Post on 27-Nov-2018
UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
PÓS GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO VEZ DOMESTRE
FATORES ATUANTES NA EVOLUÇÃO DO
SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO
Curso : Docência do Ensino Superior
Autor: Demétrio Marcelo Ribeiro Garcia
Orientador: Prof Diva
Data de Entrega: 29 set 04
2
UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
PÓS GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO VEZ DO MESTRE
FATORES ATUANTES NA EVOLUÇÃO DO
SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO
OBJETIVOS: Analisar os principais fatores que atuaram no Sistema Educacional Brasileiro, assim como as principais reformas e movimentos que resultaram na reconstrução da política educacional brasileira, do período colonial até o Governo Castelo Branco..
3
AGRADECIMENTOS
A todos o corpo docente do Projeto “A vez do mestre”, à professora DIVA, em especial, pela paciência e competência com que levou esse trabalho à frente. Enfim, essa dedicatória vai para todos aqueles que, direta ou indiretamente, contribuíram para a concretização desse trabalho.
4
DEDICATÓRIA
Dedico esse livro a minha mulher ANA, que tanto
colaborou para a confecção e o aperfeiçoamento
desse trabalho (com seus palpites que são
intermináveis), aos meus filhos LUISA, JOÃO
VICTOR e o pequeno ARTHUR, que sem eles
para atrapalhar a toda hora, não teria a menor
graça, e por fim, para minha mãe, que não precisa
de maiores explicações, mãe é mãe.
5
RESUMO
Esse trabalho é de extrema importância no que tange aos fundamentos da
educação no Brasil, seu desenvolvimento, seu abandono, seus prós e contras, num
país já tão contraditório.
No decorrer do trabalho vão surgindo perguntas que estarão sempre sem
respostas definitivas, pois não conseguimos encontrar uma resposta que satisfaça
a nossa curiosidade e, por que não, nossa decepção com a educação de um povo
que merecia muito mais.
A proposta foi buscar a educação em seu início, nas escolas jesuíticas, fazendo
um paralelo com as mudanças políticas ocorridas no Estado, mostrando o
quanto a influência política tendeu a direcionar e, em algumas vezes, a modificar
radicalmente a forma e o tipo de educação ministrada no Brasil.
Por fim, temos a proposta de mostrar como o somatório de todas essas questões,
de vital importância para o Brasil, contribuíram para o presenciamos no Brasil
contemporâneo.
6
METODOLOGIA
A metodologia utilizada se destina, dentro de uma abordagem teórico-metológica, a
destrinchar cada período de nossa riquíssima história ( da colônia à Republica nova até chegar ao
governo Castelo Branco), relacionando-os com a política educacional superior adotada pelos
vários governos brasileiros.
Será mostrado passo a passo, a relação entre o Governo X Educação, utilizando com
referência: bibliografias, outros trabalhos relacionados com o tema, bem como, internet e jornais
da época.
Para se entender a atual situação superior no Brasil, devemos ficar atentos com os enlaces
que começaram a acontecer há muito tempo atrás, só assim entenderemos os gargalos existentes
em nossa educação e a forma contraditória de como se tornou instrumento de exclusão social,
principalmente quando desemboca no terceiro grau.
Através dessa investigação histórico-político-educacioal, co-relacionaremos tempo/ação,
trazendo esse resultado para os dias atuais, mostrando essa relação científico-temporal entre
políticas passadas e problemas atuais no Sistema educacional brasileiro.
7
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 08
CAPÍTULOI 10
AEDUCAÇÃO: DA COLÔNIA “AO IMPÉRIO 10
CAPÍTULOII 28
A EDUCAÇÃO: DA REPÚBLICA AO GOVERNO CASTELO BRANCO 28
CONCLUSÃO 81
BIBLIOGRAFIA 83
ÍNDICE 84
8
INTRODUÇÃO
A pesquisa tem como objetivo principal caracterizar a conjuntura da educação no Brasil,
desde a sua criação (Brasil Reino Unido a Portugal e Algarves), bem como seu desenvolvimento
durante a vida política brasileira, mostrando suas tentativas de melhoria, através de medidas
político-econômicas, e por fim, fazer uma relação entre as mudanças educacionais no decorrer do
tempo e a sua atual situação.
Devido ao tema acima exposto, este trabalho faz parte do campo da História do Poder, e
não , simplesmente, da História Educacional ou História Política.
Em primeiro lugar porque não se trata de todas as medidas políticas adotadas pelos
governos brasileiros, da época (somente medidas relacionadas à educação); Em segundo lugar,
não se trata de História econômica, puramente, pois o trabalho não tem a proposta, muito menos a
pretensão, de se aprofundar em teorias e fórmulas educacionais.
A pesquisa irá se desenvolver numa junção de ambas, tanto política com econômica,
resultando numa História de Poder.
Podemos entender com História de Poder uma forma de dominação, formas de sujeição
que funcionam localmente (ou não), por exemplo, numa oficina, numa empresa, no Estado, numa
sociedade do tipo servil/escravista, ou seja, em todos os lugares temos essa relação de poder.
Tudo isso são formas de poder, que têm seu próprio modo de funcionamento,
procedimento e técnica, sendo todas essas formas de poder heterogêneas.
Esta é a idéia de poder, que não é localizado, de um poder que não é propriedade, que não
se restringe a uma concepção jurídica de poder, desta concepção de poder a partir a lei e do
soberano, a partir da regra e da proibição, enfim, um poder que está imbricado nas relações
sociais com os “nós entrecruzados de uma malha”.
Observamos então, uma relação (e uma identificação) entre essa definição de história do
poder e as medidas político-econômicas adotadas pelos governos (do Reino Unido ao Governo
9
Militar – Castelo Branco), os quais influenciaram o Estado (a partir dessas mudanças políticas,
teremos mudanças educacionais e posteriormente, mudanças sociais).
Para que o trabalhos seja melhor entendido é necessário que se faça a definição dos
conceitos usados:
Política Educacional – É o conjunto de medidas tomadas pelo governo de um país, com o
intuito de influir sobre os mecanismos sociais. Embora dirigidas ao campo educacional, essas
medidas obedecem também a critérios sociais, na medida em que determinam, por exemplo, quais
segmentos da sociedade se beneficiarão com as diretrizes educacionais emanadas do Estado.
Essa política educacional depende da visão que os governantes têm do papel do Estado no
conjunto da sociedade. De maneira geral, podem-se classificar as políticas educacionais:
estruturais, de estabilização conjuntural e de expansão.
A política estrutural está voltada para modificações da estrutura educacional do país,
regulando o funcionamento do mercado educacional (mudando o padrão da política educacional
vigente).
A política de estabilização conjuntural visa a superação de desequilíbrios ocasionais,
podendo envolver tanto uma luta contra a evasão escolar, como o combate ao analfabetismo.
A política de expansão tem por objetivo a manutenção ou aceleração do desenvolvimento,
aparando arestas existentes, com o único intuito de promover o aperfeiçoamento do sistema
educacional buscando aprimorar uma qualidade.
A problemática apresentado pela pesquisa será mostrar a criação do ensino no Brasil, suas
orientações e objetivos no decorrer dos tempos, mostrado, ao final, a relação entre esses
acontecimentos e a atual situação do Ensino no Brasil.
Para isso, a pesquisa irá tratar com o hipótese, a política educacional calculada de cada
governo, a prioridade e o incentivo dados à Docência , como forma de melhoria social no Brasil.
Para analisar tais mudanças, a pesquisa será dividida em dois capítulos : o primeiro
capítulo começará mostrando a educação feita por jesuítas ( a primeira a ser efetiva no Brasil), até
o fechamento do capítulo com o fim do Primeiro Império.
O segundo capítulo irá no mostrar uma política educacional mais recente, compreendida
entre o final da República velha e o Governo Castelo Branco, com a criação da primeira Lei de
Diretrizes para a Educação.
Por fim, iremos Ter uma conclusão comentando a relação educação/governos,
desenvolvendo a importância de cada governo da época para o desenvolvimento da educação no
Brasil.
10
CAPÍTULO I
A Educação: da Colônia ao Império
11
A EDUCAÇÃO: DA COLÔNIA AO IMPÉRIO
1.1 – Condições favoráveis para a educação jesuítica
A economia colonial brasileira fundada na grande propriedade e na mão-de-obra escrava
teve implicações de ordem social e política bastante profundas. Ela favorece o aparecimento da
unidade básica do sistema de produção, de vida social e do sistema de poder representado pela
família patriarcal.
O isolamento e a estratificação sociais, esta a princípio, basicamente dual, aliados à
necessidade de manutenção de um esquema de segurança, favoreceram uma estrutura de poder
fundada na autoridade sem limites do dono de terras.
Foi a família patriarcal que favoreceu, pela natural receptividade, a importação de formas
de pensamento e idéias dominantes na cultura medieval européia, feita através da obra dos
Jesuítas. Afinal, ao branco colonizador, além de tudo, se impunha distinguir-se, por sua origem
12
européia, da população nativa, negra e mestiça, então existente. A classe dominante, detentora do
poder político e econômico, tinha de ser também detentora dos bens culturais importados.
Não é pois de se estranhar que na Colônia tenham vingado hábitos aristocráticos de vida.
No propósito de imitar o estilo da Metrópole, era natural que a camada dominante procurasse
copiar os hábitos da camada nobre portuguesa. E, assim, a sociedade latifundiária e escravocrata
acabou por ser também uma sociedade aristocrática. E para isso contribuiu significativamente a
obra educativa da Companhia de Jesus.
As condições objetivas que portanto favoreceram essa ação educativa foram, de um lado, a
organização social e, de outro, o conteúdo cultural que foi transportado para a Colônia, através da
formação mesma dos padres da Companhia de Jesus. A primeira condição consistia na
predominância de uma minoria de donos de terra e senhores de engenho sobre uma massa de
agregados e escravos. Apenas aqueles cabia o direito à educação e, mesmo assim, em número
restrito, porquanto deveriam estar excluídos dessa minoria as mulheres e os filhos primogênitos,
aos quais se reservava a direção futura dos negócios paternos. Destarte, a escola era freqüentada
somente pelos filhos homens que não os primogênitos. Estes recebiam apenas, além de uma
rudimentar educação escolar, a preparação para assumir a direção do clã, da família e dos
negócios, no futuro. Era, portanto, a um limitado grupo de pessoas pertencentes à classe
dominante que estava destinada a educação escolarizada.
A segunda condição consistia no conteúdo cultural de que se faziam portadores os padres.
Que conteúdo era esse? Era, antes de tudo, a materialização do próprio espírito da Contra-
Reforma, que se caracterizou sobretudo por uma enérgica reação contra o pensamento crítico, que
começava a despontar na Europa, por um apego a formas dogmáticas de pensamento, pela
revalorização da Escolástica, como método e como filosofia, pela reafirmação da autoridade, quer
da Igreja, quer dos antigos, enfim, pela prática de exercícios intelectuais com a finalidade de
robustecer a memória e capacitar o raciocínio para fazer comentários de textos. Se aos Jesuítas de
então faltava o gosto pela ciência, sobrava-lhes, todavia, um entranhado amor às letras, cujo
ensino era a maior preocupação. “Humanistas por excelência e os maiores do seu tempo,
concentravam todo o seu esforço, do ponto de vista intelectual, em desenvolver nos seus
discípulos, as atividades literárias e acadêmicas, que correspondiam, de resto, aos ideais de
“homem culto” em Portugal, onde, como em toda a península ibérica, se encastelara o espírito da
Idade Média e a educação, dominada pelo clero, não visava por essa época senão a formar
letrados eruditos. O apego ao dógma e à autoridade, a tradição escolástica e literária, o
desinteresse quase total pela ciência e a repugnância pelas atividades técnicas e artísticas tinham
13
forçosamente de caracterizar, na Colônia, toda a educação modelada pela Metrópole, que se
manteve fechada e irredutível ao espírito crítico e de análise, à pesquisa e à experimentação.
Resta-nos agora saber de que forma esse tipo de conteúdo veio corresponder aos anseios
da minoria dominante na estrutura da sociedade nascente.
O ensino que os padres jesuítas ministravam era completamente alheio à realidade da vida
da Colônia. Desinteressado, destinado a dar cultura geral básica, sem a preocupação de qualificar
para o trabalho, uniforme e neutro (do ponto de vista nacional, como quer Fernando de Azevedo),
não podia, por isso mesmo, contribuir para modificações estruturais na vida social e econômica
do Brasil, na época. Por outro lado, a instrução em si não representava grande coisa na construção
da sociedade nascente. As atividades de produção não exigiam preparo, quer do ponto de vista de
sua administração, quer do ponto de vista da mão-de-obra. O ensino, assim, foi conservado à
margem, sem utilidade prática visível para uma economia fundada na agricultura rudimentar e no
trabalho escravo. Podia, portanto, servir tão-somente à ilustração de alguns espíritos ociosos que,
sem serem diretamente destinados à administração da unidade produtiva, embora sustentados por
ela, podiam dar-se ao luxo de se cultivarem. Evidentemente, a esse tipo de desocupados sociais,
cujo destino não estava associado a uma atividade manual – então reservada aos cativos e,
portanto, estigmatizada – ou mesmo profissional definida, só podia interessar uma educação
literária, humanista, capaz de dar brilho à inteligência. A esse tipo de indivíduos convinha bem a
educação jesuítica, “portanto não perturbava a estrutura vigente, subordinava-se aos imperativos
do meio social, marchava paralelamente a ele. Sua marginalidade era a essência de que vivia e se
alimentava.
Casavam-se, portanto, os objetivos da população, que buscava educação com os objetivos
da educação jesuítica. Aqueles, identificados exclusivamente com a ilustração da mente, estes
representados pelo conteúdo cultural “importado em bloco do Ocidente, internacionalista, de
tendência inspirada por uma ideologia religiosa católica e a cuja base residiam as humanidades
latinas e os comentários das obras e Aristóteles, solicitadas num sentido cristão. Tratando-se de
uma cultura neutra do ponto de vista nacional (mesmo português), estreitamente ligada à cultura
européia, na Idade Média, e alheia a fronteiras políticas – como tinha de ser a cultura difundida
por uma associação essencialmente internacional, com o característico de verdadeira milícia
papalina – é certo que essa mesma neutralidade (se nos colocarmos do ponto de vista qualitativo)
nos impede de ver, nessa cultura, nas suas origens e nos seus produtos, uma cultura
especificamente brasileira, uma cultura nacional ainda em formação”.
14
1.1.2– Objetivos da Educação Jesuítica
Não se podem perder de vista, evidentemente, os objetivos práticos da ação jesuítica no
Novo Mundo: o recrutamento de fiéis e servidores. Ambos foram atingidos pela ação educadora.
A catequese assegurou a conversão da população indígena e foi levada a cabo mediante criação de
escolas elementares para os “curumins” e de núcleos missionários no interior das nações
indígenas. A educação que se dava aos “curumins” estendia-se aos filhos dos colonos, o que
garantia à evangelização destes. A simples presença dos padres já era garantia de manutenção da
fé entre os colonos. Quanto aos servidores da Ordem, estes deveriam ser preparados para o
exercício do sacerdócio e foi principalmente para eles que se fundaram os colégios, onde se
passou a ministrar o ensino das ciências humanas, as letras e as ciências teológicas. Foi também
na camada dominante que se recrutaram os homens que iriam engrossar as fileiras dos sacerdotes
da Ordem.
Assim, os padres acabaram ministrando, em princípio, educação elementar para a
população índia e branca em geral (salvo as mulheres), educação média para os homens da classe
dominante, parte da qual continuou nos colégios preparando-se para o ingresso na classe
sacerdotal, e educação superior religiosa só para esta última. A parte da população escolar que
não seguia a carreira eclesiástica encaminhava-se para a Europa, a fim de completar os estudos,
principalmente na Universidade de Coimbra, de onde deviam voltar os letrados.
A obra de catequese, que, em princípio, constituía o objetivo principal da presença da
Companhia de Jesus no Brasil, acabou gradativamente cedendo lugar, em importância, à educação
da elite. E foi com esta característica que ela se firmou durante o período em que estiveram
presentes no Brasil os seus membros e também com essa mesma característica que ela sobreviveu
à própria expulsão dos Jesuítas, ocorrida no século XVIII. Dela estava excluído o povo e foi
graças a ela que o Brasil se “tornou por muito tempo, um país da Europa”, com os olhos voltados
para fora, impregnado de uma cultura intelectual transplantada, alienada e alienante. Foi ela, a
educação dada pelos jesuítas, transformada em educação de classe, com as características que tão
bem distinguiam a aristocracia rural brasileira, que atravessou todo o período colonial e imperial e
atingiu o período republicano, sem ter sofrido, em suas bases, qualquer modificação estrutural,
mesmo quando a demanda social de educação começou a aumentar, atingindo as camadas mais
baixas da população e obrigando a sociedade a ampliar sua oferta escolar. Era natural que assim
fosse, porque esse tipo de educação veio a transformar-se no símbolo da própria classe, distintivo
desta, fim, portanto, almejado por todo aquele que procurava adquirir status. Na época colonial
mesma, “... já não era somente pela propriedade da terra e pelo número de escravos que se media
15
a importância ou s avaliava a situação social dos colonos: os graus de bacharel e os de mestre em
artes (dados pelos colégios) passaram a exercer o papel de escada ou de ascensor, na hierarquia
social da Colônia, onde se constituiu uma pequena aristocracia de letrados, futuros teólogos,
padres-mestres, juizes e magistrados.
Símbolo de classe, esse tipo de educação livresca, acadêmica e aristocrática foi fator
coadjuvante na construção de poder na Colônia. Isso porque a classe dirigente, aos poucos, foi
tomando consciência do poder público. Os primeiros representantes da Colônia junto às Cortes
foram os filhos dos senhores de engenho educados no sistema jesuítico. Casaram-se, assim,
portanto, a grande propriedade, o mandonismo e a cultura transplantada expandida pela ação
pedagógica dos Jesuítas.
1.2 – Queda da Educação Jesuítica
Esse complexo sobreviveu mesmo à expulsão dos Jesuítas em 1759. A decadência
econômica em que entrou o Reino Português, principalmente com a queda da mineração, e o
atraso cultural que, entre outras coisas, teve no fanatismo religioso um de seus fatores, fez com
que surgisse na Metrópole um descontentamento geral em relação aos Jesuítas. Na Colônia, já se
faziam notar os atritos entre estes e a população, em torno da questão da escravização dos índios.
Juntava-se a isso a presença, tanto no Reino, quando na Colônia, de idéias provindas do
enciclopedismo, declaradamente anticlericais. Da ascensão do Marquês de Pombal, cuja linha de
pensamento estava estreitamente vinculada ao enciclopedismo, resultou a expulsão dos Jesuítas
de Portugal e de seus domínios.
Inúmeras foram as dificuldades daí decorrentes para o sistema educacional. Da expulsão
até as primeiras providências para a substituição dos educadores e do sistema jesuítico transcorreu
um lapso de 13 anos. Com a expulsão, desmantelou-se toda uma estrutura administrativa de
ensino. A uniformidade da ação pedagógica, a perfeita transição de um nível escolar para outro, a
graduação, foram substituídas pela diversificação das disciplinas isoladas. Leigos começaram a
ser introduzidos no ensino e o Estado assumiu, pela primeira vez, os encargos da educação.
Mas, apesar disso, a situação não mudou em suas bases. Recorde-se de que os Jesuítas
mantiveram, além de colégios para a formação de seus sacerdotes, seminários para a formação do
clero secular. Era esse o clero que atuava principalmente nas fazendas de onde ele proviera,
constituído, como era, de filhos das famílias proprietárias, Foram estes que formaram a massa de
tios-padres e capelães de engenho e que, por exigência das funções, foram também os mestres -
escola ou preceptores dos filhos da aristocracia rural. Formados nos seminários dirigidos pelos
Jesuítas, eles foram os naturais continuadores de sua ação pedagógica, Compuseram também o
16
maior contingente de professores recrutados para as chamadas aulas régias introduzidas com a
reforma pombalina. Assim, “embora parcelado e fragmentário e rebaixado de nível, o ensino mais
variado nos seus aspectos orientou-se para os mesmos objetivos, religiosos e literários, e se
realizou com os mesmos métodos pedagógicos, com apelo à autoridade e à disciplina estreita,
concretizados nas varas de marmelo e nas palmatórias de sucupira, tendendo a abafar a
originalidade, a iniciativa e a força criadora individual, para pôr em seu lugar a submissão, o
respeito à autoridade e a escravidão aos modelos antigos”.
O século XIX, no Brasil, viu porém surgir uma estratificação social algo mais complexa
do que a predominante no período colonial. A presença, pelo menos, de uma camada
intermediária, se não surgia, mas acentuada com a mineração, fez-se cada vez mais visível,
principalmente na zona urbana, onde se radicou. Sua participação na vida social passou então a
ser mais ativa, não tanto pelas atividades produtoras a que estava ligada – o artesanato, o pequeno
comércio, a burocracia – mas sobretudo pelo comprometimento político. Foi nesta camada
intermediária que se recrutaram os indivíduos ligados ao jornalismo, às letras e principalmente à
política. O período marcante de sua presença foi o da Regência, por isso mesmo um dos períodos
mais conturbados do século.
O mercado interno, criado e reforçado com a economia de mineração, foi um fator
importante na ascensão dessa classe intermediária, que Nelson Wernek Sodré prefere chamar de
pequena burguesia, pelas afinidades que teve com a mentalidade burguesa, também em plena
ascensão na Europa. Essa classe desempenhou relevante papel na evolução da política no Brasil
monárquico e nas transformações por que passou o regime no final do século. E se ela pôde fazê-
lo, isso se deve sobretudo ao instrumento de que dispôs para afirmar-se como classe: a educação
escolarizada.
1.2.1- A relação entre o desenvolvimento econômico- educacional
Assim, o período que se seguiu à independência política viu também diversificar-se um
pouco a demanda escolar: a parte da população que então procurava a escola já não era apenas
pertencente à classe oligárquico-rural. A esta, aos poucos, se somava a pequena camada
intermediária, que, desde cedo, percebeu o valor da escola como instrumento de ascensão social.
Desde muito antes, o título de doutor valia tanto quanto o de proprietário de terras, como garantia
para a conquista de prestígio social e de poder político. Era compreensível, portanto, que ,
desprovida de terras, fosse para o título que essa pequena burguesia iria apelar, a fim de firmar-se
como classe e assegurar-se o status a que aspirava.
17
Mas, se essa camada intermediária procurou a educação, como meio de ascensão social,
são suas relações com a classe dominante que vão proporcionar-nos uma compreensão maior da
característica dominante no ensino brasileiro, na época e posteriormente. Essas relações são ainda
relações de dependência. Uma vez que as camadas inferiores viviam na servidão ou na
escravatura e o trabalho físico era tido como degradante, não é de se estranhar que se
considerasse o ócio como um distintivo de classe. Não era, pois, a essas camadas que a classe
intermediária iria ligar-se, mas à camada superior, de quem iria depender para obter ocupações
consideradas mais dignas, como as funções burocráticas, administrativas, intelectuais. “Numa
estrutura social, como a existente no Brasil do início do século XIX, a camada intermediária, em
que são recrutados os intelectuais, deveria depender da classe dominante, cujos padrões aceita e
consagra. Nada a aproxima das classes dominadas, que fornecem trabalho.” Se assim é, o ensino
que essa classe procurava era justamente aquele que se proporcionava a própria classe dominante,
porque era o único que “classificava”. Vemos assim que, embora já existissem duas camadas
distintas freqüentando escolas, o tipo de educação permanecia o mesmo para ambas, ou seja, a
educação das elites rurais.
Todavia, se, por um lado, a pequena burguesia se ligou à classe dominante da qual
dependia, por outro, ela estava, pela própria característica de classe burguesa, vinculada às idéias
liberais então dominantes na Europa. Essa foi a contradição maior, no dizer de Nelson Wernek
Sodré, em que viveu essa nova classe emergente de um lado, suas relações de dependência para
com a aristocracia rural, e, de outro lado, sua ligação com a ideologia burguesa que primava, na
Europa, pela contestação da antiga ordem fundada em idéias aristocrático-feudais. E seria essa
contradição que iria acabar provocando não só a ruptura das duas classes aqui no Brasil, como a
vitória dos ideais burgueses sobre a ideologia colonial, que se concretizou, numa primeira fase,
com a abolição da escravatura e a proclamação da República e, posteriormente, com a
implantação do capitalismo industrial.
Que tipo de escola predominou nessa ordem social é o que aqui nos importa verificar. Em
primeiro lugar, convém assinalar a herança recebida da Colônia. Além de algumas escolas
primárias e médias, em mão de eclesiásticos, existiam também os seminários episcopais, entre os
quais sobressaiu o seminário de Olinda, fundado em 1800 pelo Bispo Azeredo Coutinho, famoso
por seu espírito de renovação científica, e ainda algumas aulas régias criadas com a reforma
pombalina.
A presença do príncipe Regente, D. João, por 12 anos, trouxe sensíveis mudanças no
quadro das instituições educacionais da época. A principal delas foi, sem dúvida, a criação dos
18
primeiros cursos superiores (não-teológicos) na Colônia. Embora organizados na base de aulas
avulsas, esses cursos tinham um sentido profissional prático. Dentre as escolas superiores,
distinguiram-se a Academia Real da Marinha e a Academia Real Militar, esta mais tarde
transformada em Escola Central e Escola Militar de Aplicação, que tiveram a incumbência de
formar engenheiros civis e preparar a carreira das armas. Os cursos médico-cirúrgicos da Bahia e
do Rio de Janeiro foram as células das nossas primeiras Faculdades de Medicina. Não se pode
omitir a criação de um curso da Economia Política, que ficou a cargo de José da Silva Lisboa. O
Gabinete de Química organizado na Corte e o Curso de Agricultura criado na Bahia, em 1812,
foram duas tentativas de implantação do ensino técnico superior, que, se não vingaram, pelo
menos tiveram o mérito de trazer para a Colônia opções diferentes em matéria de educação
superior. Deve-se assinalar ainda a presença da Missão Cultural Francesa, que teve como
conseqüência a criação da Real Academia de Desenho, Pintura, Escultura e Arquitetura Civil, em
1820. Esta seria transformada depois em Escola Nacional de Belas Artes. Finalmente, a criação
do Museu Real, do Jardim Botânico, da Biblioteca Pública, cujo acervo inicial foi de 60.000
volumes, vindos da Biblioteca do Palácio da Ajuda, em Portugal, e, ainda, a Imprensa Régia
completaram o quadro da criação da infra-estrutura cultural de que necessitava a Corte para viver
na Colônia.
Com D. João, no entanto, não apenas nascia o ensino superior, mas também se iniciava um
processo de autonomia que iria culminar na Independência política. Todavia, o aspecto de maior
relevância dessas iniciativas foi o fato de terem sido levadas a cabo, com o propósito exclusivo de
proporcionar educação para uma elite aristocráticas e nobre de que se compunha a Corte. A
preocupação exclusiva com a criação de ensino superior e o abandona total em que ficaram os
demais níveis do ensino demonstram claramente esse objetivo, com o que se acentuou uma
tradição – que vinha da Colônia – a tradição da educação aristocrática. Ao mesmo tempo
lançaram-se as bases para uma revolução cultural que, embora lenta, culminou de certa forma na
introdução de hábitos de pensamento e ação que vigoravam na Europa do século XIX e
compuseram a ideologia da burguesia brasileira em ascensão, no final do século.
A independência política não modificou o quadro da situação do ensino, pelo menos de
imediato. Considerada por João Cruz Costa como “simples transferência de poderes dentro de
uma mesma classe, (a Independência) entregaria a direção da nova ação aos proprietários de
terras, de engenhos e aos letrados”. O papel, portanto, que os letrados passaram a desempenhar na
nova ordem política foi de indiscutível relevância, uma vez que foram eles que, em sua maioria,
ocuparam os cargos administrativos e políticos. A importância assumida pela educação de
19
letrados durante toda a monarquia estava diretamente ligada à necessidade de o país ter de
preencher o quadro geral da administração e da política. A escola, representada sobretudo pelas
novas Faculdades de Direito, criadas na década de 1820 – uma em S. Paulo e outra em Recife,
ambas em 1827 – passou a desempenhar o papel de fornecedora do pessoal qualificado para essas
funções. Apesar da existência de cursos de Medicina, Engenharia e Artes, que as antecederam, as
Faculdades de Direito lograram uma supremacia na formação dos quadros superiores do Império.
Por outro lado, a forma assumida pelo ensino superior, mormente o jurídico, de currículo
universalista e humanístico, acabou por influenciar ou mesmo condicionar a estrutura do ensino
secundário. Vejamos como se deu isso. O Ato Adicional de 1834 “conferiu às Províncias o direito
de legislar sobre instrução pública e estabelecimentos próprios a promovê-la, excluindo, porém,
de sua competência as Faculdades de Medicina e Direito e as Academias então existentes e outros
quaisquer estabelecimentos que, no futuro, fossem criados por lei geral”. Isso suscitou uma
dualidade de sistemas, com superposição de poderes (provincial e central) relativamente ao ensino
primário e secundário. O poder central se reservou, e a ela se limitou, o direito de promover e
regulamentar a educação no Município Neutro e a educação de nível superior, em todo o Império,
enquanto delegou às Províncias a incumbência de regulamentar e promover a educação primária e
média em suas próprias jurisdições. Esse monopólio do ensino superior de que gozou o poder
central, aliado ao currículo vigente nas duas escolas de Direito, que contavam com a preferência
da população escolar, acabou influindo sobre a composição do currículo e toda a estrutura da
escola secundária, segunda afirma Maria de Lourdes Mariotto Haidar. Isso se deveu a que:
a) o ensino secundário destinava-se ao preparo dos candidatos ao ensino superior, razão por
que seu conteúdo se estruturou em função deste;
b) os candidatos aos cursos superiores eram examinados nesses próprios cursos, segundo
critérios fixados por estes mesmos.
Esse caráter propedêutico assumido pelo ensino secundário, somado ao seu conteúdo
humanístico, fruto da aversão a todo tipo de ensino profissionalizante, próprio de qualquer
sistema escolar fundado numa ordem social escravocrata, sobreviveu até há pouco e constituiu o
fator mesmo do atraso cultural de nossas escolas.
1.3– A Descentralização educacional de 1834
A descentralização ocorrida em o Ato Adicional de 1834, como já se disse, delegou às
províncias o direito de regulamentar e promover a educação primária e secundária. O que ocorreu
a contar de então foi a tentativa de reunir antigas aulas régias em liceus, sem muita organização.
20
Nas capitais, foram criados os liceus provinciais. A falta de recursos, no entanto, que um sistema
falho de tributação e arrecadação da renda acarretava, impossibilitou as Províncias de criarem
uma rede organizada de escolas. O resultado foi que o ensino, sobretudo o secundário, acabou
ficando nas mãos da iniciativa privada e o ensino primário foi relegado ao abandono, com
pouquíssimas escolas, sobrevivendo à custa do sacrifício de alguns mestres-escola, que,
destituídos da habilitação para o exercício de qualquer profissão rendosa, se viam na contingência
de ensinar.
O fato de a maioria dos colégios secundários estarem em mãos de particulares acentuou
ainda mais o caráter classista e acadêmico do ensino, visto que apenas as famílias de altas posses
podiam pagar a educação de seus filhos.
A transformação que esses colégios sofreram no decorrer do século XIX, no sentido de se
tornarem meros cursos preparatórios para o ensino superior, foi uma decorrência da pressão
exercida pela classe dominante, a fim de acelerar o preparo de seus filhos e assim interligá-los no
rol dos homens cultos. A legislação decorrente desse processo culminou com a isenção da
obrigatoriedade de freqüência, com o que se instituiu a matrícula por disciplina e se eliminou a
seriação. Aos poucos, tanto liceus provinciais, quanto colégios particulares foram-se convertendo
em meros cursinhos preparatórios para os exames de admissão ao ensino superior existente. Até o
Colégio Pedro II, criado na Corte e único mantido pelo Governo Central para servir de modelo,
não pôde escapar à pressão. E, apesar dos cuidados que mereceu por parte dos governantes, ele
acabou por transformar-se também num curso preparatório. Se, além disso, se levar em conta que
nem liceus provinciais, nem colégios particulares podiam conferir o grau de bacharel – privilégio
do Colégio Pedro II e requisito para inscrição nos cursos superiores – pode-se imaginar quanto
desinteresse havia nas províncias pela organização séria do ensino. Geralmente, o preparo
começava nas províncias para terminar com a passagem pelos exames parcelados que o Pedro II
realizava para conferir o grau de bacharel. Por aí se pode avaliar quão propedêutico era o ensino
secundário e, ao mesmo tempo, quão seletivo acabou de ser.
Completam o quadro geral do ensino, no período monárquico, além de poucas escolas
primárias (em 1888, 250.000 alunos para uma população se 14 milhões de habitantes), dos liceus
provinciais, em cada capital de província e dos colégios particulares, em algumas cidades
importantes, alguns cursos normais, o Liceu de Artes e Ofícios, criado na Corte, em 1856, e mais
alguns cursos superiores, que foram enriquecidos com a transformação da antiga Escola Central
em Escola Politécnica, e a criação da Escola de Minas de Ouro Preto, no Governo de Rio Branco
(1871-1876).
21
Para se ter uma idéia da predominância do ensino jurídico sobre os demais ramos,
assinale-se que em 1864, nas duas Faculdades de Direito, estavam matriculados 826 alunos,
contra 294 em Medicina, 154 em Engenharia (Escola Central) e 109 na Escola Militar e de
Aplicação. Considerando que nessas Faculdades, além do ensino relacionado com a profissão, que
era a do Direito, também se ministrava ensino ligado às humanidades, pode-se compreender o
quanto predominou, na educação das camadas que freqüentavam as escolas, a formação
acadêmica, humanística e retórica.
Se se lembrar, além disso, de que a educação popular estava abandonada e de que a
educação média era meramente propedêutica, pode-se ajuizar do quanto a educação foi
minimizada, a ponto de transformar-se em mera ilustração e preparação para o exercício de
funções, nas quais a retórica tem papel mais importante do que a criatividade. Tais funções eram
exercidas por aqueles que praticavam o jornalismo ou a política, razão pela qual as camadas em
ascensão ou as camadas dirigentes revelaram preferência especial pelas Faculdades de Direito.
A cultura transmitida pela escola “guardava, pois, o timbre aristocrático”. E o guardava
em função das “exatas necessidades da sociedade escravista”. Enquanto não predominavam nessa
sociedade relações de teor capitalista, nenhuma contradição de caráter excludente pôde ocorrer
entre as camadas que procuravam a educação: a aristocracia rural e os estratos médios.
A constituição da República de 1891, que instituiu o sistema federativo de governo,
consagrou também a descentralização do ensino, ou melhor, a dualidade de sistemas, já que, pelo
seu artigo 35, itens 3.º e 4.º, ela reservou à União o direito de “criar instituições de ensino superior
e secundário nos Estados” e “prover a instrução secundária no Distrito Federal”, o que,
conseqüentemente, delegava aos Estados competência para prover e legislar sobre educação
primária. A prática, porém, acabou gerando o seguinte sistema: à União cabia criar e controlar a
instrução superior em toda a Nação, bem como criar e controlar o ensino secundário acadêmico e
a instrução em todos os níveis do Distrito Federal, e aos Estados cabia criar e controlar o ensino
primário e o ensino profissional, que, na época, compreendia principalmente escolas normais (de
nível médio) para moças e escolas técnicas para rapazes.
1.4 – O Auge do Sistema Educacional no Império
Era, portanto, a consagração do sistema dual de ensino, que se vinha mantendo desde o
Império. Era também uma forma de oficialização da distância que se mostrava, na prática, entre a
educação da classe dominante (escolas secundárias acadêmicas e escolas superiores) e a educação
do povo (escola primária e escola profissional). Refletia essa situação uma dualidade que era o
próprio retrato da organização social brasileira. O que, no entanto, não ocorria ao sistema assim
22
consagrado era o fato de a nova sociedade brasileira, que despontava com a República, já ser mais
complexa do que a anterior sociedade escravocrata. Havia vários estratos sociais emergentes. O
povo já não abrangia apenas a massa homogênea dos agregados das fazendas e dos pequenos
artífices e comerciantes da zona urbana: transparecia a heterogeneidade da composição social
popular, pela divergência de interesses, origens e posições. Existia já uma pequena burguesia, em
si mesma heterogênea, uma camada média de intelectuais letrados ou padres, os militares em
franco prestígio, uma burguesia industrial, ensaiando seus primeiros passos, e todo um
contingente de imigrantes que, na zona urbana, se ocupavam de profissões que definiam classes
médias e, na zona rural, se ocupavam da lavoura. Estes últimos eram, tanto no que respeitava ao
nível cultural, quanto ao que caracterizava os interesses, bastante diferentes das camadas
camponesas que se ocupavam da economia de subsistência e, mais diferentes ainda, do
contingente saído da escravidão. Todo esse complexo organismo social já não podia comportar-se
em instituições de caráter simplista. A pressão não tardaria, pois, a provocar a ruptura das
limitações impostas pela Constituição. E a instituição da escola, calcada no princípio da dualidade
social, iria aos poucos ter seus alicerces comprometidos pelo crescimento e complexificação
dessas camadas.
A dualidade do sistema educacional brasileiro, se, de um lado, representava a dualidade da
própria sociedade escravocrata, de onde acabara de sair a República, de outro, representava ainda,
no fundo, a continuação dos antagonismos em torno da centralização e descentralização do poder.
A vitória dos princípios federalistas que consagrou a autonomia dos poderes estaduais fez com
que o Governo Federal, reservando-se uma parte da tarefa de proporcionar educação à nação, não
interferisse de modo algum nos direitos de autonomia reservados nos Estados, na construção de
seu sistema de ensino. Como um não interferiu na jurisdição do outro, as ações eram
completamente independentes e, o que era natural, díspares, em muitos casos. Isso acabou
gerando uma desorganização completa na construção do sistema educacional, ou melhor, dos
sistemas educacionais brasileiros.
A par dessa dualidade, a 1.ª República tentou várias reformas, sem êxito, para a solução
dos problemas educacionais mais graves. A primeira delas, a de Benjamin Constant, a mais
ampla, não chegou sequer a ser posta em prática, a não ser em alguns aspectos. Tentou a
substituição do currículo acadêmico por um currículo enciclopédico, com inclusão de disciplinas
científicas, consagrou o ensino seriado, deu maior organicidade ao sistema todo, atingindo a
reforma as escolas primárias, as escolas normais, as secundárias (através da reforma do Distrito
Federal), além “do ensino superior, artístico e técnico, em todo território do país” e da criação do
23
Pedagogium, centro de aperfeiçoamento do magistério e “impulsor das reformas”. Faltava, porém,
para a execução da reforma, além de uma infra-estrutura institucional que pudesse assegurar-lhe a
implantação, o apoio político das elites, que viam nas idéias do reformador uma ameaça perigosa
à formação da juventude, cuja educação vinha, até então, sendo pautada nos valores e padrões da
velha mentalidade aristocrático-rural. Era toda uma estrutura social e econômica entrando no
processo de formação do povo e colocando-se como entrave à renovação pedagógica. Se a
reforma Benjamin Constant teve o mérito de romper “com à antiga tradição do ensino
humanístico”’, não teve, porém, o cuidado de pensar a educação a partir de uma realidade dada,
pecando, portanto, pela base e sofrendo dos males de que vão padecer quase todas as reformas
educacionais que se tentou implantar no Brasil. Ademais, é preciso que se leve em conta o nível
de preparação que o Governo vinha manifestando para com a reconstrução do sistema
educacional. A própria criação do Ministério da Instrução, Correios e Telégrafos, de curta
duração, reunindo num só órgão a administração de coisas tão díspares, denunciava o grau de
importância que assumia, para as classes dirigentes do momento, a educação do povo.
Outras reformas se seguiram a essa, mas não lograram acarretar nenhuma mudança
substancial ao sistema. Algumas delas, como a Lei Orgânica Rivadávia Corrêa, no Governo do
Marechal Hermes da Fonseca, em 1911, chegaram até a ocasionar um retrocesso na evolução do
sistema, em virtude de facultar total liberdade e autonomia nos estabelecimentos e suprimir o
caráter oficial do ensino, o que trouxe resultados desastrosos. A reforma Carlos Maxmiliano
representou uma contramareha: reoficializou o ensino, reformou o Colégio Pedro II e
regulamentou o ingresso nas escolas superiores. E a reforma Rocha Vaz, no Governo Arthur
Bernardes, em 1925, representou a última tentativa do período no sentido de instituir normas
regulamentares para o ensino, tendo o mérito de estabelecer, pela primeira vez, um acordo entre a
União e os Estados, com o fim de promover a educação primária, eliminar os exames
preparatórios e parcelados, ainda vigentes e herança do Império. Foi, na verdade, uma tentativa de
impor a sistematização sobre a desordem.
1.5 – Novas Reformas no Ensino
Todas as reformas, porém, não passaram de tentativas frustradas e, mesmo quando
aplicadas, representaram o pensamento isolado e desordenado dos comandos políticos, o que
estava muito longe de poder comparar-se a uma política nacional de educação. Segundo Fernando
24
Azevedo, “do ponto de vista cultural e pedagógico, a República foi uma revolução que abortou e
que, contentando-se com a mudança do regime não teve o pensamento ou a decisão de realizar
uma transformação radical no sistema de ensino para provocar uma renovação intelectual das
elites culturais e políticas, necessárias às novas instituições democráticas”. Caso se leve em conta
que as elites, que passaram desde logo a controlar o poder, representavam as oligarquias do café,
às quais se juntaram, pouco a pouco, as velhas oligarquias rurais de atuante ação política, no
tempo do Império, é justo concluir-se que o tipo de educação reivindicado por essa classe a Nação
só poderia ser aquele ao qual ela mesma vinha sendo submetida. A “renovação intelectual de
nossa elites culturais e políticas” foi um fato que não se deu, visto que o comando político,
econômico e cultural se conservou nas mãos da classe que tinha recebido aquela educação
literária e humanista, originária da Colônia e que tinha atravessado todo o Império “sem
modificações essenciais”.
Depois, a vitória do fechamento, que dava plena autonomia aos Estados, acentuou, não só
no plano econômico, mas também no plano educacional, as disparidades regionais. Colocando o
ensino à mercê das circunstâncias político-econômicos locais, o federalismo acabou por
aprofundar a distância que já existia entre os sistemas escolares estaduais. Sim, porque os Estados
que comandavam a política e a economia da Nação e eram, em conseqüência, sede do poder
econômico, estavam em condições privilegiadas para equipar, com melhores recursos, o aparelho
educacional, enquanto os Estados mais pobres, sem a possibilidade de qualquer ingerência nos
destinos do país e, mais ainda, sem condições de colocar em pé de igualdade suas reivindicações
junto ao poder público, ficavam à mercê da sua própria sorte. Esse liberalismo político e
econômico, que acabou por transformar-se num liberalismo educacional foi fator de relevância no
aprofundamento das desigualdades sócio- econômicas e culturais das diversas regiões do país, o
que, evidentemente, redundou na impossibilidade de se criarem uma unidade e continuidade de
ação pedagógica. Vamos ver, assim, a educação e a cultura tomando impulso em determinadas
regiões do sudeste do Brasil, sobretudo em São Paulo, e o restante dos Estados seguindo, “sem
transformações profundas, as linhas do seu desenvolvimento tradicional, predeterminadas na vida
colonial e no regime do Império”.
Na verdade, o controle do poder pelas oligarquias rurais, que, evidentemente, propunham
reformas e legislavam sobre a educação, acabou por projetar no sistema escolar a mesma
mentalidade que havia sido plasmada na Colônia e tinha vigorado durante a Monarquia. “O
mesmo espírito literário e livresco, a mesma falta de audácia construtiva e a mesma preocupação
25
excessiva de fórmulas jurídicas, ou de formalismo e de “jurisdicismo”, nas expressões de José
Maria Belo”.
Mesmo a burguesia industrial em ascensão copiava os modelos de comportamento e
educação da classe latifundiária. E era natural que assim fosse: era esta última que tinha fornecido
parte de seu capital humano e econômico para engendrar o processo de industrialização. Era, pois,
no comportamento da classe oligárquica que ia a burguesia nascente buscar seus exemplos e era a
educação dessa classe que ela iria solicitar para si.
Além disso, as próprias classes médias emergentes, que não tinham, como já se disse
antes, nenhuma afinidade ou ligação com as camadas mais pobres da população, não possuíam
senão o mesmo modelo de educação a copiar. Viam elas nessa educação de classe, vigente em
todo o território nacional, um instrumento bastante eficaz de ascensão social. Anísio Teixeira
assinalou bem esse aspecto, ao afirmar que “para esta sociedade aparentemente renovada mas
realmente estacionária, assim como o latifúndio se faz o molde para a industrialização, a educação
de elite se faz o molde para certo tipo moderado de educação para ascensão social, que não fosse
suscetível de quebrar a estrutura aristocrática e conservadora da sociedade”.
As novas pretensões educacionais das classes emergentes responderam, todavia, depois, as
camadas dominantes com certos mecanismos de defesa que, na oferta da educação escolarizada,
se caracterizaram pela escassez de oportunidades e conservação do caráter eminentemente
literário. Buscavam, com isso, preservar o patrimônio da educação para o ócio.
Agradava a situação o fato de que nem a estrutura econômica da Nação permitia oferecer
educação técnica em abundância, dada a falta de recursos e a escassez da demanda de mão-de-
obra qualificada, determinada pelo nível de industrialização do país, nem tampouco as populações
estavam interessadas nesse ensino técnicos, símbolo de classe dominada. A velha mentalidade
escravocrata não era privilégio das camadas dirigentes: era também uma característica marcante
do comportamento das massas que se acostumaram, após três séculos, a ligar trabalho com
escravidão. O povo, principalmente as camadas médias que almejavam ascender na escala social,
afastou logo de si a idéia de educar-se para o trabalho. Decorreu daí que, malgrado os esforços
privatistas das camadas dominantes, a educação, que acabou por expandir-se, foi justamente
aquela que representava o próprio símbolo de classe. Foi, assim, que a falta de tradição de classe
média, aliada ao fator escravidão, fez com que a “intenção do sistema escolar brasileiro de prover
às necessidades educativas da cada classe, sem lhe alterar a estrutura social, confirmando a
distribuição da educação às estreitas necessidades da cada classe”. Não lograsse êxito. A classe
26
média aspirava ao status de elite e não podia ver na educação para o trabalho, tão estigmatizado
durante três séculos, um objetivo almejável.
Era essa uma situação que iria delinear-se mais claramente após a I Grande Guerra e
caracterizar profundamente o período seguinte. No começo da República, as classes médias que
emergiam na zona urbana não tinham ainda a força numérica que iria ter a contar dos anos 30.
Durante todo o período de que estamos tratando, o predomínio numérico coube às populações
estabelecidas na zona rural. Esse fato, determinado pela estrutura sócio-econômica vigente, foi
também fator determinante na composição efetiva da demanda escolar, no decorrer do período.
Para uma economia de base agrícola, como era a nossa, sobre a qual se assentavam o latifúndio e
a monocultura e para cuja produtividade não contribuía a modernização dos fatores de produção,
mas tão-somente se contava com a existência da técnicas arcaicas de cultivo, a educação
realmente não era considerada como fator necessário. Se a população se concentrava na zona rural
e as técnicas de cultivo não exigiam nenhuma preparação, nem mesmo a alfabetização, está claro
que, para esta população camponesa, a escola não tinha qualquer interesse. Enquanto as classes
médias e operárias urbanas procuravam a escola, porque dela precisavam para, de um lado
ascender na escala social e, do outro, obter um mínimo de condições para consecução de emprego
nas poucas fábricas, para a grande massa composta de populações trabalhadoras da zona rural, a
escola não oferecia qualquer motivação. Essa foi a razão pela qual o índice de analfabetismo no
período foi bastante alto e as reivindicações escolares das classes emergentes puderam ser, de
alguma forma, atendidas. A I República teve, assim, um quadro de demanda educacional que
caracterizou bem as necessidades sentidas pela população e, até certo ponto, representou as
exigências educacionais de uma sociedade cujo índice de urbanização e de industrialização ainda
era baixo. A permanência, portanto, da velha educação acadêmica e aristocrática e a pouca
importância dada à educação popular fundavam-se na estrutura e organização da sociedade. Foi
somente quando essa estrutura começou a dar sinais de ruptura que a situação educacional
principiou a tomar rumos diferentes. De um lado, no campo das idéias, as coisas começaram a
mudar-se com movimentos culturais e pedagógicos em favor de reformas mais profundas; de
outro, no campo das aspirações sociais, as mudanças vieram como aumento da demanda escolar
impulsionada pelo ritmo mais acelerado do processo de urbanização ocasionado pelo impulso
dado à industrialização após a I Guerra e acentuado depois de 1930.
27
1.6 - Integração e Desintegração de Fatores
Do que acaba de ser exposto decorre naturalmente uma conclusão: os fatores atuantes na
organização e evolução do ensino, quais sejam o sistema econômico, a herança cultural, a
demanda social de educação e o sistema de poder permaneceram durante o período que antecedeu
a década de 20, integrados na formação de um complexo sócio-econômico-político-cultural que
fez com que a educação ofertada à população brasileira correspondesse às reais exigências da
sociedade então existente.
Uma vez que a economia não fazia exigências à escola em termos de demanda
econômica de recursos humanos; que a herança cultural havia sido criada a partir da importação
de modelos de pensamento provenientes da Europa; que a estratificação social,
predominantemente dual na época colonial, havia destinado à escola apenas parte da aristocracia
ociosa; que essa demanda social de educação, mesmo quando englobou no seu perfil os estratos
médios urbanos, procurou sempre na escola uma forma de adquirir ou manter status, alimentando,
além disso, um preconceito contra o trabalho que não fosse intelectual e uma vez, enfim, que
todos esses aspectos se integravam, é possível afirmar-se que a educação escolar existente, com
origem na ação pedagógica dos Jesuítas, correspondia às exatas necessidades da sociedade como
um todo. A função social da escola era, então, a de fornecer os elementos que iriam preencher os
quadros da política, da administração pública e formar a “inteligência” do regime. É possível,
assim, pensar na ausência de uma defasagem entre educação e desenvolvimento, nessa época, ou
seja, é possível pensar numa ausência de defasagem entre os produtos acabados oferecidos pela
escola e a demanda social e econômica de educação.
A contar do momento, porém, em que um desses fatores começa a fazer exigências
diferentes à escola, o complexo entra em crise. A intensificação do processo de urbanização, que
tem na deterioração das formas de produção no campo e na industrialização crescente suas causas
principais, passou a criar, desde a primeira República, os germes do desequilíbrio.
No que toca à demanda social de educação, esse processo fez modificar-se
substancialmente o seu perfil, introduzindo nele um contingente cada vez maior de estratos
médios e populares que passaram a pressionar o sistema escolar para que se expandisse. A estreita
oferta de ensino de então começou a chocar-se com a crescente procura.
Já com respeito à economia, a evolução de um modelo exclusivamente agrário -
exportador para um modelo parcialmente urbano-industrial, afetou o equilíbrio estrutural dos
fatores influentes no sistema educacional pela inclusão de novas e crescentes necessidades de
28
recursos humanos para ocupar funções nos setores secundário e terciário da economia. O modelo
econômico em emergência passou, então, a fazer solicitações à escola.
Esses dois aspectos – o crescimento acelerado da demanda social de educação, de um
lado, e o aparecimento de uma demanda de recursos humanos, de outro – criaram as condições
para a quebra do equilíbrio. Uma vez estabelecido o desequilíbrio, que se acentuou sobretudo a
contar de 1930, a crise do sistema educacional obedeceu, na sua escala evolutiva, ao jogo de
forças que esses fatores mantinham entre si. Esse jogo, naturalmente, obedeceu, por sua vez, às
regras do crescimento espontâneo próprio do sistema capitalista. E a crise se manifestou
sobretudo pela incapacidade de as camadas dominantes reorganizarem o sistema educacional, de
forma que se atendesse harmonicamente, tanto à demanda social de educação, quanto às novas
necessidades de formação de recursos humanos exigidos pela economia em transformação. Nesse
processo, a herança cultural atuou desfavoravelmente na mentalidade, tanto dos dirigentes que
organizaram a escola, quanto das próprias camadas que passaram a pressionar o sistema escolar.
Os aspectos que o desequilíbrio apresentou foram, então, de duas ordens.
a) de ordem quantitativa, representados pela pequena oferta, pelo baixo rendimento e
pela discriminação social do sistema;
b) de ordem estrutural, representados pela expansão de um tipo de ensino que já não
correspondia às novas necessidades criadas com a expansão econômica e estratificação social
mais diversificadas.
29
CAPÍTULO II
A EDUCAÇÃO: DA REPÚBLICA AO GOVERNO CASTELO
BRANCO
30
2.1 - As novas Exigências Educacionais da Industrialização
2.1.1 - A Influência da Revolução Capitalista na Expansão do Ensino
A análise que nos propomos fazer daqui para a frente diz respeito exclusivamente ao
problema da defasagem entre educação e desenvolvimento, defasagem que, a nosso ver, se vem
acentuando com a passagem de um modelo econômico para outro. Limita-se, portanto, esta
análise à constatação da distância que vai se ampliando entre os produtos acabados oferecidos
pela escola e aquilo que o deferido modelo está a exigir relativamente à formação de recursos
humanos. Como a vigência de tal modelo não propôs mudanças estruturais profundas na escola,
as exigências educacionais foram pronunciadamente exigências relacionadas com o ensino e,
muito raramente, com a pesquisa.
E tendo em vista esses fatos que passaremos à reflexão sobre a influência da Revolução
Industrial na expansão do ensino.
Desde a segunda metade do século XIX, os países mais desenvolvidos vinham cuidando
da implantação definitiva da escola pública, universal e gratuita. De fato, esse século se
caracterizou, quanto à educação, pela acentuada tendência do Estado de agir como educador. È
que as exigências da sociedade industrial impunham modificações profundas na forma de se
encarar a educação e, em conseqüência, na atuação do Estado, como responsável pela educação
do povo. As mudanças introduzidas nas relações de produção e, sobretudo, a concentração cada
vez mais ampla de população em centros urbanos tornaram imperiosa a necessidade de se
eliminar o analfabetismo e dar um mínimo de qualificação para o trabalho a um máximo de
pessoas. O capitalismo, notadamente o capitalismo industrial, engendra a necessidade de fornecer
conhecimentos a camadas cada vez mais numerosas, seja pelas exigências da própria produção,
seja pelas necessidades do consumo que essa produção acarreta. Ampliar a área social de atuação
do sistema capitalista industrial é condição de sobrevivência deste. Ora, isto só é possível na
medida em que as populações possuam condições mínimas de concorrer no mercado de trabalho e
de consumir. Onde, pois, se desenvolvem relações capitalistas, nasce a necessidade da leitura e
da escrita, como pré-requisito de uma melhor condição para concorrência no mercado de trabalho.
Por outro lado, comparando um tipo de vida com outro, a proletarização representa um
progresso em relação à vida e ao trabalho nas economias de subsistência. É que o capitalismo
31
gera, onde predominava antes esse tipo de economia, uma ampliação da oferta de trabalho
assalariado. Isso, por sua vez, representa um crescimento constante da demanda social da
educação.
A intensificação do capitalismo industrial no Brasil, que a Revolução de 30 acabou por
representar, determinou conseqüentemente o aparecimento de novas exigências educacionais. Se
antes, na estrutura oligárquica, as necessidades de instrução não eram sentidas, nem pela
população, nem pelos poderes constituídos (pelo menos em termos de propósitos reais), a nova
situação implantada na década de 30 veio modificar profundamente o quadro das aspirações
sociais, em matéria de educação, e, em função disso, à ação do próprio Estado. Lourenço Filho
mostra-nos isso através de pesquisa realizada sobre a evolução da taxa de analfabetismo, a contar
de 1900. Segundo ele, “é fácil compreender que, em grupos de população muito dispersos, de
economia incipiente, muitas vezes reduzia à prática de agricultura de subsistência ou pouco mais
que isso, em regime quase geral de subemprego, as expectativas de melhoria dos padrões de vida
são exíguas, não apresentando maior sentido prático a preparação formal que a escola passa a
proporcionar. Nessas circunstâncias, a demanda é reduzida, ainda em face de mais ampla oferta”.
2.1.2 – O Reduzido interesse pela instrução: um problema sempre
presente
Ocorria, no entanto, que não era apenas o setor ligado à economia de subsistência que
determinava a presença de um reduzido interesse pela instrução. Também na economia de
exportação, na região cafeeira, esse desinteresse era evidente. Isso se explica pela estrutura que
assumia e ainda assume, em parte, a propriedade de terras no Brasil. Se exploração agrícola de
então se fazia em moldes capitalistas, esses aspectos, todavia, não atingiam diretamente as formas
de produção, o labor de terra, mas, quase exclusivamente, o setor de comercialização. Sendo
abundante a mão-de-obra – praticamente inexgotável pela presença de enormes áreas de
economia de subsistência – e sendo, portanto, barato o trabalho, a produção se fazia intensiva de
mão-de-obra, com métodos rudimentares e arcaicos. Além disso, a população ligada a esse tipo de
economia não via utilidade prática na educação formal ministrada pelas escolas.
“Dá-se o contrário, porém, como continua a afirmar Lourenço Filho, onde haja grupos
mais adensados, com economia de mercado ascendente e maior diferenciação do trabalho, por
deslocamento crescente de elementos ativos dos setores econômicos primários (agricultura,
pecuária, mineração) para as manufaturas e atividades industriais em geral. Quando isso se passa,
vêm a crescer as ocupações terciárias (administração, transportes e serviços em geral) cuja
32
influência na integração das pequenas comunidades logo se faz sentir. Então a leitura e a escrita
passaram a ter preço, são sentidas como úteis e benéficas, e a demanda do ensino normalmente se
eleva, ao mesmo tempo que maiores recursos, advindos de maior produção, possibilitaram maior
e mais diferenciada oferta”.
A predominância do setor agrícola na nossa economia, aliada a formas arcaicas de
produção e à baixa densidade demográfica e de urbanização, respondia, portanto, pela escassa
demanda social de educação. Era esse também um dos aspectos assumidos pelo nosso
subdesenvolvimento.
A forma como se instalou o regime republicano no Brasil e como se conduziram no
poder as elites, em nada modificando a estrutura sócio-econômica. Influiu para que, de um lado,
não houvesse pressão de demanda social de educação e, de outro, não se ampliasse a oferta, nem
se registrasse real interesse pela educação pública, universal e gratuita. Não é, pois, à falta de
recursos materiais que se deve imputar maior soma de responsabilidade pela ausência de
educação do povo, mas à estrutura sócio- econômica que sobreviveu com a República.
2.2 – A Revolução de 1930 e o seu resultado educacional
A Revolução de 30, resultado de uma crise que vinha de longe destruindo o monopólio
do poder pelas velhas oligarquias, favorecendo a criação de algumas condições básicas para a
implantação definitiva do capitalismo industrial no Brasil, acabou, portanto, criando também
condições para que se modificassem o horizonte cultural e o nível de aspirações de parte da
população brasileira, sobretudo nas áreas atingidas pela industrialização. É então que a demanda
social de educação cresce e se consubstancia numa pressão cada vez mais forte pela expansão do
ensino. Mas, assim como a expansão capitalista não se fez por todo o território nacional e de
forma mais ou menos homogênea, a expansão da demanda escolar só se desenvolveu nas zonas
onde se intensificavam as relações de produção capitalista, o que acabou criando uma das
contradições mais sérias do sistema educacional brasileiro. Sim, porque, se, de um lado, iniciamos
nossa revolução industrial e educacional com um atraso de mais de 100 anos, em relação aos
países mais desenvolvidos, de outro, essa revolução tem atingido de forma desigual o próprio
território nacional. Daí resultou uma defasagem histórica e, se assim podemos exprimir-nos,
geográfica, que se tem traduzido pela presença de contradições cada vez mais profundas
patenteadas através dos seguintes fatos:
33
a) O fato de vivermos, em matéria de educação, como nos demais aspectos da vida
social, duas ou mais épocas históricas, simultaneamente, e de sermos com isso obrigados a
resolver problemas que outros povos já resolveram há um século ou mais, enquanto enfrentamos
situações mais complexas, cuja superação está a exigir uma tradição cultural e educacional, que
ainda não temos.
b) E, com isso, o fato de expor-nos ao risco de enfrentar e até mesmo, a nosso ver, de
passar a viver o dualismo educacional que se traduz pela presença do analfabetismo e ausência de
educação primária gratuita e universal, ao lado de uma profunda e sofisticada preocupação
pedagogizante.
Além disso, a expansão capitalista trouxe também a luta de classe. A expansão escolar,
que se verificou a contar de então, foi afetada por essa luta, porque oscilou entre necessidades
sociais “decorrentes do desenvolvimento das relações capitalistas e temores vinculados à luta de
classes que se aprofundou na mesma época em ligação dialética com o referido
desenvolvimento”.
Essa luta assumiu no terreno educacional características assaz contraditórias, uma vez
que o sistema escolar, a contar de então, passou a sofrer, de um lado, a pressão social de
educação, cada vez mais crescente e cada vez mais exigente, em matéria de democratização do
ensino, e, de outro lado, o controle das elites mantidas no poder, que buscavam, por todos os
meios disponíveis, conter a pressão popular, pela distribuição limitada de escolas, e, através da
legislação do ensino, manter o seu caráter “elitizante”.
O que se verificou, a partir daí, foi o fato de a expansão do sistema escolar, inevitável,
ter-se processado de forma atropelada, improvisada, agindo o Estado mais com vistas ao
atendimento das pressões do momento ao que propriamente com vistas a uma política nacional de
educação. É por isso que cresceu a distribuição de oportunidades educacionais, mas esse
crescimento não se fez de forma satisfatória, nem em relação à quantidade, nem em relação à
qualidade.
O tipo de escola que passou a expandir-se foi o mesmo que até então educara as elites e
essa expansão, obedecendo, como já se disse, às pressões da demanda e controlada pelas elites,
jamais ocorreu de forma que tornasse universal e gratuita a escola elementar e adequado e
suficiente o ensino médio superior. Assumindo a forma de uma luta de classes, a expansão da
educação no Brasil, mormente a contar de 1930, obedeceu às normas da instabilidade própria de
34
uma sociedade heterogênea profundamente marcada por uma herança cultural academicista e
aristocrática.
35
2.2.1 - O Crescimento da demanda social da Educação e a expansão do Ensino
A modalidade social favorecida com a nova ordem político-econômica, a contar da década de
1930, vem quebrar, em parte, a rigidez do sistema social predominantemente dualista,
estabelecendo novas oportunidades, quer para camadas intermediárias incipientes, quer para os
imensos estratos agregados à lavoura, em vias de mobilizar-se em direção aos centros urbanos, ou
já nestes estabelecimentos. O rompimento das barreiras que separavam nitidamente, do restante
da população, uma enriquecida e poderosa classe de donos de terra e comerciantes significou, por
seu lado, modificações mais ou manos profundas no sistema educacional que, até 30, fora
composto de compartimentos estanques a serviço de uma estratificação social rígida. Retratando a
sociedade, o sistema educacional brasileiro fora, até então, um sistema acentuadamente dualista:
de um lado, o ensino primário, vinculado às escolas profissionais, para os pobres, e, de outro, para
os ricos, o ensino secundário articulado ao ensino superior, para o qual preparava o ingresso.
Essa ordem de coisas, no que diz respeito ao sistema educacional global, se manteve em
equilíbrio, enquanto se manteve uma ordem social menos complexa. E a articulação interna dos
vários níveis do sistema, quer no que concerne ao subsistema para os pobres, quer no que
concerne ao subsistema para os ricos, era viável, já que como dissemos o equilíbrio social se
mantinha, como também se mantinha o mesmo nível das aspirações culturais para o conjunto da
população.
O que caracteriza a viabilidade de um sistema educacional e o que torna possível sua
concretização, no espaço e no tempo, são dois fatores essenciais:
a) Um mínimo de coerência interna capaz de dar, como quer Jayme Abreu, consistência
lógica ao sistema e que signifique, de um lado, a existência de objetivos bem definidos para cada
um dos níveis de ensino e, de outro, uma articulação entre os vários níveis capaz de fazer com
que, ao lado da independência própria criada pelos objetivos de cada nível, se crie também entre
eles uma interdependência. É essa interdependência que faz com que o ensino secundário seja
continuação do primário, ao mesmo tempo que ele se proponha objetivos próprios relacionados
com a formação do adolescente e ainda com o seu preparo para continuar estudos em nível
superior.
b) Uma certa coerência externa, que vise, antes de tudo, a uma adequação do sistema
global de ensino às exigências do contexto sócio-econômico-cultural, em que está imerso. Essa
adequação representa uma dinâmica, na qual a escola busca uma readaptação constante ao nível
do desenvolvimento social e econômico, quer gerando produtos acabados, que se traduzam por
36
recursos humanos de que carece o sistema econômico, quer absorvendo os produtos gerados pelo
progresso científico-tecnológico, quer, enfim, desempenhando um papel importante junto a este
último, criando ou recriando, no seu próprio âmbito, o progresso de que carece o meio.
Vê-se, por aí, que a coerência externa de um sistema educacional se define por sua
capacidade de responder às solicitações que o contexto lhe faz. Incluem-se entre elas as
solicitações do sistema econômico vigente. Um sistema de industrialização dependente, que
importa tecnologia, evidentemente tem solicitações a fazer quanto à formação de recursos
humanos para o trabalho especializado, mas tem poucas solicitações a fazer quanto à formação de
pesquisadores e cientistas.
O divórcio entre o ensino e a pesquisa no Brasil esteve, até certo ponto, coerente com o
tipo de solicitação que o sistema econômico vinha fazendo à escola.
É de sua coerência interna e externa que depende o grande rendimento de um sistema
educacional. Esse rendimento pode também ser, se não completamente mensurável, pelo menos
observado pelos dois aspectos sob os quais se apresenta:
a) O rendimento quantitativo, que se mede pela relação existente entre a oferta e a
demanda, de um lado, e a matrícula e os produtos acabados do sistema, de outro. Nesse sentido. O
rendimento do sistema escolar caracteriza-se por sua capacidade de atender as exigências
quantitativas da demanda social de educação, ou, ainda, de absorver a população escolarizável
presente, ao mesmo tempo que assegura a essa população o mínimo de educação compatível com
o nível de desenvolvimento sócio - econômico do contexto, mediante retenção da população
escolarizável, em seu âmbito, e garantia de conquista de sua formação cultural e qualificação
mínima para o trabalho.
b) O rendimento qualitativo, que se mede pela capacidade de o sistema responder às
necessidades da economia e da sociedade, oferecendo a estas os produtos acabados de que
necessitam para o seu desenvolvimento. Uma vez que o sistema econômico não exige mais do
que a qualificação de mão-de-obra, a avaliação do rendimento qualitativo fica limitada à medição
da capacidade de a escola oferecer essa qualificação de forma adequada.
O antigo regime conseguiu manter um mínimo de coerência interna e externa em seu
sistema educacional, já que as escolas profissionais de nível pós-primário vinculadas ao ensino
primário para os pobres eram terminais, não davam acesso ao ensino superior, nem possibilitavam
mobilidade para o sistema educacional da “elite”. Satisfaziam, no entanto, as aspirações da
demanda escassa, cujos horizontes culturais não iam além da necessidade da conquista rápida de
uma profissão. O sistema escolar da elite, por sua vez, satisfazia, em certo sentido, a demanda
37
efetiva também restrita de educação, quer quanto à quantidade, quer quanto à qualidade,
porquanto sempre foi próprio das aspirações da classe dominante o ilustrar-se simplesmente,
através da preparação para as carreiras liberais. Dessa forma, o ensino secundário propedêutico
vinculava-se completamente ao superior, tendo mesmo sido seu objetivo exclusivo, durante
séculos, a preparação para o ingresso nas Faculdades. Por outro lado, o modelo de
desenvolvimento não demandava o tipo de educação que as sociedades industrializadas, por
exemplo, exigem.
Esse equilíbrio, como já dissemos, se manteve enquanto se manteve a ordem social
dualista. Foi, porém, quebrado, quando esta ordem passou a sofrer a pressão das camadas
emergentes que o capitalismo industrial impulsionado pela Revolução de 30 acabou por acarretar.
O rompimento da velha ordem trouxe para a pauta das reivindicações sociais das novas camadas a
necessidade crescente de educação escolar. E foi esse crescimento da demanda social efetiva de
educação que acabou rompendo com a velha estrutura dualista da escola, já que cresceu,
sobretudo a partir de então, a procura de educação que possibilitasse acesso a posições mais altas,
ou seja, a educação das elites. A partir daí rompe-se o equilíbrio do sistema dual e, com isso, o
mínimo de coerência interna e externa que conseguia manter o sistema na ordem social dualista.
As relações que o sistema educacional passou a manter com a sociedade global foram as
mais contraditórias possíveis. Isso porque, no momento em que começaram os rompimentos, a
nova ordem já não conseguia produzir o sistema escolar de que carecia, nem o setor social, nem o
econômico. As pressões oriundas da demanda tiveram de ser satisfeitas, em parte, e o foram da
forma mais precária. Refletindo as incoerências do novo regime implantado, que nem rompera de
todo com o passado, nem se comprometera de todo com o futuro, implantando completamente
uma autêntica revolução burguesa, o sistema educacional brasileiro oscilou entre as novas
exigências educacionais emergentes e a velha estrutura da escola, fazendo expandir
aceleradamente o ensino, mas o mesmo ensino vigente até 1930.
2.3 - Crescimento e Expansão Geral do Ensino
Analisando o sistema educacional brasileiro em 1960. Florestan Fernandes assinalava: “É
certo que a República falhou em suas tarefas educacionais. Mas falhou por incapacidade criadora:
por não ter produzido os modelos de educação sistemática exigidos pela sociedade de classes e
pela civilização correspondente, fundada na economia capitalista, na tecnologia científica e no
regime democrático. Em outras palavras, suas falhas provêm das limitações profundas, pois se
omitiu diante da necessidade de converter-se em Estado educador, em vez de manter-se como
38
Estado fundador de escolas e administrador ou supervisor do sistema nacional de educação.
Sempre tentou, não obstante, enfrentar e resolver os problemas educacionais tidos como “graves”,
fazendo-o naturalmente segundo forma de intervenção ditada pela escassez crônica de recursos
materiais e humanos. Isso explica por que acabou dando preeminência às soluções educacionais
vindas do passado, tão inconsistentes diante do novo estilo de vida e das opções republicanas, e
por que simplificou demais a sua contribuição construtiva, orientando-se no sentido de multiplicar
escolas invariavelmente obsoletas, em sua estrutura e organização, e marcadamente rígidas, em
sua capacidade de atender às solicitações educacionais das comunidades humanas brasileiras”.
Todavia, se o papel do Estado se revelou ineficaz na solução dos problemas educacionais que
surgiam, não se pode esquecer que a forma como se processou a expansão teve na demanda um
papel importante, se não predominante. Vejamos como.
As relações que um sistema educacional pode manter coo desenvolvimento global da
sociedade são de duas ordens:
a) Numa primeira posição, a escola é tida como fator de mudança social. Neste caso, ou
seu rendimento é assegurado por um mínimo de coerência interna e externa e sua dinâmica se
exprime por uma readaptação constante e uma participação ativa no desenvolvimento. A
educação é tida aqui como fator de desenvolvimento e, como tal, não só corresponde às
necessidades quantitativas da demanda, como, e principalmente, cria e orienta essa demanda. A
expansão do ensino, pois, não se restringe apenas aos horizontes culturais da demanda, mas, pelo
contrário, orienta-se pelas necessidades reais do desenvolvimento, com revisão constante das
naturais defasagens.
b) Numa segunda posição, a escola é mantida em atraso em relação ao desenvolvimento.
Seu rendimento é mínimo e se fundamenta na ausência de um mínimo de coerência interna e
externa. O sistema escolar mantém-se inerte em relação ao desenvolvimento e só se expande
mediante pressão da demanda efetiva e na direção em que esta exija. A demanda, portanto,
comanda a expansão.
Para maior clareza e objetividade de nossa exposição, precisemos mais nosso conceito de
demanda social de educação. Esta pode constituir-se em demanda potencial, ou tornar-se
demanda efetiva. Isso quer disser que nem sempre a demanda da potencial se traduz, em sua
totalidade, por uma procura efetiva de mais escola. Numa sociedade, a demanda potencial de
educação tem sido um fator que cresce em função do crescimento demográfico. A demanda
efetiva, porém, é um fator que cresce não só em função do crescimento demográfico, mas também
em função de outras causas. A industrialização e a deteriorização das relações de produção, no
39
setor agrícola, as quais tiveram como conseqüência a aceleração do processo de urbanização,
constituem um fator que pode ser computado como determinante de uma procura efetiva de mais
educação.
Quando afirmamos que a educação, tida como fator de mudança social e de
desenvolvimento, é capaz de criar uma demanda, isso significa que ela é capaz de transformar a
demanda potencial em demanda efetiva de educação, seja pela elasticidade da oferta que ela
proporciona, seja pela real integração do sistema educacional num sistema global de
desenvolvimento, com o conseqüente equilíbrio entre a qualificação profissional e as
necessidades do sistema de produção. Nesta perspectiva, a garantia de trabalho que a qualificação
dada pela escola oferece é a pedra de toque da motivação concreta da população para a procura de
educação escolarizada, o que também concorre para que o sistema de educação, criando a procura
efetiva, acabe por criá-la e orientá-la na direção em que exige o desenvolvimento global.
No caso brasileiro, o que se verificou, na verdade foi o fato de a escola manter-se em
atraso, em relação ao desenvolvimento. A ruptura do equilíbrio, em que se encontrava a sociedade
dual, provocou o rompimento da estabilidade do sistema dual do ensino. Esse rompimento foi
gerado por uma expansão escolar que consistiu, antes de tudo, numa expansão em função das
pressões da demanda efetiva em crescimento. Nessa expansão, todavia, o Estado teve uma
participação meramente passiva, tentando, quando muito, soluções de emergência diante das
crises provocadas pela pressão social. É verdade que a ineficácia das soluções está ligada também
a outros fatores e não só à pressão social da demanda. Importa levar em conta que a forma como
se comportou e se tem comportado o Estado brasileiro, em relação aos problemas da educação,
está vinculada profundamente à estrutura do poder político, que passou a predominar depois de
30. Mas a esta aspecto voltaremos adiante. Por enquanto, interessa-nos estabelecer com a
demanda social de educação se transformou em fator-chave da expansão do ensino no Brasil e
como esta expansão, rompendo o citado equilíbrio, não criou, todavia, condições para mudanças
mais profundas, permanecendo a estrutura da escola a mesma do antigo regime.
40
2.4 - A Reforma Francisco Campos
Assumindo o poder em fins de 1930, o Governo Provisório tratou logo de estabelecer
condições de infra-estrutura administrativa para fazer prevalecer alguns dos princípios básicos em
que se fundamentava o novo regime. Dessa forma, e como conseqüência disso, criaram-se logo
novos Ministérios. E o da Educação e Saúde Pública foi instituído logo após a tomada do poder,
no ano de 1930. Era esse Ministério a primeira das grandes realizações práticas, mas, diga-se de
passagem, não constituía propriamente uma novidade, já que no início da República ele existira,
embora tivesse tido curta duração. Sua ação se fez sentir logo, através dos atos de seu primeiro
Ministro da Educação e Saúde Pública Sr. Francisco Campos. A chamada reforma Francisco
Campos efetivou-se através de uma série de decretos. São eles os seguintes:
1. Decreto n.º 19.850 – de 11 de abril de 1931:
Cria o Conselho Nacional de Educação.
2. Decreto n.º 19.851 – de 11 de Abril de 1931:
Dispõe sobre a organização do ensino superior no Brasil e adota o regime
universitário.
3. Decreto n.º 19.852 – de 11 de abril de 1931:
Dispõe sobre a organização da Universidade do Rio de Janeiro.
4. Decreto n.º19.890 – de 18 de abril de 1931:
Dispõe sobre a organização do ensino secundário.
5. Decreto n.º 20.158 – de 30 de junho 1931:
Organiza o ensino comercial, regulamenta a profissão de contador e dá outras
providências.
6. Decreto n.º21.241 – de 14 de abril de 1932:
Consolida as disposições sobre a organização do Ensino Secundário.
Antes de passarmos à análise dessa reforma, seja-nos permitido recordar-nos aqui de
alguns aspectos relevantes:
O primeiro deles relaciona-se com o ponto de partida, ou seja, com a estrutura do ensino
existente até então, o qual, de modo geral, nunca estivera organizado à base de um sistema
nacional. O que existia eram os sistemas estaduais, sem articulação com o sistema central,
alheios, portanto, a uma política nacional de educação. Foi esse, aliás, um dos pontos visados nos
ataques do chamado movimento renovador.
41
Até essa época, o ensino secundário não tinha organização digna desse nome, pois não
passava, na maior parte do território nacional, de cursos preparatórios, de caráter, portanto,
exclusivamente propedêutico. Além disso, todas as reformas que antecederam o movimento
renovador, quando efetuadas pelo poder central, limitaram-se quase exclusivamente ao Distrito
Federal, que as apresentava como “modelo” aos Estados, sem, contudo, obrigá-los a adotá-las.
São, portanto, justas as palavras de Maria Tetis Nunes, ao referir-se à reforma Francisco
Campos: “Ela é, teoricamente, uma grande reforma”. Efetivamente, credita-se-lhe, entre outros
méritos, o de haver dado uma estrutura orgânica ao ensino secundário, comercial e superior. Era a
primeira vez que uma reforma atingia profundamente a estrutura do ensino e, o que é importante,
era pela primeira vez imposta a todo o território nacional. Era, pois, o início de uma ação mais
objetiva do Estado em relação à educação.
Tentaremos também uma análise da reforma, em seu conjunto, procurando manter no
centro de nossas cogitações o problema que nos propusemos com relação a esta 4.ª parte, ou seja,
o de saber como as reformas do ensino refletiram as contradições políticas e sociais por que
passava o Brasil, na época.
2.5 - A Reforma do Ensino Superior
2.5.1 - O aparecimento das Universidades no Brasil
Embora o ensino superior tenha sido criado há mais de um século, durante a permanência
da família real portuguesa no Brasil, de 1808 a 1821, a primeira organização desse ensino em
Universidade, por determinação do Governo Federal, só apareceu em 1920, com a criação da
Universidade do Rio de Janeiro, pelo decreto n.º 14.343, de 7 de setembro de 1920, durante o
Governo Epitácio Pessoa. Não passou, porém, essa primeira criação, da congregação de três
escolas superiores existentes no Rio: a Faculdade de Direito, a Faculdade de Medicina e a Escola
Politécnica.
Em 1912, já havia sido criada a Universidade do Paraná, oficializada pela Lei Estadual
n.º 1.284. Dela faziam parte as Faculdades de Direito, Engenharia, Odontologia, Farmácia e
Comércio. Todavia, o Governo Federal, através do Decreto-lei n.º 11.530, de março de 1915, que
determinava a abertura de escolas superiores apenas em cidades com mais de 100.000 habitantes,
deixava de reconhecer oficialmente a Universidade do Paraná, uma vez que Curitiba, naquela
época, não atingia essa população. Oficialmente reconhecida somente em 1946, não deixou,
todavia, de funcionar, segundo o testemunho de Ernâni Cartaxo, durante todo o período que vai
42
de 15 de março de 1913, quando foram abertos seus cursos, até a sua oficialização pelo Governo
Federal.
Em 1927, surgia, por iniciativa de Francisco Mendes Pimentel, a Universidade de Minas
Gerais. Também não passou da agregação das Escolas de Direito, Engenharia e Medicina.
Eram estas as únicas Universidades brasileiras, recém-criadas, existentes antes do
decreto 19.851, de 11 de abril de 1931, que instituiu o Estatuto das Universidades Brasileiras,
adotando, para o ensino superior, o regime universitário. Na mesma data, pelo decreto 19.852, o
Governo reorganizou a Universidade do Rio de Janeiro, incorporando-lhe, além dos três cursos já
existentes, a Escola de Minas Gerais, as Faculdades de Farmácia e Odontologia, a Escola de Belas
Artes, o Instituto Nacional de Música e a Faculdade de Educação, Ciências e Letras, esta última
nunca implantada.
Na verdade, apesar da reorganização da Universidade do Rio de Janeiro, a primeira
Universidade a ser criada e organizada, segundo as normas dos Estatutos das Universidades, foi a
Universidade de São Paulo, surgida em 25 de janeiro de 1934. As demais universidades, até
então, tinham-se organizado pela simples incorporação dos cursos existentes e autônomos. A
Universidade de São Paulo foi criada segundo as normas do decreto e apresentava a novidade de
possuir uma Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras que segundo Fernando Azevedo, passou a
ser a medula do sistema, tendo por objetivos a formação de professores para ( 1ª linha da página
133 está ilegível)
Em 1935, Anísio Teixeira, como Secretário da Educação, criava a Universidade do
Distrito Federal, de estrutura arrojada, caracterizada pelo fato de não possuir as três faculdades
tradicionais e ter uma Faculdade de Educação, na qual se situava o Instituto de Educação. Teve,
porém, essa Universidade curta duração: em 1939, ela foi extinta, ao incorporar-se à Universidade
do Brasil, na qual se transformara a Universidade do Rio de Janeiro, desde 1937.
Também em 1935 era criada a Universidade de Porto Alegre, a primeira a incluir, em sua
estrutura, uma Faculdade de Estudos Econômicos.
A partir de então, começaram a surgir universidades, públicas e privadas, por todo o
território nacional, em número que, em 1969, já somava 46.
2.6 - O Estatuto das Universidades Brasileiras.
O decreto n.º 19.851, de 11 de abril de 1931, que instituiu o regime universitário no
Brasil e se constituiu no Estatuto das Universidades Brasileiras, fixou os fins do ensino
universitário da seguinte forma:
43
“Art. 1.º - O ensino universitário tem como finalidade: elevar o nível da cultura geral,
estimular a investigação científica em quaisquer domínios dos conhecimentos humanos; habilitar
ao exercício de atividades que requerem preparo técnico e científico superior; concorrer, enfim,
pela educação do indivíduo e da coletividade pela harmonia de objetivos entre professores e
estudantes e pelo aproveitamento de todas as atividades universitárias, para a grandeza da Nação e
para o aperfeiçoamento da Humanidade”.
A formulação de tão vastos e pretensiosos objetivos denuncia claramente uma visão
distorcida, tanto da realidade educacional brasileira de então, quanto dos limites que comporta
toda e qualquer instituição, sobretudo a instituição escolar. A investigação científica e o preparo
para o exercício profissional têm sido, na verdade, os reais objetivos da Universidade moderna.
Mas, apesar de ambos constarem da declaração de princípios da legislação, a Universidade
brasileira vem perseguindo, desde sua criação, apenas os objetivos ligados à formação
profissional, salvo raríssimas exceções. A falta de tradição de pesquisa deve-se, como já se
assinalou, a fatores tais como a estratificação social, a herança cultural (que pesa fortemente na
manutenção de uma estrutura arcaica de ensino), a forma como tem evoluído a economia e,
sobretudo, como se tem processado a industrialização. Mas, poder-se-ia incluir também, entre
outros fatores, a própria forma como se organiza o ensino: nossas leis referentes ao ensino
superior têm sido omissas quanto à previsão de situações objetivas e definidas para as atividades
de pesquisa. Salvo algumas referências nos títulos reservados às finalidades ou à atividade do
professor catedrático, nada mais, de efetivamente objetivo, tem constado do corpo das leis, que
regulamente o trabalho de pesquisa. O primeiro exemplo disso é a reforma de que estamos
tratando.
A organização da administração previa a existência de órgãos e funções básicas, tais
como a Reitoria, o Conselho Universitário, a Assembléia Universitária e a Direção de cada escola.
Instituíram-se várias categorias para a composição do corpo docente de cada unidade, tais como o
catedrático, o auxiliar de ensino e os cursos equiparados ( dados pelos livres-docentes), os de
aperfeiçoamento e especialização.
Relativamente, porém, à estrutura global da Universidade, o artigo 5.º estipulava a
obrigatoriedade de pelo menos três dos seguintes cursos para a constituição de uma Universidade:
Direito, Medicina, Engenharia e Educação, Ciências e Letras. Com isso, consagrava-se a falta de
diversificação de nosso ensino superior, ao mesmo tempo que se reforçava a velha concepção
aristocrática de ensino. A lei refletia, assim, uma das contradições de nossa vida política e social.
44
O poder que havia derrubado a antiga ordem social oligárquica era composto de forças
antagônicas, que se sustentavam precariamente, pois só eventualmente se achavam ligadas.
Enquanto não houve radicalização de posições entre progressistas e conservadores, entre tenentes
e constitucionalistas, foi possível o compromisso mútuo, mútua tolerância e a mútua concessão.
Dessa forma, o velho sobreviveu do novo, até na organização do ensino. É à velha concepção,
ainda remanescente, que se devem imputar a consagração e a obrigatoriedade de manter, na
constituição de Universidades brasileiras, esses cursos formadores de profissionais para as
carreiras liberais.
A autonomia individual de cada escola, consagrada pelos artigos 8.º e 9.º, eliminou a
possibilidade de uma estruturação mais orgânica da Universidade, ao mesmo tempo que
representou a sobrevivência, no âmbito universitário, do espírito federalista, tão caro às forças
dominantes da Velha República. Foi essa sobrevivência que, acarretando a simples agregação ou
soma de escolas auto-suficientes e independentes, impediu a Universidade brasileira, até nossos
dias, de viver um verdadeiro regime universitário. O artigo 8.º chagou até a prever a possibilidade
de formação de Universidades (federal, estadual ou particular).
Mas, por outro lado, em flagrante contradição com a descentralização interna, a
dependência administrativo-burocrática de cada escola, em relação ao Ministério da Educação, a
cujo titular competia nomear até os membros dos Conselhos Técnico- administrativos denunciava
uma tendência acentuadamente centralizadora. Essa dupla ação centralizadora e
descentralizadora, oscilante e dúbia, foi mais um reflexo do momento político em que vivia a
nação. Ainda não estava encerrada a luta entre centralização e descentralização do ensino. Ela
teve continuidade na evolução do sistema educacional até nossos dias.
Finalmente, a dependência total de todas as demais categorias docentes, em relação ao
catedrático, ao mesmo tempo que consagrava um espírito aristocrático na condução do ensino,
criava o mesmo tipo de relacionamento vigente entre os políticos e sua clientela, numa verdadeira
transplantação, para o âmbito universitário, das relações sócio-políticas características do
coronelismo.
2.7 - AS LUTAS IDEOLÓGICAS EM TORNO DA EDUCAÇÃO NA
PRIMEIRA FASE DO NOVO REGIME
2.7.1 - As lutas ideológicas e o “Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova
45
A Constituição de 1891, ainda em vigor até 1934, pelo seu artigo 72, parágrafo 6,
declarava: “Será leigo o ensino ministrado nos estabelecimentos públicos”.
Já a Constituição de 1934, pelo se artigo 153, declarava: “O ensino religiosa será de
freqüência facultativa, e ministrado de acordo com os princípios da confissão religiosa do aluno
manifestada pelos pais ou responsáveis e constituirá matéria dos horários nas escolas públicas
primárias, secundárias, profissionais e normais”.
Modificando um pouco o teor da prescrição, a Constituição 1937 determinava, pelo seu
artigo 183: “O ensino religioso poderá ser contemplado com matéria de curso ordinário das
escolas primárias, normais e secundárias. Não poderá, porém, constituir objeto de obrigação dos
mestres ou professores, nem de freqüência compulsória por parte dos alunos”.
A questão do ensino religioso poderia ser considerada uma questão de ordem secundária
na evolução do sistema educacional brasileiro, se não fossem as polêmicas que suscitou e as lutas
ideológicas em que se envolveu. O problema evoluiu, evidentemente, e a forma como foi
encarado pela lei também evoluiu, como bem o demonstram os artigos acima citados pertencentes
a três Constituições diferentes. A proscrição do ensino religioso da 1.ª Constituição da República
e a sua instituição nas Constituições de 1934 e 1937 foram feitas à base de lutas de caráter
ideológico. Essas lutas tiveram seu ponto culminante no início da década de 1930, quando foi
retomada a questão, por causa do conteúdo das reformas educacionais que começavam a ser
implantadas em alguns Estados e por causa dos princípios abraçados pelo movimento renovador
da educação que tinham dado ênfase à necessidade da permanência da laicidade do ensino. Além
da laicidade, o movimento renovador reivindicava a institucionalização da escola pública e sua
expansão, assim como a igualdade de direitos dos dois sexos à educação. Estes três aspectos-
laicidade, obrigatoriedade do Estado de assumir a função educadora e coeducação – constituíram
o pomo da discórdia entre os educadores que, pela Associação Brasileira de Educação, acorriam
às Conferências Nacionais de Educação. Logo, dois grupos se definiram: o dos que promoviam e
lideravam as reformas e o movimento renovador, e o dos que, em sua maioria católicos,
combatiam sobretudo os três aspectos acima citados. A Igreja Católica, que até então
praticamente monopolizava, no Brasil, o ensino médio, estava, desde a proclamação da
República, agastada com a laicidade do ensino, instituída pela 1.ª Constituição Republicana.
Agora, em face do alcance do movimento renovador e em face, principalmente, das
reivindicações que este fazia em torno da necessidade de se implantar efetivamente o ensino
público, de âmbito nacional obrigatório e gratuito, ela se via ameaçada de perder aquele quase
monopólio.
46
É evidente que, na ordem social oligárquico-aristocrática, na qual a educação escolar se
constituía em privilégio das elites, carecia de sentido a ação estatal, com vistas a fazer expandir o
ensino público e gratuito. A elite pagava a sua educação e a Igreja exercia um quase monopólio
do ensino. Outra era, porém, a situação que começava configurar-se na ordem social burguesa. As
classes médias em ascensão reivindicavam o ensino médio, e as camadas populares, o ensino
primário. Daí por que o movimento renovador compreendeu que havia chegada a hora de o
Estado assumir o controle da educação e que, portanto, esta deveria ser gratuita e obrigatória,
dadas as necessidades da nova ordem econômica em implantação. Mas a ala católica entendeu
que a campanha em favor da escola pública, universal e gratuita redundaria no monopólio estatal
da Educação. Não entendeu ela que nem o Estado tinha condições materiais de implantar o
monopólio, nem tinha a intenção de fazê-lo. A campanha em torno da escola pública foi uma
campanha que, crescendo de intensidade na época, visava, antes de tudo, à concretização de um
dos princípios máximos do movimento: o do direito de todos à educação. Entendiam os
reformadores que esse direito só poderia ser garantido, na sociedade de classes em de educação
compatível com o nível do desenvolvimento então alcançado. Daí a razão pela qual o ensino, sem
se tornar monopólio do Estado, deveria ser também público e gratuito. Como ensino ministrado
pelo Estado, numa sociedade heterogênea, ele só poderia se leigo, a fim de garantir aos educandos
o respeito à sua personalidade e confissão religiosa e a fim de evitar que a escola se transformasse
em instrumento de propaganda de doutrinação religiosa. Por fim, entendiam os reformadores que
o direito de todos significava a igualdade de direito do homem e da mulher às mesmas
oportunidades educativas. Entendiam também que as diferenças que pudessem existir, quanto à
ação pedagógica, só poderiam advir das naturais diferenças psicológicas dos indivíduos, seus
interesses e aptidões. Essas diferenças, segundo as descobertas da ciência, não advinham da
diferença de sexos. Nesse sentido, porém, eram intransigentes os católicos: confundiam eles uma
questão essencialmente pedagógica com questão de ordem moral baseadas, evidentemente, em
princípios sedimentados em hábitos de educação religiosa.
Vê-se, portanto, que a luta ideológica travada não se revestia apenas de caráter religioso:
estava também mesclada de aspectos políticos e econômicos. De um dos lados estavam os
partidários das teses católicas, logo identificados pelos reformadores como partidários da escola
tradicional e, portanto, partidários também da velha ordem. O perigo representado pela escola
pública e gratuita consistia não apenas no risco de esvaziamento das escolas privadas, mas
consistia sobretudo no risco de extensão de educação escolarizada a todas as camadas, com
evidente ameaça para os privilégios até então assegurados às elites. Insurgindo-se contra as
47
reivindicações do movimento renovador, a Igreja Católica tomou o partido da velha ordem e, com
isso, da educação tradicional.
As lutas que se desenrolavam no seio das Conferências Nacionais de Educação,
promovidas pela Associação Brasileira de Educação, refletiam, assim, no setor educacional, as
lutas ideológicas que a sociedade brasileira enfrentava e teria de enfrentar, no início do novo
regime.
Se, porém, ao movimento renovador não faltava consistência, já que ele conseguira, de
alguma sorte, implantar reformas educacionais em alguns Estados, ele se mostrava, contudo,
bastante confuso, no campo teórico. As mais diversas doutrinas sobre educação se misturavam,
sem objetividade. Quando se reuniu, em dezembro de 1931, a IV Conferência Nacional de
Educação, à qual o Governo havia solicitado a elaboração de diretrizes para uma política nacional
de educação, a polêmica em torno do ensino leigo e da escola pública se tornou tão acirrada, que
não houve clima, nem condições para atender ao pedido do Governo, com o que ficou
configurada a falta de uma definição objetiva do era e do que pretendia o movimento renovador.
Foi então que os líderes desse movimento resolveram precisar seus princípios e torná-los
públicos, através de um documento endereçado “Ao Povo e ao Governo”. Surge, pois, o
“Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova “, publicado em 1932. Ele representou o auge da luta
ideológica, porque, se de um lado definiu e precisou a ideologia dos reformadores, de outro,
acabou aprofundando os debates e a polêmica que continuou durante a V Conferência Nacional
de Educação, reunida no mesmo ano e durante os anos seguintes, segundo testemunho de
Fernando Azevedo, sobretudo por ocasião da elaboração dos projetos das Constituições de 1934 e
1937. Esses debates se fizeram públicos através de jornais e publicações várias. Só entraram em
declínio após a implantação do Estado Novo.
As constituições de 34 e 37, adotando o ensino religioso, facultativo, fizeram concessão
aos católicos. Mas tentaram a conciliação das partes disputantes, atendendo também a algumas
reivindicações do movimento renovador. Adiante, voltaremos ao assunto. Contentemo-nos, por
enquanto, com o saber que a inclusão do ensino religioso em caráter facultativo, nas duas
Constituições, é o resultado prático dessa luta. Fazendo-o incluir nas duas constituições, quais o
Governo adotar nesse primeiro período, como já dissemos, uma política de conciliação e
compromisso.
2.8 - O Conteúdo do “Manifesto”
2.8.1 - Educação e desenvolvimento
48
O “Manifesto”, elaborado por Fernando Azevedo e assinado por 26 educadores
brasileiros, líderes do movimento de “renovação educacional”, inicia-se estabelecendo a relação
dialética que deve existir entre educação e desenvolvimento, colocando aquela, porém, numa
situação de primazia no que respeita aos problemas nacionais. “Pois, como diz o documento, se a
evolução orgânica do sistema cultural de um país depende de suas condições econômicas, é
impossível desenvolver as forças econômicas ou de produção, sem o preparo intensivo das forças
culturais e o desenvolvimento das aptidões à invenção e à iniciativa que são os fatores
fundamentais do acréscimo de riqueza de uma sociedade”. Situa, portanto, a educação no
processo de desenvolvimento, ao mesmo tempo que define dialeticamente a relação entre aquela e
este.
O Manifesto representa, efetivamente, a ideologia dos renovadores. É a afirmação de
uma tomada de consciência e um compromisso. Mas, justamente por refletir as incoerências do
período, o Manifesto exibe também suas inconsistências. Assim, por exemplo, enquanto apresenta
uma concepção avançada da educação e suas relações com o desenvolvimento, denunciando uma
visão globalizante deste último, permanece, todavia, no terreno do romantismo, quando cogita das
causas dos problemas educacionais. Ao colocar estes como decorrência da falta de uma “filosofia
de vida” por parte dos educadores, o Manifesto demonstra que a compreensão da realidade
educacional, por parte dos pioneiros, estava ainda muito próxima da concepção liberal e idealista
dos educadores românticos do século XIX. É certo que o documento encarece também a
necessidade da aplicação dos métodos científicos aos problemas educacionais. Mas prefere
abordar o assunto de maneira que preconize preferentemente a ação isolada do educador, o que
denuncia também certa incoerência com o próprio conceito de educação e desenvolvimento
contido na introdução, conceito que faz prever a necessidade de uma ação objetiva, científica, mas
conjunta de toda uma estrutura do sistema educacional em conexão com a estrutura do
desenvolvimento econômico. Essa incoerência é tanto maior quanto reconhece o Manifesto a
necessidade de se “transferir do terreno administrativo para o dos planos políticos-sociais a
solução dos problemas escolares”, numa avançada concepção, para a época, do nível em que
devem ser tratados esses problemas.
O documento tem por objetivo imprimir uma direção mais firme ao movimento
renovador e defini-lo mais objetivamente. Opondo-se ao empirismo das reformas parciais, o
Manifesto surge como uma convicção abertamente definida da necessidade de se construir e
aplicar um programa de reconstrução educacional de âmbito nacional. Nesse sentido, ele não se
opõe, mas ao contrário, parece apoiar as reformas que Francisco Campos estava implantando no
49
país. Segundo o autor do documento. “O nosso programa concretiza uma nova política
educacional, que nos preparará, com o ritmo acelerado dos organismos novos, o músculo central
estrutura política e social da nação”.
Percebe-se, portanto, boa dosagem de otimismo e confiança nos poderes da educação,
fatores que constituíam a tônica mesma de todo o movimento renovador, mas percebe-se também
a consciência da precariedade das reformas parciais e improvisadas e da importância e
necessidade de se adotar um programa nacional de reorganização da educação.
50
2.9 - Os fundamentos do movimento renovador
O Manifesto afirma que a finalidade da educação se define de acordo com a filosofia de
cada época. Assim, a nova educação tem de ser “uma reação categórica, intencional e sistemática
contra a velha estrutura do serviço educacional, artificial, e verbalista, montada para uma
concepção vencida”. E tinha de ser essa a noção, porque a situação vigente era de conflito entre o
novo e o velho, entre o novo regime político e as velhas oligarquias, entre o capitalismo industrial
e o predomínio da economia agrícola. A sociedade estava mudando. Urgia que a educação escolar
refletisse essas mudanças. Cada época se caracteriza por sua concepção própria de vida, por um
ideal próprio, que exerce, através da ação pedagógica, uma pressão constante sobre o educando.
Segundo o autor do Manifesto, “o exame, num longo olhar para o passado, da evolução da
educação através das diferentes civilizações, nos ensina que o conteúdo real variou sempre de
acordo com a estrutura e as tendências sociais da época, extraindo a sua vitalidade, como a sua
força inspiradora, da própria natureza da realidade social’.
O momento histórico pedia, pois, que a educação se convertesse, de uma vez por todas,
num direito, porque, na verdade, ela é um direito biológico do ser humano e, como tal, deve
concretizar-se e, para tanto, deve estar acima de interesses de classe. Enfim, ela deve vincular-se
efetivamente ao meio social, saindo a escola se seu secular isolamento.
O Manifesto apresenta a novidade de deslumbrar a educação como um problema social.
Mas não se detém aí. Para ele, o método científico, aplicado ao estudo dos problemas
educacionais, acabou gerando uma nova concepção de educação , segundo a qual é o educando,
com o seu interesse, suas aptidões e tendências, quem deve ser o centro da ação pedagógica.
Preconiza, portanto, a mudança de métodos educacionais fundamentando seu parecer sobre as
descobertas da psicologia. Foi analisando a educação, do ponto de vista filosófico, sociológico e
psicológico, que o Manifesto fundamentou as reivindicações de mudança, que suscitou em prol da
educação escolar brasileira.
2.9.1 - Reivindicações contidas no “Manifesto”
Começa ele por solicitar uma ação mais objetiva da parte do Estado. Para tanto, a
primeira grande reivindicação do Manifesto é feita em prol da escola pública. Segundo ele, “do
direito da cada indivíduo à sua educação integral decorre logicamente para o Estado, que o
reconhece e proclama, o dever de considerar a educação, na verdade de seus graus e
manifestações, como uma função social e eminentemente pública, que ele é chamado a
51
desempenhar com a cooperação de todas as instituições sociais”. Sendo, portanto, função do
Estado, cabe-lhe, a este, proporcioná-la, de tal forma que nenhuma classe social seja excluída do
direito de beneficiar-se dela e ainda de tal forma que ela não constitua privilégio de uns em
detrimento de outros, devendo ser ministrada de forma geral, comum e igual.
Prossegue o Manifesto afirmando, num apelo que é também uma tomada de posição
ideológica, o seguinte:
“Em nosso regime político, o Estado não poderá, de certo, impedir que, graças à
organização de escolas privadas de tipos diferentes, as classes mais privilegiadas assegurem a
seus filhos uma educação de classe determinada; mas está no dever indeclinável de não admitir,
dentro do sistema escolar do Estado, quaisquer classes ou escolas, a que só tenha acesso uma
minoria, por um privilégio exclusivamente econômico. Afastada a idéia de monopólio da
educação pelo Estado, num país em que o Estado, pela sua situação financeira, não está ainda em
condições de assumir a sua responsabilidade exclusiva, e em que, portanto, se torna necessário
estimular, sob sua vigilância, as instituições privadas idôneas, a “escola única” se entenderá, entre
nós, não como uma conscrição precoce arrolando, da escola infantil à universidade, todos os
brasileiros e submetendo-se durante o maior tempo possível a uma formação idêntica, para
ramificações posteriores em vista de destinos diversos, mas antes como a escola oficial, única, em
que todas as crianças, de 7 a 15 anos, todas ao menos que, nessa idade, sejam confiadas pelos pais
à escola pública, tenham uma educação comum, igual para todos”.
Vê-se, pois, que se trata de uma tomada de posição ideológica em face do problema
educacional. Reivindicando uma ação firme e objetiva do Estado, no sentido de assegurar escola
para todos, contestando a educação como privilégio de classe, sem, contudo, recusar a
contribuição da iniciativa particular, de cujo controle não deve o Estado abrir mão, o Manifesto
toca profundamente no aspecto político da educação. E ao abordá-lo, toma partido em favor da
uma ação vigorosa do estado, no sentido de que este, se não elimina, pelo menos não deixe
aumentar as distâncias já então existentes entre as classes sociais, no que respeita às
oportunidades educacionais.
O Manifesto sugere em que deva consistir a ação do Estado, reivindicando a laicidade do
ensino público, a gratuidade, a obrigatoriedade e a co-educação. Reconhecendo pertencer ao
cidadão o direito vital à educação, e ao Estado o dever de assegurá-la de forma que ela seja igual
e, portanto, única, para todos quantos procurem a escola pública, é evidente que esse direito só
possa ser assegurado a todas as camadas sociais, se a escola for gratuita. Por outro lado, a
necessidade de colocar “o ambiente escolar acima das seitas, disputas religiosas, de dogmatismo”
52
e de excluir do mesmo “qualquer influência perturbadora à personalidade do educando”, impõe-se
que seja leigo o ensino, na escola pública. Os reclamos do desenvolvimento fazem que a educação
se torne, cada vez mais uma necessidade social e econômica, além, de ser, como já o dissemos,
um direito humano. Decorre daí o imperativo de torná-la compulsória para todos os membros da
sociedade. Sua obrigatoriedade constitui também uma forma de extinguir os privilégios de classe,
relativamente à educação. E, finalmente, decorrente do direito de todos à educação pedagógica
obedecer as diferenças psicológicas de ordem geral e não às de ordem sexual. A co-educação põe
em pé de igualdade, quanto à qualidade da educação, os educandos de ambos os sexos.
Por fim, o Manifesto completa o elenco de suas reivindicações solicitando autonomia
para a função educativa e descentralização do ensino. Quanto à primeira, esclarece ele que a
unidade de função educativa decorre da necessidade de se fazer desenvolver no indivíduo, e ao
máximo, suas “capacidades vitais”. Para tanto, a ação educativa deve ser exercida através da uma
estrutura única, não fragmentária. A organização do sistema escolar deve visar obter essa ação
unificadora. A esse respeito, escreve o autor do Manifesto: “A seleção dos alunos nas suas
aptidões naturais, a supressão de instituições criadas sobre base econômica, a incorporação dos
estudos do magistério à universidade, a equiparação de mestres e professores em remuneração e a
reação contra tudo que lhes quebra a coerência interna e a unidade vital, constituem o programa
de uma política educacional, fundada sobre a aplicação do princípio unificador, que modifica
profundamente a estrutura ;intima e a organização dos elementos constitutivos do ensino e dos
sistemas escolares”.
Mas essa unidade de organização e unidade de ação, não as pode obter o sistema
educacional se, em seu funcionamento, ele sofrer a “ação de poderes estranhos, capazes de impor
à educação fins inteiramente contrários aos fins gerais que assinala a natureza em suas funções
biológicas”. Daí decorre, portanto, a necessidade de se garantir a autonomia da função educativa.
“Toda a impotência manifesta do sistema escolar atual e a insuficiência das soluções dadas às
questões de caráter educativo não provam senão o desastre irreparável que resulta, para a
educação pública, de influências e intervenções estranhas que conseguiram sujeitá-la a seus ideais
secundários e interesses subalternos”.
Mas o Manifesto choca-se com o espírito da Revolução de 1930, sobretudo com a
Reforma Francisco Campos, a esse tempo já promulgada, quando prega a descentralização. Nele
se adverte que unidade não significa uniformidade, mas pressupõe multiplicidade. Define o papel
que devem desempenhar a União e os Estados, quando diz: “A União, na capital, e aos Estados,
nos seus respectivos territórios, é que deve competir a educação em todos os graus, dentro dos
53
princípios gerais fixados na nova constituição, que deve conter, com a definição de atribuições e
deveres, o e fundamentos da educação nacional. Ao Governo Central, pelo Ministério da
Educação, caberá vigiar sobre a obediência a esses princípios, fazendo executar as orientações e
os rumos gerais da educação.
2.9.2 - Plano de reconstrução educacional
Criticando o sistema educacional então vigente, de estrutura dual, já que se dividia em
dois subsistema – o ensino primário e profissional, para os pobres, e o ensino secundário e
superior, para os ricos – o Manifesto acaba propondo à substituição desse sistema por outro, de
estrutura unificada, que pode assim resumir-se em suas linhas gerais:
1. Na base do sistema, as escolas pré-primárias e o ensino primário, único.
a) uma base comum, de 3 anos (fundamental);
b) um ensino diversificado, dividido em:
- seção predominantemente intelectual – onde se estudariam as humanidades, ciências
químicas e biológicas;
- seção preferentemente manual, subdividida em:
- extração de matéria-primas: escolas agrícolas; escolas de mineração; escolas de pesca.
- elaboração de matérias-primas: escolas industriais e profissionais.
- Distribuição de produtos elaborados: escolas de transportes; escolas de comunicações;
escolas de comércio.
2) O ensino superior deveria ser mais diversificado, organizando-se, segundo o sistema
universitário, em cursos para as carreiras liberais e para as profissões técnicas.
Enfim, o Manifesto assinala que, como a escola secundário tradicional formava o reduto
dos interesses de classe, que criaram o dualismo educacional, era nela que estava o “ponto
nevrálgico da questão”. De fato, até nossos dias, o ensino médio continuou a pecar por falta de
organização unitária capaz de oferecer condições para a democratização do ensino. Como se vê,
também essa reivindicação dos pioneiros, no que respeita à escola média, estava muito à frente da
época, já que a própria reforma Francisco Campos, que, em muitos sentidos, foi um avanço,
acabou solidificando e aprofundando o dualismo, por não haver possibilitado qualquer
flexibilidade entre os ramos secundário e profissional.
Quanto ao problema da educação de nível superior, adverte o Manifesto que “ela deve
ser organizada de maneira que possa desempenhar a tríplice função que lhe cabe de elaboradora
ou criadora de ciência (investigação), docente ou transmissora de conhecimentos (ciência feita) e
54
de vulgarizadora ou popularizadora, pelas instituições de extensão universitária, das ciências e das
artes”. Enfim, que ela se organize segundo seus modernos objetivos, a saber: ensino pesquisa e
extensão.
Por último, assinala o Manifesto a impossibilidade de se organizar o sistema e dar-lhe
unidade de ação sem a unidade de formação de professores, os quais, de todos os graus do ensino,
devem ter formação universitária. Critica a forma como vinha sendo até então recrutado o
professorado e propõe que a reorganização do ensino superior seja feita de tal forma, que das
elites que ele prepare faça parte o professorado de todos os níveis.
2.9.3 - O significado histórico do “Manifesto”
Ao proclamar a educação como um direito individual que deve ser assegurado a todos,
sem distinção de classes e situação econômica; ao afirmar ser dever do Estado assegurá-la,
principalmente através de escola pública gratuita, obrigatória e leiga, e, finalmente, ao opor-se à
educação-privilégio, o Manifesto trata a educação como um problema social, o que é um avanço
para a época, principalmente se nos lembrarmos de que a sociologia aplicada à educação era uma
ciência nova. Na ordem filosófica e estritamente administrativa, no Brasil. Ao proclamar a
educação como um problema social, o Manifesto não só estava traçando diretrizes novas para o
estudo da educação no Brasil, mas também estava representando uma tomada de consciência, por
parte dos educadores, até então praticamente inexistente.
Essa tomada de consciência vinha-se processando graças à influência que, desde a
segunda década do século, certos educadores vinham recebendo das correntes americanas e
européias ligadas ao chamado movimento das Escolas Novas. Prova disso é a incontestável
presença, no Manifesto, na parte referente aos fundamentos da Educação Nova, do pensamento de
Dewey acerca do papel do interesse no processo educativo.
Por outro lado, a reivindicação de escola pública, gratuita, obrigatória e leiga é
conseqüência da nova situação criada com a ascensão de novas classes sociais e a
complexificação crescente de todo organismo social. A educação pública , gratuita, obrigatória e
leiga é uma conquista do Estado burguês, e surgiu na Europa com a ascensão da burguesia s o
desenvolvimento da vida urbana. Historicamente, pois, é uma conquista resultante da decadência
da antiga ordem aristocrática e, como tal, representa, no Brasil, uma reivindicação ligada à nova
ordem social e econômica, que começa a se definir mais precisamente após 1930.
Além disso, a campanha encetada pelo Manifesto em favor da autonomia da função
educativa confirma também o que acabamos de asseverar, principalmente se nos lembrarmos de
55
que imperaram sempre, de modo geral, em todos os ramos e níveis da administração pública, na
vigência da velha ordem oligárquica, os mesmos princípios imperantes na política comandada
pelo coronelismo: o partidarismo e o nepotismo. A condição “sine qua non”de sobrevivência do
novo regime estava na liquidação desse processo. A organização e funcionamento do sistema
educacional estava na mesma dependência.
Quanto ao plano de “reconstrução educacional” elaborado pelo documento é
evidentemente impertinente uma apreciação à luz dos valores e necessidades do contexto atual.
Mas uma apreciação de seu significado histórico é oportuna e viável.
O próprio documento é enfático, ao assinalar que não se trata de um plano, mas de suas
linhas gerais. Tomando-o neste sentido, pode-se afirmar que é um plano avançado para a época e
a realidade educacional brasileira de então, e isso porque propõe algumas providências realmente
importantes, tais como a unificação do sistema e sua reestruturação de forma que organize a
educação profissional de níveis médio e superior e, ainda, a formação universitária para os
professores de todos os níveis.
Representa, portanto, a reivindicação de mudanças totais e profundas na estrutura do
ensino brasileiro, em consonância com as novas necessidades do desenvolvimento da época.
Representa ao mesmo tempo, a tomada de consciência, por parte de um grupo de educadores, da
necessidade de se adequar a educação ao tipo de sociedade a à forma assumida pelo
desenvolvimento brasileiro da época. É a tomada de consciência da defasagem já existente entre
educação e desenvolvimento e o comprometimento do grupo numa luta pela redução dessa
defasagem.
É evidente que o documento não questionava a nova ordem que se estava implantado.
Nesse sentido, o grande avanço que representa o documento para a teoria da educação no Brasil e
que ele propõe, em última instância, adequar o sistema educacional a essa nova ordem, sem
todavia questioná-la. Com isso manifestava o documento seu pleno acordo como novo regime e a
nova situação. Refletia ele, pois, o pensamento pedagógico dos representantes dessa nova situação
que tiveram a lucidez de equacionar o problema das relações entre a escola e a nova ordem social,
política e econômica.
Por fim, voltando ao problema proposto no início desta parte de nosso trabalho, ocorre-
nos perguntar – já que afirmamos que o movimento renovador teve consciência da defasagem
existente entre a escola e a nova ordem social, sem todavia questioná-la, antes aceitando-a: - Que
funções teve esse movimento junto às estruturas de poder, as quais, segundo afirmamos,
56
exerceram, através da legislação do ensino, um controle efetivo sobre a expansão dos ensinos e
dos rumos que tomou?
Naturalmente, desde que aceitamos que a sociedade brasileira, após 1930, iniciou a
liquidação da velha ordem oligárquica, sem no entanto eliminá-la totalmente; desde que
concordemos com que o poder passou a ser estruturado e as lideranças manipuladas de forma que
acomodavam velhas e novas posições; enfim, desde que admitamos que o regime se estabeleceu à
base do compromisso tácito entre o novo e o velho, é incontestável que, na estrutura então vigente
do sistema educacional, o movimento renovador representava a nova ordem de coisas e a posição
ao tradicional. Constituía ele, na verdade, no terreno da educação escolarizada, a vanguarda,
aquilo que na política era representado pela ala jovem dos tenentes e da classe média. Estava a
favor da ordem que então se implantava e não a questionava. Mas estava também consciente da
defasagem existente entre a nova situação econômica e social e a escola tradicional. A sua luta era
contra a escola tradicional, não contra o Estado burguês. Representava o pensamento das
lideranças jovens na composição das estruturas de poder da época, estruturas que, como já
afirmamos, contavam também com velhas lideranças.
A evolução do sistema educacional brasileiro vai refletir as tentativas a acomodação e
compromisso entre a ala jovem e a ala velha das classes dominantes, a partir de então. O
“Manifesto” representa o pensamento da primeira. As Constituições e a legislação do ensino
representam, daí para cá, uma tentativa constante de acomodação dessas duas alas. Mas a prática
educacional continuou a representar o predomínio das velhas concepções.
57
2.9.4 - As vitórias e as derrotas do movimento renovador
As lutas ideológicas encetadas, no período, entre o movimento renovador e “os
representantes da escola tradicional”, como quer Fernando Azevedo, tiveram conseqüências
práticas na elaboração do texto das Constituições de 1934 e 1937. Em ambas sente-se muito bem
o espírito de acomodação que presidiu à elaboração do texto.
A Constituição de 1934, em seu Capítulo II – Da Educação e da Cultura- representa, em
sua quase totalidade, uma vitória do movimento renovador, salvo no seu artigo 153, que, como já
assinalamos, instituiu o ensino religioso facultativo, favorecendo os interesses verbalizados pelos
representantes da Igreja Católica. Excetuado isso, quase todo o texto constitucional, no capítulo
referente à educação, (1ª linha da página 152 está ilegível) Manifesto. Assim o e, por exemplo, o
artigo 148, que afirma ser a educação direito de todos e dever dos poderes públicos proporcioná-
la, concomitantemente com a família.
Pertence também ao “Manifesto” o conteúdo de vários artigos da Constituição: o de n.º
150, referente à fixação do Plano Nacional de Educação, à ação supletiva da União, o ensino
primário integral, à gratuidade do ensino, etc., o de n.º 151 , que representa a vitória da luta pela
descentralização do ensino, como se vê de seu texto: “Compete aos Estados e ao Distrito Federal
organizar e manter sistemas educativos nos territórios respectivos, respeitadas as diretrizes
estabelecidas pela União”; e os de n.º 156 e 157, que são uma tentativa de organização dos
recursos fixados para a educação, também reivindicados pelo “Manifesto”, na parte relativa ao
problema da autonomia da função educativa.
Vê-se, destarte, que a luta não foi tão inglória. Apenas foi de pouca duração essa vitória,
já que, três anos após, era promulgada outra Constituição, com o golpe de Estado que instalou o
Estado Novo. Esta última Constituição não teve a amplitude da outra, quanto à educação, antes
tratou-a muito restritamente. Continuou, todavia, declarando a necessidade de a União “fixar as
bases e determinar os quadros da educação nacional, traçando as diretrizes” dessa educação (art.
15, n.º IX), e mantendo a gratuidade e obrigatoriedade do ensino (art. 130). Foi mais enfática na
questão do ensino profissional, embora se referisse a ele como “um ensino destinado às classes
menos favorecidas”, o que denunciava bem a ideologia do Governo, em sua política educacional,
favorável a um sistema educacional de discriminação social.
Mas a Constituição de 1937 estava longe de dar a ênfase que dera a de 1934 ao dever do
Estado como educador. No seu artigo 128, que inicia com a seção “Da educação e da Cultura”,
preferiu antes a fórmula suave de tratar o problema, proclamando a liberdade da iniciativa
58
individual e de associações ou pessoas coletivas públicas e particulares”, quando ao que
respeitava o ensino. Na Constituição de 1934, ao contrário, o Governo começa determinando o
dever da União, Estados e Municípios de favorecer as ciências, artes e cultura e, além do direito à
educação, o dever do Estado de assegurá-la.
A Constituição de 1937 é, no entanto, mais moderada, ao tratar do ensino religioso,
afirmando no artigo 133, que ele “poderá ser contemplado como matéria de curso ordinário das
escolas”... “não poderá, porém, constituir objeto de obrigação dos mestres ou professores, nem de
freqüência compulsória par parte dos alunos”.
Como se vê, o Movimento Renovador teve suas vitórias e suas derrotas, voltaremos a
ocupar-nos delas, quando tratarmos da Constituição de 1946 e das demais reformas do ensino. Por
enquanto, bastam-nos essas referências sobre o primeiro período da Revolução de 30, que se
encerra em 1937.
Antes de finalizar este capítulo, postaríamos de ressaltar dois pormenores das duas
Constituições, aqui assinaladas, nos quais se reporta ao problema que vimos estudando. São eles
referidos, na Constituição de 34, no seu art. 150, parágrafo único, letra “c” e na Constituição de
1937, artigo 129.
O primeiro está assim enunciado:
Art. 150.......
“Parágrafo único. O plano nacional de educação (..........) obedecerá às seguintes normas:
por meio de provas de inteligência e aproveitamento, ou por processos objetivos apropriados à
finalidade do curso”.
Como em todo o texto não há referência ao estudo e levantamento das necessidades
educacionais do país, nem ao estudo de captação e aplicação de recursos de acordo com essas
necessidades, pode-se facilmente concluir quanto ao alcance social que têm a prescrição legal da
limitação da matrícula à capacidade dos estabelecimentos e a oficialização da seleção para
ingresso. A Constituição não se refere a um plano de expansão das escolas, mas sim a plano de
limitação de matrículas, prova de que, por parte do Governo, se cuidou de conter a expansão do
ensino em limites estreitos.
O segundo aspecto de que falamos está na Constituição de 1937, artigo 129,assim
redigido:
“O ensino pré-vocacional e profissional destinado às classes menos favorecidas, ( grifo
nosso) é em matéria de educação o primeiro dever do Estado. Cumpre-lhe dar execução a esse
59
dever, fundando institutos de ensino profissional e subsidiando os de iniciativa dos Estados, dos
Municípios e dos indivíduos ou associações particulares e profissionais”.
Fernando Azevedo elogiou largamente a preocupação que a Constituição de 1937 tivera
para com o ensino profissional, declarando ser ela amais democrática, das Constituições em
matéria de ensino. Não atentou, porém, o mestre para esse pormenor, de suma importância para
compreensão da evolução do sistema do ensino no Brasil, sobretudo do ensino profissional. Não
observou, por exemplo, que, oficializando o ensino profissional, como ensino destinado aos
pobres, estava o Estado cometendo um ato lesivos aos princípios democráticos: estava o Estado
instituindo oficialmente a discriminação social, através da escola. E fazendo isso, estava orientado
e escolha da demanda social de educação. Com efeito, assim orientada para um tipo de educação
capaz de assegurar acréscimo de prestígio social, a demanda voltaria naturalmente as costas às
escolas que o Estado mesmo proclamava como sendo as escolas dos pobres. Aí está, para a nossa
tese, a prova de que, do lado da oferta, ou seja, do lado do Estado, existiu uma grande
responsabilidade na orientação da escolha do tipo de educação feita pela demanda.
60
2.9.5 - A POLÍTICA EDUCACIONAL DOS ÚLTIMOS ANOS
2.9.5.1 - A EDUCAÇÃO BRASILEIRA APÓS 1964: SÍNTESE DOS FATOS
As rupturas da sociedade brasileira com a velha ordem oligárquica foram analisadas por
Octavio Ianni em seu livro O Colapso do Populismo no Brasil. Objetivando apresentar os passos
dados pelo populismo, desde o seu nascimento com Vargas, até sua extinção, com a queda de
Goulart, aquele autor mostrou que o que comumente se chamada Revolução Brasileira se
constitui de uma série de conflitos iniciados na década de 1920 e que tiveram, na Revolução de
30, um ponto alto. Esses conflitos denunciavam rupturas no sistema oligárquico-rural e
prenunciavam a implantação gradual da origem social burguesa e da ordem econômica industrial
capitalista.
Durante o período que vai de 30 a 64, as relações política e economia caracterizaram-se
por um equilíbrio mais ou menos estável entre o modelo político getuliano, de tendências
populistas, e o modelo de expansão da indústria. Dentro deste último, o Estado teve papel
importante, como já assinalamos, na direção dessa expansão e na implantação de condições
mínimas de infra-estrutura e indústria básica. É por esse motivo que o empresariado não só se
apoiou no poder público, como também o apoiou, inclusive apoiou ou tolerou o nacionalismo,
como ideologia do Governo, em determinadas épocas. Então o modelo político tinha sua
contrapartida no modelo econômico e o equilíbrio se manteve, embora, às vezes, de forma
precária, enquanto durou o apoio da classe empresarial e das Forças Armadas à política de
compromissos de Vargas. A penetração mais intensa do capital internacional foi fator de
rompimento daquele equilíbrio e Vargas perdeu o apoio do empresariado e das Forças Armadas.
Daí para frente a internacionalização da economia brasileira já não podia mais coincidir com a
política de massas e com os apelos do nacionalismo. O Governo Kubitschek aprofundou bastante
a distância entre o modelo político e a expansão econômica, já que continuara adotando a política
de massa, mas acelerara a expansão industrial, abrindo mais as portas da economia nacional ao
capital estrangeiro. As contradições chegam a um impasse com a radicalização das posições de
direta e esquerda. Os rumos do desenvolvimento precisavam então ser definidos, ou em termos de
uma revolução social e econômica pró-esquerda, ou em termos de uma orientação dos rumos da
política e da economia de forma que eliminasse os obstáculos que se interpunham à sua inserção
definitiva na esfera de controle do capital internacional. Foi esta última a opção feita e levada a
cabo pelas lideranças do movimento de 1964.
61
Celso Furtado analisa bem a evolução do modelo brasileiro de então. Distingue ele
duas fases:
a) uma que se inicia em 64 e se define como um período de “recuperação econômica” no
qual o Governo se ocupa da captação de recursos e recuperação do nível de investimento público;
b) outra que se define como uma fase de retomada da expansão (67 / 68 em diante) com
acentuado desenvolvimento do setor industrial.
O modelo é concentrador da renda já que segue o caminho das sociedades periféricas que
se industrializam a partir de um processo de modernização introduzido pela modificação nos padrões
do consumo de uma camada restrita da população. Esse processo condiciona a industrialização que se
faz intensiva de capital em meio a um excedente de mão-de-obra.
Não cabe aqui toda a análise feita pelo autor. Deve-se apenas lembrar que a expansão
nesses moldes implica o estabelecimento de uma estratégica que pressupõe prioridades que
favorecem determinadas camadas sociais, por serem estas as mais “capazes” de ajudar a alimentar o
processo, dadas as suas possibilidades de consumo. Essa estratégia que adota, entre outras medidas, o
arrocho salarial das classes trabalhadoras e o aumento do poder aquisitivo das camadas altas e médias
altas, impõe uma redefinição das funções do Estado. Nessa redefinição fica evidente a necessidade de
se alijar a própria população da esfera das decisões. A criação e preservação de condições políticas e
sociais para que a economia se expanda no sentido desejado definem essas novas funções do Estado
que então se expressam, politicamente, em termos de:
a) reforço de executivo e conseqüente remanejamento das forças na estrutura do poder;
b) aumento do controle feito pelo Conselho de Segurança Nacional;
c) centralização e modernização da administração pública;
d) cessação do protesto social.
É nesse sentido que nos parece válida a interpretação de Cardoso e Faletto quando
analisam a fase de transição das sociedades latino-americanas de fortalecimento do mercado interno
para a da diferenciação da economia capitalista. A primeira fase pode ser sustentada, segundo eles,
pelas “relações estáveis entre nacionalismo e populismo”, enquanto a segunda – “baseada na
formação de bens de capital e no fortalecimento dos grupos empresariais – está marcada pela crise do
populismo e da organização política representativa dos grupos dominantes”.
Se levarmos em conta a insuficiência da interpretação que limita o problema do
desenvolvimento nas sociedades chamadas periféricas a uma “determinação mecânica e imediata do
interno pelo externo”, impõem-se a necessidade de se compreender que esse mesmo desenvolvimento
é fator de uma complexa estrutura que nem privilegia em demasia o econômico, nem, ao mesmo
62
tempo, se resume numa simples trama de mecanismos que coloca o setor interno inteiramente à
mercê do externo.
A teoria da dependência que os autores defendem assinala que “há uma série de fatos e
situações que aparecem conjuntamente e em um momento dado” e que podem ser interpretados a
partir da compreensão das conexões entre os fatores internos e externos. Mas estas conexões se
expressam como um modo particular de relações sociais no âmbito interno. Logo, é neste último e em
sua manifestação que deve ser centralizada a análise da dependência.
Assim sendo, compreende-se melhor por que as mudanças ocorridas no setor interno,
quer no que concerne à economia, quer no que concerne à ordem política, assumiram vital
importância no processo da reorientação dos rumos tomados pelo desenvolvimento desde 1964. Eles
não foram ditados apenas e “mecanicamente” de fora para dentro. Foram também o fruto da atuação
de grupos sociais conflitantes. As relações de dominações que se vão definido nessa fase de
superação do modelo getuliano populista e nacionalista e de fortalecimento do empresariado
industrial tiveram, como contrapartida, mudanças na estrutura política e econômica.
O antigo esquema de dominação entra em crise em função de novos interesses
fortalecidos e do acirramento de seu confronto. É nesse sentido e com base nas lições da própria
história, que nos parece válida a colocação segundo a qual “a política continua sendo o meio pelo
qual se possibilita a determinação econômica”.
Esse processo implica uma redefinição das funções do Estado. Essa reorientação, por
sua vez, tem sido função de “uma redefinição da vinculação centro-periferia”, no atual estágio de
expansão do capitalismo internacional. A nova vinculação pressupõe, ao mesmo tempo, melhor
integração dos países periféricos no mercado mundial e um reforço de sua situação na periferia desse
mercado.
É nesse sentido que se coloca a modernização como expressão, tanto de integração
centro-periferia, quanto de dominação em âmbito interno e externo. Internamente, ela aciona
mecanismos mais eficientes de controle, quer no setor da administração privada, enquanto
compartimentaliza a produção e o trabalho em qualquer âmbito, eliminando ou diminuindo os perigos
da integração social dos trabalhadores e a visão crítica do conjunto do sistema produtivo.
Externamente, a modernização não apenas assegura a expansão de mercados, mas também aumenta
as distâncias entre os centros criadores de ciência e tecnologia e os países seus consumidores. Se no
âmbito da produção científica dos próprios países centrais já se consubstanciou há muito a perda, por
parte dos criadores ou produtores de ciência, do controle dos produtos de seu trabalho, nas relações
entre países centrais e países periféricos, o controle da produção científica por aqueles assinala uma
63
necessidade de expansão do mercado consumidor dos produtos por eles criados. Isso só pode ser feito
mediante a modernização, que em princípio, se observa nos hábitos de consumo das populações dos
países periféricos para depois se consubstanciar na instalação de indústrias no próprio centro desse
mercado consumidor. Vista sob este prisma, a modernização impede um desenvolvimento autônomo
e transforma-se em mecanismo de deminação ou de controle do setor interno pelo externo.
A redefinição do jogo político, determinado em parte pelo fortalecimento do
empresariado, teve apoio na própria modernização e na evolução dos interesse e fortalecimento das
forças armadas. Esses foram os setores internos da estrutura social que conseguiram impor-se ao
restante da sociedade. E o “modelo econômico” adotado nada mais significou do que o reforço de um
modelo que já se vinha desenvolvendo à base da modernização dos hábitos de consumo das classes
altas e médias altas e que precisava, portanto, centralizar mais os investimentos em setores que nem
sempre eram básicos para o conjunto da população. Mas isso não pode, evidentemente, ser levado a
cabo dentro de um processo político democrático: pressupõe, antes, a centralização e, ao mesmo
tempo, o alijamento, da esfera das decisões, de amplos setores da sociedade. Daí as razões dos itens
a), b), c) e d) acima citados.
Se o significado da educação como fator de desenvolvimento foi percebido desde o
início da implantação do nosso regime, isso não foi demonstrado, pelo menos em toda a sua
plenitude, senão a começar de 1968. Como esse ano assinala também o início de mudanças mais
profundas na vida da sociedade e da economia – já que foi a época em que a expansão foi retomada
de forma mais acelerada – pode-se perceber que o sistema educacional foi marcado por dois
momentos nitidamente definidos em sua evolução, a partir de 1964.
O primeiro corresponde àquele em que se implantou o regime e se traçou a política da
recuperação econômica. Ao lado da contenção e da repressão, que bem caracterizaram essa fase,
constatou-se uma aceleração do ritmo do crescimento da demanda social de educação, o que
provocou, conseqüentemente, um agravamento da crise do sistema educacional, crise que já vinha de
longe.
Esta, na verdade, acabou por servir de justificativa para a assinatura de uma série de
convênios entre o MEC e seus órgãos e a Agency for International Development (AID) – para
assistência técnica e cooperação financeira desse Agência à organização do sistema educacional
brasileiro. Este é, então, o período dos chamados “Acordos MEC-USAID”.
O segundo momento começou com as medidas práticas, a curto prazo, tomadas pelo
Governo, para enfrentar a crise, momento que se consubstanciou, depois no delineamento de uma
política de educação que já não via apenas na urgência de se resolverem problemas imediatos, ditados
64
pela crise, o motivo único para reformar o sistema educacional. Mais do que isso, o regime percebeu,
daí para a frente, entre outros motivos, por influência da assistência técnica dada pela USAID, a
necessidade de se adotarem, em definitivo, as medidas para adequar o sistema educacional ao modelo
do desenvolvimento econômico que então se intensificava no Brasil.
O que se vai descrever nos próximos capítulos serão justamente os principais aspectos
que assumiu a evolução da crise, no primeiro momento, seguida das medidas práticas para contê-la, e
as reformas básicas que se sucederam, no segundo momento: Nesse sentido, procuraremos descrever
e analisar não só os principais documentos relativos ao tema, mas sobretudo, o papel assumido pela
ajuda internacional dada através da USAID e a função mediadora dos órgãos governamentais entre os
interesses externos e os internos na reorganização da educação brasileira.
Destacamos, na primeira fase, a expansão da demanda social da educação e suas bases
sociais e econômicas, a expansão do ensino, que se seguiu a ela, e a criação de mecanismos para
levantar recursos para essa expansão, como, por exemplo, a instituição do salário-educação. Como o
Governo assumiu o papel acumulador de capital para promover a expansão econômica, essa fase vai
caracterizar-se por uma expansão do ensino que, embora grande, teve de ser contida dentro de certos
limites, a fim de não comprometer a política econômica adotada. Daí por que a oferta, apesar de ter
crescido, ficou aquém da demanda. Essa defasagem teve seu ponto alto no acúmulo insustentável dos
“excedentes”, candidato ao ensino superior que, embora aprovados nos exames vestibulares, não
lograram classificação para as vagas oferecidas naquele nível.
Esse período vai se marcado também pelas primeiras medidas legais que reformaram o
ensino superior, medidas que, no entanto, não trouxeram qualquer solução prática real para o
problema dos excedentes. A partir do momento em que se configurou, de forma aguda, a crise, o
Governo se dispôs a tomar medidas que visavam à sua solução a curto e a longo prazo. Esse período
de transição caracterizou-se pela constituição de comissões para estudar os problemas relativos à crise
e propor soluções.
Foi nessa altura que foram assinados todos os convênios através dos quais o MEC
entregou a reorganização do sistema educacional brasileiro aos técnicos oferecidos pela AID. Os
convênios, conhecidos comumente pelo nome de “Acordos MEC-USAID” tiveram o efeito de situar
o problema educacional na estrutura geral de dominação, reorientada desde 1964, e de dar um sentido
objetivo e prático a essa estrutura. Lançaram, portanto, as principais bases das reformas que se
seguiram e serviram de fundamento para a principal das comissões brasileiras que completaram a
definição da política educacional: a Comissão Meira Matos.
65
Por outro lado, ao provocarem protestos de todos os lados, os Acordos MEC-USAID
tiveram também o efeito de agravar a crise educacional. A Comissão Meira Matos teve assim uma
dupla função: a) atuar como interventora nos focos de agitação estudantil e b) estudar a crise em si,
para propor medidas de reforma. Sob este aspecto, o relatório que ela apresentou nada mais fez do
que reforçar as propostas surgidas com os Acordos MEC-USAID, como se verá depois.
Além do relatório Meira Matos que tanta influência iria ter na política educacional
adotada a seguir, surgiu na época outro documento elaborado pelo Grupo de Trabalho da Reforma
Universitária que, além de relatório, apresentou o anteprojeto, depois transformado na Lei n.º 5.540.
Resultado dessas comissões de estudos foram as medidas práticas imediatamente tomadas, tais como
as relativas ao aumento da matrícula do ensino superior (Decreto-Lei 405, de 31 de dezembro de
1968, e 8 de maio de 1969) e à contenção do protesto estudantil (Decreto-Lei 477, de 11 de fevereiro
de 1969). Nesses estudos e medidas veio a delinear-se a política educacional que se implantou a partir
daí, numa fase, portanto, já nova para o sistema. Essa política se concretizou na reforma geral do
ensino, criada pelas Leis 5.540, de 28 de novembro de 1968, que fixou normas para a organização e
funcionamento do ensino superior, seguida de outros decretos que a regulamentaram, e pela Lei
5.692, de 11 de agosto de 1971, que reformou o ensino de 1.º e 2.º graus.
Caracterizou, finalmente, essa segunda fase a integração do planejamento educacional
no Plano Nacional de Desenvolvimento, tratada a área da educação como área prioritária. Isso, por si
só, é o suficiente para demonstrar as inovações por que tem passado o sistema educacional nos
últimos anos.
A vista do exposto, impõe-se não só um estudo descritivo-analítico dos principais fatos
que marcaram a evolução do sistema educacional, a iniciar de 1964, mas também, e principalmente,
uma reflexão sobre o significado das mudanças que nele ocorreram. É nesse sentido que julgamos
necessária a introdução de um capítulo sobre a ajuda internacional para a educação, seu significado
no atual contexto ( 1ª linha da página 198 ilegível) e, como decorrência disso, as formas que
assumiram essa ajuda no âmbito interno da sociedade brasileira e suas conseqüências para a
reorganização do ensino. É com base nesse pormenor que pretendemos não apenas descrever a
evolução das transformações por que passou o sistema nacional de educação, como também, partindo
da averiguação dessas transformações, indagar acerca do sentido da modernização que delas adveio.
E isso será possível sem uma referência aos Acordos MEC-USAID.
2.9.7 - A AJUDA INTERNACIONAL PARA A EDUCAÇÀO BRASILEIRA
2.9.7.1 - A ajuda internacional para a educação no atual estágio da expansão capitalista
66
Um dos aspectos que atualmente mais avultam nas redefinições dos rumos e das
estratégias de desenvolvimento das sociedades periféricas é o tipo de atuação que sobre estas vêm
exercendo as agências internacionais de ajuda e cooperação, pertençam ou não à Organização das
Nações Unidas. É possível identificar, na maioria dessas agências do mundo capitalista, não só
aspectos ideológicos mas também objetivos e formas de atuação semelhantes nos países do Terceiro
Mundo. As diferenças neste último caso decorrem muito mais do estágio de integração desses países
na esfera de influência do capitalismo, do que propriamente de diferenças de objetivos ou de
ideologias.
Em todas, é possível identificar um determinado conceito do subdesenvolvimento que o
define de forma insuficiente, parcial, na maioria dos casos partindo de pressupostos que o consideram
como uma fase anterior ao desenvolvimento, estando, portanto, os países nele imersos apenas “em
relação aos países desenvolvidos. Com base nesse pressuposto, adotamos um tipo de interpretação
que consiste em admitir como “causas” ou “fatores” do subdesenvolvimento elementos como:
a) a presença ou a predominância política de grupos sociais oligárquicos e tradicionais na
estrutura de poder;
b) a predominância do setor agrário-exportador sobre o industrial;
c) os períodos de transição de uma sociedade, tida como tradicional, para uma sociedade
moderna, como fenômeno que se dá naturalmente.
Enfim, identificam, como afirmam Cardoso e Faletto, tradicional com subdesenvolvido e
moderno com desenvolvido. E, mais ainda, ao partirem dessa base teórica, as agências internacionais
apontam, para ajuda ao desenvolvimento dos países do Terceiro Mundo, o atual estágio das
sociedades do centro do mundo capitalista como um modelo a alcançar, admitindo que o
desenvolvimento é apenas questão de tempo. Conseguem, as mais das vezes, relacionar fatores
históricos com o subdesenvolvimento, partindo, evidentemente, do pressuposto de que a mera
seqüência cronológica dos fatos, que marcaram a evolução das atuais sociedades subdesenvolvidas,
fornece as bases científicas para as interpretações do subdesenvolvimento.
Não se pode negar que o subdesenvolvimento compreende, em parte, todos estes
aspectos. É possível identificar fatores históricos que geraram situações favoráveis a ele, como é
inegável que o atraso científico, tecnológico e, em certos aspectos, cultural é também um indicador
do subdesenvolvimento.
O que torna insuficiente essa teoria do subdesenvolvimento é o apego a aspectos
particulares para interpretar a totalidade do subdesenvolvimento. Na verdade, teorias desse tipo não
oferecem apenas uma interpretação parcial: elas oferecem também, consciente ou inconscientemente,
67
uma explicação distorcida ou até tendenciosa, porque partem de pressupostos reconhecidamente
inconsistentes para propor estratégias de ação que levem a considerar a modificação nos hábitos de
consumo, de ação e de pensamento das populações dos países “em atraso” como a única forma viável
de colocá-los em consonância com o atual estágio de desenvolvimento dos países “mais avançados”.
Segundo essa estratégia que na verdade compartimenta a realidade dos países
subdesenvolvidos, o problema do subdesenvolvimento deve ser tratado, predominantemente, como
um problema técnico. Daí a superioridade do planejamento sobre a ação não planejada, a necessidade
de se incluir nos investimentos feitos pelos países centrais nos países periféricos, a educação como
fator importante na produção de recursos humanos, para o desenvolvimento desejado. Além disso,
essa estratégia atribui os malogros desses investimentos à falta de experiência das autoridades
governamentais e administrativas, à falta de “planos concretos”, à falta de preparo de pessoal e coisas
que tais.
É com base nessa forma de encarar o subdesenvolvimento que tais agências
internacionais têm proposto formas de cooperação para o desenvolvimento da educação no Terceiro
Mundo. Elas diferem apenas quanto ao estágio de desenvolvimento, ou melhor, de integração dos
países periféricos aos países centrais.
Nas sociedades coloniais, os investimentos externos no setor educação que geralmente
emanam das metrópoles, têm sempre por objetivo criar hábitos de consumo próprio destas camadas
mais altas da população e, ao mesmo tempo, criar, através do ensino, mão-de-obra de baixo nível.
Esse é o caso das sociedades coloniais da época contemporânea. Nesse caso, a dependência cultural é,
a um tempo, fator e instrumento de reforço da dependência política e da dependência econômica.
Nesse sentido, os argumentos de Ali Mazrui, ao analisar a influência das sociedades
multinacionais sobre os processos educativos nos países africanos são importantes para a
compreensão da estratégia da ajuda internacional para o desenvolvimento da educação. Segundo ele,
com a emergência do nacionalismo nesses países, o investimento ocidental em educação, ao invés de
diminuir, aumentou. Isso se explica pelo fato de que o crescimento do investimento em educação
pelas multinacionais, como foi o caso africano, tem representado uma forma de criar ou expandir
mercados, o que faz supor, com Tugendhat, citado pelo autor que “uma das grandes razões do
progresso das sociedades multinacionais, no decorrer dos últimos trinta anos do século XIX, foi o
desenvolvimento do nacionalismo nesses países”.
Mazrui assinala que o nacionalismo criou tarifas aduaneiras protetoras que levaram as
empresas estrangeiras a investirem naqueles países diretamente, em vez de para eles exportarem. Para
tanto, contribuiu bastante a ocidentalização, ou a “desafricanização” do pessoal aí recrutado para
68
operar nas multinacionais, entendida a desafricanização como a ação de ocidentalizar os africanos.
Nesse sentido, teve papel preponderante o ensino ocidental.
De certo modo, isso é fenômeno comum nas sociedades subdesenvolvidas recém-saídas
do colonialismo ou que, de uma ou de outra forma, atravessam um processo de nacionalismo
econômico ou político. Isso serve para reforçar a tese de que a ajuda internacional para a educação
procura desenvolver estratégias diferentes, conforme o contexto político e econômico das sociedades
em que pretende atuar ou onde já atua. Essa suposição, se confirmada, vem corroborar a teoria da
dependência desenvolvida por Cardoso e Faletto, que atribuem singular importância ao setor interno
das sociedades periféricas, quer quanto ao contexto econômico, quer quanto à estrutura social e às
lutas internas pela conquista do poder pelas camadas ou grupos dominantes. São, assim, as condições
internas de cada país que determinam as estratégias de intervenção do setor externo e, assim, a
própria forma de dependência.
Em se tratando de sociedades colonizadas ou recém-saídas do colonialismo, a ajuda
internacional tem sido instrumento eficiente de fornecimento e preparo de mão-de-obra ou de
recursos humanos da vários níveis de qualificação, culturalmente adaptados aos objetivos da
consolidação da dependência, mesmo após a emergência das sociedades nacionais.
Nos períodos de plena vigência do nacionalismo, a implantação de empresas no seio
dessas sociedades, em conseqüência dos obstáculos criados à importação de produtos
industrializados, é facilitada por um trabalho prévio de criação de hábitos de consumo, ação e
pensamento, para o qual contribui extraordinariamente o processo educacional Iato sensu e stricto
sensu.
Nas fases de superação do nacionalismo – este sempre decorrência da evolução do
mercado interno – a diversificação e fortalecimento do empresariado industrial concorre para que o
setor externo atue como reforço nas redefinições do modelo econômico e na reestruturação do poder
político que a decadência do populismo e do próprio nacionalismo acaba por favorecer. Mas é sempre
em função dos rumos que tomam essas redefinições e reorganizações que se manifesta o setor
externo. Então, avulta igualmente a importância de uma redefinição da estratégia da cooperação
internacional para a educação.
Antes, todavia, de analisarmos esse último aspecto, ocupemo-nos primeiro da análise da
ajuda em si.
Em primeiro lugar, importa indagar se a ajuda ou cooperação técnica e financeira dos
países desenvolvidos para os países subdesenvolvidos resulta em benefícios reais para estes últimos.
69
No que toca especificamente à educação, favorece ela realmente o desenvolvimento e a expansão do
ensino? Em que aspectos?
Se se leva em conta que geralmente os países subdesenvolvidos apresentam um contexto
acentuadamente heterogêneo, sobretudo na fase de sua industrialização, como já se assinalou aqui, no
caso específico do Brasil, outras questões devem ser também levantadas, tais como as propostas por
Le Than Khoi: se as distâncias sociais são grandes, nesses países, quais os grupos que mais se
beneficiam da ajuda? São estruturais ou apenas quantitativas as mudanças que esta acarreta do
desenvolvimento? Se apenas quantitativas, não teria a ajuda a função de perpetuar e consolidar a
ordem existente?
Se se considera a importância do comportamento geral do contexto interno das
sociedades beneficiárias, não se pode deixar de salientar que a ajuda quase sempre se faz sentir
justamente onde e quando são perceptíveis condições mínimas de integração das populações na esfera
de influência do capitalismo.
A partir desse pressuposto objetivo, a estratégia geral da ajuda para o desenvolvimento
da educação segue, mais ou menos, as seguintes fases e assume os aspectos assinalados por Le Than
Khoi, quando se trata do que ele chama de ajuda vinculada, geralmente no caso dos países mais
pobres ou menos industrializados:
a) Em primeiro lugar, quando a ajuda é feita à base de inversão da capital (construção de
escolas), todo o circuito que vai da elaboração dos estudos, transporte de material, até o fornecimento
de pessoal, favorece o país assistente, porque apenas uma pequena parte da ajuda aproveita mão-de-
obra local.
b) “A ajuda vinculada obriga os países beneficiários a pagarem preços superiores aos
preços mundiais e a se responsabilizaram por fretes de transporte e seguro junto às empresas dos
países de origem”
c) Quando à manutenção do pessoal de cooperação que representa 70% da ajuda à
educação, os recursos não são inteiramente gastos localmente. Pelo menos a metade, talvez até dois
terços são conservados no país de origem ou para ele voltam sob a forma de poupança. Até mesmo as
despesas com consumo do pessoal se fazem sempre com importação de produtos manufaturados e até
alimentares oriundos dos países industrializados. Assim apenas uma pequena parte de renda favorece
a economia local (aluguel, serviços domésticos, alimentação de base).
d) Além disso, para o país que recebe um técnico é diferente o “valor” de sua
remuneração paga pelo país que o envia, em confronto com o custo de um técnico local para o país
beneficiário.
70
e) Na maior parte das vezes, a ajuda exterior acarreta encargos decorrentes de
alojamento. Transporte, etc., que, podem atingir ou ultrapassar a despesa que o país beneficiário
suporta, se ele empregasse técnicos nacionais.
É por isso válida e oportuna a transcrição de um trecho de um depoimento do Boletim
do Departamento de Estado Americano, n.º 59, de dezembro de 1968, citado por Le Than Khoi, no
qual se lê: “O maior erro mantido a respeito do programa de ajuda ao estrangeiro é o de acreditar que
enviamos dinheiro ao estrangeiro. Nós não o fazemos. A ajuda ao estrangeiro consiste em material,
matérias-primas, serviços e produtos alimentares americanos. Desta forma, 93% dos fundos da AID
são gastos diretamente nos Estados Unidos”. (Conforme William S. Gand: “Foreign aid: what it is;
how it works, why we provide it”, State Department Bulletin, vol. LIX, n.º 1.537, p. 605).
Do ponto de vista do setor externo, todavia, os benefícios financeiros por este auferidos
não são as únicas vantagens resultantes da “ajuda” ao desenvolvimento da educação nos países
periféricos. Outros aspectos, alguns da maior relevância, merecem aqui destaque.
De forma bem evidente, a ajuda favorece dois tipos de situações, quando dada sob a
forma de bolsas de estudo: uma que diz respeito ao país doador , outra que diz respeito ao país
beneficiário. Geralmente o treinamento ou a formação de pessoal dos países subdesenvolvidos sob a
forma de bolsas de estudos concedidas pelos países que prestam a ajuda, favorece o êxodo de
cérebros, ou, pelo menos, pode esse treinamento ser considerado uma de suas causas. Quer o
treinamento ou a formação seja no país doador da bolsa, quer no do bolsista, é forçoso concluir que
sempre obedece a um modelo estrangeiro que, por isso mesmo, não facilita a integração do indivíduo
ou a qualificação por ele recebida nos quadros das reais exigências do seu país. Valores e aspirações
intelectuais, bem como a manipulação de instrumentos específicos de atuação, próprios de uma
realidade econômica, social, cultural e cientificamente mais avançada alienam o indivíduo do seu
meio acarretando-lhe desadaptação, inadequado aproveitamento, frustrações, enfim, uma série de
conflitos que o levam ou a isolar-se da própria realidade, ou a “fugir” para o exterior. No caso de
ocorrer essa última alternativa, são evidentes para o país favorecedor da bolsa os benefícios
decorrentes: ele ganha um técnico ou um cientista, sem geralmente haver arcado com o ônus de sua
educação de base. Quando é a primeira alternativa que ocorre, de qualquer forma, o treinamento ou a
formação desse indivíduo desadaptado em nada beneficia o seu país.
Se, todavia, não ocorre nenhuma das duas alternativas, há ainda o risco de o indivíduo
atuar ou negativa ou ineficazmente em (e para) sua realidade sócio-cultural e econômica, por achar-se
culturalmente adaptado aos modelos de pensamento e ação assimilados com o tipo de qualificação
recebia.
71
Esse tem sido o caso específico dos cientistas treinados segundo métodos de pesquisas
construídos e próprios de sociedades, tecnologia e cientificamente mais avançadas. Usando modelos
bastante sofisticados, eles atuam, ou procuram atuar, em um contexto cujo grau de
subdesenvolvimento não comporta o grau avançado de sofisticação ou, se o comporta, é para ajustá-lo
apenas às necessidades do tipo de empresa existente em seu país. Esta quase sempre mantém, junto a
uma restrita camada social, hábitos de consumo que a identificam com as elites dos países mais
desenvolvidos. Nesse caso, é evidente que o preparo de cientistas serve a interesses econômicos que
não são básicos para o conjunto da população.
São, a esse respeito, pertinentes as observações de André Béteille acerca dos “perigos da
metodologia da pesquisa” importada de países avançados e aplicadas ao estudo de realidades
subdesenvolvidas. Tomando por base o caso da Índia, em suas observações, ele assinala que a
metodologia da pesquisa americana, construída lentamente segundo necessidades, condições e
objetivos de uma sociedade capitalista avançada, orientada para o concreto e a prática, se, por um
lado, tem a vantagem de “normalizar as regras a observar” na pesquisa, comporta, de outro lado, o
risco de valorizar a metodologia em si mais do que os problemas a estudar e a elucidar. Esse risco
cresce mais quando se transfere um tal tipo de metodologia de um para o outro meio intelectual.
Atualmente a pesquisa, nos Estados Unidos, envolve bastante para o trabalho em equipe, o que supõe
que ela se baseia no aprofundamento da especialização de cada colaborador. Essas condições não
apenas são difíceis de ser encontradas nas realidades subdesenvolvidas: a sofisticação do modelo
tende a fazer crescer a preocupação pelo domínio da técnica da pesquisa em si e a diminuir a
preocupação com a problemática do contexto da sociedade em questão. Isso não significa, como
entende o autor citado, que os cientistas “devam em cada país construir seus próprios métodos de
pesquisa; mas a desproporção entre problemas a estudar e os meios disponíveis aparecem às vezes
exagerados em países como a Índia, ou, se quisermos, na maior parte das sociedades
subdesenvolvidas. Essas desproporções acarretam, em conseqüência, outra despreocupação entre “as
vastas dimensões da máquina de pesquisa utilizada e o valor dos resultados finais”, como assinala o
autor, citando Manheins. E, mais ainda, a generalização desse emprego da metodologia em países
pobres tem de levar em consideração um fato concreto: “A nova metodologia custa caro”.
Enfim, na medida em que as agências internacionais de ajuda à educação nos países do
Terceiro Mundo partem de uma concepção de subdesenvolvimento, que na realidade procura explicar
o global pelo particular, ela tem também por estratégia a compartimentação da realidade e, nesse
sentido, não só se comporta acriticamente como ajuda, ou favorece o desencadeamento da organização
de sistemas educacionais ou reformas de ensino que atribuem acentuado valor ao estudo do processo
72
educacional em nível micro-social, evidenciando-lhe mais os aspectos psicopedagógicos do que os
aspectos macrossociais. Nesse sentido, não só favorece a importação de técnicas de ensino
modernizantes, que privilegiam o estudo da aprendizagem em si, isolando-a do seu contexto, mas
também, o que é ainda mais grave, imprime uma direção quase única à pesquisa educacional. Esta
passa então a refletir a compartimentação e a desvalorizar os estudos do macro - sistema educacional e
suas relações com o contexto global da sociedade.
É sintomática a supervalorização das áreas tecnológicas com predominância do
treinamento específico sobre a formação geral e a gradativa perda de status das humanidades e
ciências sociais, de modo geral, nas reformas do ensino desencadeadas por situação desse tipo de
ajuda internacional para a educação.
Para tentar possíveis respostas às questões atrás levantadas, cremos que alguns elementos
precisam ainda ser melhor evidenciados na nossa análise.
Quando o desenvolvimento e à expansão do ensino, parece-nos que a ajuda internacional
só interfere quando o contexto interno apresenta certas condições básicas, como a expansão da
demanda social de educação, que nem sempre encontra, no sistema vigente, elasticidade de oferta de
oportunidades educacionais. Mas não é apenas isso que condiciona a interferência da ajuda. A
estrutura social e política de dominação pode utilizar-se da seletividade do ensino como instrumento
de manutenção do status quo. Também o tipo de modelo econômico pode lucrar com a permanência
de mão-de-obra de baixo nível para cuja manutenção contribui a falta de uma escolarização mais
extensa.
Somente, pois, quando há necessidade de redefinição na expansão econômica que
implique o aparecimento ou o incremento de demanda econômica de recursos humanos de vários
níveis de qualificação e também quando o remanejamento das forças na estrutura do poder objetive
utilizar-se da modernização como ideologia de justificação e necessite aumentar as oportunidades
educacionais em determinada direção, é que as pressões da demanda social de educação começam a
ser consideradas. Esse processo é sempre definido em termos de interesses, pelo aumento ou não da
participação social no jogo político, com estratégias definidas em função das condições internas
criadas.
Em princípio, a estratégia da ajuda ataca principalmente o problema em seus aspectos
quantitativos. Daí ser comum a identificação pura e simples da explosão da demanda com a explosão
demográfica. Então, as soluções propostas envolvem, quase sempre, a obtenção de maior rendimento
da rede escolar existente, com a menor aplicação de recursos, com base em estudos de “rentabilidade”
do sistema.
73
Já no que concerne à qualidade do ensino, os programas de ajuda identificam, e
necessariamente, o baixo nível de qualidade com a “democratização” ou a expansão do ensino,
distorcem, portanto, o conteúdo problemática, para justificar um tipo de ação que isola de seu contexto
o processo educacional. A estratégia sempre adotada é a do treinamento de pessoal docente e técnico,
do aumento dos recursos materiais (como o aparelhamento de escolas) e a reorganização do currículo,
com vistas ao treinamento, em nível desejado, do pessoal destinado a preencher as categorias
ocupacionais das empresas em expansão. Tem isso por base a necessidade de adequar a educação às
“necessidades do desenvolvimento”.
Nas sociedades subdesenvolvidas, em que são acentuadas as distâncias sociais e a
estrutura de dominação interna privilegia camadas e grupos restritos, a expansão do ensino é sempre
controlada por mecanismos legais, que a mantêm seletiva e, como se viu no caso brasileiro,
socialmente discriminante. A ajuda internacional para a educação privilegia muito o ensino superior,
que, nessas sociedades em fase de modernização, tem como função precípua definir ou redefinir a
situação dos indivíduos na estrutura social. É óbvio que, nesse caso, a ajuda vem privilegiar as
camadas mais altas da população. Além disso, ao modernizar a estrutura do ensino, em qualquer dos
seus níveis, vem não só favorecer o controle da educação pelos órgãos centrais do Governo, o que
implica, no caso da Universidade, perda de autonomia, mas também ensejar mudanças
acentuadamente quantitativa, favorecendo a expansão da oferta do ensino, sem contudo favorecer a
real mobilidade social que seria de se esperar. E isso porque a modernização, de modo geral, implica
hierarquização e compartimentação de ocupações e achatamento de níveis salariais, o que
evidentemente faz acompanhar a extensão da escolaridade, tanto em nível horizontal, quanto em nível
vertical, de perda constante e contínua de etatus. A diferença, portanto, entre o atual modelo
educacional e o antigo modelo da sociedade tradicional consiste em que este conferia ou assegurava
status, enquanto aquele está acarretando, pela massificação do ensino e perda de poder aquisitivo que
o trabalho qualificado pode oferecer ao indivíduo, perda progressiva de status pelas profissões de nível
superior.
Cremos, pois, nesta altura, que se nos afigura óbvia a resposta às questões que nos
propusemos atrás:
São estruturas ou apenas quantitativas as mudanças que a ajuda acarreta ao
desenvolvimento da educação? Se quantitativas, não teria a ajuda a função de perpetuar e consolidar a
ordem existente?
74
2.9.7 - A crise da educação brasileira no período 64 / 68 e a ajuda da AID
2.9.7.1 - Base sociais e econômicas da crise estudantil
A crise a que nos referimos tem, em verdade, sua gênese num período anterior: ela foi o
resultado da aceleração do ritmo de crescimento da demanda efetiva de educação. Esse crescimento
resultou da conjugação de dois fatores:
a) A implantação da indústria de base, acelerada sobretudo na segunda metade da
década de 50, que criou uma quantidade e uma variedade de novos empregos;
b) A determinação dos mecanismos tradicionais de ascensão da classe média.
Quanto ao primeiro fator, resulta que, uma vez acelerada a industrialização, a tendência à
criação de serviços é imensa, devido à necessidades de obras de infra-estrutura, crescimento do setor
terciário, e organização burocrática, em crescente complexificação. Além disso, é preciso não
esquecer que este foi o período da instalação de grandes firmas multinacionais, as quais, por si sós,
possibilitaram a criação de uma infinidade de outras firmas menores, além de um esquema
burocrático, que exige uma extensa gama de serviços. Segundo Luiz Antônio Rodrigues da Cunha,
não são só essas grandes empresas que criam diretamente serviços e ocupações; o Estudo, como
propulsor da expansão econômica, mantém vários mecanismos concentradores de capital e órgão de
planejamento e administração além das suas próprias empresas. A necessidade da criação de infra-
estrutura de comunicações, transporte e energia já é o suficiente para formar uma fonte de empregos
que exigem os mais diversos níveis de habilitação.
Esse primeiro fator acabou indo ao encontro dos interesses da classe média. E é aqui que
entra a explicação do segundo fator.
Ainda de acordo com Luiz Antônio Rodrigues da Cunha, o que se verificou, de uns anos
para cá, foi “a mudança do modelo de ascensão da classe média. Anteriormente, esta passava pela
constituição de capital através da poupança, investimento em pequenas empresas, reprodução do
capital, nova poupança, etc. O alvo da ascensão social para as camadas médias era a abertura de um
pequeno negócio ou o exercício de uma atividade profissional, por conta própria. A partir, no entanto,
desse processo de concentração de capital, renda e mercado, os canais “tradicionais” de ascensão
tornam-se cada vez mais estreitos. Em função disso, as alternativas de ascensão das camadas médias
transferem-se para as hierarquias ocupacionais, que se ampliam e multiplicam, tanto no setor privado
quanto no setor público da economia”.
75
Tem-se, assim, de um lado, uma crescente demanda de pessoal, por parte do sistema
econômico, e, de outro, uma crescente oferta de trabalho por parte das camadas médias, que vêem nas
hierarquias ocupacionais das empresas a única forma de manter ou conquistar status.
Mas, se a procura de pessoal aumenta, a presença apenas da oferta de trabalho não
significa emprego. Entre uma e outra, está a exigência de qualificação para a edequação às atividades
próprias de cada nível e rumo das hierarquias de ocupacionais (1ª linha da página 206 está ilegível)
para as classes médias, de conquistar postos e, para as empresas, de preencher os seus quadros.
Como respondeu o sistema educacional brasileiro a essas duas pressões, a da demanda
efetiva de educação e a da demanda do sistema econômico para a formação de recursos humanos? É o
que passaremos a enfocar, daqui para a frente.
Antes de mais nada, convém lembrar que as grandes reformas educacionais só vão
ocorrer depois que a crise do sistema atingir sua fase aguda. Portanto, até 1968, nenhuma resposta
viável tinha sido dada às pressões acima assinaladas. E foi justamente da incapacidade do antigo
sistema de responder a essas pressões que resultou o impasse. A Lei de Diretrizes e Bases não havia
criado a estrutura aberta de que carecia o desenvolvimento da Nação e a inelasticidade da oferta era
acompanhada de uma estrutura escolar que não respondia, nem de longe, à demanda de recursos
humanos criada pela expansão econômica. A demanda de pessoal com qualificação de nível médio
crescia em ritmo mais acelerado do que a oferta. Isso criou um déficit que cresceu, também, nos
últimos anos.
Um dos aspectos da crise, portanto, está na crescente incapacidade de o sistema
educacional oferecer os recursos humanos de que carece a expansão econômica.
Ao lado disso, porém, está a pressão da demanda social de educação que, por sua vez,
cresce, na medida em que a própria expansão econômica destrói os “canais tradicionais” de ascensão
social das classes médias.
A política educacional adotada após 1964 vai evoluir de forma diferente nos dois
momentos antes assinalados. Em princípio, ela vai procurar atender às exigências quantitativas da
demanda social de educação. No momento, aliás, ela vai preocupar-se predominantemente com esse
aspecto. Todavia, sua ação vai resultar ineficiente, tanto mais quanto a crise econômica do início da
década de 60 vai exigir, por parte do novo regime e segundo sua ideologia, a adoção de uma política
econômica de contenção. Porém, mais do que em conter gastos, o Governo estava preocupado em
capitalizar, em acumular, para investir. A expansão da rede escolar, segundo as exigências da
demanda social de educação, poderia comprometer em parte a política econômica do Governo. Daí
por que a expansão se deu em limites estreitos e, por não acompanhar nem ao menos o ritmo do
76
crescimento da demanda, acabou agravando a crise do sistema educacional. Este já não respondia nem
às exigências do sistema econômico, nem às da demanda de educação.
Os quadros 54 e 55 evidenciam esse fato com mais precisão. Neles procuramos colocar
os dados referentes à expansão do ensino nos seus níveis, em dois períodos diferentes a 1964/68. A
diferença entre ambos dá bem a medida da atuação do Governo, no manejo da política educacional.
77
2.9.8 - A REFORMA UNIVERSITÁRIA
A Lei 5,540, de 28 de novembro de 1968, e o Decreto-Lei n.º 464, de 11 de fevereiro de
1969, vieram reafirmar princípios já adotados em legislação anterior e a estrutura, já em implantação.
Para tanto, ficaram logo definitivamente consagradas em lei as seguintes mudanças:
1. Organização – A lei que o ensino superior passe a ser ministrado preferentemente em
Universidades e só excepcionalmente em estabelecimentos isolados. Assim mesmo, o Conselho
Federal de Educação fica incumbido de estudar e fixar os distritos geo-educacionais para a
aglutinação, em Universidades ou federação de escolas, dos estabelecimentos isolados de ensino
superior já existentes.
Essa política de aglutinação faz parte da política de concentração de esforços e recursos
materiais e humanos para obtenção de maior economia de aplicação de recursos e maior
produtividade.
A menor fração da estrutura universitária passa a ser o Departamento, o qual congregará
disciplinas afins.
2. Administração – Além do Reitor, que responde pelo executivo na Universidade, a
administração passa a ser exercida pelos seguintes órgãos principais:
2.1. Um órgão central de coordenação do ensino e da pesquisa;
2.2. Um Conselho de Curadores, quando se tratar de autarquia, composto de membros
da Universidade, representantes do Ministério da Educação e Cultura e membros da Comunidade, ao
qual compete a fiscalização econômico-financeira da Universidade.
No âmbito das unidades, há, além do diretor, um Conselho Departamental ou uma
Congregação, com funções deliberativas , e um Colegiado de Coordenação Didática.
Em todos os órgãos de direção superior das unidades e da Universidade haverá sempre
representação de todas as categorias docentes, bem como a representação discente.
3. Cursos – A Universidade, através de suas unidades, deve promover cursos de
graduação, pós-graduação, extensão, aperfeiçoamento e especialização.
Os cursos de graduação compõem-se de:
1. Um ciclo básico, comum, para áreas afins, visando à:
“a) recuperação de insuficiências evidenciadas pelo concurso vestibular, na formação de
alunos;
c) orientação para a escolha da carreira;
d) realização de estudos básicos para ciclos ulteriores”.
78
2. Um ciclo profissional, composto, por sua vez, de cursos de curta duração e de cursos
de longa duração, já explícitos anteriormente.
Além dessa estrutura, a legislação de que tratamos tomou algumas providências
práticas, tais como: a unificação do vestibular, por universidade e por região; a extinção da cátedra e a
previsão de mais de um professor em cada nível de carreira (em cada categoria docente) por
departamento; e a submissão das decisões do Conselho Federal de Educação ao Ministro da Educação
e Cultura, prevendo, inclusive, a devolução, por parte deste último, para reexame, das decisões do
Conselho, das quais estiver divergindo.
Algo de importante para os dois relatórios antes mencionados, mas que não constou dos
textos legais, foi a possibilidade de a nomeação de reitores e diretores de unidades recair em pessoas
alheias ao corpo-docente universitário. A legislação teve, portanto, a precaução de evitar o
agravamento dos problemas de autonomia administrativa no ensino superior.
Em 1971, as condições para o ingresso na Universidade foram fixadas pelo Decreto n.º
68.908, de 13 de julho de 1971, que dispôs sobre o Concurso Vestibular. Esse decreto, depois
regulamentado por portarias ministeriais, previa o vestibular classificatório, que eliminava, de uma
vez por todas, o problema jurídico dos excedentes e determinava que a sua execução fosse realizada
ao mesmo tempo, em todo o Território Nacional ou, pelo menos, para diferentes regiões. Além disso,
previa que as provas fossem idênticas para toda a Universidade ou grupo de Instituições interessadas,
bem como previa sua gradativa unificação para regiões cada vez mais amplas. Dispôs ainda que as
provas se limitassem, daí para frente, a conteúdos relativos às disciplinas obrigatórias do ensino de
grau médio.
Resta-nos agora refletir sobre o significado dessas mudanças. Resumindo-as, podemos
afirmar que a racionalização administrativa e a modernização conseguiram organizar uma estrutura
universitária, com a predominância das seguintes características:
a) Integração de cursos, áreas, disciplinas.
b) Composição curricular, que teoricamente atende a interesses individuais dos alunos
pela presença de presença de disciplinas obrigatórias e optativas e pela matrícula por disciplina.
c) Centralização da coordenação administrativa, didática e de pesquisa.
d) Cursos de vários níveis e de duração diferente.
e) Incentivo formal à pesquisa.
f) Extinção da cátedra.
g) Ampliação da representação nos órgãos de direção às várias categorias docentes.
79
h) Dinamização da extensão universitária, etc.
O que nos falta saber agora é qual a extensão real dessas modificações e, também, em
que grau elas contribuíram para criar as mudanças reais reivindicadas, já há algum tempo, pela
sociedade. Para quem vive, atualmente, no âmbito da Universidade, não é difícil perceber que, apesar
dos grandes avanços, ela continua a organizar-se segundo normas mais ou menos rígidas. É assim, por
exemplo, que a pretensa exigência de rigor e de racionalização está criando um tipo de curso baseado
em, currículos mínimos prefixados e cargas horárias mínimas, no qual a preocupação com o tempo
gasto e com o cumprimento de exigências formais de realização de programas está dando
continuidade a um processo antigo de desvirtuamento de valores. Os cursos estão sendo avaliados
mais pelo seu número de horas-aula do que pelo conteúdo real e padrão cultural que eles são capazes
de possibilitar aos alunos.
A exigência, indiscutivelmente necessária, de que o ensino esteja aliado à pesquisa não
conta, todavia, com uma estrutura real de recursos, nem sequer com mecanismos de ordem
administrativa capazes de possibilitá-lo. A implantação gradual de tempo integral e de dedicação
exclusiva, com o objetivo formal de garantir esse propósito, não está sendo feita segundo critérios
racionais, nem conta ainda , por parte da maioria dos professores, com a devida “abertura” para
empregar o tempo remunerado em trabalho de pesquisa séria. Para boa parte dos docentes, o regime
especial de trabalho continua sendo mais uma oportunidade de exibir uma situação privilegiada dentro
da unidade escolar, do que uma forma de assumir maiores responsabilidades em relação ao ensino e à
pesquisa.
A dependência cultural tem evoluído com a importação de modelos de pensamento e os
“modismos” pontificam, mais que a originalidade, nos meios docentes. Nesse sentido, processaram-se
as mudanças sem que estas tivessem ajudado a criar condições para a formação de um padrão
intelectual mais autêntico, mais autônomo.
2.9.9 - O novo modelo e sua funcionalidade
A questão que se coloca, inicialmente, para nós é a de saber por que o Governo resolveu,
em determinado momento, promover a Reforma Universitária, quando era ela reivindicação da ala
mais contestada da sociedade brasileira na época.
Florestan Fernandes dá-nos uma resposta aceitável após 1964 a atuação do Governo , em
relação à Universidade, passou por duas fases. A princípio, ele defendeu os interesses dos estratos
conservadores manipuladores da cátedra contra a ofensiva de professores e estudantes que advogavam
80
a reforma. Depois, mudou de tática, quando percebeu que “a extinção do antigo padrão de escola
superior não ameaçava o status quo.
E mais ainda:
“Sob a pressão constante de tendências modernizadoras que partiam do interior do país,
dos Estados Unidos e de organismos econômicos, educacionais e culturais internacionais, e sob a
egide conservadora preferiu tomar a liderança política da “reforma universitária”. Iria, portanto,
modernizar sem romper com as antigas tradições, nem ferir interesses conservadores. Ao mesmo
tempo, iria controlar a inovação.
Assim, pois, a modernização da universidade ocorreu menos por pressão da rebelião
estudantil do que pela descoberta de que a inovação poderá ser manipulada sem ameaças à estrutura
de poder, ao mesmo tempo em que se ajustaria mais a um certo padrão de desenvolvimento
econômico, apontado este aspecto pelas forças internas e externas interessadas nessa modernização.
Assim, pois, o Governo não só cedeu às pressões, como também assumiu a responsabilidade da
inovação. E foi esse fato que deu sentido ao “expurgo” dos aspectos político-ideológicos que
informavam as propostas da reforma universitária vindas de própria Universidade e à sua
caracterização como modernização técnico-administrativa. Ao fazer essa opção, o Governo assumiu a
posição dos dirigentes da AID, que tendiam a enfocar a educação como fenômeno isolado do resto do
contexto social e político, e a identificar reformas das instituições com remodelações de caráter
predominantemente técnico-administrativo, como se “seu rendimento intenso constituísse uma função
exclusiva de sua organização interna, da qualidade do pessoal (ou de sua motivação) e da adequação
das relações entre meios e fins. Em suma, bastaria uma “boa organização” e uma “boa direção” para
se ter um “bom rendimento” ou um “rendimento ótimo”. A instituição retiraria de si própria as forças
de seu dinamismo e do seu crescimento, como se fosse auto-suficiente e se determinasse por si
mesma”.
Nesse contexto, a racionalização, a eficiência e a produtividade tornam-se valores
absolutos: têm validade em si e por si mesmos. A racionalidade técnica procura sobrepor-se a
qualquer opção de ordem política e a neutralizar o processo de inovação de qualquer ingerência de
caráter ideológico. Essa é uma posição obviamente ilusória, pois que a técnica não ocorre no vazio,
mas num determinado contexto histórico-político-econômico. A pretensa neutralidade técnica é uma
farsa que busca camuflar, com a racionalidade das decisões técnicas, o fortalecimento de uma
determinada estrutura de poder que procura, sob várias formas, substituir a participação social pela
decisão de poucos. A tecnologia, a ciência, as decisões de origem técnica sempre acontecem numa
81
situação concreta, não numa situação abstrata. E são também decorrência delas e, portanto, utilizadas
em função de estruturas políticas, sociais e econômicas.
A separação do processo político em relação ao processo do planejamento (que é o
processo racional) é uma distorção decorrente da distorção das próprias funções do Estado, ou, talvez,
mais do que distorções nestas, opções feitas pelo Estado em função de interesses prevalecentes nos
estratos que manipulam o seu aparelho.
Dumerval Trigueiro Mendes faz uma análise das distorções na filosofia atual do poder,
ressaltando que:
“Em primeiro lugar o Estado criou o que se poderia chamar de desvio tecnocrático.
Pretende-se esvaziar o desenvolvimento (consciência e processo) de sua substância política,
substituindo a “ratio”” política pela “ratio” técnica. O desvio, no plano metodológico, consiste em
opor a idéia de “eficiência” (conceito ambíguo) à de “participação”. O pretexto é a complexidade das
estruturas na qual a tecnocracia corta fácil e o lucro é a neutralidade que afasta a controvérsia”. ( 1ª,2ª
e parte da 3ª linha da página 232 está ilegível) população – instituição, grupo, classe, etc. – por seu
turno deve concentrar-se nos próprios interesses. Não cabe à Universidade preocupar-se com o que
acontece além de seus muros, nem tampouco à Igreja ou aos Sindicatos. Os estudante são para estudar,
os trabalhadores para cuidar do seu ofício, a Igreja da sua fé, e assim por diante. Dessa forma, se
desfazem as solidariedades não só das estruturas, como das pessoas e grupos juntamente com os seus
dinamismos convergentes. Na sociedade, qualquer parte decepada do todo perde o contato com a fonte
de seu próprio dinamismo”.
Assim pois, o modelo de análise que propõe o isolamento do processo e do fenômeno
educacional, longe de apenas simplista e distorcido, consubstancia uma proposta que resulta em
teorias que pretendem dar justificativas à preservação de um determinado status quo. Comporta-se,
dessa forma, como uma estratégia teórica, que, longe de ser ingênua, tem objetivos seus definidos na
manutenção da ordem político-econômico-social.
O novo modelo de Universidade, decorrente dessa proposição, consiste exatamente
naquele que acabamos de descrever. Teoricamente, ele pretende agregar a racionalidade
administrativa à universidade para torná-la mais moderna e adequada às exigências do
desenvolvimento. Mas, politicamente, essa racionalidade administrativa acaba aumentando, no seio da
própria Universidade, o controle dos órgãos centrais sobre toda a vida acadêmica e, externamente, o
controle da própria Universidade pelos órgãos de administração federal de ensino.
A partir daí, é possível afirmar que a atual modernização tem uma funcionalidade
política, não só pelo controle que exerce externamente sobre a Universidade, mas sobretudo por retirar
82
da Universidade qualquer chance de interferir sobre, ou de controlar os resultados daquilo que ela
mesma produz.
Ao utilizar, porém, um modelo que é próprio de uma realidade desenvolvida e, portanto,
eficaz para o conjunto dessa realidade, o Governo acabou por criar, no seio da Universidade brasileira,
o esfacelamento das antigas estruturas, grupos e pessoas. A introdução da matrícula por disciplina, por
exemplo, se tem uma funcionalidade prática na obtenção de maior economia no emprego de recursos
(o que é bem duvidoso em nossa realidade), desfez os grupos de estudantes, que antigamente
caminhavam juntos na sua vida acadêmica. Nesse sentido, não só atingiu em cheio o espírito de
solidariedade, como eliminou uma condição essencial para o desenvolvimento do espírito de grupo ou
de classe. E, com isso, retirou do corpo discente a pré-condição que dava dinamismo à sua própria
existência. O resultado prático de uma medida como essa, foi a eliminação de uma das vigas mestras
da solidariedade e da união entre os próprios estudantes.
Ademais, é forçoso admitir que a atual modernização, ao utilizar mecanismos de
administração que eliminam cada vez mais o óbices do livre fluxo do comando das esferas mais para
as instâncias inferiores, esvaziou os antigos cargos de chefia ou de direção de seu conteúdo próprio,
determinado por certo grau de liberdade e opção e de determinação na condução e administração das
instituições. No que concerne à Universidade, isso é verificável, tanto no que respeita às suas relações
com a administração pública federal, como no que respeita ao seu próprio âmbito. No primeiro caso,
decisões que antes eram tomadas pelas próprias Universidades, através de seus órgãos administrativos,
passaram para a instância superior, como é o caso das normas de seleção, contratação e nomeação do
seu próprio pessoal, deixaram de subordinar-se aos reitores ou a administração central da
Universidade, para subordinar-se diretamente a órgãos que se situam fora do seu âmbito.
O setor interno de cada universidade, todavia, reflete a estrutura de dominação que sobre
ela paira. Órgãos superiores de cada Universidade, ligados à área de planejamento pessoal,
coordenação curricular e de administração, tornaram-se plenipotentes, ao criarem mecanismos que
subordinam diretamente ao seu controle, serviços, órgãos administrativos e colegiado de cursos de
cada unidade ou escola. Dessa forma, os cargos de direção da unidade, atualmente, têm muito pouca
ingerência sobre os serviços do ensino, secretaria, pessoal e colegiados de coordenação didática.
Assim, da mesma forma que os atuais reitores tiveram esvaziadas suas funções e
restringidas suas liberdades de fazer opções ou traçar linhas gerais de comando, os atuais diretores
tiveram seus cargos transformados em pouco mais do que cargos de administração predial ou, quando
muito, de intermediários na fluição e cumprimento das ordens que lhes vêm de cima.
83
O antigo modelo de Universidade – não estamos aqui a defendê-lo – se pensarmos bem,
possibilitava maior margem de independência, tanto na Universidade em suas relações com a
administração pública federal, quanto em seu próprio âmbito. Os desmandos e abusos ocorreram
menos em função do modelo existente, do que os estratos sociais que manipulavam a cátedra e os
órgãos encarregados de sua direção.
Dessa forma, a modernização acabou criando uma complexidade administrativa e uma
intrincada teia de mecanismos de controle dentro e fora da Universidade, que a tornou mais
conservadora na sua estrutura geral do que a do antigo modelo.
O que dá um toque modernizante à Universidade brasileira atual e camufla sua estrutura
rígida e conservadora é o fato de ele utilizar-se de meios mais modernos de comunicação e controle
administrativo e pedagógico, ter diversificado sua oferta de cursos, tanto no que tange aos ramos do
conhecimento, quanto no que tange às formas de duração. E, ainda, o fato de ela ter dado um caráter
mais racional à aplicação de recursos, evitando “duplicar meios para fins idênticos”. Acrescente-se,
finalmente, a isso o fato de ela haver ingressado, há pouco, na fase de incentivo à pesquisa, cujos
objetivos discutíveis já salientamos páginas atrás.
Com tudo isso, a racionalidade só veio acarretar um poderoso aumento do esquema de
dominação dentro e fora da Universidade, do que resultou a perda total de sua autonomia.
84
Conclusão:
Após o fim desta pesquisa, concluímos que cada modificação impetrada, durante
determinado período na educação brasileira, está diretamente relacionada com o perfil do governo da
época e com a política-econômica adotada por este governo.
Foi assim, primeiramente, com os jesuítas, os quais, devido à grande força da igreja e,
ainda, ao início da colonização brasileira, tiveram total liberdade para impor sua ideologia através da
catequese, o que, no momento, era, exatamente, o que de melhor podia acontecer ao Brasil.
Vemos, no decorrer desse processo, surgir um governante ( D. José I e seu ministro
Marquês de Pombal, ambos “Despotas escalrecidos”) que presava a arte e o desenvolvimento
científico, acima da religião (achavam, mesmo, que a religião era o freio da educação). Essa postura
irá acarretar na expulsão dos jesuítas do Brasil e a educação brasileira entregue nas mãos de
professores indicados por Pombal.
Mais à frente, com as mudança de governante, teremos a volta dos jesuítas ( um imperador católico
era sinônimo de uma igreja forte, e, consequentemente, uma educação marchando paralelamente com
a religião, ou seja, tudo se interligava).
Entramos no Império e continuamos observando que quando a política era de descaso e
inconsequência para com o Estado, esse descaso era refletido na educação (um bom exemplo é o
governo de D. Pedro I). Já com D. Pedro II (último governo do Brasil Império) a educação conseguiu
passar de muito ruim para ruim, ou seja, houve uma evolução, devido a valorização dada por D. Pedro
II à cultura (patrocinou várias descobertas, ficando conhecido esse período como “Messenato”, em
homenagem ao Rei Messenas – grande propulsor das artes e das ciências), porém, mesmo assim, não
havia, ainda, a consciência do alto grau de importância da educação. Esse descaso, com a educação, se
85
deve tanto ao nível das pessoas que vinham para o Brasil (a maior parte era composta da classe mais
baixa), bem como, e principalmente, pelo motivo que essas pessoas vinham para o Brasil (pensavam
em vir para o Brasil, fazer riqueza e voltar para Portugal, para poder gastar a fortuna conseguida),
visto ambos motivos, fica claro, para nós, concluirmos o porquê de toda pouca importância dada ao
Brasil, no que tange o desenvolvimento científico. O interesse era de explorar, e não de desenvolver.
Com o início da República, a educação continua sendo tratada da mesma maneira, só
havendo um “suspiro” de melhoria no Governo Rodrigues Alves, porém nesse momento, aconteceu
uma resistência muito grande do povo (talvez até devido á ignorância da população) aos métodos
pouco ortodoxos do Governo (Quem não se lembra da Revolta da Vacina?).
Novamente, temos um hiato de descaso e falta de vontade para com a educação, só acontecendo nova
melhoria no Governo de Vargas, onde este devido a Ter ficado por 15 anos, consecutivos, no poder,
conseguiu algumas melhorias ( a criação do SENAI E SENAC, por exemplo), ‘ainda aquém do que o
Brasil necessita.
E por fim, iremos observar no Governo de Castelo Branco, a primeira reforma educacional, real, do
Brasil, onde tentou-se diminuir um pouco a defasagem entre o ensino do Brasil e dos países de
primeiro mundo (o presidente compreendera ser a educação a mola mestra do desenvolvimento,
tentando suprir a falta de recursos brasileiros para atendê-la, foi buscar ajuda na cúpula
interamericana, sendo encaminhado posteriormente ao BID e a AID, em palavras do próprio Castelo
Branco : “ Seria a ambicionada educação para o desenvolvimento”).
Em suma, fazendo um estudo do grau de preocupação de cada Governo para com a educação do Brasil
( dos jesuítas até Castelo Branco ; da construção de escolas até a especialização de docentes), iremos
Ter uma plástica perfeita da política adotada naquele determinado governo, é uma simbiose perfeita
entre a importância e desenvolvimento, entre modo de governar e tipo de educação, ou seja, uma
simbiose perfeita entre política e educação, quando uma vai bem a outra vem subindo junto e vice-
versa, nem que essa melhoria de ambas seja a longo prazo.
A atual situação do ensino no Brasil (principalmente o ensino superior, que é onde toda a carência irá
desaguar, às vezes na forma de exclusão, outras vezes na formação de profissionais deficientes) está
refletindo toda essa política de idas e vindas dos nossos antigos governos.
Concluímos que a solução para esse problema que se alastra por séculos de descaso, somente terá
chance de melhorar com outros tantos séculos de boa política (boa vontade e bom senso de nossos
governantes já é um belo caminho a trilhar).
86
Um país onde dominasse muito fácil pela falta de cultura, enquanto nossos políticos continuarem
colocando seus interesses na frente do país, essa situação nunca estará sanada. Resta a nós tentarmos
reverter essa situação.
87
BIBLIOGRAFIA
• LAROSA, Marco Antônio. Como produzir uma monografia passo a passo... siga o
mapa da mina. Rio de Janeiro: WAK, 2002.
• LEITE, Glacyra Lazzari. As lutas ideológicas em torno da educação. São Paulo:
Universidade de São Paulo, 1976. ( Tese de Mestrado )
• TEIXEIRA, Anísio. Educação Progressiva. São Paulo: Nacional , 1954.
• CHAUÍ, Marilena, FRANCO, Maria Sylvia de Carvalho. Ideologia e mobilização
popular. Rio de Janeiro: Cedec, Paz e Terra, 1978.
88
ÍNDICE
INTRODUÇÃO....................l............................................................................. 08
CAPÍTULO I..................................................................................................... 10
A EDUCAÇÃO: DA COLÔNIA AO IMPÉRIO............................................... 10
1.1 - Condições favoráveis para a educação jesuítica ........................................ 11
1.1.1- Objetivos da Educação jesuítica.............................................................. 13
1.2- Queda da Educação jesuítica.................................................................... 14
1.2.1- A Relação entre o desenvolvimento econômico e a educação.. ...............15
1.3- A Descentralização educacional de 1834................................................. 18
1.4- O Auge do Sistema Educacional no Império .......................................... 20
1.5- Novas Reformas no Ensino...................................................................... 23
1.5- Integração e Desintegração de Fatores.................................................... 26
CAPÍTULO II......................................................................................................28
A EDUCAÇÃO: DA REPÚBLICA AO GOVERNO CASTELO BRANCO....28
2.1- As Novas Exigências Educacionais da Industrialização...............................29
2.1.1- A Influência da Revolução Capitalista na Expansão do Ensino................29
2.1.2- O Reduzido interesse pela instrução: um problema sempre presente.......30
2.2- A Revolução de 1930 e o seu resultado educacional....................................31
2.2.1- O Crescimento da demanda social da educação........................................33
2.3 – Crescimento e Expansão geral do Ensino....................................................35
2.4 – A Reforma Francisco Campos.....................................................................38
2.5 – A Reforma do Ensino Superior....................................................................39
2.5.1- O Aparecimento da Universidade no Brasil................................................39
2.6- O Estatuto das Universidades brasileiras........................................................40
2.7- As Lutas ideológicas em torno da Educação na 1ª fase do novo regime.........42
2.7.1- As Lutas ideológicas e o Manifesto dos pioneiros da Educação nova..........42
2.8- O conteúdo do Manifesto.................................................................................45
2.8.1- Educação e desenvolvimento.........................................................................45
2.9- Os Fundamentos do Movimento Renovador.....................................................47
89
2.9.1- Reivindicações contidas no Manifesto..........................................................47
2.9.2- Plano de Reconstrução e Desenvolvimento...................................................50
2.9.3- O Significado histórico do Manifesto............................................................51
2.9.4- As Vitórias e as derrotas do Movimento Renovador.....................................54
2.9.5- A Política Educacional dos últimos anos.......................................................57
2.9.5.1- A Educação brasileira após 64-síntese dos fatos........................................57
2.9.6- A Ajuda Interna para a educação brasileira....................................................62
2.9.6.1- A Ajuda Interna para a educação brasileira no atual estágio capitalista......62
2.9.7- A Crise da Educação brasileira no período 64/68...........................................71
2.9.7.1- Bases Sociais e econômicas da crise estudantil............................................71
2.9.8 – A Reforma Universitária.................................................................................74
2.9.9- O Novo Modelo e sua funcionalidade...............................................................76
CONCLUSÃO.............................................................................................................81
BIBLIOGRAFIA.........................................................................................................83
ÍNDICE........................................................................................................................84
90
FOLHA DE AVALIAÇÃO
UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
PROJETO A VOZ DO MESTRE
Pós Graduação: “Docência em Ensino Superior - Latu Sensu”
Título: FATORES ATUANTES NA EVOLUÇÃO DO SISTEMA EDUCACIONAL
BRASILEIRO
Data de Entrega: 29 de setembro de 2004
Auto Avaliação: Como você avaliaria esta monografia?
Avaliado por :________________________________Grau____________________
Rio de Janeiro, de de 2004