Portugal ganharam energia com a criao da Comisso Geolgica58
, em
1857, dirigida pelos portugueses Francisco Antnio Pereira da Costa (1809-1889),
Professor da Escola Polytechnica de Lisboa (atual Faculdade de Cincias de Lisboa) e por
Carlos Ribeiro, um acadmico muito ativo, muitas vezes considerado o pai da geologia e
da arqueologia pr-histrica portuguesas. Como adjunto foi nomeado Joaquim Filippe
Nery Delgado (1835-1908). Carlos Ribeiro trabalhou mais como gelogo de campo,
enquanto Pereira da Costa estava mais voltado para a investigao de gabinete. Esta dupla
de sucesso, conseguiram um trabalho notvel, at surgir desentendimento entre ambos.
Entretanto Pereira da Costa obtm a deslocao das colees para a Escola Politcnica
(1858) assim como a extino da Commisso Geolgica (1868), levando a que o governo
de ento criasse um ano depois os Servios Geolgicos de Portugal59
.
segunda Commisso Geologica, deve-se um vasto trabalho nas reas da geologia
e da paleontologia. Nesta altura destaca-se Pereira da Costa, que na sua obra descreveu
novos espcimes para a cincia e as ilustrou com estampas de admirvel qualidade. Pereira
57 Idem; Idem; Idem; Idem; Idem
58 Instituio que est na origem dos Servios Geolgicos de Portugal, mais tarde
transformado no Instituto Geolgico e Mineiro (IGM), que foi fundido, em 2003, no
Instituto Nacional de Engenharia, Tecnologia e Inovao (INETI). Com as novas fuses
e extines dos institutos pblicos, o antigo IGM ser integrado no novo Laboratrio
Nacional de Energia e Geologia (LNEG), instituio que ir tutelar o Museu Geolgico,
detentor das colees dos Servios Geolgicos.
59 Idem; Idem; Idem; Idem; Idem
O Paleoturismo em Portugal: proposta de modelo de enquadramento e valorizao turstica do Patrimnio Paleontolgico
37
da Costa, para alm de ter sido um nome de relevo para a geologia e paleontologia
nacional, realizou ainda alguns trabalhos de valor na rea da arqueologia. De entre as suas
publicaes, distinguem-se as memrias sobre moluscos miocnicos, de Lisboa e do
Algarve, com especial destaque para a jazida algarvia de Cacela, referida anteriormente.
Na rea da paleontologia, surge entretanto Nery Delgado, com importantes obras
acerca do Paleozoico, das quais se distingue o estudo sobre trilobites e cruzianas, algumas
das quais recolhidas por Carlos Ribeiro. A fundao dos Servios Geolgicos de Portugal
no em 1869 impulsionou a obra realizada pela Segunda Commisso Geolgica. Carlos
Ribeiro assumiu a chefia dos Servios Geolgicos, elaborou o levantamento geolgico do
pas, do qual resultou a recolha de inmeros fsseis e materiais arqueolgicos. Na
sequncia das diversas participaes internacionais e influenciado pelos trabalhos de
Darwin, envolver-se no movimento arqueolgico europeu e dedicou a ltima parte da sua
vida ao estudo dos antepassados do Homem nas formaes miocnicas e pliocnicas (24-2
Ma.) do Ribatejo, na zona da Ota. Esta sua investigao desencadeou a problemtica do
denominado Homem Tercirio Portugus, dando origem organizao, em 1880, do IX
Congresso Internacional de Antropologia e Arqueologia Pr-Histrica, por Carlos
Ribeiro, em Lisboa. Este congresso contou com a participao dos principais
investigadores destas reas a fim de debaterem sobre o Homem Tercirio Portugus"60
.
Nery Delgado que colaborou diretamente com Carlos Ribeiro, sucedeu-o na direo
dos Servios Geolgicos. Depois de 1878 de distinguir o suo Paul Choffat (1849-1919),
pelos trabalhos de investigao cientfi