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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO VEZ DO MESTRE O PAPEL DO PSICOPEDAGOGO AO UTILIZAR O LÚDICO
NA EDUCAÇÃO INFANTIL
Por: Priscila de Vasconcelos Lima
Profº: Nilson Guedes Freitas Orientador
Rio de Janeiro 2007
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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO VEZ DO MESTRE O PAPEL DO PSICOPEDAGOGO AO UTILIZAR O LÚDICO
NA EDUCAÇÃO INFANTIL
Monografia apresentada à Universidade Cândido Mendes para obtenção parcial do grau de especialista em Psicopedagogia.
Rio de Janeiro 2007
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AGRADECIMENTOS Agradeço a minha família, a todos os meus colegas do curso de Psicopedagogia e
aos meus amigos.
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DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho de pesquisa àqueles que se encontram envolvidos com o
processo de aprendizagem e o atendimento da criança com problemas escolares,
buscando, assim, uma relação afetiva, pessoal e contextualizada, que permita que
o momento de novas descobertas seja de grande alegria e entusiasmo para o
educando.
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RESUMO O presente trabalho tem como objetivo analisar a utilização do lúdico no processo de aprendizagem e no atendimento da criança com problemas escolares, limitando-se ao seguimento da Educação Infantil e procurando responder se este é agente facilitador da mesma ou não. Para tanto a metodologia utilizada foi a pesquisa bibliográfica do tema, encontrando em Piaget e Vygotsky resposta positiva a questão problema. Estes teóricos da educação afirmam os benefícios cognitivos, afetivos, sociais, físicos e didáticos dos jogos e brincadeiras, apontando-os como fonte de lazer e simultaneamente como fonte de conhecimento. Palavras-chaves: lúdico, aprendizagem, Educação Infantil, agente facilitador.
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SUMÁRIO Introdução..........................................................................................................6
1. Histórico da Psicopedagogia no Brasil.........................................................8
2. O Lúdico na Psicopedagogia.......................................................................17
3. O Papel do Psicopedagogo na Utilização do Lúdico...................................26
4. A Contribuição do Lúdico na Educação Infantil...........................................36
Conclusão.........................................................................................................43
Referências Bibliográficas................................................................................45
Anexos.............................................................................................................47
Índice...............................................................................................................48
Folha de Avaliação..........................................................................................49
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INTRODUÇÃO
Os jogos são excelentes instrumentos de atuação pedagógica para a
Educação Infantil.
Certamente o brincar e o jogar caminham juntos, e fazem parte da formação
do homem e de uma humanidade mais sadia, justa e equilibrada.
Quando se fala em crianças pensa-se em sorrisos, brinquedos, brincadeiras,
cantigas e jogos, ou seja, brincar é algo que pertence à infância de maneira útil,
saudável e construtiva. A cada geração os jogos se renovam, tomam formas
diferentes, mas o seu objetivo continua sendo o mesmo, de desenvolver o
conhecimento, o domínio, a utilização do corpo, regulando as emoções,
estimulando diversos raciocínios e ampliando a convivência social.
Jogar é uma atividade natural do ser humano. Ao jogar, a criança fica tão
envolvida no que está fazendo, que coloca na ação seu sentimento e emoção. O
jogo é um elo integrador entre os aspectos motores, cognitivos, afetivos e sociais.
Por isso, parte-se do pressuposto de que é brincando e jogando que a criança
ordena o mundo à sua volta, assimilando experiências e informações e, sobretudo
incorporando atividades e valores. Portanto é através do jogo que ela reproduz e
recria o meio que a circunda.
A Educação Infantil precisa ser prazerosa e estimula à movimentação
constante de todos os envolvidos no processo ensino-aprendizagem.
O trabalho com jogos deve ser levado a sério, pois brincando, a criança
conseguirá atingir seu objetivo de maneira agradável e descontraída, conseguindo
com isso, um aprendizado contínuo e linear, proporcionando que a criança
construa seu conhecimento e se torne um adulto crítico, dinâmico e participativo.
O jogo é muito importante em um fazer psicopedagógico, pois leva o
psicopedagogo a observar o indivíduo como um todo, observando seu
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comportamento enquanto joga e interferindo, quando achar necessário, visando
ajudar.
O jogo estimula a exploração e a solução de problemas e, por ser livre de
pressões e avaliações cria um clima adequado para a investigação e a busca de
soluções, ele simula situações de trocas que se estabelecem durante toda a vida
entre indivíduo e o meio.
O capítulo 1 refere-se ao histórico da Psicopedagogia no Brasil,
contextualizando o momento da constituição da Psicopedagogia no Brasil, desde
seu surgimento até os dias atuais. No capítulo 2, a interação do lúdico e a
Psicopedagogia constata que uma das formas de trabalho psicopedagógico, é
fazendo uso do lúdico, que é um rico instrumento de investigação clínica, pois
permite ao sujeito expressar-se livre e prazerosamente. No capítulo 3, discute-se o
papel do psicopedagogo na utilização do lúdico, onde o psicopedagogo poderá
detectar problemas e minimizá-los ou com um trabalho preventivo, evitá-los, para
que, no capítulo 4, possa discorrer a respeito da contribuição do lúdico na
Educação Infantil, pois propicia a descentração, aquisição de regras, a expressão
do imaginário e a apropriação do conhecimento pela criança.
Espera-se que este trabalho de pesquisa sirva de subsídio na detecção,
prevenção e mediação efetiva das dificuldades de aprendizagem, mas
principalmente que ele seja um veículo de conscientização para educadores,
psicopedagogos e demais profissionais nesta área, acerca do desenvolvimento do
“olhar” e da “escuta” para com as crianças enquanto seres humanos singulares e
aprendentes.
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1. HISTÓRICO DA PSICOPEDAGOGIA NO BRASIL
A Psicopedagogia nasceu na Europa, ainda no século XIX, devido à
necessidade de contribuir na busca de soluções para a difícil questão do problema
de aprendizagem. Os filósofos, os médicos e os educadores foram os primeiros a
pensarem sobre esse assunto. A Psicopedagogia está fortemente marcada pela
literatura francesa, na qual é possível destacar alguns autores como, Jacques
Lacan, Maud Mannoni, Françoise Dolto, George. Mauco, Janine Mery, Pierre
Vayer e Maurice Debesse.
A literatura francesa conta com o trabalho de Janine Mery, psicopedagoga
francesa – que apresenta algumas considerações sobre o termo Psicopedagogia e
sobre a origem dessas idéias na Europa, e os trabalhos de George Mauco,
fundador do primeiro centro médico-psicopedagógico na França onde se percebe
as primeiras tentativas de articulação entre Medicina, Psicologia, Psicanálise e
Pedagogia, na solução dos problemas de comportamento e de aprendizagem.
O termo psicopedagogia curativa, adotado por Janine Mery, é usado para
caracterizar uma ação terapêutica que considera aspectos pedagógicos e
psicológicos no tratamento de crianças que apresentam fracasso escolar. Janine
Mery aponta o século XIX como aquele em que teve início o interesse por
compreender e atender portadores de necessidades especiais e outros problemas
relacionados ao comprometimento da aprendizagem. Segundo essa autora, no
final do século XIX, educadores como Itard, Pereire, Pestalozzi e Seguin
começaram a se dedicar às crianças que apresentavam problemas de
aprendizagem em razão de vários tipos de distúrbios. Mery aponta esses
educadores como pioneiros no tratamento dos problemas de aprendizagem,
observando, porém, que eles se preocupavam mais com as deficiências sensoriais
e debilidade mental do que propriamente com a desadaptação infantil.
Ainda em fins do século XIX, foi formada uma equipe médico- pedagógica
pelo educador Seguin e pelo médico psiquiatra Esquirol. A partir daí a
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neuropsiquiatria infantil passou a se ocupar dos problemas neurológicos que
afetam a aprendizagem. Nessa mesma época, Maria Montessori, psiquiatra
italiana, criou um método de aprendizagem destinado inicialmente às crianças
retardadas.
Segundo Mery, em 1946 foram fundados os primeiros centros
psicopedagógicos, onde se buscava unir conhecimentos da Psicologia, da
Psicanálise e da Pedagogia para tratar comportamentos socialmente inadequados
de crianças, tanto na escola como no lar, objetivando a sua adaptação.
A partir de 1948, entretanto, o termo pedagogia curativa passa a ser
definido como terapêutica para entender a crianças e adolescentes desadaptados
que, embora inteligentes, tinham maus resultados escolares. A Pedagogia
Curativa introduzida na França poderia ser entendida como “método que favorecia
a readaptação pedagógica do aluno”, uma vez que pretendia tanto auxiliar o
sujeito a adquirir conhecimentos, como também desenvolver a sua personalidade.
É recorrente na literatura, o termo psicopedagogia ser tratado como
sinônimo de outros que são: Psicologia Escolar e Psicologia Educacional. Isso se
deve ao fato de que, do ponto de vista da atuação profissional, o psicólogo
educacional e o psicólogo escolar desempenham papéis semelhantes.
Ainda na fase do seu desenvolvimento, os conhecimentos
psicopedagógicos, os fatores etiológicos eram utilizados para explicar índices
alarmantes do fracasso escolar. Esses fatores envolviam quase que
exclusivamente aspectos individuais como desnutrição, problemas neurológicos,
psicológicos, etc. No Brasil, particularmente, durante a década de 70, foi
amplamente difundido o rótulo de Disfunção Cerebral Mínima – DCM - para as
crianças que apresentavam, como sintoma proeminente, distúrbios na
escolaridade.
O objeto central de estudo da Psicopedagogia está se estruturando em
torno do processo de aprendizagem humana: seus padrões evolutivos normais e
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patológicos – bem como a influência do meio (família, escola, sociedade) no seu
desenvolvimento. A Psicopedagogia estuda o ato de aprender e ensinar, levando
sempre em conta as realidades interna e externa da aprendizagem, tomadas em
conjunto. E, mais, procurando estudar a construção do conhecimento em toda a
sua complexidade, procurando colocar em pé de igualdade os aspectos
cognitivos, afetivos e sociais que lhe estão implícitos.
A vertente mais antiga que influenciou o surgimento da Psicopedagogia no
Brasil foi o movimento da Escola Nova, que direcionou à política a educação dos
anos vinte aos anos sessenta, buscando respostas para os problemas
relacionados à educação brasileira em experiências consagradas em outros
países, como nos Estados Unidos e na Europa, baseando-se em uma concepção
acerca do reconhecimento da especificidade psicológica da criança. Como
salienta Mendes (1998, p.32) “sob a influência do aparecimento da Escola Nova
(na década de 20), o ensino é reformulado, e então passa-se a defender a idéia de
promover a educação integral do aluno”.
Contudo, o processo histórico da Psicopedagogia no Brasil encontra seu
lugar somente no final da década de setenta e início da década de oitenta,
juntamente com os profissionais que atuavam com os problemas de
aprendizagem, principalmente nas áreas de leitura e escrita.
Nessa época, a expressiva demanda pela Psicopedagogia foi provocada em
virtude do elevado índice de evasão escolar e repetência, principalmente na
escola pública. Para Scoz (apud Mendes, 1998, p.33), “as causas do fracasso
escolar, que estão vinculadas ao professor, dizem respeito ao seu despreparo
profissional e à sua má formação”. Nesse sentido, fazia-se necessário que os
educadores adquirissem conhecimentos que lhes possibilitassem entender sua
prática, como objetivo de oferecer meios eficazes para que os alunos obtivessem
sucesso na escola.
As primeiras contribuições na área psicopedagógica foram oferecidas por
especialistas argentinos, que vinham ao Brasil para ministrar palestras e cursos,
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preocupando-se com a formação e capacitação que abrangessem os chamados
“distúrbios da aprendizagem”. Desse modo, a formação do psicopedagogo no
Brasil iniciou-se com pequenos cursos que davam subsídios para se entender
aspectos relacionados com a psicomotricidade , linguagem e com a área de
raciocínio, visto que cada profissional construía um currículo a partir das
oportunidades que surgiam.
Um dos especialistas que mais contribuíram para a formação dos
psicopedagogos no Brasil foi o argentino Jorge Visca, que esteve em São Paulo
entre os anos de 1982 e 1983, estabelecendo um maior vínculo com os
profissionais do Rio de Janeiro e alguns anos mais tarde, trabalhando com os
especialistas de Curitiba, com os quais atualmente ainda mantém atividades.
Visca adota a concepção da Epistemologia Convergente, isto é, a articulação
entre a Epistemologia Genética e a Psicanálise.
Para Scoz (1994, p.20), “Visca concebe a aprendizagem como uma
construção intrapsíquica, com continuidade genética e diferenças evolutivas,
resultantes das pré-condições energético-estruturais do sujeito e das
circunstâncias do meio”.
Durante a década de oitenta, a psicopedagoga argentina Ana Maria
Rodrigues Muniz veio ao Brasil para um seminário de três dias, num primeiro
momento. Em seguida, coordenou grupos de estudo, colaborando para o
enriquecimento das pessoas que atuavam na Psicopedagogia e por conta disso,
nesse período chegou a morar em São Paulo, conforme comenta Mendes (1998,
p.48)
Referindo-se ao depoimento da psicóloga Fátima Gola, Mendes (1998,
p.48) salienta que:
A formação com Ama Maria Muniz foi uma resposta à dicotomia que vivia como professora pela manhã e psicóloga à tarde. Para ela significou o encontro de uma abordagem de trabalho, que era estabelecer uma relação entre os aspectos cognitivos e a psicanálise. Anete Fernandes nos conta que iniciou o grupo de formação com Ama Maria Muniz por volta de 1985 ou 86, permanecendo no mesmo por sete anos, pois ela
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era a pessoa que fazia a articulação entre Psicanálise e Cognição, de acordo com suas expectativas.
Sara Pain (1985), filósofa e psicanalista argentina, veio a São Paulo em
1984 ministrar palestras a convite do Centro de Estudos Vera Cruz (CEVEC). Nos
anos seguintes, passou a ser convidada pela Associação Brasileira de
Psicopedagogia (ABPp), estando envolvida em inúmeros encontros e congressos.
Em 1989, participou de uma semana de atividades com alguns profissionais
ligados à área psicopedagógica, o que contribuiu para delinear o contorno deste
especialista, resultando assim num documento intitulado “Perfil do
Psicopedagogo”, que delimitava as áreas de conhecimento e os campos de
atuação desse profissional.
Como aponta Mendes (1998, p.49):
Na verdade , Sara Pain possibilitou uma visão de aprofundamento na concepção de aprendizagem, a busca da essência do que pode significar a apreensão do conhecimento. Portanto, alem de nos mostrar a articulação entre a cognição e a emoção, sua formação filosófica nos permitia pensar de uma maneira mais criteriosa, procurando o âmago das questões voltadas ao aprender
No final da década de oitenta, Alicia Fernández iniciou suas vindas ao Brasil
ministrando palestras e seminários, revelando-se uma das continuadoras dos
estudos de Sara Pain, pois relacionou a Psicanálise ao ato de aprender,
propiciando o entendimento das diferentes questões envolvidas nesse processo.
Dentro desse contexto no início da década de noventa iniciou a organização de
grupos terapêuticos e em 1992 fundou a Escuela de Psicopedagogia de Buenos
Aires – E.PSI.BA. Segundo Mendes (1998, p.50):
A formação com Alicia Fernández foi mobilizadora no sentido de ampliar meus estudos em psicanálise, entendendo cada vez melhor as variáveis emocionais envolvidas com o ato de aprender. Aprofundei meus estudos, procurando outros grupos de estudo e supervisões com psicanalistas. A partir dessa formação, passei também a trabalhar de forma mais eficiente com as famílias das crianças e adolescentes que estavam em atendimento psicopedagógico comigo, podendo realizar uma interação mais completa entre este trabalho, a escola e a família.
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No que diz respeito ao histórico da Psicopedagogia no Brasil, observa-se nas
suas primeiras concepções uma preocupação com técnicas que contribuíssem
para promover a recuperação, no sentido da cura. As dificuldades eram
entendidas como distúrbios, patologias e os atendimentos das dificuldades de
aprendizagem estavam relacionados a uma visão organicista do ser humano,
sendo que os educadores buscavam explicações através da neurologia. Os
aspectos orgânicos eram, desse modo, motivos de maior preocupação.
Entre os cursos criados, estão os da PUC, constituídos no início da década
de setenta e organizados com o objetivo de atender principalmente os
educadores, que não sabiam lidar com os problemas de aprendizagem.
Como aponta Mendes (1998, p.39) a respeito dos cursos da PUC:
Eram coordenados pela Profª Geny Golubi de Moraes desde 1973 na PUC: “A Criança Problema numa Sala Comum”, “Dificuldades Escolares”, “Pedagogia Terapêutica”, todos voltados para uma concepção de aprendizagem que levava em conta os distúrbios notadamente orgânicos. Estes cursos são considerados precursores dos atuais cursos de Psicopedagogia.
É relevante mencionar que essa perspectiva patológica dos problemas de
aprendizagem foi rapidamente incorporada, pois proporcionava uma explicação
mais ingênua para a situação do sistema de ensino, na medida em que mascarou
a verdadeira natureza do problema, que seria sociopedagógico, conforme salienta
Bossa (1994, p.43).
Ainda na década de setenta já acontecia algum movimento
científico/acadêmico em Porto Alegre, preocupado com a formação e capacitação
de profissionais, sendo dirigido pelo professor Nilo Fichtner que se denominava
Psicopedagogia Terapêutica. Nessa época, os profissionais que atuavam na
cidade iniciaram o contato com os especialistas da Argentina, entre eles, Bernardo
Quiróz, que vinha constantemente ao Brasil ministrar cursos numa visão médica,
organicista, segundo comentários de Rubinstein (apud Mendes, 1998, p.39).
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O primeiro curso regular de Psicopedagogia em São Paulo foi criado em
1979, no Instituto Sedes Sapientiae, o qual preocupava-se com a perspectiva da
formação de um homem global, que pudesse ser percebido a partir de referenciais
intelectuais, afetivos e corporais, possuindo grande vontade de retomar a
educação como área de conhecimento mais significativa. Dentro desse contexto,
os instrumentos pedagógicos e a abordagem construtivista eram as bases mais
objetivas para que houvesse um trabalho paralelo à escola. Nesse período, a
proposta do curso voltava-se para a prática clínica.
De acordo com Mendes (1998, p.41), “na fase em que se segue, a
demanda para os cursos do Instituto Sedes Sapientiae se diferenciam, de uma
característica explicitamente clínica, para uma demanda institucional”.
No ano de 1978, ainda no Instituto Sedes Sapientiae, surgiu um curso com
um enfoque psicopedagógico, mas com nome de “Aprendizagem – Uma Visão
Global de Pessoa no Processo de Educação”. Constituía-se em uma
especialização com duração de um ano. A partir de 1979, este curso passou por
várias estruturações e em 1991 denominou-se “Especialização em
Psicopedagogia – Reflexão e Prática”, visto que a fenomenologia existencial era a
fundamentação teórica de base e tinha como principal objetivo a priorização do
aspecto preventivo num contexto escolar. Nesse sentido, em meados da década
de oitenta, Heloisa Fagali assume a coordenação do curso em questão.
Assim, com os novos conhecimentos das áreas de Lingüística,
Psicolingüística, teorias do desenvolvimento e contribuições de Emilia Ferreiro
(1985), os problemas de aprendizagem são ressignificados e passam a ter outro
direcionamento, iniciando uma linha de trabalho em nível preventivo. Dessa forma,
os conhecimentos dessas teorias vinculados à realidade educacional brasileira
possibilitaram uma visão ampla do sujeito, iniciando-se a fundamentação da
prática psicopedagógica.
Atualmente, existem cursos de Psicopedagogia espalhados pelo Brasil,
como nos estados do Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Paraná, Santa Catarina,
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Minas Gerais, Espírito Santo, Mato Grosso do Sul, Goiás, Bahia, Pernambuco,
Ceará e Brasília.
Segundo Mendes (1998, p.44):
Em meio a este processo do surgimento dos cursos, há que se destacar o papel da Associação Brasileira de Psicopedagogia, constituída em 1980 sob a denominação de Associação dos Psicopedagogos de São Paulo, graças à iniciativa de um grupo de profissionais formadas pelo curso do Sedes (...). O pioneirismo destas pessoas estava fundamentado num discurso daqueles que ao se apropriarem de uma fundamentação teórica, embasavam sua prática em um referencial (a partir de então) denominado Psicopedagógico.
A Associação Brasileira de Psicopedagogia (ABPp) tem sido responsável
pela organização de eventos em dimensão nacional e internacional, bem como
publicações cujos temas retratam as preocupações e tendências da época,
delineando, assim, a prática do psicopedagogo em nosso país.
Nos dias de hoje, a concepção de Psicopedagogia ainda não é uniforme,
tendo em vista que é possível apontar três fases que denotam três diferentes
concepções dessa área, conforme comenta Rubinstein (apud Scoz, 2000, p.419).
A primeira fase caracteriza-se pela Reeducação, ou seja, a visão
organicista das dificuldades de aprendizagem, sendo estas últimas entendidas
como distúrbios e inaptidão; o segundo momento, denominado Psicopedagogia
Dinâmica, preocupou-se com os aspectos subjetivos, assim, a aprendizagem do
sujeito cognoscente manifesta-se como o tema central da Psicopedagogia,
entretanto, mostrou-se necessário construir um curso com uma área própria do
conhecimento para que não se confundisse com uma outra área específica.
Finalmente, a terceira fase, a Psicopedagogia Transdisciplinar, que visa avaliar o
potencial de aprendizagem e o processo em si, exigindo maior compreensão dos
aspectos relacionados à subjetividade e objetividade, sendo valorizadas as
técnicas do profissional e seu estilo pessoal de trabalho.
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Atualmente, a contribuição da Psicopedagogia ultrapassa os limites dos
problemas de aprendizagem, já que os psicopedagogos sensibilizam os
profissionais da escola a respeito de um novo discurso baseado nos pressupostos
de que dificuldades não são sinônimo de patologia e também enfatizam a
importância de se considerar a singularidade do sujeito e a relação vincular
professor/aluno.
Nesse sentido, Bossa (1994, p.06) coloca:
Penso que a Psicopedagogia como área de aplicação, antecede o status de área de estudos, a qual tem procurado sistematizar um corpo teórico próprio, definir seu objeto de estudo, delimitar seu campo de atuação, e para isso recorre à Psicologia, Psicanálise, Lingüística, Fonoaudiologia, Medicina, Pedagogia.
As áreas de aplicação mencionadas na citação acima, ofereceram à
Psicopedagogia uma visão diversificada de fatores que envolvem o processo de
aprendizagem e os problemas dele decorrentes, o que evidencia a necessidade
de um conhecimento multidisciplinar.
Atualmente, a Psicopedagogia refere-se a um saber existencial, às condições
subjetivas e relacionais, especialmente à família e à escola. Dessa forma, o
conhecimento psicopedagógico avalia as possibilidades do sujeito, sua
disponibilidade afetiva de saber e de fazer, reconhecendo que esse saber é
inerente ao ser humano e aprofundando conhecimentos que lhe contribuam de
maneira efetiva em relação aos problemas de aprendizagem e também em um
nível mais amplo, na melhoria da qualidade de ensino.
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2. O LÚDICO NA PSICOPEDAGOGIA
O lúdico é para crianças uma possibilidade de desenvolver o afetivo, o motor,
o cognitivo, o social, o moral e possibilita também aprendizagem de conceitos.
Quando se discute o uso de jogos na educação, aparecem duas correntes:
há autores que destacam sua importância e outros assinalam seus limites e
cuidados. É importante essa ressalva, pois no contexto educativo, o jogo deve ser
usado de maneira justa para que não venha substituir a realidade.
Segundo o dicionário Aurélio o jogo é uma atividade física ou mental
organizada que por um sistema de regras definem quem perde ou ganha, é uma
brincadeira;passatempo,entretenimento.
Na ótica da teoria da psicologia genética, de acordo com Piaget o brincar
representa uma atividade por meio da qual a realidade é incorporada pela criança
e transformada quer em função dos hábitos motores ( jogos de exercícios) quer
em função das necessidades do seu eu (jogo simbólico) ou em função das
exigências de reciprocidade social ( jogos de regras).
Winnicott (1975), diz que “é no brincar, e somente no brincar que o
indivíduo, criança ou adulto, pode ser criativo e utilizar sua personalidade integral:
e é somente sendo criativo que o indivíduo descobre o eu”,
Macedo (2001) defende os jogos especialmente os de regra porque criam
um contexto de observação e diálogo sobre os processos de pensar e construir o
conhecimento de acordo com os limites da criança.
A técnica do jogo em Psicanálise foi elaborada por Melanie Klein, Ana
Freud e outros que aprofundaram o simbolismo inconsciente do jogo. Para
Melanie Klein, brincando a criança expressa de modo simbólico suas fantasias,
seus desejos e suas experiências vividas (1977, p.26).
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Para Vygotsky (1995) o brincar tem origem na situação imaginária criada
pela criança, em que desejos irrealizáveis podem ser realizados com a função de
reduzir a tensão e ao mesmo tempo, para construir uma maneira de acomodação
a conflitos e frustrações da vida real.
Logo é importante entender o lugar que o jogo ocupa para que possa ser
usado de forma adequada. Ele só é educativo quando o educador o desenvolve
com o objetivo e intencionalidade, caso contrário é apenas uma brincadeira.
Pode-se dizer que o jogo está muito ligado ao próprio funcionamento da
inteligência uma vez que a sua construção depende de uma série de assimilações
e acomodações que a pessoa faz ao longo da vida. O cérebro, no entanto, não é
um sistema de funções fixas e imutáveis, mas um sistema aberto, de grande
plasticidade, cuja estrutura e modos de funcionamento são moldados ao longo da
história da espécie e do desenvolvimento individual. Como as possibilidades
humanas são tantas que essa plasticidade pode ser usada de tal sorte que não
são necessárias transformações no órgão físico. Quando a criança joga com
regras exercita todas as suas funções intelectuais mesmo que esta seja de
naturezametafórica. Com o tempo a criança vai distinguindo os diferentes jogos e
percebendo que alguns necessitam de um grande esforço e concentração, sem
deixar de lado o caráter prazeroso da ação.
É importante destacar que o jogo por si só não permitirá o desenvolvimento
e a aprendizagem, mas sim a ação de jogar é que desenvolve a compreensão.
Mas também no lúdico é importante que o aluno seja percebido como ele é,
mesmo apresentando dificuldades, e que o programa de atividades esteja voltado
para atender as suas necessidades.
Por possuir regras supõe-se que o jogo tenha organização e coordenação
que o inserem num quadro de natureza lógica. É necessário conhecer as regras,
compreendê-las e praticá-las exigindo um exercício de operação e cooperação.
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Ao jogar acontece uma série de relações, de encaixe parte e todo, de ordem,
de antecipação e de retroação. Como o jogo envolve operações entre pessoas,
contato social, a situação problema que o jogo oferece dá ao participante
oportunidade de empregar procedimentos cooperativos para alcançar o objetivo
que é ganhar. O jogo assume um significado funcional onde a realidade é
incorporada pela criança e transformada, de acordo com seus hábitos motores,
com as necessidades do eu e em função das exigências do social.
Piaget (1978) dedicou-se a estudar os jogos e chegou a estabelecer uma
classificação de acordo com a evolução das estruturas mentais.
Para Piaget os jogos são classificados em: jogos de exercícios - de zero a
2anos; jogos de símbolos - 2 a 7anos; jogos de regras - a partir dos 7anos e jogos
de exercícios.
O período sensório-motor (0 a 2 anos) se caracterizam pela satisfação das
necessidades básicas. O jogo consiste em rituais ou manipulações de objetos em
função dos desejos e hábitos motores da própria criança. Aos poucos a criança vai
ampliando seus esquemas, adquirindo cada vez mais prazer através de suas
ações.
Os jogos simbólicos compreende de 2 aos 7 anos aproximadamente. É a
fase do faz de conta, da representação, do teatro, onde uma coisa simboliza outra.
Uma vassoura pode virar um cavalo, e ao brincar com as bonecas pode
representar o papel de mãe. A criança é capaz porque já estruturou as imagens
mentais, já domina a linguagem falada com a qual pode se expressar.
Segundo Brougère (1998), o jogo caracteriza-se por constituír-se de um
sistema de regras, do uso de determinado tipo de objeto e também do contexto
social em que este se apresenta. Já o brinquedo, em contraposição ao jogo, não
pressupõe a utilização de regras e enquanto objeto, é sempre um suporte para a
brincadeira, sendo que esta,nada mais é do que o lúdico em ação.
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Criança, jogo e brincadeira estão interligadas, no entanto, o sistema escolar
não percebe essa interligação e cerceia a criança das suas necessidades de
movimento, expressão e de construção de seu conhecimento a partir do seu
próprio corpo. Apesar de estar inserida neste meio, a escola precisa perceber a
criança como um ser em constante desenvolvimento.
O clima de seriedade e de repressão estabelecido por tal instituição, não
chega a intimidar totalmente as crianças, pois estas encontram sempre um jeito de
fazer o que mais gostam, que é brincar. Esse brincar se manifesta das mais
variadas formas, até mesmo, sob a forma de brigas e intrigas aparentes.
A ação de educar não pode restringir-se à simples preocupação com as
estruturas mentais, mas também com a expressão do corpo em sua totalidade. Se
educar é libertar, então, os processos que regem esta ação educativa devem
fornecer subsídios para que tal idéia se concretize.
A intervenção psicopedagógica introduziu uma contribuição mais rica no
enfoque da Pedagogia. O processo de aprendizagem da criança é compreendido
como um processo abrangente, implicando componentes de vários eixos de
estruturação: afetivos, cognitivos, motores, sociais, econômicos, políticos etc. O
processo de aprendizagem, bem como suas dificuldades, deixa de focalizar
somente o aluno e o professor isoladamente e passa a ser visto como um
processo de interações entre ambas as partes com inúmeras variáveis que
precisam ser apreendidas com bastante cuidado pelo professor e psicopedagogo.
Partindo desse pressuposto, é possível constatar que uma das formas de
trabalho psicopedagógico é fazendo uso do lúdico, quer seja no diagnóstico, quer
seja no tratamento. No diagnóstico, a atividade lúdica é um rico instrumento de
investigação clínica, pois permite ao sujeito expressar-se livre e prazerosamente.
Através da ação de brincar, a criança constrói um espaço de
experimentação. Nas atividades lúdicas, esta, aprende a lidar com o mundo real,
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desenvolvendo suas potencialidades, incorporando valores, conceitos e
conteúdos.
É nesse contexto que se afirma que jogar e aprender caminham
paralelamente na Psicopedagogia e, possibilita, através da hora lúdica ou hora do
jogo, observar prazeres, frustrações, desejos, enfim, podemos trabalhar com o
erro e articular a construção do conhecimento.
O material pedagógico não deve ser visto como um objeto estático sempre
igual para todos os sujeitos, pois, trata-se de um instrumento dinâmico que se
altera em função da cadeia simbólica e imaginária do aluno. Apresenta um
potencial relacional, que pode ou não desencadear relações entre as pessoas.
O jogo é considerado como um preparo da criança para a vida adulta.
Brincando, a criança aprende, e aprende de uma forma prazerosa. O ato de
brincar constitui-se numa característica universal, independente de épocas ou
civilizações.
A partir da vivência com o lúdico, as crianças podem recriar sua visão de
mundo e o seu modo de agir. Os jogos podem ser empregados no trabalho da
ansiedade, pois, esse sentimento compromete a capacidade de atenção, de
concentração, as relações interpessoais, a auto-estima, e, conseqüentemente, a
aprendizagem. Através dos jogos competitivos e com a aplicação das regras, os
limites podem ser revistos e as crianças desenvolvem conceitos de respeito e
regras, tudo isso de uma maneira prazerosa. O lúdico proporciona à criança
experiências novas, na medida em que esta erra, acerta, reconhecendo-se como
capaz; desenvolvendo sua organização espacial e ampliando seu raciocínio lógico
na medida que exige estratégias de planejamento e estimula a criatividade.
É desta forma que a criança constrói um espaço de experimentação, de
transição entre o mundo interno e o externo. Neste espaço transacional, dá-se a
aprendizagem.
22
Inserida a esta realidade, cabe ao educador definir quais objetivos pretende
alcançar, utilizando uma metodologia adequada como: selecionar jogos coerentes,
buscando explorar ao máximo os conhecimentos do indivíduo.
Pode-se constatar que o profissional da Psicopedagogia surgiu a partir da
necessidade de obter-se um maior entendimento sobre o processo de
aprendizagem do homem, procurando sempre focar este homem como um ser
múltiplo, influenciado tanto por aspectos físicos, cognitivos, quanto emocionais. No
movimento de procurar entender estes aspectos é que o psicopedagogo constrói o
seu trabalho, visando a diminuição dos problemas de aprendizagem e do fracasso
escolar.
É nesse contexto de múltiplas interações que as atividades lúdicas são
utilizadas no diagnóstico psicopedagógico, pois fazem com que as crianças
revelem aspectos que não aparecem em situações mais formais do diagnóstico. O
material a ser utilizado em tais atividades deve ser muito bem selecionado de
acordo com os objetivos específicos do trabalho, da idade das crianças, do tempo
disponível e, é importante estar atento para que esse material funcione como um
atrativo pelo seu possível uso (colorir, escrever, modelar, construir, pregar, colar,
prender, juntar), tendo em vista a construção do conhecimento e do saber por
parte da criança.
De acordo com Fernández, o psicopedagogo não deve abrir mão de uma
maior compreensão da dinâmica dos jogos, pois como recursos de ampliação de
significados e sentidos de seres humanos, os jogos são de valia extrema.
Pela dinâmica do jogar, brincar e sorrir, o espaço de inserção desta prática
pode contextualizar/construir/ampliar novos conhecimentos de modo gratificante,
vivo, em que a dimensão humana do sentir-se pleno, em prazer e gozo, seja uma
motivação ao querer continuar em movimento de aprender.
Para Fernández (1991), não pode haver construção do saber, se não se
joga com o conhecimento:
23
Para construir um saber, para apropriar-se de um conhecimento, deve-se jogar com a informação como se fosse certa e como se não fosse certa. E é no seio deste processo que irá se construindo a criação, a possibilidade de transformar o objeto, de acordo com a experiência de cada um e, por sua vez, deixar-se transformar pela inclusão desse objeto (FERNÁNDEZ, 1991, p.166).
O saber se constrói fazendo próprio o conhecimento do outro e a operação
de fazer próprio o conhecimento do outro só se pode fazer jogando. Aí se encontra
uma das interseções entre aprender e jogar.
Diz-se que o objetivo do trabalho psicopedagógico é ajudar a recuperar o
prazer perdido de aprender e a autonomia do exercício da inteligência e que esta
conquista vem de mãos dadas com o recuperar o prazer de jogar.
Quando se lida com brinquedos, jogos e materiais pedagógicos, deve-se
atentar a uma significativa quantidade de estruturas de alienação no saber que
cercam esses objetos. É preciso que tais estruturas sejam identificadas com
precisão para que o processo de intervenção psicopedagógica se realize mais
facilmente.
Segundo Fernández (1991), por meio da hora do jogo, estabelecida pelos
psicopedagogos em sua prática institucional, é permitida a observação da
aprendizagem, possibilitando a compreensão de alguns dos processos que podem
ter levado à instalação de alguma patologia no aprender; a análise da modalidade
de aprendizagem e das significações do aprender para a criança; a observação do
processo de construção do símbolo e os processos de assimilação-acomodação e
seus possíveis equilíbrios, desequilíbrios e compensações e a verificação da
capacidade da criança para argumentar, para construir uma história e em que
medida a cognição põe-se a serviço da organização de seu mundo simbólico.
Os jogos possibilitam à criança com dificuldades de aprendizagem aprender
de forma lúdica, num contexto desvinculado da situação de aprendizagem formal.
Facilitam, também, o vínculo terapêutico, fundamental para que qualquer processo
tenha êxito. Por meio da aprendizagem do próprio jogo, do domínio das
24
habilidades e raciocínios utilizados, a criança tem a possibilidade de
redimensionar sua relação com as situações de aprendizagem, com seu desejo de
buscar novos conhecimentos. Tem, igualmente a oportunidade de lidar com a
frustração do não saber, com a alternância entre vitórias e derrotas. Essas
mudanças na percepção de si mesmo e do objeto de conhecimento podem ser
estendidas às situações de aprendizagem formal na medida em que se
restabelecem o desejo e a confiança da criança em sua capacidade de aprender.
A escolha dos jogos será definida pelas dificuldades específicas de cada
criança e é nesse momento que se pode lidar com tais dificuldades. Existem jogos
que trabalham a linguagem como, por exemplo, o “jogo da forca” e “palavras
cruzadas”. Outros trabalham com números, como “banco imobiliário”. Outros
trazem informações sobre diversos temas como “perfil”. Existe, ainda, uma
variedade de jogos que exigem estratégia, domínio espacial, verificação de
hipóteses e tomadas de decisões. Os jogos de computador são muito bons, e a
diversidade de temas é inesgotável, variando de jogos de linguagem, raciocínio,
até simulações de realidade.
Brinquedos, jogos e materiais pedagógicos não são objetos que trazem um
saber pronto e acabado. Ao contrário, eles são objetos que trazem um saber em
potencial que pode ou não ser ativado pela criança. É importante perceber o
objeto em construção para não reduzi-lo a uma leitura rasa do que pode estar
acontecendo com a criança. Este processo é fundamental, porque não é só o
objeto do conhecimento e do saber que está sendo construído, mas também a
modalidade de aprendizagem da criança.
O conceito de modalidade de aprendizagem proposto por Fernández (1991)
permite que se passe do universal para o particular, do estático para o dinâmico,
do concreto para o abstrato, de uma percepção do objeto pedagógico construído
para um objeto pedagógico em construção. O aspecto fundamental desse
processo é o modo como se dá o processo de construção do material pedagógico
no interior do sujeito.
25
Para o diagnóstico psicopedagógico a atividade lúdica é um rico
instrumento de investigação, permite ao sujeito se expressar livre e de forma
prazerosa. Para o psicopedagogo é uma importante ferramenta de observação
sobre a simbolização e as relações que este estabelece com o jogo, permitindo
a formulação de hipóteses e diagnósticos para uma posterior intervenção.
Fica, portanto, evidenciado a essencialidade do lúdico no trabalho
psicopedagógico. No próprio diagnóstico, este pode ser encarado como uma
possibilidade de compreender o funcionamento dos processos cognitivos e
afetivo-sociais.
26
3. O PAPEL DO PSICOPEDAGOGO NA UTILIZAÇÃO DO LÚDICO
Segundo Oliveira (1994), o psicopedagogo está diretamente ligado à
educação e procura atender educandos com dificuldades de aprendizagem e
principalmente atender a professores e alunos com o objetivo de prevenir futuros
problemas de aprendizagem. Ele trabalha analisando os sintomas apresentados
pelo indivíduo, tais como: lentidão, dispersão, dificuldades de elaboração,
compreensão e projeção da aprendizagem.
Estes sintomas devem ser estudados à luz dos aspectos físicos,
emocionais, sociais e culturais do educando, levando-se em conta suas relações
tanto com o ambiente familiar, como o escolar e o social.
Ao psicopedagogo cabe saber como se constitui o sujeito, como este se
transforma em suas diversas etapas de vida, quais os recursos de conhecimento
de que ele dispõe e a forma pela qual produz conhecimento e aprende. É preciso,
também, que o psicopedagogo saiba o que é ensinar e o que é aprender; como
interferem os sistemas e métodos educativos; os problemas estruturais que
intervém no surgimento dos transtornos de aprendizagem e no processo escolar.
Para Fernández (1991), esse saber só é possível com uma formação que
os oriente sobre três pilares: prática clínica, construção teórica e tratamento
psicopedagógico-didático.
Sendo assim, são duas a formas básicas de atuação desse profissional – o
psicopedagogo: a clínica, mais voltada para a recuperação; e a Institucional, mais
voltada para a prevenção. É válido ressaltar a importância do psicopedagogo
também como um pesquisador, no que diz respeito à aprendizagem e
desenvolvimento.
27
Institucionalmente, o psicopedagogo pode trabalhar prestando assessoria
aos professores e demais educadores para que estes possam melhorar a
qualidade de sua atuação, através de reflexões sobre questões pedagógicas e de
novas alternativas de trabalho, propiciando a análise de como acontece o
processo de ensino-aprendizagem, frizando sempre a importância dos fatores
orgânicos, cognitivos, afetivos/sociais e pedagógicos, na construção do
conhecimento pelos indivíduos cognoscentes. Além disso, a sua função também
perpassa a instalação de um clima de cooperatividade entre todos os profissionais
da escola, possibilitando a participação destes, na construção do Projeto
Pedagógico, em discussões sobre situações e casos especiais ocorridos com os
alunos.
O psicopedagogo na escola tem o papel de atuar junto às coordenadorias
pedagógicas como consultar para melhores estratégias metodológicas.
O trabalho do psicopedagogo se dá em uma relação entre pessoas, sendo
um caminho entre educando e educador, onde o psicopedagogo assume sua
função de educador, numa postura que traduz um interesse pessoal e humano,
trazendo de dentro do educando capacidades e possibilidades muitas vezes
desconhecida dele mesmo e incentivando-o a procurar seu próprio caminho e a
caminhar com seus pés.
O objetivo do psicopedagogo é o de conduzir o educando, os profissionais
envolvidos no processo ou a instituição a inserir-se numa escolaridade normal e
saudável de acordo com os interesses e possibilidades dela.
A atuação desse profissional na escola muitas vezes pode determinar o
sucesso ou o fracasso escolar de uma criança, por isso seu papel na escola é tão
importante, pois cuida do ser aprendente e deve evitar o fracasso e facilitar o
processo de aprendizagem.
O psicopedagogo elabora diagnósticos e realiza intervenções durante o
trabalho com foco na aprendizagem, porém sem esquecer a individualidade do
28
ser humano, sua capacidade e o ambiente em que está inserido, tendo um olhar
amplo, imparcial e sem preconceito, uma escuta atenta que vai além das
evidências geralmente já observadas pela família e pela escola.
De acordo com Bossa (1994), a tarefa do psicopedagogo é levar a criança a
reintegrar-se a vida escolar normal, segundo suas potencialidades e interesses.
O psicopedagogo não trabalha sozinho, atua em parceria com outros
profissionais como: neurologista, psiquiatra, fonoaudiólogo e psicólogo, sendo
uma área que só vêm a somar no processo.
Segundo Piaget (1975), o ideal da educação, não é de aprender ao
máximo, é antes de tudo aprender a aprender, e aprender a se desenvolver e
aprender a continuar a se desenvolver depois da escola.
De acordo com o Conselho Nacional da Associação Brasileira de
Psicopedagogia (1997), o psicopedagogo possibilita intervenção visando à
solução dos problemas de aprendizagem tendo como enfoque o aprendiz ou a
instituição de ensino público ou privado; realiza o diagnóstico e intervenção
psicopedagógica, utilizando métodos, instrumentos e técnicas próprias da
psicopedagogia; atua na prevenção dos problemas de aprendizagem; desenvolve
pesquisas e estudos científicos relacionados ao processo de aprendizagem e seus
problemas; oferece acessória psicopedagógica aos trabalhos realizados em
espaços institucionais e orienta, coordena e supervisiona cursos de especialização
de Psicopedagogia, em nível de Pós-Graduação, expedidos por instituições ou
scolas devidamente autorizadas ou credenciadas nos termos da legislação
vigente.
O psicopedagogo deve ter uma visão direcionada sobre o indivíduo e deve
observar nele a coordenação motora ampla, aspecto sensório motor, dominância
lateral, desenvolvimento rítmico, criatividade, evolução do traçado e do desenho,
percepção e discriminação visual e auditiva, percepção espacial, percepção viso-
motor, orientação e relação espaço-temporal, aquisição e articulação de sons,
29
aquisição de palavras novas, elaboração de organização mental, atenção e
concentração, expressão plástica, aquisição de conceitos, discriminação e
correspondência de símbolos, raciocínio lógico matemático.
Ainda falando sobre a atuação do psicopedagogo na escola, esta também
se configura no atendimento aos alunos com problemas de aprendizagem já
instalados (realizando atividades com grupos) bem como, na prevenção dos
mesmos, buscando realizar um trabalho global junto aos alunos, através do
desenvolvimento do raciocínio e resgate da auto-estima, a fim de despertar o
prazer e a vontade de aprender.
Em se tratando do atendimento clínico, o psicopedagogo deve procurar
mediante escuta sensível, estabelecer um diagnóstico que deve caracterizar-se
por ter um caráter investigatório, interventivo e contínuo, a fim de mobilizar ações
que venham levantar hipóteses sobre as possíveis causas que estão intervindo no
processo de construção da aprendizagem.
Os instrumentos utilizados nesta modalidade são: entrevistas com a família,
entrevistas com o sujeito, contato com a escola e com outros profissionais que
venham complementar o diagnóstico e, por fim, a devolutiva, na qual o profissional
solicitado irá fazer uma síntese do processo que foi realizado, durante o período
terapêutico, pontuando a necessidade ou não de encaminhar o aluno para um
outro especialista.
Todas as crianças têm necessidade de brincar e jogar. O lúdico faz parte
do mundo da criança porque é jogando que ela fará descobertas de si, do outro e
do meio em que está inserida. Por esse motivo, considera-se que aprender a jogar
é indispensável na vida das crianças. É uma estratégia de ensino criativa, atraente
e interativa que mantém os alunos envolvidos e interagindo com os colegas do
grupo.
Os jogos não devem ser utilizados somente como forma de lazer ou
brincadeira. Além de serem divertidos e prazerosos, desenvolvem o raciocínio,
30
treinam a concentração, ensinam as crianças a obedecerem a regras, a
respeitarem o outro, enfim, oferecem oportunidades para o desenvolvimento das
habilidades que uma criança necessita para viver em sociedade. Lopes (2000)
deixa claro que, quando se usa o jogo como prática pedagógica, ele se torna um
elemento enriquecedor para promover a aprendizagem e contribuir com o
desenvolvimento de muitas habilidades.
Através das atividades lúdicas pode se trabalhar as habilidades do
pensamento, da criatividade, da imaginação, da interpretação, da atenção, da
motivação interna e da socialização. O jogo é um indicador de várias
competências, é uma atividade muito rica e que trará grandes contribuições para
que o aluno possa se conhecer melhor, enfrentar desafios, ter interação com o
outro, organizar suas relações sociais e emocionais, construir aos poucos sua
personalidade e favorecer uma melhor adaptação social no futuro.
Verderi (1999) diz que, atualmente, a formação da personalidade das
crianças é bastante influenciada pelo contexto sócio-cultural. A cada dia, as
crianças são mais afastadas dos jogos e das brincadeiras, do contato com as
atividades recreativas, o que traz como conseqüências o empobrecimento nas
etapas do desenvolvimento infantil e a privação de um aprimoramento mais
adequado ao desenvolvimento de suas capacidades motoras, cognitivas e sócio-
afetivas. Logo, se entende que os jogos e as brincadeiras são primordiais em
todas as etapas do desenvolvimento infantil.
Os jogos ajudam a desenvolver a cooperação entre os alunos do grupo.
Fazem com que as crianças se ajudem mutuamente no processo de construção
coletiva de conhecimento e possibilitam a interação do grupo. Aprendem, assim, a
conviver com os colegas de maneira mais saudável e prazerosa.
A autoconfiança e a auto-estima são continuamente evoluídas por meio do
jogo e a criança é desafiada a desenvolver habilidades operatórias que envolvam
a identificação, a análise, a síntese e a generalização, sendo livre para gritar,
correr, expandir-se, enfim, construir-se a si mesma.
31
Desse modo, a conduta de viver ludicamente situações do cotidiano
amplia as oportunidades não somente de compreensão das próprias experiências,
mas também de progressos paralelos ao pensamento, visto que o sujeito apóia-se
na imaginação para reproduzir recordações ligadas aos seus momentos
cotidianos. Assim, quanto mais puder brincar, refazendo diferentemente o seu dia-
a-dia e compreendendo o significado de suas experiências, seu pensamento
alcançará uma evolução cada vez maior.
O jogo representa, então para a criança o papel que o trabalho representa
para o adulto. Como o adulto se sente forte por suas obras, a criança sente-se
crescer com suas proezas lúdicas. Um homem feito procura provar a si mesmo, e
aos outros seu próprio valor por um resultado real: obra artística, lucros de
comerciante, construção de casa, filhos bem criados; o aposentado que perdeu o
trabalho pelo qual afirmava seu lugar na sociedade humana, seu valor social,
procura um substituto desse trabalho no cuidado de seu jardim. Daí a importância
primordial do jogo nas crianças. Uma criança que não quer brincar/jogar, é uma
criança cuja personalidade não se afirma, que se contenta com ser pequena e
fraca, um ser sem determinação, sem futuro.
Uma outra visão que o psicopedagogo precisa ter em mente é que através
do jogo a criança mostra que tem olhos para ver, de que forma está construindo
seu mundo. Também mostra suas fantasias inconscientes e o que não brinca e
também denunciador de patologia, pois um sintoma de neurose grave na criança é
a inibição no jogar. A ausência do jogo certo no momento adequado acarretará
problemas futuros no desenvolvimento da criança.
O jogo é revelador, ao observá-lo e ver seu significado além do aparente, é
provável que se poderá contribuir para um crescimento sadio e uma vida adulta
mais satisfatória.
Para Kishimoto (1997), o jogo é importante para o desenvolvimento infantil,
porque propicia a descentração, aquisição de regras, a expressão do imaginário e
a apropriação do conhecimento.
32
O jogo estimula a exploração e a solução de problemas e por ser livre de
pressões e avaliações, cria um clima adequado para a investigação e a busca de
soluções.
Para interpretar um jogo, o psicopedagogo não pode precipitar-se, pois
agindo assim, pode até chegar a impossibilitar a interpretação do material
desenvolvido pela criança, pela maneira como está contagiada pela ansiedade do
psicopedagogo. Com essa atitude o psicopedagogo impede a constituição do
espaço de jogo. Ele precisa ser um bom observador e saber interferir no momento
certo para que seu diagnóstico possa ajudar a criança e não apenas interpretá-la.
Segundo Winnicott (1975), na hora do jogo psicopedagógico, o
psicopedagogo deve observar os seguintes aspectos que permitirá determinar a
existência de patologia no aprender e seu significado: a atitude ante a
aprendizagem; a modalidade de aprendizagem; a disponibilidade corporal; o grau
de prazer presente no jogo; o modo de suas utilizações de possibilidades a partir
do uso de recursos presentes; observar o grau de correlação entre o discurso
verbal e o corporal e observar o tipo de relação com o objeto de conhecimento.
Os jogos e brincadeiras deixaram de ser um simples passatempo, na
medida que passaram a ser mais observados e estudados, tornando-se um
instrumento poderoso no processo de ensino-aprendizagem, facilitando-o.
Para Vygotsky (1995), a função do lúdico no desenvolvimento infantil é um
dos fatores responsáveis por expandir os horizontes da zona de desenvolvimento
proximal, definida por ele como:
A distância entre aquilo que a criança é capaz de fazer de forma autônoma (nível de desenvolvimento real) e aquilo que ela realiza em colaboração com outros elementos de seu grupo social (nível de desenvolvimento potencial). O desenvolvimento da criança é visto de forma prospectiva, pois a zona de desenvolvimento proximal define aquelas funções que ainda não amadureceram, mas que estão em processo de maturação e só se torna possível esse amadurecimento com ajuda de adultos e crianças mais experientes, contribuindo assim, para o seu aprendizado (VYGOTSKY, 1995, p.73).
33
Nesta concepção o conceito de aprendizagem é intrínseco as motivações
internas e ao relacionamento social, transformando o outro em espelho para a
própria aquisição do conhecimento. Vygotsky enfatiza a função da imitação não
como uma atividade mecânica, mas sim como uma oportunidade da criança
potencializar-se para tarefas além de seu desenvolvimento. O brinquedo funciona
como “faz-de-conta”, promovendo na criança a criação de situações de transição
entre a ação, um objeto concreto e suas ações com significados, como por
exemplo: brincar de escolinha, casinha, contribuindo na aceleração da
aprendizagem.
O que na vida real é “natural” e passa desapercebido, na brincadeira torna-
se regra e contribui para que a criança entenda o universo particular dos diversos
papéis que desempenha, conseguindo articular situações imaginárias, tornando-as
reais em sua brincadeira, facilitando e contribuindo para o seu desenvolvimento.
Vygotsky (1995), valoriza a brincadeira, pois a partir dela, a criança toma
decisões, segue regras, experimenta e vivencia emoções aprendendo a lidar com
suas angústias.
O desenvolvimento cognitivo ocorre através de constantes desequilíbrios e
equilíbrios. Ocorrendo um desequilíbrio, são acionados mecanismos internos
(assimilação e acomodação), para que haja seu restabelecimento.
Os métodos ativos de educação das crianças exigem que se forneça às
crianças um material conveniente, a fim de que, jogando, elas cheguem a
assimilar as realidades intelectuais que, sem isso, permanecem
exteriores à inteligência humana (PIAGET, 1978, p.15).
O jogo é uma atividade que tem um grande valor educacional, é prazeroso
e por isso motiva a criança a desenvolver-se em sua totalidade, sendo para a
criança uma coisa muito importante na sua vida, assim como é um excelente
recurso psicopedagógico. Para o psicopedagogo é um rico instrumento para
conhecer a criança, detectar possíveis problemas e principalmente preveni-los.
34
É importante fazer com que as crianças vivam melhores e o papel dos
educadores é desenvolvê-las, preocupando-se menos com regras e metas e mais
com os objetivos a serem alcançados, criando uma atmosfera de mais
proximidade e sinceridade, tornando-as pessoas em processo de auto-realização.
Para melhorar o aprendizado da criança o psicopedagogo pode, por exemplo, criar
jogos com sucata, onde gastará quase nada e desenvolverá muito o raciocínio da
criança.
Através do jogo o psicopedagogo consegue detectar problemas e minimizá-
los ou com um trabalho preventivo, evitá-los.
A escola mudou com o passar do tempo, novas tecnologias e metodologias
engrenaram no cotidiano escolar. Professores e planos de curso se tornaram
defasados, necessitando de atualização. Paradigmas ultrapassados perdem
espaço para o isolamento da escola em relação à realidade de cada educando. É
nesse contexto que o psicopedagogo conquista seu espaço como parceiro no
processo ensino-aprendizagem. Uma observação minuciosa e uma escuta atenta
sem pré-conceitos, assinalada pela imparcialidade, pode detectar a real
problemática da instituição escolar.
O psicopedagogo deve participar da rotina escolar, interagindo com a
comunidade escolar; participando de reuniões de pais, esclarecendo o
desenvolvimento dos filhos; dos conselhos de classe, avaliando o processo
didático-metodológico, acompanhando a relação professor-aluno; sugerindo
atividades ou oferecendo apoio emocional e finalmente acompanhando o
desenvolvimento do educando e do educador no complexo processo de
aprendizagem que estão compartilhando.
A Psicopedagogia, em sua ação preventiva, pode, portanto, desde os
primeiros contatos com o aluno e sua família, na escola, colaborar para sua
adaptação e prevenção das dificuldades de aprendizagem. É através de um
diagnóstico cuidadoso, com o levantamento de dados e observações do aluno que
35
o psicopedagogo institucional poderá instrumentalizar o educador na criação de
novos fazeres.
36
4. A CONTRIBUIÇÃO DO LÚDICO NA EDUCAÇÃO INFANTIL
A questão do lúdico está vinculada às concepções de infância vigentes em
cada momento histórico. O contexto vivenciado pela criança reflete-se no seu
modo de brincar.
O lúdico é uma das necessidades básicas da personalidade humana, da
formação da mente e do corpo. Faz parte das atividades essenciais da dinâmica
humana, caracterizando-se por ser umas atividades espontâneas, funcionais,
satisfatórias e promovedoras de prazer; sendo definida no dicionário Aurélio como
“relativo a jogos, brinquedos e divertimentos”. Portanto pensar em lúdico na
Educação Infantil é pensar nas brincadeiras e jogos infantis.
Os jogos, tanto quanto as brincadeiras, são processos que envolvem o
indivíduo e a cultura, adquirindo especificidades de acordo com cada grupo. Eles
possuem um significado cultural muito marcante, pois é através do brincar que a
criança vai conhecer, aprender e se constituir como um ser pertencente ao grupo,
construindo significados, indagações e transformações e com isso, construir sua
identidade cultural.
Estas atividades não promovem apenas conquistas cognitivas, mas também
envolvem emoções, afetividade, estabelecimento e ruptura de laços e
compreensão da dinâmica interna que perpassa a ligação entre as pessoas.
Uma vez compreendida a dimensão do lúdico, faz-se necessário diferenciar
seus elementos constituintes: o emprego do termo do jogo deve corresponder a
uma referência à descrição de uma atividade lúdica que envolve situações
estruturadas através de regras externas. Ao contrário da brincadeira que
independe das mesmas, dando autonomia à criança.
37
Wajshop (1995) aponta que as brincadeiras são mais valiosas que os jogos,
definindo-as como estrutura organizada pela criança de forma espontânea e
autônoma onde cada coisa se transforma através do faz-de-conta. A imaginação é
quem comanda.
Os jogos são definidos enquanto estruturas organizadas através de regras
explícitas ou implícitas, com sua existência marcada por uma sequencialização
própria e limitação espaço-temporal.
Uma outra diferenciação necessária é quanto ao termo “recreação” também
associada aos jogos e brincadeiras. Wajshop (1995) afirma que recreação é uma
atividade que leva muito em conta o movimento, deixando a imaginação em
segundo plano. É uma atividade organizada pela criança espontaneamente, com
gasto grande de energia e sem a dimensão simbólica.
A brincadeira é um sistema que integra a vida social das crianças, sendo
transmitida de geração a geração e incorporada pelas crianças de forma
espontânea. A forma de brincar muda ao longo dos tempos, mas o conteúdo, que
corresponde ao seu objetivo básico não.
As brincadeiras são imitadas e reinterpretadas em função das
necessidades e interesses do grupo cultural, traduzindo valores. As características
do brincar são dadas em função das etapas do desenvolvimento, do tempo e
espaço destinados a ela. Ao decorrer das brincadeiras a criança estabelece
interações sociais, durante as quais pode assumir vários papéis e colocar-se no
lugar do outro. Os brinquedos utilizados não são só meios para brincar, mas
veículos da inteligência e ação que refletem os padrões culturais dos contextos
sócio-econômicos, como nos mostra Wajshop (1995, p.25): “A brincadeira é uma
atividade humana na qual as crianças são introduzidas, constituindo-se em um
modo de assimilar e recriar a experiência sócio-cultural dos adultos”.
38
Meyer (2004), define brinquedo como suporte da brincadeira,
potencializando as reproduções do cotidiano, substituindo os objetos reais o que
viabiliza sua manipulação.
O brinquedo educativo é definido pela mesma autora enquanto recurso
que “ensina, desenvolve e educa de forma prazerosa” (MEYER, 2004, p.37),
citando como exemplo o quebra-cabeça, brinquedos de móbiles, encaixe,
carrinho.
Nesse sentido, os brinquedos educativos têm duas funções: a função
lúdica, entendida enquanto possibilidade de diversão, entretenimento, sem
associação a aprendizagem; e a função educativa: entendida como via de
facilitação do saber.
Pode-se encontrar também uma classificação dos tipos de brincadeiras,
definidos por Kishimoto (1993) como:
• Brincadeiras tradicionais infantis: manifestação livre da cultura com função
perpetuadora da cultura infantil;
• Brincadeiras de faz de conta: brincadeira simbólica, permitindo à criança
criar símbolos, resignificando objetos e sua realidade;
• Brincadeiras de construção: fonte de enriquecimento sensorial, perceptivo,
motor e criativo.
A brincadeira é uma atividade “séria”, através da qual a criança dá
liberdade para a criação de suas fantasias, relatando sua vivência, liberando seu
potencial criador, cooperando e dominando situações de conflitos, relacionando
suas percepções com suas experiências anteriores.
De todas as brincadeiras, o “faz de conta”, é a atividade lúdica primordial.
Através de suas fantasias as crianças aprendem a lidar com o mundo real,
39
assumindo um papel fundamental no desenvolvimento ao permitir um
comportamento mais avançado do que seu desenvolvimento real.
Quando a criança representa o papel do professor, por exemplo, age de
acordo com o comportamento já vivenciado na interação com o outro, permitindo
criar o que Vygotsky (1995) chamou de zona de desenvolvimento proximal.
Segundo Morais (2003) o lúdico na Educação Infantil permite a criança o
desenvolvimento de habilidades motoras, perceptivas, cognitivas e afetivas, pois
estimula a imaginação, o conhecimento de seu próprio corpo, provoca o uso de
regras e cooperação através da socialização, o que leva a internalização de
valores e hábitos sócio-culturais. Através dos jogos e brincadeiras, a criança
explora o ambiente ao seu redor, manipula objetos e vivencia situações que lhe
propiciam o desenvolvimento integral de suas potencialidades.
Com os estudos de Piaget (1978) e Vygotsky (1995) verifica-se que a
brincadeira não é apenas um meio de passar conteúdos, mas um meio de poder
ajudar a criança a desenvolver sua identidade e interação. Na brincadeira a
criança desenvolve algumas capacidades que fazem, inclusive, parte do conteúdo
da Educação Infantil, tais como: atenção, imitação, memória, coordenação motora
e visual, socialização, por meio da utilização e experimentação de regras e papéis
sociais.
Portanto para que as crianças da Educação Infantil possam desenvolver
mais facilmente a auto-estima, a autonomia, a imaginação, a socialização e a
fantasia devem-se garantir no cotidiano escolar o espaço das brincadeiras, do faz
de conta. Como Pereira afirma:
Brincar é uma forma própria da criança se relacionar com o mundo, é a exteriorização de sentimentos através do concreto, é o encontro com o próprio mundo, a interação com o outro, a descoberta do mundo construído no real e no faz de conta. Hoje é inegável a importância à atividade lúdica (PEREIRA, 2002, p.93).
Desta forma a Educação Infantil cumpre sua função pedagógica de ampliar
os conhecimentos e o repertório vivencial objetivando a autonomia e a cooperação
40
na medida que proporciona o espaço da brincadeira possibilitando uma educação
criadora, voluntária e consciente.
Sobre a seleção das atividades lúdicas na Educação Infantil, Pereira
(2002) coloca que se deve ter alguns pontos em mente:
• Favorecer a aprendizagem criadora: oferecer uma variedade de materiais e
atividades para a escolha da criança, possibilitando olhar, tocar, provar,
identificar-se em plenitude;
• Permitir que os objetivos sejam atingidos: favorecendo o processo de
desenvolvimento cognitivo, afetivo e social;
• Favorecer a aquisição de atitudes, através de um clima de liberdade e
confiança;
• Misturar experiências: refere-se à associação, a pontos de ligação, das
atividades desenvolvidas;
• Respeitar o nível de desenvolvimento da criança: para não gerar
sentimentos como insatisfação, incapacidade, dispersão;
• Favorecer o processo avaliativo: a variedade de atividades que permita ao
professor o feedback, ou seja, que ele perceba o nível de evolução do
desenvolvimento de cada aluno.
Desta forma, a Educação Infantil, por ampliar os laços sociais da criança,
torna-se introdutora de uma lógica extra familiar, mostrando que é possível,
aprender, conhecer novas pessoas, gostar delas, responder a avaliação do outro,
sem depender de uma ou mais pessoas de seu primeiro núcleo social, que é a
família. E esta construção (preparação para autonomia do sujeito e compreensão
da realidade social é facilitada através dos jogos e brincadeiras) trabalhando com
cada um de forma específica, reconhecendo suas funções.
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Na Educação Infantil, o principal objetivo é favorecer o desenvolvimento
integral da criança, ou seja, contribuir para o seu amadurecimento, estimulando
suas potencialidades, levando em conta os conhecimentos e valores que já
possuem, possibilitando a construção da autonomia, criticidade, criatividade e
responsabilidade: elementos fundamentais para constituição de um sujeito.
Assim verifica-se que Piaget (1978) relaciona a brincadeira a natureza
infantil, quer dizer, o brincar é visto como um ato espontâneo e natural da criança,
que vai impulsioná-la em direção ao desenvolvimento na medida em que esta
oferece situações que põem em prova o raciocínio, desequilibrando esquemas de
ações já estabilizados e gerando outros cada vez mais diferenciados. Quanto mais
a criança avança em idade mais ela caminha para a realidade.
O jogo é definido por Kishimoto (1993) como resultado de um sistema
lingüístico, que assume a imagem e o sentido que cada sociedade lhe atribui; e de
regras, identificando uma estrutura seqüencial. Quando uma criança joga vivencia
a possibilidade da existência de regras vinculadas à diversão.
Na categoria jogo está incluído uma série de classificações, como: os
jogos simbólicos, jogos motores, jogos sensórios-motores, jogos cognitivos, jogos
verbais, individuais e coletivos, envolvendo sempre o prazer e a vontade de
participar livremente. Caso contrário, o jogo deixa de ter o caráter lúdico (sem
interesse de criação) e passa a ser competição ou trabalho ( preocupação em criar
ou adquirir algo).
O jogo só é jogo quando o pensamento único da criança é “brincar” sem
buscar efeitos ou resultados. É por este motivo que alguns jogos educativos
fracassam, porque dão prioridade ao produto. O jogo deve ser selecionado
espontaneamente pela criação, para que não se torne trabalho. Os próprios
jogadores é que devem determinar o desenvolvimento dos acontecimentos. Por
este motivo, os jogos utilizados na educação, não devem ser impostos de forma
coercitiva, mas libertar os alunos para a aprendizagem. Se não existe controle do
aluno sobre o jogo, resta apenas a direção do professor.
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Portanto, o que torna um jogo educativo é o fato de o jogo ser apresentado
para as crianças como espaço de liberdade, no qual devem apenas brincar; e, ao
mesmo tempo, ter para o professor o objetivo de promover o processo cognitivo,
sem fazer imposições e sem mostrar o que devem alcançar no final da ação. Se o
pré-escolar sabe, inicialmente, que deve ser capaz de conquistar um objetivo, vai
jogar na busca de alcançá-lo, e não livremente.
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CONCLUSÃO
É importante ressaltar que os jogos e brincadeiras por si não dão conta do
processo de aprendizagem, é preciso que sejam articulados com outras formas de
apreensão do conhecimento, tornando-se seu facilitador, afinal o processo de
aprendizagem inclui ação, reflexão e sistematização, que promoverá o
desenvolvimento dos processos psíquicos, físicos, sociais e aquisições lingüísticas
e lógico-matemáticas.
Por ser essencialmente dinâmico, o jogo permite comportamentos
espontâneos e improvisados, uma vez que os padrões de desempenho e as
normas podem ser criados pelos participantes. Há liberdade para a tomada de
decisões, e a direção que o jogo assume é determinada pelas crianças
considerando o grupo e o contexto.
É com base nos estudos de Piaget (1978), Vygotsky (1995) e outros
teóricos citados ao longo da pesquisa que foi pensada a hipótese. Com eles
verificou-se que as brincadeiras e jogos não são apenas métodos de lazer, e sim,
uma possibilidade de desenvolver a identidade e a interação. Através deles a
criança desenvolve a atenção, a imitação, memória, coordenação motora e visual,
socialização, etc, por meio da utilização e experimentação de regras e papéis
sociais. Pode-se ver aí uma, ou melhor, várias possibilidades de investigação que
não foram abordadas no presente trabalho, afinal ao observar uma brincadeira e
as inter-relações entre as crianças verifica-se o nível de elaboração de perdas e
ganhos que estão seja eles físicos ou afetivos; suas possibilidades de interação
viabilizadas pelos jogos e brincadeiras, suas habilidades e falhas em conduzir-se
conforme as regras do jogo e idade, etc.
Conclui-se que o lúdico como meio de construção do conhecimento é muito
mais que uma estratégia didática, pois pressupõe o comportamento integral da
criança numa atividade, unindo interesse e inteligência, na medida que transmite o
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conteúdo, despertando atenção diante do assunto, fazendo com que as crianças
participem ativamente, liberando e canalizando suas energias, transformando a
realidade.
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WINNICOTT, D. W. O Brincar & a Realidade. Rio de Janeiro: Imago, 1975.
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ANEXOS
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ÍNDICE
Folha de Rosto 01 Agradecimentos 02 Dedicatória 03 Resumo 04 Sumário 05 Introdução 06 1. Histórico da Psicopedagogia no Brasil 08 2. O Lúdico na Psicopedagogia 17 3. O Papel do Psicopedagogo na Utilização do Lúdico 26 4. A Contribuição do Lúdico na Educação Infantil 36 Conclusão 43 Referências Bibliográficas 45 Anexos 47
Folha de Avaliação 49
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FOLHA DE AVALIAÇÃO
Universidade Cândido Mendes
Instituto a Vez do Mestre
Curso: Pós-Graduação Lato Sensu em Psicopedagogia
Nome: Priscila de Vasconcelos Lima Mat: C201294/07
Título da Monografia: O Papel do Psicopedagogo ao Utilizar o Lúdico na Educação
Infantil
Avaliação: Professor Nilson Guedes de Freitas
Avaliação: ................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................