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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AUTISMO E APRENDIZAGEM
MARIANA DE CARVALHO BURD FALCAO
ORIENTADORA
SIMONE FERREIRA
Rio de Janeiro
2011
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AUTISMO E APRENDIZAGEM
Rio de Janeiro
2011
Apresentação de monografia à Universidade Candido Mendes como requisito parcial para obtenção do grau de especialista em Psicopedagogia. Por: Mariana de carvalho Burd Falcao
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RESUMO
Este trabalho teve como objetivo apresentar o Autismo e a Escolarização. Este transtorno, que causa prejuízos em múltiplas áreas do desenvolvimento, interação, comunicação e comportamentos, se descoberto cedo pode ser tratado com procedimentos medicamentosos (em casos mais graves) e com a interação de profissionais, contribuindo para a melhoria da qualidade de vida dos indivíduos com autismo. Com isso, é importante sempre lembrar da importância da participação da família, da dedicação e aprofundamento profissional e do trabalho em grupo.
Palavras chave: Autismo, educação, aprendizagem.
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METODOLOGIA APLICADA
Como já mencionado no início, a presente monografia tem como objetivo central
levantar a visão de professores da educação básica sobre a educação de autistas no
ensino regular. Para isso, questões específicas foram abordadas para que esse objetivo
possa ser alcançado, como: apontar as possibilidades de diminuir o distanciamento
existente entre a educação “normal” e a educação de alunos autistas, levantar o conceito
de inclusão e autismo dos professores investigados e refletir sobre a educação de alunos
autistas.
Em um primeiro momento, a pretensão era fazer um estudo de campo onde
pudesse acompanhar a rotina de um aluno autista em sala de aula, observando e
registrando todo o seu cotidiano em sala. No entanto, as dificuldades para encontrar uma
escola com alunos autistas nas salas regulares de ensino foram muito grandes. Quando
encontrada a escola regular que tinha esses alunos matriculados, a resistência para
conseguir acesso a essa escola foi muito grande por parte das coordenadoras, pois, elas
não queriam “expor” a rotina do aluno e conseqüentemente a rotina da escola onde este
estava inserido. A característica da pesquisa mudou a partir de conversas sobre este
tema, onde percebeu-se que as opiniões eram muito confusas. O tema inclusão ainda é
um tema que gera polêmicas e controvérsias, e a idéia de inclusão é muito proveniente
do senso-comum. O conceito de autismo é um conceito muito cinematográfico, ou seja,
tudo o que sabem é muito proveniente do que os filmes sobre o assunto relatam.
Com isso, a partir de muitas leituras sobre o assunto autismo e inclusão, e após
essas conversas informais com professoras, fazer um levantamento, para que esses
objetivos pudessem ser alcançados com maior eficácia parecia ser a maneira mais
eficaz. O referencial teórico aqui trabalhado será em torno dos conceitos de autores
específicos sobre o tema abordado. Vale ressaltar que a discussão teórica não será uma
mera citação do que os autores pensam sobre o tema, e sim uma dialogicidade entre os
autores e suas principais idéias, ao analisar o material coletado na pesquisa, as
respostas serão vinculadas a estes autores, para que haja um diálogo produtivo a
discussão teórica não será apenas citações das melhores frases desses autores.
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3.1 Tipo de Pesquisa
O presente estudo classifica-se como uma abordagem qualitativa, sendo do tipo
exploratório e descritivo. A abordagem qualitativa tem como características principais: a
realidade sendo estudada de uma maneira holística, ou seja, levando em consideração
sua totalidade e não dividindo-a em variáveis. Este tipo de abordagem dá ênfase também
à interpretação, na compreensão das motivações, crenças, sentimentos, valores que
movem os sujeitos envolvidos que dão significado à realidade que está sendo estudada
no momento e não aos fatos observáveis e medidos estatisticamente. É uma abordagem
de estudo que leva em consideração a participação do pesquisador, onde este não é
neutro, ou seja, não há aqui a idéia de separação entre pesquisador e o objeto da
pesquisa; há, sim, uma reciprocidade entre eles (CANEN; 2003). Como é predominante
nos estudos qualitativos, a coleta de dados é descritiva, pois o material adquirido é
caracterizado pela riqueza na descrição de pessoas, situações e acontecimentos do
estudo.
3.2. Instrumento de Coleta
Para realizar esta monografia, foi realizada entrevistas, pois por sua natureza
interativa, a entrevista permite que temas complexos sejam abordados e explorados com
maior profundidade (MOZZOTTI; 1998). Segundo Goldenberg (1997) as vantagens da
entrevista consistem no fato de que é o instrumento mais adequado quando se pretende
trabalhar com assuntos mais complexos, pois as emoções e pensamentos dos
entrevistados são mais nítidos para o pesquisador. Há também uma maior profundidade,
pois a pessoa pode falar livremente sobre aquilo que está sendo perguntado e ainda
pode-se estabelecer uma relação de confiança e amizade entre entrevistador-
entrevistado, o que faz com que outros dados possam surgir no decorrer da entrevista.
Há várias maneiras de se estruturar uma entrevista. No caso do presente estudo a
entrevista foi padronizada, ou seja, foi apresentada a todos os entrevistados as mesmas
questões, de modo que todos respondessem à mesma pergunta. No entanto, as
perguntas foram estruturadas de maneira “aberta”, onde as respostas são livres, não-
limitadas, em que o pesquisado fala livremente sobre o tema proposto.
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Foram elaboradas cinco perguntas acerca do tema proposto. No caso das duas
professoras que têm alunos autistas em suas salas de aulas, foi pedido para que elas
relatassem sobre o processo de ensino-aprendizagem, o convívio e a rotina da criança
na escola. Foram elaboradas questões curtas, na intenção de não deixar o entrevistado
“cansado” de tanto ouvir a pergunta, e também para que este pudesse falar mais para
que uma maior fonte de dados fosse adquirida. A intenção de se fazer uma entrevista
menor no que tange à elaboração das perguntas foi também no intuito de respeitar mais
o tempo da entrevista, a intenção era deixar o entrevistado falar livremente sobre o tema.
As perguntas foram elaboradas pela autora deste estudo, onde a intenção era
realizar perguntas simples, porém objetivas, realizar perguntas pouco extensas, mas
obter respostas ricas e consistentes que pudesse ser de relevância para a análise dos
dados.
Para coletar o material da monografia foram entrevistadas sete professoras de
uma escola particular de classe média alta, localizada na Barra da Tijuca, no Rio de
Janeiro. Além de levantar a visão dessas professoras acerca da inclusão desses alunos
nas salas de ensino regular, a entrevista tinha como objetivo, também, perceber qual a
relação que elas fazem entre autismo e inclusão, o que elas pensam ser uma educação
inclusiva e se estas se sentem preparadas para a inclusão. Das sete professoras
entrevistadas, duas delas têm alunos autistas em sala de aula, o que pôde enriquecer
ainda mais a pesquisa.
3.3. Procedimentos de Aplicação do Instrumento
As entrevistas foram realizadas na própria escola, de acordo com a disponibilidade
das professoras entrevistadas. Todos os sujeitos analisados trabalham na mesma
escola, o que facilitou a realização das entrevistas. As professoras foram escolhidas
devido à vasta experiência que a maioria delas têm, não só como professoras desta
escola em especial, mas sim de outras tantas. Das sete professoras entrevistas.
3.4. Tratamento dos Dados
As entrevistas foram transcritas na íntegra minuciosamente para que a análise dos
dados fosse realmente feita através das respostas obtidas na entrevista. Após cada
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entrevista, estas já eram transcritas no mesmo dia, a fim de, ao realizar novas
entrevistas, poder dominar cada vez mais o tema no qual estava trabalhando.
As cinco perguntas propostas foram: o que é uma educação inclusiva; qual o
conhecimento sobre o distúrbio autista e como descrevê-lo; a opinião dos sujeitos
entrevistados sobre alunos autistas estudarem em classes de ensino regular; quais as
ações necessárias para que ocorra a inclusão dessas crianças no ensino regular e se
estas se sentiam preparadas para a inclusão. Ao longo das entrevistas, outras perguntas
foram feitas, devido às respostas dadas e como dito anteriormente, no caso das duas
outras professoras com alunos autistas em sala de aula, outras perguntas mais
específicas sobre estas crianças foram feitas, no entanto a “base” da entrevista se
caracteriza pelas cinco perguntas descritas acima.
3.5. Análise de Conteúdo
Esta seção se dará pela análise do conteúdo. A análise de conteúdo se caracteriza
por trabalhar com materiais textuais escritos. Existem dois tipos de textos no processo de
elaboração de uma pesquisa, e um desses é o que caracteriza este estudo, que se trata
da entrevista.
Segundo Bardin (2006) as técnicas de análise de conteúdo é composto de três
grandes etapas, são elas: a pré-analise; a exploração do material e por último o
tratamento dos resultados e interpretação. Foram analisadas os conteúdos a partir
dessas técnicas, com isso após as respostas dadas à entrevista terem sido transcritas na
íntegra, verificou-se a partir da leitura e releitura das respostas dos entrevistados
comparando as respostas dos professores no sentido de perceber em que aspectos elas
se pareciam e se diferiam uma das outras, para poder fazer uma análise mais profunda
acerca da visão desses professores e o porque desta visão. A partir desses dados
coletados foi feita uma ligação entre as respostas obtidas e o referencial teórico
trabalhado nesta monografia.
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SUMÁRIO
METODOLOGIA
INTRODUÇÃO
CAPÍTULO 1
COMPREENDENDO A INCLUSAO
1.1 – EDUCACAO ESPECIAL
1.2 O BRASIL E OPROCESSO INCLUSIVE
1.3 DADOS ESPECIAIS DA EDUCACAO
CAPÍTULO 2
TRANSTORNO AUTISTA
2.1 O CONCEITO DE AUTISMO E SUAS DIVERSIDADES
2.2 O AUTISMO E O PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM
2.3 AUTISMO E INCLUSAO
CAPÍTULO 3
METODOLOGIA APLICADA
3.1 TIPO DE PESQUISA
3.2 INSTRUMENTO DE COLETA
3.3 PROCEDIMENTOS DE APLICACAO DO INSTRUMENTO
3.4 TRATAMENTO DE DADOS
3.5 ANALISE DE CONTEUDO
CAPÍTULO 4
DISCUSSAO E ANALISE DE DADOS
CAPÍTULO 5
AUTISMO E INCLUSAO: VENCENDO BARREIRAS
5.1 O PROFESSOR NA OTICA INCUSIVA
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5.2 SUJEITO INCLUIDO, PROFESSOR, FAMILIA: UM PASSO A MAIS NO CAMINHO PARA INCLUSAO.
5.3 OS CONCEITOS DE CURRICULO, AVALIACAO, METODOLOGIA E PRATICA PEDAGOGICA.
5.4 A DIFERENCA NO PROCESSO INCLUSIVO
5.5 A FORMACAO DE PROFESSORES PARA UMA EDUCACAO INCLUSIVA
CONCLUSÃO
BIBLIOGRAFIA
APENDICE
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INTRODUCAO
A inclusão é um processo que vem se firmando cada vez mais. A Declaração
Universal dos Direitos Humanos proclamada pela ONU em 1948 iniciou a discussão
sobre uma educação inclusiva, na medida em que ela defende que todos os seres
humanos têm direito à educação.
Ao longo dos anos, conferências e declarações foram sendo instituídas para a
criação de uma sociedade inclusiva e também de uma educação inclusiva.
Uma das declarações sobre inclusão é a Declaração Mundial sobre Educação
para Todos, que ocorreu em Jomtiem, na Tailândia em 1990 (Unesco). Esta Declaração
procura reafirmar o direito à educação para todos estabelecida pela Declaração dos
Direitos Humanos. A Declaração de Jomtiem é um plano de ação para satisfazer as
necessidades básicas da aprendizagem.
Subseqüente à Declaração Mundial de Educação para Todos, ocorre em
Salamanca na Espanha em 1994, uma das mais conhecidas declarações sobre inclusão,
porém com foco voltado especificamente para portadores de necessidades especiais.
A Declaração de Salamanca afirma ser necessário uma educação capacitada para
reconhecer as diferenças, promover a aprendizagem, atender às necessidades de cada
criança. Ela é um documento sobre os princípios, a política e a prática educacional para
necessidades especiais.
Segundo o conceito de inclusão descrito no dicionário (Aurélio; 1993), a palavra
incluir tem vários significados, dentre eles: compreender; abranger; inserir; introduzir;
estar incluído ou compreendido; fazer parte etc.
Se nos basearmos por estas definições, diríamos que incluir significa acolher a
todos, e quando falamos de todos, isto significa acolher a todas as pessoas sem
discriminações.
No entanto, a questão da inclusão ainda não é consensual, ou seja, há várias
divergências a respeito desse conceito.
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Para alguns autores a inclusão é um processo, processo este que não pode ser
ensinado. Incluir é, em primeiro lugar, oferecer condições para que o sujeito participe
socialmente e exerça a cidadania (SANTOS; 2006). O conceito de inclusão abrange três
dimensões: culturas, políticas e práticas.
Uma das divergências sobre a inclusão está nas abordagens clínicas, que só
visam os deficientes, procurando garantir sua educação, mas separadamente, ou seja,
centrando em um único grupo. Neste conceito de inclusão eles focam as deficiências do
sujeito.
Esses conceitos, dimensões e divergências serão aprofundados posteriormente
em capítulos específicos sobre o assunto, por ora, basta entender que inclusão é um
assunto que gera controvérsias por parte dos estudiosos da área.
Ao afirmar que a inclusão acolhe a todos, significa que ela é voltada para os
portadores de deficiências físicas, mentais, para pobres, ricos, pessoas de diferentes
culturas, negros, brancos, enfim, para todos e principalmente para aqueles, que por
alguma razão, encontram-se excluídos de participação na sociedade.
Todavia, neste trabalho não discutiremos todas essas e outras possíveis
inclusões. Levando em consideração a grandeza do assunto, nos deteremos então, nos
portadores de necessidades especiais, enfocando exclusivamente o grupo dos autistas.
A presença de crianças autistas nas escolas regulares de ensino está diretamente
relacionada à questão da inclusão.
O autismo é um distúrbio conhecido, porém pouco estudado. Acredita-se que há
no Brasil mais de um milhão de casos de autismos não diagnosticados, devido à
inaptidão para reconhecer os sintomas.
A definição de autismo teve início em 1943 com Leo Kanner, psiquiatra austríaco,
radicado nos Estados Unidos, no artigo: Distúrbio autísticos do contato afetivo
(Disturbances of affective-contact).
Para Kanner o distúrbio central do autista é a dificuldade de se relacionar com
outras pessoas, escolhendo o termo autismo para ressaltar a questão do afastamento
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social. Para ele autismo era um distúrbio inato. Ele acreditava também que o autismo é a
incapacidade do indivíduo desenvolver o relacionamento social e a falta de imaginação.
Já Bleuler, psiquiatra suíço, acreditava que o autismo estava ligado à esquizofrenia, e
era um retraimento ativo do imaginário, um retraimento fora das relações sociais.
(LEBOYER; 1995).
Segundo Gary¹, diretor da Universidade da Carolina do Norte e da divisão
TEACCH, crianças autistas têm problemas na aprendizagem devido a alguns fatores,
como: dificuldades de organização, distração, dificuldade de seqüência e dificuldade de
generalização. No entanto, há diferentes níveis e graus de autismos fazendo com que as
dificuldades apresentadas não sejam as mesmas para todos.
Há muitos enfoques teóricos em torno do autismo e esses diferentes enfoques
dificultam uma análise concreta a respeito do conceito.
No DSM-IV (Manual Diagnóstico e Estatístico das Perturbações Mentais) criado
em 1994, o autismo é conhecido com um Transtorno Invasivo do Desenvolvimento (TID).
Este termo é usado para refletir sobre o fato de que múltiplas áreas de desenvolvimento
são afetadas, como: comunicação, interação social etc.
As características mais comuns de pessoas autistas são quatro: incapacidade de
desenvolver relações sociais, déficit no desenvolvimento da linguagem, respostas
anormais ao meio ambiente, em particular, estereotipias gestuais e resistência à
mudança e os sinais aparecem antes da idade de 30 meses (LEBOYER; 1995).
O meu interesse por autismo surgiu há muito tempo, ao conhecer, em uma
viagem, um menino com o diagnóstico de autista. O que mais me chamou a atenção nele
foi o seu comportamento, ele se movia para frente e para trás continuamente, totalmente
alheio ao que acontecia ao seu redor.
Até então, nunca tinha ouvido falar sobre esse distúrbio. Ao indagar as pessoas o
que era uma criança autista, as respostas obtidas eram sempre as mesmas; são
crianças que balançam o corpo para frente e para trás, vivem no seu “próprio mundo” e
se tornam agressivas quando são tiradas desse “mundo”. No entanto, ao longo do tempo
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e através de pesquisas para trabalhos acadêmicos sobre o assunto, percebi que o
conceito de autismo vai muito além disso.
No início da minha prática pedagógica não acreditava ser possível educar alunos
com deficiências em uma turma regular, pois eles eram diferentes dos demais, achava
que o melhor para eles seria que estudassem em escolas especiais. No entanto, não
basta apenas uma escola especial que acolha esses alunos com deficiências. É preciso
que eles aprendam também os conteúdos e saibam conviver em sociedade. É
necessário estudar as diferenças em vez de se concentrar nas deficiências.
Acredito ser relevante um estudo mais aprofundado sobre o conceito de autismo,
pois ainda há muita imprecisão sobre o assunto, e para que haja uma inclusão
educacional dessa camada da sociedade, é preciso conhecer essa parcela da
sociedade, entendendo seus dilemas para que a escola possa fornecer um ambiente
favorável para o seu desenvolvimento educacional.
Com isso, esta monografia tem como objetivo central levantar a visão de
professores da educação básica sobre a educação de autistas no ensino regular. Para
isso, serão abordadas questões especificas para que esse objetivo possa ser alcançado,
como: apontar as possibilidades de diminuir o distanciamento existente entre a educação
“normal” e a educação de alunos autistas, levantar o conceito de inclusão e autismo dos
professores investigados e refletir sobre a educação de alunos autistas. Este trabalho
será organizado em capítulos. O primeiro versará sobre a questão da inclusão, sendo
abordados seu conceito, os princípios que norteiam essa inclusão e as declarações mais
importantes relacionadas a ela.
Ainda dentro deste capítulo haverá seções destinadas à abordagem dos projetos
educacionais em prol da inclusão no Brasil, analisando sua “posição” atual nesta área.
O segundo capítulo será dedicado ao estudo do autismo, apontando os principais
enfoques teóricos e seus conceitos sobre este distúrbio. Abordaremos também as
dificuldades enfrentadas por autistas no seu processo ensino-aprendizagem e como
estas podem ser superadas, também será abordada a relação entre autismo e inclusão.
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O terceiro será destinado a metodologia aplicada para a realização deste
estudo,onde serão relatados como se organizaram as entrevistas, quais as dificuldades
encontradas, ou não, para a realização do trabalho, qual tipo de pesquisa e material
utilizado para a coleta dos dados, dentre outras coisas.
O quarto capítulo será específico para a análise dos dados coletados durante o
estudo, trabalhando de maneira profunda o que os entrevistados pensam acerca da
inserção desses portadores de necessidades especiais no ensino regular.
O quinto capítulo será destinado à tentativa de “trilhar” um caminho para a
inserção desses portadores de necessidades especiais em escolas regulares de ensino,
sem perda da qualidade da aprendizagem dos mesmos.
___________________
¹http: //www.ama.org.br
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CAPITULO 1
COMPREENDENDO A INCLUSAO
O objetivo deste capítulo é fornecer informações acerca do termo “inclusão” no
âmbito educacional. Para atingir este objetivo sera versado sobre o que vem a ser
inclusão na visão social e como esta se apresenta na prática pedagógica. Para isso, foi
analisado, primeiramente, como a inclusão vem se desenvolvendo ao longo dos anos,
tanto nacionalmente, quanto internacionalmente, através da análise dos projetos, leis,
conferências e declarações acerca deste assunto.
Neste capítulo, sera trabalhado os principais documentos sobre inclusão, inclusão
tanto das pessoas ditas “normais” quanto das pessoas conhecidas como “especiais”,
pois como visto mais adiante, inclusão não trata somente de incluir pessoas deficientes
no contexto social. Contudo, não se pretende ensinar ninguém a incluir ou como incluir,
pois inclusão não se ensina, e sim se vivencia. O objetivo principal deste capítulo é tentar
conscientizar o leitor da necessidade (re) pensar nossas idéias e práticas sobre o que
vem a ser inclusão.
Ao falar sobre inclusão, fala-se conseqüentemente em exclusão, pois para que
haja seres humanos necessitando ser incluídos é porque os mesmos, por alguma razão,
encontram-se excluídos socialmente.
No cenário brasileiro os processos de exclusão começam desde os tempos do
Brasil colônia, passando pelo Brasil Império, Brasil República (velha, nova e
contemporânea) agravando durante a ditadura militar (SAWAIA; 2004). Isso mostra que
os processos sociais excludentes estão presentes em toda a história.
Se a História sócio-cultural for analisada ficara nitido que esta questão inclusão-
exclusão é bastante antiga. Na época do Brasil-colônia verificou-se inúmeros tipos de
discriminações. Um princípio básico acerca da inclusão que distinguia determinadas
parcelas da população era o chamado princípio de sangue. Impuros eram os cristãos-
novos, os negros, mesmo quando libertos, os índios, os mestiços. Eles não podiam
ocupar cargos do governo, receber títulos de nobreza, entre outras coisas. Essa
distinção entre cristãos antigos e novos se dissipou em 1773 (FAUSTO; 1999). No
entanto, isso não significou o fim das discriminações.
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No decorrer dos séculos muitos foram os processos discriminatórios, como:
discriminação sexual (divisão entre homens e mulheres), discriminação religiosa
(católicos e cristãos), discriminação racial (negros e brancos) e muitos outros. (FAUSTO;
1999).
Essa questão de inclusão-exclusão vai muito além do contexto brasileiro, é uma
questão mundial. Como exemplo a Revolução Francesa ocorrida no século XVIII, que
tinha como lema: Igualdade, Liberdade e Fraternidade. Era uma luta de todo o povo
excluído contra qualquer tipo de autoritarismo, a favor da liberdade, democracia e
modernização. (MORAES; 1998).
Percebe-se que esse duo inclusão-exclusão muda de acordo com sua época e
necessidade. Inclusão é vista como um processo, pois ela vem sendo construída ao
longo do tempo, por isso não existe uma inclusão permanente. (SANTOS; 2006). A
inclusão é temporária, na medida em que o grupo de excluídos de hoje pode não ser o
mesmo de amanhã, ou seja, as prioridades inclusivas do presente podem não ser as
mesmas do futuro, pois novos excluídos surgirão e com isso, novas prioridades de
inclusão também.
Esta breve retrospectiva histórico-social mostra que desde sempre houve
indivíduos excluídos, exclusão essa, oriunda das mais variadas razões.
Esta dialética inclusão - exclusão gesta subjetividades especificas que vão desde
o sentir-se excluído até o sentir-se discriminado ou revoltado. Essas individualidades
determinam e são determinadas por maneiras diferentes de legitimação social e se
manifestam ao cotidiano como identidade, sociabilidade, afetividade, consciência e
inconsciência. (SAWAIA; 2006).
No entanto, muito já foi feito no âmbito da inclusão: documentos, diretrizes, metas
foram adotadas e ainda são, para se construir uma sociedade inclusiva, tais como:
Declaração dos Direitos Humanos (1948), Declaração de Salamanca (1994), Conferência
de Jomtiem (1990), Estatuto da Criança e do Adolescente (1990), LDB (1996) etc.
Apesar de não ser um documento voltado exclusivamente para a inclusão, a
Declaração Universal dos Direitos Humanos versa, mesmo que implicitamente, sobre
essa questão da inclusão social ao afirmar que:
Toda pessoa tem capacidade para gozar os direitos e liberdades estabelecidas nesta declaração, sem distinção de qualquer
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espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza... (Artigo II)
Ao ler este documento em especial, percebe-se a “preocupação” da ONU em
construir uma sociedade onde todos os seres humanos tenham seus direitos
respeitados, sem distinção alguma. A palavra distinção é a palavra-chave que caracteriza
essa inclusão. O dicionário, afirma que distinção é o “ato ou efeito de distinguir-se”.
Quando se distingui algo ou alguém mostra-se uma consideração especial, em outras
palavras, diferencia-se esse alguém ou algo, através de critérios estabelecidos pelas
pessoas e isso não cabe aqui, pois em termos de direitos, todos os seres humanos
devem ter acesso igualitário, ou seja, um negro tem o mesmo direito à liberdade, à
educação, ao lazer etc que o branco, o pobre, o rico tem, sem diferenciações.
Segundo Sawaia (2004) existem valores e representações do mundo que geram a
exclusão do indivíduo. Mas, primeiramente e necessário questionar, quem são esses
excluídos socialmente? Sawaia afirma também que os excluídos são aqueles rejeitados
de todas as riquezas espirituais, não tendo seus valores reconhecidos.
No entanto, excluído é também o “diferente”, aquele que não se enquadra nos
“padrões” impostos pela sociedade.. O problema é que a sociedade não presta a devida
consideração àqueles que são diferentes, àqueles que pensam e agem diferentemente
daquilo que considerado “certo”, certeza essa que vem a partir de valores, crenças e
princípios pessoais de cada um, perpetuados através das gerações. A tendência então a
categorizar, classificar e muitas vezes discriminar alguém por causa dessas definições
de “certo” ou “errado”, dialética essa que também leva à exclusão.
A inclusão é a luta contra a exclusão, no entanto ela não é somente isso, incluir é
também oferecer condições para que o indivíduo participe socialmente e exerça sua
cidadania. (OLIVEIRA; 2006). Entende-se por cidadania o
reconhecimento do cidadão, de seus direitos, deveres e participação, bem como pelo Estado. Sendo assim, a cidadania está vinculada à posse de direitos conquistados, unindo uma idéia de igualdade de direitos, não existindo cidadania sem direitos. Nesse caso, cidadão é aquele indivíduo que participa de uma mesma comunidade política na qual todos têm os mesmos direitos legalmente reconhecidos.
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Romper a relação existente entre a subordinação, discriminação e subalternidade
é ainda um desafio no combate à exclusão (SAWAIA; 2004).
A inclusão não pode ser ensinada e sim vivenciada através dos processos de
exclusão e dos excluídos que vão surgindo ao longo do tempo.
Como foi mencionado na introdução, segundo Santos (2006) há três dimensões
que norteiam o conceito de inclusão, são elas: culturas, práticas e políticas.
A dimensão cultural está relacionada à conscientização do indivíduo para ampliar
a participação dele na sociedade, desenvolvendo valores e crenças para que haja um
espaço de diálogo entre as diversas culturas e subjetividades.
A dimensão política refere-se às medidas - ações para diminuir esses processos
de exclusão, são explicitadas nos documentos oficiais de uma determinada instituição ou
governo.
A dimensão prática é a valorização do outro, é o que é feito no cotidiano
relacionado às políticas e às culturas.
Como dito anteriormente, as discussões sobre uma educação inclusiva se
iniciaram com a ONU, na conhecida Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948),
pois esta afirma que todos têm direito à educação:
1. Todo ser humano tem direito à instrução. A instrução será gratuita, pelo menos nos graus elementares e fundamentais. A instrução elementar será obrigatória. A instrução técnico-profissional será acessível a todos, bem como a instrução superior, esta baseada no mérito. 2. A instrução será orientada no sentido do pleno desenvolvimento da personalidade humana e do fortalecimento do respeito pelos direitos humanos e pelas liberdades fundamentais. A instrução promoverá a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e grupos raciais ou religiosos, e coadjuvará as atividades das Nações Unidas em prol da manutenção da paz... (Artigo XXVI).
Baseado no princípio de que todos devem ter acesso à educação da Declaração
da ONU, ocorre em Jomtiem, na Tailândia (1990) a Conferência Mundial sobre Educação
para todos, momento em que a sociedade se concentra em satisfazer as necessidades
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básicas da aprendizagem que são definidas na Declaração por: leitura, escrita e
matemática.
Esta conferência nos mostra a preocupação pela educação inclusiva, pois afirma
que:
- mais de 100 milhões de crianças, das quais pelo menos 60 milhões são meninas, não têm acesso ao ensino primário;
- mais de 960 milhões de adultos - dois terços dos quais mulheres são analfabetos, e o analfabetismo funcional é um problema significativo em todos os países industrializados ou em desenvolvimento;
- mais de um terço dos adultos do mundo não têm acesso ao conhecimento impresso, às novas habilidades e tecnologias, que poderiam melhorar a qualidade de vida e ajudá-los a perceber e a
tradaptar-se às mudanças sociais e culturais;
- mais de 100 milhões de crianças e incontáveis adultos não conseguem concluir o ciclo básico, e outros milhões, apesar de concluí-lo, não conseguem adquirir conhecimentos e habilidades essenciais.
Através desses trechos extraídos da própria Conferência ratifico a questão de que
os excluídos de uma sociedade mudam de acordo com o contexto social e político de
cada época.
O primeiro artigo da Conferência fala sobre as quatro necessidades básicas da
aprendizagem, essas necessidades abrangem os instrumentos essenciais para a
aprendizagem (leitura e escrita, expressão oral, cálculo, solução de problemas) e
abrange também os conteúdos básicos da aprendizagem (conhecimentos, habilidades,
valores e atitudes) que são para que os indivíduos possam sobreviver, desenvolver suas
potencialidades, ter participação social etc.
O terceiro artigo discorre sobre universalizar o acesso à educação e promover a
equidade, através de um padrão mínimo de qualidade da aprendizagem e também tomar
atitudes para diminuir as desigualdades entre os indivíduos.
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No âmbito educacional, um dos princípios fundamentais é a igualdade (SANTOS;
2006), mas não no sentido de generalizar o discurso e a prática, e sim no sentido de
valorizar as diferenças. No processo de inclusão educacional não há um “padrão” de
aluno, até porque padronizar é generalizar e generalizar é excluir, pois a generalização é
difundir um pensamento ou um modelo de sujeito igual, geral para todos.
É preciso um olhar cuidadoso a respeito dessa palavra igualdade na ótica
inclusiva, pois o igual aqui é em termos de direitos, direitos esses previstos por leis, na
Declaração de 1948, na Constituição de 1988, no restante somos diferentes, ou seja,
incluir é tratar diferenciado cada indivíduo, pois cada um tem suas particularidades e
características próprias.
Boaventura Sousa Santos² que explicita muito bem essa lógica: “hoje vivemos
num mundo muito desigual, mas aonde a igualdade não nos chega porque, além do
reconhecimento da igualdade, também queremos o reconhecimento da diferença”.
Sempre quando falamos em inclusão a palavra direito está relacionada, mesmo
que implicitamente no contexto. Vale a pena apontar quais são esses direitos, direitos
estes descritos na Constituição de 1988; são eles: direitos sociais, direitos civis e os
direitos políticos (OLIVEIRA; 2006).
Na Constituição (1988) esses direitos estão caracterizados da seguinte maneira:
Título II, Cap. I – (art.5º) Dos direitos e deveres individuais e coletivos.Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantido-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.
Cap. II – Dos direitos sociais (art. 6º) São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados... Cap. IV-Dos direitos políticos (art.14º). A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e nos termos da lei...
Apesar de existirem inúmeros documentos sobre o direito de todos terem seus
direitos assegurados, a nossa dificuldade em lidar com as diversidades prejudica a
concretização desses direitos.
21
Retomando a Conferência de Jomtiem (1990), a necessidade de promover uma
educação duradoura implicou em três objetivos que trouxeram conseqüências à
Educação Especial (SANTOS; 2006). Os objetivos são: metas para aumentar o número
de crianças na escola; providencias para assegurar a permanência da criança na escola
por um tempo suficiente para que ela possa obter uma escolarização benéfica e reformas
educacionais que incluam nos currículos escolares e através também dos professores
serviços que atendam as necessidades de seus alunos.
_____________
² http://www.correioweb2.com.br/cw
Segundo as Diretrizes Nacionais para a Educação na Educação Básica (2001),
Educação Especial deve garantir a educação escolar e promover o desenvolvimento dos
educandos com necessidades especiais.
A educação especial deve ocorrer em todas as escolas (públicas ou privadas),
baseada nos princípios da educação inclusiva, assegurando condições para o sucesso
condições para o sucesso escolar de todos os alunos. Contudo, sabe-se que na história
das sociedades a exclusão de pessoas com necessidades especiais é ainda mais forte e
intensa.
1.1 Educação Especial
A questão da exclusão de portadores de necessidades especiais é também um
assunto bastante complexo.
A História das sociedades revela que os preconceitos, discriminações,
perseguições e violência contra os deficientes existem desde a Antiguidade. Aceitar
aqueles que estão longe dos padrões estabelecidos pela sociedade é uma situação que
vem desde daquela época e persiste até os dias de hoje.
Em Esparta, na Grécia as crianças com deficiências eram deixadas nas
montanhas. Em Roma, os pais podiam, por direito, abandonar seus filhos recém-
nascidos, casos estes tivessem alguma deficiência.
Na Idade Média, deficientes mentais eram excluídos da sociedade, pois
acreditavam que eles eram possuídos por demônios.
22
Na Revolução Industrial, surge uma nova parcela de deficientes, aqueles que
sofreram mutilações, lesões sensoriais e doenças mentais devido às condições
inapropriadas de trabalho (SOUZA; 2003).
Como pode observar, a exclusão dos portadores de necessidades especiais
existe desde os primórdios da sociedade humana ocidental.
A partir da segunda metade do século XX uma série de documentos foi sendo
elaborada para uma maior participação dos portadores de necessidades especiais na
vida social.
Na primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação de 1961 (Lei nº 4.024 / 61) já
havia alguns itens relacionados aos portadores de necessidades especiais, que na época
eram intitulados “excepcionais”, afirmando que a educação dos portadores de
necessidades especiais deveria “encaixar-se” no sistema geral da educação.
Na atual LDB (Lei nº 9.394/ 96) a educação especial abrange todos os alunos
portadores de deficiências, sejam elas físicas, visual, auditiva, mental, transtornos na
aprendizagem etc.
Além da Conferência de Jomtiem (1990), muitos documentos têm sido criados
para que essas exclusões possam diminuir.
Proveniente desta Conferência é feita a Declaração de Salamanca, na Espanha
em 1994, uma das mais conhecidas declarações para portadores de necessidades
educacionais especiais.
Duas grandes preocupações serviam de base para a organização da Conferência
Mundial sobre Educação para Necessidades Especiais, são elas:
01. Garantir que cada criança, incluindo aquelas com necessidades especiais, tenham acesso às oportunidades educacionais e 02. Trabalhar no sentido de assegurar que tais oportunidades representem uma educação de qualidade.
Com isso, ficam claros os objetivos da Declaração que eram a inclusão de todas
as crianças nas escolas e a reforma dos sistemas de ensino para que essa inclusão
possa ser possível.
23
A partir desses objetivos os 88 governos e 25 instituições internacionais acreditam
e proclamam que:
- toda criança tem direito fundamental à educação, e deve ser dada a oportunidade de atingir e manter o nível adequado de aprendizagem, - toda criança possui características, interesses, habilidades e necessidades de aprendizagem que são únicas,
- sistemas educacionais deveriam ser designados e programas educacionais deveriam ser implementados no sentido de se levar em conta à vasta diversidade de tais características e necessidades,
- aqueles com necessidades educacionais especiais devem ter acesso à escola regular, que deveria acomodá-los dentro de uma Pedagogia centrada na criança, capaz de satisfazer a tais necessidades,
- escolas regulares que possuam tal orientação inclusiva constituem os meios mais eficazes de combater atitudes discriminatórias criando-se comunidades acolhedoras, construindo uma sociedade inclusiva e alcançando educação para todos; além disso, tais escolas provêem uma educação efetiva à maioria das crianças e aprimoram a eficiência e, em última instância, o custo da eficácia de todo o sistema educacional.
A Declaração procura afirmar o princípio e discutir a prática de como garantir que
as crianças com necessidades educacionais especiais sejam incluídas numa sociedade
de aprendizagem. Segundo a Declaração, entre as 200 milhões de crianças do mundo
sem acesso à educação, uma parcela significativa delas tem necessidades educacionais
especiais.
A questão das crianças com necessidades especiais é brevemente citada no
relatório final da Conferência de Jomtiem (1990) e em outras conferências.
Embora o acesso à educação seja um direito humano, entre os indivíduos com
necessidades especiais há uma parcela considerável que tem sido ignorada
freqüentemente (UNESCO; 1994).
As estimativas mostram que somente 1% das crianças e adultos com deficiências
recebem o suporte necessário (UNESCO; 1994).
24
Com isso, a Conferência de Salamanca proveu a primeira significativa
oportunidade internacional para construir a partir dessas iniciativas e para assegurar que
as crianças com necessidades educacionais especiais, independentemente de como
forem definidas, sejam incluídas nos planos locais e nacionais de abertura das escolas a
todas as crianças e asseguradas de que as escolas se tornem centros prazerosos e
desafiadores de aprendizagem. (p. 6 da Declaração).
1.2 O Brasil e o processo inclusivo
Analisando o Brasil e a inclusão atualmente o MEC- Ministério da Educação- vem
desenvolvendo programas voltados para a inclusão de alunos com necessidades
especiais nas classes regulares de ensino.
Iniciado em 2004, o Projeto Educar na Diversidade, criado pela Secretaria de
Educação Especial (SEESP) tem como objetivo a formação e também acompanhamento
de docentes de 144 municípios-pólos para que se desenvolvam práticas educacionais
inclusivas nas salas de aula.
A finalidade do projeto é promover a inclusão educacional e desenvolver meios
para que os docentes possam responder às diversidades dos alunos.
O projeto oferece recursos teóricos, didático e pedagógico para que os alunos
possam aprender os conteúdos em sala de aula. Ele focaliza sua atenção nos alunos
excluídos do sistema educacional e dos que enfrentam obstáculos na aprendizagem.
Os objetivos do projeto são: desenvolver escolas e práticas de ensino inclusivas a
fim de combater a exclusão e responder à diversidade de estilos de aprendizagem nas
salas de aula; formar professores do ensino regular para usarem estratégias de ensino
inclusivas; preparar educadores e a comunidade escolar para apoiar o desenvolvimento
docente para a inclusão; transformar o ambiente escolar em um espaço inclusivo (MEC;
2008).
Um outro grande passo no caminho para uma educação menos segregacionista
foi a aprovação, na Conferência Nacional da Educação Básica de que alunos com
deficiências, altas habilidades ou transtorno têm direito de se matricularem em classes
25
regulares de ensino. A conferência rejeitou a proposta de continuar a oferecer escolas e
classes especiais para substituir a escolarização (MEC; 2008).
Criada para ser responsável pela gestão de políticas voltadas para a integração
das pessoas portadoras de deficiência- a CORDE- Coordenadoria Nacional para
Integração da Pessoa Portadora de Deficiência tem como foco a defesa dos direitos e o
exercício da cidadania dessas pessoas. A CORDE é um órgão de Assessoria da
Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República.
Em 1999, ocorre o decreto N.º 3.298, este decreto regulamenta a Lei n.º 7.853, de
24 de outubro de 1989, dispõe sobre a Política Nacional para a Integração da Pessoa
Portadora de Deficiência, consolida as normas de proteção, e dá outras providências.
Este novo decreto reafirma que:
A Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência compreende o conjunto de orientações normativas que objetivam assegurar o pleno exercício dos direitos individuais e sociais das pessoas portadoras de deficiência. (Artigo I).
Cabe aos órgãos e às entidades do Poder Público assegurar à pessoa portadora de deficiência o pleno exercício de seus direitos básicos, inclusive dos direitos à educação, à saúde, ao trabalho, ao desporto, ao turismo,ao lazer, à previdência social, à assistência social, ao transporte, à edificação pública, à habitação, à cultura, ao amparo à infância e à maternidade, e de outros que, decorrentes da Constituição e das leis, propiciem seu bem-estar pessoal, social e econômico.(Artigo II).
Do final do século XX até os dias atuais muitos avanços ocorrem também no
âmbito da Educação Especial. Documentos recentes como: Diretrizes Nacionais da
Educação Especial para a Educação Básica (2001); Plano Nacional de Educação (2000)
e Plano de Desenvolvimento da Educação (2007) nos mostra a preocupação com está
parcela da sociedade.
O Plano Nacional de Educação (2000) baseia-se na Constituição Federal de 1988
para ressaltar o direito dos alunos com necessidades especiais estudarem na rede
26
regular de ensino. Em seu artigo 208 III, a Constituição Federal Brasileira “estabelece o
direito das pessoas com necessidades especiais receberem educação preferencialmente
na rede regular de ensino”.
O PNE afirma que uma das tendências recentes do sistema de ensino é a
inclusão de alunos com necessidades especiais na classe regular de ensino caso não
seja possível, devido às necessidades individuais de cada aluno, o atendimento será
realizado em escolas ou classes especializadas.
Para o PNE, o grande avanço do país seria a construção de uma escola inclusiva
que possa assegurar o atendimento à diversidade humana.
No ano de 2001 é elaborada as Diretrizes da Educação Especial para a Educação
Básica, segundo as Diretrizes a inclusão reformula o sistema educacional com o objetivo
de tornar a escola, uma escola inclusiva. O conceito desta escola acarreta em uma nova
postura da escola comum, onde no projeto pedagógico (currículo, metodologia de ensino,
avaliação e atitude dos educadores) haja ações que favoreçam a interação social e a
escolha por práticas heterogêneas.
Elaborado em 2007, o Plano de Desenvolvimento da Educação prevê alguns itens
direcionados à educação especial, como a criação de salas multifuncionais qualificadas
para atender alunos com necessidades especiais. Há também a criação do programa de
formação continuada de professores na educação especial.(MEC /2008). Em decorrência
dessas e de muitas outras medidas em prol de uma educação menos segregacionista, o
caminho para a inclusão são mais satisfatórios, facilmente visto nos dados da educação
especial no Brasil.
Assegurar uma educação básica de qualidade é a prioridade do Plano de
Desenvolvimento da Educação. Ao elaborar este Plano o MEC considerou, dentre outras
documentos, a Declaração de Jomtiem sobre Educação para Todos. (UNESCO;2007).
1.3 Dados da Educação Especial
O Censo Escolar de 2006 (MEC) mostra que o atendimento inclusivo referente a
pessoas com deficiência no Brasil cresceu, indo de 24,7% em 2002 para 46,4% em
2006.
27
Entre 1998 e 2006, o número de crianças com necessidades especiais em classes
comuns do ensino regular subiu consideravelmente, houve um aumento de 640% de
matriculas desses alunos em classes regulares de ensino, passando de 43.923 alunos
em 1998 para 325.316 em 2006.
Todas essas estatísticas e os projetos inclusivos mostram que há um interesse
para que os direitos dos indivíduos com necessidades especiais sejam garantidos no
sistema educacional.
Com relação à inclusão de crianças autistas na sociedade, alguns passos têm
sido dados. No dia 02 de abril de 2008 a ONU realizou o primeiro dia Mundial da
Conscientização do Autismo, com o discurso de melhorar as condições de vida das
pessoas que têm este transtorno, que segundo a ONU, cada vez mais afeta uma
proporção maior da população infantil.
O entao secretário da ONU afirmou que devem ser criados ambientes que
possibilitem que crianças autistas cresçam como membros de suas comunidades,
exercendo o direito a sua cidadania e participem da “comunidade global”. No que tange a
inclusão de autista no cenário brasileiro, são trabalhados nos seminários nacionais e nos
cursos de formação realizados nos municípios-pólos alguns eixos temáticos e um desses
eixos é a inclusão de alunos com autismo.
Ainda há muitas coisas a serem feitas, no entanto a conscientização de que
alunos autistas e com outras necessidades especiais tenham os direitos previstos na Lei
garantidos, não deixa de ser um passo importante em prol de uma educação menos
segregacionista.
28
CAPITULO 2
TRANSTORNO AUTISTA
O objetivo deste capítulo é fornecer subsídios para uma melhor compreensão do
que é o transtorno autista, como se dá seu processo de ensino-aprendizagem, mostrar
alguns métodos utilizados para o ensino desses indivíduos e compreender o que a
história nos relata sobre este transtorno. Compreender o autismo não é fácil, pois há
muitas diversidades acerca do conceito e etiologia, para entendermos realmente o
autismo é preciso uma revisão contínua sobre nossos valores, crenças e conhecimentos,
é despir-se de preconceitos no âmago de nosso ser e aprender a lidar com aqueles que
são diferentes.
Em linhas gerais, o autismo caracteriza os indivíduos que têm um distúrbio do
desenvolvimento, há nos autistas uma grande deficiência na socialização, comunicação,
imaginação e um interesse restrito. Ao longo do capítulo essas características serão
aprofundadas e outras mais na intenção de um melhor conhecimento dessa camada da
sociedade.
Desde a década de 1940, quando ocorreram as primeiras publicações em torno
do conceito de autismo, pelo psiquiatra Leo Kanner, ninguém, até os dias atuais pode
afirmar precisamente o que é o autismo.
Apesar das questões sobre autismo se tornarem conhecidas na década de 1940
por Leo Kanner, muito antes disso o termo “autista” já era usado para designar certos
pacientes. Em 1911, o psiquiatra Eugen Bleuler relacionava o autismo a um transtorno
básico em esquizofrenia (FRITH; 1989). Segundo o conceito de Bleuler, o autismo nos
esquizofrênicos estava ligado a um retraimento do imaginário e a uma vida imaginária
rica (LEBOYER; 1995). No entanto, pacientes com esquizofrenia e autismo não se
assemelham, pois segundo Frith (1989):
Os sintomas positivos mais característicos da esquizofrenia dizem respeito a ouvir vozes e acreditar que há mensagens pessoais significativas no ambiente. As vozes e crenças são experiências subjetivas que o paciente é capaz de comunicar às outras pessoas. Pessoas autistas articuladas que relataram suas experiências dão relatos bem diferentes daqueles que os pacientes esquizofrênicos. Além disso, fases de crise esquizofrênicas agudas freqüentemente são alternadas com longos períodos em que a normalidade é novamente estabelecida.
29
As muitas controvérsias e polêmicas devido à diversidade de teorias e operações
acerca do assunto dificultam os possíveis meios de intervenção (BOSA; 2002).
Desde a década de 1940, muito conhecimento vem sendo acumulado devido às
publicações de Leo Kanner (1943) e Hans Asperger (1944). Kanner observou nas
crianças que atendia uma ausência do relacionamento interpessoal, afirmando que essas
crianças eram incapacitadas de estabelecerem relações normais com pessoas e
situações (BOSA; 2002).
Observou também um atraso na linguagem de alguns pacientes. A questão da
linguagem não está restrita à fala, pois, é possível a comunicação sem o uso da mesma,
sendo a recíproca verdadeira. A fala está presente em alguns casos, mas não para fins
de comunicação ou interação social (BOSA; 2002). No entanto, alguns pacientes de
Kanner falavam, mas a fala era somente para nomear objetos, adjetivos indicando as
cores, o alfabeto e não para a comunicação em si.
Para um bom desenvolvimento da criança, os dois primeiros anos de vida são
fundamentais, por isso devemos levar em consideração o fato da comunicação e da
linguagem terem início quando a criança nasce. Mais ou menos, no segundo ano de
vida, a criança ainda não fala corretamente, não estrutura uma frase completa nem narra
corretamente os acontecimentos vividos. No entanto, nessa faixa etária a criança já é
comunicativa, sua comunicação se dá através de gestos, resposta a estímulos, interação
com pessoas e com situações (SCHEUER; 2002).
Aproximadamente aos dezoito meses de vida, a criança já fala um número
considerável de palavras, o vocabulário começa a aumentar quando elas passam a
perceber que algumas palavras descrevem os objetos e que essas palavras podem ser
utilizadas para comunicar-se com outras pessoas.
No período dos dois aos cinco anos, a linguagem da criança evolui, passando de
uma só palavra para uma forma gramatical mais estruturada. A linguagem dá lugar
então, a um pensamento concreto, que reflete os fatos e acontecimentos relacionados ao
seu cotidiano (SCHEUER; 2002).
30
Essas etapas do desenvolvimento da comunicação e da fala da criança nem
sempre ocorre da maneira descrita acima, nas crianças autistas as formas de
comunicação (gestos, choro, expressões faciais) e o desenvolvimento da linguagem são
comprometidas, a maior parte dos autistas começam a falar mais tarde e de uma
maneira mais lenta. Pesquisas apontam que em média, 25% das crianças com TGD
(Transtorno Global do Desenvolvimento) falaram algumas palavras em torno de 12 a 18
meses de idade, perdendo-as posteriormente. Algumas crianças param de falar
definitivamente enquanto algumas retêm poucas palavras, elas não mostram intenção
de se comunicar e as formas que se comunicam são inteligíveis (SCHEUER; 2002).
Um conceito muito mencionado em crianças autistas é a ecolalia. Existem dois
tipos de ecolalia, a ecolalia imediata que se caracteriza pela repetição de palavras
produzidas por alguém logo após serem ouvidas e a ecolalia diferida que é a repetição
de algo que foi falado e ouvido no passado. Há também um outro aspecto acerca da
linguagem de crianças autistas que é a inversão pronominal, que ocorre quando o
sujeito usa a 3º pessoa para referir-se a si mesmo (SCHEUER; 2002). Essas questões
(ecolalias e inversão pronominal) também foram constatadas nos pacientes de Kanner.
Outro aspecto observado por ele foi a dificuldade na atividade motora global em
contraste com uma habilidade na motrocidade fina, como por exemplo, a habilidade
para girar objetos circulares. Havia também a obsessão na manutenção da rotina,
limitando assim as atividades espontâneas. E havia ainda os movimentos repetitivos e
estereotipados, como se balançar de um lado para o outro.
A primeira publicação de Kanner foi o artigo Austitic Disturbances of Affective
Contact (1943), neste artigo o psiquiatra relata o caso de crianças que foram
encaminhadas para serem atendidas por ele, segundo Leboyer (1995) a originalidade
de Kanner foi:
Individualizar, em um grupo de crianças que lhe foram encaminhadas seja por debilidade mental ou esquizofrenia, uma síndrome nova reunindo sinais clínicos específicos, formando um quadro clínico totalmente à parte e diferenciado das síndromes psiquiátricas pré-existentes.
31
Para Kanner, o autismo é um distúrbio inato, ressaltando o “isolamento autístico” o
sintoma fundamental, presente na criança desde o início da vida. Para ele, o distúrbio
central era a ausência de estabelecer relações normais com as pessoas (LEBOYER;
1995).
Tanto Kanner (1943) quanto Asperger (1944) escolheram o termo autismo para
ressaltar os aspectos de intenso retraimento social observado em seus pacientes. O
termo autismo é derivado do grego (autos = si mesmo + ismos = disposição-orientação).
Outra questão presente nas crianças autistas é a questão do comportamento, que
na maioria das vezes são estereotipados e repetitivos, esta parte do autismo é a área de
pesquisa que menos tem sido investigada (BOSA; 2002). As estereotipias têm diversas
funções, dependendo da situação, ou seja, o mesmo tipo de comportamento pode ter
diferentes significados.O balançar do corpo continuamente pode ser o extravasamento
de tensão, comunicar vontades, protesto por alguma situação (BOSA; 2002).
A fascinação da criança por movimentos, objetos circulares, luzes, ou qualquer
outro tipo de preservação em uma só atividade não ajudam a desenvolver o
conhecimento e muito menos o desenvolvimento da linguagem e da comunicação, na
verdade é um impedimento, pois, a criança ao focalizar um só objeto ou situação, exclui
ou não percebe os outros estímulos do ambiente (SCHEUER; 2002).
No artigo Austitic Disturbances of Affective Contact (1943) Kanner relata os casos
de pacientes que apresentavam problemas com relação à fala e comportamento. O
primeiro caso relatado por Kanner foi o de Donald atendido em outubro de 1938, o
paciente tinha cinco anos de idade na época em que começou a ser atendido. Em seu
relatório inicial constava o problema que ele tinha para comer, afirmando que seu apetite
não era normal, não se mostrava “tentado” a comer doces, balas, sorvetes e coisas do
gênero ao ver outra criança comendo o mesmo. Notou-se também que ele ficava mais
feliz quando estava sozinho, quase não chorava para ficar com a mãe e parecia não notar
a presença do pai no ambiente ou quando chegava, era indiferente também a visita de
parentes.
32
Aos dois anos de idade desenvolveu a “mania” de girar blocos e outros objetos
redondos, ao chegar em algum lugar, não prestava atenção nas pessoas ao seu redor,
rapidamente se esquivava do contato com os outros, indo a procura de objetos,
principalmente aqueles que podiam rodar. Ele tinha uma limitação em atividades
espontâneas, andava pelos cantos fazendo movimentos estereotipados com os dedos,
cruzando-os no ar. A maioria de suas ações era repetições exatas de algo feito ou falado
por outra pessoa (ecolalia).
Outra característica observada em Donald era em relação à fala. As palavras para
ele tinham um significado inflexível, não conseguia generalizar ou transferir uma
expressão para um objeto ou situação similar.
Outro caso estudado por Kanner foi o de Frederick em 1942, este caso tinha
algumas similaridades com o apresentado por Donald. A satisfação em ficar sozinho era
muito nítida em suas ações. Nunca chorava para chamar atenção e não gostava de
muitos contatos físicos, sempre procurava afastar as pessoas, com isso ficar sozinho
nunca era um problema para ele, pelo contrário, ele se entretinha andando e cantando
sozinho.
A questão da fala também foi uma barreira para ele, pois até os dois anos de idade
ele só pronunciava duas palavras “papai” e “Dora” nome de sua mãe, por volta dos dois
anos e meio de idade ele começou a cantar, cantava de vinte a trinta canções. Uma
grande dificuldade enfrentada por ele era em aprender o uso dos pronomes pessoais
(inversão pronominal).
Para Kanner, a insistência em manter a rotina limitando a variedade de atividades
espontâneas estava fortemente presente em crianças autistas.
Ao concluir seu trabalho, Kanner afirma que:
O autismo originou-se da uma incapacidade inata de estabelecer o contato afetivo habitual e biologicamente previsto com as pessoas, chamando a atenção para a necessidade de estudos que forneçam “critérios concretos” sobre os componentes constitucionais da reatividade emocional. (BOSA; 2002).
33
Em 1956, Kanner só considerou dois sinais patagônios em torno do autismo: o
isolamento autístico e a necessidade de imutabilidade. Com isso, ele desconsidera as
anomalias da linguagem, apresentada de início como um dos principais sintomas do
distúrbio. (LEBOYER; 1995).
Em 1944, Hans Asperger publicou de maneira detalhada os casos de autismo
oferecendo explicações teóricas sobre o transtorno. As descrições de Asperger (1944),
muito se assemelham às defendidas por Kanner (1943). Na verdade, elas são até mais
amplas que a de Leo Kanner, levantando questões que não foram consideradas por ele,
como os casos que mostravam um dano orgânico severo. Asperger evidenciou a
incapacidade das crianças em fixar o olhar em situações sociais, ressaltou também a
questão dos gestos – ausentes de significados e estereotipados e apontou também a
questão da fala que podia ser gramaticalmente correta e com vocabulário rico, porém
monótona. Asperger não deu muita ênfase ao retraimento social quanto Kanner, mas
ressaltou a maneira ingênua da criança aproximar-se das pessoas (BOSA; 2002).
O trabalho de Asperger foi publicado em língua alemã, no final da Segunda Guerra
Mundial, o que dificultou a sua expansão, com isso seus trabalhos só foram
reconhecidos posteriormente (FRITH; 1989).
Tanto os artigos de Kanner quanto os de Asperger tem suas similaridades, visto
que ambos notaram dificuldades no relacionamento social e na comunicação. Segundo
Frith (1989) surgiu a crença de que Asperger descreveu um tipo de criança diferente da
descrita por Kanner e por isso, não deveria ser confundida, atualmente esta crença não
tem fundamento. Hoje, há a chamada, “Síndrome de Asperger” que tende a descrever
as crianças autistas altamente verbais e com um Q.I. elevado. Na verdade, a síndrome
de Asperger é diferente do autismo por não vir acompanhado de deficiência da
linguagem e do desenvolvimento cognitivo. A principal diferença entre o autismo e a
síndrome de Asperger consiste no fato do autista possuir um atraso na aquisição da
linguagem. Na prática clínica a distinção tem pouca diferença, pois o tratamento é
basicamente o mesmo.
34
2.1 O conceito de autismo e suas diversidades
No final da década de 1960, as descrições de Kanner eram muito difundidas entre
os profissionais da área. Em 1962, fundou-se a primeira associação de autismo – a
National Austic Society na Inglaterra, formado por familiares e profissionais da área
(BOSA; 2002). Os debates em torno do autismo se intensificaram, gerando polêmicas
acerca da etiologia do distúrbio (causalidade parental X fatores biológicos).
Historicamente há muita controvérsia em torno da distinção entre o autismo,
psicose e esquizofrenia. As primeiras publicações do CID – Classificação Internacional
de Doenças-publicado pela Organização Mundial de Saúde e o DSM - Manual
Diagnóstico e Estatístico de perturbações mentais da Associação Psiquiatria Americana
não fazem referência ao autismo. Na oitava edição do CID o autismo vem como uma
forma de esquizofrenia, na nona edição (1979) ele é considerado como psicose infantil. A
partir da década de 1980 ocorre uma mudança em torno do conceito, no CID-10 (1993) e
no DSM - III R (1987) o autismo já não é mais visto como uma categoria da psicose
infantil, fazendo parte dos transtornos globais do desenvolvimento.
No DSM-IV (1994) o autismo é considerado um distúrbio do desenvolvimento. O
comprometimento se dá em três áreas principais: alterações nas interações sociais;
modalidades da comunicação; comportamento com atividades estereotipadas e
repetitivas (BOSA; 2002). Segundo o DSM-IV os critérios para o diagnóstico autista são:
A. Um total de seis (ou mais) itens de (1), (2), e (3), com pelo menos dois de (1), e um de cada de (2) e (3). 1. Marcante lesão na interação social, manifestada por pelo menos dois dos seguintes itens: a. destacada diminuição no uso de comportamentos não-verbais múltiplos, tais como contato ocular, expressão facial, postura corporal e gestos para lidar com a interação social. b. dificuldade em desenvolver relações de companheirismo apropriadas para o nível de comportamento. c. falta de procura espontânea em dividir satisfações, interesses ou realizações com outras pessoas, por exemplo: dificuldades em mostrar, trazer ou apontar objetos de interesse. d. ausência de reciprocidade social ou emocional.
35
2. Marcante lesão na comunicação, manifestada por pelo menos um dos seguintes itens: a. atraso ou ausência total de desenvolvimento da linguagem oral, sem ocorrência de tentativas de compensação através de modos alternativos de comunicação, tais como gestos ou mímicas. b. em indivíduos com fala normal, destacada diminuição da habilidade de iniciar ou manter uma conversa com outras pessoas. c. ausência de ações variadas, espontâneas e imaginárias ou ações de imitação social apropriadas para o nível de desenvolvimento. 3. Padrões restritos, repetitivos e estereotipados de comportamento, interesses e atividades, manifestados por pelo menos um dos seguintes itens: a. obsessão por um ou mais padrões estereotipados e restritos de interesse que seja anormal tanto em intensidade quanto em foco. b. fidelidade aparentemente inflexível a rotinas ou rituais não funcionais específico c. hábitos motores estereotipados e repetitivos, por exemplo: agitação ou torção das mãos ou dedos, ou movimentos corporais complexos. d. obsessão por partes de objetos. B. Atraso ou funcionamento anormal em pelo menos uma das seguintes áreas, com início antes dos 3 anos de idade: 1. interação social. 2.linguagem usada na comunicação social. 3. ação simbólica ou imaginária. C. O transtorno não é melhor classificado como transtorno de Rett ou doença degenerativa infantil.
A forma de conceber o autismo mudou, os diferentes conceitos sobre o assunto
ocorreram devido aos diferentes mecanismos de explicação. No entanto, o autismo
deixou de ser visto com doença e passou a ser considerado uma “síndrome” (conjunto de
sintomas). “a síndrome do autismo identifica um perfil comportamental com diferentes
etiologias” (BOSA; 2002).
Segundo a psiquiatria, parte da medicina especializada no tratamento de doenças
/ problemas mentais, o autismo é visto como um transtorno global do desenvolvimento.
Geralmente, todos os transtornos globais do desenvolvimento têm como característica
principal o dano nas variadas áreas do desenvolvimento. Além do transtorno autista,
ainda há o Transtorno de Rett, Transtorno desintegrativo da infância e o transtorno de
36
Asperger. O transtorno autista é o mais conhecido, caracterizado pela “tríade” interação
social, comunicação e comportamento.
A partir de 1970, pesquisam mostram que o autismo tende a estar ligado com
anormalidades cerebrais e com causas imunológicas ligadas a anticorpos maternos
(ZAVASCHI; 2002).
Ainda não há consenso sobre a origem do autismo, sendo provável que sua causa
seja biológica, pois muitas vezes, o transtorno está ligado a doenças orgânicas (retardo
mental, convulsões) e genéticas (síndrome do X frágil).
O autismo, como visto anteriormente, não é uma síndrome nova, sua descoberta
vem desde do século passado. No entanto, a imprecisão do número de pessoas autistas
é ainda bem ampla. No Reino Unido, o número de crianças com autismo é de 4 a 5 em
cada 10 mil, aumentando para 15 a 20 em cada 10 mil se considerar a “tríade” principal
do autismo (interação, comunicação e comportamento). O autismo ocorre mais em
meninos do que em meninas, a prevalência é quatro vezes maior neles (BOSA; 2002).
O autismo dura para a vida toda, ser independente é algo raro em pessoas
autistas, pois eles necessitam sempre de suporte familiar e de instituições. Alguns
conseguem tornar-se um adulto mais independente, são aqueles que conseguem falar
até os 5 ou 6 anos de idade, tem um nível de intelecto médio e apresenta uma resposta
satisfatória acerca das intervenções educacionais. No entanto, estima-se que somente
um terço das crianças autistas conseguem ser auto-suficiente quando se tornam adultas
(ZAVASCHI; 2002).
Para que essa independência relativa possa se concretizar, o tratamento de
indivíduos autistas tem por objetivo diminuir os comportamentos mal adaptativos,
promover aprendizado na aquisição da linguagem e em outras potencialidades sociais
(ZAVASCHI; 2002).
As intervenções educacionais dependem, na maioria das vezes, do nível de
comprometimento do autista. Em casos com prejuízos cognitivos mais severos deve se
tentar aumentar a questão da comunicação e interação social e também reduzir os
comportamentos estereotipados.
A criança autista não consegue entender metáforas, ambigüidades e sentidos
figurados, sua fala é, muitas vezes, palavras e frases repetidas com exatidão. A terapia
da comunicação trabalha esses aspectos da linguagem, utilizando a linguagem falada,
37
linguagem de sinais, cartões com figuras e equipamento computadorizado
(SCHWARTZMAN; 1995).
Um dos grandes obstáculos cognitivos da criança autista é a de representar
mentalmente. As dificuldades em lidar com situações de conflito provêm dessa falta de
representação mental, pessoas autistas não têm a habilidade de analisar ou interpretar
racionalmente essas situações. Eles não reconhecem expressões de emoção ou então
não sabem lidar com as questões afetivas, pois essas vivências são confusas para eles,
encontram dificuldades em lidar com seus próprios estados mentais para compreender o
que as outras pessoas estão pensando ou sentido (BEYER; 2002).
O estudo dessa característica cognitiva da criança autista acarretou na formulação
da conhecida teoria da mente. Um grupo de pesquisadores na área do autismo criou a
hipótese de que a “tríade” de dificuldades característica do autismo eram provenientes da
limitada capacidade humana essencial de “ler a mente”.
A partir dos quatro anos de idades a criança já tem condições de analisar as
intenções das ações de outras pessoas, não só as reais, mas também as simuladas, em
brincadeiras como o “faz-de-conta” a criança consegue diferenciar as situações
verdadeiras das situações fictícias. Em crianças autistas a capacidade mental de
interpretar as ações alheias e a distinção entre real e imaginário não está presente nelas.
A partir dos estudos e leituras em torno do autismo, as características mais
ressaltadas sobre o transtorno são:
• Comprometimento da comunicação verbal e também a não-verbal.
• Prejuízo na interação social.
• Pouco contato visual e olhar distante e fixo.
• Alteração das atividades imaginativas.
• Linguagem estereotipada e movimentos estereotipados.
• Manutenção de uma rotina monótona nas atividades.
2.2 Autismo e o processo de ensino-aprendizagem
Assim como todos os alunos de uma sala de aula necessitam de atenção para
seu aprendizado possa ser significativo, com alunos autistas não é diferente, mas não
38
pelo fato de serem alunos “especiais” e sim porque cada um de nós tem um tempo de
aprendizado diferenciado, necessitando de atenção para que a aquisição do
conhecimento possa ser realmente enriquecedora.
No entanto, quando ao se deparar com alunos autistas inevitavelmente certas
perguntas vem à mente, pois ainda geram algumas controvérsias, como: Quais as ações
educativas para esses alunos? Como deve ser o espaço educativo adequado para eles?
E principalmente, como alunos autistas devem ser educados? Essas são apenas das
inúmeras perguntas que norteiam as discussões de educadores e pesquisadores. Não
há uma fórmula para a garantia do aprendizado desses alunos, há apenas meios para
que se possa diminuir essa lacuna ainda existente entre a educação de alunos autistas e
alunos “normais”.
Nessa seção sobre o processo de ensino-aprendizagem do aluno autista objetiva-
se pontuar e mostrar algumas das dificuldades apresentadas por eles no âmbito
educacional, não mostrar soluções para que essa aprendizagem ocorra de maneira
eficaz, apenas tentar mostrar que alunos autistas têm condições e direito de aprender
como qualquer outro aluno, alunos com esse transtorno são iguais aos tantos outros
alunos, e o que aproxima dessas igualdade eh o reconhecimento de suas diferenças e
procurar fazer disso uma maneira de transformação e não de um fim, educar alunos com
autismo não é ter em mãos uma “receita pronta”, mas sim ter em mente o foco de
esforços nas diferenças e não nas deficiências.
Segundo o site da AMA (Associação do Amigo Autista) o pensamento da criança
autista abrange alguns itens, tais como: falta de conceito de sentido; foco excessivo em
detalhes; distrabilidade; pensamento concreto; dificuldade em combinar ou interagir
idéias; dificuldades em organizar e sequenciar; dificuldades em generalizar. Além desses
déficits cognitivos o autista, como já visto anteriormente, apresenta padrões
comportamentais característicos, como: forte impulsividade; ansiedade em excesso e
anormalidades sensório-perceptuais. Abordardando cada um dessesfacilita a
compreensão de seu processo de aquisição dos conhecimentos escolares.
A falta de sentido é basicamente a incapacidade de dar sentido as suas
experiências, eles podem aprender habilidades, mas sem entender o que significa aquela
atividade em si. Conceitos, razões e temas são questões obscuras para os autistas. Essa
39
falta de sentido, muitas vezes, pode estar ligada a outras dificuldades cognitivas da
criança.
O foco excessivo em detalhes se caracteriza pelo fato do autista se prender muito
em detalhes pequenos, detalhes que passam despercebido, alguns alunos com autismo
freqüentemente são bons na percepção desses detalhes, especialmente os visuais e
sensoriais, já autistas com um nível cognitivo mais elevado, percebem detalhes mais
elevados, como código de áreas de telefone, ou de capitais dos estados, no entanto eles
não conseguem perceber a importância desses fatos observados por eles. O autista
pode perceber algo, digamos irrelevante numa rua movimentada, mas não notar a
aproximação de um ônibus.
A distrabilidade é outra característica associada ao autista, é muito difícil eles
manterem sua atenção voltada para o professor enquanto este está explicando uma
matéria, pois eles se concentram em coisas que consideram mais relevantes e
importantes para eles. O professor pode colocar um lápis em frente ao aluno para que
ele faça sua atividade e a criança fica tão distraída pela presença do lápis que não
realiza a atividade. Alguns alunos com autismo têm estímulos auditivos mais aguçados,
com isso um barulho distante ouvido por ele é suficiente para se desconcentrar.
O pensamento concreto está relacionado com as dificuldades que autistas tem
com os conceitos lingüísticos, sejam eles simbólicos ou abstratos.
A dificuldade de combinar ou interagir idéias está relacionado à questão de ser
mais fácil para a criança autista compreender fatos e conceitos separados do que
integrar esses conceitos com informações ligadas a eles.
A dificuldade em organizar e sequenciar é outro aspecto observado na criança
autista, esse problema provem da dificuldade que eles tem em ligar várias informações.
Para organizar algo é preciso unir vários elementos para que se alcance determinado
objetivo, essa falta de organização está relacionada com a questão da falta de habilidade
para se concentrar na tarefa que precisa executar. A questão de sequenciar também é
difícil devido a essas faltas de habilidades.
A dificuldade de generalizar acontece devido ao fato do autista aprender
comportamentos e habilidades em uma situação determinada, mas não conseguir
transferir esse aprendizado para outra situação, como por exemplo, eles aprendem a
40
escovar os dentes com uma escova verde, mas se mostram resistentes se
posteriormente tiverem que escovar os dentes com uma escova azul.
Os padrões comportamentais, como já vimos em outras seções está ligado a
questão do autismo, um deles é a forte impulsividade que se caracteriza pela insistência
que o autista tem em buscar coisas que eles querem e desejam sem se importar se é um
objeto preferido, experiências ou sensações, esses tipos de comportamento são muito
difíceis de serem controlados pelos professores, pois a determinação é muito grande.
A ansiedade excessiva também é encontrada em criança com autismo, essas
frustrações, muitas vezes, são relacionados a fatores biológicos devido aos seus déficits
cognitivos, autistas não entendem bem o que se espera deles e o que acontece em volta
dele, essa ansiedade é compreensível, pois provem dessas incertezas.
As Anormalidades Sensório-perceptuais já são uma característica muito
conhecida no autista. Relatos de que pessoas autistas passam a maior parte do tempo
observando a mesma coisa, como olhando seus dedos em movimento são atitudes
comuns nesses indivíduos. Pessoas autistas não respondem aos estímulos sensoriais da
mesma maneira que outras pessoas, muitas vezes quando se machucam parecem não
sentir dor.
Criado para auxiliar pessoas autistas foi desenvolvido o método TEACCH
(Treatment and Education of Autistic and related Communication handicapped Children)
que traduzido seria: Tratamento e Educação de Crianças Autistas com Dificuldades de
Comunicação.
Segundo informações do AMA a proposta de tratamento TEACCH se desenvolveu
a partir de um grupo de abordagem psicanalítica criado no Depto de Psiquiatria da
Universidade da Carolina do Norte em Chapel Hill, para atender crianças com autismo
(ou na época psicose infantil) e suas famílias no início da década de 60. Esse método
tem como objeto educacional principal ensinar o aluno autista que o ambiente em que ele
está inserido tem um significado, outro objetivo é ensinar ao aluno a questão de causa e
efeito e a comunicação também é um objetivo educacional muito almejado nesse
método, algumas autistas primeiro precisam aprendem que a comunicação existe.
O método TEACCH também tem por objetivo desenvolver habilidades
significativas para a vida adulta da criança autista, pois
41
concentramos nosso dia educacional em eventos muito concretos: usar o banheiro, colocar os sapatos, pedir ajuda ou algo para beber, selecionar, emparelhar e colar materiais, limpar mesas, ligar o aparelho de som, montar um quebra-cabeça etc.¹
Além do método TEACCH, existem alguns outros métodos que auxiliam na
educação do aluno autista, no entanto, esses métodos não são tão conhecidos, quanto o
método TEACCH. São eles o ABA e PECS.
O ABA (Applied Behavior Analysis)² – Análise Aplicada do Comportamento- que
desenvolve um ensino individualizado para que a pessoa possa desenvolver uma maior
independência. Algumas das atividades trabalhadas são as comportamentais, como o
contanto visual e a comunicação, a redução do comportamento estereotipado também
faz parte do tratamento.
São ensinados ao aluno autista a apresentação de uma “dica” com o auxílio de um
professor. A característica principal desse tratamento é usar conseqüências que sejam
favoráveis, como, por exemplo, executar uma atividade favorita do aluno, contudo o
objetivo é que com o decorrer do tempo situações naturais geradas pelo próprio
comportamento da criança autista possa ser o bastante para que ele mantenha o
aprendizado.
O tratamento com ABA teve início nos anos 60 quando se começou a analise do
comportamento de crianças autista e com outros transtornos do desenvolvimento, essa
técnica é usada com criança autistas de todas as idades no processo de aprendizagem.
________________
¹ http://www.ama.org.br/
Outro tratamento utilizado no processo de ensino-aprendizagem de crianças
autistas é o PECS (Picture Exchange Communication System)³ – Sistema de Intercâmbio
de Comunicação por Figuras. Como já vimos, crianças autistas tem grande dificuldade
em utilizar a linguagem para fins de comunicação. Esse programa foi desenvolvido pelas
dificuldades de comunicação das crianças autistas. O PECS inicialmente procura buscar
coisas que as agrade ou que elas querem, pode ser um objeto, brinquedo, alimento,
42
livros etc. Após que o adulto descobre o que a criança quer, uma imagem (foto, desenho)
é feito deste objeto que a criança quer. Essas crianças usando o PECS são ensinadas a
se aproximar e dar uma imagem do objeto que deseja ao seu terapeuta (ou a outra
pessoa que está auxiliando) para que ela consiga o objeto que quer, ao realizar isso a
criança passa a iniciar um ato comunicativo com outras pessoas ao seu redor.
Esses são alguns dos métodos e instrumentos trabalhados com crianças autistas
para que possa diminuir os comportamentos estereotipados, a melhoria da interação
social e da linguagem enquanto comunicação e para que eles se tornem um pouco mais
autônomos.
_____________________
² http://autismoemfoco.com/aba
³ http://www.autista.org/pecs.htm
Estes tipos de métodos são de origem americana, no Brasil ainda não
encontramos nenhum tipo de técnica ou método produzido para essa parcela da
comunidade global. O método TEACH é o mais conhecido dos três já mencionados. O
ABA e o PECS ainda não são tão difundidos nos currículos das escolas brasileira.
2.3. Autismo e Inclusão
Esta seção tem por objetivo, tentar mostrar que incluir alunos autistas em uma
sala de ensino regular não é algo simples e prático, mas é não uma instância inatingível
e que a inclusão é benéfica para o autista.
A questão do desenvolvimento da criança é algo essencial na compreensão do
comportamento do ser humano. Segundo Schettini (2003), o desenvolvimento está muito
ligada à experiência pessoal da criança com a realidade externa e a interna. No decorrer
do livro ele continua versando sobre essa questão do desenvolvimento, mas num
determinado momento ele afirma que “o contato com as outras pessoas, bem como tudo
que lhe é ensinado fazem parte da conquistas da evolução pessoal”. Neste parágrafo,
acredito que a palavra-chave é trecho que diz sobre o contato com outras pessoas, pois
é nos relacionando com os outros que se molda a identidade.
Na maioria das vezes, não é a deficiência que traz a exclusão, mas sim a
sociedade. Algumas crianças não se sentem descriminadas devido as suas deficiências,
mas sim devido ao olhar do outro para a sua deficiência, segundo Rubem Alves (2002),
43
“a criança lida com algo que dói muito: não é a diferença que, em si mesma, mas o ar de
espanto que a criança percebe nos olhos dos outros”.
Ensinar um aluno autista não é fácil, não há uma “receita pronta”, há sim meios,
como alguns dos apresentados aqui, para que haja uma enriquecedora e eficaz
aprendizagem.
Incluir não é somente garantir que os alunos aprendam os conteúdos, incluir é
fazer com que o aluno se sinta parte daquele do meio no qual ele está inserido.
Compreender o autista e como lhe dar com eles requer um olhar para dentro de
nós, pois precisamos nos abdicar de nossos preconceitos e medos daquilo que não
conhecemos e não sabemos lidar, é perceber que não há apenas uma forma de ver o
mundo, que não há apenas a nossa forma de ver o mundo. É trilhar caminhos que talvez
não tenham sido trilhados antes, caminhos esses que nem sempre vem com um mapa
nas mãos para ajudar a conducao, entender o autista é ouvir um outro tipo de linguagem,
é conviver com um outro tipo de comportamento. Ensinar e incluir autistas é algo
complexo sim, mas não impossível, na verdade é uma troca, ensina-se a, mas também
aprende-se com eles, pois abre-se espaços para perceber que não se sabe tudo e que
se precisa deixar nossos preconceitos de lado e deixar de temer aqueles que são
diferentes, conviver com autistas é minimizar preconceitos, é quebrar tabus, é perceber
que “diversidade não é inferioridade, mas sim sinônimo de versatilidade” ¹.
Muitos temem em lidar com autistas, e incluir e educar essas pessoas porque o
diferente nos traz insegurança, nos traz receio de não se sentir capazes de “dar conta”
do aprendizado dessas crianças.
O medo existe sim, mas não se pode deixar que ele paralise, uma criança autista
merece e tem o direito ao estudo, não há fórmulas infalíveis para a aprendizagem desses
alunos, há apenas meios para que ela ocorra. Mas que meios? Que caminhos? O poeta
espanhol diz “caminhante, não há caminho. O caminho se faz ao andar” ².
_________________ ² Cervantes, poeta espanho
44
CAPITULO 3
DISCUSSAO E ANÁLISE DE DADOS
Este capítulo se dará pela interpretação das entrevistas. Mostrando trechos das
respostas dos entrevistados, fazendo uma relação, quando necessário, com os teóricos
que trabalham o assunto de inclusão e o de autismo.
A partir dos dados coletados através das entrevistas, pôde-se fazer algumas
reflexões: a primeira delas consiste no fato de que é notório que o conceito de educação
inclusiva estar diretamente vinculado a questão da deficiência, ou seja, educação
inclusiva, na ótica dos professores está relacionado à inclusão de deficientes, somente
deles, nas classes de ensino regular. Outra reflexão obtida foi que as pessoas conhecem
o transtorno autista, no entanto, seus conhecimentos são provenientes do senso-comum.
A primeira pergunta realizada foi sobre o pensamento dos entrevistados sobre o que
estes entendiam por uma educação inclusiva. Eis abaixo, alguns trechos das respostas
dadas para esta primeira questão:
“Acredito que uma educação inclusiva é aquela que permite que uma criança com problema seja uma deficiência motora, mental, de alguma forma estude em uma escola normal...” (entrevistado nº1).
“Acredito que é uma educação que aceita e inclui as diferenças no projeto pedagógico. Quando digo diferença, digo de qualquer tipo de diferença, diferença de raça, de deficiência, de escolha sexual, afinal todos nós somos diferentes”.(entrevistado nº2)
“Como o próprio nome já diz, acredito que incluir é colocar a criança que precisa de uma atenção especial dentro do contexto da própria escola...” (entrevistado nº 3).
“É a escola aceitar as crianças diferentes, as crianças com necessidades especiais”.(entrevistado nº4)
“É fácil e ao mesmo tempo difícil de responder. Fácil se a gente for pensar no que os livros falam pra gente de que você tem que incluir independente de que tipo de aluno ele é. É difícil quando você coloca isso na prática, porque, ao mesmo tempo em que você está colocando um aluno que é diferente dos outros...” (entrevistado nº 5).
45
“Para mim educação inclusiva é uma educação onde você pode englobar alunos com necessidades especiais, adaptando as atividades, de preferência com uma facilitadora que possa conduzir e auxiliar, porque você deixar o aluno sozinho numa sala pra mim não é inclusão...” (entrevistado nº6). “Pela minha experiência inclusão não é somente você colocar a criança dentro de sala de aula, é também adaptar o currículo, ver as necessidades da criança é estar atenta a cada passo que ela dá e o que elas tem possibilidade de dar...” (entrevistado nº7). Como pudemos analisar, apenas o entrevistado “número dois” entende a educação
inclusiva como uma educação que inclua aqueles que são diferentes, ou seja, uma
educação que inclua todos os seres humanos, já que todos nós somos diferentes uns
dos outros.
Segundo Santos (2003), a inclusão abrange todas as pessoas que passaram por
obstáculos em termos de aprendizagem e participação e não somente de deficientes. Ao
pensarmos nesta questão da inclusão educacional, precisamos nos atentar para o fato
de que muitas vezes não é a escola que traz a exclusão, na maioria das vezes é através
da nossa maneira de “ver” o mundo, de nossas culturas, valores que fomos elaborando
como meios para classificar, categorizar e com isso excluir os alunos. Com isso, o
professor tem um papel muito importante nesta questão da inclusão educacional, é
preciso uma “reciclagem” por partes deles, para que a inclusão possa ser benéfica para
todos, é preciso repensar o conceito de educação inclusiva, para num futuro próximo,
compreendermos que não existe apenas um aluno diferente, existem vários alunos
diferentes. Como uma das professoras disse num determinado trecho de sua entrevista,
“inclusão é incluir as diferenças no projeto político pedagógico... diferença de sexo, raça,
escolha sexual, afinal todos nós somos diferentes”.
Por isso, ainda segundo Santos (2006), o conceito de inclusão está diretamente
relacionado ao conceito de dimensão cultural. Este conceito é categorizado pelo fato das
pessoas se predisporem a desenvolver seus valores, crenças para assim ampliar a
participação do outro na sociedade. No âmbito educacional cabe muito ao professor isso,
o primeiro ponto de partida para que ocorra a inclusão se dá no pensamento do
professor acerca desse conceito de educação inclusiva.
Um outro item bastante notado durante a entrevista foi o fato da imprecisão acerca do
que é o autismo, a maioria dos professores entrevistados acreditam que o autismo é uma
46
doença. Todos sem exceção conhecem o transtorno autista, esses conhecimentos vêm
ou de contatos que algumas já tiveram devido a parentes próximos, outras conhecem
somente através de filmes e poucas reportagens que leram sobre o assunto e há as
professores que passaram a conhecer devido à “necessidade”, pois hoje têm alunos
autistas em suas salas de aula. Ao responderem sobre as características de uma criança
com autismo as respostas são muito parecidas, no entanto nenhuma delas tinha certeza
se realmente eram essas as características de uma criança autista.
Eis abaixo algumas respostas obtidas sobre esta pergunta:
“Eu descrevo um autista por puro “sentimento “, é difícil falar sobre isso, pois não sei quais são suas deficiências, o que sei é que tudo que vejo de uma criança que tem ações repetitivas, que fica parado olhando para o “nada”, isso me dá a sensação de que ele é autista... A minha base do que é o autismo vem da ficção, do que vejo nos filmes, na verdade essa é a minha referência.”.
“Descrevo como uma criança que tem um mundo próprio, que não se relaciona com as outras pessoas, com o meio que está inserida, é uma criança fechada. Creio que existem vários graus de autismo e com isso alguns não chegam a se comunicar...”. “Pelo pouco que conheço e li sobre, acredito que autista é aquela criança que fica muito sozinha, no mundo dela, como se fosse um mundo à parte, é como se nada ao redor dela tivesse acontecendo que só o que ela ta fazendo ali naquele momento é o que importa, é como se ela fosse um elemento à parte do grupo”. Durante as outras entrevistas as respostas das outras professoras muito se
assemelham a essas aqui transcritas. Avaliando essas respostas dadas pelas
professoras verifica-se que seus conhecimentos sobre o conceito de autismo não são
errôneos, no entanto ainda se apresentam muito vinculados a noções do senso comum.
Durante algumas entrevistas, expliquei para os entrevistados a questão da fala em
crianças autistas. Segundo Bosa (2002), muitas vezes a fala está presente na criança
autista, mas não para fins de comunicação. Após foram questionadas qual instituição
seria melhor para essas crianças, a instituição de ensino regular ou a de ensino especial.
As respostas para essa pergunta foram bastante imprecisas, no sentido de que as
opiniões das professoras ficaram bem divididas, algumas acreditavam que o grau de
autismo iria determinar se aquela criança poderia estudar numa escola regular ou numa
escola especializada, outras acreditavam que a escola especializada seria a melhor
47
opção para a criança, pois estas saberiam como lidar com ela. E em todas as respostas,
as professoras acreditam que a presença de uma facilitadora em sala de aula é
fundamental para o ensino desta criança.
Quando indagadas sobre as ações necessárias para que possa ocorrer a inclusão
dessas crianças em salas de ensino regular, as respostas obtidas foram diferentes,
porém não antagônicas, ou seja, eram opiniões diferentes, mas percebe-se que elas
acabam se completando entre si, pois de uma maneira geral todas acreditam que a falta
de informação sobre o assunto ainda é muito grande, no sentido de que muito se fala
sobre educação inclusiva, mas pouco se faz para que ela se concretize realmente. Outro
detalhe, observado durante a análise das entrevistas era sobre a questão da capacitação
dos professores, a maioria dos entrevistados acredita que é necessária uma preparação
maior para que estes possam saber lidar com essas crianças em sala de aula.
Segundo Serra (2006), o nosso sistema educacional não está totalmente
preparado para receber as crianças com necessidades especiais. Mas precisamos nos
perguntar porque as instituições escolares não estão preparadas para receber alunos
autistas ou qualquer outro aluno em suas salas de aula? Acredito que parte da resposta
se encontra nas respostas dadas pelos sujeitos entrevistados: falta de informação,
capacitação de professores, formação continuada, adaptação metodológicas,
repensando assim nossos conceitos sobre currículo e avaliação.
Creio que alunos autistas têm possibilidade de aprender sim, acreditava nisso ao
iniciar esta monografia, e a crença veio a se confirmar ao ouvir o relato das professoras
com alunos autista em sala de aula sobre a aprendizagem deles.
“Trabalho com eles um determinado livro o do “Mico Maneco”, a gente vai muito pela idéia da Heloisa Vilas Boas. Faz a frase, escolhe-se uma palavra, mas dentro da possibilidade dele, escolhi a palavra macaco, pegamos várias coisas que com começam com o “ma” do macaco, como “mata” , tentando fazer o máximo possível trazer coisas do cotidiano dele, que ele conhece. Então quando eu coloquei a palavra “mata” aquilo para ele não fez sentido algum, então temos que procurar alguma coisa com a letra M, mas que tenha sentido pra ele, se colocar o meu nome (o nome da professora começa com a letra M) é uma coisa da realidade dele, pois ele me conhece e sabe que esse é meu nome...
No início a gente colocava a figura e duas palavras e aí ele pegava a palavra correspondente à figura, num outro momento começamos a colocar três palavras e ele
48
pegava a palavra correta. Então, a gente acredita que ele está aprendendo, mas ainda não temos total certeza.” ( professora nº1)
“Tenho um aluno autista na outra escola em que trabalho e quando tem uma
atividade de desenho, por exemplo, ele não consegue desenhar, ele consente, tenta, mas o que ele rabisca não é tartaruga e aquilo o frustra e ele não faz a atividade, com isso bate nos outros colegas. Então descobrimos que com a figura pronta e ele somente pintando-a e colando-a no lugar ele consegue fazer. No momento que ta todo mundo desenhando, ele escolhe a figura que ele sabe que é uma tartaruga, cola no lugar e pinta, é a mesma atividade, onde o vocabulário está sendo trabalhado, mas adaptada para a necessidade dele... Eles aprendem, a gente não pode esperar que eles aprendam tudo o que os outros aprendem, mas eles aprendem. Vejo pelo meu aluno, ele foi à psicóloga, aí ela mostrou pra ele uma foto do sol, ela perguntou o que era aquela figura e ele respondeu “sun”, ela mostrou a figura de uma nuvem e ele respondeu “é uma cloud” (vale ressaltar que essas aulas dadas a esta turma onde este aluno está é de inglês). (Professora nº2)
Com isso para que haja uma inclusão escolar é preciso repensar o conceito de
avaliação e currículo, pois em determinados casos o currículo, ou a metodologia com a
qual se trabalha em uma determinada turma terá de ser adaptada para que possa
ocorrer uma aprendizagem destes alunos. Segundo Santos (2006), uma classe inclusiva
deve promover o desenvolvimento de seu aluno e não oferecer somente a convivência
social, educação inclusiva não se resume só a colocar o aluno com necessidades
especiais em uma sala regular, é também adaptar a rotina, as atividades, a metodologia
para que esse aluno possa aprender.
Ao analisar esta entrevista pode-se concluir que a prática pedagógica do professor
é um dos itens mais relevantes para que haja uma inclusão eficaz. Um dos sujeitos
entrevistados concedeu uma resposta muito interessante para nos fazer repensar sobre
nossos próprios conceitos sobre o que vem a ser uma classe inclusiva.
“Dentro de uma sala de aula sempre tento imaginar como o aluno está pensando, como ele recebeu a maneira de eu falar, explicar, como ele está “vivendo” aquele exercício passado, quando o aluno não entende algo, fico me imaginando porque será que ele não está aprendendo e reflito de que forma posso mudar meus métodos para que ele possa aprender. No caso do aluno autista, eu iria ler, para conhecer, para me aproximar dele para que ele possa aprender.”
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Caso pretendende-se que nossa sociedade seja mais inclusiva, que nosso
sistema educacional seja mais inclusivo, que o ponto de partida é a nossa
conscientização sobre o que vem a ser inclusão, é entender que inclusão não é algo
relacionado só a deficientes, inclusão é algo que abrange a todos, a todos que por um
motivo, ou outro se encontrem excluídos. Em salas de aula, convive-se todos os dias
com diversos tipos de exclusão, e muitas vezes não são exclusões devido à algum tipo
de deficiência, afinal existem inúmeros tipos de exclusões, como já mencionado.
O professor é uns dos principais agentes para que essa inclusão ocorra, pois ele é
quem mais lida com o sujeito “excluído”. No entanto, não cabe só a ele essa “tarefa”. Na
verdade toda a instituição educacional tem que estar envolvida para esta inclusão possa
ocorrer, ou seja, é necessário o envolvimento de coordenadores, funcionários, pais,
professores, enfim de todos aqueles interessados em que ocorra uma escola inclusiva.
Com isso, para que uma instituição seja inclusiva é preciso pensar e repensar
nossos conceitos sobre metodologia, currículo, avaliação e prática pedagógica.
A última pergunta feita aos entrevistados foi se estes se sentiam preparados para
a inclusão, ao analisar as respostas ficou claro que todos, exceto um, não se sentem
preparados para a inclusão, mas estas respostas estavam associadas ao conceito de
inclusão que eles têm. A educação inclusiva é vista como uma educação que visa incluir
apenas crianças com necessidades especiais. Com isso, ao fazer esta pergunta, os
entrevistados associaram a inclusão ao portador de necessidade especial do “momento”,
o autista, já que a entrevista estava vinculada a isso.
“Não me sinto preparada, pois não tenho conhecimentos específicos suficientes para atingir uma criança como essa.”.(entrevistado nº1)
“Não. Porque tem que ter um olhar diferente, um cuidado diferente, eu com certeza tentaria, mas não sei se saberia lidar com isso.” (entrevistado nº2)
“Eu sou da opinião “missão dada, missão cumprida”, se me derem uma turma com um, ou mais de um aluno autista eu vou aceitar o desafio com certeza. Agora preparação de saber como lidar, isso eu não me sinto preparada.” ( entrevistado nº3)
50
“Não. Porque eu não sei o que eu faria com a criança, o que seria mais indicado para a sua aprendizagem, precisaria de alguém especializado, pelo menos para me dizer alguns princípios de como agir com uma criança assim.” ( entrevistado nº4)
“Ainda não. Pois não tenho conhecimento.” ( entrevistado nº5)
“Não completamente...” ( entrevistado nº 6)
Apenas uma das professoras não associou a questão da inclusão à deficiência.
“Eu acho que ninguém por mais que freqüentes anos e anos de faculdade estarão preparados para a inclusão, porque cada inclusão é uma inclusão, cada caso é um caso. É como as crianças que nós temos em sala, que chamamos de “normais”. Na verdade, são crianças são completamente diferentes e a realidade é que muitas delas também são crianças que precisam de inclusão, às vezes é uma inclusão emocional, mas não deixa de ser uma inclusão. Eu acho que ninguém está preparado porque o ser humano é um “leque” de possibilidades, acredito que é muito do momento, por exemplo, com essa criança eu posso ir por esse caminho, mas com uma outra talvez eu já não possa ir pelo mesmo caminho.
Hoje eu me sinto preparada para receber alguém diferente e respeitar essa pessoa. Não sou conhecedora do autismo e por mais que conhecesse, eu acho que facilitaria, mas não ia garantir.” ( entrevistado nº7)
.
Ao concluir estas entrevistas percebe-se que há muito a ser feito para que haja
uma inclusão de todos os seres humanos no âmbito educacional e social. Um dos
aspectos importantes durante a entrevista é que para que ocorra de fato uma inclusão é
importante que haja uma parceria significativa entre escola e família do sujeito que
necessita ser incluído , pois o cotidiano do aluno vai além das fronteiras da instituição
escolar.O próximo capítulo tratara de maneira explícita e abrangente os caminhos
possíveis para que ocorra uma inserção destes portadores de necessidades especiais,
não só na vida estudantil, mas também na vida social.
51
CAPITULO 4 AUTISMO E INCLUSAO: VENCENDO BARREIRAS
Este capítulo tem como objetivo versar de maneira mais explícita sobre a questão
da inclusão e autismo. Ao longo deste estudo, em determinados momentos foram
trabalhados estes conceitos separadamente, com o propósito de familiarizar o leitor
acerca de ambos os conceitos, analisando os temas mais importantes sobre eles e
entendendo o que vem a ser cada um deles.
No entanto, neste capítulo o objetivo eh vincular o termo autismo e o termo
inclusão de maneira mais específica, na tentativa de tentar trilhar um caminho para que
as barreiras contra a inclusão desses portadores de necessidades especiais possam ser
superadas, fazendo com que estes sejam incluídos tanto educacional, quanto
socialmente, possibilitando a aprendizagem desses portadores de necessidades
especiais.
A partir de muitas leituras sobre o que os teóricos sobre o assunto estudado, e
após as entrevistas realizadas com professores da educação básica do sistema de
ensino regular, torna-se possível a inclusão dessas pessoas no âmbito educacional
através de alguns itens necessários e passíveis de serem analisados com maior atenção.
Alguns aspectos relevantes para que isso aconteça são: o papel do professor na ótica
inclusiva; a importância da família, sujeito incluído e professor; a reavaliação dos
conceitos de currículo, avaliação, metodologia e prática pedagógica; compreensão do
que significa a palavra diferença no que tange à inclusão e, por último, a questão da
formação dos professores.
Cada item aqui mencionado será trabalhado de maneira aprofundada, por isso
cada um será discutido separadamente, em tópicos, para que os conteúdos possam ser
entendidos de maneira eficaz.
4.1. O professor na ótica inclusiva
Um dos aspectos mais observados durante esta pesquisa foi a questão da função
do professor, no sentido de que este não se sente preparado para a inclusão, pois visam
a educação inclusiva como uma educação que inclui somente os “diferentes”.
52
É preciso lembrar que o professor tem um papel muito importante no processo
educativo da criança, pois este se caracteriza como um “condutor”, alguém que, por ser
mais preparado na condução da vida acadêmica do educando precisa estar consciente
de seus atos, atitudes, postura, pensamentos, visto que, muitas vezes refletirá em
conseqüências para seus alunos. Em muitos casos, a turma reflete a maneira como o
professor a conduz. A ação pedagógica do professor se configura ao longo das suas
experiências adquiridas e vivenciadas no decorrer de sua jornada, as quais configuram
sua prática pedagógica e também sua forma de olhar os desafios e as diferenças
existentes em seu contexto escolar.
Segundo Santos (2006), a escola é considerada um lugar onde se constroem
conhecimentos e se desenvolvem valores, com isso suas propostas podem contribuir, ou
não, para uma sociedade menos desigual. Os professores, na maioria das vezes, são os
que auxiliarão seus alunos nesta construção de uma sociedade mais democrática e
menos desigual. Por isso, é preciso que o professor assuma um papel de “líder”, não no
sentido de mandar em seus alunos, mas de saber lidar com a diversidade de alunos que
encontrará em sua sala de aula. É importante a conscientização de que essa diversidade
está além das fronteiras da questão da criança especial, a diversidade, como o próprio
nome sugere, está relacionada às diferenças. É necessária ainda uma conscientização
de que não há apenas um tipo de inclusão, mas sim vários. Lidamos com diversos tipos
de exclusão em sala de aula, desde exclusões emocionais até as mais acentuadas, que
são as exclusões para com aqueles portadores de necessidades especiais.
É preciso ter em mente também que ensinar não é somente transferência de
conhecimentos acadêmicos, é possibilitar a criação para a sua produção ou construção
(SANTOS; 2006). A pedagogia elaborada por Paulo Freire está diretamente relacionada
a esta questão, pois ele afirma que ensinar é aprender com quem aprende, ou seja, o
ensinamento é uma troca e não uma transferência. Freire ainda afirma que ensinar exige
do professor risco, aceitação daquilo que é novo e rejeição a qualquer forma de
discriminação, pois a prática discriminatória nega a democracia, um dos pilares da
educação inclusiva.
Em um dos livros publicado por Freire, Pedagogia da Esperança (1992), em
determinado trecho o autor apresenta um “jogo” que realizou com um grupo que visitou
num assentamento da reforma agrária. Era um jogo de saberes onde cada um
53
apresentava seus conhecimentos acerca de diversos assuntos. Ao concluir esse “jogo”
Freire termina sua visita àqueles camponeses fazendo uma sugestão:
Pensem no que houve esta tarde aqui. Vocês começaram discutindo muito bem comigo. Em certo momento ficaram silenciosos e disseram que só eu poderia falar porque só eu sabia e vocês não. Fizemos um jogo sobre saberes e empatamos em dez a dez. Eu sabia dez coisas que vocês não sabiam e vocês sabiam dez coisas que eu não sabia. Pensem sobre isso.
Na educação de alunos autistas isso também ocorre diversas vezes, há
conhecimentos que possuímos, mas há aqueles que eles possuem e por isso podem nos
ensinar. Devido a todas essas exposições durante essa seção, se frisa a importância do
professor na ótica inclusiva, por isso é necessário que o mesmo se conscientize de seus
atos e atitudes como também conscientizem seus alunos.
4.2 Sujeito incluído, professor e família: Um passo a mais no caminho
para a inclusão.
Nesta seção sera analisada a importância de uma boa parceria entre a família,
professor e o sujeito que necessita ser incluído, esses três elementos são de grande
relevância para que uma inclusão dessa parcela da sociedade ocorra. É necessário
sempre retomar ao conceito de inclusão que foi discutido durante todo este estudo. O
conceito de inclusão aqui apresentado diz respeito àquela inclusão que possibilita o
sujeito excluído ter condições de obter participação social e exercício de sua cidadania,
essa cidadania nada mais é do que o reconhecimento do cidadão, dos seus direitos,
deveres e sua participação na vida social.
Segundo Serra (2006) esses três elementos (sujeito incluído, família do sujeito e
professor) são essenciais nos processos inclusivos no ambiente escolar. O sujeito
incluído, ou que necessita ser incluído, é o reflexo do que se quer oferecer aos alunos
quando tratamos de educação inclusiva. O professor, como já visto anteriormente, é o
elemento mais importante para atenuar estes processos de exclusão pelo qual passam
estes sujeitos, já que este deve estar consciente de sua prática pedagógica para que a
educação inclusiva exerça a sua função: promover a aprendizagem destes alunos e o
desenvolvimento de suas potencialidades. Outro elemento importante e indispensável no
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processo de inclusão é a família do sujeito, que muitas vezes passa por processos de
exclusão, por terem filhos com necessidades especiais.
É preciso que haja sempre uma parceria contínua entre esses três elementos para
que esta inclusão possa de fato ocorrer.
4.3 Os conceitos de currículo, avaliação, metodologia e prática
pedagógica.
Segundo a lei de Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação
Básica (2001) o conceito de escola inclusiva desencadeia uma nova postura da escola
comum. Uma escola inclusiva parte do pressuposto de que é preciso propor em seu
projeto político pedagógico (currículo, metodologia, avaliação e prática pedagógica)
ações que intensifiquem e com isso favoreçam a interação social.
Inclusão não é somente matricular alunos com necessidades especiais nas redes
regulares de ensino, ignorando suas necessidades. Inclusão é adaptação de currículo,
de metodologia, de formas de avaliar os alunos. É preciso ter em mente em nossas
práticas pedagógicas que a inclusão necessitará sempre que repensemos nossa maneira
de educar. É ter consciência de que nem sempre se pode utilizar os mesmos métodos
para fazer com que o aluno aprenda, pois a diversidade é grande e a maneira de receber
aquilo que se ensina pode mudar de um grupo para o outro.
Segundo Schettini (2003) a realização da aprendizagem é resultado das
características individuais de cada um, ou seja, ninguém é obrigado a aprender no
mesmo tempo e da mesma maneira que o outro aprende, e os professores, precisam
entender que muitas vezes isso não está relacionado à deficiência do aluno.
5.4 A diferença no processo inclusivo
Para que a inclusão seja benéfica para todo e qualquer ser humano é importante
entender que ser diferente é algo positivo. Na verdade, muitos não dão conta de que
todos são diferentes uns dos outros, e essas diferenças se manifestam em situações
simples como na maneira de se vestir, por exemplo, até diferenças mais acentuadas,
como nos casos das deficiências.
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Rubem Alves em seu livro Como Nasceu a Alegria (1999) afirma que “o medo dos
olhos dos outros é sentimento universal. Todos nós gostaríamos de olhos mansos... O
que muda não é a diferença. São os olhos....”
Como então diminuir o abismo que crianças autistas sofrem devido à sua
“diferença”? Uma palavra responde esta questão: convivência. Só eh possivel entender
e aceitar aqueles que são diferentes, à medida que nos aproximamos dessa diferença,
ou seja, apenas convivendo com crianças autistas, e percebendo suas necessidades,
sua maneira de entender e sentir o mundo. A conivência de uma criança autista com
outras crianças facilitará sua identidade, pois ela se sentirá aceita como ser humano. A
diferença contribui para interação e para a convivência. (SCHETTINI; 2003).
5.5 A formação de professores para uma educação inclusiva
Um dos aspectos em destaque na realização das entrevistas com os professores
foi a questão da formação docente. Ao serem indagados quais as ações necessárias
para que os alunos autistas sejam incluídos em salas de aula de ensino regular, a
maioria, de uma maneira ou de outra, relacionou a questão da formação dos professores,
que se encontra defasada.
Santos (2006) afirma que pesquisas realizadas nesta área apontam que os
professores não estão preparados para receber alunos com necessidades especiais em
suas salas de aula. Mais adiante ela pondera que o professor da classe regular não está
capacitado para lidar com os alunos que apresentam deficiências, pois não há discussão
sobre isso e muitos consideram que o aluno especial é considerado de responsabilidade
única e exclusiva da educação especial.
Muito se tem falado sobre a questão de melhoria da formação dos professores
para que estes possam saber lidar com as diversidades encontradas em sala de aula,
uma vez que o professor é o maior condutor desta questão no âmbito escolar. Muitos
professores não se sentem preparados para aceitarem alunos com necessidades
especiais em suas salas de aula, apesar de acreditarem que a inclusão é benéfica e
importante para o aluno que dela necessita. No entanto, não adiantam políticas, leis,
diretrizes, oportunidades de formação continuada se o professor não quiser esta
inclusão. Há de se Concordar plenamente que uma formação mais específica e voltada
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para a questão de inclusão de portadores de necessidades especiais seja importante,
porém é de grande valia ressaltar que inclusão é a junção de muitos fatores,
principalmente coragem e abdicação de nossos preconceitos.
A aprendizagem modifica de forma inigualável a vida dos seres humanos, já que
oferece caminhos diversos, criando escolhas, oportunidades e criando também
pensamento crítico, gerando condições de escolhas e tomadas de decisões.
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CONCLUSAO
A inclusão de autistas só será possível quando houver uma sociedade inclusiva,
ou seja, uma sociedade que aceite as diferenças, uma sociedade realmente democrática,
em que todos possam participar da tomada de decisões que se manifestam no cotidiano.
Só haverá portanto, inclusão se cada um de nós compreender que o mundo foi feito para
todos, enquanto acreditarmos que inclusão só diz respeito as pessoas com deficiência
não teremos inclusão, mas sim ilusão.
Ao final desse estudo conquista-se a certeza de que algumas palavras se fazem
necessárias para que autistas sejam incluídos, essas palavras vem carregadas de um
desejo e uma esperança de que um dia tenhamos uma educação realmente inclusiva
para estas pessoas e para todos os que se sentem excluídos, são elas: aceitação,
coragem, compreensão, reflexão e inovação.
Para conclusão desta monografia parafrasearemos Santos (2005) que afirma que
inclusão não é uma ameaça, não é um processo que começou hoje e terminará amanhã,
na verdade, inclusão não tem fim, pois o mundo não pára e com isso novos processos
excludentes poderão aparecer, cabem àqueles que já se conscientizaram do que vem a
ser inclusão, não esmorecer e estar em constante alerta para que uma sociedade mais
justa e democrática seja construída sempre.
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APÊNDICE
Entrevistas realizadas com os professores.
Perguntas para entrevista:
1) O que você entende por educação inclusiva?
2) Você conhece o distúrbio autista? Como o descreveria?
3) É possível, em sua opinião, que alunos autistas estudem em uma classe de
ensino regular? Por que?
4) Quais ações você acredita serem necessárias para a inclusão de autistas em uma
sala regular?
5) Você se sente preparada para a inclusão? Por que?
Respostas Obtidas:
1º Entrevista
1) Acredito que uma educação inclusiva é aquela que permite que uma criança com problema seja uma deficiência motora, mental, de alguma forma estude em uma escola normal. Se bem que hoje é difícil você definir o que é normal. Hoje em dia, a gente convive com uma quantidade de crianças que são hiperativas, ou que se descobrem hiperativas etc dentro de uma sala de aula. E se a professora não tiver um olhar diferenciado ela vão ficar lá sem serem percebidas. Creio que a inclusão é algo positivo, é preciso conviver e incluir essas crianças, mas também resguardando um certo grau da sua dificuldade.
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2) Sim. Mas não sei descrever precisamente. Eu descrevo um autista por puro “sentimento”, é difícil falar sobre isso, pois não sei quais são suas deficiências, o que sei é que tudo que vejo de uma criança que tem ações repetitivas, que fica parado olhando para o “nada”, isso me dá a sensação de que ele é autista. Então eu avalio um autista por essa ótica, na verdade não sei se isso é autista, só sei que ele é diferente, pois tem um comportamento diferente das outras crianças. Tenho crianças na sala de aula em que eu sinto isso, essa coisa de eu perguntar algo e ela fica com aquele olhar vago, não responde as questões, parece que está em outro mundo. Então associo o autismo a isso.
(Nesse momento, explico de maneira muito breve e sucinta o que é o transtorno autista e a entrevista prossegue).
A minha base do que é o autismo vem da ficção, do que vejo nos filmes, na verdade essa é a minha referência.
3) Dependendo do grau de deficiência da criança eu acho pouco provável que uma criança sem alguém capacitado para acompanha-la, seja o professor ou um outro profissional especializado, acho difícil que essa criança consiga se desenvolver como as outras crianças, porque ela tem uma necessidade de atividades e cuidados diferenciados. Acredito que esta inclusão tem que vir, mas acompanhado de alguém especializado dentro da sala de aula trabalhando junto com o professor. Outra coisa é a capacitação dos professores, ou você tem alguém que te auxilie, que seja conhecedora do assunto ou então as instituições (pública ou privada) têm que promover meios para essa capacitação, pra que essa criança possa ser incluída. Caso contrario a escola especializada talvez fosse uma opção, mas aí caímos numa outra questão que é a descriminação dessas crianças. A escola é obrigada a incluir, deve-se incluir sim, pois então capacite os professores para trabalharem com essas crianças.
4) Capacitação dos professores.
5) Não me sinto preparada, pois não tenho conhecimentos específicos suficientes para atingir uma criança como essa. Como professor a gente “se vira”, tenta dar nosso jeito, vai atrás do conhecimento, mas porque ela está ali e você não pode simplesmente ignora-la ou passar por cima, pois ela não vai acompanhar. Eu teria que fazer um curso
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ou ler mais sobre para poder de alguma forma fazer com que essa criança aprenda. Mas, assim como eu tenho que me preparar, a escola também tem que dar subsídios para isso, pois a carga horária é alta, o número de crianças em uma sala de aula é grande etc. Hoje em dia a escola deixou de ser uma instituição educacional para ser uma instituição financeira, visa-se o lucro que aqueles alunos vão te dar no final do mês. E com relação à escola pública a falência é tão absurda que passou a ser uma instituição desacreditada. Hoje a situação da escola pública e ate mesmo de algumas privadas é essa: você finge que ensina e o aluno finge que aprende. Inclusão na teoria é uma coisa, mas na prática é outra, incluir não é só você colocar um aluno com problemas numa sala de aula normal, mas é fazer com q ele aprenda. Não me sinto preparada para a inclusão, é preciso um movimento do governo, dos professores para que ela ocorra realmente.
2º Entrevista
1) Acredito que é uma educação que aceita e inclui as diferenças no projeto pedagógico. Quando digo diferença, digo de qualquer tipo de diferença, diferença de raça, de deficiência, de escolha sexual, afinal todos nós somos diferentes.
2) Sim. Descrevo como uma criança que tem um mundo próprio, que não se relaciona com as outras pessoas, com o meio que está inserida, é uma criança fechada. Creio que existem vários graus de autismo e com isso alguns não chegam a se comunicar. Leio reportagens de revistas de psicologia, ou seja, meu conhecimento vem disso, mas nunca convive com uma criança autista.
3) Acredito que os professores não estão preparados para receber uma criança autista, ou pelo menos, a maioria deles, eu acho complicado um autista estudar numa escola regular, pois eles precisam de alguém que entenda mais suas deficiências, que tenham um acompanhamento mais personalizado. Eles até podem estudar numa escola regular, mas que então que seja uma escola que esteja preparada para essa inclusão, onde o professor conheça a deficiência, tenha estudado e se preparado pra isso. Colocar um autista numa classe regular e achar que ele está incluído é utopia.
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4) Primeiro é uma doença pouco estudada, digo em termos de educação, pois na psicologia sabe-se mais sobre isso. Na educação sabemos muito pouco sobre esse tipo de criança. Então é preciso mais divulgação a respeito do assunto, como por exemplo, o percentual de crianças que tem essa doença. É importante estudarmos sobre isso para estarmos prontos para receber e lidar com elas.
5) Não. Porque tem que ter um olhar diferente, um cuidado diferente, eu com certeza tentaria, mas não sei se saberia lidar com isso. Como professora nunca tive casos de alunos com deficiências. Se tivesse que viver essa experiência eu ia ter que estudar, “correr atrás”, mas hoje eu não me sinto preparada.
(Ao terminar a entrevista, ela pede pra falar sobre a questão da sustentabilidade, uma área que ela estuda e que tem a ver com a inclusão).
A sustentabilidade tem a ver com a inclusão pq ela abrange o fato de você respeitar as diferentes culturas, raças etc pq isso vai ser passado adiante, para as outras gerações, então você não pode se fechar para os núcleos, porque cada vez mais a gente ta vivendo num mundo globalizado, então uma educação visando a sustentabilidade acredita no respeito às novas culturas, novos valores, novos comportamentos pq cada vez mais a gente vive isso. A inclusão é importante em termos de sustentabilidade pq cada vez mais a gente vai ter que lidar com essas diferenças, tentando levar a frente e não “fechar a porta” achando que isso vai resolver o assunto. Cada vez mais temos que estar ligados ao meio em que vivemos, pois o meio em que vivemos é composto dos mais variados tipos de pessoas.
A inclusão é assunto muito importante, mas muito difícil também, difícil de “digerir”, pq as pessoas tem muita dificuldade em lidar com o diferente, isso incomoda demais, é preciso uma mudança na mente das pessoas.
(Perguntei se a escola onde ela trabalha era inclusiva)
A escola onde trabalho não é inclusiva, pois ela é uma escola elitista, que nem diferença de raça tem, pode-se contar nos dedos quantos negros trabalham nela. É uma escola de classe alta que com certeza não está querendo se misturar, os casos de inclusão aqui existem, mas não acho que seja realmente inclusão, inclui-se porque tem que aceitar, mas não é uma escola aberta às diferenças.
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3º Entrevista
1) Como o próprio nome já diz, acredito que incluir é colocar a criança que precisa de uma atenção especial dentro do contexto da própria escola e fazer com que esse aluno interagia com os outros alunos da mesma forma que eles, ou no máximo possível da mesma forma que eles (os outros alunos), já que ele depende de uma certa ajuda para isso. 2) Sim, já ouvi falar. Já li algumas coisas sobre, mas nunca tive contato. Acho que num primeiro momento não saberia reconhecer que aquela criança é autista, mas lidando, trabalhando com ela, aí sim eu poderia reconhecer, pois pelo pouco que conheço e li sobre, acredito que autista é aquela criança que fica muito sozinha, no mundo dela, como se fosse um mundo à parte, é como se nada ao redor dela tivesse acontecendo que só o que ela ta fazendo ali naquele momento é o que importa, é como se ela fosse um elemento à parte do grupo. 3) Acho que na maioria das atividades creio que dá para fazer, mas muitas vezes é preciso uma ajuda especial para este aluno, uma facilitadora talvez. (Perguntei a ela pq ela considerava a facilitadora importante junto com a criança). Como o professor conseguiria dar aula, ao mesmo tempo para todas as crianças e dar uma atenção especial para ela? Eu acho que o professor tem que ser o elemento mais importante ali na sala de aula, mas que precisaria sim de uma ajuda, ajuda de uma pessoa que ajudasse esta criança a entrar no contexto da sala de aula. 4) Em primeiro lugar abertura, porque o preconceito ainda é muito existente em se tratando de deficientes. E uma especialização do professor eu acho que faz muita falta. O professor só se habilita a cuidar de crianças com essas necessidades se ele quiser, caso ele precise, aí sim ele faz um curso específico, mas não é uma coisa obrigatória, o que eu creio que deveria ser, porque hoje em dia a gente lida com diversos tipos de deficiências. Deveria ser algo obrigatório no sentido de vir da faculdade, tipo, disciplinas especificas para isso, sobre educação especial e nas especializações ser uma coisa bem mais aprofundada. Acho também que falta falar sobre, falta esclarecimento, quebra de tabus ainda existentes. 5) Eu sou da opinião “missão dada, missão cumprida”, se me derem uma turma com um, ou mais de um aluno autista eu vou aceitar o desafio com certeza. Agora preparação de saber como lidar, isso eu não me sinto preparada. Se tivesse um aluno autista, eu iria ler, estudar, ver vídeos, me aprofundar no assunto. Lidar com uma turma mista a gente sabe, mas como que eu vou ali direto para fazer com que aquela criança aprenda? Pois, incluir não é só você colocar a criança dentro da sala de aula, incluir é fazer com que ela aprenda. A questão do acolhimento, do carinho com aquela criança eu vou saber fazer, agora como ensinar e fazer com que ela aprenda, eu acredito que não saberia.
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4º Entrevista
1) É a escola aceitar as crianças diferentes, as crianças com necessidades especiais.
2) Já ouvi falar sobre isso. Ele ou ela, na verdade eu só vejo meninos autistas, mas enfim descrevo um autista como uma criança que vive num mundo particular, não consegue interagir, apresenta movimentos repetitivos, como balançar a mão, a cabeça etc. A primeira vez que ouvi falar sobre autismo foi em um filme muito, mas muito antigo chamado “Meu filho, meu mundo” em que a criança era autista. Depois disso passei muito tempo sem ouvir falar sobre isso, somente agora com esse menino que entrou na escola é que retomei o que era isso.
3) Eu acho complicado. A escola tem que estar preparada, os professores tem que estar preparados para lidarem com isso. Eu não saberia lidar com isso, mas tentaria. Porém, uma base teórica é necessária para saber lidar com ele. Eu acho que pra poder aceitar tem que ter um acompanhamento.
(Perguntei se ela acha melhor que alunos autistas estudassem em escolas regulares ou em escolas especializadas para eles).
Acredito que a escola especializada é sempre melhor, pois ela é mais especializada nesse tipo de distúrbio.
4) Ter uma pessoa dentro de sala, que hoje eles chamam de facilitadora, para estar ali com a criança. Para começar seria isso, na verdade creio que é basicamente isso.
5) Não. Porque eu não sei o que eu faria com a criança, o que seria mais indicado para a sua aprendizagem, precisaria de alguém especializado, pelo menos para me dizer alguns princípios de como agir com uma criança assim.
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5º Entrevista
1) É fácil e ao mesmo tempo difícil de responder. Fácil se a gente for pensar no que os livros “falam” pra gente de que você tem que incluir independente de que tipo de aluno ele é. É difícil quando você coloca isso na prática, porque, ao mesmo tempo em que você está colocando um aluno que é “diferente” dos outros, você não tem que pensar somente na maneira como você vai trabalhar com ele, para ele aprender. Mas é preciso também conscientizar os outros alunos aceitarem ele da forma como ele é e que eles tenham condições de colaborar e fazer um aprendizado onde todos saiam ganhando. A partir do momento que você está incluindo e há uma limitação física, cognitiva ou outras tantas, que vai fazer com que ele não aprenda da mesma maneira que os outros, ou não conseguir fazer todas as atividades que os outros também fazem não é o mais difícil. O mais difícil acredito, é fazer com que os alunos o aceitam e contribuam também para a sua aprendizagem. Não é só também, o professor ficar trabalhando só com este aluno “especial”, pois aí quem acaba sendo excluído é o restante da turma. A educação inclusiva consiste justamente no fato de que ele pertence aquela turma ali como um todo e que os colegas possam reconhecer ele com um colega, alguém que também está ali para aprender. 2) Muito pouco. Na verdade, tive um primo muito distante que era autista e seu grau era muito elevado, então vou falar pelo o que eu conheço dele. Ele era uma criança muito inteligente, não sei se todos são assim. Ele aprendeu a ler sozinho, falava coisas que só adultos falariam, coisas que via em programas de televisão, ou que ouvia em algum lugar e ele assimilava aquilo de uma maneira incrível, mas não tinha nenhum tipo de inteligência intrapessoal, a relação com os outros era nula, totalmente nula. Não sei dizer, até que ponto ele conseguiu aprender na escola, pois de início a mãe o colocou numa escola especial. 3) Acho possível. Mas, às vezes o grau é tão alto, como o caso desse meu primo, que é difícil você conseguir com que ele seja incluído na turma, aceito pelos outros. Não é uma questão também só da turma aceitar, ele também precisa aceitar os colegas para que haja uma relação ali. A questão da escola não é só incluir o aluno para ele poder aprender, é também a questão da socialização que é muito importante. Se o grau é muito alto essa socialização fica prejudicada, tipo em uma atividade em grupo é complexo fazer com que ocorra essa interação. Eu acho que o ensino deveria sempre ser numa escola regular, mas dependendo do grau do autismo. 4) Iria procurar ajuda, iria ler muito sobre o assunto para saber e entender como eles pensam. Dentro de uma sala de aula sempre tento imaginar como o aluno está pensando, como ele recebeu a maneira de eu falar, explicar, como ele está “vivendo” aquele exercício passado, quando o aluno não entende algo, fico me imaginando porque será que ele não está aprendendo e reflito de que forma posso mudar meus métodos para que ele possa aprender. No caso do aluno autista, eu iria ler, para conhecer, para me aproximar dele para que ele possa aprender.
6) Ainda não. Pois não tenho conhecimento.
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7) 6º Entrevista
1) Para mim educação inclusiva é uma educação onde você pode englobar alunos com necessidades especiais, adaptando as atividades, de preferência com uma facilitadora que possa conduzir e auxiliar, porque você deixar o aluno sozinho numa sala pra mim não é inclusão, você faz a criança se sentir pior, porque ela vê que os outros conseguem fazer algo e ela não. Então educação inclusiva tem que ter um facilitador junto, ter atividades especificas para aquela criança, digo uma atividade com o mesmo tema para todos, mas uma atividade diferente para ela. Tenho um aluno autista na outra escola em que trabalho e quando tem uma atividade de desenho, por exemplo, ele não consegue desenhar, ele consente, tenta, mas o que ele rabisca não é tartaruga e aquilo o frustra e ele não faz a atividade, com isso bate nos outros colegas. Então descobrimos que com a figura pronta e ele somente pintando-a e coloando-a no lugar ele consegue fazer. No momento que ta todo mundo desenhando, ele escolhe a figura que ele sabe que é uma tartaruga, cola no lugar e pinta, é a mesma atividade, onde o vocabulário está sendo trabalhado, mas adaptada para a necessidade dele.
2) Já conhecia o distúrbio autista antes de começar a dar aula para este aluno, conhecia tanto de ler sobre o assunto, quanto de te ter contato. Tenho um “parente” que é autista, então a gente convive com ele há 15 anos, hoje ele tem 36 anos, mas a idade mental dele é de uma criança de 12 anos de idade. Às vezes ele “desliga”, às vezes tem crises, principalmente quando troca o seu remédio, pois dá umas reações, mas a gente teve que aprender a lidar com isso.
Seu comportamento é se “desligar” do mundo, é totalmente na dele, mas, às vezes, quando a gente pensa que ele não está prestando atenção em algo percebemos que ele está sim prestando sim e dá respostas.
Em relação ao meu aluno, às vezes ele está olhando pro céu, mexendo com as mãos e de repente quando pergunto algo ele responde, ou então, eu percebo que ele está mexendo a boca para falar a palavra, ele ta no “mundo dele”, mas sinto que às vezes ele interage. A aquisição da linguagem está começando agora (ele tem cinco anos de idade), agora que ele está, aos poucos, construindo frases completas, porque antes ele não falava na 1º pessoa, ele falava “ele quer; ele vai” sendo que na verdade, ele estava se referindo a ele mesmo. Agora ele está conseguindo falar “eu”, mas é um trabalho que a facilitadora já vem desenvolvendo há mais tempo, ela fica junto dele o tempo todo.
3) Acho possível sim. Eles aprendem, a gente não pode esperar que eles aprendam tudo o que os outros aprendem, mas eles aprendem.
Vejo pelo meu aluno, ele foi à psicóloga, aí ela mostrou pra ele uma foto do sol, ela perguntou o que era aquela figura e ele respondeu “sun”, ela mostrou a figura de uma
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nuvem e ele respondeu “é uma cloud” (vale ressaltar que essas aulas dadas a esta turma onde este aluno está é de inglês).
Eles aprendem as coisas que mais interessam a ele, o que tem a ver com o “mundo dele”, o mundo que ele criou, coisas muito fora da realidade dele ele não aprende. Ele aprendeu todos os animais, pois ele adora animais e música, pois ele é muito musical.
4) Preparação dos professores. Porque, às vezes, esse meu aluno tem atitudes agressivas, que sabemos que não são pessoais, ele bate na pessoa não por não gostar dela, mas porque ele não está conseguindo, de alguma maneira, comunicar o que ele quer e por isso acaba batendo. Alguns professores levam isso com pessoal e pensam “ele está me batendo porque não gosta de mim” e aí acabam o tratando mal, deixando-o de lado.
Acho que é preciso haver uma preparação maior dos professores mesmo. Porque a facilitadora não está lá todos os dias e não é toda a escola que tem uma facilitadora para auxiliar.
O professor tem que trabalhar com os outros alunos também a questão do respeito, explicar a eles que ele ta fazendo isso por essa razão. Quando o professor tem domínio do assunto é mais fácil lidar e com isso vc consegue fazer com que os outros alunos não o excluam e compreenda melhor.
5) Não completamente. Tenho muita intuição por ter um “parente” nessas condições eu acabo sabendo um pouco mais. Mas, procuro ler, sempre que estou perto de algo diferente, algo que não sei, procuro me informar para saber como vou lidar com aquela situação.
Eu particularmente tenho uma facilidade com o assunto autismo, mas vejo que muitos outros professores não têm, se eu não tivesse essa curiosidade minha, natural de procurar me informar eu não estaria preparada.
Talvez hoje nos cursos de formação de professores tenha isso, essas disciplinas sobre educação especial, mas pra quem já se formou há mais tempo, como é o meu caso, não havia isso, não era realidade na escola. Então é preciso uma reciclagem, um curso especializado, disciplinas pra quem está na faculdade e cursos para pessoas que já se formaram, uma especialização para gente reaprender ou aprender, saber como lidar também. E inclusive auxiliar os pais também e, principalmente os outros pais, para lidarem com este assunto, para eles terem noção do que se trata, na verdade, falta falar, falta comunicação.
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(Ao finalizar a entrevista perguntei se ela acha a escola especial era melhor para alunos autistas ou se era melhor a escola regular).
Acredito que a escola especializada. Acho a inclusão muito importante, estar no meio de todos, mas cria-se certas frustrações para a criança especial. A criança que não é especial tem a oportunidade de aprender a lidar com aquela criança especial, mas ao mesmo tempo você pode desenvolver o medo, porque numa relação violenta que a criança tiver, o outro pode não entender que ele está fazendo aquilo que é “especial”. A inclusão é boa pelo lado da interação, mas tem o outro lado que eu não acho positivo que é a frustração dessa criança especial. Como todas as escolas não conseguem uma facilitadora, pode acontecer da criança ficar ali “jogada” num canto e isso não é inclusão, creio que ele estaria aprendendo mais numa escola voltada para as necessidades dele. A facilitadora veio da escola, no início esse meu aluno estava em outra turma, mas teve que trocar de turma porque a professora não estava preparada para recebe-lo, lá ele tb tinha uma facilitadora, mas a professora não estava preparada para lidar com ele, ela acabou passando esse despreparo para os alunos e isso acabou gerando um ambiente ruim na sala, esse problema chegou aos pais dessas crianças que foram à escola pedir para que esse aluno autista fosse tirado da escola, mas a escola não aceitou isso, resolveu por muda-lo para outra turma. Hoje em dia, a gente vê que o trabalho está fluindo mais, que ele está mais sociável, às vezes não quer fazer uma atividade, a facilitadora então, vai lá e conversa com ele, mostra que ele faz parte do grupo e hoje ele ta começando a sentir isso, mas porque há um “link”, escola+ família+ facilitadora e professora.
7º Entrevista
1) Hoje ta muito bagunçado isso e a gente não entende muito bem o que é. Pela minha experiência inclusão não é somente você colocar a criança dentro de sala de aula, é também adaptar o currículo, ver as necessidades da criança é estar atenta a cada passo que ela dá e o que elas tem possibilidade de dar. A educação inclusiva não é só colocar em sala, é fazer estar com o grupo tanto socialmente, emocionalmente e pedagogicamente.
2) Antes de trabalhar com este aluno autista, nunca tive contato, conhecia o distúrbio através de textos.
Esse aluno é um autista que recebe e aceita contato físico, então ele não tem nenhum tipo de rejeição a aproximação de estranhos, ele fica meio que esperando, mas não tem quando se aproximam dele, acredito que devido ao fato de que desde muito cedo ele foi estimulado ao contato físico.
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3) Eu acho possível, dependendo do grau de autismo da criança. No caso dele, a parte mais afetada é a da fala e a cognitiva, então creio que é possível. Agora nos casos mais severos, de crianças que batem ou são agressivas, que não aceitam o contato físico é mais complicado. É preciso prestar atenção no grau da criança, se for muito elevado creio que a instituição especializada é mais indicada.
4) Em primeiro lugar conhecer a criança, que foi o que eu fiz. Nas primeiras semanas não fiz nenhuma atividade, tentei primeiro estabelecer um contato com ele para saber o que fazer e observei muito o que a facilitadora fazia com ele, pois ela já está com ele há bastante tempo. A partir do momento que eu o conheci aí eu passei a adaptar o currículo. Uma das coisas que eu considero fundamentais é adaptar o currículo para essas crianças, é levar a sério, já que ele está ali na sala, que ele tem o mesmo direito que as outras crianças, então adaptamos este currículo e o trabalho dele é diferenciado das outras crianças, mas feito no mesmo momento que as outras crianças estão fazendo.
5) Eu acho que ninguém por mais que freqüentes anos e anos de faculdade estarão preparados para a inclusão, porque cada inclusão é uma inclusão, cada caso é um caso. É como as crianças que nós temos em sala, que chamamos de “normais”. Na verdade, são crianças são completamente diferentes e a realidade é que muitas delas também são crianças que precisam de inclusão, às vezes é uma inclusão emocional, mas não deixa de ser uma inclusão. Eu acho que ninguém está preparado porque o ser humano é um “leque” de possibilidades, acredito que é muito do momento, por exemplo, com essa criança eu posso ir por esse caminho, mas com uma outra talvez eu já não possa ir pelo mesmo caminho.
Hoje eu me sinto preparada para receber alguém diferente e respeitar essa pessoa. Não sou conhecedora do autismo e por mais que eu conhecesse eu acho que facilitaria, mas não ia garantir.
(Perguntei a ela como era o comportamento do aluno autista, seu processo de ensino-aprendizagem e sua relação com os outros, e a entrevista prossegue).
Ele precisa ser estimulado o tempo inteiro, não pode ser deixado sozinho, em uma atividade tem sempre que ter alguém do lado dele. Ele tem duas facilitadoras (uma fonoaudióloga e uma psicopedagoga), mas que estão em momentos diferentes da tarde e eu fico observando como elas estão auxiliando ele na atividade que eu dei e como ele está respondendo a esta atividade.
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Logo no início do ano ele não tinha nenhum tipo de rotina, então ele chegava e começava a rodar pela sala, quase correndo e aos poucos nós fomos “montando” a rotina dele, chegar, colocar a mochila no lugar, a agenda em cima da mesa, a partir do momento que ele senta ela sabe que ali ele vai fazer uma atividade, então ele faz todo o trabalho. Quando ele está cansado ele começa a chorar, pois ele não fala, a forma dele se comunicar e dizer “meu tempo acabaram” é chorando. No início ele se irritava e gritava mesmo, hoje ele simplesmente empurra o material e chora.
Na hora do lanche ele aceita pouquíssimas coisas e na hora de brincar ele fica passeando no quintal, vendo as crianças brincarem, ele não chega para brincar, às vezes um colega o pára e faz um carinho nele ou o abraça, ou põe a mão nele e ele passa a mão no colega como se dissesse “oi” e continua andando e andando e assim ele se mantém a tarde toda. Uma coisa que ele já consegui é olhar nos olhos do colega, por pouco tempo, mas ele olha. Ele consegue também olhar figuras quando estamos contando uma história, por pouco tempo, mas olha. E ele sabe exatamente a hora de ir embora, então quando ele escuta os nomes dos alunos sendo chamados para a saída, ele pára tudo que está fazendo, pega suas coisas, coloca a mochila nas costas e fica esperando. Então, a rotina pra ele é algo fundamental, qualquer coisa que saía da rotina dele ele se desestrutura e aí é preciso da intervenção do adulto para ele voltar a se equilibrar.
Com relação à aprendizagem ainda não conseguimos avaliar se ele realmente está aprendendo o que estamos tentando ensinar para ele. Por exemplo, trabalho com eles um determinado livro o do “Mico Maneco”, a gente vai muito pela idéia da Heloisa Vilas Boas.
Faz a frase, escolhe-se uma palavra, mas dentro da possibilidade dele, escolhi a palavra macaco, pegamos várias coisas que com começam com o “ma” do macaco, como “mata” , tentando fazer o máximo possível trazer coisas do cotidiano dele, que ele conhece. Então quando eu coloquei a palavra “mata” aquilo para ele não fez sentido algum, então temos que procurar alguma coisa com a letra M, mas que tenha sentido pra ele, se colocar o meu nome (o nome da professora começa com a letra M) é uma coisa da realidade dele, pois ele me conhece e sabe que esse é meu nome.
Para agilizar a questão social dele começamos a fotografa-lo com outros colegas, fazendo atividades, brincando no quintal, dentro de sala, ele tem um caderno com essas fotos e escrito embaixo o que ele tava fazendo no momento em que aquela foto foi tirada, para podermos mostrar pra ele que existe aquele mundo e que ele faz parte desse mundo, fotografamos também os outros professores das outras disciplinas dele com seus nomes embaixo da foto. Então, o máximo possível a gente consegue trazer pra ele a realidade dele e buscando nisso a aprendizagem. A gente já vê que ele faz relações de nomes, forma nomes, por exemplo, a palavra macaco, ele já consegue pegar as sílabas e formar o nome macaco. No início a gente colocava a figura e duas palavras e aí ele
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pegava a palavra correspondente a figura, num outro momento começamos a colocar três palavras e ele pegava a palavra correta. Então, a gente acredita que ele está aprendendo, mas ainda não temos total certeza.
Passamos agora para as frases, então, o fotografei fazendo a atividade, peguei a foto e fiz um quebra-cabeça, ele montou a foto dele (o quebra-cabeça), aí coloquei duas frases do lado e perguntei qual a frase dizia o que ele tava fazendo na hora em que a foto foi tirada, lemos a frase, sem mostrar nenhuma das duas e ele tem que pegar a frase correta e colocar embaixo da foto. Começamos com as palavras e agora com as frases, mas só trabalhando frases do contexto dele. Eu acho que ele está aprendendo, ontem ele estava balbuciando dois fonemas o “ma” e o “la” e ele ficou muito feliz e a gente sabe que ele fica feliz porque ele tem um movimento corporal diferenciado, ele bate os braços e começa a rir, aí eu sei que aquilo é sinal de felicidade.
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INDICE
RESUMO_________________________________________________________ 03
METODOLOGIA___________________________________________________04
SUMARIO________________________________________________________08
INTRODUÇÃO _____________________________________________________ 10
CAPÍTULO 1
COMPREENDENDO A INCLUSAO_____________________________________15
1.1 EDUCACAO ESPECIAL _____________________________________________ 21
1.2 O BRASIL E OPROCESSO INCLUSIVE_______________________________24
1.3 DADOS ESPECIAIS DA EDUCACAO__________________________________26
CAPÍTULO 2
TRANSTORNO AUTISTA________________________________________________28
2.1 O CONCEITO DE AUTISMO E SUAS DIVERSIDADES___________________34
2.2 O AUTISMO E O PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM_____________37
2.3 AUTISMO E INCLUSAO__________________________________________45
CAPÍTULO 3
DISCUSSAO E ANALISE DE DADOS___________________________________52
CAPÍTULO 4
AUTISMO E INCLUSAO: VENCENDO BARREIRAS________________________52
4.1 O PROFESSOR NA OTICA INCUSIVA_______________________________54
4.2 SUJEITO INCLUIDO, PROFESSOR, FAMILIA: UM PASSO A MAIS NO CAMINHO PARA INCLUSAO.__________________________________________________54
4.3 OS CONCEITOS DE CURRICULO, AVALIACAO, METODOLOGIA E PRATICA PEDAGOGICA._____________________________________________________55
4.4 A DIFERENCA NO PROCESSO INCLUSIVO___________________________55
4.5 A FORMACAO DE PROFESSORES PARA UMA EDUCACAO INCLUSIVA___56