Post on 08-Nov-2018
Universidade de Braslia
Faculdade de Cincias da Sade
Departamento de Enfermagem
Programa de Ps Graduao em Enfermagem
VALDENISIA APOLINARIO ALENCAR
CONTRIBUIES DA INTERNAO DOMICILIAR PARA PROMOVER A
DESOSPITALIZAO E PREVENIR A REOSPITALIZAO NO MBITO DO SUS
BRASLIA DF
2013
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Universidade de Braslia
Faculdade de Cincias da Sade
Departamento de Enfermagem
Programa de Ps Graduao em Enfermagem
VALDENISIA APOLINARIO ALENCAR
CONTRIBUIES DA INTERNAO DOMICILIAR EM PROMOVER A
DESOSPITALIZAO E PREVENIR A REOSPITALIZAO NO MBITO DO SUS
Dissertao apresentada como requisito parcial para a
obteno do titulo de Mestre em Enfermagem pelo
Programa de Ps-Graduao em Enfermagem da
Universidade de Braslia.
rea de Concentrao:
Polticas, prticas e cuidado em sade e enfermagem
Linha de Pesquisa:
Gesto da ateno sade e organizao dos servios
de Sade
Orientador: Prof. Dr. Emerson Fachin Martins
BRASLIA DF
2013
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VALDENISIA APOLINARIO ALENCAR
CONTRIBUIES DA INTERNAO DOMICILIAR EM PROMOVER A
DESOSPITALIZAO E PREVENIR A REOSPITALIZAO NO MBITO DO SUS
Dissertao apresentada como requisito parcial para a
obteno do titulo de Mestre em Enfermagem pelo
Programa de Ps-Graduao em Enfermagem da
Universidade de Braslia.
Aprovado em 30 de setembro de 2013
BANCA EXAMINADORA
Professor Doutor Emerson Fachin Martins Presidente da Banca
Universidade de Braslia
Professor Doutor Jos Antnio Iturri de la Mata Membro Efetivo e externo ao PPGEnf
Universidade de Braslia
Professora Doutora Leila Bernarda Donato Gottems Membro efetivo e interno PPGEnf
Universidade Catlica de Braslia
Professor Doutor Elioenai Dornelles Alves Membro suplente e interno PPGEnf
Universidade de Braslia
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Dedico este trabalho a minha referncia de
vida, minha me, exemplo de amor, trabalho e
honestidade. Que tinha como lema de vida:
minha famlia meu tesouro.
Dedico tambm ao grande amor da minha
vida, Ccero Alencar, ar dos meus pulmes.
Meu amigo, meu companheiro, meu cmplice
e eterno namorado. Sem voc nada teria
sentido.
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AGRADECIMENTOS
Agradeo primeiramente a Deus, meu sustento e inspirao.
Ao meu amado esposo, por sua pacincia, lealdade, cumplicidade, apoio e amor, eu no tenho
palavras para expressar minha gratido. Voc um presente de Deus para minha vida.
Aos familiares e amigos que acreditaram em mim e compreenderam minhas ausncias, em
especial ao Valter e Valdizia Apolinrio.
Aos queridos companheiros da ateno domiciliar do Distrito Federal em especial a equipe do
Ncleo Regional de Ateno Domiciliar de Ceilndia pela cumplicidade, apoio, incentivo e
principalmente por embarcarem na ousada proposta de construir um servio de ateno
domiciliar na Ceilndia.
Ao meu orientador, Emerson Fachin Martins, que foi para mim um pai acadmico, ensinando-
me muito sobre cincia e, alm disso, ofertou lies sobre persistncia, valores morais,
famlia, resilincia e esforo na busca de um ideal, eu serei eternamente grata por sua
dedicao e voto de confiana.
A toda a equipe do Ncleo Regional de Ateno Domiciliar da Regional de Sade de
Ceilndia que, quase desde sua origem em 2009, tem sido parceira dos projetos de ensino,
pesquisa e extenso coordenados pelo Prof. Dr. Emerson Fachin Martins. Obrigado por nos
permitir fazer parte desta histria.
Tenho um especial agradecimento aos pacientes e familiares admitidos no Programa de
Internao Domiciliar do Ncleo Regional de Ateno Domiciliar de Ceilndia, pela
oportunidade de aprendizado sobre cincias da sade, enfermagem, cuidado e muito mais
pelos ensinamentos de vida, de resilincia, compaixo, dedicao, amor incondicional e zelo
pelo outro. Vocs marcaram minha vida profundamente.
A Regional de Sade de Ceilndia, parceira constante dos projetos desenvolvidos na
Faculdade de Ceilndia (FCE) da Universidade de Braslia (UnB), nosso sincero
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agradecimento por possibilitar o uso desta grande regional como cenrio de investigao desta
pesquisa.
A todos os estudantes que ao longo desses anos tem contribudo com a execuo do ensino-
pesquisa-servio em Ceilndia, cenrio de trocas de conhecimento e experincia, em especial
dedico aos alunos que diretamente contriburam com este trabalho: Arthur Rodrigues Bezerra,
Ana Carolina Oliveira Costa, Daniela Aires Cardoso, Dyego Ramos Henrique, rika Cristina
Botelho Pinho, Lucas Lobato de Souza, Lus Carlos Beda do Nascimento, Ndia Luiza
Gonalves, Rayanne Peres Rosa, Renata Cristina Martins Silva, Samira Yusef Ali e outros.
Ao Decanato de Extenso (DEX) da Universidade de Braslia (UnB) que desde 2010 at 2013
tem apoiado administrativa e financeiramente as quadro edies anuais do Projeto de
Extenso de Ao Contnua (PEAC): MELHOR EM CASA DESOSPITALIZANDO PELA
ATENO NO DOMICLIO coordenado pelo Prof. Dr. Emerson Fachin Martins.
Ao Decanato de Pesquisa e Ps-Graduao (DPP) da Universidade de Braslia (UnB) que, por
meio da Diretoria de Fomento Iniciao Cientfica (DIRIC) em parcerias com o Conselho
Nacional de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico (CNPq) e a Fundao de Apoio
Pesquisa do Distrito Federal (FAPDF) subsidiou bolsas de iniciao cientfica para as
estudantes de graduao Ana Carolina Dill de Quadros de Matos (Terapia Ocupacional),
Beatriz dos Santos Mesquita (Fisioterapia), Joaquim Pedro Ribeiro Vasconcelos (Sade
Coletiva), Ludmila de Souza Santos (Enfermagem), Sara de Frana Mendes (Enfermagem) e
Pedro Henrique Corts de Sousa (Fisioterapia) que contriburam para a coleta parcial e
sistematizao de dados utilizados nesta dissertao.
Ao Prof. Dr. Oviromar Flores que em colaborao com o Prof. Dr. Emerson Fachin Martins
coordenaram o projeto de pesquisa que viabilizou recursos financeiros para a elaborao da
pesquisa apresentada nesta dissertao.
Agradeo a Fundao de Apoio Pesquisa do Distrito Federal (FAPDF) que em parcerias
estabelecidas com a Secretaria do Estado de Sade do Distrito Federal (SESDF), o Ministrio
da Sade (MS) e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico (CNPq)
concederam recursos financeiros pela aprovao do projeto de pesquisa LIMITES E
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POSSIBILIDADES NA DES-HOSPITALIZAO E PREVENO DE RE-
HOSPITALIZAO DE PORTADORES DE DOENAS CRNICO-DEGENERATIVAS
VIA FORTALECIMENTO DA POLTICA DE INTERNAO DOMICILIAR NO
MBITO DO SUS que concorreu ao Edital FAPDF 13/2010 Pesquisa para o SUS: Gesto
Compartilhada em Sade (PPSUS-DF processo: 193.000.346/2010).
Ao Programa Nacional de Reorientao da Formao Profissional em Sade (PRO-SADE) e
ao Programa de Educao pelo Trabalho para Sade (PET-SADE) que proporcionaram
fora de trabalho financiada pela aprovao do projeto FORTALECIMENTO DA REDE DE
ATENO SADE DE CEILNDIA: UM PROJETO DE REORIENTAO DA
FORMAO E DO CUIDADO EM SADE que concorreu ao Edital 24/2011 e foi
contemplado com recursos financeiros.
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A casa nosso canto no mundo.
A casa abriga o devaneio, a casa abriga o sonhador,
a casa permite sonhar em paz.
A casa nos ajuda a dizer: serei um habitante do mundo,
apesar do mundo.
A casa uma das maiores foras de integrao para os pensamentos,
as lembranas e os sonhos do homem.
Sem a casa o ser humano seria disperso,
jogado no mundo...
Gaston Bachelard
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RESUMO
ALENCAR, V.A. Contribuies da internao domiciliar em promover a
desospitalizao e prevenir a reospitalizao no mbito do SUS. 2013. 131 folhas.
Dissertao (Mestrado) Departamento de Enfermagem, Faculdade de Cincias da Sade,
Universidade de Braslia, Braslia, 2013.
Ateno domiciliar desponta como modalidade de assistncia que substitui ou complementa a
ateno hospitalar que ainda carente de estudos que descrevam suas contribuies. Assim,
objetivou-se investigar limites e possibilidades da internao domiciliar promover
desospitalizao e prevenir reospitalizao de sujeitos admitidos em Programa de Internao
Domiciliar (PID). Optou-se por delineamento de pesquisa observacional do tipo longitudinal
em etapas retrospectiva e prospectiva com abordagens qualitativa e quantitativa. Os dados
foram obtidos dos registros documentais do servio e dos sujeitos admitidos no perodo de
maio de 2009 a dezembro de 2012. Os resultados apontaram uma populao idosa (71%
acima de 60 anos), predominantemente masculina (52,5%), no alfabetizada (36,7%) e j
aposentada (44,6%). As doenas crnicas representaram 97,2% do que foi encontrado. Das
doenas diagnosticas como primrias e codificadas pela CID10 prevaleceu aquelas do
captulo do aparelho circulatrio (39,5%), seguidas por cdigos distribudos nos captulos de
neoplasias (27,7%), doenas do sistema nervoso central (21,5%) e consequncias de causas
externas (4,5%). Em mdia, os sujeitos conviviam com a doena primria por 73 meses,
podendo variar de 3 a 12 anos de cronicidade. Estes sujeitos permaneciam no PID por 378
29 dias, recebendo em mdia 2,8 visitas ao ms. Admisso via desospitalizao no PID
iniciou no ano de 2009 com uma frao de desospitalizao de 2,7% finalizando o ano de
2012 com 46,9%. Dentre os admitidos com desfecho de alta, 75% no foram reospitalizados
ou tiveram apenas 1 reospitalizao, sendo os admitidos com este desfecho significativamente
diferentes dos admitidos ativos ou com desfecho de bito, em que se observou mais de 1
reospitalizao. Conclui-se que o PID iniciou suas atividades com pequena contribuio na
desospitalizao que aumentou progressivamente aps 4 anos, neste perodo constatou-se que
o sucesso na assistncia domiciliar pode estar relacionado preveno de reospitalizao.
Descritores: gesto em sade, indicadores bsicos de sade, servios de assistncia domiciliar,
hospitalizao, doena crnica, enfermagem.
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ABSTRACT
ALENCAR, V.A. Home care contributions promoting dehospitalization and preventing
dehospitalization within SUS. 2013. 131 sheets. Thesis (Master) Department of Nursing,
Faculty of Health Science, University of Braslia, Braslia, 2013.
Home care emerges as a support modality that replaces or complements hospital care, which
is still poor of studies describing their contributions. Then, it was aim to investigate limits and
possibilities of the home care promotes dehospitalization and prevents rehospitalization of
subjects at a Home Care Program. It was used longitudinal observational research design by
retrospective and prospective phases, including qualitative and quantitative approaches. Data
were obtained from service and subject documental records during May 2009 until December
2012. The results pointed elderly population (71% above 60 years old), predominantly male
(52.5%), non-alphabetized (36.7%) and retired (44.6%). Chronic diseases represented 97.2%.
From diagnosed diseases as primary and codified by ICF10, it was prevalent those within
circulatory system (39.5%), neoplasia (29.3%), central nervous system diseases (21.5%) and
consequence of external causes (4.5%) chapters. In average, subjects had primary disease for
73 months, varying from 3 to 12 years of chronicity. These subjects remaining in the Home
Care Program for 378 29 days, receiving 2.8 times on average 2.8 visits by month. Starts by
dehospitalization into Home Care Program began on 2009 with dehospitalization fraction of
2.7%, ending on 2012 with 46.9%. Among subjects with outcome of discharge, 75% was not
rehospitalized or they had only 1 reospitalization, being significant different from subjects
with outcomes ative or dead, where was observed less than 1 reospitalization. It was
concluded that the Home Care Program began with few contributions to dehospitalization that
were increased progressively after 4 years, nowadays it was evidenced that success in home
care could be related with prevention of the rehospitalization.
Key-words: management health, health status indicators, home care services, hospitalization,
chronic disease, nursing.
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RESUMEN
ALENCAR, V.A. Aportes de la atencin domiciliaria en la promocin de la
deshospitalizacin y prevenir rehospitalizacin el SUS. En 2013. 131 hojas. Tesis (Master)
Departamento de Enfermera de la Facultad de Ciencias de la Salud de la Universidad de
Brasilia, Brasilia, 2013.
Cuidado en el hogar se est convirtiendo en una modalidad de ayuda que sustituye o complementa
la atencin hospitalaria que an falta estudios que describen sus contribuciones. As, este estudio
tuvo como objetivo investigar los lmites y posibilidades de atencin en el hogar y evitar
reospitalizao promover la desinstitucionalizacin de los pacientes ingresados en Programa de
Asistencia Domiciliaria (PID). Hemos elegido para la investigacin del diseo pasos
longitudinales observacionales en estudio retrospectivo y prospectivo de los enfoques cualitativos
y cuantitativos. Los datos se obtuvieron de los registros documentales de los servicios y los
sujetos ingresados entre mayo de 2009 y diciembre de 2012. Los resultados mostraron una
poblacin de edad avanzada (71 % ms de 60 aos), con predominio masculino (52,5 %),
analfabetos 36,7 %) y ahora jubilados (44,6 %). Las enfermedades crnicas representan el 97,2 %
de lo que se encontr. Enfermedades como diagnstico primario y codificado por CIE-10 se
impusieron las del captulo del aparato circulatorio (39,5 %), seguido de los cdigos distribuidos
en los captulos neoplasias (29,3 %) , enfermedades del sistema nervioso central (21,5 % %) y
secuelas de causas externas (4,5 %) . En promedio, los sujetos vivan con la enfermedad primaria
durante 73 meses y puede variar de 3 a 12 aos de cronicidad. Estos temas quedaron en PID de
378 29 das, recibiendo una media de 2,8 visitas por mes. La admisin a travs de la
desinstitucionalizacin PID se inici en 2009 con una fraccin de desinstitucionalizacin del 2,7
% cerrando el ao 2012 con 46,9 %. Entre los admitidos con gran resultado, el 75 % no eran o
tenan slo 1 reospitalizados reospitalizao, de ser admitido con este resultado significativamente
diferente de los activos admitidos o el resultado de la muerte, en el que hubo ms de un
reospitalizao. Llegamos a la conclusin de que las actividades PID comenzaron con una
pequea contribucin a la desinstitucionalizacin que aumenta progresivamente a partir de cuatro
aos, durante este perodo se encontr que el cuidado en casa con xito puede estar relacionado
con la prevencin reospitalizao.
Palabras-clave: gestin de la salud, los indicadores de salud, servicios de atencin domiciliaria, la
hospitalizacin, enfermedad crnica, de enfermera.
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LISTA DE FIGURAS
Figura 1 Pirmide etria Brasil, Amrica Latina e Caribe de 1950-2050. 024
Figura 2 Evoluo temporal das taxas de fecundidade do Chile, Brasil. Estados Unidos da
Amrica (EUA), Coria do Sul, China e Alemanha. 025
Figura 3
Trajetria de involuo da fertilidade no mundo e por grupo selecionado de regies
mais e menos desenvolvidas e de pases com desenvolvimento classificado como
mnimo.
026
Figura 4 Relao entre quantidade de funo e idade observada nos ciclos da vida e ilustrando
diferenas entre envelhecimento fisiolgico e patolgico. 034
Figura 5 Memorial cronolgico e marcos histricos da implementao dos Ncleos Regionais
de Ateno Domiciliar no Distrito Federal. 055
Figura 6 Memorial cronolgico e marcos histricos da implementao do Ncleo Regional de
Ateno Domiciliar de Ceilndia. 056
Figura 7
Histograma da distribuio de frequncia da idade em anos completos observada na
populao de sujeitos admitidos no Programa de Internao Domiciliar (PID) at
dezembro de 2012.
060
Figura 8
Histograma da distribuio de frequncia da renda familiar em salrios mnimos
observada na populao de sujeitos admitidos no Programa de Internao Domiciliar
(PID) at dezembro de 2012.
061
Figura 9
Grfico de linhas indicando a incidncia de unidades de morbidade codificadas por tipo
de comorbidade (da doena primria sextenria) encontrada na populao de sujeitos
admitidos no Programa de Internao Domiciliar (PID) at dezembro de 2012.
063
Figura 10
Histograma da distribuio de frequncia da cronicidade em meses da doena de base
(primria) observada na populao de sujeitos admitidos no Programa de Internao
Domiciliar (PID) at dezembro de 2012.
064
Figura 11
Histograma da distribuio de frequncia do tempo de permanncia em dias observado
na populao de sujeitos admitidos no Programa de Internao Domiciliar (PID) at
dezembro de 2012.
064
Figura 12
Grficos de linhas indicando a dinmica mensal de visitas, admisso e alta no
Programa de Internao Domiciliar at dezembro de 2012. A curva identificada como
ativo corresponde valor resultante das entradas por admisses e sadas por altas
mensais.
066
Figura 13
Grfico de linhas indicando a incidncia anual de pacientes admitidos e
desospitalizados, bem como a frao de desospitalizao em porcentagem do total de
admitidos encontrada na populao de sujeitos no Programa de Internao Domiciliar
(PID) at dezembro de 2012.
067
Figura 14
Blox plots indicando comparaes da idade, renda familiar, cronicidade e tempo de
permanncia entre os sujeitos desospitalizados e os admitidos por outra via de entrada
no Programa de Internao Domiciliar (PID) at dezembro de 2012.
069
Figura 15 Grficos de barras indicando a proporo de desfechos observados na populao de
sujeitos admitidos no Programa de Internao Domiciliar (PID) at dezembro de 2012. 070
14
Figura 16
Blox plots indicando comparaes entre os grupos de desfechos (bitos, ativos e altas)
para os sujeitos admitidos no Programa de Internao Domiciliar (PID) at dezembro
de 2012.
072
15
LISTA DE TABELAS
Tabela 1
Detalhamento histrico dos marcos temporais da implentao e consolidao do
Ncleo Regional de Ateno Domiciliar da Regional de Sade de Ceilndia (NRAD-
CEI).
057
Tabela 2 Caractersticas pessoais e demogrficas da populao de sujeitos admitidos no
Programa de Internao Domiciliar (PID) at dezembro de 2012. 058
Tabela 3 Caractersticas sociodemogrficas da populao de sujeitos admitidos no Programa de
Internao Domiciliar (PID) at dezembro de 2012. 059
Tabela 4 Caractersticas econmicas e culturais da populao de sujeitos admitidos no Programa
de Internao Domiciliar (PID) at dezembro de 2012. 060
Tabela 5 Distribuio de frequncia das comorbidades codificadas pela CID10 na populao de
sujeitos admitidos no Programa de Internao Domiciliar (PID) at dezembro de 2012. 062
Tabela 6 Distribuio de frequncia das comorbidades codificadas pela CID10 na populao de
sujeitos desospitalizados at dezembro de 2012. 068
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LISTA DE ABREVEATURAS, SIGLAS E SMBOLOS
aC Antes de Cristo
AIDS Acquired Immunodeficiency Syndrome
AVE Acidente Vascular Enceflico
AVD Atividades de Vida Diria
CID10 Classificao Internacional de Doenas 10 Edio
CSC Centro de Sade de Ceilndia
DCNT Doena Crnica No Transmissvel
DF Distrito Federal
ECVE Escala da Cruz Vermelha Espanhola
EMAD Equipe Multiprofissional de Ateno Domiciliar
EMAP Equipe Multiprofissional de Apoio
EPM Erro Padro da Mdia
ESF Estratgia Sade da Famlia
EUA Estados Unidos da Amrica
FCE Faculdade de Ceilndia
GEAD Gerncia de Ateno Domiciliar
HIV Human Immunodeficiency Virus
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica
NRAD Ncleo Regional de Ateno Domiciliar
NRAD-CEI Ncleo Regional de Ateno Domiciliar da Regional de Sade de Ceilndia
OMS Organizao Mundial da Sade
ONU Organizao das Naes Unidas
RAS Redes de Ateno em Sade
PACS Programa de Agentes Comunitrios de Sade
PAD Programa de Ateno Domiciliar
PEAC Projeto de Extenso de Ao Contnua
PET Programa de Educao pelo Trabalho
PIB Produto Interno Bruto
PID Programa de Internao Domiciliar
PNH Poltica Nacional de Humanizao
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PPGEnf Programa de Ps Graduao em Enfermagem
RA Regio Administrativa
RASS-AD Registro de Aes Ambulatoriais de Sade da Ateno Domiciliar
SAD Servios de Ateno Domiciliar
SIA Sistema de Informaes Ambulatoriais
SIAB Sistema de Informao da Ateno Bsica
SIH Sistema de Informaes Hospitalares
SIM Sistema de Informaes de Mortalidade
SINASC Sistema de Informao de Nascidos Vivos
SIOB Sistema de informao de Oramento Pblico em Sade
SES/DF Secretaria de Estado de Sade do Distrito Federal
SUS Sistema nico de Sade
UBS Unidade Bsica de Sade
UN United Nations
UnB Universidade de Braslia
UTI Unidade de Terapia Intensiva
WHO World Health Organization
18
SUMRIO
1 APRESENTAO............................................................................................................................... 018
2 INTRODUO.................................................................................................................................... 020
3 REVISO DA LITERATURA........................................................................................................... 023
3.1 TENDNCIAS NA ATENO A SADE DE UMA POPULAO EM CONSTANTE
CRESCIMENTO.................................................................................................................. ................ 023
3.2 O DESAFIO DAS CONDIES CRNICAS..................................................................................... 030
3.3 ESTRATGIAS PARA O ENFRENTAMENTO DAS CONDIES CRNICAS: ATENO
DOMICILIAR............................................................................. .......................................................... 036
3.4 IMPORTNCIA DOS INDICADORES PARA GESTO NA SADE............................................. 041
3.5 HOSPITALIZAO, DESOSPITALIZAO E PREVENO DE REOSPITALIZAO............ 044
4 OBJETIVOS......................................................................................................................................... 050
5 MTODOS........................................................................................................................................... 051
5.1 DELINEAMENTO DA PESQUISA..................................................................................................... 051
5.2 LOCAL DE ESTUDO................................................................................ ........................................... 051
5.3 POPULAO ALVO.............................................................................. .............................................. 052
5.4 ABORDAGEM QUALITATIVA.......................................................................................................... 053
5.5 ABORDAGEM QUANTITATIVA....................................................................................................... 053
5.5.1 Procedimento de coleta e variveis................................................................................................. 054
5.5.2 Processamento e anlise estatstica................................................................................................. 054
6 RESULTADOS..................................................................................................................................... 055
6.1 MEMORIAL CRONOLGICO E MARCOS HISTRICOS.............................................................. 055
6.2 CARACTERIZAO DA POPULAO............................................................................................ 059
6.3 PERFIL EPIDEMIOLGICO E ASSISTENCIAL............................................................................... 062
6.4 CONTRIBUIES PARA A DESOSPITALIZAO........................................................................ 068
6.5 CONTRIBUIES PARA A PREVENO DE REOSPITALIZAO........................................... 071
7 DISCUSSO......................................................................................................................................... 073
8 CONCLUSES.................................................................................................................................... 090
9 REFERNCIAS................................................................................................................................... 92
10 ANEXOS............................................................................................................................................... 112
10.1 ANEXO A............................................................................................................................................. 112
11 APNDICES......................................................................................................................................... 121
11.1 APNDICE A.......................................................................,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,......................... 121
19
1 APRESENTAO
Meu interesse pela temtica coincide com o inicio da minha carreira como enfermeira,
uma vez que meu primeiro emprego como enfermeira foi no servio pblico, na Secretaria de
Estado de Sade do Distrito Federal (SES/DF), onde assumi o cargo de chefe do Ncleo
Regional de Ateno Domiciliar de Ceilndia (NRAD-CEI), em janeiro de 2009. Antes disso
apenas havia trabalhado como tcnica de enfermagem, em hospital militar, nos setores de
quimioterapia, internao geral e Unidade de Terapia Intensiva (UTI). Portanto, assumir a
implantao de um servio de ateno domiciliar foi um duplo desafio, pois alm de adentrar
a desconhecida rea da ateno domiciliar eu precisei aprender e dominar os diversos
meandros e ferramentas da gesto em sade. Foi um perodo de grande crescimento pessoal e
profissional.
Logo no inicio das atividades do NRAD-CEI firmamos parceria com a Universidade
de Braslia (UnB), na pessoa do Professor Dr. Emerson Fachin Martins, no intuito de vincular
ensino-servio-pesquisa e extenso na rea da ateno domiciliar, nossas metas eram por um
lado basear as aes de assistncia domiciliar dos profissionais do NRAD-CEI em evidncia
cientfica e por outro, apresentar essa modalidade de atuao aos acadmicos das disciplinas
de sade da Faculdade de Ceilndia (FCE), numa recproca troca de experincias e
conhecimentos tendo como meta comum divulgar e fortalecer a poltica de ateno domiciliar
no Sistema nico de Sade (SUS), contribuindo com a consolidao desse servio na
Regional de Sade de Ceilndia.
Nesse perodo o NRAD constituiu equipe multiprofissional que assumiu o desafio de
implantar um programa de ateno domiciliar na maior regional de sade da SES-DF, tal
esforo tem logrado bons resultados na ateno a sade de indivduos com doenas crnicas,
desde sua origem primando pela qualidade e pela promoo de princpios como integralidade,
acesso e equidade em sade por meio da ateno domiciliar.
Uma das caractersticas do NRAD-CEI o forte envolvimento cientfico, sendo que
at julho de 2013 foram desenvolvidos trs edies do Projeto de Extenso de Ao Contnua
(PEAC), um Programa de Educao para o Trabalho (PET), em parceria com o Ministrio da
Sade/ UnB/ NRAD e trs servidoras iniciaram suas ps graduao, stricto sensu, nvel
mestrado, na UnB. A coordenao acadmica dos projetos e orientao das servidoras, agora
estudantes da ps-graduao da UnB foi feita pelo Prof. Dr. Emerson Fachin Martins.
20
Em pouco tempo o NRAD-CEI estabeleceu-se como uma das referncias no servio de
ateno domiciliar no Distrito Federal (DF), e em 2011 iniciei meu curso de mestrado, no
Programa de Ps-Graduao em Enfermagem (PPGEnf) da UnB, com a meta de estudar dois
relevantes indicadores assistncias da ateno domiciliar que o de promover
desospitalizao e prevenir reospitalizao.
A experincia de atuao na ateno domiciliar nestes quase quatro anos me fez
repensar e reconstruir todo o projeto profissional construdo por mim durante toda a minha
vida profissional. Na verdade eu no tinha ideia das possiblidades de atuao profissional
tendo como cenrio a casa, o lar de um individuo, no tinha noo de toda a estrutura
necessria para a prestao desse tipo de cuidado, quo complexo pode ser a assistncia no
domicilio, bem como quo resolutivo, especialmente no servio pblico de sade. A ateno
domiciliar tem sido uma experincia marcante no apenas profissionalmente, mas
pessoalmente, como ser humano, enriquecedora a relao com o individuo e famlia, isto me
cativa cada dia mais, exigindo dedicao, estudo constate, resilincia e diversas competncias
profissionais, ..
Sou defensora inveterada por acreditar que uma estratgia necessria no sentido de
garantir e viabilizar o cumprimento dos princpios do SUS a uma parcela da populao que
necessita desse tipo de assistncia, alm de ampliar as possibilidades de atuao aos
profissionais de sade e otimizar os recursos existentes . Fato tambm a carncia de
maiores investimentos em polticas pblicas e pesquisas para o fortalecimento e consolidao
dessa modalidade de ateno sade.
21
2 INTRODUO
Historicamente e antes mesmo da criao do SUS era possvel localizar pesquisa que
apontava para programas experimentais focados na ateno domiciliar de pacientes crnicos
frente grande quantidade de sujeitos hospitalizados desnecessariamente (hospitalizao
redundante hospitalizao evitvel) que, alm disso, estavam mais suscetveis aos riscos
decorrentes da internao hospitalar prolongada, ocupando leitos hospitalares com
desperdcio de recursos financeiros e humanos (CORDEIRO et al., 1977).
Mais de 30 anos depois, hoje no Brasil a internao domiciliar j conta com poltica
pblica que institui sua insero no mbito do SUS (BRASIL, 2013a, 2013b, 2013c, 2013e,
2013f, 2013h, 2013i). Principalmente direcionada a sujeitos portadores de doenas crnicas
em estado de dependncia funcional, tal poltica de sade se faz valer no Distrito Federal por
meio do Programa de Internao Domiciliar (PID) implantado pelos NRAD (BRASIL,
2008a; 2008c).
Apesar da evoluo histrica para assistncia das condies crnicas, o manejo e
controle dessas condies um desafio que continua a dominar a agenda dos sistemas de
ateno sade no mundo e no Brasil, visto que a preveno e a cura para muitas doenas
ainda no esto disponveis e porque j existe uma grande parte da populao vivendo com
condies crnicas incapacitantes (BRASIL, 2013d; BRASIL, 2011a; SCHMIDT et al., 2011;
BAGSHAW et al., 2009; POT et al., 2009; RAVEN et al., 2009; RIZZI et al, 2009, TIBALDI
et al, 2009; CORDEIRO et al., 1977).
Neste contexto, a promoo da sade no deve limitar-se apenas preveno de
doenas, mas tambm preveno de agravos consequentes s doenas crnico-
degenerativas. Porm, se j complicado promover a prtica de aes preventivas
mundialmente conhecidas como padro de alimentao, nveis de atividade fsica, hbito de
fumar, dentre outros; desafio maior ainda colocar em prtica aes preventivas secundrias
pouco conhecidas, relacionadas preveno de agravos em pacientes portadores de doenas
crnicas (CAMARGOS et al., 2009, 2008, 2005; GASPAR et al., 2007; HAM, 2012).
Uma srie de doenas, embora menos suscetveis a conduzir para morte prematura, so
excessivamente onerosas em termos socioeconmicos por reduzir a produtividade e qualidade
de vida, bem como por promover o sofrimento humano. Artrite, diabetes, asma, sequelas de
acidente vascular enceflico, dentre outras so bons exemplos destas condies (WHO, 2013,
22
2011; BRASIL, 2011a; SCHMIDT et al., 2011; RIZZI et al., 2009; SINGH, 2008;
MOCELIN et al., 2001).
O modelo de sade no Brasil encontra srios problemas neste cenrio, pois tem como
base organizacional a caracterstica de ser fragmentado em especialidade, hospitalocntrico,
hierarquizado e estruturado para atender condies agudas acionadas pela demanda
populacional. Assim, comum observar nos hospitais condies sensveis ateno primria
(CALDEIRA et al., 2011; MOURA et al., 2010; FERNANDES et al., 2009; ALFRADIQUE
et al., 2009) que se somam s internaes hospitalares de portadores de doenas crnicas que
poderiam ser alocadas em servios de internao domiciliar (MENDES EV, 2012; SOUZA e
COSTA, 2011; MOREIRA e DULTILHNOVAES, 2011; TIBALDI et al., 2009; DAL BEN et
al., 2006; MESQUITA et al., 2005; SILVA et al., 2005).
Alm disso, observa-se que apesar da competncia no tratamento das doenas, a
assistncia hospitalar tornou-se ineficaz na resolutividade de algumas delas, elevando a mdia
de permanncia dos pacientes internados e os episdios de reospitalizaes (MENDES EV,
2012; DUTRA et al., 2011; GARBINATO et al., 2007) e favorecendo a reinternao dos
mesmos sem sanar o problema que motivou internao (ESTRELLA et al., 2009; GUERRA
e RAMOS-CERQUEIRA, 2007; PEIXOTO et al., 2004) .
Desta forma, o PID representa uma estratgia na reverso da ateno centrada nos
hospitais e proporciona a elaborao de uma nova sistemtica de ateno em sade e na
humanizao desta ateno (SILVA KL et al., 2010; FEUERWERKER E MERHY, 2008;
REHEM e TRAD, 2005; SILVA et al., 2005) . Entende-se que a anlise de programas em
funcionamento deve contribuir para a definio de polticas pblicas de sade e para o
aperfeioamento dos servios j implantados, rumo efetividade dos princpios do SUS.
A relevncia do estudo se deve ao fato que ateno domiciliar tem ressurgido como
uma tendncia mundial em resposta s demandas decorrentes da transio demogrfica e
epidemiolgica, caracterizadas pelo envelhecimento populacional e pela prevalncia de
doenas crnicas (SERAFIM et al., 2011; RAVEN et al., 2009; POT et al., 2009; VECINA
NETO e MALIK, 2007; LACERDA, 2006; CLARCK, 2003; AMARAL, 2001).
A anlise dos limites e possibilidades em desospitalizar pacientes com condies
crnicas, bem como a preveno de reospitalizaes dos mesmos, representa conhecimento
no suficientemente pesquisado que poder auxiliar no planejamento e implantao das atuais
polticas pblicas de sade, bem como no estabelecimento de futuras polticas.
23
3 REVISO DA LITERATURA
3.1 TENDNCIAS NA ATENO A SADE DE UMA POPULAO EM
CONSTANTE CRESCIMENTO
A ateno sade passa por um momento de reengenharia, principalmente empenhada
na busca para responder s demandas provenientes das duas grandes transies populacionais
decorrente do crescimento humano que impactaram diretamente a maneira de promover
sade: (1) a transio demogrfica e (2) a transio epidemiolgica (VASCONCELOS et al.,
2012; OPAS, 2012; VERAS, 2009; ALVES, 2008, 2004; VECINA NETO e MALIK, 2007).
Embora o crescimento populacional seja preocupao presente desde os primrdios da
humanidade, como constatado em obras de Plato, Aristteles, Ccero e Confcio (KIELING,
2009) na histria recente que governos pelo mundo comearam a mobilizar aes no
sentido de combater os problemas gerados por este crescimento, que representa um grande
desafio para os servios de assistncia sade (MENDES EV, 2012; KIELING, 2009;
VECINA NETO e MALIK, 2007; WONG e CARVALHO, 2006).
Levantar questes relativas ao crescimento populacional requer plena compreenso do
papel e significado do termo demografia que segundo informa ALVES (2003, p.131):
O termo foi utilizado pela primeira vez em 1855 pelo pesquisador belga Achille
Guillard. Do ponto de vista etimolgico, a palavra demografia formada a partir de
dois vocbulos gregos: dmos (demo), que quer dizer povo, populao ou povoao,
e grphein (grafia), que quer dizer ao de escrever, descrio ou estudo. Portanto, o
objeto da Demografia a anlise das populaes humanas e suas caractersticas
gerais. Mais especificamente, a Demografia estuda o tamanho da populao, sua
composio por sexo e idade e sua taxa de crescimento (positiva ou negativa). A
Demografia se autodefine como cincia, tendo como um dos seus objetos de estudo
os problemas populacionais.
Conceituado Demografia, fica claro entender que a importncia da transio
demogrfica acelerada se da por seu resultado direto no aumento da longevidade,
considerando a equao composta pela queda da mortalidade e pela reduo da natalidade
(ALVES, 2008).
Este novo comportamento da mortalidade e natalidade influenciou diretamente a
alterao da estrutura etria da pirmide populacional em mbito mundial. Se no passado
envelhecer era raro e at mesmo um privilgio, hoje caracterstica presente e comum para
milhes de cidados, tanto em pases desenvolvidos com em pases em desenvolvimento
(UM, 2013, 2013b; TURRA, 2012; CHRISTENSEN et al., 2009; KIELING, 2009).
24
Um mesmo comportamento etrio pode ser observado e estimado no perodo de 1950
a 2050 para pases caribenhos e da Amrica Latina quando comparado ao Brasil (UN, 2003).
A transio ocasionada pela diminuio da base da pirmide decorrente da reduo da
natalidade e o alargamento do seu topo causado pela queda na mortalidade e aumento da
longevidade, conforme observado na figura 1, ilustra o que j presenciado em 2013 e o que
ir acontecer at 2050 (UN, 2013b, 2005, 2003)
Figura 1. Pirmide etria Brasil, America Latina e Caribe de 1950-2050 (WONG e CARVALHO, 2006).
Muitos aspectos so considerados contribuintes na queda da mortalidade e
consequente longevidade observada nas populaes, dentre eles so citados os avanos
biotecnolgicos na sade, as estratgias e programas de sade pblica, o maior acesso a
saneamento bsico, crescente desenvolvimento socioeconmico e das foras produtivas, um
maior acesso a bens e servios, melhorias que resultam em aumento na renda familiar e
qualidade de habitao, bem como mudanas no acesso alimentao de qualidade que
influencia diretamente na qualidade de vida (TURRA, 2012; KIELING,2009).
Com relao reduo da natalidade e taxa de fecundidade, existe uma teoria,
conhecida como teoria da modernizao, que afirma que as taxas de fecundidade
permaneceram altas por longo perodo, mesmo aps o processo de urbanizao e
25
industrializao, o que possibilitou melhoria no padro de vida, maior acesso aos bens e
servios e crescimento econmico (KIELING, 2009; ALVES, 2002; NOTESTEIN, 1945).
A manuteno em alta das antigas taxas de fecundidade se dava pela influncia dos
perodos de guerra e epidemias que provocava grande mortalidade, levando instituies a
estimularem a natalidade (KIELING, 2009).
Tal prtica era vista nas aes do prprio Estado que criavam leis e normas. Estmulo
fecundidade tambm era influenciada no processo educativo; pela igreja por meio das
crenas e costumes; bem como pelas prprias famlias que atendiam a ideologia de manter
grande quantidade de filhos (KIELING, 2009; ALVES, 2008; BRITO, 2007).
Aps algum tempo estas crenas e tabus em relao quantidade de filhos foi
superada e inaugurou-se um novo tempo onde o controle da natalidade foi progressivamente
adotado e facilitado pelo acesso a meios reguladores da fecundidade (KIELING, 2009;
BRITO, 2007; ALVES, 2004). Relatos como o transcrito abaixo reforam esta viso:
A transio da fecundidade um fenmeno social da maior importncia, pois, alm
de afetar a dinmica do crescimento demogrfico, afeta a estrutura etria da
populao, com grandes consequncias sobre o relacionamento entre as geraes e
os diversos grupos de idade. As mudanas da estrutura etria transcendem os
aspectos demogrficos, afetando as polticas de educao, sade, emprego e
previdncia, tendo profundo efeito sobre o processo de planejamento
socioeconmico do pas e sobre as polticas pblicas (ALVES, 2004, p.12)
A evoluo temporal da taxa de fertilidade observada no perodo de 1980 a 2005
aponta dentre seis pases que o Brasil era, em 1980, o pas com a maior quantidade de filhos
por mulher (figura 2). Entretanto, com o passar dos anos, esse indicador foi diminuindo, at
que em 2005 a populao brasileira passou a ser constituda por mulheres com menos de dois
filhos, ficando abaixo de pases como o Chile e os Estados Unidos.
Fonte: UN (2005) Figura 2. Evoluo temporal das taxas de fecundidade do Chile, Brasil. Estados Unidos da Amrica (EUA),
Coria do Sul, China e Alemanha.
26
Mesmo frente s diferenas econmicas e sociais em todo o mundo, h uma
similaridade nas taxas de fecundidade, com projees de reduo mundial do nmero de
filhos por mulheres, tanto em pases desenvolvidos como nas naes mais pobres, como
mostra o ltimo relatrio mundial da UN (2013b) da figura 3.
Figura 3. Trajetria de involuo da fertilidade no mundo e por grupo selecionado de regies mais e menos
desenvolvidas e de pases com desenvolvimento classificado como mnimo. Dados e projees de 1950-2100
(variao mdia)
Associado ao exposto observa-se que a expectativa de vida tem se alongado quase que
linearmente na maioria dos pases desenvolvidos e sem sinais de desacelerao. Em pases
onde a populao tem maior longevidade como os da Europa Ocidental, Europa Oriental,
Estados Unidos, Canad, Austrlia, Nova Zelndia e Japo; a expectativa para crianas
nascidas a partir do sculo XX, caso se mantenha o atual nvel de crescimento anual, pode
chegar aos 100 anos de idade (UN, 2013b; TURRA, 2012; CHRISTENSEN et al., 2009).
Anlises feitas por demgrafos (OEPPEN e VAUPEL, 2002), tomando como base
regies com maior ndice de longevidade e considerando um perodo de quase dois sculos
demonstraram que a expectativa de vida ao nascer, entre as mulheres, cresceu linearmente
cerca de trs meses a cada ano.
Entre os cientistas que estudam a transio na estrutura etria existem os chamados
futuristas que argumento que a taxa de desenvolvimento tecnolgico ir avanar ainda neste
27
sculo, permitindo que se alcance a imortalidade dentro de 40-50 anos. No outro lado do
debate, h os chamados realistas, grupo defensor da ideia da existncia de barreiras
biolgicas e ambientais para a continuidade da regularidade histrica de queda da
mortalidade. Sua proposio que a diminuio no ritmo de crescimento da expectativa de
vida ao nascer ocorrer, por exemplo, pelo aumento na prevalncia de comportamentos de
risco na populao jovem (obesidade, tabagismo, sedentarismo), pela violncia urbana e pelos
efeitos da poluio sobre a sade (OEPPEN E VAUPEL 2002; OLSHANSKY et al., 2009;
TURRA, 2012).
A partir da extrapolao de sries histricas, a expectativa de vida ao nascer feminina
atingir um sculo de vida no pas recordista em longevidade, ainda em 2060, segundo
Oeppen e Vaupel (2002). Esta viso compartilhada pela maioria dos demgrafos, embora
no seja consenso.
Assistimos a um acelerado crescimento populacional, em que se observa no ano de
1800 uma populao global em torno de um bilho de habitantes que cresceu hoje para
nmeros que ultrapassam os oito bilhes de habitantes, tudo isso em cerca de duzentos anos
(TURRA, 2012).
Apesar da boa notcia do envelhecimento populacional, h uma preocupao com a
qualidade deste envelhecimento. H vrias dcadas pesquisadores e formuladores de polticas
no mundo todo tm se preocupado com o processo de envelhecimento saudvel, a senescncia
(TURRA, 2012; IBGE, 2011; POULAIN, 2010; MORAES, 2008).
fato a maior prevalncia de deficincia nesta populao e a maior demanda e custos
na ateno desta parcela da populao. Maior longevidade pode significar mais anos de
incapacidade, perda de autonomia e demanda por cuidado. Se por um lado os avanos tem
propiciado maior longevidade isso no garantia de funcionalidade, independncia e
autonomia (CAMPOLINA et al., 2013; URSINE et al., 2011; CAMARGOS et al., 2008,
2009; BONARDI et al, 2007).
A expresso transio demogrfica, originalmente Demographic Transition Model, foi
inicialmente proposta em 1929, pelo norte americano Warren Thompson, na busca de tentar
explicar a queda na mortalidade e natalidade, que ocasionou aumento da longevidade. Ela foi
entendida como o estudo das modificaes que ocorrem nas populaes humanas desde o
perodo das altas taxas de nascimento (natalidade) e altas taxas de mortalidade, at os
perodos de baixas taxas de nascimento e mortalidade (THOMPSON, 1929).
28
Em sua construo terica, Thompson (1929), defendia trs etapas nessa transio: a
primeira, em que a taxa de mortalidade cai e a taxa de natalidade permanece elevada,
provocando um rpido crescimento da populao; a segunda, etapa em que a taxa de
natalidade comea a cair, o que reduz progressivamente o crescimento populacional e a
terceira etapa, quando tanto a taxa de natalidade quanto a de mortalidade mantm-se baixas,
resultando em lento crescimento demogrfico.
Associado a essa mudana demogrfica temos a transio do perfil epidemiolgico
que, segundo Mendes EV (2012), pode ser entendida conforme transcrito abaixo:
Tradicionalmente trabalha-se em sade com uma diviso entre doenas
transmissveis e doenas crnicas no transmissveis. Essa tipologia, talhada na
perspectiva da etiopatogenia, largamente utilizada, em especial, pela
epidemiologia. verdade que essa tipologia tem sido muito til nos estudos
epidemiolgicos, mas, por outro lado, ela no se presta para referenciar a
organizao dos sistemas de ateno sade. A razo simples: do ponto de vista
da resposta social aos problemas de sade, o objeto dos sistemas de ateno sade,
certas doenas transmissveis, pelo longo perodo de seu curso, esto mais prximas
da lgica de enfrentamento das doenas crnicas que das doenas transmissveis de
curso rpido. Alm disso, uma tipologia que se assenta no conceito de doena e
exclui outras condies que no so doenas, mas que exigem uma resposta social
adequada dos sistemas de ateno sade (MENDES EV, 2012, p.33)
O entendimento da atual situao sanitria imprescindvel para elaborao de
estratgias eficazes, capazes de garantir acesso, qualidade, sustentabilidade e equidade. A
Organizao Mundial de Sade (OMS) vem incorporando paulatinamente essa nova tipologia,
que melhor representa o cenrio de sade, no se restringindo ao binmio de doena crnica-
doena infecciosa, mas utilizando terminologia ampla que melhor representa a demanda e
possibilita uma gesto e organizao dos sistemas de ateno sade em que o termo
condio em sade pode ser referente tanto crnica como a aguda (WHO, 2013, 2011, 2008,
2005, 2003).
fato que algumas doenas agudas, aps a incorporao das biotecnologias em sade,
passaram a evoluir com curso longo, tornando-se condies crnicas, como o caso da
tuberculose, a AIDS, a hansenase, entre outras. Por isso, a categorizao baseada nas
condies de sade tem sido utilizada por ser mais representativa da atual realidade em sade.
Estas tipologias trazem em si a complexidade da ateno sade e refletem novas demandas
que exigem inovadoras formas de prestao de cuidado (WHO, 2003). H dois elementos
chave para entendimento deste conceito de condio de sade, a forma de enfrentamento e o
tempo de durao. A forma de enfrentamento corresponde maneira pela qual a organizao
29
de sade e os prprios usurios do sistema de sade tratam a questo sade, se de forma
episdica ou reativa, com foco nas doenas e na queixa-conduta ou se contnua, proativa e
focada nas pessoas e famlias por meio de cuidados permanentes, contidos num plano de
cuidado elaborado conjuntamente pela equipe de sade e pelas pessoas usurias (MENDES,
2011; MENDES EV, 2012; CAMARGOS et al., 2009, 2005).
Ainda, em relao s condies de sade, outra varivel importante a ser considerada
o tempo de evoluo, onde as condies agudas geralmente evoluem em curto perodo de
tempo, inferior a trs meses e tendem a se autolimitar. As condies crnicas evoluem em
perodo maior, sendo relativamente longo (superior a trs meses) e geralmente se
apresentando de forma definitiva e permanente (MENDES EV, 2012; SINGH, 2008; VON
KORFF, 1997).
Se no inicio do sculo a mortalidade, em sua maioria, era por doenas infecciosas;
hoje temos um novo e complexo cenrio, caracterizado por tripla carga de doenas oriunda
das relaes entre doenas infectocontagiosas e doenas crnicas (MENDES EV, 2012;
SCHMIDT et al., 2011; VECINA NETO e MALIK, 2007).
Atualmente permanece a antiga agenda, ainda no superada de doenas
infectocontagiosa. H uma agenda relativamente nova, gerada pelo progressivo aumento da
morbimortalidade ocasionado pelas doenas crnicas no transmissveis (DCNT) associadas
s causas externas. Finalmente uma agenda recente, proveniente de uma carga importante de
enfermidades que faziam parte da agenda antiga (doenas infectocontagiosas como dengue,
tuberculose), somado a molstias infectocontagiosas emergentes (AIDS, hantaviroses,
doenas espongiforme humana) que apesar do carter de doena infecciosa j no causa os
mesmos danos letais, sendo controlada por longo perodo quando assumido o tratamento
especfico. Tais fatores (agendas) impactaram diretamente no consumo dos servios de sade,
o que forjou um novo perfil de morbimortalidade cujas velhas respostas j no resolvem as
novas questes. Diante deste cenrio epidemiolgico necessrio maior recurso tecnolgico,
financeiro, humano e estrutural para alcanar resultados efetivos na ateno a sade (WHO,
2013; MENDES EV, 2012; MENDES, 2011;VECINA NETO e MALIK, 2007).
Ao revisarmos a histria da ateno sade nos deparamos com um modelo
hospitalocntrico onde as instituies eram originalmente organizadas para atendimento de
problemas agudos e episdicos, como as doenas infectocontagiosas, as urgncias e os
pontuais procedimentos cirrgicos (MENDES EV, 2012; MALTA e MERHY, 2010; VERDI
et al., 2010; BITTENCOURT, 2010; BITTENCOURT e HORTALE, 2009; MERHY, 2005).
30
Entretanto, este modelo de sade, centrado na problemtica aguda, tornou-se
obsoleto e ineficaz diante da atual agenda de tripla carga de doenas. Transpor os limites do
antigo modelo condio sine qua non para garantir eficcia, equidade e sustentabilidade na
sade (DUARTE e BARRETO, 2012; GADELHA et al. 2012; MENDES EV, 2012;
CAMARANO, 2010; VECINA NETO e MALIK, 2007; REHEM e TRAD, 2005).
A boa notcia que, apesar dos desafios importados do sculo passado, houve
tambm avanos nas cincias da sade com a implementao de biotecnologias, a evoluo da
sade coletiva, a ampliao das categorias profissionais, o crescimento da pesquisa cientfica,
o que potencializou a resposta aos novos desafios (CAMPOLINA et al. 2013; DUARTE e
BARRETO, 2012; BARCEL et al., 2012; VECINA NETO e MALIK, 2007;
CAMARANO, 2010; MERHY, 2005; ROBINE et al, 2004; WHO, 2003)
3.2 O DESAFIO DAS CONDIES CRNICAS
A Organizao Mundial da Sade (WHO, 2003) apontou as condies crnicas em
sade como um dos maiores desafios do sculo. Elas j so a maior causa de morte no mundo,
sendo considerada uma epidemia global (WHO, 2013, 2011, 2004; BRASIL, 2011a, 2008b).
As condies crnicas englobam todos os problemas de sade que persistem no tempo
e requerem algum grau de gerenciamento do sistema de sade, incluem nessa categoria
condies como diabetes, problemas cardiovasculares, problemas respiratrios, cncer,
depresso, esquizofrenia, AIDS, deficincias fsicas permanentes e condies que exigem
ateno dentro dos ciclos de vida como condies perinatais (gravidez e infncia), atividade
laboral, entre outras (VASCONCELOS, 2012; MENDES, 2012; MENDES EV, 2011;
CAPILHEIRA e SANTOS, 2011).
As condies crnicas so um problema de sade complexo, pois alm de exigirem
um gerenciamento continuo por um perodo de vrios anos ou dcadas, abarcam uma
categoria extremamente vasta de agravos, o que gera um alto custo financeiro (MENDES
EV, 2012; SCHMIDT et al., 2011; VERAS, 2009; LINCK, 2008; BARRETO e CARMO,
2007).
Considerando todas as mortes no mundo em 2008, num total de 57 milhes de bitos,
mais da metade desses, ou seja, 63% se deram por condies crnicas, com destaque para
doenas cardiovasculares, diabetes, cncer e doenas crnicas respiratrias, eleitas como
prioridade para o enfrentamento em mbito global tanto pela Organizao das Naes Unidas
31
quanto para a Organizao Mundial de Sade. . Do total das mortes registradas, cerca de 80%
ocorreu em pases de baixa e mdia renda, onde 29% dos indivduos tm menos de 60 anos de
idades. Em contrapartida nos pases desenvolvidos, com maior renda, apenas 13% foram
mortes prematuras. Tais dados comprovam a grande iniquidade gerada pelas condies
crnicas com maior prejuzo nos pases menos desenvolvidos (WHO, 2013,2011, 2008;
SCHMIDT et al., 2011).
Determinantes sociais influenciam diretamente na origem e evoluo das condies
crnicas, com especial nfase para fatores como as desigualdades sociais, a baixa
escolaridade, as dificuldades no acesso s informaes, o baixo acesso a preveno em todos
os nveis de ateno e promoo da sade, alm de fatores de risco modificveis como
etilismo, tabagismo, sedentarismo e hbitos alimentares inadequados (ANTUNES et al., 2013;
BUTLER et al., 2012; QUEIROGA et al., 2012; WHO, 2011; MUKAI et al., 2009, WHO,
2009; CRIGHTON et al., 2007).
Alm do nus para o Estado, h custos psicoemocionais e financeiros para a
populao, famlia e individualmente para os cidados decorrentes das condies crnicas. A
expectativa de que at o ano de 2020, as condies crnicas (incluindo tanto as doenas
como as sequelas oriundas de traumas) e os distrbios mentais sero responsveis por 78% da
carga global de doenas nos pases em desenvolvimento (SCHMIDT et al., 2011).
H um impacto econmico causado pelas condies crnicas, percebido tanto em
pases desenvolvidos como nos em desenvolvimento. Entretanto, nos pases de baixa e mdia
renda, detecta-se um crculo vicioso em que os mais afetados pelas condies crnicas so
pobres e isso aumenta ainda mais a pobreza, gerando maior custo econmico para as famlias,
a sociedade, os sistemas de sade e o estado (WHO, 2003).
Estes custos so diretos, quando se trata de internaes, medicamentos, insumos,
tratamentos ambulatoriais; mas tambm eles podem ser indiretos, relativos prestao de
servios, perda de produo devido ao recurso humano, aposentadorias precoces e benefcios
sociais, o que impacta negativamente no desenvolvimento macroeconmico (UN, 2013a;
THEODORE, 2011, WHO, 2011).
A importncia da poltica de enfrentamento das condies crnicas se d frente ao
assombroso cenrio que prev uma reduo de 0,5% a 1% do Produto Interno Bruto (PIB) em
pases como Brasil, Canad, Paquisto e Nigria nos prximos anos. H estimativas
conservadoras por parte da OMS quanto ao impacto negativo das condies crnicas no
crescimento econmico brasileiro, apontando que as perdas na fora de trabalho e a
32
diminuio da renda e poupana familiar levaro a uma perda econmica na ordem de U$
4,18 bilhes no intervalo dos anos de 2006 a 2015 (SCHMITD et al., 2011; BRASIL, 2011a;
WHO, 2011, 2005, 2003; JACINTO et al. , 2010).
Para o enfrentamento deste desafio necessrio uma reestruturao dos sistemas de
sade, tanto no nvel macro (polticas), no meso (organizaes de sade e comunidade),
quanto pelo nvel micro (interaes do paciente). Alm da estratgia local, tem sido
fomentada uma estratgia mundial para enfrentamento deste problema, concatenando vrios
setores de modo a estabelecer aes coordenadas com metas que contemplam o cenrio sade,
poltica e economia (WHO, 2011, BRASIL, 2011a).
Nas ltimas dcadas, no Brasil, as condies crnicas passaram a determinar a maioria
das causas de bito e incapacidade prematura, ultrapassando as taxas de mortalidade por
doenas infecciosas e parasitrias, representando uma grande parcela das despesas com
assistncia hospitalar no SUS e no Setor Suplementar. O enfrentamento de tal questo exige
uma interao multissetorial, com polticas pblicas bem estruturadas em todos os nveis,
articulando os diversos atores envolvidos (ANTUNES et al., 2013; BRASIL, 2011, 2010;
MOREIRA e DUTILHNOVAES, 2011; ALFRADIQUE et al., 2009, GONALVES et al.,
2007; RICCI et al., 2005; PEIXOTO et al., 2004; MONTEIRO , 2004).
A projeo que a principal causa de incapacidade no mundo, at o ano 2020, ser
alguma das condies crnicas e, caso tais condies no sejam bem gerenciadas,
representaro o problema mais dispendioso para os sistemas de sade. Este um fator de
preocupao global, pois o aumento das condies crnicas impacta diretamente no
crescimento econmico e no desenvolvimento das naes, sendo gerador de iniquidades
sociais que contrariam os princpios do SUS (, BARROS, 2012; THEODORE, 2011; WHO,
2010, 2003).
Esta relao das condies crnicas com o crescimento econmico e com o aumento
da pobreza eleva a problemtica relacionada ao desafio das condies crnicas para alm de
uma questo sanitria, tornando-se uma questo social e, portanto, uma questo poltica.
Diante disto, em 2011, foi convocada uma reunio pela Organizao das Naes Unidas
(ONU) para programar um plano global de enfrentamento das condies crnicas.
Historicamente esta foi a terceira vez que a ONU convocou uma reunio para discutir um
plano global cujo tema era condio de sade, anteriormente a agenda tinha sido poliomielite
e HIV/AIDS, ou seja, discusso de enfrentamento de doenas. Tal ato representa a magnitude
33
desta problemtica, evidenciando que seu enfrentamento exige uma organizao
multidimensional (WHO, 2011; SCHMIDT et al., 2011, BRASIL, 2011a).
Como proposta de resposta para tal demanda, foi lanado pelo Ministrio da Sade no
Brasil em 2011 o plano de aes estratgicas para o enfrentamento das DCNT 2011-2020, em
resposta a convocao da ONU e como estratgia para reverso da atual pandemia das
condies crnicas (BRASIL, 2011a).
O plano props intervenes que possibilitaram um melhor enfrentamento das
condies crnicas, definiu e priorizou aes e investimentos para melhor controle das
mesmas no prazo de 10 anos. Foram priorizadas quatro condies crnicas: as doenas
cardiovasculares, as doenas respiratrias, o diabetes e o cncer (MALTA e SILVA JNIOR,
2013; DUNCAN et al., 2012; BRASIL, 2011a).
Apesar da discusso sobre condies crnicas, ainda ficou pouco discutida a questo
do grande nmero de indivduos com condies crnicas estabelecidas, que convivem com
inmeras comorbidades e somado a tais condies, convivem ainda com sequelas ou agravos
(MONTEIRO et al., 2013; CECCON et al., 2013; CAMPOLINA et al., 2013; RIBEIRO et al.,
2012; URSINE et al., 2011; HAM, 2007; GASPAR et al., 2007).
O indivduo portador de uma condio crnica, convive geralmente com perda da
integridade estrutural e funcional do corpo, bem como limitao em maior ou menor grau
das atividades globais da vida , devido a uma reduzida capacidade ou mesmo por
incapacidades para realizao das Atividades de Vida Diria (AVD), restrio da participao
em atividades sociais, essa sequela causa nus para o individuo, famla e para o prprio
Estado (GRATO et al., 2013; CAMARGOS et al., 2009).
Como j introduzido na seo anterior, ao discutir os problemas gerados pelo
crescimento populacional, ao celebrar-se o aumento da expectativa de vida brasileira, que j
supera os 74 anos de vida na maioria das regies do pas (IBGE, 2012), preciso considerar
o tempo de vida com qualidade, pois h estimativas de que apenas 59,6 destes anos so
efetivamente vividos em condio saudvel (IBGE, 2011). Tal dado alarmante, pois apesar
de j haver polticas especficas para a populao idosa (BRASIL, 2003) no temos
consolidada polticas publicas de sade que atendam integral e equitativamente esta parcela
da populao.
Mesmo que o tempo a ser vivido com incapacidade funcional seja menor que o
vivido livre dessas condies preciso pensar na demanda de cuidado requerida por
esta populao. Afinal, em mdia, um brasileiro de 60 anos vai demandar de 3,5
anos de acompanhamento para alimentar-se, tomar banho e/ou ir ao banheiro, o que
34
refletir diretamente nos gastos para atender a necessidade de cuidado e reabilitao,
bem como no dia-a-dia da sua famlia ou na necessidade de insero em uma
instituio de longa permanncia. Este tipo de discusso refora a ideia que, tanto
para o idoso como para a sua famlia, a sociedade e o Estado, os investimentos em
preveno, que sejam capazes de reduzir o tempo vivido com incapacidade, so
ainda a melhor soluo para reduzir custos e ampliar a qualidade de vida nos anos
remanescentes (CAMARGOS et al, 2008, p10).
A figura 4 ilustra melhor esta problemtica, nela possvel observar a funcionalidade
humana em funo da idade. Esta funcionalidade definida com quantidade de funo, sendo
estabelecida uma faixa de quantidade de funo definida como limiar de incapacidade.
Quando o sujeito encontra-se nesta faixa de quantidade de funo ele necessita de cuidados
prprios das condies crnicas. Em tese, o envelhecimento fisiolgico (senescncia) no
permitir que o indivduo alcance este limiar de incapacidade, diferente do envelhecimento
patolgico (convalescncia) que mais comum, em que o idoso adentra o limiar de
incapacidade.
Fonte: Moraes (2008).
Figura 4. Relao entre quantidade de funo e idade observada nos ciclos da vida e ilustrando diferenas entre
envelhecimento fisiolgico e patolgico. A linha vertical descontnua indica o limite entre vida adulta e idosa e a
faixa amarela definiu o limiar de incapacidade com base na quantidade de funo.
As informaes sobre condies crnicas impulsionam a necessidade de estudos que
discutam as possibilidades de respostas aos desafios advindos das sequelas e agravos
decorrentes destas condies. Ainda so escassas as polticas pblicas, os programas sociais e
de sade voltados para este pblico (CAMPOLINA et al., 2013; BAGSHAW et al., 2009;
LINCK et al., 2008; BARRETO e CARMO, 2007; BONARDI et al., 2007, GASPAR et al.,
2007).
35
Estratgias de preveno primria e secundria existem (BARCEL et al., 2012;
RIBEIRO et al., 2012, MALTA e MERHY, 2010; POT et al., 2009; SINGH, 2008; WONG e
CARVALHO, 2006), mas faltam ainda aes e programao consistente para a preveno
terciria (BARRETO e CARMO, 2007; BONARDI, et al., 2007).
No aspecto clnico e assistencial, essa populao de pessoas que necessita de
preveno terciria por alguns denominada de pacientes de vidro, devido a fragilidade
observada e a necessidade de minucioso cuidado e ateno contnua para a manuteno da
estabilidade clnica (URSINE et al., 2011; DEL DUCA et al., 2012, CAMARGOS et al.,
2009, 2003).
A populao dos pacientes de vidro pouco aparece nas estatsticas oficiais, ficando
geralmente restrita em instituies de longa permanncia ou em seus lares (DUNCAN et al.,
2012; FLORIANI e SCHRAMM, 2004; TORRES et al., 2009). Nem mesmo os indicadores
de sade representam bem esta populao, os indicadores de morbimortalidade usualmente
utilizados no so capazes demonstrar ou traduzir suas peculiaridades (SOUZA e CORREIA,
2010; SILVA BCN, 2010).
Compe grande parcela dessa populao frgil os indivduos idosos. Nota-se que
discutir a temtica do idoso, por si s, no garante promoo de sade para esta populao.
preciso incluir a temtica condio crnica. So necessrios instrumentos para avaliar alm da
quantidade a qualidade do envelhecimento populacional. Vrias propostas de avaliao da
longevidade existem (BRASIL, 2013d, CAMPOLINA et al.,2013; VERAS, 2009), mas no
representam adequadamente esta populao em termos de informar sobre suas condies de
sade.
Estimativas de expectativa de vida saudvel so exemplos de indicadores que tem
capacidade de avaliar o envelhecimento integralmente (CAMPOLINA et al., 2013; DEL
DUCA et al., 2012; IBGE, 2012, 2009). Tal informao relevante pela capacidade de ser
preditor de sade e de consumo de servios, bem como por incluir nesse amplo debate das
condies crnicas, alguns fatores como funcionalidade, incapacidade e autonomia.
Iniciativas como esta so positivas, pois lanam um olhar profundo no cenrio
epidemiolgico e demogrfico, demonstrando que h potenciais respostas capazes de
promover, aperfeioar ou manter a funcionalidade dos indivduos e lanar luz aos aspectos
relacionados ao cuidar dos indivduos que sobrevivem a enfermidades cronicamente. Diversos
estudos relacionam a longevidade com as deficincias e incapacidades, indicando que embora
a populao esteja vivendo mais, ela no tm vivido to bem (CAMPOLINA et al. 2013;
36
IBGE, 2009; CAMARGOS et al., 2009, 2008, 2005, GASPAR et al., 2007; RAMOS, 2005;
PASCHOAL, 2002).
Vrios estudiosos dessa temtica, em destaque aqui Camargos e colaboradores (2005),
provocam ao indagar quem cuidar dessa populao crescente e ao questionar como sero
vividos estes anos extras do aumento da expectativa de vida. um desafio saber quem, como
e onde sero assistidos esses indivduos que so produto das grandes transies da sade e
que apresentam complexidades diversas e necessidades preementes.
3.3 ESTRATGIAS PARA O ENFRENTAMENTO DAS CONDIES
CRNICAS: ATENO DOMICILIAR
Revisando a histria da humanidade, desde os primrdios da escrita, h registros de
cuidado a sade. Mesmo nas mais remotas referncias em sade h descrio desse tipo de
cuidado ao ser humano (BARROS, 2012). Ao longo do tempo esses cuidados foram mais bem
definidos e consolidados quanto ao local onde a assistncia era oferecida, quem era o cuidador
e como era realizada tal assistncia. Esse cuidado foi sistematicamente sendo organizado em
trs modalidades de ateno a sade: (1) hospitalar, (2) ambulatorial e (3) domiciliar
(BARROS, 2012, LACERDA et al., 2006; AMARAL et al., 2001).
Antigos registros egpcios apresentam a figura de Imhotep, indivduo polivalente que
desenvolvia atividades na rea da medicina, arquitetura e direito; esse ento considerado
mdico primitivo surge no perodo do sculo XIII aC, na terceira dinastia do Egito Antigo e
atendia a populao tanto em locais especficos para o cuidado em sade, que seria uma
espcie de ambulatrio ou hospital, como tambm no domicilio, tendo entre seus pacientes
domiciliares o prprio Fara (BARROS, 2012; SILVA et al., 2005).
Na Grcia, destaca-se o mdico Asklpios, que atendia seus pacientes tanto em suas
casas como em templos, que dispunham de insumos e medicamentos para os tratamentos dos
doentes, sendo esta estrutura similar a do atual sistema hospitalar (BARROS, 2012;
ROONEY, 2012; AMARAL et al., 2001).
O prprio pai da medicina, Hipcrates, em seu tratado sobre ares, guas e os lugares,
datado do sculo V aC, destacava a residncia como um lugar adequado e propicio para o
cuidado da sade (ROONEY, 2012; CAIRUS e RIBEIRO JUNIOR, 2005) .
Influncia religiosa tambm observada tanto no cuidado a sade que era feito no
ambiente hospitalar quanto no domiciliar. Entre o sculo XVI e XVII, o religioso So
37
Francisco de Sales, que fundou a ordem da virgem Maria, e So Vicente de Paula, padre
francs que junto a viva Luisa de Marillac fundou o Instituto das filhas da caridade ou
Ordem das irms da caridade, primando pelo cuidado a sade institucionalizado em
conventos e casas de acolhimento, onde eram oferecidos cuidados para os mais pobres como
obra de caridade, cuidados de higiene, conforto e alimentao. Alm de realizarem visitas nas
parquias, este atendimento era expandido para os domiclios dos enfermos pobres
(MEZZADRI, 1996; DODIN, 1979; CASTRO, 1957).
Segundo Augusto e Franco (1980), neste perodo a ordem vicentina, adotava um
manual denominado: Manual das filhas da Caridade, que destinava um trecho a orientaes
quanto a visitas domiciliares, sob o ttulo, A procura de doentes, onde afirmava:
1. [...] nada equivale a uma visita de enfermagem domiciliar, repetida todos os dias
em horas diferentes.
2. Se por acaso vos fecharem as portas, retirai-vos sem nada dizer.
3. Diante de uma companhia duvidosa (famlia desajustada, pessoa de outra religio)
ir diretamente ao doente, cumprimentando-o simplesmente.
4. Ocupar-se exclusivamente do doente, agir como se estivesse sozinho, no escutar
nada e nem olhar para nada.
5. Terminados os cuidados e as determinaes feitas, sair rapidamente.
6. Desconfiar de um homem s, doente.
7. Conforme as doenas, elas daro remdios, faro sangrias, lavagens e outros
medicamentos.
8. Reclamar sempre a receita antes de comear a l-la atentamente at o fim [...]
9. Em todos os cuidados pedir uma pessoa da famlia ou vizinha sempre mesma,
para auxili-la, a fim de faz-los melhor e mais depressa com menor sofrimento para
o doente. (AUGUSTO E FRANCO, 1980, p.51)
Esta ao da ordem das irms da caridade representa o inicio da sistematizao da
ateno domiciliar (PEREIRA, 2001). Neste mesmo perodo os mdicos realizavam o cuidado
domiciliar para a populao mais abastada, com maior poder e recursos financeiros. Na
Europa, durante o perodo do Iluminismo, os cuidados domiciliares foram adotados com
entusiasmo refletindo a valorizao da sade pblica, com prticas que iam do atendimento
hospitalar a visita domiciliar (AMARAL et al., 2001; BARROS, 2012, REINALDO E
ROCHA, 2002).
At mesmo a homeopatia deixou sua contribuio inicial ateno domiciliar, quando
ao final do sculo XVII, seu fundador Samuel Hanneman passou a realizar atendimentos nas
casas dos enfermos, com a firme crena de que ao mdico cabia lutar contra a enfermidade,
onde fosse necessrio. Durante a visita domiciliar ele permanecia ao lado do paciente em seu
domiclio a maior parte do tempo possvel (PAZ e SANTOS, 2003; AMARAL et al., 2001;
TAVALORI et al., 2000).
38
Um dos primeiros marcos histricos, no principio da sistematizao da ateno
domiciliar, que inaugurou uma nova fase nessa modalidade de ateno, foi o Dispensrio de
Boston no ano de 1976, atualmente denominado de New England Medical Center. Ainda nos
Estados Unidos, no ano de 1850 teve inicio outra organizao que ajudou a consolidar a
ateno domiciliar internacionalmente, tendo como precursora Lilian Wald, visando
promover aes de sade em domicilio, sendo conhecido depois como Public Health Nurse.
Este movimento foi crucial para lanar as bases dos atuais programas de ateno domiciliar
no mundo, influenciando tambm os movimentos pblicos de sade (AMARAL et al., 2001;
PEREIRA, 2001; MONK-TUTOR, 1998).
Importante tambm foi contribuio de William Rathbone, na Inglaterra, por volta
do ano 1850, que se sensibilizou quanto ao cuidado domiciliar, aps ter sua esposa cuidada
por Mary Robson e a partir disso buscou estender esse tipo de assistncia a outras pessoas, em
especial aos mais carentes de sua regio, assim procurou a promissora Florence Nightingale,
que o auxilio na implantao de uma escola para capacitao de enfermeiras visitadoras, que
em 1859 foi vinculada a Liverpool Royal Infermary, oficializando em 1862 um servio de
enfermagem distrital em Liverpol (PEREIRA, 2001). Florence Nightingale considerada uma
das figuras mais importantes para a enfermagem, que contribuiu para a profissionalizao e
consolidao da enfermagem com bases cientfica (LOPES e SANTOS, 2010).
O estudo da evoluo histrica da ateno sade demonstra uma relao intricada
entre as vrias modalidades de ateno a sade, sendo elas institucionalizadas ou realizada no
domiclio. Observa-se que, apesar da ateno domiciliar nascer junto com as primeiras
instituies de sade, tal ateno acabou sendo centralizada em hospitais. As formas de
ateno sade foram evoluindo de modo diferenciado, sendo que os investimentos
financeiros, tecnolgicos e de polticas pblicas foram por longo tempo maior e mais arrojado
na ateno hospitalar, o que para alguns autores configurou o hospitalocentrismo, com
consequente fragmentao da sade e medicalizao (BARROS, 2012; MENDES EV, 2012;
VECINA NETO, 2007; AMARAL et al., 2001; PEREIRA, 2001).
Voltando ao contexto nacional da histria da ateno domiciliar no Brasil, de acordo
com Paz e Santos (2003), a ateno a sade no domiclio tem sua origem relacionada rea
da sade coletiva, aos programas materno-infantil e ao controle de doenas
infectocontagiosas.
Segundo Barros (2012), h duas verses referentes ao inicio da ateno domiciliar
brasileira, uma datada de 1919, correlacionada ao inicio da sade coletiva, onde enfermeiras
39
realizavam visitas domiciliares. A outra verso data de 1949 e relata o surgimento do Servio
de Assistncia Mdica Domiciliar de Urgncia, precursor do atual modelo adotado pelo
Servio de Atendimento Mvel de Urgncia (SAMU).
J Amaral (2001), afirma que o inicio da ateno domiciliar brasileira se d com a
criao do primeiro servio no Hospital do Servidor Estadual Pblico de So Paulo, em 1967,
denominado de Assistncia Domiciliar a Sade (ADS) (BARROS, 2012, AMARAL, 2001,
PEREIRA, 2001).
Fato que hoje no pas a ateno domiciliar ressurgiu e reformulou-se de modo a
adequar-se e apoiar a resposta dos sistemas de sade s emergentes demandas constatadas
universalmente em todos os sistemas de sade. Conforme Barros (2012), cada modalidade de
ateno sade acompanha as particularidades epidemiolgicas, socioeconmicas, culturais e
polticas de cada pas. Isso ficou claro no rearranjo dos servios de ateno domiciliar em
todo o mundo, que alm das aes de preveno a sade, presente em seus primrdios adotou
a ateno ao paciente crnico e sequelado como populao alvo da maioria dos programas,
inclusive no Brasil (BRASIL, 2013a, 2013b, 2013c, 2013e; BARROS, 2012).
consenso que os atuais sistemas de sade no so desenhados para atender as
condies crnicas. O modelo de tratamento agudo ainda dominante nas organizaes de
sade como um todo e tem no hospital, nas unidades de pronto atendimento e nos
ambulatrios seu local de referncia (FEUERWERKER e MERHY, 2008; REHEM e TRAD,
2005; WHO, 2003).
Os sistemas so fragmentados, fortemente hegemnicos e hierarquizados, havendo
vrios pontos com diversas possibilidades de ateno, mas que no conversam entre si e
consequentemente so incapazes de manter uma ateno continua e integral a populao
(MENDES EV, 2012; Mendes, 2011; BRASIL, 2008a).
Essa organizao dos sistemas de sade predominantemente global, comprovando
que os sistemas esto falhando por no conseguir sincronizar-se com as mudanas
epidemiolgicas e demogrfica mundiais, tendendo ao declnio das condies agudas e
ascenso das condies crnicas (MENDES, 2010, HAM, 2007; WHO, 2003)
Neste cenrio, a ateno domiciliar considerada ferramenta com grande potencial
para responder aos novos desafios dos sistemas de sade. Isso tem sido percebido pelos
sistemas de sade em todo o mundo, em especial no Brasil essa potencialidade foi verificada
ao final do sculo XX, como ratifica Paz e Santos (2003), referindo-se a nova estruturao da
ateno domiciliar brasileira, analisada ao final da dcada de 1990, embasada em Paskulin e
40
Dias (2002), Duarte e Diogo (2000) e Santos et al., (1999), que afirmam que apenas na
ltima dcada, o cuidado domiciliar est voltando-se para o atendimento, principalmente, de
pacientes com agravos de longa durao, incapacitados ou em fase terminal.
Mas atualmente no pas h uma estratgia de reorganizao do sistema de sade para
responder a crise gerada em especial pelas condies crnicas, sendo ela a adoo da ateno
primria a sade como ordenadora do SUS. Neste contexto tem importncia a ateno
domiciliar por integrar a APS, compondo assim uma das grandes apostas de reverso da
lgica de ateno a sade centrada no hospital e no atendimento agudo e reativo (BRASIL,
2013a, 2013b, 2013c, 2013e, 2011; FEUERWERKER e MERHY, 2008; REHEM e TRAD,
2005; WHO, 2003).
Hoje no Brasil contamos com uma poltica nacional de ateno domiciliar e com
servios tanto na esfera pblica quanto no setor privado capaz de oferecer desde a baixa
complexidade domiciliar, representada pela ESF, passando pela mdia complexidade,
representada pelo PID, alcanando at a alta complexidade domiciliar, representada pelo
Home Care. (BRASIL, 2013b; SERAFIM e RIBEIRO, 2011). No SUS a previso da ateno
domiciliar contempla duas vertentes complementares, com diferentes nveis de
complexidade: uma configurada pelo programa Melhor em Casa, que organiza os Servios de
Ateno Domiciliar (SAD) e outra por meio da Estratgia Sade da Famlia (ESF) e do
Programa de Agentes Comunitrios de Sade (PACS)(BRASIL, 2011b).
O Melhor em Casa conta com arcabouo legal que normatiza a ateno domiciliar no
mbito do SUS, financiando e monitorando esta estratgia de ateno a sade. Segundo dados
do Ministrio da Sade, hoje a ateno domiciliar pblica, concretizada pelo Melhor em Casa
alcana 16,2 milhes de brasileiros, estando presente em 20 estados e 67 municpios em todo
o Brasil, e com proposta de expanso em todo o territrio nacional (BRASIL, 2013e).
A outra modalidade da ateno domiciliar presente no pas, ESF e PACS, encontra-se
normatizada pela Portaria 2.488 de 21 de Outubro de 2011 (BRASIL, 2011b). De acordo com
dados do Ministrio da Sade de 2013, a ESF conta hoje com uma cobertura nacional de
55,73% do territrio, contemplando 5.309 municpios onde esto implantadas 34.185 equipes.
O PACS tem cobertura nacional de 64,34% do territrio, distribuda em 5.514 municpios
onde h 255.772 equipes de PACS implantadas (BRASIL, 2013f)).
Atualmente no sistema de sade brasileiro a ateno domiciliar representa uma
modalidade de ateno sade substitutiva ou complementar s j existentes, caracterizada
por um conjunto de aes de promoo sade, preveno e tratamento de doenas e
41
reabilitao prestadas em domiclio, com garantia de continuidade de cuidados e integrada s
redes de ateno sade (BRASIL, 2013a, 2013b).
Um dos maiores desafios impostos a ateno domiciliar conseguir prover cuidados
domiciliares de qualidade, garantindo segurana ao paciente, famlia e aos profissionais de
sade, adaptando-se a cenrios diferentes do hospitalar e ambulatorial, sendo muitas vezes
limitado. Ao realizao promoo e preveno de sade no domicilio prioritrio garantir
qualidade assistencial, estabilidade clnica, segurana, sem contudo desvirtuar o ambiente
domiciliar, sem descaracterizar o lar. Vemos a Ateno Primria elaborar vrias estratgias
de ateno domiciliar, com programas como o PID/PAD e a ESF, mas sem um dilogo entre
os mesmos de modo a prestar um cuidado integral ao individuo e famlia no domicilio. Parece
no haver um plano de ao conjunto que permita que as aes preconizadas sejam realizadas
de forma complementar.
Estudiosos do funcionamento dos programas de ateno domiciliar ratificam que a
organizao de uma estratgia de ateno no domicilio tem inicio com um diagnstico de qual
a real necessidade do paciente, sua situao clnica, econmica, social, familiar, as
condies ambientais/sanitrias. S a partir disso traado um plano para melhor prover
suas demandas. No nvel macro, tambm seria importante um diagnstico das estratgias de
ateno no domicilio existentes, como elas conversam entre si e como organiza-las a ponto de
promover uma ateno no domicilio mais resolutiva (DAL BEN e GAIDIZINSKI, 2006;
FUGULIN, 2010, 2006, PERROCA e GAIDIZINSKI, 1998).
3.4 IMPORTNCIA DOS INDICADORES PARA GESTO NA SADE
Ao se fazer gesto em sade necessrio se estabelecer quais sero as ferramentas
capazes de aferir a qualidade e quantidade dos recursos empregados que se traduza em uma
assistncia de qualidade (RIPSA, 2013; TAMAKI et al. , 2012; REMOR et al.,2010).
Agora, para se avaliar a qualidade da assistncia necessrio traduzir os conceitos e
definies gerais, ou seja, estabelecer qual a melhor maneira de prestar assistncia em
critrios operacionais, parmetros e indicadores, validados e calibrados pelos atributos da
estrutura, processo e resultados (DONABEDIAN, 1988).
Os indicadores so informaes tratadas de modo a torn-las acessveis, traduzindo
assim fenmenos complexos, tornando-os quantificveis e compreensveis sendo possvel
42
avaliar, utilizar e transmitir aos diversos setores da sociedade informaes em sade,
contribuindo para a planificao das polticas de sade e otimizando a informao (SCHOUT
e NOVAES, 2007; FERREIRA, 2002).
Indicadores podem ser definidos como ferramentas imprescindveis para a gesto em
sade, entendidos como medidas-sntese que contm informao relevante sobre
determinados atributos e dimenses do estado de sade, bem como do desempenho do sistema
de sade, refletindo a situao sanitria de uma populao, suas tendncias, quais os grupos
humanos com maiores necessidades de sade e possibilitando a estratificao do risco
epidemiolgico e da identificao de reas crticas. Alm de importante insumo para a gesto
imprescindvel para vigilncia das condies de sade (RIPSA, 2013; FELDMAN et al.,
2005).
Os dados coletados em si no constituem indicadores de sade, os dados so finitos
em si prprios, s possuem significados medida que so capazes de gerar informao que
embasem o processo de deciso, so na verdade sinalizadores, que indicam problemas
potenciais ou boas prticas de cuidados, sendo ferramentas importantes para a gesto de sade
(RIPSA, 2013; FIELDING E KUMANYKA, 2009; LEO et al., 2008).
O indicador geralmente representado como uma varivel numrica, podendo ser um
nmero absoluto (por exemplo, nmero total de cirurgias limpas realizadas) ou uma relao
entre dois eventos, estabelecendo-se o numerador e denominador (por exemplo, nmero de
cirurgias limpas/nmero total de cirurgias). O numerador o evento que est sendo medido ou
reconhecido e precisa apresentar definio objetiva e clara, ser fundamentado por meio de
estudos prvios, prontamente aplicveis, rapidamente identificados e clinicamente
importantes em uma dada populao. O denominador do indicador corresponde populao
de risco/interesse ou sob avaliao de risco para um dado evento definido do numerador. O
indicador deve definir um perodo, permitir o desenvolvimento de ndices e ser o mais
especfico possvel (BREVIDELI e FREITAS, 2012; FERREIRA, 2002).
Para avaliar a qualidade da assistncia importante que as informaes sejam claras e
representativas de todos os recursos utilizados para alcanar aquele resultado. Os indicadores
so exatamente essas informaes, tratadas de modo a traduzir toda essa dinmica do
processo, facilitando o entendimento de fenmenos complexos, tornando-os quantificveis e
compreensveis pelos quais possvel avaliar, planejar, executar e reavaliar todo o processo
de trabalho (GOUVA e TRAVASSOS, 2010; ALLEGRANZI et al, 2007; FERREIRA,
2002).
43
H mais de 40 anos iniciou-se de forma sistematizada na sade um movimento que
buscava avaliar a qualidade da assistncia prestada, recursos empreendidos e segurana do
paciente, classicamente esta avaliao considerava trs dimenses, propostas por Donabedian
(1990), sendo elas: estrutura, processo e resultados. Avedis Donabedien, pediatra armnio
radicado nos Estados Unidos, considerado um dos precursores na utilizao e divulgao
dos indicadores sade. Suas ideias aliceram os conceitos atuais de indicadores na sade
utilizadas globalmente (FARACO, 2013; LEO et al.; 2008, DINNOCENZO et al., 2006;
BITTAR, 2001).
Hoje a utilizao de indicadores consenso mundial, presente tanto na sade pblica
como nas instituies privadas, por meio de programas de avaliao de qualidade, organismos
acreditadores nacionais e internacionais, bem como por normas de avaliao de qualidade de
assistncia. A qualidade tornou-se meta para toda e qualquer instituio de sade e os
indicadores so ferramentas imprescindveis para alcanar este objetivo. (FARACO, 2013;
KURGANCT e TRONCHIN, 2008).
Segundo a OMS (1993) qualidade da assistncia em sade engloba um conjunto de
elementos que incluem: um alto grau de competncia profissional, a eficincia na utilizao
dos recursos, um mnimo de riscos, um alto grau de satisfao dos pacientes e um efeito
favorvel na sade (RACOVEANU, 1995).
No Brasil, temos vrios sistemas de informaes e rgos que avaliam a qualidade da
sade por meio de indicadores prprios. Considerando a grandiosidade do SUS, um dos
maiores sistemas pblicos de sade do mundo, cujos principais produtos so as suas aes e
servios, preciso uma organizada rede de informaes para mensurar a eficincia e
efetividade desse sistema (REMOR et al. 2010).
Um dos primeiros i