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1
Universidade
Católica de
Brasília
Virtual
PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO
LATO SENSU EM DIREITOS HUMANOS: PROTEÇÃO
A VÍTIMAS E A COLABORADORES DA JUSTIÇA
Especialização
TÍTULO
Autor:
Orientador: Prof. Msc. Thiago Bazi Brandão
BRASÍLIA 2010
0
JOSÉ LUIS V. LEAL
PARTICIPAÇÃO DA SOCIEDADE CIVIL NA CONSOLIDAÇÃO DA POLÍTICA
PÚBLICA DE PROTEÇÃO A VÍTIMAS E TESTEMUNHAS
Brasília
2010
Trabalho apresentado ao Programa de Pós-Graduação
Lato Sensu em Direitos Humanos – Proteção e
Assistência a Vítimas e a Colaboradores da Justiça, da
Universidade Católica de Brasília, como requisito
para obtenção do Título de Especialista em Direitos
Humanos.
Orientador: Prof. Msc. Thiago Bazi Brandão
Orientador: Prof. Msc. Thiago Bazi Brandão
Monografia apresentada a Pró-Reitoria de pós-
graduação Lato Sensu em Direitos Humanos:
proteção a vítimas e a colaboradores da justiça.
Universidade Católica de Brasília- UCB.
Orientador: Prof. Msc. Thiago Bazi Brandão
1
Trabalho de autoria de José Luís V. Leal intitulado “Participação da Sociedade Civil
na consolidação da política pública de proteção a vítimas e testemunhas”, requisito parcial
para obtenção do grau de especialista em Direitos Humanos, defendido e aprovado, em 21de
outubro de 2010, pela banca examinadora constituída por:
_____________________________________________
Prof. Msc. Thiago Bazi Brandão
Orientador
__________________________________________
Profª MSc. Marili Quadros Berbert Freire
Brasília
2010
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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
GAJOP - Assessoria Jurídica a Organizações Populares
CNAS - IV Conferência Nacional de Assistência Social
CF88 -.Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
CGPT - Coordenação-Geral de Proteção a Testemunhas
HIV -Vírus da Imunodeficiência Humana
LBA - Legião Brasileira de Assistência Social
LOAS - Lei Orgânica da Assistência Social
ONU Organização das Nações Unidas (ONU),
ONGs Organizações Não Governamentais (ONGs)
PNAS Política Nacional de Assistência Social (PNAS)
PNDH - Programa Nacional de Direitos Humanos
PNDH 3 Plano Nacional de Desenvolvimento Humano-3
PNDH - Programa Nacional de Direitos Humanos
PROVITA - Programa Federal de Assistência a Vítimas e Testemunhas Ameaçadas
SUAS Sistema Único de Assistência Social
SUS - Sistema Único de Saúde
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RESUMO
O estudo permeado por seu objetivo geral demonstra a participação da sociedade civil na
consolidação de políticas públicas de proteção a vítimas e testemunhas ameaçadas, Delineado
por seus objetivos específicos conceituou Estado, participação, sociedade civil e estabeleceu
relação entre Estado e participação da sociedade civil; demonstrou o papel da sociedade civil
e das políticas públicas no cenário brasileiro contemporâneo; e descreveu como a sociedade
civil participa do programa de Proteção de Assistência a Vítimas e a Testemunhas
Ameaçadas. Metodologicamente o estudo caracterizou-se como descritivo exploratório, se
apoiou em uma base teórica consistente, por meio da técnica bibliográfica, constituída pela
análise de textos publicados, tanto na literatura especializada, como em periódicos (impressos
e/ou disponibilizados na Internet). No capítulo I percebeu-se que o conceito ou definição de
Estado, se não esteve sempre presente na organização humana, é uma constante; que o
conceito de sociedade civil vem se consolidando nas últimas décadas, que a participação da
sociedade civil em se tratando de consolidação de políticas públicas de proteção deve ser
compreendida e analisada também pelos e nos espaços e processos históricos que as
comportam; e que o processo de definição de políticas públicas para uma sociedade reflete os
conflitos de interesses, os arranjos feitos nas esferas de poder que perpassam as instituições do
Estado e da sociedade como um todo. No capítulo II verificou-se que as políticas públicas são
compostas por políticas econômicas e sociais e têm no Estado o seu formulador e executor e
que a concepção de interação democrática construída entre os diversos órgãos do Estado e a
sociedade civil trouxe consigo resultados práticos em termos de políticas públicas e avanços
na interlocução de setores do poder público com toda a diversidade social, cultural, étnica e
regional que caracteriza os movimentos sociais brasileiro. No capítulo III viu-se o sentido
fundamental do PNDH-3, que com ele, aprofunda-se o compromisso do Estado com a
responsabilidade na realização dos Direitos Humanos onde o Estado está exposto cada vez
mais a variadas frentes de negociação com a sociedade civil, verificou-se também que o
PNDH-3 e o PROVITA são avanços, fundamentais, necessários, mas ainda insuficientes para
que se possa dizer que o Brasil tem uma política nacional de Direitos Humanos. Todos os
dados descritos no estudo levaram a concluir que historicamente a sociedade civil foi
construindo a sua participação junto às políticas públicas de proteção, e que o Estado e a
sociedade civil têm responsabilidades necessariamente compartilhadas.
Palavras - chave: Estado; Participação; Sociedade Civil; Políticas Públicas de Proteção;
Direitos Humanos.
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ABSTRACT
The study permeated by his general objective demonstrates the participation of the civil
society in the consolidation of public politics of protection to victims and threatened
witnesses, Outlined by his specific objectives it conceptualized State, participation, civil
society and established relation between State and participation of the civil society; it
demonstrated the paper of the civil society and of the public politics in the Brazilian
contemporary scenery; and it described like the civil society it announces of the program of
Protection of Presence the Victims and You witness it When They Were Threatened.
Metodologicamente was characterized the study like descriptive exploratório, rested on a
theoretical solid base, through the bibliographical technique constituted by the analysis of
published texts, both on the specialized literature, and in magazines (printed and / or available
in the Internet). In the chapter I it was realized that the concept or definition of State, one was
not always present in the human organization, it is the constant one; that the concept of civil
society comes if consolidating in the last decades, that the participation of the civil society in
treating consolidation of public politics of protection must be understood and analysed also
for and in the spaces and historical processes that hold them; and that the process of definition
of public politics for a society reflects the conflicts of interests, the arrangements done in the
spheres of power that go by the institutions of the State and of the society as a whole. In the
chapter one checked II that the public politics is composed by economical and social politics
and has in the State his formulador and executioner and that the conception of democratic
interaction when several organs of the State were built between and the civil society brought
with you practical results in terms of public politics and advancements in the interphrase of
sectors of the public power with the whole social, cultural, ethnic and regional diversity that
characterizes the social movements Brazilian. In the chapter III saw himself the basic sense of
the PNDH-3, that with him, the promise of the State goes deeper with the responsibility into
the realization of the Human rights where the State is exposed more and more to varied fronts
of negotiation with the civil society. One checked also that the PNDH-3 and the healthy
PROVITA advancements, basic, necessary, but still insufficient so that it is possible to be said
that Brazil has a national politics of Human rights. All the data described in the study took
ending that historically the civil society was building his participation near the public politics
of protection, and that the State and the civil society have necessarily shared responsibilities.
Words - key: When it was; Participation; Civil Society; Public Politics of Protection; Human
rights.
5
SUMÁRIO
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS................................................................. iii
RESUMO....................................................................................................................... iv
ABSTRACT.................................................................................................................. v
INSTRODUÇÃO......................................................................................................... 07
CAPÍTULO I - ESTADO E SOCIEDADE CIVIL.................................................. 11
1.1 ESTADO.................................................................................................................. 11
1.2 SOCIEDADE CIVIL.............................................................................................. 13
1.3 PARTICIPAÇÃO.................................................................................................... 17
1.4 ESTADO E PARTICIPAÇÂO DA SOCIEDADE CIVIL................................... 19
CAPÍTULO II - SOCIEDADE CIVIL E POLÍTICAS
PÚBLICAS NO CENÁRIO BRASILEIRO CONTEMPORÂNEO....................... 21
2.1 POLÍTICAS PÚBLICAS......................................................................................... 21
2.2 POLÍTICAS PÚBLICAS SOCIAL......................................................................... 22
2.3 SOCIEDADE CIVIL E POLÍTICAS PÚBLICAS SOCIAIS .............................. 26
CAPÍTULO III - PARTICIPAÇÃO DA SOCIEDADE CIVIL NOS
PROGRAMAS DE PROTEÇÃO DE ASSISTÊNCIA A VÍTIMAS
E A TESTEMUNHAS AMEAÇADAS...................................................................... 31
3.1 DIREITOS HUMANOS.................................................................................... ...... 31
3.2 GARANTIA DE DIREITOS - VÍTIMAS DE CRIMES E DE PROTEÇÃO DAS
PESSOAS AMEAÇADAS............................................................................................. 34
3.3 PERSPECTIVAS FUTURAS.................................................................................. 40
CONCLUSÃO............................................................................................................... 43
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................................... 44
7
INTRODUÇÃO
Este estudo demonstra a participação da sociedade civil na consolidação de
políticas públicas de proteção a vítimas e testemunhas ameaçadas, tendo em vista que a
evolução da humanidade, a criação do Estado e suas diferentes facetas sempre
representaram temas de grande relevo para as Ciências Sociais e Humanas e entre os
teóricos sempre tiveram um ponto comum de análise: o ser e o agir da sociedade civil.
A proteção a vítimas e testemunhas ameaçadas é algo de fundamental
importância para o desenvolvimento das investigações policiais, para a instrução
processual e para a diminuição da impunidade. Constitui preocupação dos especialistas
desde o final do Século XIX, operando-se, a partir de meados do século passado, um
movimento no sentido de sua redescoberta e revalorização. Este movimento, assumindo
proporções de verdadeira descoberta científica, busca reverter um longo período da
história, no qual a vítima foi quase inteiramente esquecida na etiologia do crime e nas
relações jurídicas dele decorrentes, reclamando o reconhecimento do papel que ela
desempenha na explicação do fato criminoso, na sua prevenção e na resposta do sistema
legal.
A proposta de implementação de serviços específicos de atendimento de vítimas
e testemunhas ameaças foi originariamente prevista no Programa Nacional de Direitos
Humanos (PNDH) em 1996. Surgiu da necessidade de luta contra a impunidade e
estabeleceu a meta de apoiar a criação nos Estados programas que fazem parte das
políticas públicas de cunho social que foram construídas ao longo do desenvolvimento
da ordem burguesa, com a emergência do Estado-Nação a partir do século XVI. Elas
referem - se a ações que determinam o padrão de proteção social implementado pelo
Estado, voltadas, em princípio, para a redistribuição dos benefícios sociais visando à
diminuição das desigualdades estruturais produzidas pelo desenvolvimento
socioeconômico.
O marco de institucionalização do processo de implementação do programa de
proteção de vítimas e testemunhas de crimes expostas, ocorreu com a promulgação, em
13 de julho de 1999 da Lei nº 9.807. A Lei inovou ao estabelecer normas para a
organização de programas estaduais instituindo no âmbito da Secretaria Nacional de
Direitos Humanos, o Programa Federal de Assistência a Vítimas e Testemunhas
Ameaçadas (PROVITA) - programa de reinserção social de pessoas em situação de
risco em novos espaços comunitários de forma sigilosa, que conta com a efetiva
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participação da sociedade civil na construção de uma rede solidária de proteção. Neste
processo foram definidos: Modo de Funcionamento, Sistema Nacional de Assistência a
Vítimas e Testemunhas, e as estruturas dos Programas de Proteção.
O PROVITA se operacionaliza por meio de estruturas previstas na Lei nº
9.807/99: Órgão executor, Equipe Técnica e Conselho Deliberativo que é um órgão
colegiado, com representantes do Ministério Público, do Poder Judiciário e de outros
órgãos públicos e entidade da sociedade civil com destacada atuação na área de direitos
humanos ou de segurança pública.
No Estado do Paraná o PROVITA é executado por uma entidade da sociedade
civil que tem se organizado no sentido de buscar uma melhoria na qualidade de vida e
especialmente na garantia dos seus direitos individuais e coletivos. Esse processo vem a
algum tempo obtendo conquistas e qualificando a discussão e até mesmo acesso às
políticas públicas de um modo geral.
Atualmente existem muitos entraves na execução do PROVITA pela sociedade
civil que poderia não somente participar do Conselho Deliberativo, mas também na
execução do programa e na garantia de autonomia deste frente à cultura organizacional
do Estado. No entanto quando se fala em garantir as políticas de proteção o Estado deve
estar presente de forma a garantir uma estrutura para a existência dessas políticas, e
quando se fala em implementação dessas políticas há de se considerar a participação da
sociedade civil, e a garantia de uma estrutura independente para a efetivação dessas
políticas. Mediante o exposto questiona-se: Qual é a participação da sociedade civil
na consolidação de políticas públicas de proteção a vítimas e testemunhas
ameaçadas?
No intuito de responder ao questionamento efetuado este estudo foi realizado.
Permeada por seu objetivo geral o estudo demonstra a participação da sociedade civil na
consolidação de políticas públicas de proteção a vítimas e testemunhas ameaçadas.
Delineado por seus objetivos específicos conceitua Estado, participação e sociedade
civil e estabelece relação entre Estado e participação da sociedade civil; demonstra o
papel da sociedade civil e das políticas públicas no cenário brasileiro contemporâneo; e
descreve como a sociedade civil participa do programa de Proteção de Assistência a
Vítimas e a Testemunhas Ameaçadas.
O estudo justifica-se primeiro porque existe uma necessidade de novos estudos
sobre políticas públicas, a medida que se buscam novas formas de concretização dos
direitos humanos, em particular dos direitos sociais.
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Em segundo, porque a definição dos papeis do Estado e da sociedade civil são
fundamentais para garantir a proteção à vida de vítimas e testemunhas ameaçadas de
morte, visto que a sociedade civil, através dos tempos, veio se organizando no Brasil
para a garantia de proteção aos direitos humanos e à vida, e como políticas públicas de
proteção são fruto dessa trajetória histórica.
Em terceiro, porque clarificar o papel da sociedade civil e sua participação na
consolidação de políticas públicas de proteção contribuirá com a ampliação de
programas de proteção, na sensibilização da sociedade como um todo nos processos de
garantia dos Direitos Humanos; no aumento da consciência coletiva; e na credibilidade
das políticas de proteção.
Em quarto lugar, porque o estudo contribuirá para com o processo de
implementação de novas políticas de proteção onde ainda não foram implementadas por
falta de compreensão de gestores públicos, ou pela falta de clareza do papel da
sociedade civil neste processo.
Metodologicamente o estudo caracteriza-se como descritivo exploratório, e se
apóia em uma base teórica consistente por meio da técnica bibliográfica constituída pela
análise de textos publicados, tanto na literatura especializada, como em periódicos
(impressos e/ou disponibilizados na Internet).
O trabalho foi organizado em itens. O primeiro apresenta a Introdução. O
segundo apresenta o desenvolvimento do estudo e foi dividido em capítulos.
O primeiro capítulo denominado de Estado e Sociedade Civil esclarece os
conceitos e definições de Estado, sociedade civil, participação, e estabelece relação
entre Estado e participação da sociedade civil. Os termos salientados são considerados
fundamentais para o estudo, tendo em vista que existem concepções inteiramente
diferentes, e um esclarecimento do sentido destes conceitos é muito importante para que
se evitem ambigüidades no entendimento da relação existente entre Estado e sociedade
civil na consolidação de políticas públicas de proteção a vítimas e testemunhas
ameaçadas.
O segundo capítulo intitula-se de Estado, Sociedade Civil e Políticas Públicas no
Cenário Brasileiro Contemporâneo - discorre sobre as políticas públicas, políticas
públicas sociais e participação da sociedade civil nas políticas públicas sociais.
O terceiro capítulo - Participação da Sociedade Civil nos Programas de Proteção
de Assistência a Vítimas e a Testemunhas Ameaçadas descreve como o Estado tem
procurado articular o interesse de participação existente na sociedade civil de modo a
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garantir uma maior consolidação das políticas públicas formuladas nos programas de
proteção de Direitos Humanos.
O último item - Conclusão - apresenta os argumentos mais relevantes,
considerados pelo autor do trabalho, no entendimento da participação da sociedade civil
na consolidação de políticas públicas de proteção a vítimas e testemunhas ameaçadas.
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CAPÍTULO I - ESTADO E SOCIEDADE CIVIL
Este capítulo esclarece os conceitos e definições de Estado, sociedade civil,
participação, e estabelece relação entre Estado e participação da sociedade civil. Termos
considerados fundamentais para o estudo, tendo em vista que existem concepções
inteiramente diferentes e um esclarecimento do sentido destes conceitos é muito
importante para que se evitem ambigüidades no entendimento da relação existente entre
Estado e sociedade civil na consolidação de políticas públicas de proteção a vítimas e
testemunhas ameaçadas.
1.1 ESTADO
Os direitos humanos são os direitos de todos e devem ser protegidos em todos
Estados e nações. São direitos fundamentais de todas as pessoas, sejam elas mulheres,
negros, homossexuais, índios, idosos, pessoas portadoras de deficiências, populações de
fronteiras, estrangeiros e emigrantes, refugiados, portadores de Vírus da
Imunodeficiência Humana, (sigla do inglês - Human Immunodeficiency Vírus (HIV)
positivo, crianças e adolescentes, policiais, presos, despossuídos e os que têm acesso a
riqueza.
É evidente que a efetividade dos direitos humanos está condicionada à
configuração de um ambiente sócio - cultural que lhes seja favorável, não menos
verdadeira é a perspectiva de que a materialização dos direitos humanos só pode resultar
de um quadro sócio-político no qual o Estado tenha um papel relevante.
O Estado é que confere a realidade jurídica e que tem a responsabilidade de
assegurar sua presença como fator balizador do convívio entre os seres humanos,
inclusive ao fomentar iniciativas que possibilitem o florescimento de uma cultura de
respeito aos direitos humanos.
A palavra Estado provém do grego polis (cidade-estado). De polis advém o
conceito de política, que é a ciência de governar a cidade (CREMONESE, 2010, p.1).
Segundo Dallari (1995) a denominação etimológica de Estado tem origem latina, status,
que significa estar firme, significando situação permanente de convivência e ligada à
sociedade política aparecendo pela primeira vez em O Príncipe, de Maquiavel, escrito
em 1513. “Portanto, o conceito de Estado, na forma que se entende atualmente, é
recente, é uma definição moderna” (CREMONESE, 2010, p.1).
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O Estado é uma sociedade que se constitui essencialmente de um grupo de
indivíduos unidos e organizados, permanentemente, para realizar um objetivo comum.
Para Azambuja (1971) essa sociedade política é determinada por normas de direito
positivo, é hierarquizada na forma de governantes e governados e tem como finalidade o
bem público. “O Estado emerge na tentativa de superar o instinto natural do homem e
implantar definitivamente a sociedade política. O instinto social leva ao Estado, que a
razão e a vontade cria e organiza” (AZAMBUJA 1971, in. CREMONESE, p.1).
Não existe uma definição única de Estado. Há vários autores, cada um com uma
concepção ou doutrina diferente. Entre tantos se podem citar: Maluf (1995 in.
CREMONESE, 2010):
Estado é o órgão executor da soberania nacional (...). O Estado é apenas uma
instituição nacional, um meio destinado à realização dos fins da comunidade
nacional... O Estado é uma sociedade política necessária, dotada de um
governo soberano, a exercer seu poder sobre uma população, dentro de um
território bem definido, onde cria, executa e aplica seu ordenamento jurídico,
visando o bem comum.
Filomeno (1997, p.18) “o Estado deve estar a serviço do homem... O Estado é
mero instrumento para a realização do homem, tendo em vista sua fragilidade e
impossibilidade de bastar-se a si mesmo (...)". Menezes (1996 in. CREMONESE, 2010,
p.2) ”Estado é uma sociedade de homens, fixada em território próprio e submetida a um
governo que lhe é originário (...) o Estado é uma pessoa politicamente organizada da
nação em um país determinado (...)”. Semeraro (2001, p. 75) “Estado é todo o conjunto
de atividades teóricas e práticas com as quais a classe dirigente justifica e mantém não
somente a sua dominação, mas, também, consegue manter o consenso ativo dos
governados”. Cremonese (2010, p.3) “Estado é um conjunto de instituições
especializadas em expressar um dado equilíbrio e uma condensação de forças favoráveis
a um grupo e ou uma classe social”.
Neste estudo, considerando-se os conceitos e definições citadas, define-se Estado como
o conjunto de instituições permanentes – como órgãos legislativos, tribunais, exército e outras
que possibilitam a ação do governo; e Governo, como o conjunto de programas e projetos que
parte da sociedade (políticos, técnicos, organismos da sociedade civil e outros) propõe para a
sociedade como um todo, configurando-se a orientação política de um determinado governo que
assume e desempenha as funções de Estado por um determinado período. Considera-se também
que fazem parte do Estado, uma população, um território, um governo independente dos
demais Estados. “Cada elemento é essencial, não pode existir Estado sem um deles. O
13
elemento humano do Estado é sempre um povo, ainda que com ideais e aspirações
diferentes” (COUTINHO, 1981, p. 93). Os elementos que constituem o Estado, segundo
Maluf (1995 in. CREMONESE, 2010) são os materiais compostos pela população e
território; os elementos formais constituídos por um governo soberano (poder) e um
ordenamento jurídico; e o elemento final, o bem comum. “O bem comum é o fim último
do Estado. Não se admite a existência do Estado sem este fim específico”
(VERONESE, 2010, p.4)
Para Semeraro (2001) o Estado resulta da composição de elementos políticos e
sociais; da força das instituições e da liberdade dos organismos privados; da inter-
relação entre estrutura e superestrutura; da compenetração do aparelho estatal com a
sociedade civil organizada.
Em síntese, percebe-se que o conceito ou definição de Estado, se não esteve
sempre presente na organização humana, é uma constante, à medida que cresce o grau
de abrangência populacional e conseqüente complexidade das organizações da
sociedade civil.
1.2 SOCIEDADE CIVIL
Atualmente, é impossível ter uma conversa sobre política pública de proteção
sem que alguém cite as palavras mágicas "sociedade civil", assim se poderia pensar que
as pessoas são claras no que querem dizer quando usam este termo e por isso é tão
importante. Infelizmente, clareza e rigor são notáveis por sua ausência no debate da
sociedade civil, a falta de precisão que ameaça submergir sobre o tema que está
completamente sob uma maré crescente de críticas e confusões.
A sociedade civil surge na história do pensamento político com concepções
diferentes, até porque o termo aparece em línguas diferentes e nem sempre a tradução
de uma
para outra é uma tradução intacta. A expressão “civil society”, ou seja, sociedade civil
aparece pela primeira vez, no pensamento dos contratualistas ingleses, particularmente
em Hobbes e Locke. Em ambos, existe a idéia de que os homens viviam em estado da
natureza, em estado, de certo modo, pré-social e, certamente pré-estatal, enfim, em
estado de guerra. “Assim, os homens criam, através de um contrato, um governo que
garante segurança à propriedade e elimina o estado de natureza”. “É, a esta sociedade,
como um governo, que eles chamam de sociedade civil”.
14
Segundo Bobbio (1987), o termo sociedade civil já havia sido usado
anteriormente por Aristóteles, mas é o conceito recebido dos jusnaturalistas que se
reconheceu como sendo a acepção original de sociedade civil. Na visão dos
jusnaturalistas, que baseavam suas teorias principalmente na dicotomia estado natureza/
estado civil, a sociedade civil significava justamente este último, como sinônimo de
estado politicamente organizado, em oposição à sociedade pré-estatal. Este sentido é
plenamente visível em Kant "o oposto do estado de natureza não é o estado social, mas
o estado civil, porque pode muito bem existir sociedade no estado de natureza, mas não
uma sociedade civil" (KANT in. BOBBIO 1992, p.27). O mesmo depreende-se dos
ensinamentos de Hobbes (1992, p.119):
A união assim feita diz-se uma cidade, ou uma sociedade civil, ou ainda uma
pessoa civil; pois, quando de todos os homens há uma só vontade, esta deve ser
considerada como uma pessoa, e pela palavra uma deve ser conhecida e
distinguir-se de todos os particulares, por ter ela seus próprios direitos e
propriedades.... Uma cidade, portanto, assim como a definimos, é uma pessoa
cuja vontade, pelo pacto de muitos homens, há de ser recebida como sendo a
vontade de todos eles...
Este conceito foi aos poucos se fragilizando, principalmente após Maquiavel,
“onde pode ser notada certa diferenciação do clássico conceito Estado-sociedade para a
definição de um Estado - máquina” (BOBBIO, 1992, p.50). Mas, foi com Hegel que o
conceito de sociedade civil deixou de identificar-se com o Estado, representando apenas
um momento em sua formação. “Hegel inovou ao conceituar a sociedade civil como
sinônimo de sociedade pré-política, já delineando certa inversão do conceito empregado
pelos jusnaturalistas” (MARX, 2006).
Mas, segundo Ivan Claudio Marx (2006), a completa inversão do conceito
opera-se, de fato, em Marx, para quem a sociedade civil coincide com a sociedade
burguesa Em Marx, a sociedade civil é apenas um mundo das relações mercantis. A
administração da justiça, a polícia, o sindicato fazem parte da superestrutura, de outro
nível da ordem social. Max estende seu sentido a toda a vida social pré-estatal,
colocando-a no plano da estrutura (relações materiais e econômicas). Este trecho define
claramente o pensamento de Marx (in.: BOBIO, 1982, p. 31).
A forma determinada de relações das forças produtivas existentes em todos
os estágios históricos que se sucederam até hoje, e que por sua vez as
determina, é a sociedade civil [...]. Já se pode ver aqui que essa sociedade
civil é o verdadeiro centro, o teatro de toda história; e pode-se ver como é
absurda a concepção da história até hoje corrente, que se limita às ações de
líderes e de Estados e deixa de lado as relações reais [...]. a sociedade civil
compreende todo o conjunto das relações materiais entre os indivíduos, no
15
interior de um determinado grau de desenvolvimento das forças
produtivas(...).
Dessa forma, ocorreu uma completa inversão do conceito de sociedade civil, que
deixa de significar o Estado em contraposição à sociedade pré-estatal, assumindo o
sentido desta, em oposição ao Estado. Em Marx a Sociedade civil é definida em termos
muito parecidos com os utilizados pelos jusnaturalistas para definir o Estado de
natureza: "O Estado moderno tem como sua base natural a sociedade civil, ou seja, o
homem independente, unido a outro homem somente pelo vínculo do interesse privado
e pela inconsciente necessidade natural" (MARX in. BOBBIO et al, 1992, p.1209). “A
sociedade civil representa a estrutura, a base, o teatro de toda história, sobre a qual se
ergue uma superestrutura política e jurídica” (id. ibidem). No entanto, desde Marx até a
e primeira década do século XXI, houve muitas transformações, tanto na esfera social
quanto estatal. Nos dizeres de Bobbio et al ( 1992, p. 1210):
(...) A sociedade civil é representada como o terreno dos conflitos econômicos,
ideológicos, sociais e religiosos que o Estado tem a seu cargo resolver,
intervindo como mediador ou suprimindo-os; e como a base da qual partem as
solicitações às quais o sistema político está chamado a responder; como o
campo das várias formas de mobilização, de associação e de organização das
forças sociais que impelem à conquista do poder político.
Complementando essa concepção, segundo Bobbio (1987) ainda surgem dois
fenômenos interessantes ocorridos no último século: os processos inversos, de tentativas
de absorção da sociedade pelo Estado, e de absorção do Estado pela sociedade.
Embora os pensamentos de Marx tenham influenciado o Estado na condução de
suas políticas, foi Antonio Gramsci quem introduziu o conceito de sociedade civil no
debate contemporâneo quando usou a expressão “società civile” para definir uma esfera
do ser social nova no desenvolvimento histórico. Sociedade civil, em Gramsci, não é o
mundo das relações mercantis, a isso ele chama de sociedade econômica. Não é o
mundo do Estado strictu sensu, que ele chama de sociedade política. Sociedade civil é a
esfera da auto-organização, da representação de interesses, que se torna tanto mais
complexa e rica na medida em que existe uma crescente socialização da participação
política, seja por meio do sufrágio universal, da criação de partidos políticos, ou da
legalização dos sindicatos de massa.
Para Gramsci, a sociedade civil é um terreno de luta, ela pode ser hegemonizada
pela direita e pela esquerda, visando mudar as relações de poder da sociedade e,
finalmente, fazer com que o projeto hegemônico se aproprie do Estado e programe uma
16
política que pode ser de conservação ou de transformação radical. O conceito de
sociedade civil respaldado nos pressupostos de Gramsci teve uma força grande no
Brasil, em meados dos anos 70 correspondendo a um momento em que a sociedade civil
brasileira estava crescendo a oposição à ditadura aumentando, no momento também em
que a esquerda foi obrigada a fazer uma dura autocrítica de suas posições anteriores,
sobretudo sobre a luta armada.
Nas décadas pós 70 a sociedade civil, como conceito da ciência política, passou
a designar a diversidade de pessoas com status de cidadão, que atuam, geralmente de
forma coletiva, para tomar decisões no âmbito público de sua sociedade, por fora das
estruturas governamentais e recentemente surgiu um novo conceito de sociedade civil
que a identifica com o terceiro setor. Aqui se têm a economia, o mercado, e para o
pensador liberal burguês, economia é evidentemente de mercado, e o Estado. Entre o
mercado e o Estado existe o terceiro setor, o reino do voluntariado. E freqüentemente, a
sociedade civil, além de ser confundida com terceiro setor, também é confundida com a
sociedade de mercado.
De acordo com Avritzer (1994), o surgimento da sociedade civil no Brasil
associa-se a três fenômenos fundamentais: ao surgimento de atores sociais modernos e
democráticos; à retomada da idéia, realizada por esses autores, de constituição de um
espaço intermediário entre estado e sociedade e à constituição de estruturas legais
apropriadas para a institucionalização das reivindicações da sociedade civil. Os dois
primeiros fenômenos estão vinculados ao surgimento de novos atores sociais,
decorrência do rápido processo de modernização por que passou a sociedade brasileira
durante o regime militar. Nesse processo verifica-se não apenas um crescimento
quantitativo de novos atores, mas também que esses novos atores constituiu-se social,
cultural e politicamente de maneira diferenciada, na medida em que a urbanização
crescente provocou a introdução de novos hábitos. Ao lado da constituição de um
associativismo civil urbano, outros dois movimentos exerceram um papel fundamental
nesse processo, trata-se do novo sindicalismo e do associativismo profissional de classe
média.
Para Ivan Claudio Marx (2006), apesar de modernamente o conceito de
sociedade civil ser vislumbrado em antagonismo ao conceito estatal, esta separação já
não se apresenta com a mesma nitidez existente ao tempo dos escritos marxistas.
"Enquanto no século XIX, na perspectiva do liberalismo clássico havia uma nítida
separação entre o Estado e a sociedade civil, no século XX esta linha divisória deixou
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de ser tão nítida" (CAMPILONGO, 1998, p.46). De acordo com Bobbio (1987) sob
este aspecto, sociedade civil e Estada atua como dois momentos necessários, separados,
mas contíguos, distintos, mas interdependentes, do sistema social em sua complexidade
e em sua articulação interna.
Em síntese, o conceito de sociedade civil vem se consolidando nas últimas
décadas, e passa a ser visto simultaneamente como uma meta para a finalidade, um meio
para alcançá-lo, e um quadro de envolvimento com o outro, sobre meios e fins. Quando
esses três integrarem as suas diferentes perspectivas, em um quadro de apoio mútuo, o
conceito de sociedade civil poderá explicar muita coisa sobre o curso da política e
mudança social. Esta situação contribuirá sobremaneira para criar um novo cenário no
processo de formulação, implementação e consolidação de políticas públicas de
proteção a vítimas e testemunhas ameaçadas, um direito do ser humano.
1.3 PARTICIPAÇÃO
O debate teórico-conceitual que gira em torno do tema da participação da
sociedade civil, segundo Nogueira (2004) tem uma longa tradição de estudos e análises,
comportando diferentes conceitos e definições. Soma-se a isso o fato de que na
contemporaneidade, as possibilidades de ampliação e fortalecimento da democracia
parecem vislumbrar uma direção comum: a participação de atores sociais múltiplos na
tomada de decisões políticas.
Nesse sentido, ao se falar em participação da sociedade civil, é imprescindível
explicitar as diferenças que o termo comporta. Essas diferenças se acentuam ainda mais
ao se discutir o significado que lhes é atribuído não só a partir de concepções teóricas,
mas, também da época e da conjuntura histórica em que se apresentam.
Para Tatagiba (2003), os princípios da participação ganham contornos muito
diferenciados, dependendo dos estilos de gestão dos governos aos quais estão
subordinadas as experiências participativas. E, ainda podem expressar os diferentes
“[...] graus de consciência política coletiva, a depender do maior ou menor grau de
maturidade, homogeneidade e organicidade dos grupos sociais” (GRAMSCI, apud
NOGUEIRA, 2004, p. 130).
18
As diversas formas de se interpretar a participação deram origem aos paradigmas
analíticos: liberal (comunitária e corporativa); autoritário (de direita e de esquerda);
revolucionário (gradual ou por ato de força); e o democrático radical.
De maneira bem sucinta, pode - se dizer que na interpretação liberal a
participação, em função de sua base nos princípios do liberalismo, tem como objetivos
principais a reforma da estrutura da democracia representativa e a melhoraria da
qualidade desta nos marcos das relações capitalistas. Dentro desse princípio de
democracia, “todos os membros da sociedade são iguais e a participação seria o meio, o
instrumento de busca de satisfação dessas necessidades” (GOHN, 2001, p. 56).
Na concepção corporativa de participação ela é um movimento espontâneo dos
indivíduos. Há um sentimento de concordância com certa ordem social que cria algo
superior chamado bem comum. Esse bem comum é o núcleo articulador dos indivíduos.
“Tal concepção busca articular o processo participativo com a existência de
organizações na sociedade, supondo que as organizações existem apenas quando as
pessoas participam” (GOHN, 2001, p. 1207).
No paradigma comunitário, a participação é caracterizada por uma forma
institucionalizada, pois concebe o fortalecimento da sociedade civil em termos de
integração dos órgãos representativos da sociedade aos órgãos deliberativos e
administrativos do Estado. Resulta que os grupos organizados devem participar no
interior dos aparelhos de poder estatal, de forma que as esferas do público e do privado
se fundem.
Na forma autoritária, a participação tem como princípios a integração e o
controle social e político. Para Gohn (2001) essa forma pode ocorrer tanto em regimes
políticos autoritários de massa, e em regimes democráticos representativos. Neste
último caso, a participação é de natureza cooptativa e a arena participativa associa-se às
políticas públicas, quando se estimula, de cima para baixo, a promoção de programas
que visem a apenas diluir os conflitos sociais. E, por fim, têm-se as formas de conceber
a participação democrática: as revolucionárias e a democrática radical. Esta representa a
fusão das duas formas anteriores. De acordo com (GOHN, 2001, p. 1208):
Nesse modelo democrático, a soberania popular é seu princípio regulador: a
participação é concebida como um fenômeno que se desenvolve tanto na
sociedade civil – em especial entre os movimentos sociais e as organizações
autônomas da sociedade como no plano institucional – as instituições formais
políticas.
19
Conforme Nogueira (2004), a participação da sociedade civil, como uma prática
ética e política, “um meio de se fazer presente no conjunto da vida coletiva, de disputar
seu governo e de postular a hegemonia, a direção intelectual e moral da sociedade”
(GRAMSCI, apud NOGUEIRA, 2004, p. 140) nem sempre produziu o resultado de
maior participação no sentido explicitado.
Em síntese a participação da sociedade civil em se tratando de consolidação de
políticas públicas de proteção deve ser compreendida e analisada também pelos e nos
espaços e processos históricos que as comportam.
1.4 ESTADO E PARTICIPAÇÂO DA SOCIEDADE CIVIL
A relação entre Estado e participação sociedade civil na perspectiva do
pensamento liberal é compreendida a partir de uma relação dicotômica em que o Estado
é entendido como aparato da administração pública, e a sociedade civil como um
sistema estruturado de relações de pessoas privadas.
A partir desta concepção, a democracia é vista como um instrumento de gestão,
e a participação da sociedade civil é a forma de reduzir os custos do Estado. Já no
pensamento crítico, principalmente a partir da contribuição de Gramsci, a concepção de
Estado é dialética, Estado e sociedade são pensados como dois momentos de um mesmo
processo.
De acordo com Nogueira (2004) o Estado é um aparato de dominação.
Condensa as relações sociais e age em conformidade com as classes que dominam a
economia e que sustentam um projeto de hegemonia. Mas é também essencialmente um
campo de disputas, no qual a correlação de forças, a movimentação social e a
organização política têm papel decisivo.
Ao deslocar a sociedade civil da infra-estrutura para a superestrutura, conforme
Nogueira (2004), Gramsci amplia o conceito de Estado, na medida em que adiciona
elementos da sociedade civil e da sociedade política ao conceito de Estado. Em sua
base, a do Estado ampliado, está uma relação dialética de identidade-distinção entre a
sociedade civil e sociedade política: “[...] duas esferas da superestrutura, distintas e
relativamente autônomas, mas inseparáveis na prática” (SEMERARO, 2001, p. 74).
No que se refere à materialidade, Coutinho (2003) ressalta que a sociedade
política tem seus portadores nos aparelhos repressivos de Estado e a sociedade civil os
tem nos aparelhos privados de hegemonia. No dizer de SEMERARO (2001, p. 74):
20
A sociedade civil, ao compreender os organismos privados e voluntários, como
os partidos políticos, as diversas organizações sociais, os meios de
comunicação, as escolas, as igrejas, as empresas, etc., [...] se caracteriza pela
elaboração e difusão das ideologias e dos valores simbólicos que visam à
„direção. Já a sociedade política, ao compreender instituições mais públicas,
como o governo, a burocracia, as forças armadas, o sistema judiciário, o
tesouro público, etc., se caracteriza pelo [...] conjunto dos aparelhos que
concentram o monopólio legal da violência e visa a dominação.
Dentro dessa perspectiva, “um grupo social manifesta sua supremacia e se
mantém no domínio de duas maneiras: como “dominação” e como “direção intelectual”
(SEMERARO, 2001, p. 76)”.
Na visão de Janoski (1998) a sociedade civil representa uma esfera de discurso
público dinâmico e participativo entre o Estado, a esfera pública composta de
organizações voluntárias e a esfera do mercado referente a empresas privadas e
sindicatos. Para Edwar (2005) como esfera pública a sociedade civil se torna a arena de
discussão e deliberação, de associação e colaboração institucional, e na medida em que
tais espaços prosperaram, é crucial para a democracia, o interesse público
inevitavelmente sofre.
Em síntese, a dinâmica da sociedade civil tem reflexos no Estado, e juntos
compõem uma totalidade, donde não se pode pensar o Estado sem a sociedade civil e
vice - versa.
21
CAPÍTULO II - ESTADO SOCIEDADE CIVIL E POLÍTICAS PÚBLICAS NO
CENÁRIO BRASILEIRO CONTEMPORÂNEO
Este capítulo aborda a sociedade civil e as políticas públicas no cenário
brasileiro contemporâneo, tendo em vista que as noções de Estado, sociedade civil,
participação e políticas públicas sociais mantêm entre si uma estreita relação.
2.1 POLÍTICAS PÚBLICAS
As políticas públicas constituem uma temática oriunda da ciência política. Na
política pública está a vontade coletiva da sociedade civil expressa em normas
obrigatórias. Elas representam os instrumentos de ação dos governos, numa clara
substituição dos "governos por leis" pelos "governos por políticas”. São "programas de
ação governamental visando a coordenar os meios à disposição do Estado e as
atividades privadas, para a realização de objetivos socialmente relevantes e
politicamente determinados" (BUCCI, 2002, p. 241).
Para Cristovam (2005) as políticas públicas podem ser entendidas como o
conjunto de planos e programas de ação governamental voltados à intervenção no
domínio social, por meio dos quais são traçadas as diretrizes e metas a serem
fomentadas pelo Estado, sobretudo na implementação dos objetivos e direitos
fundamentais dispostos na Constituição. O fundamento mediato e “fonte de justificação
das política pública é o Estado social, marcado pela obrigação de implemento dos
direitos fundamentais positivos, aqueles que exigem uma prestação positiva do Poder
Público” (BUCCI, 1996, P. 135).
De acordo com Bucci (1996, p. 137) as políticas públicas funcionam como
instrumentos de aglutinação de interesses em torno de objetivos comuns, que passam a
estruturar uma coletividade de interesses. Em outras palavras:
Toda política pública é um instrumento de planejamento, racionalização e
participação popular. Os elementos das políticas públicas são o fim da ação
governamental, as metas nas quais se desdobra esse fim, os meios alocados
para a realização das metas e, finalmente, os processos de sua realização.
As políticas públicas, nesse estudo, são entendidas como o “Estado em ação”
(GOBERT & MULLER, 1987 apud HÖFLING, 2001, p. 35). É o Estado implantando
um projeto de governo, por meio de programas, de ações voltadas para setores
específicos da sociedade. As políticas públicas são aqui compreendidas como as de
22
responsabilidade do Estado – quanto à implementação e manutenção a partir de um
processo de tomada de decisões que envolvem órgãos públicos e diferentes organismos
e agentes da sociedade civil relacionados à política implementada. Já, as políticas
públicas sociais se referem a ações que determinam o padrão de proteção social implementado
pelo Estado, voltadas, em princípio, para a redistribuição dos benefícios sociais visando à
diminuição das desigualdades estruturais produzidas pelo desenvolvimento socioeconômico.
Em síntese, o processo de definição de políticas públicas para uma sociedade
reflete os conflitos de interesses, os arranjos feitos nas esferas de poder que perpassam
as instituições do Estado e da sociedade como um todo.
2.2 POLÍTICAS PÚBLICAS SOCIAL
As políticas públicas são compostas por políticas de cunho social e econômico e
foram construídas ao longo do desenvolvimento da ordem burguesa, com a emergência
do Estado-Nação a partir do século XVI. Elas referem - se a ações que determinam o
padrão de proteção social implementado pelo Estado, voltadas, em princípio, para a
redistribuição dos benefícios sociais visando à diminuição das desigualdades estruturais
produzidas pelo desenvolvimento socioeconômico.
De acordo com Santos (1987) o padrão brasileiro de políticas sociais baseou-se
na cidadania regulada, isto é, tinham acesso à proteção social somente aqueles que
detivessem a carteira de trabalho, com profissão e sindicato reconhecidos pelo Estado.
Aqueles que não detinham a carteira de trabalho e/ou questionassem a ordem vigente
eram tratados com violenta repressão estatal. Este padrão de política social subjugada à
política econômica atravessou: o governo e a ditadura Vargas (1930/1945) onde Estado
criou grandes instituições, como a
Legião Brasileira de Assistência Social (LBA)
política social de assistência cunhada pela ótica do favor e a serviço da manutenção da
miséria e dos interesses das elites brasileiras; o período populista (1946/1963); a longa
ditadura militar (1964/1984) e só foi modificado com a promulgação da Constituição
da República Federativa do Brasil de 1988 (CF88).
Segundo Pereira (2010) historicamente, no Brasil, a assistência social foi
detida pelas instituições religiosas e utilizada como moeda de troca política, com o
poder dos coronéis onde o processo de constituição da cidadania foi marcado pela
restrição das liberdades civis, enquanto o Executivo ficou com o papel de criar os
23
direitos sociais, como um distribuidor repressor e paternalista de empregos e favores.
Nos dizeres de Carvalho (2001, p.47):
A ação política voltava-se para a negociação direta com o governo, sem
passar pela mediação das representações políticas. A cultura política
brasileira foi, portanto, mais orientada para o Estado do que para o
fortalecimento de representações políticas na sociedade civil: é a estadania
em contraste com a cidadania.
Somente com os ventos democrático-populares da década de 1980 e a
promulgação da CF88 inaugurou-se um padrão de proteção social afirmativo de direitos
sociais enquanto direitos de cidadania.
No Brasil, conforme Soares (2001), no campo das políticas sociais, o governo
Collor (1990/1992) simplesmente ignorou os preceitos constitucionais por meio da
desconsideração do Sistema de Seguridade Social inscrito na CF88. Nesta, a Seguridade
Social é compreendida como um conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes
públicos e da sociedade destinadas a assegurar os direitos relativos à Saúde, à
Previdência e à Assistência. Assim, a Seguridade Social requer uma proposta de
orçamento elaborada de forma integrada e um Ministério da Seguridade Social, o que
não foi realizado.
De acordo com Pereira (2010) o governo Collor fragmentou a Seguridade
Social em ministérios diferentes, dando-lhe margem para realizar, na Saúde, um boicote
orçamentário sistemático ao Sistema Único de Saúde (SUS). Na Previdência, lançou um
pacote de reforma previdenciária já em 1992, cuja função era retirar direitos dos
trabalhadores conquistados na CF88. Na Assistência, vetou a Lei Orgânica da
Assistência Social (LOAS) – Lei n. 8742, de 7 de dezembro de 1993 que dispõe sobre a
organização da Assistência Social e dá outras providências, desrespeitando a CF88. “A
Carta Magna insere a Assistência Social no conjunto do sistema de Seguridade Social e
afirma-a como uma política pública, direito de todos e dever do Estado e da sociedade”
(PEREIRA, 2010, p. 5).
O artigo 203 referente à Assistência Social traduziu-se em políticas públicas,
somente no governo Itamar, em 1993, após o impeachment de Fernando Collor de Melo
e intensas mobilizações sociais. O governo Itamar sancionou a LOAS, mas preparou o
terreno para a continuidade da política neoliberal, que foram eficientemente implantadas
pelo Estado brasileiro no governo do presidente Fernando Henrique Cardoso eleito em
1994. Conforme
Raichelis, (2000) no plano social do governo de Fernando Henrique
Cardoso, houve um verdadeiro desmonte do que foi construído ao longo do período da
24
“cidadania regulada” (1930/1984). Na Saúde, manteve o boicote orçamentário ao SUS;
na Previdência, realizou reformas no regime dos funcionários públicos e tornou mais
rígidas as regras previdenciárias, e, na Assistência Social, criou o Programa
Comunidade Solidária, passando ao largo do que a LOAS estabelece. “O Comunidade
Solidária recebia recursos, sem controle social do Conselho Nacional de Assistência
Social e configurou-se como uma política assistencialista, indo na contracorrente dos
avanços inscritos na CF88 e na LOAS” (RAICHELIS, 2000, p. 87).
Ao final do governo, 2002, era notório que Fernando Henrique Cardoso não
cumpriu com a lei, ignorando a necessidade de construção do Sistema Único de
Assistência Social (SUAS) para que os preceitos indicados pela CF88 e LOAS fossem
efetivamente concretizados. Mas, foi somente em dezembro de 2003, que foi realizado a
IV Conferência Nacional de Assistência Social (CNAS) em caráter extraordinário, o que
significou um avanço no que diz respeito à retomada da valorização de espaços de
controle social. De acordo com Pereira (2010, p.8):
É importante lembrar que, no governo Fernando Henrique Cardoso, o Conselho
Nacional de Assistência Social passou a convocar a CNAS de quatro em quatro
anos e não mais bianualmente como prevê a LOAS (art. 18, inciso VI). Esse
prolongamento dos intervalos entre as Conferências foi estratégico,
proporcionando um explícito esvaziamento político.
A plenária final da IV CNAS aprovou a Política Nacional de Assistência Social
(PNAS) que prevê a construção e implantação do Sistema Único de Assistência Social
(SUAS) - modelo de gestão para todo território nacional, que integra os três entes federativos,
e objetiva consolidar um sistema descentralizado e participativo, instituído pela LOAS. O
caráter desse regime foi atribuído pela Constituição Federal, artigo 204 inciso I e se
particulariza pelo (a):
exigência de unidade de concepção e ação integrada entre os três entes
federativos (federal, estadual, e municipal);
exigência de ação integrada com a sociedade civil através de suas
organizações sem fins lucrativos, nominadas em lei como entidades de
assistência social, sob o modelo público não contributivo e não lucrativo de
gestão, cuja direção, nem estatizadora, nem de subsidiariedade, consagra
parcerias sob a primazia do dever de Estado e do direito de cidadania;
articulação e integração com as demais políticas sociais e econômicas
resguardando o seu campo de especificidade como política pública de
seguridade social;
25
compromisso com o desenvolvimento humano e social do país e pela partilha
de ações intersetoriais governamentais para enfrentar e superar a pobreza, as
desigualdades sociais, econômicas e as disparidades regionais e locais
existentes no país;
caráter não contributivo da proteção social de assistência social ao compor,
com a saúde e a previdência social, o sistema brasileiro de Seguridade
Social.
O SUAS objetiva o rompimento com a fragmentação programática entre as
esferas governamentais e a articulação e provisão de proteção social básica e especial
para os segmentos populacionais usuários da política de Assistência Social no país. Seus
princípios e diretrizes apontam para a universalização do sistema; a territorialização da
rede; a descentralização político-administrativa; a padronização dos serviços de
assistência social; a integração de objetivos, ações, serviços, benefícios, programas e
projetos; a garantia da proteção social; a substituição do paradigma assistencialista e a
articulação de ações e competências com os demais sistemas de defesa de direitos
humanos, políticas sociais e esferas governamentais. Para Pereira (2010, p.8):
A proposta do SUAS é um avanço e concretiza um modelo de gestão que
possibilita a efetivação dos princípios e diretrizes da política de assistência,
conforme definido na LOAS. O princípio organizativo da Assistência Social
baseado num modelo sistêmico aponta para a ruptura do assistencialismo, da
benemerência, de ações fragmentadas, ao sabor dos interesses coronelistas e
eleitoreiros. Afirma a Assistência Social como uma política pública, dever do
Estado e direito de todos os cidadãos e cidadãs, com a afirmação do controle
social por parte da sociedade civil.
Para a efetivação da proteção social, o SUAS dispõe de duas modalidades a
proteção básica - envolvimento de potencialidades, com fortalecimento dos vínculos
familiares e comunitários, destina-se à população que vive em situação de
vulnerabilidade social decorrente da pobreza, privação e/ou fragilização de vínculos
afetivos – relacionais e de pertencimento social; e a de proteção social especial que
objetiva prover atenções sócio-assistenciais a famílias e indivíduos em situação de risco
pessoal e social, por ocorrência de abandono, maus tratos físicos e/ou psíquicos, abuso
sexual, uso de substâncias psicoativas, cumprimento de medidas sócio-educativas, em
situação de rua, dentre outras. Ambos os tipos de proteção tem como suposto o
princípio de proteção social pró-ativa, o que significa não mais considerar os usuários
26
dos serviços de assistência social como objetos de intervenção, mas sim como sujeitos
de direitos.
O SUAS, apresenta como eixos estruturantes: Precedência da gestão pública da
política; Alcance de direitos sócio-assistenciais; Matricialidade sócio-familiar;
Territorialização; Descentralização político-administrativa; Financiamento partilhado
entre os entes federados; (vii) Fortalecimento da relação democrática Estado - sociedade
civil; Valorização da presença do controle social; Participação popular; Qualificação de
recursos humanos; Informação, monitoramento, avaliação e sistematização de
resultados.
O SUAS aponta ainda a implantação de um sistema de vigilância sócio-
assistencial, que consiste no desenvolvimento da capacidade e de meios de gestão
assumidos pelo órgão público gestor da assistência social para conhecer a presença de
pessoas em situação de vulnerabilidade.
A rede sócio-assistencial indicada no SUAS é um conjunto integrado de ações
de iniciativa pública e da sociedade civil que ofertam e operam benefícios, serviços,
programas e projetos, o que supõe a articulação entre todas estas unidades de provisão
de proteção social sob a hierarquia de básica e especial e ainda por níveis de
complexidade. O SUAS supõe a gestão compartilhada de serviços, como uma política
federativa entre União, Distrito Federal, estados e municípios, o que exige a utilização
de instrumentos de cooperação entre os entes federativos, como convênios, consórcios,
comissões de pactuação, dentre outros. Os tipos e níveis de gestão são caracterizados
como gestão inicial, gestão intermediária e gestão plena, o que determinará o valor do
piso de proteção social que o município receberá e as competências de cada município.
Em síntese verifica-se que as políticas públicas são compostas por políticas
econômicas e sociais e têm no Estado o seu formulador e executor, e no Brasil, as
políticas sociais estiveram submetidas às necessidades da política econômica, a serviço
dos interesses das elites e do processo de produção capitalista.
2.3 SOCIEDADE CIVIL E POLÍTICAS PÚBLICAS SOCIAIS
O processo de construção de participação da sociedade civil em políticas
públicas sociais enfrenta atualmente no cenário contemporâneo brasileiro um dilema
cujas raízes estão na existência de uma confluência perversa entre dois conjuntos de
princípios básicos sob os quais se articula toda uma variedade de subprojetos, que
27
apresentam uma relativa diversidade interna de processos, princípios de alargamento da
democracia, que segundo Teixeira et al (2002) se expressam na criação de espaços
públicos e na crescente participação da sociedade civil nos processos de discussão e de
tomada de decisão relacionados com as questões e políticas públicas
No Brasil, a luta pela participação da sociedade civil na gestão pública esteve
incluída nas pautas de reivindicação dos movimentos sociais das diversas áreas,
principalmente a partir da década de 1970, começam a ressurgir iniciativas de
articulação dos movimentos sociais, a despeito da repressão política e da ausência de
canais democráticos de participação. Fortes protestos e a luta pela democracia marcaram
esse período. Paralelamente, surgiram iniciativas populares nos bairros reivindicando
direitos básicos como saúde, transporte, moradia e controle do custo de vida. Em um
primeiro momento, eram iniciativas atomizadas, buscando conquistas parciais, mas que
ao longo dos anos foram se caracterizando como movimentos sociais organizados.
Com o avanço da democratização do País, os movimentos sociais multiplicaram-
se. Alguns deles institucionalizaram- se e passaram a ter expressão política. Os
movimentos populares e sindicatos foram, no caso brasileiro, os principais promotores
da mudança e da ruptura política em diversas épocas e contextos históricos, mas o
debate em torno das políticas públicas sociais na perspectiva de sua democratização tem
como marco histórico a década de 1980, numa conjuntura de crise econômica e ebulição
dos movimentos sociais.
Nas décadas de 1970 e 1980 a sociedade civil articulou-se em torno da
participação política no contexto da redemocratização. Com o fim do período
autoritário, novas experiências de organizações coletivas eclodiram com caráter
reivindicatório. “Na busca pela construção de um modelo de cidadania, baseado nos
direitos sociais e humanos, as ações coletivas experimentavam a vivência dos
movimentos sociais, atores políticos que levantavam a bandeira da política
emancipatória” (BUCCI, 2010, p.7).
O cenário de debate em torno das políticas públicas sociais constituiu a
formulação da Constituição Federal de 1988, em seus artigos 10; 194 (inciso VII); 198
(inciso III); 204 (inciso II); e 206 (inciso VI), (BRASIL, 1988) e consagrou o princípio
de participação da sociedade civil.
De acordo com Ferreira (2006) a promulgação de uma nova Constituição
Federal inaugurou uma nova fase da história brasileira − a redemocratização, após um
longo período autoritário. Nesse documento, segundo a autora, algumas reivindicações
28
dos diversos movimentos e organizações foram contempladas, por exemplo: a
autonomia da esfera municipal aliada a um aumento de sua participação na divisão dos
tributos do país e, ao lado da descentralização e municipalização das políticas públicas,
a participação da população no controle e gestão dessas políticas.
Os estados e os municípios da federação brasileira elaboraram e/ou
reelaboraram suas leis dentro dos novos princípios democráticos estabelecidos na
Constituição Federal de 1988.
Para Ferreira (2006) a incorporação do ideário municipalista na Constituição gerou,
além de uma maior autonomia para os municípios, a abertura e a ampliação de espaços
de participação social na gestão de políticas públicas.
Conforme Dagnino (2004) a Constituição brasileira de 1988, conhecida como a
“Constituição Cidadã”, incluiu mecanismos de democracia direta e participativa, entre
eles, o estabelecimento de Conselhos Gestores de Políticas Públicas, nos níveis
municipal, estadual e federal, com representação paritária do Estado e da sociedade
civil, destinados a formular políticas sobre questões relacionadas com a saúde, crianças
e adolescentes, assistência social, mulheres, e outros. Durante a etapa de elaboração da
Constituição Cidadã de 1988, os movimentos populares e sindicatos atuaram de forma
especialmente articulada, afirmando-se como um dos pilares da democracia e
influenciando diretamente os rumos do País. Nos anos que se seguiram, os movimentos
passaram a se consolidar por meio de redes com abrangência regional ou nacional,
firmando-se como sujeitos na formulação e monitoramento das políticas públicas. A
forma de conselhos, como estratégia política, foi absorvida na década de 1990 pela
maioria dos planos e projetos governamentais, para viabilizar a questão da participação
da população nos órgãos e políticas estatais. Daí a se afirmar que houve uma ampliação
da participação (em termos da composição desses órgãos) da sociedade civil nas
políticas públicas.
Os anos noventa foram cenários de numerosos exemplos desse trânsito da
sociedade civil para o Estado. Segundo Dagnino (2004) como conseqüência, o
confronto e o antagonismo que tinham marcado profundamente a relação entre o Estado
e a sociedade civil nas décadas anteriores, cederam lugar a uma aposta na possibilidade
da sua ação conjunta para o aprofundamento democrático. De acordo com o autor, a
aposta de ação conjunta para o aprofundamento democrático, deve ser entendida num
contexto onde o princípio de participação da sociedade civil se tornou central como
29
característica distintiva desse princípio, subjacente ao próprio esforço de criação de
espaços públicos onde o poder do Estado pudesse ser compartilhado com a sociedade.
Ao longo da década de 90 o caráter politizado que conduzia as ações coletivas
nas décadas de 70 e 80 cedeu espaço para novas formas de mobilização social. “A ação
coletiva se reestrutura em função do atendimento de demandas sociais específicas,
geralmente tentando suprir [...] os precários investimentos em políticas públicas sociais”
(FIGUEIRÓ, 2001, p.74) Em outras palavras, a sociedade civil passa a refletir sua ação
coletiva voltada para a realização complementar dos serviços públicos estatais.
No decorrer da década de 90, e como parte da estratégia do Estado para a
implementação do ajuste neoliberal, houve a emergência de um projeto político de
Estado mínimo que isenta-se progressivamente de seu papel de garantidor de direitos,
por meio do encolhimento de suas responsabilidades sociais e sua transferência para a
sociedade civil. Projeto político esse que faz com que a participação da sociedade civil,
a identidade de propósitos, seja evidentemente aparente. Mas, conforme Dagnino
(2004), essa aparência é sólida e cuidadosamente construída por meio da utilização de
referências comuns, que tornam seu deciframento uma tarefa difícil, especialmente para
os atores da sociedade civil envolvidos, e faz com que a disputa política entre projetos
políticos distintos assuma o caráter de uma disputa de significados para referências
aparentemente comuns: participação, sociedade civil, cidadania, democracia.
Entre os espaços implementados durante a década de 90 destacam-se os
Conselhos Gestores de Políticas Públicas, instituídos por lei, e os Orçamentos
Participativos, ou seja, espaços públicos para deliberação sobre o orçamento das
administrações municipais, onde a população decide sobre onde e como os
investimentos devem realizados. A forma de conselhos, como estratégia política, foi
absorvida pela maioria dos planos e projetos governamentais, para viabilizar a questão
da participação da população nos órgãos e políticas estatais. Daí a se afirmar que houve
uma ampliação da participação (em termos da composição desses órgãos) da sociedade
civil nas políticas públicas.
Com as eleições de 2002, alguns dos setores mais organizados da sociedade
trouxeram reivindicações históricas acumuladas, passando a influenciar diretamente a
atuação do governo e vivendo de perto suas contradições internas. Nesse novo cenário,
o diálogo entre Estado e sociedade civil assumiu especial relevo, com a compreensão e
a preservação do distinto papel de cada um dos segmentos no processo de gestão. A
interação é desenhada por acordos e dissensos, debates de idéias e pela deliberação em
30
torno de propostas. Esses requisitos são imprescindíveis ao pleno exercício da
democracia, cabendo à sociedade civil exigir, pressionar, cobrar, criticar, propor e
fiscalizar as ações do Estado.
Em síntese, a concepção de interação democrática construída entre os diversos
órgãos do Estado e a sociedade civil trouxe consigo resultados práticos em termos de
políticas públicas e avanços na interlocução de setores do poder público com toda a
diversidade social, cultural, étnica e regional que caracteriza os movimentos sociais
brasileiro. Avançou-se fundamentalmente na compreensão de que os Direitos Humanos
constituem condição para a prevalência da dignidade humana, e que devem ser
promovidos e protegidos por meio de esforço conjunto do Estado e da sociedade civil.
31
CAPÍTULO III - PARTICIPAÇÃO DA SOCIEDADE CIVIL NOS
PROGRAMAS DE PROTEÇÃO DE ASSISTÊNCIA A VÍTIMAS E A
TESTEMUNHAS AMEAÇADAS
Neste capítulo demonstra-se como o Estado tem procurado articular o interesse
existente da sociedade civil de modo a garantir uma maior consolidação das políticas
públicas formuladas nos programas de proteção de Direitos Humanos. Trata - se de
ressaltar a maneira como o Estado se articula com a sociedade civil a fim de aperfeiçoar
parte de suas funções, ou seja, saber de que maneira atores não-estatais podem
participar no processo de políticas públicas de proteção a vítimas e testemunhas
ameaçadas.
3.1 DIREITOS HUMANOS
Os Direitos Humanos são os direitos de todos e devem ser protegidos em todos
Estados e nações. São direitos fundamentais de todas as pessoas, sejam elas mulheres,
negros, homossexuais, índios, idosos, pessoas portadoras de deficiências, populações de
fronteiras, estrangeiros e emigrantes, refugiados, portadores de HIV positivo, crianças e
adolescentes, policiais, presos, despossuídos e os que têm acesso a riqueza.
De acordo com Plano Nacional de Desenvolvimento Humano-3 (PNDH 3,
2010) os Direitos humanos referem-se a um grande número de campos da atividade
humana: o direito de ir e vir sem ser molestado; o direito de ser tratado pelos agentes do
Estado com respeito e dignidade, mesmo tendo cometido uma infração; o direito de ser
acusado dentro de um processo legal e legítimo, onde as provas sejam conseguidas
dentro da boa técnica e do bom direito, sem estar sujeito a torturas ou maus tratos; o
direito de exigir o cumprimento da Lei e, ainda, de ter acesso a um Judiciário e a um
Ministério Publico que, ciosos de sua importância para o Estado democrático, não
descansem enquanto graves violações de direitos humanos estejam impunes e seus
responsáveis soltos e sem punição, como se estivessem acima das normas legais; o
direito de dirigir seu carro dentro da velocidade permitida e com respeito aos sinais de
trânsito e às faixas de pedestres, para não matar um ser humano ou lhe causar acidente;
o direito de ser, pensar, crer, de manifestar - se ou de amar sem tornar-se alvo de
humilhação, discriminação ou perseguição.
32
Todos os seres humanos devem ser respeitados e sua integridade física protegida
e assegurada. “Os assassinatos, as chacinas, o extermínio, os seqüestros, o crime
organizado, o tráfico de drogas e as mortes no trânsito não podem ser consideradas
normais, especialmente em um Estado e em uma sociedade que se desejam modernos e
democráticos” (PNDH-3, p.187). Foi com esta mentalidade que o Governo brasileiro,
sob a presidência de Fernando Henrique Cardoso, decidiu elaborar o primeiro Programa
Nacional de Direitos Humanos. Atualmente o PNDH está na sua terceira versão, um foi
complementando o outro, e está dirigido para o conjunto dos cidadãos brasileiros.
De acordo com o ministro da Secretaria Especial dos Direitos Humanos da
Presidência da República Paulo Vannuchi (in. PNDH – 3 2010) o Governo Federal, com
a iniciativa do Programa Nacional de Direitos Humanos, quer ir além de um quadro
profundamente preocupante, marcado no passado por um Poder Público deficiente e
indiferente ao desrespeito à tranqüilidade e segurança do cidadão comum. Para o
ministro os brasileiros, especialmente os setores populares organizados, encontraram na
agenda dos Direitos Humanos um conteúdo fundamental de suas lutas em diferentes
cenários. No passado, na resistência à ditadura, atualmente, para exigir a efetivação de
relações sociais igualitárias e justas. Nos dizeres do ministro (ibidem, p.15):
É sob o impulso dinâmico dos movimentos populares organizados que os
Direitos Humanos se fortalecem, erguendo como bandeira a democratização
permanente do Estado e da própria sociedade. É deles, também, que o Estado
vem colhendo crescentemente demandas e exigências para incorporá-las a sua
ação programática nas diferentes políticas públicas.
O reconhecimento e a incorporação dos Direitos Humanos no ordenamento
social, político e jurídico brasileiro resultam de um processo de conquistas históricas,
que se materializaram na Constituição de 1988. Desde então, avanços institucionais vão
se acumulando e começa a nascer um Brasil melhor, ao mesmo tempo em que o
cotidiano nacional ainda é atravessado por violações rotineiras desses mesmos direitos.
Contextualizando o processo histórico de conquistas têm-se a Declaração
Universal dos Direitos Humanos, lançada em 10 de dezembro de 1948, que fundou os
alicerces de uma nova convivência humana, tentando sepultar o ódio e os horrores do
nazismo. Os diversos pactos, tratados e convenções internacionais que a ela sucederam
construíram, passo a passo, um arcabouço mundial para proteção dos Direitos
Humanos. Em 1993, a comunidade internacional atualizou a compreensão sobre os
elementos básicos desses instrumentos na Conferência de Viena, da Organização das
33
Nações Unidas (ONU), fortalecendo os postulados da universalidade, indivisibilidade e
interdependência.
A Conferência de Viena também firmou acordo sobre a importância de que os
Direitos Humanos passassem a ser conteúdo programático da ação dos Estados
nacionais. Por isso, recomendou que os países formulassem e implementassem
Programas e Planos Nacionais de Direitos Humanos. Redemocratizado, o Estado
brasileiro ratificou também os principais instrumentos internacionais de Direitos
Humanos, tornando-os parte do ordenamento nacional. Isso significa que, em termos
jurídico político, eles se constituem em exigência de respeito a suas determinações pelo
país.
A Carta Constitucional de 1988 inclui entre os fundamentos do Estado brasileiro
a cidadania e a dignidade da pessoa humana. Estabelece como objetivo primordial a
construção de uma sociedade livre, justa e solidária, além de comprometer-se com o
desenvolvimento nacional, a erradicação da pobreza, redução das desigualdades sociais
e regionais e a promoção do bem-estar de todos, sem preconceitos ou discriminação de
qualquer tipo. Mas, as diretrizes nacionais que orientam a atuação do poder público no
âmbito dos Direitos Humanos somente foram desenvolvidas a partir de 1996, ano de
lançamento do primeiro Programa Nacional de Direitos Humanos – PNDH - 1. O
Programa foi revisado e atualizado em 2002, sendo ampliado com a incorporação dos
direitos econômicos, sociais e culturais, o que resultou na publicação do segundo
Programa Nacional de Direitos Humanos – PNDH 2.
O PNDH - 2 foi implementado, a partir de 2002, com os recursos orçamentários
previstos no atual Plano Plurianual (PPA 2000-2003) e na lei orçamentária anual.
Embora a revisão do PNDH - 2 tenha sido apresentada à sociedade brasileira a pouco
mais de um ano da posse do novo governo, os compromissos expressos no texto quanto
à promoção e proteção dos direitos humanos transcenderam a atual administração e se
projetaram no tempo, independentemente da orientação política de futuras gestões.
Nesse sentido, o PNDH - 2 influenciou a discussão, no transcurso de 2003, e no Plano
Plurianual 2004-2007.
O PNDH- 2 serviu de parâmetro e orientação para a definição dos programas
sociais a serem desenvolvidos no Brasil até 2007, ano em que se procedeu a sua revisão
fazendo surgir o PNDH -3 aprovado pelo Decreto nº 7.037 de 21 de dezembro de 2009,
cuja definição operacional de sua implementação, com estabelecimento de prazos, será
garantida por meio de Planos de Ação a serem construídos a cada dois anos, sendo
34
fixados os recursos orçamentários, as medidas concretas e os órgãos responsáveis por
sua execução.
A terceira versão do Programa Nacional de Direitos Humanos – PNDH-3 é fruto
de um longo e meticuloso processo histórico de diálogo entre poderes públicos e
sociedade civil representada por diversas organizações e movimentos sociais, que teve
participação decisiva em todas as etapas de sua construção. Ele representa para o Brasil
o fortalecimento definitivo da democracia. Não apenas democracia política e
institucional, grande anseio popular que a Constituição de 1988 já materializou, mas
democracia também no que diz respeito à igualdade econômica e social.
Para Vannuchi (in. PNDH -3 2010) o PNDH -3 representa mais um passo largo
no processo histórico de consolidação das orientações para concretizar a promoção dos
Direitos Humanos no Brasil, e entre os avanços mais robustos, destaca-se a
transversalidade e inter- ministerialidade de suas diretrizes, de seus objetivos
estratégicos e de suas ações programáticas, na perspectiva da universalidade,
indivisibilidade e interdependência dos direitos. Conforme o ministro Vannuchi a
iniciativa, compartilhada entre sociedade civil e poderes públicos, mostrou-se capaz de
gerar as bases para formulação de uma Política Nacional de Direitos Humanos como
verdadeira política de Estado. “Os compromissos de promoção e proteção dos Direitos
Humanos expressos no PNDH-3 estendem-se para além da atual administração e devem
ser levados em consideração independentemente da orientação política das futuras
gestões” (VANNUCHI in. PNDH-3, 2010).
Em síntese, o sentido fundamental do PNDH-3 é que, com ele, aprofunda-se o
compromisso do Estado com a responsabilidade na realização dos Direitos Humanos. O
mais central ainda é que o PNDH-3 ganhará mais sentido se conseguir que os Direitos
Humanos ganhem efetividade no cotidiano da vida das pessoas.
3.2 GARANTIA DOS DIREITOS HUMANOS - VÍTIMAS DE CRIMES E DE
PROTEÇÃO DAS PESSOAS AMEAÇADAS
O Plano Nacional de Desenvolvimento Humano - PNDH - 3 representa o
diálogo permanente dos últimos anos entre Estado e sociedade civil. Estrutura-se em
seis eixos orientadores, subdivididos em 25 diretrizes, 82 objetivos estratégicos e 521
ações programáticas, que incorporam ou refletem os 7 eixos, 36 diretrizes e 700
resoluções aprovadas na 11ª Conferência Nacional de Direitos Humanos, realizada em
35
Brasília entre 15 e 18 de dezembro de 2008 como coroamento do processo desenvolvido
no âmbito local, regional e estadual. O PNDH-3 também inclui como alicerce de sua
construção, propostas aprovadas em cerca de 50 conferências nacionais, temáticas
realizadas desde 2003 sobre igualdade racial, direitos da mulher, segurança alimentar,
cidades, meio ambiente, saúde, educação, juventude, cultura e outras.
Uma das finalidades básicas do PNDH-3 é dar continuidade à integração e ao
aprimoramento dos mecanismos de participação existentes, bem como criar novos
meios de construção e monitoramento das políticas públicas sobre Direitos Humanos no
Brasil. No âmbito institucional, o PNDH-3 amplia as conquistas na área dos direitos e
garantias fundamentais, pois internaliza a diretriz segundo a qual a primazia dos
Direitos Humanos constitui princípio transversal a ser considerado em todas as políticas
públicas.
Ao ser estruturado por eixos o PNDH -3 contempla os seguintes
temas: Interação Democrática entre Estado e Sociedade Civil; Desenvolvimento e
Direitos Humanos; Universalizar Direitos em um Contexto de Desigualdades;
Segurança Pública, Acesso à Justiça e Combate à Violência; Educação e Cultura em
Direitos Humanos; Direito à Memória e à Verdade, e Estabelece diretrizes, objetivos
estratégicos e ações programáticas a serem trilhados nos próximos anos.
No eixo Segurança Público Acesso à Justiça e Combate à Violência está a
Diretriz 15 (ANEXO I) intitulada - Garantia dos direitos das vítimas de crimes e de
proteção das pessoas ameaçadas, e uma das estratégias que contempla essa diretriz é o
Programa Federal de Assistência a Vítimas e a Testemunhas ameaçadas (PROVITA).
O PROVITA foi instituído pela Lei nº 9.807/99 de 13 de julho de 1999, e
regulamentada pelo Decreto Federal nº 3.518, de 20 de junho de 2000, que estabeleceu
as normas para a organização e a manutenção de programas especiais a vítimas e
testemunhas ameaçadas. A Lei dispõe ainda, sobre a proteção de acusados ou
condenados que tenham voluntariamente prestado efetiva colaboração à investigação
policial e ao processo criminal.
O PROVITA tem como objetivo proteger pessoas que estejam coagidas ou
expostas a grave ameaça em razão de colaborarem com investigação ou processo
criminal (art. 1º Lei n.º 9.807/99) e oferecer as condições possíveis e necessárias para a
reconstrução de suas vidas em uma nova cidade, propiciando-lhes os meios para que se
tornem, gradualmente, independentes do Programa. É composto, conforme o artigo 2º
36
do Decreto 3518/00, pelo Conselho Deliberativo Federal, Órgão Executor Federal e da
Rede Voluntária de Proteção.
O Conselho Deliberativo Federal é composto conforme o artigo 7º do Decreto
3518/00, por um representante: da Secretaria de Estado dos Direitos Humanos, da
Secretaria Nacional da Segurança Pública, da Secretaria Nacional da Justiça, do
Departamento de Polícia Federal, do Ministério Público Federal (todos indicados pelo
Ministro de Estado da Justiça), do Poder Judiciário Federal (indicado pelo Supremo
Tribunal de Justiça), e representante de entidade não-governamental com atuação na
proteção de vítimas e testemunhas (indicado pelo Secretário de Estado dos Direitos
Humanos). Dentre as principais competências do Conselho Deliberativo Federal pode-
se citar: a decisão sobre os pedidos de admissão e exclusão do programa; solicitação às
autoridades competentes de medidas de proteção; solicitação ao Ministério Público das
providências necessárias à obtenção de medidas judiciais acautelatórias e de alteração
da identidade civil; e a fixação do o valor máximo da ajuda financeira mensal aos
beneficiários da proteção.
A Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República, por
meio da Coordenação-Geral de Proteção a Testemunhas, é o órgão responsável por
implementar, manter e aprimorar o programa. A execução das atividades é
descentralizada por meio da assinatura de convênios com as Secretarias Estaduais, na
maioria das vezes, aquelas responsáveis pela área de direitos humanos. Estas, por sua
vez, firmam parcerias com Organizações Não Governamentais (ONGs) que atuam na
área de direitos humanos e que serão as responsáveis diretas pelo acolhimento dos
beneficiários do programa.
A legislação atribui legitimidade para apresentar solicitação de ingresso no
programa ao próprio interessado, ao Ministério Público, ao Delegado de polícia
responsável pelo inquérito, ao Juiz e aos demais órgãos públicos e privados com
atribuições de defesa dos direitos humanos. Para o ingresso dos beneficiários no
programa, a Lei n.º 9.807/99 prevê certos requisitos, tais como: iminente situação de
risco, decorrente da colaboração prestada a procedimento criminal, ou seja, deve estar
caracterizada a relação de causalidade, entre a situação de risco e a colaboração prestada
(art. 1º, caput). Assim, não estão incluídas as pessoas sob ameaça ou coação motivadas
por quaisquer outros fatores. O interessado deve, ainda, possuir personalidade e conduta
compatíveis com as restrições de comportamento a ele inerentes (art. 2º, § 2º), sob pena
37
de por em risco as demais pessoas protegidas, as equipes técnicas e a rede de proteção
como um todo.
A apresentação do pedido de ingresso deve ser feita ao órgão executor, que o
remeterá à avaliação do Conselho Deliberativo, instruído da manifestação do Ministério
Público e dos pareceres jurídico e psicossocial. Enquanto se desenvolve o procedimento
de triagem, e dependendo da gravidade do caso, o órgão executor pode requerer aos
órgãos de segurança pública que sejam providenciadas medidas cautelares para garantir
provisoriamente a segurança dos interessados.
O PROVITA como executor de política pública é um importante instrumento de
combate à impunidade no Brasil, dado o grande peso da prova testemunhal em
processos criminais. Para o Tribunal de Contas da União (BRASIL, 2005) além de seu
caráter protetor, o programa também desempenha um papel significativo na promoção
dos direitos humanos, uma vez que seus beneficiários contam com assistência
psicossocial para reinseri-los, de forma autônoma, em um novo espaço social.
Relatórios gerenciais apresentados após avaliações realizadas pelos auditores
do Tribunal de Contas da União (BRASIL, 2005) demonstraram que foi garantida a
integridade física de mais de 1.200 pessoas desde o início do PROVITA em 1998, o que
contribuiu para a elucidação de mais de 400 crimes de alto poder ofensivo e repercussão
oficial. Na visão dos auditores o programa, de modo geral, apresenta resultados
positivos, mas em se tratando de participação da sociedade civil, ainda é deficitário. Os
auditores revelam alguns aspectos do programa que comprometem a participação da
sociedade civil, são eles:
A divulgação nas instituições que interagem com o Programa é feita
principalmente pelos seus representantes no Conselho Deliberativo. Porém,
estas ações não são fruto de uma orientação centralizada, dependendo
basicamente da iniciativa pessoal dos representantes. Isso acarreta graus
bastante desiguais de divulgação, o que tende a repercutir nos níveis de
atendimento dos programas estaduais.
As secretarias estaduais não mantêm um repasse regular de recursos
financeiros para as Organizações Não Governamentais (ONGs) o que
compromete o funcionamento do programa e desestimula os gestores das
entidades executoras estaduais.
Algumas secretarias estaduais recebem os recursos federais em parcela
única, mas parcelam e retardam os repasses para as entidades executoras.
38
Com isso, muitas delas têm que realocar recursos próprios na “entressafra” -
período de escassez dos recursos públicos o que depende da saúde
financeira da entidade e pode comprometer suas demais ações e mesmo a
manutenção e custeio das atividades de proteção a testemunhas ameaçadas.
Insuficiência nos treinamentos oferecidos e na sistemática de troca de
experiências Os programas estaduais têm se ressentido de deficiências na
atuação da Coordenação-Geral de Proteção a Testemunhas (CGPT) e do
Gabinete de Assessoria Jurídica a Organizações Populares (GAJOP) como
instâncias responsáveis pela supervisão e apoio ao desempenho adequado do
Programa nos estados.
Falta de eficácia das ações para a reinserção social dos beneficiários - o
acesso aos serviços de saúde, educação e assistência social não é garantido
de forma institucional nos estados, sendo fruto de articulações pessoais das
entidades gestoras ou membros da equipe técnica com secretários estaduais,
diretores de escolas ou de postos de saúde. O inconveniente reside no caso
de haver mudança dos ocupantes desses cargos, quando há grande risco de
perda de todo o trabalho já feito, sendo necessário o estabelecimento de
novos contatos e articulações com a pessoa que assumiu o posto.
Mediante os aspectos citados pode-se afirmar que a capacidade de revitalização
e ampliação da participação da sociedade civil nesse processo, não se encerra com a
constituição de movimentos sociais autônomos, carecendo ao mesmo tempo de canais
institucionais para se expressarem. Para Santos (2002) concretamente, isso se daria com
a possibilidade de apresentação de projetos de lei ou de políticas públicas por iniciativa
das próprias instituições.
Para que a sociedade civil, seus atores diversos, participe efetivamente na
execução de políticas públicas de proteção deve alargar o escopo analítico para dar
conta de uma realidade que, em alguns contextos, vai se tornando mais complexo. A
maior complexidade aqui, para Santos (2002) se refere ao fato de responsabilidades no
ciclo de políticas públicas estarem sendo, em muitos casos, compartilhada entre atores
públicos, privados e da sociedade civil.
Para que haja uma maior participação da sociedade civil no programa, o
Tribunal de Contas da União (2005) recomenda que a Coordenação-Geral de Proteção a
Testemunhas que:
39
Discuta com as secretarias estaduais convenentes a adoção de procedimentos
para o fornecimento de identificação especial para os integrantes da equipe
técnica, de forma a resguardar o sigilo de suas identidades.
Defina uma política institucional de divulgação, inclusive com sugestões de
práticas para disseminação de informações, previsão para troca de
experiências entre os estados e definição de estratégia de tratamento de
denúncias.
Identifique as necessidades de treinamento das equipes técnicas,
promovendo cursos de capacitação para o seu atendimento.
Estabeleça rede de comunicação entre os programas estaduais, utilizando-se,
por exemplo, de meios eletrônicos e das salas de videoconferência,
observando, em todos os casos, os procedimentos de segurança da
informação necessários à garantia do sigilo das atividades do programa;
Reveja a sistemática dos relatórios de acompanhamento e monitoramento,
visando torná-los instrumentos efetivos de divulgação de boas práticas e
correção de falhas e problemas.
Institua ouvidoria, por meio, por exemplo, de serviço disque 0800, à
disposição dos beneficiários para apresentação de denúncias, reclamações e
sugestões. Inclua, no convênio assinado entre a União e os Estados, cláusula
prevendo o estabelecimento de parcerias institucionais do programa com as
secretarias responsáveis pelas atividades implicadas no processo de
reinserção social dos beneficiários.
Discuta com os estados maneiras de possibilitar a doação aos egressos do
programa dos bens móveis utilizados, a critério do Conselho Deliberativo e
com o fim de assegurar a reinserção social dos egressos do programa.
Mediante as proposições dos avaliadores do Tribunal de Contas da União pode-
se afirmar que “o Estado não mais se coloca como o principal responsável pela proteção
social, havendo uma distribuição entre os setores não-governamentais” (PEREIRA,
2010, p. 128). Ao contrário do que possa parecer, o Estado envolvido no processo de
políticas públicas através de rede não é um Estado prisioneiro e fragilizado em sua ação.
Trata-se de um Estado que perdeu suas pretensões de dirigismo, mas que não
abdicou de seu papel de formulador e implementador de políticas. Entretanto, para
Santos (2002), este papel tradicional passa a ser combinado com uma nova maneira de
40
processar as demandas, a saber, quando atores não-estatais passam a estar incluídos ex
ante na identificação de problemas e na proposição de soluções, inclusive com alguns
desses atores assumindo parcela da responsabilidade em sua implementação. “Aqui não
significa que o Estado tenha se tornado irrelevante, mas tão somente que o Estado passa
a compartilhar sua importância com atores sociais situados na sociedade civil” (id. ibid).
Em síntese, por meio do conteúdo apresentado, percebe-se que os atores
governamentais, ou seja, o Estado está exposto cada vez mais a variadas frentes de
negociação quando se trata de executar aquilo que constitui um dos principais resultados
de sua ação, que são precisamente as políticas públicas. Rejeita-se com isso a
abordagem que parte do Estado como o único ator relevante neste processo. Nesta
percepção, a proposta política de descentralização e de programas de proteção vem
exaltar o papel da sociedade como executora das ações sociais, com o discurso da
“possibilidade de executar políticas públicas mais próximas das pessoas, das realidades
onde vivem” (STEIN, 2000, p.160).
3.3 PERSPECTIVAS FUTURAS
A perspectiva fundamental do PNDH-3, incluso nele o PROVITA, é que, com
ele, aprofunda-se o compromisso do Estado com a responsabilidade na realização dos
Direitos Humanos. O mais central ainda é que o PNDH-3 ganhará mais sentido se
conseguir que os Direitos Humanos ganhem efetividade no cotidiano da vida das
pessoas. Assim que, para além do debate em defesa dos conteúdos expressos no PNDH-
3, está a tarefa de realizar o que nele está proposto.
A formulação das políticas públicas ainda tem muito caminho a percorrer para
que seja orientada pelos Direitos Humanos. As políticas públicas implementadas no
Brasil ainda estão a caminho para se constituírem políticas de Estado (para além de
ações de governo) e com capacidade de resposta sistemática. O que se vê muito, ainda, é
a ação socorrista, aquela que é reativa às circunstâncias, sobretudo em se tratando de
situações de violações. Soma-se a isso que a maioria das políticas públicas nem sequer
se entende como parte de uma política de Direitos Humanos, não sendo formuladas
nesta perspectiva. Até porque, uma coisa é interpretar uma política como sendo de
Direitos Humanos, outra é a sua concepção e outra a sua implementação, expressos da
mesma forma, com o mesmo conteúdo e compromissos implicados em sua orientação.
41
No campo da execução da política é fundamental que se considere a centralidade
do orçamento público. Mesmo que as atuais propostas contenham programas e ações de
Direitos Humanos, ainda privilegiam ajustes fiscais e não são construídos na
perspectiva de direcionar os recursos públicos para a realização de direitos. Um dos
principais instrumentos do ciclo orçamentário, o Plano Plurianual, por exemplo, ainda
tem uma compreensão restrita dos Direitos Humanos, já que assim compreende apenas
as ações feitas nos grupos e segmentos sociais excluídos, atendo-se praticamente a
programas e ações das Secretarias Especiais que atuam diretamente nesses temas.
A expectativa da sociedade civil com o PNDH-3 aponta para exigências
fundamentais que cobram compromisso do Estado, mas que também querem o
compromisso da sociedade civil com os Direitos Humanos. O PNDH-3 é um marco. Foi
amplamente discutido em sua formulação e continua sendo após sua publicação.
Em uma sociedade democrática o debate é necessário. Mas, para além do debate,
com o debate e exatamente em função do debate é que esta posta a tarefa principal:
tornar efetivos os preceitos nele contidos, de tal forma que produza transformações
efetivas no cotidiano da vida das pessoas para realizar os Direitos Humanos. A
perspectiva democrática e popular de compreensão dos Direitos Humanos confia que a
força transformadora que está nele não seja suplantada pelo poder ou pelos interesses.
É fundamental manter abertos os debates críticos para que Direitos Humanos
continuem sendo construção de sujeitos que os querem como insumo da rebeldia
criativa e construtiva. Os Direitos Humanos são atualmente mais partes do problema do
que da solução para os da sociedade civil, está em jogo manter viva e forte a luta da
sociedade civil por Direitos Humanos. Esta luta se faz em toda a sociedade civil e não
pode nunca ser substituída por qualquer ação, por melhor que seja do Estado ou do
governo.
Consolidar uma política nacional de Direitos Humanos, de um lado, é parte da
responsabilidade do Estado com a realização dos Direitos Humanos, tanto quanto é
parte dessa mesma responsabilidade o reconhecimento da independência e da autonomia
da sociedade civil. De outro lado, é parte da responsabilidade da sociedade civil com a
realização dos Direitos Humanos sua participação independente e autônoma no
monitoramento e na avaliação dos compromissos do Estado com os Direitos Humanos
e, acima de tudo, seu fortalecimento e sua capacidade de gestar novos direitos e novos
conteúdos aos velhos direitos.
42
O PNDH-3 e o PROVITA são avanços, fundamentais, necessários, mas ainda
insuficientes para que as políticas públicas sejam pautadas pelos Direitos Humanos e
que estes se convertam em conteúdo programático das políticas públicas ou para que se
possa dizer que o Brasil tem uma política nacional de Direitos Humanos.
Em síntese, na luta pelos Direitos Humanos o Estado e a sociedade civil têm
responsabilidades necessariamente compartilhadas. É uma parceria que se funda sobre
princípios rígidos e irrenunciáveis, qualquer que seja a conjuntura política ou econômica
do País. Como nenhum País no mundo conseguiu realizar plenamente os Direitos
Humanos ou o Estado de Direito, a avaliação de sua implementação em cada País
somente pode ser avaliada à luz de sua própria evolução histórica.
43
CONCLUSÃO
Finalizando este estudo pode-se afirmar que ele cumpriu aos objetivos a que se
propôs, tendo em vista que demonstrou a participação da sociedade civil na
consolidação de políticas públicas de proteção a vítimas e testemunhas ameaçadas.
Mediante todos os dados apresentados pode-se afirmar que:
Os direitos humanos são os direitos de todos e devem ser protegidos em todos
Estados e nações, no entanto o conceito ou definição de Estado nem sempre esteve
presente na organização humana, embora seja uma constante, à medida que cresce o
grau de abrangência populacional e conseqüente complexidade das organizações da
sociedade civil.
A sociedade civil e o Estado, em se tratando de Direitos Humanos, atuam como
dois momentos necessários, separados, mas contíguos, distintos, mas interdependentes,
do sistema social em sua complexidade e em sua articulação interna. A dinâmica da
sociedade civil tem reflexos no Estado, e juntos compõem uma totalidade, donde não se
pode pensar o Estado sem a sociedade civil e vice - versa.
As políticas públicas são compostas por políticas econômicas e sociais e têm no
Estado o seu formulador e executor. As políticas públicas sociais referem ações que
determinam o padrão de proteção social implementado pelo Estado e visam à
diminuição das desigualdades estruturais produzidas pelo desenvolvimento
socioeconômico, na consolidação dessas políticas a participação da sociedade civil deve
ser compreendida e analisada pelos e nos espaços e processos históricos que as
comportam.
A concepção de interação democrática construída entre os diversos órgãos do
Estado e a sociedade civil trouxe consigo resultados práticos em termos de políticas
públicas e avanços na interlocução de setores do poder público com toda a diversidade
social, cultural, étnica e regional que caracteriza os movimentos sociais brasileiro.
Os avanços foram fundamentais na compreensão de que os Direitos Humanos
constituem condição para a prevalência da dignidade humana, e que devem ser
promovidos e protegidos por meio de esforço conjunto do Estado e da sociedade civil.
Com o PNDH-3 aprofunda-se o compromisso do Estado e da sociedade civil com a
responsabilidade na realização dos Direitos Humanos.
O PNDH-3 e o PROVITA constituem-se em avanços necessários, fazem parte
de uma política pública social de descentralização do Estado que exaltam o papel da
44
sociedade como executora das ações sociais, mesmo que seja com o discurso da
possibilidade de executar políticas públicas mais próximas das pessoas, das realidades
onde vivem.
Os atores governamentais, ou seja, o Estado está exposto cada vez mais a
variadas frentes de negociação com a sociedade civil quando se trata de executar aquilo
que constitui um dos principais resultados de sua ação, que são precisamente as
políticas públicas.
Todos os aspectos referidos neste estudo levam a concluir que historicamente a
sociedade civil foi construindo o seu papel junto às políticas públicas de proteção,
parceria essa que se funde em um pacto de desconfiança em que a participação e a
autonomia da sociedade civil são condições necessárias, porque o Estado e a sociedade
civil têm responsabilidades necessariamente compartilhadas. É uma parceria que se
funda sobre princípios rígidos e irrenunciáveis, qualquer que seja a conjuntura política
ou econômica do País.
Encerrando este trabalho recomenda-se que novos estudos sobre o tema
abordado sejam realizados visto que o Plano de Nacional de Desenvolvimento Humano
- PNDH-3 apenas iniciou a sua trajetória histórica junto a sociedade civil e ao Programa
Federal de Assistência a Vítimas e a Testemunhas ameaçadas.
45
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48
ANEXO 1
Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3)
Diretriz 15:
Garantia dos direitos das vítimas de crimes e de proteção das pessoas ameaçadas.
Objetivo estratégico I:
Instituição de sistema federal que integre os programas de proteção.
Ações programáticas:
a) Propor projeto de lei para integração, de forma sistêmica, dos programas de
proteção a vítimas e testemunhas ameaçadas, defensores de Direitos Humanos e
crianças e adolescentes ameaçados de morte.
Responsável: Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da
República
Parceiros: Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República;
Ministério da Justiça
b) Desenvolver sistema nacional que integre as informações dos programas de
proteção às pessoas ameaçadas.
Responsável: Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da
República
Parceiros: Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República;
Ministério da Justiça
Recomendação: Recomenda-se aos estados e ao Distrito Federal a adoção de
medidas necessárias à integração de suas informações ao banco de dados
nacional sobre os programas de proteção.
c) Ampliar os programas de proteção a vítimas e testemunhas ameaçadas,
defensores dos Direitos Humanos e crianças e adolescentes ameaçados de morte
para os estados em que o índice de violência aponte a criação de programas
locais.
Responsável: Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da
República
d) Garantir a formação de agentes da Polícia Federal para a proteção das pessoas
incluídas nos programas de proteção de pessoas ameaçadas, observadas suas
diretrizes.
Responsáveis: Ministério da Justiça; Secretaria Especial dos Direitos Humanos
da Presidência da República
Recomendação: Recomenda-se aos estados e ao Distrito Federal a capacitação
dos policiais protetores, considerando as especificidades das medidas protetivas
no âmbito deste programa.
e) Propor ampliação dos recursos orçamentários para a realização das ações dos
programas de proteção a vítimas e testemunhas ameaçadas, defensores dos
Direitos Humanos e crianças e adolescentes ameaçados de morte.
Responsável: Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da
República
Parceiros: Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República;
Ministério da Justiça
Recomendações:
49
• Recomenda-se aos estados e ao Distrito Federal a garantia de
compromisso orçamentário para execução dos seus programas de
proteção.
• Recomenda-se ao Ministério Público e ao Poder Judiciário que cooperem
nas ações judiciais que envolvem pessoas ameaçadas.
Objetivo estratégico II:
Consolidação da política de assistência a vítimas e a testemunhas ameaçadas.
Ações programáticas:
a) Propor projeto de lei para aperfeiçoar o marco legal do Programa Federal de
Assistência a Vítimas e Testemunhas Ameaçadas, ampliando a proteção de
escolta policial para as equipes técnicas do programa, e criar sistema de apoio à
reinserção social dos usuários do programa. Responsáveis: Ministério da Justiça;
Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República
Parceiro: Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República
Recomendações:
• Recomenda-se aos estados e ao Distrito Federal que se
responsabilizem pela regularidade dos repasses financeiros para
as entidades executoras do Programa Federal de Assistência a
Vítimas e Testemunhas Ameaçadas (PROVITA), conforme
convênios firmados.
• Recomenda-se ao Poder Judiciário a priorização dos processos
que envolvam pessoas sob proteção.
b) Regulamentar procedimentos e competências para a execução do Programa
Federal de Assistência a Vítimas e Testemunhas Ameaçadas (PROVITA), em
especial para a realização de escolta de seus usuários.
Responsáveis: Ministério da Justiça; Secretaria Especial dos Direitos Humanos
da Presidência da República
c) Fomentar a criação de centros de atendimento a vítimas de crimes e a seus
familiares, com estrutura adequada e capaz de garantir o acompanhamento
psicossocial e jurídico dos usuários, com especial atenção a grupos sociais mais
vulneráveis, assegurando o exercício de seus direitos.
Responsáveis: Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da
República; Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres da Presidência da
República
Parceiro: Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República
Recomendação: Recomenda-se aos estados que não têm programas de proteção
a testemunhas que adotem as medidas necessárias para celebração de convênio
com a União.
d) Incentivar a criação de unidades especializadas do Serviço de Proteção ao
Depoente Especial da Polícia Federal nos estados e no Distrito Federal.
Responsável: Ministério da Justiça; Secretaria Especial dos Direitos Humanos
da Presidência da República
Recomendação: Recomenda-se aos estados e ao Distrito Federal a criação de
Serviço de Proteção ao Depoente Especial, com recursos humanos e materiais
necessários ao exercício de suas funções.
e) Garantir recursos orçamentários e de infraestrutura ao Serviço de Proteção ao
Depoente Especial da Polícia Federal, necessários ao atendimento pleno,
imediato e de qualidade aos depoentes especiais e a seus familiares, bem como o
atendimento às demandas de inclusão provisória no programa federal.
Responsável: Ministério da Justiça
50
Objetivo estratégico III:
Garantia da proteção de crianças e adolescentes ameaçados de morte.
Ações programáticas:
a) Ampliar a atuação federal no âmbito do Programa de Proteção a Crianças e
Adolescentes Ameaçados de Morte nas unidades da Federação com maiores
taxas de homicídio nessa faixa etária.
Responsável: Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da
República
Parceiro: Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República
Recomendação: Recomenda-se aos estados, Distrito Federal e municípios a
implementação do programa, fortalecendo a rede de atendimento especializado.
b) Formular política nacional de enfrentamento da violência letal contra crianças e
adolescentes.
Responsável: Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da
República
Parceiros: Ministério da Justiça; Secretaria-Geral da Presidência da República;
Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA)
c) Desenvolver e aperfeiçoar os indicadores de morte violenta de crianças e
adolescentes, assegurando publicação anual dos dados.
Responsáveis: Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da
República; Ministério da Saúde.
Parceiro: Ministério da Justiça
d) Desenvolver programas de enfrentamento da violência letal contra crianças e
adolescentes e divulgar as experiências bem sucedidas.
Responsáveis: Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da
República; Ministério da Justiça.
Objetivo estratégico IV:
Garantia de proteção dos defensores de Direitos Humanos e de suas atividades.
Ações programáticas:
a) Fortalecer a execução do Programa Nacional de Proteção aos Defensores dos
Direitos Humanos, garantindo segurança nos casos de violência, ameaça,
retaliação, pressão ou ação arbitrária, e a defesa em ações judiciais de má-fé, em
decorrência de suas atividades.
Responsável: Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da
República
Parceiros: Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República;
Ministério da Justiça.
Recomendação: Recomenda-se aos estados, Distrito Federal, municípios,
Poderes Legislativo e Judiciário, nas diversas esferas federativas, e Ministério
Público que cooperem para o enfrentamento às ações criminalizantes contra
defensores dos Direitos Humanos, dos movimentos sociais e suas lideranças, tais
como difamação, prisão ilegal ou arbitrária, falsa acusação, desqualificação de
seu trabalho e outras.
b) Articular com os órgãos de segurança pública e Direitos Humanos nos estados
para garantir a segurança dos defensores dos Direitos Humanos.
Responsáveis: Ministério da Justiça; Secretaria Especial dos Direitos Humanos
da Presidência da República.
Recomendações:
51
• Recomenda-se aos estados que adotem as medidas necessárias para
implementação ou fortalecimento dos programas de proteção aos
defensores dos Direitos Humanos, celebrando convênios com a União.
• Recomenda-se aos estados e ao Distrito Federal que adotem as medidas
necessárias para a proteção de defensores de Direitos Humanos
ameaçados, capacitando seus policiais e garantindo os recursos humanos
e materiais necessários para o exercício de suas funções.
c) Capacitar os operadores do sistema de segurança pública e de justiça sobre o
trabalho dos defensores dos Direitos Humanos.
Responsável: Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da
República
Parceiro: Ministério da Justiça.
d) Fomentar parcerias com as Defensorias Públicas dos Estados e da União para a
defesa judicial dos defensores dos Direitos Humanos nos processos abertos
contra eles.
Responsável: Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da
República
Recomendação: Recomenda-se que as Defensorias Públicas dos estados
consolidem o apoio jurídico aos defensores dos Direitos Humanos nos processos
judiciais, por meio de acordos de cooperação com o Programa de Proteção aos
Defensores dos Direitos Humanos.
e) Divulgar em âmbito nacional a atuação dos defensores e militantes dos Direitos
Humanos, fomentando cultura de respeito e valorização de seus papéis na
sociedade.
Responsáveis: Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da
República
Recomendação: Recomenda-se que os estados e o Distrito Federal desenvolvam
campanhas que valorizem os defensores dos direitos humanos e sua luta social.