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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS
FACULDADE DE EDUCAÇÃO
DANIELE SILVA ROCHA
EDUCADORES SURDOS:
REFLEXÕES SOBRE A FORMAÇÃO E A
PRÁTICA DOCENTE
CAMPINAS
2017
DANIELE SILVA ROCHA
EDUCADORES SURDOS:
REFLEXÕES SOBRE A FORMAÇÃO E A
PRÁTICA DOCENTE
Dissertação de Mestrado
apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Educação da
Faculdade de Educação da
Universidade Estadual de Campinas
para obtenção do título de Mestra
em Educação, na área de
concentração de Educação.
Orientadora: Prof.ª Dra. Lilian Cristine Ribeiro Nascimento
ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO
FINAL DA DISSERTAÇÃO DEFENDIDA PELA
ALUNA DANIELE SILVA ROCHA, E ORIENTADA
PELA Prof.ª DRA. LILIAN CRISTINE RIBEIRO
NASCIMENTO.
CAMPINAS
2017
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS
FACULDADE DE EDUCAÇÃO
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO
EDUCADORES SURDOS:
REFLEXÕES SOBRE A FORMAÇÃO E A
PRÁTICA DOCENTE
Autora: Daniele Silva Rocha
COMISSÃO JULGADORA:
Orientadora Prof.ª Dr.ª Lilian Cristine Ribeiro
Nascimento.
Prof.ª Dr.ª Aryane Santos Nogueira.
Prof.ª Dr.ª Terezinha de Jesus Machado Maher.
A Ata da Defesa assinada pelos membros da Comissão Examinadora, consta no processo de vida acadêmica do aluno.
2017
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho à pessoa eu que amo muito e sempre está presente em todos
os momentos de minha vida. Minha avó Mafalda Beraldi da Rocha, pessoa que
sempre acreditou e acredita em mim, que me enche de conforto de muito amor. Minha
eterna gratidão à pessoa maravilhosa.
Aos meus pais, Célia Silva e Márcio Rocha, pela educação que me deram para
minha vida e apoio nos meus estudos, sempre me apoiaram e confiaram no meu
potencial. Nunca permitiram que eu me acomodasse.
AGRADECIMENTOS
A Deus, pela sua presença constante na minha vida, por sempre me amparar nas
dificuldades e por todas graças concedidas.
À querida Prof.ª Dra. Lilian Nascimento, por ter me acolhido, por sua confiança em
meu trabalho, pelas necessárias e valiosas contribuições para a pesquisa e por ampliar e
enriquecer o meu olhar sobre o mundo.
Ao meu irmão, Pedro Rocha, pela inspiração.
Ao meu avô paterno, Boris Rocha, pelo seu exemplo de honestidade e caráter, uma
pessoa integra a qual admiro muito.
À família paterna e materna, pelo acolhimento e carinho de sempre: Andressa, Camila,
Cecília, Celise, Késsia, Kellen, Leda, Lucia, Luís, Jaime, José, Rafael, Jorge
Matheos, Selma (in memória), Telma e Yara.
Ao meu amado, Leonardo Volf, que entrou há pouco tempo em minha vida, mas me
preenche de alegria e orgulho. Obrigada pela compreensão, pelas trocas de sexta para
sábado, por ser a minha paz nas horas de desespero e cansaço, por ser quem faz meu
sorriso mais aberto, meus dias mais coloridos, minha vida mais feliz!
À Carmem Zulueta, que faz parte da família Rocha, pela ajuda e acolhimento.
À Prof.ª Dra. Aryane Santos Nogueira, pela amizade, pelas risadas garantidas, estudos,
reflexões e conversas de sempre.
À Prof.ª Dra. Heloísa Lins, pelas contribuições na participação da banca de
qualificação.
Às Prof.ª Dra. Teca Maher, Prof.ª Dra. Aryane Nogueira, por aceitarem em participar
da banca de qualificação e da defesa.
À Prof.ª Dra. Regina Souza, pelas conversas filosóficas que contribuiu para a reflexão
da minha pesquisa.
À Jaqueline Araújo, pela revisão do abstract graças à ajuda da Prof.ª Dra. Lilian.
Obrigada.
Aos intérpretes Lilian Ferreira e Diego Assis por emprestar as suas vozes, pela
paciência e acompanhar sempre nas interpretações durante o tempo do mestrado.
Às fonoaudiólogas, Prof.ª Dra. Tereza Rossi e Prof.ª Dra. Priscila Amorim, pela
amizade e carinho de sempre.
Aos profissionais do CEPRE, em especialmente, Prof. Dra. Ivani Silva e Prof. Dra.
Zilda Gesueli pelo aprendizado e conhecimento.
À Luciana Rosa, amiga querida de longa data, pela amizade sincera.
Ao Guilherme Nichols, além de amigo querido, um modelo de referência acadêmica e
que me “empurrou” para o mestrado. Gratidão.
À Olívia Rall, por acolher-me de forma tão amiga, pela convivência afável comigo nos
tempos da UNESP, de quem guardo amizade e respeito.
Aos amigos da UNESP, Bárbara Melo, Clarisse Zan, Elaine Rezende, Glauciele
Edygio, Jaquelini Santos, Priscila Caetano, Roberta Amaral, Victor Hugo
Cassetari, pelas ótimas histórias vividas, pela convivência e risadas garantidas ao longo
da graduação.
Às companheiras de estudo do mestrado e do grupo GES (Grupo de Estudos Surdos),
Daniela Cury, Geilda Fonseca, Mirian Santos, Elaine Fernandes e Ellen Oliveira.
À Thais Marin, funcionária da Faculdade de Educação (FE), pela ajuda com a
Plataforma Brasil. Sem você, não teria conseguido.
Ao Departamento de Informática da FE pela elaboração do questionário online para a
realização da minha pesquisa.
Às escolas Cravo, Girassol e Tulipa, pela disponibilidade para a realização da
pesquisa.
Aos participantes que responderam o questionário para o andamento da pesquisa e aos
profissionais que permitiram que eu observasse seu trabalho.
A todas as pessoas que direta ou indiretamente, contribuíram para o andamento e a
realização deste estudo.
À Capes, pela bolsa concedida e pelo financiamento deste estudo.
RESUMO
EDUCADORES SURDOS: REFLEXÕES SOBRE A FORMAÇÃO E A
PRÁTICA DOCENTE
Esta pesquisa teve como objetivo compreender o perfil do profissional educador surdo e
sua função no ambiente educacional, destacando sua formação técnica pedagógica, e
refletir sobre sua atuação na formação dos alunos surdos. Essa pesquisa foi realizado
com método de cunho qualitativo e quantitativo que teve como objeto de análise um
questionário on line realizado com educadores surdos e também observações em sala de
aula. Os dados das respostas aos questionários foram quantificados e, posteriormente,
discutidos e analisados. Para descrever e refletir sobre observações em sala de aula em
que atuam educadores surdos, realizou-se uma análise interpretativista baseada nos
seguintes critérios: metodologia utilizada; didática; comprometimento com o ensino;
uso de materiais adaptados e conhecimento. As análises tiveram como embasamento as
perspectivas histórico-cultural (Vygotsky) e a teoria enunciativo-discursiva (Bakhtin).
Os resultados encontraram uma consonância entre as respostas dos questionários e as
observações em sala de aula. Pode-se concluir que, ainda hoje, ocorre uma
desvalorização do profissional surdo no ambiente educacional, sendo que este, na
maioria das vezes, é contratado na educação básica como instrutor, mesmo tendo
formação superior, o que lhes cerceia a autonomia como docente.
Palavras-chaves: Professores surdos; formação docente; prática docente;
ABSTRACT
DEAF EDUCATORS: REFLECTIONS ABOUT FORMATION AND
TEACHING PRACTICES
The present research aims at understanding the profile of the deaf educator as well as
his role in the educational environment highlighting his technical academic formation,
not to mention dwelling on how his job reflects on the formation of the deaf students.
The objects of analysis of such research, being qualitative as it is, were classroom
observations and an online questionnaire for which the respondents were the
aforementioned deaf educators. The data produced by the answers to the questionnaire
were quantified and, later on, discussed and analyzed. To describe and reflect upon the
classroom observations in which deaf educators work, an interpretative analysis was
made based on the following criteria: methodology applied; teaching practice;
commitment to teaching; use of adapted materials and knowledge. The analyses were
based on the historical-cultural perspective (Vygotsky) and on the enunciative-
discursive perspective (Bakhtin). The answers to the questionnaires and the classroom
observations proved to be in harmony. Thus, we may conclude that, still today, the deaf
professional is devalued in the educational environment and in most cases is hired for
the primary education level of schooling as an instructor even having superior formation
which, by the way, curbs his authority as an educator.
Keywords: Deaf teachers; educator formation; educator teaching.
LISTA DE FIGURAS
Figura 01 – Tirinha de Carlos Ruas 66
LISTA DE TABELAS
Tabela 01 - Formação de instrutor de trânsito 29
Tabela 02 - Curso de instrutor de armamento e tiro 30
Tabela 03 - Instrutor de mergulho livre 30
Tabela 04 - Instrutor de voo 31
Tabela 05 - Mapeamento de levantamento de produções técnicas 50
Tabela 06 – Editais 58
Tabela 07 - Descrição dos locais da pesquisa de observação 72
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 01 - Idade dos participantes
74
Gráfico 02 - Alunos matriculados na educação superior com surdez,
deficiência auditiva, pessoas com deficiências no Brasil.
75
Gráfico 03 – Estados de residência
76
Gráfico 04 – Idade em que aprendeu Libras
76
Gráfico 05 – Local em que aprendeu Libras
78
Gráfico 06 – Local em que aprendeu Libras (< 9 anos) 79
Gráfico 07 – Local em que aprendeu Libras (> 9 anos)
79
Gráfico 08 – Tipo de escola em que estudou na educação básica
80
Gráfico 09 – Formação em nível superior
82
Gráfico 10 – Cargo 82
Gráfico 11 – Cargo de professor 83
Gráfico 12 – Cargo de instrutor
84
Gráfico 13 – Cargo de professor e instrutor
84
Gráfico 14 – Curso de formação em nível superior 85
Gráfico 15 – Escolha da profissão
Gráfico 16 - Facilidade de vaga no mercado de trabalho
Gráfico 17 – Valorização da profissão
87
90
91
Gráfico 18 – Melhoria na educação de surdos
93
Gráfico 19 – Diferença de professor e instrutor
95
Gráfico 20 – Contratado como instrutor 97
LISTA DE QUADROS
Quadro 01 – Prefeitura Municipal de Barueri/SP
55
Quadro 02 – Prefeitura Municipal de Petrópolis/RJ
56
Quadro 03 – Prefeitura Municipal de Santo Ângelo/RS 56
Quadro 04 – Prefeitura Municipal de São Caetano do Sul/SP
Quadro 05 – Prefeitura Municipal de São Paulo/SP
Quadro 06 – Prefeitura Municipal de Vitória/ES
56
57
57
Quadro 07 – Perguntas relevantes para a análise do questionário
71
Quadro 08 – Sujeitos da pesquisa de observação em sala de aula 102
Quadro 09 – Trecho de diálogo entre professor e aluno 104
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ....................................................................................................
13
CAPÍTULO I – O papel e a formação do professor e instrutor surdo .................
23
CAPÍTULO II – Professor e instrutor surdo: revendo os conceitos.....................
36
2.1 Compreendendo a formação docente do sujeito surdo.............................. 37
CAPÍTULO III – Contribuições teóricas para a reflexão sobre profissão
do educador surdo .................................................................................................
52
CAPÍTULO IV – Método de pesquisa .................................................................
68
CAPÍTULO V – Análise dos questionários: o que dizem os educadores surdos
sobre sua formação e atuação ................................................................................
73
CAPÍTULO VI – Análise das observações: o que é possível afirmar sobre as
práticas dos educadores surdos em sala de aula ....................................................
99
CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................
117
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .............................................................
123
ANEXOS .............................................................................................................
133
13
INTRODUÇÃO
Pensar na formação do profissional surdo, objeto de estudo da pesquisa, é pensar
também na minha própria história de vida e relatar um pouco das minhas vivências com
esse profissional. Lembro-me dos tempos em que eu ia ao Centro de Estudos e
Pesquisas em Reabilitação (CEPRE)1, pertencente à Universidade Estadual de
Campinas (UNICAMP), o qual frequentei por dez anos (dos dois aos doze anos de
idade). No CEPRE, eu sempre procurava pela instrutora surda. O que esta figura
representava em minha vida?
Minha mãe participou do curso de Língua Brasileira de Sinais (Libras) nessa
instituição (CEPRE) com o intuito de aprender essa língua, uma das partes do programa
que os pais deveriam participar, enquanto os filhos eram atendidos na instituição, que
naquela época adotava a abordagem comunicação total2. Quando eu tinha dúvidas,
além da minha mãe, eu sempre procurava a instrutora surda3, pois com ela minha
compreensão se realizava qualitativamente. Vygotsky (1998) define que a relação entre
sujeitos é de suma importância, já que a aprendizagem ocorre na mediação do sujeito
com o outro. Para que o sujeito tenha o desenvolvimento do pensamento, é necessária
sua inserção na cultura, através dos grupos sociais e da linguagem. Portanto, o
desenvolvimento da linguagem ocorre no meio social e o significado das palavras é que
permite uma representação da realidade no pensamento. Cito um exemplo: quando
pedia à minha mãe para explicar porque a palavra manga estava escrita numa parte de
um casaco, porque ela escreveu errado? Ela afirmou que manga tinha dois significados
parte de uma peça de vestuário, como casaco, blusa; mas, também significava fruta.
Fiquei confusa, era tamanha a minha incompreensão, eu olhava: “MANGA” – As
mesmas letras e com significados tão diferentes? Minhas indagações e insatisfação
continuavam, principalmente porque minha mãe me explicava com os recursos que ela
tinha: o bimodalismo, usando a fala e os sinais ao mesmo tempo. Era essa a forma
defendida pela abordagem da Comunicação Total, na época.
1 O Centro de Estudos e Pesquisas em Reabilitação (CEPRE) também atende às pessoas com deficiência
visual. Para mais informações: http://www.fcm.unicamp.br/fcm/centro-de-estudos-e-pesquisas-em-
reabilitacao-cepre. 2 Comunicação Total, método adotado após o fracasso de oralismo, começou a ser desenvolvido em
meados de 1960. A abordagem consistia no uso de sinais, fala, leitura labial, apontamento, uso de figuras,
ou seja, uso simultâneo de fala com os sinais (LACERDA, 1998). 3 Denomino a profissional surda que trabalhava no CEPRE de instrutora, porque, na época ela não tinha
formação acadêmica em nível de graduação e até hoje a nomenclatura é adotada nesta instituição.
14
Quando a instrutora surda me explicou sobre os dois significados da palavra, a
real comunicação se fez, pude compreender claramente. Hoje reflito sobre a importância
da língua de sinais como compreensão e inserção no mundo em que vivemos.
Com a minha mãe algo que eu não compreendia ou não conhecia, ela fazia à
maneira dela, usando seu próprio discurso de ouvinte; por outro lado, quando eu
perguntava algo à instrutora surda, ela citava vários exemplos e ainda acrescentava
outros, próprios da comunidade surda4. A identificação pessoal vai além da língua de
sinais, é a essência e a sutileza da comunicação, assim como define Vygotsky (1998), é
a inclusão das relações entre as pessoas que garante a aprendizagem, ou seja, a
construção da linguagem ocorre quando a criança tiver exposição a uma língua natural,
o que permitirá a realização de trocas comunicativas, vivenciando situações do seu meio
(GOLDFELD, 1997; GESUELI, 2003).
Parece-me que o CEPRE, além de uma escola de vida, era meu palco de
comunicação, pois parte das pessoas conversavam (e conversam) por meio de Libras e
havia respeito às singularidades das pessoas surdas. Na escola, não havia professor
surdo e nem professora ouvinte que soubesse a língua de sinais e, por isso, eu sempre
recorria à minha mãe e aos profissionais do CEPRE. Nesse período, fui aprendendo com
várias pessoas e me apropriando, porque ali havia um ambiente bilíngue, inclusive as
fonoaudiólogas com quem eu fazia as sessões eram bilíngues, utilizavam a fala e a
língua de sinais simultaneamente, o que facilitava a comunicação e o entendimento. O
ambiente rico que eu vivenciei naqueles tempos era um ambiente de interação com
todos no CEPRE. Não foi na escola que essa interação aconteceu.
Tenho memória fotográfica de certas situações, por exemplo, conversas em
Libras. Lembro-me dos amigos conversando em Libras, lembro-me de certos discursos.
A presença do instrutor faz diferença na vida da criança surda. O papel do professor
surdo fazia falta em minha vida escolar, pois o CEPRE não era uma escola e sim uma
instituição clínica, mas que, a partir do conhecimento que tenho hoje do que é uma
escola bilíngue, esse ambiente me parecia muito com o que hoje entendo como uma
escola bilíngue. Eu podia conversar com qualquer profissional que sabia a língua de
sinais e com as crianças surdas. É através desta interação com outros que a criança
4 Entende-se que se refere ao grupo de pessoas ouvintes e surdos, sejam elas, intérprete de Libras,
professores, pesquisadores, pais de filhos surdos, entre outros que participam à militância em favor da
cultura surda. Segundo Padden (2000), "uma comunidade surda pode incluir pessoas que não são próprias
surdas, mas que apoiam ativamente os objetivos da comunidade e trabalham em conjunto com as pessoas
surdas para os alcançar" PADDEN (2000, p. 5).
15
constrói significados e valores. Além desses ambientes “bilíngues”, lembro-me também
das broncas dos tios ou das tias, nesses momentos eles sempre chamavam minha prima
para dar explicações, porque esta sabia a língua de sinais, nossa comunicação era
baseada em gestos caseiros (a maioria dos sinais inventados por nós), o que tornava uma
comunicação parcialmente interativa. Mesmo o CEPRE não sendo uma instituição de
ensino escolar, as experiências que vivenciei lá me fazem compreender a falta que faz o
professor surdo em sala de aula nas escolas brasileiras.
No CEPRE, eu aprendi a língua de sinais, descobri a minha língua, comuniquei-
me com amigos surdos na nossa língua, construí minha história e fiz diferença em
minha vida e de minha mãe. A ideia do projeto de mestrado se deu devido a essa
experiência que relatei, ou seja, minha vivência com o instrutor surdo na época em que
eu frequentava o CEPRE. Já como adulta, pude refletir sobre essa experiência da
infância e adolescência e compreender a importância do contato da criança surda com o
adulto surdo. Essas lembranças também se entrelaçaram à minha própria experiência
profissional como instrutora da Agência para a formação profissional da Unicamp,
antiga AFPU e atualmente Educorp5, durante quatro anos ensinando Libras aos
funcionários públicos da Unicamp e, atualmente, ensinando Libras e Língua Portuguesa
para crianças e adolescentes surdos em uma instituição. Tanto minha experiência no
CEPRE quando criança como minha experiência profissional me levaram a
compreender, principalmente, a importância da presença e da ação do professor surdo
em determinadas situações voltadas ao desenvolvimento da criança e a relação com ela.
Estas questões são perpassadas por elementos nem sempre facilmente percebidos e
compreendidos pelas escolas inclusivas e ainda mais por famílias ouvintes com filhos
surdos. Assim, é importante sistematizar esses elementos e analisar a relação e os
modos de interação professor-aluno. Uma convicção ratificada por essa experiência de
pesquisa foi reconhecer a importância da presença do profissional surdo na vida da
criança surda tomando como referência a criança e os elementos significativos de seus
ambientes.
Vygotsky (1998) afirma que a formação ocorre numa relação dialética entre o
sujeito e a sociedade a seu redor, ou seja, o homem modifica o ambiente e o ambiente
modifica o homem, é essa interação que cada pessoa estabelece com determinado
ambiente que promove seu desenvolvimento e sua inserção na cultura. Posso afirmar,
5 Link do Educorp: http://www.educorp.unicamp.br/
16
então, que constitui a minha identidade, adquiri a minha língua, minha história no
CEPRE.
Apesar de algumas condições desfavoráveis na minha vida escolar, considero-
me privilegiada por ter oportunidade de ter contato com uma instrutora surda. Ao sair
do CEPRE, eu me recordo muito bem, senti um vazio, porque a partir daquele momento
comecei a conviver, quase que exclusivamente, com pessoas ouvintes. Todos da minha
família são ouvintes, estudei a vida toda em escola com ouvintes. Eu sentia que algo
faltava, uma “estranha no ninho”. Era um desconforto, percebia que eu estava
decorando tudo o que os professores diziam, mas como poderia me comunicar
oralmente? Não compreendia os conceitos. Minha situação era de uma aluna que
copiava da lousa sem entender. Essa atitude não foi ou é exclusividade minha,
Fernandes (2006) comenta:
Com muita clareza e propriedade, Góes e Tartuci (2002, p.114) nos
revelam em suas pesquisas acerca da inclusão na escola regular, as
situações excludentes a que são submetidas crianças e adolescentes
surdos, simulando o papel de aprendiz e reproduzindo os rituais
escolares para ocupar o lugar de aluno em sala de aula: “copiar da
lousa, copiar do colega, copiar de seu próprio caderno – o aluno surdo
aprende e acaba por fortalecer este tipo de estratégia: copiar para se
manter vivo no ambiente” (FERNANDES, 2006, p. 3).
Inevitavelmente, eu comparava minha experiência na escola com as vivenciadas
no CEPRE. O CEPRE, embora fosse um programa de reabilitação e de apoio à
escolaridade, era um espaço para aprender, refletir, pensar, questionar e interagir com os
colegas. Meu histórico na escola regular, em que predominavam a oralização e a cultura
ouvinte, suscitou em mim o desejo para desenvolver essa pesquisa com o intuito de
realizar uma reflexão sobre a importância de se ter um profissional surdo nas escolas
onde há alunos surdos. Quem explicava e repassava as disciplinas da escola era minha
mãe e o meu irmão, eles sabiam a língua de sinais, eles eram, para mim, a imagem de
um professor “surdo”. A experiência no CEPRE e o auxílio que eu tinha de minha mãe
e meu irmão que usavam comigo a língua de sinais foram confirmando a importância de
um professor surdo e da Libras para uma educação de qualidade e o desenvolvimento da
identidade.
Durante o período de convivência com diversas pessoas, algumas inquietações
foram geradas: que aspectos de minhas experiências de vida influenciaram e
influenciam essas relações e também a escolha do tema da dissertação do mestrado?
17
Quais minhas percepções sobre as diferenças de significação do discurso na minha
relação com minha mãe e na minha relação com a professora surda? Como se dá e como
deveria ser a formação do instrutor e do professor surdo? Qual a importância do papel
do professor surdo na sala de aula no processo educacional de crianças e jovens surdos?
Junto a essas inquietações e da minha formação como pedagoga, constatei que a
maioria dos professores surdos formados no ensino superior continua sendo contratada
como instrutor nas escolas brasileiras, o que me mobilizou para algumas questões que
direcionaram os caminhos percorridos para geração dos registros e a análise
empreendida na pesquisa: Quais são as práticas que constituem a atuação
profissional dos profissionais surdos nos contextos escolares? São práticas
constituídas de elementos próprios de uma prática de docência? Quais as
percepções que os próprios profissionais surdos têm de sua formação e de sua
atuação no contexto educacional? O que faz com que as instituições educacionais
continuem a contratar o educador surdo com o título de instrutor?
A relação da formação do professor surdo e o mercado de trabalho foram se
constituindo como objeto de pesquisa. A base teórica que utilizo nessa pesquisa foi a
sócio histórico cultural, com destaque a Vygotsky (1998) e a teoria da enunciação de
Bakhtin (1999). Segundo os autores, a criança precisa construir o seu conhecimento na
inter-relação com os outros e com o meio em que está inserida. Vygotsky enfatiza o
quanto a experiência sociocultural influencia a criança e afirma que a construção do
conhecimento ocorre a partir de um grande e importante processo de interação. Ele frisa
que além da importância da socialização no processo de construção do conhecimento, o
professor como mediador tem um importante papel na construção do próprio sujeito e
em suas ações. Essa mediação passa necessariamente pela língua.
No estudo de Vygotsky apresento dois aspectos sobre o desenvolvimento:
cultural e natural. Segundo o autor, “o crescimento intelectual da criança depende de
seu domínio dos meios sociais do pensamento, isto é, da linguagem” (VYGOTSKY,
1998, p. 63). O ser humano tem sua capacidade de expressar-se por meio da linguagem,
e principalmente por uma língua, que tem sua relação com as gerações repassadas
construindo assim sua cultura, os valores, sua história. Seguindo a mesma lógica de
Vygotsky (1998), para Bakhtin (1999), outro pesquisador russo, a relação do ser
humano se dá com a influência da linguagem na constituição da subjetividade. Segundo
o autor, o ser humano não nasce pronto para desenvolver a sua linguagem, ele passa a
fazer parte de um contexto social, como ele afirma: “não se nasce organismo biológico
18
abstrato, mas se nasce camponês ou aristocrata, proletário ou burguês”. (BAKHTIN,
1988, p. 36). Poderíamos ampliar essa expressão: “não se nasce organismo biológico,
mas se nasce brasileiro, americano ou japonês; surdo ou ouvinte; homem ou mulher;
branco, negro ou indígena...”; e tantas outras possibilidades culturais quanto o número
de grupos humanos existentes no mundo. Esses dois pensadores deram a importância ao
estudo da linguagem e no estudo das realidades (relações) humanas, motivo pelo qual
são tão adequados à fundamentação teórica de uma pesquisa que pretende analisar as
relações educacionais com a presença do educador surdo.
No século XXI, houve grandes avanços na política educacional para surdos, no
Brasil, isso se deu graças ao reconhecimento da Lei Federal n° 10.436 de 2002 e do
Decreto n° 5.626 de 2005 que regulamenta esta lei. Com isso, a política tem se
preocupado com a formação de profissionais que trabalham com o ensino de Libras
como primeira língua e português como segunda língua para surdos. Isso porque o
surdo precisa apropriar-se da Libras, que se baseia na pista visual e espacial e é
considerada sua língua natural6. De acordo com Gesser (2006), a Libras é a língua
natural dos surdos brasileiros e, como tal, poderá ser aprendida pelo surdo nas
interações que estabelece com a comunidade surda e por qualquer pessoa ouvinte
interessada através de cursos específicos.
A Libras possui todos os elementos classificatórios identificáveis e componentes
gramaticais de uma língua e demanda de prática para seu aprendizado como qualquer
outra língua. Foi na década de 60 que a Língua de Sinais foi estudada e analisada por
linguistas de forma sistemática, passando então a ocupar um status de língua, como
afirma o autor “a língua de sinais dos surdos têm estrutura e função semelhante às
demais línguas” (STOKOE, 1960, p. 3). Os estudos constataram que a Língua de Sinais
é uma língua viva e autônoma. Como já mencionado, foi ela, então, reconhecida pelo
Governo Federal Brasileiro que, em 2002, assinou uma lei que definiu a Libras como
meio legal de comunicação e expressão da comunidade surda.
O reconhecimento da Libras como língua pela comunidade surda relaciona-se
diretamente com a questão da educação inclusiva bilíngue do aluno com surdez. Isto
porque os sistemas educacionais têm por base a política educacional inclusiva
6 Sobre a língua natural, segundo Caporali (2005), “quando a criança ouvinte desde seu nascimento é
exposta à língua oral, dessa forma é fornecida para ela a oportunidade de adquirir uma língua natural, a
qual irá permitir realizar trocas comunicativas, vivenciar situações do seu meio e, assim, possuir uma
língua efetiva e constituir sua linguagem. Para a criança surda deveria ser dada a mesma oportunidade, de
adquirir uma língua própria para constituir sua linguagem”. (CAPORALI et al, 2005, p. 587)
19
implementada no país a partir de 1990, segundo a qual as escolas devem se organizar de
forma a garantir condições de acessibilidade curricular para todos os alunos, oferecendo
uma educação de qualidade, inclusive para os que apresentam necessidades
educacionais especiais, entre eles os alunos com surdez. Especificamente no caso do
aluno surdo, Fernandes (2006) relata que a educação escolar bilíngue propicia o ensino
e/ou ampliação da Libras como primeira língua e o português escrito, como segunda
língua. Porém, sabe-se que ainda se faz necessário a efetivação de uma educação
bilíngue de qualidade no território brasileiro. Há, ainda, a necessidade de mais pesquisas
sobre esse tema a fim de que lancemos luz a esse modelo educacional com o intuito de
consolidá-lo no Brasil.
A educação bilíngue almejada para grupos minoritários (alunos índios,
imigrantes, de fronteira) nos últimos anos ressalta a importância de propiciar a esses
grupos de alunos uma escolarização que lhes permita ter acesso dentro do ambiente
escolar à sua primeira língua (MAHER, 2007). Como parte também de um grupo
minoritário, para o aluno surdo é importante o acesso à Libras ao mesmo tempo que ele
aprende o português, sua segunda língua. Uma das maneiras para que isso se efetive é a
condição de que o profissional que lida com esse grupo de pessoas seja o profissional
surdo.
A importância da figura do professor devido ao seu papel mediador com o como
defende Martins (2010)
[...] O professor surdo é alguém que transforma os alunos surdos e que
também é transformado pela L2, porque se o professor surdo contribui
para o desenvolvimento e a transformação da criança surda, ele
também é o mediador da bagagem cultural e conhecimentos de sua
formação que estão presentes na sua segunda língua, por isso [...]
também é transformado ou influenciado pelas marcas da língua
portuguesa durante a sua formação e história. (MARTINS, 2010, p.
67).
Além de contribuir para o desenvolvimento linguístico da criança surda, o
professor surdo tem um importante papel no seu desenvolvimento psíquico, através da
afetividade constituída nessa relação.
O Decreto n° 5.262 de 2005, que regulamenta a Lei Federal nº 10.436/2002 e o
art. 18º da Lei nº 10.098/2000, institui que a formação do professor deve ser oferecida,
preferencialmente, ao profissional surdo, como explicitado nos artigos 4º, 5º e 6º
20
Art. 4º: A formação de docentes para o ensino de Libras nas séries
finais do ensino fundamental, no ensino médio e na educação superior
deve ser realizada em nível superior, em curso de graduação de
licenciatura plena em Letras: Libras ou em Letras: Libras/Língua
Portuguesa como segunda língua.
Art. 5º: A formação de docentes para o ensino de Libras na educação
infantil e nos anos iniciais do ensino fundamental deve ser realizada
em curso de Pedagogia ou curso normal superior, em que Libras e
Língua Portuguesa escrita tenham constituído línguas de instrução,
viabilizando a formação bilíngue.
Art. 6º: A formação de instrutor de Libras, em nível médio, deve ser
realizada por meio de: I - cursos de educação profissional; II - cursos
de formação continuada promovidos por instituições de ensino
superior; e III - cursos de formação continuada promovidos por
instituições credenciadas por secretarias de educação. (BRASIL, 2005,
p. 12)
Com este ecreto a contratação de professores surdos deve ser priorizada, o que
significa oferecer oportunidades no mercado de trabalho a esse profissional levando em
consideração a situação de desvantagem social, política e econômica, em relação aos
ouvintes. Como o campo de trabalho para professor surdo ainda é restrito, faz-se
importante a conscientização da prioridade para o profissional surdo já prevista em lei
para que a sociedade possa, inclusive, vê-lo com outros olhos.
O argumento sobre a necessidade de inserção do professor surdo na escola é
destacado nas palavras de Lunardi (1998):
A presença do professor surdo na escola representa muito mais que
modelo de linguagem e identidade: ele é um articulador do senso de
cidadania que se estabelece num processo de relação social. Essa
relação acontece entre professores surdos e alunos surdos, porque essa
troca social de conhecimentos se reproduz através da língua de sinais
(LUNARDI, 1998, p.85).
Assim, surgem algumas questões: qual é o espaço para professor surdo dentro da
carreira reservado pelo Decreto n° 5.626 de 2005 que define o profissional
preferencialmente surdo? Porque ainda não se vê o respeito ao decreto e, por
consequência, ao profissional surdo?
É muito comum que as diretrizes operacionais das redes públicas de ensino
confundam e tratem do assunto indiscriminadamente, deixando de fora os profissionais
surdos dos dois papéis que a ele são possíveis: Instrutor ou Professor. Silveira e
Rezende (2008) questionam sobre a função do profissional surdo
21
Quão inferior o surdo se apresenta no contexto profissional, já que
no ambiente educacional foram observadas várias distorções, na
nossa avaliação. Historicamente, fomos chamados para sermos o
"dicionário ambulante" (de Libras) de muitos professores na escola
e, na maior parte, os ditos "professores especialistas” [...] apenas
orientavam os alunos a trabalharem com o sinal dado pelos surdos.
Por que o surdo não pode desempenhar este importante papel de
professor e não de mero instrutor - palavra com menor status
profissional? Por que ele não pode explicar os conteúdos
curriculares, como já acontece em várias escolas? Nesse último
caso, os surdos já trabalharam com informações importantes
apresentadas pela disciplina e mesmo assim não foram
considerados, agraciados com o título de "professores" pelos
docentes. Sempre os surdos foram considerados tecnicamente como
instrutores, mas na verdade, atuavam como professores, apesar de
poucos possuírem licenciatura. (SILVEIRA e REZENDE, 2008, p.
66).
Segundo Faria (2011), é necessário olhar atentamente a relação discriminatória
do uso do termo Instrutor de Libras, comumente utilizado para o profissional surdo que
atua nas escolas de educação básica, mesmo quando este tem formação pedagógica e
funções similares às de um docente.
A principal base para formação do profissional da educação é a docência, com
ela se envolve o processo de ensino-aprendizagem. Sobre isso, Farias (2011) descreve
que a presença de um professor surdo dará ao processo de aquisição da linguagem da
criança surda, em essência, um processo ensino-aprendizagem da Libras em contexto,
imbuído de uma cultura linguística, de uma gramática própria e uma estrutura de
construção de conhecimento peculiar.
Diante da realidade acima exposta, o objetivo geral dessa pesquisa é
compreender o perfil do profissional educador surdo e a sua função no ambiente
educacional, destacando sua formação técnica pedagógica e refletir sobre os reflexos de
sua atuação na formação dos alunos surdos.
A estrutura da dissertação traz uma organização do trabalho em cinco capítulos.
No primeiro capítulo, foi discutido sobre a formação do professor e instrutor
surdo e relacionado com outras áreas.
O levantamento bibliográfico sobre os conceitos de instrutor e professor surdo
para a análise e discussão dos termos encontrados em artigos, teses, dissertações e entre
outros será discutido no segundo capítulo.
Para o terceiro capitulo, foi feita a discussão teórica referente à formação
docente do profissional surdo.
22
O capítulo quatro descreve o método da pesquisa.
Os capítulos seguintes, cinco e seis, trazem os resultados e as análises da
pesquisa de campo, realizadas, uma a partir de um questionário e outra, a partir da
observação em sala de aula. Esses resultados são discutidos nas considerações finais.
Esta pesquisa se propõe a dar visibilidade à atuação de profissionais surdos, à
sua formação e à relevância da presença desse profissional para os alunos surdos,
compreendendo sua inserção em diferentes espaços educacionais.
23
CAPÍTULO I
O PAPEL E A FORMAÇÃO DO PROFESSOR E INSTRUTOR
SURDO
O propósito do capítulo é apresentar concepções sobre a formação do professor e
instrutor surdo ancorado na legislação vigente. A retomada da legislação é de suma
importância, uma vez que existem tendências de diferentes épocas que se mantém na
perspectiva atual, principalmente em relação ao vínculo empregatício, visto que muitos
profissionais surdos, mesmo sendo docentes formados e qualificados, são contratados
como instrutores.
Pretende-se percorrer, primeiramente, as legislações da esfera educacional,
relacionando-as com a formação do profissional surdo. Irei analisar também o
“Relatório sobre a Política Linguística de Educação Bilíngue – Língua Brasileira de
Sinais e Língua Portuguesa”7 do Ministério da Educação (MEC), elaborada por um GT
(Grupo de Trabalho) composto por pesquisadores surdos e ouvintes.
A legislação educacional, com suas diretrizes e normas, direciona a organização
e o funcionamento de vários órgãos e instituições responsáveis pela educação. Em 2005,
entrou em vigência o Decreto nº 5.626 de 2005, que regulamenta a Lei nº 10.436 de
2002 dispondo sobre a Libras e o artigo 18º da Lei nº 10.098 de 2000. Este decreto é
composto por nove capítulos, sendo que um deles tem uma parte específica sobre a
formação do professor e instrutor de Libras. Este decreto aborda, ainda, a formação do
docente de Libras, principalmente sobre a formação docente para o ensino de língua,
diferenciando as funções dos profissionais formados em Pedagogia e dos formados em
Letras Libras.
A língua de sinais, como qualquer outra língua, possui estrutura gramatical
própria com níveis linguísticos como fonológico, morfológico, sintático, semântico e
pragmático (FERREIRA BRITO, 1995). A Libras é utilizada pela comunidade surda,
que se comunicam por meio desta língua. Há outros surdos que usam exclusivamente a
língua oral ou as duas línguas, dependendo da situação comunicacional.
Entende-se como Língua Brasileira de Sinais - Libras a forma de
comunicação e expressão, em que o sistema linguístico de natureza
visual-motora, com estrutura gramatical própria, constituem um
7 Relatório disponível no link: http://www.bibliotecadigital.unicamp.br/document/?code=56513
24
sistema linguístico de transmissão de ideias e fatos, oriundos de
comunidades de pessoas surdas do Brasil. (BRASIL, 2002).
A oficialização da Libras na Lei n° 10.436 de 2002 tem sua regulamentação no
Decreto n° 5.626 de 2005, o qual define diretrizes para a divulgação e propagação desse
sistema linguístico. Para tal, define-se que os sistemas educacionais federal, estadual e
municipal devem incluir o ensino de Libras, sob garantia da lei, nos cursos de formação
de Educação Especial, de Fonoaudiologia e de Magistério nos níveis médio e superior,
prevista no artigo 4º
O sistema educacional federal e os sistemas educacionais estaduais,
municipais e do Distrito Federal devem garantir a inclusão nos cursos
de formação de Educação Especial, de Fonoaudiologia e de
Magistério, em seus níveis médio e superior, do ensino da Língua
Brasileira de Sinais - Libras, como parte integrante dos Parâmetros
Curriculares Nacionais - PCNs, conforme legislação vigente
(BRASIL, 2002).
Por conta da legislação vigente do ensino de Libras, o Decreto nº 5.626 de 2005
a Libras deve ser incluída nos sistemas de ensino para dar identidade, excelência e
legitimidade aos cursos que se propõem a formar docentes na área da educação de
surdos.
A Libras deve ser inserida como disciplina curricular obrigatória nos
cursos de formação de professores para o exercício do magistério, em
nível médio e superior, e nos cursos de Fonoaudiologia, de instituições
de ensino, públicas e privadas, do sistema federal de ensino e dos
sistemas de ensino dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios
(BRASIL, 2005).
Há orientação de que o ensino de Libras deva ser incluído nos sistemas de
ensino, com prazo e percentuais mínimos para inclusão da Libras na grade curricular
dos cursos. O decreto estabeleceu o prazo limite em 22 de dezembro de 2015, após a
criação deste decreto de dez anos. Como prevê no artigo nono, que diz os prazos e
percentuais mínimos para cumprir:
A partir da publicação deste Decreto, as instituições de ensino médio
que oferecem cursos de formação para o magistério na modalidade
normal e as instituições de educação superior que oferecem cursos de
Fonoaudiologia ou de formação de professores devem incluir Libras
como disciplina curricular, nos seguintes prazos e percentuais
25
mínimos: I - até três anos, em vinte por cento dos cursos da
instituição; II - até cinco anos, em sessenta por cento dos cursos da
instituição; III - até sete anos, em oitenta por cento dos cursos da
instituição; e IV - dez anos, em cem por cento dos cursos da
instituição (BRASIL, 2005).
Sendo que o processo de inclusão do ensino de Libras na disciplina curricular
deve ser, segundo o parágrafo único do artigo nono:
O processo de inclusão da Libras como disciplina curricular deve
iniciar-se nos cursos de Educação Especial, Fonoaudiologia,
Pedagogia e Letras, ampliando-se progressivamente para as demais
licenciaturas (BRASIL, 2005).
Desde a promulgação daquele decreto, as discussões sobre a inclusão de ensino
de Libras como disciplina curricular se intensificaram, as instituições de Ensino
Superior tiveram que se adequar à legislação federal, porém a discussão da questão do
perfil do profissional de Libras para o ensino dessa disciplina não está esclarecida e
muito menos a formação do profissional habilitado para os diferentes níveis de ensino.
Uma reflexão se faz necessária: a inserção da disciplina de Libras nos cursos de
Pedagogia e outras licenciaturas poderiam ser compreendidas como uma forma de
suprir a necessidade do profissional surdo na educação de crianças e jovens surdos? Em
uma pesquisa de Nascimento e Sofiato (2016), os graduados de pedagogia que tiveram a
disciplina de Libras em sua formação disseram não se sentirem capazes de ministrar
aulas para surdos. As autoras afirmam
Cumprir a legislação, agregando ao currículo uma disciplina de um
semestre não é suficiente para atender às necessidades de formação de
professores que poderão lecionar em uma sala de aula que inclua o
aluno surdo. Por outro lado, garante-se, ao menos, que a questão se
coloque em discussão entre os futuros professores (NASCIMENTO;
SOFIATO, 2016, p. 13).
De acordo com a Lei de Diretriz e Bases da Educação Nacional (LDB), os
profissionais da educação precisam atender às especificidades do exercício de suas
atividades, e para tanto é necessário que tenham uma formação sólida, ou seja, esses
profissionais devem ter conhecimento dos fundamentos científicos e sociais para o
exercício da docência. Segundo o parágrafo único do artigo 1° da LBD:
26
A formação dos profissionais da educação, de modo a atender às
especificidades do exercício de suas atividades, bem como aos
objetivos das diferentes etapas e modalidades da educação básica, terá
como fundamentos: a presença de sólida formação básica, que
propicie o conhecimento dos fundamentos científicos e sociais de suas
competências de trabalho (BRASIL, 1996).
Quanto à formação específica para a habilitação da docência, as Diretrizes
Curriculares Nacionais (DCN) determinam que a formação de profissionais da
Educação Básica se dará em nível superior em cursos de licenciaturas de graduação
plena, como define o artigo 62º da DCN:
A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em
nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em
universidades e institutos superiores de educação, admitida, como
formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil
e nas quatro primeiras séries do ensino fundamental, a oferecida em
nível médio, na modalidade Normal (BRASIL, 1996).
Uma análise do Decreto nº 5.626 de 2005, que menciona a formação do
professor e do instrutor de Libras, encontra-se no terceiro capítulo, intitulado como “da
formação do professor de Libras e do Instrutor de Libras”. Este se inicia com uma
descrição sobre a formação de profissionais de Letras Libras ou Letras Libras/Língua
Portuguesa para atuar no ensino fundamental das séries finais
Mais uma vez questionamos a formação desses profissionais surdos nos cursos
que os habilita a ensinar Libras em todos os níveis educacionais. Estariam os
professores surdos preparados para ensinar Libras? Albres (2014), em sua pesquisa de
doutorado analisou essa questão. Como um dos resultados da pesquisa, Albres (2014)
afirmou
Constatamos que os institutos de formação provêm de um
conhecimento científico e de um conhecimento técnico (como fazer),
mas sua fraca articulação com a experiência docente e com os
problemas reais de sala de aula desfavoreceram uma formação mais
consolidada dos professores evidenciado nos discursos dos
professores de Libras (ALBRES, 2014, p. 247).
A formação de docentes para atuar no ensino infantil e nas séries iniciais do
ensino fundamental encontra-se no artigo 5º do Decreto n° 5.626 de 2005.
Observa-se, portanto, que o curso Letras Libras, sendo uma licenciatura, não
habilita os graduados para atuar na educação infantil ou ensino fundamental.
27
O sexto artigo daquele decreto aborda a formação do instrutor de Libras, que,
diferente do professor de Libras, deve ter formação em nível médio, em instituições que
podem ser realizadas tal formação: “I - cursos de educação profissional; II - cursos de
formação continuada promovidos por instituições de ensino superior; e III - cursos de
formação continuada promovidos por instituições credenciadas por secretárias de
educação” (BRASIL, 2005). Neste artigo, o primeiro parágrafo menciona a formação do
instrutor de Libras deve ser realizada por organizações da sociedade civil representativa
da comunidade surda, como por exemplo, Federação Nacional de Educação e
Integração de Surdos (FENEIS)8, Centro de Atendimento ao Surdo (CAS)
9 ou
Associação de Surdos, desde que o certificado seja convalidado por pelo menos uma
das instituições referidas nos incisos II e III. De acordo com esse artigo do decreto, se o
curso de formação for realizado em uma associação de Surdos, o instrutor só poderá
ministrar aulas de Libras em instituição de ensino escolar, se esse curso for reconhecido
por um curso de educação profissional ou instituição de ensino superior.
O decreto determina que nos dez anos seguintes à sua promulgação, caso não
haja docente com título de pós-graduação ou de graduação em Libras para o ensino
dessa disciplina em cursos de educação superior, poderá ser ministrada por profissionais
que apresentem pelo menos um dos seguintes perfis, conforme no sétimo artigo:
I - professor de Libras, usuário dessa língua com curso de pós-
graduação ou com formação superior e certificado de proficiência em
Libras, obtido por meio de exame promovido pelo Ministério da
Educação;
II - instrutor de Libras, usuário dessa língua com formação de nível
médio e com certificado obtido por meio de exame de proficiência em
Libras, promovido pelo Ministério da Educação;
III - professor ouvinte bilíngue: Libras - Língua Portuguesa, com pós-
graduação ou formação superior e com certificado obtido por meio de
exame de proficiência em Libras, promovido pelo Ministério da
Educação (BRASIL, 2005).
Estes perfis trazem uma incoerência. Quando se menciona no item III, o
professor ouvinte bilíngue está em evidência, sendo que o professor de Libras e o
8 Federação Nacional de Educação e Integração de Surdos (FENEIS) é uma entidade filantrópica, sem
fins lucrativos, que tem por finalidade a defesa de políticas linguísticas, educação, cultura, saúde e
assistência social, em favor da comunidade surda brasileira, bem como a defesa de seus direitos. Link
disponível: http://feneis.org.br/ 9 Link do Centro de Atendimento às Pessoas com Surdez (CAS) de Ribeirão Preto na página do
Facebook: https://pt-br.facebook.com/CAS-Centro-de-Apoio-ao-SurdoRibeirão-Preto-
694409923935096/.
28
instrutor de Libras descritos nos itens I e II não são mencionados como sendo “surdo”,
só como “usuário dessa língua”. Essa definição entre aspas poderia referir-se a um
ouvinte que possui família surda e utiliza a Libras como língua para se comunicar. A
palavra “surdo” é omitida ou esquecida? Não há perspectiva à priorização da pessoa
surda, uma vez que o termo “surdo” não foi utilizado e sim “usuários dessa língua”?
Segundo Bakhtin, nenhuma palavra é utilizada por uma escolha aleatória ou
deixa de ser utilizada por um simples esquecimento. “A palavra é o fenômeno
ideológico por excelência” (BAKHTIN, 1999, p. 36). Há, portanto, uma significação
ideológica no fato de se omitir a palavra “surdo” nos itens I e II e inserir a palavra
ouvinte no item III. Como ele mesmo afirma
Um signo não existe apenas como parte de uma realidade; ele também
reflete e refrata uma outra. Ele pode distorcer essa realidade, ser-lhe
fiel, ou apreendê-la de um ponto de vista específico, etc. Todo signo
está sujeito aos critérios de avaliação ideológica (isto é: se é
verdadeiro, falso, correto, justificado, bom, etc.). O domínio do
ideológico coincide com o domínio dos signos: são mutuamente
correspondentes. Ali onde o signo se encontra, encontra-se também o
ideológico. Tudo que é ideológico possui um valor semiótico
(BAKHTIN, 1999, p. 32).
Continuando com a análise do texto do decreto, verificamos que também por
meio de aprovação no exame de Proficiência em Libras (Prolibras)10
proposto pelo
Ministério da Educação (MEC), os profissionais poderão atuar na docência do ensino de
disciplina de Libras, e o artigo 8º do primeiro parágrafo define que o exame deve ser
promovido anualmente pelo MEC e instituições de educação superior para tal
finalidade. No entanto, desde a promulgação do decreto até no dia de hoje, foram
realizados apenas sete Prolibras11
, ou seja, os exames não foram realizados anualmente
como orienta o decreto.
Ainda segue a polêmica de que esse certificado do Prolibras é aceito para atuar
como instrutor ou professor para a função docente. A polêmica vem à tona quando o
decreto diz que esse exame pode habilitar profissionais graduados ou pós-graduados em
10
Segundo o site do Prolibras (http://www.prolibras.ufsc.br/) “O exame Prolibras é uma combinação de
um exame de proficiência propriamente dito e uma certificação profissional proposto pelo Ministério da
Educação como uma ação concreta prevista no Decreto n. 5.626/2005, decreto que regulamenta a Lei n.
10.436/2002, chamada “Lei de Libras”. Basicamente, esse exame objetiva avaliar a compreensão e
produção na língua brasileira de sinais – Libras. O exame Prolibras não substitui a formação em todos os
níveis educacionais”. 11
Segundo o link do Prolibras, o último exame de proficiência realizado no Brasil foi o sétimo Prolibras
no ano de 2015, conforme no link: http://www.prolibras.ufsc.br/edicoes-anteriores/
29
qualquer área, que serão considerados professores de Libras, podendo lecionar tanto nas
séries iniciais do ensino fundamental quanto no médio sem ter nenhuma formação na
área educacional. Também podemos questionar como uma pessoa com formação em
ensino médio pode ser instrutor de Libras, ou seja, ter a função de ensinar Libras, sem
ter nunca tido qualquer formação em docência. Essa situação se deu pela urgência de
profissionais para atuar no ensino de Libras, o que deveria, segundo o decreto, ocorrer
pelo período de 10 anos, ou seja, até 2015. A partir daí, estariam, a partir de 2016, as
instituições de ensino superior preparadas para formar docentes para o ensino de Libras?
Para problematizar a questão da nomenclatura ‘Instrutor de Libras’ atribuída aos
surdos que ensinam Libras e que possuem nível educacional em ensino médio e ainda,
aqueles que mesmo tendo concluído a graduação são contratados com a denominação de
Instrutor, trago a comparação com outras profissões que também utilizam essa
nomenclatura.
Diante do exposto acima, os quadros abaixo apresentam outras formações de
instrutores de cursos existentes nos sites online, com formação em diversas áreas com
formação mínima, pré-requisito, objetivo, documento necessário para se inscrever e a
fonte do site online.
Levando em conta estes aspectos, percebe-se que os requisitos que caracterizam
o profissional instrutor se prendem a uma formação técnica e prática.
FORMAÇÃO DE INSTRUTOR DE TRÂNSITO
Objetivo Qualificar recursos humanos para atuarem como Instrutores de Centro de Formação de
Condutores, na formação de condutores de veículos automotores, com ênfase no valor
segurança.
Público-alvo Comunidade em geral.
Pré-requisitos Ser maior de 21 anos; Comprovar escolaridade de conclusão de Ensino Médio, através da
apresentação de cópia do Certificado de Conclusão do Ensino Médio;
Possuir carteira de habilitação no mínimo há dois anos; Ser aprovado em avaliação
psicológica para fins pedagógicos (em data a ser agendada).
Documento necessário para
inscrição
Cópia do RG, CPF, CNH e Comprovante de Residência; Cópia do Certificado de
Conclusão do Ensino Médio
Fonte http://www.feevale.br/ensino/cursos-e-eventos/formacao-de-instrutor-de-transito-37-
edicao
Tabela 01: Formação de instrutor de trânsito
30
CURSO DE INSTRUTOR DE ARMAMENTO E TIRO
Objetivo Nosso método visa formar instrutores de armamento tiro nos padrões de qualidade
internacional além de prepará-los para que tenham excelentes chances no teste de
Credenciamento feito pela Polícia Federal.
Público-alvo Todos aqueles que buscam tal formação que tenham um mínimo conhecimento no
assunto, Instrutores de Armamento e Tiro credenciados pelo Departamento de Policia
Federal cujos querem se enquadrar na nova normatização de formação, Instrutores de
Armamento e Tiro de Escolas de Formação, aos candidatos ao credenciamento de
instrutor de armamento e tiro pelo DPF e também atiradores desportistas em busca de
conhecimento, bem como candidatos ao Porte de Arma de Fogo.
Pré-requisitos Ter mais de 21 anos; Não possuir antecedentes criminais; Envio de demais
documentações pessoais que serão solicitados após reserva de matrícula.
Documento necessário para
inscrição
Para reserva de matrícula, o interessado deverá primeiramente entrar em contato via e-
mail para verificar a disponibilidade de vagas para a data desejada, onde receberá todas as
informações pertinentes à matrícula.
Fonte http://propoint.com.br/?curso=curso-de-instrutor-de-armamento-e-tiro
Tabela 02: Curso de instrutor de armamento de tiro
INSTRUTOR DE MERGULHO LIVRE
Objetivo Qualificar o mergulhador para: prestar assistência a um Instrutor durante os cursos de
mergulho Scuba e ministrar aulas práticas e teóricas de mergulho livre.
Público-alvo O programa é designado para treinar mergulhadores experientes e com um bom nível de
conhecimentos a se tornarem instrutores da primeira modalidade de mergulho; o mergulho
em apneia ou livre
Pré-requisitos Idade mínima: 18 anos para a certificação; Certificação de Mergulhador Livre ou Básico
Scuba; Avaliação de conhecimentos e habilidades para o curso; 32 mergulhos logados.
Documento necessário para
inscrição
Não mencionado
Fonte http://hidrofobia.com.br/cursos-de-mergulho/profissionalizante/instrutor-de-mergulho-
livre/
Tabela 03: Instrutor de mergulho livre
INSTRUTOR DE VOO
Objetivo O curso de Instrutor de Voo requer formação prévia como Piloto Comercial.
Público-alvo Para se tornar um Instrutor de Voo, você deve ter concluído o curso de Piloto
Comercial prático.
31
Pré-requisitos Possuir 18 anos de idade, 2º grau completo e ser portador da licença de Piloto Comercial
Documento necessário para
inscrição
Não mencionado
Fonte http://www.ej.com.br/cursos-para-piloto/curso-de-instrutor-de-voo
Tabela 04: Instrutor de voo
Vale ressaltar que os conceitos que se encontram nas fontes quando se fala do
"instrutor" são voltados para a formação técnica, na qual a formação mínima para
exercer o trabalho de instrutor é de ensino médio sem nenhuma formação específica
para tal curso. Todos os pré-requisitos nos cursos de instrutores solicitam a mínima
formação de ensino médio e outros não são mencionados, o que significa que qualquer
pessoa pode se formar como instrutor e exercer essa função apenas com esse curso.
Vale lembrar que esses tipos de cursos para formação de instrutor encontram-se
inexistentes nos catálogos de cursos técnicos no site do portal do Ministério da
Educação (MEC)12
. Segundo o portal
Como política de desenvolvimento e valorização da educação
profissional e tecnológica de nível médio, o MEC iniciou, em 2007, a
elaboração do Catálogo Nacional de Cursos Técnicos, um dos marcos
do centenário da educação profissional no Brasil. O documento é
elaborado de forma clara e objetiva para facilitar a consulta dos
estudantes diante da quantidade de cursos ofertados. O catálogo
agrupa os cursos em formato e linguagem simples, de acordo com as
características científicas e tecnológicas de cada um. Para cada perfil
de formação, sintonizado com o mundo do trabalho, o catálogo
apresenta uma descrição do curso. As informações englobam
atividades do perfil profissional, possibilidades de atuação e estrutura
mínima recomendada (MEC, s/d).
No entanto, cabem aqui as indagações em relação ao conceito de instrutor ao
pensar que "todo instrutor é professor?" ou vice-versa. Como fica a posição do instrutor
surdo mesmo com sua formação acadêmica? Porque a denominação de instrutor de
Libras necessita de formação em nível médio para lecionar nas instituições? Os
instrutores de outras áreas podem ser docentes?
12
Segue o link do portal de catálogo de cursos técnicos no portal do MEC:
http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=41271-cnct-3-edicao-
pdf&category_slug=maio-2016-pdf&Itemid=30192
32
Segundo Guerra (2015), o manual de curso Instrutor de Voo – Avião – INVA -
MMA 58-16, de julho 1992, em seu anexo 16, utiliza para fazer referência ao professor
como: “profissional credenciado na forma da lei, com preparação pedagógica,
responsável pelo ensino de matérias teóricas ou práticas dos diversos cursos”, e ao
instrutor como: “elemento que possui experiência ou especialidade decorrente do
exercício de atividade técnica, responsável pela instrução de matérias teóricas ou
práticas dos diversos cursos” (BRASIL, 1992).
O manual de curso citado mostra claramente o quanto há distinção entre duas
denominações que refere o professor como profissional e o instrutor como exercício de
atividade técnica responsável pela instrução de matérias teóricas ou práticas.
Podemos constatar que todos os quadros se enquadram como cursos técnicos,
algo manual que é ensinado por um instrutor de formação adquirida. Em cima disso, as
questões a serem pensadas são “Quem são os profissionais qualificados que ensinam
para o curso técnico?”, “Qual a formação adquirida por eles?”, “Por acaso, o instrutor
surdo é formado por curso técnico?” e “Em qual categoria ele se encaixa
profissionalmente?”.
Figueredo (2014) afirma em seu artigo intitulado “O enquadramento e
representação sindical do instrutor técnico do Serviço Social de Aprendizagem
Industrial - SENAI”, que discute sobre o enquadramento sindical em relação com a
diferenciação da categoria professor com a da do instrutor. Ela salienta que a formação
do instrutor é diferente a do professor, como diz em seu artigo
O instrutor, diferentemente do professor, detém seu ensino voltado
somente aos aspectos de conhecimento técnico. O professor dá sua
aula para alunos e o instrutor dá treinamento para aprendizes
(FIGUEREDO, 2014, p. 4).
Segundo a citação, o instrutor é voltado para conhecimento técnico, enquanto o
professor é responsável pelo conhecimento teórico. A autora ressalta que o curso de
profissionalização é voltado para prática técnica, que é ministrado pelo instrutor.
No caso do ensino de Libras, ao utilizar como docentes a figura dos instrutores,
estaria o decreto promovendo a ideia de que saber Libras é uma atividade técnica? Uma
língua pode ser considerada uma técnica? Essa prerrogativa coloca em grau de
inferioridade a Libras, como uma habilidade técnica e não como uma língua.
33
Para compreender sobre as etapas da formação escolar, deve-se observar que a
educação básica é composta por três níveis: educação infantil, ensino fundamental e o
ensino médio. No último nível do ensino educacional tem a educação profissional.
Neste sentido, Figueredo (2014) esclarece a educação profissional dentro do ensino
médio
[...] A atividade preponderante exercida pelo profissional dentro dos
cursos ministrados pelo SENAI é efetivamente realizada no âmbito da
aprendizagem industrial, de formação e orientação profissional.
Assim, não se pode considerar como professor de educação regular o
instrutor do ensino profissionalizante, cuja atividade enfatiza a prática
profissional, de modo que os cursos de aprendizagem não têm relação
com o exercício do magistério (FIGUEREDO, p. 7, 2014).
Diante dessa situação, acaba tornando-se uma entidade de educação, que o
diferencia das demais instituições de ensino, seja de ensino fundamental, médio ou
superior, justamente pela natureza de seu ensino, que é a profissionalização do aluno
dentro de determinada área específica e técnica.
Há uma contradição: um sistema de ensino deveria priorizar o profissional
professor, que conhece o pedagógico, a língua em toda a sua estrutura, que trabalha com
os conhecimentos científico e cultural e não o instrutor, que domina a parte técnica,
prática?
Como o instrutor surdo dentro de uma escola e sala bilíngue ou classe inclusiva
pode ministrar aula, se a instituição é de ensino regular sem possuir certificação para
ministrar a tal aula? Como entrelinhar a profissão do instrutor dentro de uma instituição
que é de ensino regular? Eis a questão a ser pensada e analisada. Onde o professor surdo
fica incluído, se há o instrutor?
Recentemente, foi lançado o Relatório de Grupo de Trabalho designado pelo
MEC pelas portarias nº 1.060 de 2013 e nº 91 de 2013. Esse grupo de trabalho teve
como, objetivo trocar e atualizar informações, conhecimentos sobre temas e aspectos
específicos sobre a educação dos surdos, a fim de elaborar políticas públicas nessa área.
Neste relatório não há denominação de conceito “instrutor” como mostra a seguinte
citação retirada do relatório
A formação de professores de Libras, de Língua Portuguesa como L2,
de tradutores e intérpretes é fundamental para formar profissionais
para atuarem na educação básica. Essas formações devem ser
garantidas em nível superior (licenciatura e bacharelado) e enquanto
34
formação continuada para os professores que já estejam atuando na
educação básica e superior. Os cursos de graduação envolvem a
Pedagogia Bilíngue (que forma o professor bilíngue de atuar na
educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental), os cursos de
Letras Libras licenciatura (que forma professores de Libras para atuar
no ensino da Libras na educação básica e nível médio) e bacharelado
(que forma tradutores e intérpretes de Libras e Língua Portuguesa). O
Curso de Língua Portuguesa como L2 deve ser oferecido para formar
os professores que atuarão, tanto na educação básica, como no nível
superior. 19) Fomentar a formação inicial e continuada de professores
surdos, professores bilíngues, professores de Língua Portuguesa como
L2, professores de Libras e tradutores e intérpretes de Libras
(BRASIL/MEC/SECADI, p.14, 2014).
Quando comparado ao Decreto n° 5.626 de 2005, o Relatório acima citado
representa um avanço, uma vez que não utiliza a terminologia “Instrutor”, porém o
mesmo não tem força de lei. Para efeitos de implantação das políticas educacionais
ainda é o decreto que deve ser seguido.
Vale a reflexão: se um instrutor formado em uma escola de idioma ou numa
associação que oferece curso de idioma para comunidade do bairro, este aluno poderá
ministrar a aula numa instituição educacional onde a lei prevista para docência é de
formação em ensino superior? Por que a lei permite o instrutor nessas instituições e qual
seriam os espaços de atuação profissional de um instrutor de Libras? O que o aluno
surdo fará com o certificado da Feneis, por exemplo, para trabalhar em um lugar onde a
escola não exige a formação específica?
Nestas circunstâncias, a reflexão da descrição do profissional habilitado para o
ensino de Libras sob a base do Decreto nº 5.626 de 2005 e da legislação educacional
brasileira, prevê a necessidade de alguns pressupostos e possibilidades para reflexão.
Tais questões que necessitam de discussão para a solução dos problemas em que se
encontra no cenário do ambiente educacional no ensino e Libras: os professores de
qualquer licenciatura podem se formar em curso de pós-graduação em Libras e atuar
como professor dessa disciplina na educação superior mesmo que sua licenciatura não
seja em Letras ou Pedagogia. A carga horária dos cursos de especialização é bem
inferior a de um curso de graduação, no entanto, possibilita esse profissional formar
outros profissionais para o ensino de Libras? Como o Prolibras pode habilitar um
profissional com certificado em proficiência num mercado de trabalho que não
privilegia a docência? Será que esses problemas serão resolvidos até a adequação da lei?
Onde estão os profissionais surdos que se encontram nessa posição? No entanto, como
35
afirma Faria (2011), o primeiro passo é superar a nomenclatura de instrutor de Libras
para que haja reconhecimento e valorização do sujeito surdo licenciado.
Diferenciar instrutor de Libras e professor é extremamente necessário, para dar
qualidade ao trabalho de docência no ensino de Libras, sobretudo, dar visibilidade,
espaço e “mãos e olhos” ao professor surdo.
36
CAPÍTULO II
PROFESSOR E INSTRUTOR SURDO: REVENDO OS CONCEITOS
Este capítulo traz um panorama das pesquisas que focalizam a formação do
professor e do instrutor surdo dentro da educação básica, a discussão destes conceitos,
possíveis enfoques, áreas de investigação e a articulação teórica com o tema. A partir de
dados de extensiva revisão de literatura, tendo como base o resultado do levantamento
realizado e a análise sobre o tema, foi conduzida uma revisão e discussão dos conceitos
de professor, de instrutor surdo e de algumas das principais questões relacionadas à
pesquisa sobre estes conceitos.
Acredita-se que um levantamento pode ser produzido em relação às
denominações professor e instrutor surdo, além de questões sobre a formação de cada
um, com o objetivo de compreender a especificidade de cada profissional e como ela é
descrita. Nesse capítulo, portanto, pretendo identificar as diferenças atribuídas às
denominações professor surdo e instrutor surdo a partir de busca realizada em pesquisas
e publicações relacionadas ao tema em bases de dados eletrônicos nacionais e livros. Tal
levantamento possibilitou o acesso a informações relevantes para a reflexão sobre os
conceitos que diferenciam ou não nas denominações instrutor e professor. O trabalho
ampliou e diversificou os conceitos estudados, ancorados pelo olhar científico e
acadêmico.
A busca foi realizada em bases científicas gerais como Scielo, SBU, bases de
dados específicas sobre o assunto, bancos de dissertações e teses, além de livros
publicados. Para a realização da busca, foi utilizada a pesquisa em bases de dados por
assuntos, foram utilizadas as palavras-chaves: "instrutor surdo" e "professor surdo",
porém não foram encontrados com exatidão e diferenciação as palavras-chave. Na busca
realizada no site de Scielo, tomou-se como referência algumas palavras-chave, tais
como: professor surdo, instrutor surdo, docente surdo, surdo. Também foram realizados
cruzamentos de palavras: professor e instrutor surdo, docente surdo e professor, entre
outros. No total foram localizados três artigos para esta pesquisa. Diante desse reduzido
número de material, foi utilizado como site de busca o Google Acadêmico. Assim,
foram localizadas mais publicações relacionadas à temática pesquisada. Ao todo, foram
localizadas 17 publicações sobre a temática, datadas de 1999 a 2014.
37
Após o levantamento bibliográfico, os dados foram analisados por meio de
realização de fichamentos, que buscaram abranger todas as informações relevantes para
o estudo dos conceitos atribuídos às denominações professor e instrutor e sua relação
com o campo de trabalho, bem como análises das principais ideias de cada artigo, teses
e revistas pesquisadas. Por fim, o resultado apresentado por cada estudo possibilitou
uma perspectiva sobre os caminhos que as pesquisas sobre o tema vêm seguindo.
Nos últimos anos, a proposta da formação do profissional surdo tem sido objeto
de inúmeras reflexões e polêmicas. É fato que essa formação no ensino de língua de
sinais no Brasil começou a ser disseminada nos estudos da área política linguística e
educacional após uma notória atenção no documento elaborado pela comunidade surda
a partir do Pré-congresso ao V Congresso Latino Americano de Educação Bilíngue para
Surdos, realizado em Porto Alegre no salão de atos da reitoria da Universidade Federal
de Rio Grande do Sul nos dias 20 a 24 de abril de 1999, no qual foi discutida uma
proposta intitulada “A educação que nós surdos queremos” com objetivo de colocar em
prática a educação dos Surdos. Este documento foi redigido pela comunidade surda,
sendo dividido em três tópicos: a) política e práticas educacionais para surdos; b)
comunidade, cultura e identidade; c) formação do profissional surdo. O evento foi um
marco para as discussões mais amplas e profundas do profissionalismo no ensino de
língua de sinais e outros assuntos referentes à educação de surdos. Houve um maior
incentivo à formação do profissional surdo e sua inserção na sala de aula, com
consequentes reflexos nas produções científicas e publicações sobre o documento. A
investigação da formação do profissional surdo se faz necessária na medida em que
propõe um mapeamento do percurso das pesquisas, da construção teórica real efetivação
da proposta e compreensões diversas dos termos professor e instrutor surdo.
Neste sentido, o presente texto discute os resultados de uma pesquisa sobre os
termos empregados e suas significações no contexto acadêmico. A pesquisa objetivou
realizar um estudo da produção teórico-bibliográfica a fim de conhecer e estudar os
textos teóricos publicados e produções científicas sobre a formação do surdo a partir
daquele documento proposto pela comunidade surda. Os resultados dessa pesquisa
poderão fornecer importantes elementos à compreensão do processo educacional e da
formação destes sujeitos que atualmente se desenvolve nas escolas.
2.1 Compreendendo a formação docente do sujeito surdo
38
Dentro da proposta de educação bilíngue, vários autores têm apontado a
importância do docente surdo na escolarização das crianças surdas. Martins, Albres e
Sousa afirmam que:
Mais importante que ter a circulação da Libras na escola é, de fato,
possibilitar que essa língua seja empoderada nos usos cotidianos, nas
avaliações, nas salas de aulas, na relação com alunos ouvintes, tendo
espaço de poder nas negociações escolares como a língua portuguesa.
É ter a presença de educadores surdos que tragam para a cultura
escolar aspectos culturais das pessoas surdas (MARTINS, ALBRES e
SOUSA, 2015, p. 105. Grifos meus).
A postura profissional do professor de Libras diante da sua formação é destacada
por Albres (2014), que produziu sua tese de doutorado utilizando como metodologia
grupo focal com professores de formação em Letras Libras. Essa pesquisa teve como
objetivo analisar as condições da formação e atuação dos professores em sala de aula,
mais especificamente a natureza dos saberes13
, como afirma a própria autora.
Para a análise e a avaliação dos participantes da pesquisa, a autora utilizou três
categorias: a primeira especificou sobre a significação e sentido do trabalho docente, a
teoria e a prática no processo de ensino-aprendizagem de língua são a segunda categoria
da análise e a terceira, a ideologia e a consciência política. Juntando estas três
categorias, a autora buscou entender e investigar sobre o curso de Letras Libras como
uma formação adequada do saber para o desenvolvimento da competência profissional
para atuar na docência. Além desta investigação, a autora buscou também analisar os
discursos dos sujeitos da pesquisa, o conhecimento e os saberes dos mesmos.
Com a análise do resultado da pesquisa, a autora vê a necessidade de
transposição didática, termo utilizado por ela como referente à formação do profissional
surdo na docência ressaltando como primordial e fundamental para a profissão do
docente, afirma que o curso de Letras Libras tem uma carência em termos de conteúdo
didático e metodologia na grade curricular. Destaca-se que os achados da pesquisa de
Albres (2014) refletem uma realidade também de outros cursos de licenciatura, que
apresentam uma carência em termos de metodologia de ensino. Mas isso não ocorre
somente na formação em Letras Libras. Segundo um estudo realizado pela Fundação
13
O termo “saber” empregado no texto de Albres (2014) refere-se ao sujeito surdo diante da sua
experiência em várias hierarquias: “da família, da escola que o formou, da cultura pessoal, dos seus
pares” (ALBRES, 2014, p 30). O conceito utilizado por Tardif define: “O saber é sempre o” saber de
alguém que trabalha alguma coisa no intuito de realizar um objetivo qualquer (...) o saber dos professores
é o saber deles, está relacionado com a pessoa e a identidade, com a sua experiência de vida e com a
história profissional (TARDIF, 2010, p. 11 apud ALBRES, 2014, p. 30).
39
Carlos Chagas, os cursos de licenciaturas têm carência e apontam falhas na formação
inicial dos professores, como mostra a situação segundo a reportagem
Assim como nos cursos de pedagogia, os de licenciatura também
enfrentam dificuldades em balancear as disciplinas. O principal
problema, segundo a professora é que as licenciaturas ainda hoje não
estão voltadas para a formação de professores, "elas priorizam a
formação disciplinar, em detrimento da pedagógica". (TODOS PELA
EDUCAÇÃO, 2008, s/p).
Albres (2014) recorre a Tardif (2010) para repensar a questão da formação de
professores de línguas, que envolve certa complexidade quando se trata de uma língua
minoritária
A política nacional de formação de professores tem indicado uma
preocupação com este aspecto, tanto que produz diretrizes para
articulação da teoria e da prática e para desenvolver nos futuros
professores a competência de trabalhar com a transposição didática
(ALBRES, 2014, p. 49).
Para garantir uma formação de qualidade na profissionalização do educador
surdo (professor e instrutor), necessita-se de uma “transposição” do conhecimento
científico do profissional para o conteúdo escolar destinado ao ensino para alunos,
utilizando as características do discente como: idade, maturidade, conhecimento prévio.
A autora analisa a falta de estrutura dos cursos voltados para o ensino de Libras e
enfatiza a importância de um planejamento de curso com uso de materiais didáticos e
pedagógicos.
Gianini (2012) apresenta, em sua tese de doutorado intitulada “Professores
surdos de Libras: a centralidade de ambientes bilíngues em sua formação”, reflexões e
análises sobre a evolução histórica e trajetória da educação dos surdos através da
formação docente destacando as três figuras de professor. A primeira figura é
denominada de “professor improvisado”, a qual se refere ao docente da primeira
geração que atuava sem ter formação especifica. Nesse sentido, Gianini (2012, p.189)
destaca que os professores improvisados eram “[...] aqueles primeiros professores na
história da educação, que atuavam quando ainda não havia formalização do ensino, e
por essa razão, qualquer pessoa que possuísse alguns conhecimentos poderia ensinar”.
O professor artesão é designado como a segunda figura de professor, aquele que
40
assumia a função docente através da troca de saberes entre os pares. De acordo com a
autora:
A partir do século XVII, e presente até o século XX, com a
formalização do ensino e o surgimento das escolas, encontramos o
modelo do professor artesão, que tinha possibilidade de construir
saberes docente na troca com vários professores, o que vai permitir
impulsionar e partilhar a criação de procedimentos de ensino e de
comportamentos em sala de aula, que a deviam ser cumpridos de
forma precisa. Para ensinar era necessário, então, dominar o conteúdo,
um método e estratégias para desenvolvê-lo. Começa, então, a ser
necessária a formação do professor, ainda não concebido como um
profissional do ensino, mas como um repetidor de regras ritualizadas e
não questionadas (GIANINI, 2012, p. 141).
O uso do termo “professor artesão” é relacionado com o instrutor, pois segundo
a autora, ele assume a função docente sem ter o domínio do conteúdo especifico e de
aspectos didáticos. Nesse sentido há uma dificuldade do profissional em atuar na
docência, por falta de informação específica.
A última figura é a de professor de verdade, denominação dada pelos
participantes da pesquisa, que eram, naquele momento, graduandos no curso Letras
Libras.
Ser um "professor de verdade" é o desejo expresso por todos os
participantes da pesquisa. Apesar de que já exercerem a profissão, de
nos revelarem todo um processo de formação docente ao longo de
suas narrativas autobiográficas, não se sentem autorizados a serem
tratados como professor. O entendimento de nossos participantes é o
de que se tornarão professores de verdade quando concluírem a
formação com a licenciatura para o ensino de Libras (GIANINI, 2012,
p. 183).
Pelo contexto profissional, os participantes da pesquisa perceberam a falta da
prática didática e conhecimento científico para atuar na docência, o que os levou a
buscar uma alternativa melhor para seu trabalho docente, quando manifestaram o desejo
de ingressar no ensino superior. A entrada para o ensino universitário é definida pela
autora como a passagem para o professor de verdade, quando serão formados na área
especifica para docência.
A identidade em construção é utilizada por Martins (2010) em sua dissertação de
mestrado quando se refere à utilização do conceito “professor surdo”. De ponto de vista
da autora, a posição do profissional surdo ainda não é reconhecida no espaço
41
educacional. Portanto, refere-se que ainda não existe uma identidade docente surda
sólida. Mesmo com a política de intervenção pedagógica e a formação acadêmica de
professores surdos esses profissionais não são reconhecidos. Além da falta de
reconhecimento e da desvalorização da profissão, a autora ressalta que a percepção
sobre a importância da atuação do professor surdo ainda está em processo. Nesse
sentido, Martins (2010, p.99) salienta que “vale lembrar que também existem
profissionais surdos (professores, instrutores, assistentes educacionais14
), que utilizam a
metodologia tradicional”. A preocupação não é focalizada apenas em construção de uma
identidade docente, há outros problemas que precisam ser resolvidos no ambiente
educacional, como por exemplo, o uso de práticas pedagógicas inadequadas,
observando que a presença do professor surdo é de suma importância para a construção
de conceitos e identidades para crianças surdas. Portanto, segundo a autora, o processo
de construção para uma nova identidade docente surda implica na construção de uma
pedagogia surda, centrada nas práticas linguísticas.
Santos (2007) coloca a reflexão sobre o papel do instrutor que se ocupa como
professor ou educador. Em sua análise de pesquisa de campo, o instrutor surdo no
ensino de Libras para crianças surdas nas escolas e instituições configura-se como
professor, que entrelaça a posição de educador de língua. Este conceito é desenvolvido
em seu trabalho de mestrado intitulado “Instrutor surdo em uma escola inclusiva
bilíngue: sua formação junto aos alunos surdos no espaço da oficina de língua brasileira
de sinais”. A autora enfatiza a preocupação de que bastaria o instrutor possuir fluência
em Libras e ter concluído o ensino médio para assumir o cargo de docente, como mostra
o Decreto n° 5.626 de 2005. Muitas instituições e escolas desistem de contratá-los e
acabam optando pelo profissional ouvinte para atuar na área educacional visto que os
surdos não tinham formação (SANTOS 2007). Em sua pesquisa sobre o espaço de
oficina ministrado por instrutores surdos, a autora destaca a importância da formação
continuada desse profissional, e aponta que havia necessidade de profissionalização dos
instrutores que atuavam no espaço por ela pesquisado.
A formação continuada e em serviço mostra-se um caminho
promissor, já que temos a necessidade urgente de instrutores surdos e
14
Segundo Martins (2010, p. 69), o termo assistente educacional é “denominação da profissão do surdo
que atua no INES (Instituto Nacional de Educação de Surdos) que substituiu a nomenclatura de monitor.
Esta profissão de assistente Educacional não é semelhante à do professor ou do intérprete. Atua em todas
as séries do Ensino Infantil, Médio e Fundamental esclarecendo conceitos e conteúdos dados pelo
professor”.
42
não dispomos de tempo para aguardar esta formação pela academia.
Sendo assim, este pode ser um caminho possível, conforme os
apontamentos do estudo aqui apresentado, para enfrentarmos os
desafios que se colocam perante o processo de ensino-aprendizagem
da criança surda, já que este profissional, o instrutor surdo, mostra-se
fundamental para as propostas de educação de alunos surdos,
quaisquer que sejam elas (SANTOS, 2007, p. 74).
O conceito de instrutor de Libras é destacado na pesquisa de dissertação
produzida por Gurgel (2004). De acordo com a pesquisa, o surgimento do conceito
instrutor de Libras teve origem nas associações de surdos, onde o ensino de Libras para
pessoas surdas e ouvintes fluía naturalmente pela língua em comum e por necessidade,
como verdadeiro espaço destinado aos surdos, filhos de pais ouvintes, com pouca ou
nenhuma fluência na língua.
Há pessoas que fazem parte de associações de surdos e atuam como
instrutor em diferentes espaços, para o ensino da língua de sinais. Nas
escolas, as iniciativas que envolvem instrutores ainda são poucas, de
âmbito local e com periocidade irregular, quase sempre sem garantias
de uma continua vinculação institucional (GURGEL, 2004, p. 31).
Lembremos que as pesquisas de Gurgel e Santos datam respectivamente de 2004
e 2007, sendo que, naquele momento, poucos profissionais surdos tinham uma
formação acadêmica específica. Em 2010, formaram-se pelo curso Letras Libras da
UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina) cerca de 389 surdos, na modalidade à
distância e em 2012, no segundo oferecimento do curso, cerca de 378 profissionais,
segundo os dados no livro digital do Letras Libras15
(2014). Atualmente a UFSC
continua oferecendo o curso na modalidade presencial e à distância e outras
universidades também têm cursos de formação em Letras Libras e pedagogia bilíngue.
A FENEIS (Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos) procurou
intensificar a formação do instrutor e sua profissionalização nas associações, o resultado
não foi atingido dentro do esperado devido à falta de reconhecimento da profissão, pelos
que deliberam na educação de surdos.
15
Dados obtidos em QUADROS, R. (org). Letras Libras ontem, hoje e amanhã. Florianópolis: UFSC,
2014. Disponível em http://www.institutosantateresinha.org.br/images/pdf/letras-libras.pdf. Acesso em 13
de novembro de 2016
43
Ao utilizar o termo professor e o termo instrutor, a cartilha de curso de
aperfeiçoamento16
de professores para Atendimento Educacional Especializado (AEE)
faz uso de barra entre as conjunções “E” e “OU”, em diferentes excertos do texto. Tal
curso foi promovido pelo Ministério da Educação (MEC) com parceira da Secretária da
Educação Especial (SEE) e Secretaria de Educação a Distância (SEED) realizada em
uma ação conjunta da Universidade Federal do Ceará (UFC). Nela há um projeto de
formação continuada de professores por meio do programa Educação Inclusiva: direito
à diversidade (MEC, 2007), que é dividido por modalidade em áreas de deficiência
física, sensorial e mental com objetivo de “introduzir conhecimentos que possam
fundamentar os professores na reorientação das suas práticas de Atendimento
Educacional Especializado” (MEC, 2007, p. 5). Diante dos conceitos encontrados nesta
cartilha, é possível constar que há a utilização da barra entre as conjunções “E” e “OU”,
entre as palavras professor e instrutor.
Este trabalhado é realizado pelo professor e/ou instrutor de Libras
(preferencialmente surdo), de acordo com o estágio de
desenvolvimento da Língua de Sinais em que o aluno se encontra. O
atendimento deve ser planejado a partir do diagnóstico do
conhecimento que o aluno tem a respeito da Língua de Sinais (MEC,
2007, p. 19, grifos meus).
O uso de barra entre “E” e “OU” mostra claramente que não há um
posicionamento da secretaria sobre a necessidade de profissionalização do professor
como mostra a anterior citação. No entanto, de forma contraditória, em outro trecho do
documento, a secretaria afirma a necessidade de formação:
Na escola comum, é ideal que haja professores que realizem esse
atendimento, sendo que os mesmos precisam ser formados para ser
professor e ter pleno domínio da Língua de Sinais. O Professor em
Língua de Sinais ministra aula utilizando a Língua de Sinais nas
diferentes modalidades, etapas e níveis de ensino como meio de
comunicação e interlocução (MEC, 2007, p. 20, grifos meus).
Percebe-se que o MEC aponta para a necessidade da formação profissional e da
fluência em Língua de Sinais. Há o uso do termo “preferencialmente” na cartilha o qual
16
Curso de aperfeiçoamento produzido pela Secretaria de Educação Especial do Ministério da Educação
(SEE/MEC) em 2007. Serve para ampliar o projeto de formação continuada de professores por meio do
programa Educação Inclusiva: direito à diversidade.
44
mostra a preferência de pessoa surda para atuar na docência, entretanto não está claro
qual a posição adequada para o profissional surdo, no que se refere à necessidade de
formação, já que não diferencia o professor de instrutor.
Por muitos anos, a prática da educação dos surdos era pautada em “pedagogia
ortopédica”, ao qual o profissional procura curar o “ouvido deficiente”, definição usada
no tempo do oralismo. Os conceitos contidos entre aspas são utilizados no artigo
publicado por Machado (2010). A autora percorre os caminhos educacionais do sujeito
surdo desde a hegemonia do oralismo até o surgimento da educação bilíngue,
procurando entender e contextualizar os processos de abordagem educacional. Na
mudança de paradigma, os profissionais que atuam na educação dos surdos também se
modificam, conforme afirma
A figura do professor especialista em deficiência auditiva passa a ser
substituída pelo professor de Libras e pelo professor bilíngue, que
aparecem no cenário tendo inclusive um curso superior para essa
formação especifica. Os surdos passam a fazer parte desse processo
como construtores teóricos e práticos dessas formações e novas
oportunidades de inserção tanto no mercado de trabalho quanto na
academia (MACHADO, 2010, p. 62).
A autora afirma que, ainda hoje, existe a exclusão de alunos surdos nas escolas
devido à política do AEE e pela pouca formação de professores qualificados para
atender à demanda dos alunos surdos na sala de aula. Mesmo com a inserção da
educação bilíngue, no sistema educacional ainda persiste a exclusão dos surdos, pois o
AEE cria um não funcionamento na sala de aula regular e deixa a Libras como uma
língua utilizada somente no contraturno. Então, vê-se a necessidade de uma busca de
novos saberes e novas experiências para a educação dos surdos.
O espaço para educação dos surdos foi fruto de muitas lutas por parte de
movimentos sociais de pessoas surdas em busca de educação de qualidade e pelo
respeito à diferença linguística. Segundo Machado (2010), desde os tempos da
Salamanca17
começou o travestismo linguístico, ou seja, a língua de sinais não é de fato
a língua de instrução, mas assume um papel instrumental, usada apenas no espaço do
AEE. Isso ocorre com a ”reorganização” pedagógica para a educação dos Surdos, o qual
17
A Declaração de Salamanca é considerada um dos principais documentos mundiais que visam a
inclusão social, ao lado da Convenção de Direitos da Criança (1988) e da Declaração sobre Educação
para Todos de 1990.
45
prevê a necessidade de repensar as práticas e saberes dos professores especialistas. A
formação deste profissional passou a ser confundida com a do generalista em educação
especial.
Com o emergir da política de educação para todos desde 1994 em
Salamanca, a Língua de Sinais, outrora “demonizada”, agora passa a
fazer parte dessas discussões, e os surdos passam a ter seus saberes
valorizados por meio de suas narrativas denunciativas. O saber clínico
aos poucos, com o discurso da inclusão, foi sendo substituído por um
espaço vazio de práticas bilíngues que o discurso da educação especial
criou com a nova racionalidade instituída quando corrobora a figura
do surdo no espaço discursivo das deficiências. Quando se pensou que
mudanças seriam prerrogativas fundamentais, foi-se percebendo que o
discurso não muda tanto. O que ocorre é um travestismo linguístico
(MACHADO, 2010, p. 9).
Para “encerrar” a confusão, a Lei da Libras foi imprescindível, porém a autora
questiona com algumas reflexões como colocar a lei em prática, como repensar a
formação do professor de surdos.
Com a regulamentação do decreto, surgem duas novidades: professor bilíngue e
professor de português para surdos. Com isso, passa a ser substituída a figura do
professor especialista em deficiência auditiva para professor de Libras e pelo professor
bilíngue, uma transcrição poética educacional (MACHADO, 2010), e que passa a ter
uma transgressão pedagógica como um intuito de tornar a educação mais
pedagogicamente “bilíngue”. Porém, Quadros (2005) aponta que a formação do
professor de surdos está em falta mesmo com o surgimento do curso de graduação para
formação especifica. Diante da preocupação da falta de formação de profissional surdo,
a autora destaca o projeto de criação do curso de graduação voltada para área de Libras
Esse processo torna-se possível se as universidades criam condições
para o ingresso e permanência dos surdos na universidade. A
Universidade Federal de Santa Catarina está desenvolvendo um
projeto, com apoio da CAPES, que visa formar professores e
pesquisadores da educação de surdos, da língua de sinais e da
interpretação da língua de sinais para garantir a implementação do
ensino da Libras, em atendimento ao artigo 4o. da Lei 10.436, de 24
de abril de 2002. A proposta é de propiciar uma formação teórico-
prática, em nível stricto sensu, que permita aos professores bilíngues
(língua de sinais e português), aos professores de língua de sinais e
aos intérpretes de língua de sinais atuar no ensino como pesquisadores
e multiplicadores da educação de surdos e da língua brasileira de
sinais, tendo em vista a promoção da inclusão de todos os alunos.
Também visa qualificar, em nível stricto sensu, os profissionais que
46
estão atuando direta ou indiretamente na educação de alunos surdos.
Dessa forma, essa Universidade passou a criar as condições para que
isso se tornasse uma realidade (QUADROS, 2005, p. 45).
Após a regulamentação daquele decreto, Faria (2011) analisou a nomenclatura
de instrutor de Libras e averiguou como essa denominação está explicada neste decreto.
A autora usa a profissão do professor sob perspectiva da LDB (Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional)18
de 1996 como base para explicar e fazer comparação com a
profissão de professor surdo, sendo que a LDB propõe a profissão “valorizada” e
reconhecida como profissional da área educacional determinando a obrigatoriedade de
formação do professor em nível de graduação. A LDB intensificou nas últimas décadas
a política da formação de professores, o que exige a valorização e reconhecimento da
profissão. Nesta diretriz, a formação do magistério, como é chamada de cursos normais
de nível médio, é aceita como formação mínima apenas em período transitório. Faria
(2011, p.89) destaca a LDB como um modelo de formação de professores como
essencial para atuar na docência, portanto “[...] é consenso entre os educadores que a
formação dos profissionais da educação em nível superior em cursos de licenciatura é
essencial tanto para a qualidade da educação, quanto para a profissionalização docente”.
Enquanto isso, o Decreto n° 5.626 de 2005 mostra o avanço significativo da formação
do profissional surdo na educação, porém a autora questiona quais as diferenças entre
dois profissionais: o professor e o instrutor e qual o papel de cada um na docência de
Libras, os usuários de Libras e sua expansão.
A autora critica o decreto quando afirma que a educação formal19
para o
instrutor é a formação para atuar no ensino, mas questiona como uma escola de curso
livre é considerado não-formal20
:
Já se identificou que o Instrutor de Libras, de acordo com o Decreto
5.626/2005 não está apto para o magistério da Educação Básica.
Portanto, esse profissional, denominado de Instrutor de Libras é todo
aquele que possui formação profissional e que poderá, portanto, atuar
no ensino da Libras em cursos livres a ser oferecidos em empresas,
instituições públicas, organizações e outros espaços, que não a
educação formal (FARIA, 2011, p.97).
18
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) regulamentada na Lei n° 9.394/96, é a mais
importante Lei do sistema educacional, que traz as diretrizes gerais da educação brasileira, seja ela
pública ou privada. 19
Educação formal refere-se a curso de graduação formado em instituição de ensino superior. 20
Instituições de cursos livres são consideradas como não formais.
47
A pesquisadora questiona a educação formal: por que o instrutor está apto para
assumir a docência e mesmo assim é tratado como instrutor? Por que não tratá-lo como
professor de Libras? Para a autora, o termo professor deveria ser usado em respeito à
profissão e ao docente surdo, e consequentemente, ao reconhecimento, na perspectiva
da igualdade de condição para interferir no processo educativo (FARIA 2011).
A pesquisadora afirma que existem profissionais formados para a docência, eles
são os professores. Além deles, existem os “trabalhadores em educação” como o
instrutor de Libras que não é habilitado para a docência, mas atua com alunos de
educação básica.
Outro aspecto relevante apontado pela autora, ao analisar o decreto, diz a
respeito à conjunção disjuntiva “OU” que mostra claramente a forma indiscriminada
quando se refere aos dois profissionais dentro da mesma função profissional como
mostra a reflexão da autora
Percebe-se que a presença do Instrutor de Libras na escola de
Educação Básica é citada no artigo 14 de forma indiscriminatória ao
Professor de Libras, usando a conjunção disjuntiva “ou” para elencar
esses dois profissionais dentro de uma mesma função profissional.
Significa que o Decreto indica que o Professor de Libras pode exercer
a função de Instrutor, porém, o Instrutor não está apto a atuar em
espaços profissionais que exigem formação pedagógica. Ou seja, a
interpretação que se faz é que o Instrutor de Libras pode apoiar a
escola, mas não é um professor. Ora, essa perspectiva diferencial de
nomenclatura não faz sentido se o lócus de atuação é a escola de
Educação Básica e se a atividade exercida tem como essência o
processo ensino-aprendizagem da Libras para os educandos surdos. É
tratar o Instrutor com certo desprestígio, mesmo se a função
desempenhada possui relevância, por se tratar de uma prática docente.
O que tem acontecido comumente é que tanto os profissionais surdos
com licenciatura, quanto os profissionais surdos sem habilitação para
o magistério, estão sendo alocados nas redes de ensino como
Instrutores de Libras (FARIA, 2011, p. 93).
Segundo Faria (2011), atualmente, ainda há um desprestigio da prática docente
dos profissionais surdos com licenciatura tanto quanto profissionais surdos sem
habilitação para o magistério, pois mesmo os graduados são contratados como
instrutores.
Além do ensino de Libras, o profissional surdo com ou sem formação acadêmica
não deve só executar o ensino de Libras, mas participar também das atividades da
gestão escolar como construção do Projeto Político Pedagógico (PPP), discussão
pedagógica, conselho escolar, entre outros. Inclusive, o profissional deve garantir o
48
exercício de sua profissão com a formação inicial e continuada (FARIA, 2011). Assim,
o profissional tem seus deveres, responsabilidade específica da docência, atitudes éticas
e políticas. Portanto, a base de formação é a essência da docência voltada para ensino-
aprendizagem. Então, fica a pergunta: o trabalho do instrutor poderá ser semelhante à
função do professor? Se sim, qual o seu papel na educação básica?
Ao analisar a reportagem publicada na revista Nova Escola21
sobre a educação
de surdos e a formação do profissional surdo, Silveira e Rezende (2008) demonstram a
desvalorização do professor surdo no contexto escolar, muitas vezes alcunhados de
“Dicionário ambulante”, pelos ditos “professores especialistas”. Segundo as autoras, em
muitos casos, ele é considerado ajudante do professor. As autoras debatem a crítica aos
termos utilizados pelos professores mostrando a falta de reconhecimento e a
profissionalização do profissional surdo.
[...] a reportagem nos mostra o quão inferior o surdo se apresenta no
contexto profissional, já que no ambiente educacional foram
observadas várias distorções, na nossa avaliação. Historicamente,
fomos chamados para sermos o “dicionário ambulante” (de Libras) de
muitos professores na escola e, maior parte, os ditos “professores
especialistas”, como é o caso dos personagens consultados na
reportagem, apenas orientavam os alunos a trabalharem com o sinal
dado pelos surdos. Por que o surdo não pode desempenhar este
importante papel de professor e não de mero instrutor – palavra com
menor status profissional? Por que ele não pode explicar os conteúdos
curriculares, como já acontece em várias escolas? Nesse último caso,
os surdos já trabalharam com informações importantes apresentadas
pela disciplina e mesmo assim não foram considerados, agraciados
com o título de “professores” pelos docentes. Sempre os surdos foram
considerados tecnicamente como instrutores, mas na verdade, atuavam
como professores, apesar de poucos possuírem licenciatura
(SILVEIRA; REZENDE, 2008, p. 66-67).
Silveira (2008) utiliza a expressão "professor secundário" ao referir os
professores surdos, pois é essa sua posição, muitas vezes, dentro da escola. Na análise, a
pesquisadora vê a importância da adaptação do currículo dentro do ensino, que
necessariamente deve ser mudado, pois o currículo atual é pensado na lógica ouvinte. A
autora faz também reflexões sobre a importância das associações, dos surdos adultos
como modelos para os surdos alunos, da necessidade de aumentar o número de
professores surdos na escola para que não tenham o posicionamento como
“secundários”.
21
Revista Nova Escola é uma revista destinada a professores e voltada para área da educação.
49
Sintetizando os trabalhos analisados, destacamos algumas reflexões sobre a
formação e atuação do profissional surdo no contexto educacional: a) falta de
articulação teoria e prática educacional (ALBRES, 2014); b) fragilidade nas formações
gerais e formação pedagógica (MARTINS, 2010); c) falta de valorização do saber
docente em detrimento do saber científico (SILVEIRA E REZENDE, 2008); d) falta de
especificidade na formação do professor surdo como responsável pela aquisição e
desenvolvimento da língua de sinais pelos alunos (MACHADO, 2010); e) necessidade
de formação continuada e em serviço do docente surdo (SANTOS, 2007); f) escassez de
profissionais surdos para atuarem nas escolas (GURGEL, 2004); g) não valorização do
profissional surdo (FARIA, 2011).
Para o mapeamento de produções técnicas encontradas neste capítulo sobre a
temática do professor e instrutor surdo, esquematiza uma tabela resumida com os
levantamentos bibliográficos encontrados a seguir
ANO DE
PUBLICAÇÃO
AUTORES LOCAL
DE
PUBLICA
ÇÃO
ASSUNTO
ESPECÍFICO
MOMENTO
CRONOLÓGICO
1 1999 Comunidade
surda
Porto
Alegre (RS)
Proposta para
educação de
surdos
Documento
proposto pela
comunidade surda
no V Congresso
Latino Americano
de Educação
Bilíngue para
Surdos
2 2004 GURGEL, T. Piracicaba
(SP)
Papel do
instrutor surdo
Dissertação de
mestrado
3 2005 QUADROS,
R.M.
Rio de
Janeiro (RJ)
Formações
profissionais
no campo da
surdez
Anais publicado no
Congresso do INES
4 2007 SANTOS,
L.F.
Piracicaba
(SP)
Instrutor surdo
em uma escola
inclusiva
bilíngue
Dissertação de
mestrado
50
5 2007 MEC Brasília
(DF)
Formação
continuada
para
professores de
AEE
Cartilha
6 2008 SILVEIRA,
C.H;
REZENDE,
P.L.F.
Petrópolis
(RJ)
Educação de
Surdos
Livro publicado
pela Editora Arara
Azul
7 2008 SILVEIRA,
C.H.
Santa Cruz
do Sul (RS)
Visão sobre a
atuação do
professor
surdo
Artigo publicado
pela Revista do
Departamento de
Educação e do
Programa de Pós-
Graduação em
Educação da
UNISC
8 2010 MACHADO,
L.M.C.V.
Pelotas
(RS)
Formação de
professores
surdos
Artigo publicado
em revista
“Caderno da
Educação”
9 2010 MARTINS,
M.A.L.
Piracicaba
(SP)
Relação do
professor e
aluno surdo em
sala de aula
Dissertação de
mestrado
10 2011 FARIA, J. G. Marília (SP) Formação do
professor
surdo
Artigo publicado
pela Revista
Brasileira de
Educação Especial
11 2012 GIANINI, E. Natal (RN) Formação de
professores
surdos
Tese de doutorado
12 2014 ALBRES,
N.A.
São Carlos
(SP)
Formação de
professores
surdos
Tese de doutorado
Tabela 05 – Mapeamento de levantamento de produções técnicas
51
Esse levantamento bibliográfico demonstra que a profissionalização do docente
surdo constitui-se num fenômeno bastante recente, presente na última década.
Embora os dados analisados apresentem algumas limitações em relação aos
conceitos, como mostrado na descrição, quanto ao acesso aos mesmos, colocam-se
como uma importante fonte de dados a respeito do movimento histórico da formação do
docente surdo, na medida em que mapeiam a produção teórica sobre a temática. As
produções cientificas e publicações também revelam o investimento em direção a um
amadurecimento no campo teórico da constituição e formação do educador surdo.
Investigar esse movimento a fim de percebê-lo e compreendê-lo coloca-se como uma
nova necessidade no processo de construção de identidade docente, buscando uma
visibilidade e reconhecimento da profissão do docente surdo. O mapeamento e
sistematização das produções que marcam este caminho de construção do conhecimento
sobre a temática, também possibilitam conhecer o teor das produções já construídas e
abrir possibilidades para avançar em novas construções.
52
CAPÍTULO III
CONTRIBUIÇÕES TEÓRICAS PARA A REFLEXÃO SOBRE A
PROFISSÃO DO EDUCADOR SURDO
Nesse capítulo, busco traçar uma fundamentação teórica que dê sustentação para
as reflexões e análises do objeto dessa pesquisa. Dois autores são basilares nesse
trabalho: Vygotsky e Bakhtin, visto que a pesquisa aborda o profissional educador
surdo, cuja função primordial na escola é possibilitar a aquisição plena da língua pelos
alunos surdos.
Elenco as contribuições importantes de alguns autores sobre a importância do
profissional surdo em sala de aula: a) mediação entre professor e aluno surdo
(GESUELI, 2006); b) modelo bilíngue (SKLIAR, 1997); c) identidade (PERLIN, 1998);
d) cultura surda (STROBEL, 2008); e) relação dialógica (BAKHTIN, 1999); f)
identidade do professor surdo (REIS, 2007); g) semiótica imagética (CAMPELLO,
2007); h) experiências visuais (PERLIN; MIRANDA, 2003); i) subjetividade (LODI,
2005); j) interação e convivência entre crianças surdas e ouvintes (LACERDA, 2006).
Todos esses autores serão utilizados como pressupostos teóricos e também nas reflexões
sobre as observações realizadas em sala de aula com educadores surdos no capítulo seis.
Quando as crianças surdas são inseridas em um ambiente que não há interações
linguísticas em uma língua que lhes seja acessível (a língua de sinais) e ainda mais na
escola, onde a língua majoritariamente é língua portuguesa, como elas irão desenvolver
uma língua? Onde irão ocorrer as relações interativas? Em que meio social ocorrerá a
aquisição de conhecimentos? Estas questões são pertinentes, uma vez que “o
crescimento intelectual da criança depende de seu domínio dos meios sociais do
pensamento, isto é, da linguagem” (VYGOTSKY, 1998, p. 44). Qual a linguagem que
irá constituir o pensamento da criança se não há ambiente linguístico bilíngue ao seu
redor? Quais práticas dos educadores surdos permitem que a língua de sinais se
desenvolva nessas crianças? São questões que essa pesquisa busca responder ao analisar
a formação e as práticas dos docentes surdos.
Para o embasamento teórico sobre a formação docente, utilizei autores da área
da educação, tais como: Tardif (2010), Libâneo (2008), Saviani (1996), Perrenoud
(1997), Veiga Neto (2004) e outros autores que focalizam a importância do professor e
53
a formação do saber. Primeiramente, o processo da educação é de suma importância
para o desenvolvimento da criança para sua formação como cidadão.
Libâneo (2008) analisa que o perfil do profissional educador é daquele voltado
para a formação cultural
O trabalho docente constitui o exercício profissional do professor e
este é o primeiro compromisso com a sociedade. Sua responsabilidade
é preparar os alunos para se tornarem cidadãos ativos e participantes
na família, no trabalho, nas associações de classe, na vida cultural e
política. É uma atividade fundamentalmente social, porque contribui
para a formação cultural e científica do povo, tarefa indispensável
para outras conquistas democráticas. (LIBÂNEO, 2008, p. 47)
Em outras palavras, a formação do docente consiste no papel do professor
especialista em conhecimento cientifico, segundo Jalbut (2011), “O professor é
entendido como um especialista que aplica as regras do conhecimento científico às
situações idealizadas para a sala de aula” (JALBUT, 2011, p. 3).
No entanto, a formação vai além do conhecimento cientifico, como afirma o
autor Alves apud Veiga Neto (2005)
A formação do profissional da Educação é um processo denso e que
comporta diversos aspectos importantes, devendo ser fornecida ao
futuro professor uma sólida bagagem nos âmbitos científico, cultural,
social e pedagógico para sua atuação profissional (VEIGA-NETO,
2002 apud ALVES, 2005, p. 05).
Todavia, alguns autores utilizam, em outras palavras, o conceito de “saber”, que
define um profissional cuja função principal é educar crianças, jovens e adultos com
seus “saberes”. Cunha (2007) define que o saber é aquilo
Que orienta a atividade do professor insere-se na multiplicidade
própria do trabalho dos profissionais que atuam em diferentes
situações e que, portanto, precisam agir de forma diferenciada,
mobilizando diferentes teorias, metodologias, habilidades. (CUNHA,
2007, p. 1).
De acordo com Saviani (1996), o professor é aquele que educa, o qual precisa
também aprender, ser formado para ser educador, e usar os saberes implicados na ação
de educar. Seguindo a mesma lógica, o autor afirma que se invertem os termos da
questão: “em lugar de os saberes determinarem a formação do educador, é a educação
54
que determina os saberes que entram na formação do educador” (SAVIANI, 1996,
p.145). Isso contribui para que o professor precise estar sempre em reflexão, em
situação em sala de aula e fora dela, para que os tipos de saberes determinem uma visão
de mundo, uma concepção de educação, de ensino. Enquanto na sala de aula como
prática do docente, o professor é visto como "espaço de produção da competência
profissional pelos próprios professores" (TARDIF, 2002, p. 291). O trabalho de cada
professor, quanto coletivamente tanto individualmente, é o lugar em que se produzem
saberes adquiridos pela reflexão prática por meio das atividades cotidianas de ensino do
professor na escola. Continuando com as palavras daquele pesquisador, o trabalho dos
professores é "um espaço específico de produção, de transformação e de mobilização de
saberes, e, portanto, de teorias, de conhecimentos e de saber-fazer específicos ao ofício
de professor" (TARDID, 2002, p. 234).
Para compreender esse postulado, faz-se necessário esclarecer a formação do
profissional surdo, como deve ser o “saber” cientifico e qual o conhecimento especifico
da sua formação.
Na educação de crianças e jovens surdos, é de suma importância a presença
física do professor surdo em sala de aula. Com ele o aluno surdo não aprende só a
língua de sinais, mas também tem sua formação e subjetividade.
Além desse aspecto, o professor surdo tem domínio de metodologias a serem
utilizadas e adaptadas, o que impulsiona o interesse dos alunos quando o conteúdo
acadêmico é trabalhado por meio de estímulo visual. Na presença do professor surdo, o
ambiente linguístico se torna rico, o que permite que ele tenha melhor aproveitamento
no processo de ensino e aprendizagem. Portanto, o trabalho bilíngue deve ter qualidade,
o que produz a partir de uma formação adequada do professor. “A formação do
professor é um processo pedagógico, intencional e organizado de forma preparado
teórico cientifico e técnica do professor para dirigir a competência do seu processo de
ensino” (LIBÂNEO, 2008, p.27). Quanto às formas de educar o aluno surdo, é
necessário que o professor realize um conjunto de operações didáticas como
planejamento, direção de ensino, aprendizagem e a avaliação.
As crianças surdas que têm oportunidade de ter contatos com os profissionais
surdos em sala de aula, tem uma otimização na construção de conhecimento, uma vez
que a interação linguística favorece seu desenvolvimento, como afirma Vygotsky
(1998). Este profissional surdo faz a função de mediador, favorecendo a construção de
palavra, ou seja, o signo, que é o elemento mais importante do pensamento e da cultura
55
humana. Embora profissionais ouvintes fluentes em Libras possam também serem
medidores na aprendizagem e desenvolvimento das crianças surdas, a maioria desses
não tem a língua de sinais como sua língua natural, como é o caso de algumas pessoas
surdas.
Entrelaçando a formação do docente com a do profissional surdo, apresento a
seguir seis quadros com os dados de editais de concursos públicos e credenciamento
para o preenchimento de cargos para instrutor ou professor surdo. A análise desse
material se faz útil para a reflexão e discussão a respeito do cargo em que o profissional
surdo está inserido no mercado de trabalho. Nesse material, analiso também a relação
entre docência e a formação do profissional surdo.
Quadro 1 – Prefeitura Municipal de Barueri/SP
Fonte: Edital n. PMB 02/20, de 07 de outubro de 201122
.
22
Disponível: https://www.pciconcursos.com.br/concurso/prefeitura-de-barueri-sp-40-vagas
56
Quadro 2 – Prefeitura Municipal de Petrópolis/RJ
Fonte: Edital n. 001/2014, de 19 de dezembro de 201423
.
Quadro 3 – Prefeitura Municipal de Santo Ângelo/RS
Fonte: Edital n. 58/2010, de 07 de janeiro de 201024
.
Quadro 4 – Prefeitura Municipal de São Caetano do Sul/SP.
23
Disponível em: https://www.pciconcursos.com.br/noticias/prefeitura-de-petropolis-rj-retifica-concurso-
publico-para-a-area-da-educacao 24
Disponível em: https://www.pciconcursos.com.br/concurso/prefeitura-de-santo-angelo-rs-75-vagas
57
Fonte: Edital n. 001/2015, de 04 de março de 201625
.
Quadro 5 – Prefeitura Municipal de São Paulo/SP
Fonte: Edital de Credenciamento SME/Divisão de Educação Especial – DIEE n. 01/201626
.
Quadro 6 – Prefeitura Municipal de Vitória/ES.
25
Disponível em: https://arquivo.pciconcursos.com.br/prefeitura-de-sao-caetano-do-sul-sp-altera-edital-
do-concurso-com-mais-de-880 vagas/1341939/64a280e421/edital_de_abertura_n_001_2015.pdf
26
Disponível em:
https://www.imprensaoficial.com.br/DO/BuscaDO2001Documento_11_4.aspx?link=/2016/diario%2520o
ficial%2520cidade%2520de%2520sao%2520paulo/abril/27/pag_0076_894MDRIMLIU3GeDODVTENK
OG5CK.pdf&pagina=76&data=27/04/2016&caderno=Di%C3%A1rio%20Oficial%20Cidade%20de%20
S%C3%A3o%20Paulo&paginaordenacao=100076
58
Fonte: Edital n. 010/2016, de 06 de maio de 201627
.
Para uma comparação, apresentamos uma tabela resumida com os seis editais,
relacionando com o cargo e o requisito para a melhor leitura, e, em seguida, uma breve
discussão sobre estes dados:
Tabela 06: Editais
EDITAIS CARGO REQUISITO
Quadro 1 – Barueri/SP Instrutor
Ensino Médio com
magistério + curso de
formação de instrutor de
Libras ou Ensino Médio +
curso de formação na área
ou Ensino Superior com
graduação de Pedagogia ou
licenciatura;
Quadro 2 – Petrópolis/RJ Instrutor
Ensino Superior +
Prolibras + Curso de
formação de instrutor de
Libras ou assistente
27
Disponível em: https://arquivo.pciconcursos.com.br/prefeitura-de-vitoria-es-anuncia-tres-processos-
seletivos/1355924/1157023f00/edital_de_abertura_n_10_2016.pdf
59
educacional de Libras;
Quadro 3 – Santo Ângelo/RS Instrutor
Ensino Superior na área
da educação + Prolibras;
Quadro 4 – São Caetano do Sul/SP Instrutor
Ensino Superior + Curso
específico na área;
Quadro 5 – São Paulo/SP Instrutor (prioritariamente
surdo)
Ensino Médio ou Ensino
Superior + Prolibras ou
Curso de pós-graduação em
Libras
Quadro 6 – Vitória/ES Instrutor e Professor
(comprovadamente surdo);
Instrutor: Ensino Médio +
Prolibras ou curso de
formação de instrutores
surdos;
Professor:Ensino Superior
+ Prolibras ou curso de
formação de instrutores de
Libras
Fonte: Elaborada pela pesquisadora
Em relação aos dados apresentados, percebe-se que os editais revelam um
problema na definição do profissional. Esse problema revela-se pela ambiguidade na
linguagem, o que tem uma relevância considerável. Os editais 1, 2, 3, 4 e 5 discriminam
as vagas para “instrutor”. Observando os requisitos verificamos que os editais 1 e 5
exigem a formação em ensino médio e/ou superior. Os editais 2, 3 e 4 definem como
requisito apenas o ensino superior. A questão
de requisito dos editais gera certa polêmica. Como podem definir que a vaga é
para instrutor e exigem ensino superior? Além disso, podemos também fazer uma
discussão sobre “não definição” da condição auditiva do candidato. Observa-se que os
editais de Barueri/SP, de Petrópolis/RJ, de Santo Ângelo/RS e de São Caetano do
Sul/SP não oferecem a vaga para o candidato surdo. Isso significa que uma pessoa
ouvinte pode concorrer à vaga de instrutor juntamente com os surdos. Esses editais não
60
dão prioridade às pessoas surdas como previsto no Decreto n° 5.626 de 2005, como já
explicado no capítulo anterior. Observa-se que deste decreto estabelece a prioridade de
formação para pessoas surdas, porém dos seis editais, quatro deles não mencionam a
prioridade à pessoa surda para a contratação no mercado de trabalho, mesmo que o
surdo tenha formação na área específica.
Enquanto esses editais não destinam a vaga para pessoas surdas, o edital de São
Paulo/SP e de Vitória/ES definem que a vaga é prioritariamente para candidatos surdos
no cargo de instrutor e professor respeitando o espaço de mercado de trabalho para estes
sujeitos. A diferença é que o de São Paulo destina o cargo de instrutor e o de Vitória são
cargos diferentes e separados para a formação especifica. Chamo a atenção que apenas o
edital de Vitória define o cargo de professor surdo, embora outros editais exijam o curso
superior. Sobre essa desqualificação do profissional surdo, Fernandes (2006) comenta
Ironicamente, alguns dos objetivos e pressupostos de “Milão”
sobrevivem no espaço escolar, travestidos em uma nova “roupagem”:
[...] os surdos adultos são convocados a colaborar no processo
educacional, desde que sejam apenas instrutores de Libras, ainda que
tenham formação para atuar como professores (FERNANDES, 2006,
p. 4).
Comparando os seis editais, é visível a violação ao decreto, com exceção de São
Paulo e Vitória, quando a formação mínima exigida para instrutor é a de ensino médio.
Se a formação mínima exigida é a de nível superior para o cargo de professor surdo, por
que não respeitá-la? Qual a intenção dos editais que colocam o requisito de formação
em nível superior para o cargo de instrutor? Não há perspectiva do mercado e mesmo
das instituições de ensino de haver profissionais surdos com ensino superior? Há uma
questão ideológica em relação aos surdos no contexto ouvinte? Nessa perspectiva,
trabalharei com o conceito de ideologia na concepção bakhtiniana, sobretudo a
ideologia do cotidiano. A ideologia é caracterizada como a expressão, a organização e a
regulação das relações histórico-materiais dos homens, portanto, pode ser vista como
uma representação, assim como ele afirma que “tudo que é ideológico possui um
significado e remete a algo situado fora de si mesmo” (BAKHTIN, 1999, p 31). O autor
finaliza com a explicação de que a ideologia ocorre por um grupo organizado, assim “a
ideologia não pode derivar da consciência, como pretendem o idealismo e o positivismo
psicologista, pois a consciência adquire forma e existência nos signos criados por um
grupo organizado no curso de suas relações sociais (BAKHTIN, 1999, p.35)”.
61
Como afirma Bakhtin (1999), a ideologia tem “dupla face”, que reflete uma
coisa, mas refrata outra por meio de signo, que é visto como um todo produto
ideológico, ele não existe como uma parte da realidade.
De acordo com esse autor, todo signo é ideológico. Ele apresenta exemplo: o pão
é um produto de consumo, mas pode também ser transformado em um signo ideológico
quando ele é usado para representar o corpo de Cristo em cerimônias religiosas, por
exemplo. Outro exemplo também é enfatizado por Miotello (2008) descrevendo o
casamento.
Como exemplo do que aqui se está discutindo, penso na luta
ideológica que vem se dando na sociedade brasileira para estabilizar o
sentindo de “casamento”. Basta olhar para as múltiplas composições
familiares, para os vários tipos possíveis de casamentos, para as
discussões sem fim em torno do “casamento de pessoas do mesmo
sexo” para entender que estamos diante de uma luta declarada de
sentidos; a ideologia oficial buscando construir um sentido
relativamente estável para “casamento” (união entre duas pessoas de
sexo diferente), enquanto os estratos inferiores da ideologia produzem
uma multidão de sentidos e de realidade (MIOTELLO, 2008, p. 174).
No entanto, pode-se dizer que, no caso dos editais, está por detrás uma ideologia
oralista e ouvinte quando se abre a possibilidade e, de certa forma, se protagoniza para o
ensino de Libras um candidato ouvinte e transparece a rara presença de um candidato
surdo.
Nesse caso, o edital com suas especificidades define que o candidato somente
poderá assumir o posto se for aprovado no concurso público (ou na seleção, no caso do
credenciamento) se ele atender a todos os requisitos estabelecidos no documento. No
entanto, não se respeita as vagas para candidatos surdos, sendo que de seis quadros,
apenas dois preveem a prioridade para candidato surdo, como determina o Decreto n°.
5.626 de 2005. O quadro 6 - edital de Vitória/ES - segue as normas do decreto dentro do
quadro exigido pelo edital, assim cumprindo legalmente a formação própria e específica
para a docência, o que caracteriza um aspecto positivo em questão de respeito e
legalidade para o espaço da pessoa surda, o que é valorizado e reforçado pela demanda
de atuação dos docentes na educação básica.
Outro aspecto relevante para a discussão é a respeito da docência da disciplina
de Libras em ensino superior. O sétimo artigo do Decreto n° 5.626 de 2005 estabelece
três perfis de profissionais para ministrar a disciplina de Libras nos dez anos seguintes à
sua promulgação.
62
Art. 7o Nos próximos dez anos, a partir da publicação deste Decreto,
caso não haja docente com título de pós-graduação ou de graduação
em Libras para o ensino dessa disciplina em cursos de educação
superior, ela poderá ser ministrada por profissionais que apresentem
pelo menos um dos seguintes perfis: I - professor de Libras, usuário
dessa língua com curso de pós-graduação ou com formação superior e
certificado de proficiência em Libras, obtido por meio de exame
promovido pelo Ministério da Educação; II - instrutor de Libras,
usuário dessa língua com formação de nível médio e com certificado
obtido por meio de exame de proficiência em Libras, promovido pelo
Ministério da Educação; III - professor ouvinte bilíngue: Libras -
Língua Portuguesa, com pós-graduação ou formação superior e com
certificado obtido por meio de exame de proficiência em Libras,
promovido pelo Ministério da Educação. § 1o Nos casos previstos nos
incisos I e II, as pessoas surdas terão prioridade para ministrar a
disciplina de Libras (BRASIL, 2005).
Este artigo menciona os três profissionais que podem ministrar o ensino de
Libras em cursos de educação superior durante dez anos após a publicação. Neste
decreto, há esclarecimento de que a formação de instrutor e de professor tem diferença
em relação ao nível de ensino, sendo médio para o instrutor e superior para o professor.
Outra observação importante que chama atenção é um dos perfis profissionais para
ministrar a disciplina de Libras no ensino superior: a de instrutor surdo com formação
em nível médio. O decreto não descreve os perfis profissionais para a educação básica,
sendo que só tem o artigo sobre a formação para ministrar a Libras e não o perfil como
deveria ser colocado neste decreto, assim como o perfil para ensino superior. O instrutor
que for contratado para dar aula em ensino superior será nomeado como instrutor? Isso
parece muito incoerente, uma vez que no ensino superior, os docentes são denominados
de professores.
Contextualizando o cenário atual da educação de surdos com os editais e o
decreto, destaco nas palavras de Maher (2007), pesquisadora da área de línguas
minoritárias como língua indígena, língua de fronteira, de imigrantes, língua de sinais e
outros. A autora ressalta a importância do planejamento de programas voltados para as
especificidades linguístico-culturais de grupos minoritários:
[...] não basta as minorias brasileiras [...] terem consciência de seus
direitos para que o cenário de opressão linguístico-cultural em que
vivem seja, na prática, no varejo, no cotidiano, modificado. Daí o meu
desconforto com o modo como o termo empoderamento vem sendo,
em muitas situações, utilizado. Creio que os termos politização ou
fortalecimento político dos grupos sociais destituídos de poder
traduzem melhor o que buscamos com nossas pesquisas e ações
63
educativas. Porque o empoderamento de grupos minoritários é,
parece-me, decorrência de três cursos de ação: (1) de sua politização;
(2) do estabelecimento de legislações a eles favoráveis; e (3) da
educação do seu entorno para o respeito à diferença. A politização é
apenas um dos alicerces – um alicerce absolutamente necessário, mas
não suficiente –, quando se pensa a arquitetura de projetos
emancipatórios para eles voltados. Sem que o entorno aprenda a
respeitar e a conviver com diferentes manifestações linguísticas e
culturais, mesmo que fortalecidos politicamente e amparados
legalmente, estou convencida de que os grupos que estão à margem do
mainstream não conseguirão exercer, de forma plena, sua cidadania
(MAHER, 2007, p. 257).
A autora destaca as três principais ações necessárias que ocorrem em certos
grupos minoritários que necessitam de ação coletiva para a restauração do problema
educacional brasileiro: I – Politização: necessita de grupos de debates, movimentos
políticos e sociais, associações de surdos, entre outros, que possam discutir a
importância do professor surdo escolas de surdos enfatizando o processo de ensino e
aprendizagem do aluno surdo de forma e ter a comunicação “plena” entre docente e
estudantes; II – Estabelecimento de legislações: necessita urgentemente de
reestruturação do Decreto n° 5.626 de 2005, visto que sua criação, que se deu há mais
de dez anos, se deu em um momento em que ainda havia poucos surdos formados. Essa
reestruturação deveria rever principalmente os aspectos referentes à formação e à
docência. Em outras palavras, se na atualidade existem vários surdos formados em
cursos de graduação e pós-graduação na área de Libras, por que as mudanças nas
formas de contratação dos surdos caminham vagarosamente? Ou seja, o que justifica a
permanência do cargo de “instrutor” para ministrar a disciplina de Libras no ensino
superior?; III – Educação do entorno: trata-se da necessidade de uma efetiva mudança
no ensino para surdos, o respeito à profissão do professor surdo e a inclusão da
disciplina de Libras na grade curricular para garantir o “fortalecimento”,
reconhecimento e respeito às pessoas surdas.
O sétimo artigo daquele decreto enfatiza o perfil de profissional para ministrar o
ensino superior. Há uma contradição quando este artigo diz que o instrutor pode
ministrar a aula no ensino superior mesmo tendo a formação em nível médio com o
certificado obtido por meio de exame de proficiência em Libras, o Prolibras. O instrutor
surdo tem competência para ministrar o curso de Libras nas instituições de ensino
superior? Teria um profissional de ensino médio, o conhecimento básico e didático para
ministrar aulas em cursos de graduação ou pós-graduação? Enquanto isso, as crianças
64
surdas nas escolas de surdos sofrem com a ausência do profissional surdo, sendo que a
maioria são professores ouvintes. É importante que a criança surda tenha contato com o
professor surdo. É preocupante a situação de uma criança surda inserida em uma escola
onde não há professor bilíngue, professor surdo, intérprete de Libras e não tem sua
língua compartilhada com seus colegas e professores (BOTELHO, 1998; LACERDA,
1999). Nesse ambiente a língua dominante é o português. As crianças ouvintes se
comunicam espontaneamente, a criança não aprende a sua língua. Além disso, as
“crianças surdas, de pais ouvintes, chegam à escola sem uma língua, cabe aos
profissionais lhes propiciar a aquisição da língua brasileira de sinais” (PEREIRA, 2011,
p.2). Como esses sujeitos podem se constituir enquanto sujeito, ou seja, desenvolver sua
subjetividade no período de aquisição da linguagem sem ter uma interação em uma
língua compreensível?
Bakhtin (1999) ressalta que o dialogismo está na relação entre os sujeitos, pois o
sujeito se constrói com os outros, então o dialogismo é um conceito relacional que
pressupõe que a linguagem sempre coloca sujeitos e sentidos em relação, não havendo,
portanto, linguagem sem interação. De acordo com ele, a linguagem é dialógica, sendo a
teoria da linguagem a base de sua concepção humana, portanto a linguagem sempre é
social.
Reis (2007) descreve os conceitos de identificação e modelo na questão do
professor surdo na sala de aula, no qual enfatiza a importância desse profissional surdo
em contato com o aluno surdo. A autora também destaca o papel do professor ouvinte
no processo educacional do aluno surdo, mas alerta para a necessidade da presença
física do professor surdo para que o aluno surdo construa os seus valores como sujeito
surdo.
Remete à importância de que os alunos surdos devam ser vistos não
como tradicionais e dependentes dos outros professores ouvintes, se
bem que estes professores ouvintes também são agentes do processo,
tendo em vista o processo de interação. Mas é importante na formação
dos professores surdos que busquem as inovações e possibilitem
efetivar uma transgressão pedagógica, para que atinjam o seu desejo e
a sua singularidade de ensinar. O seu próprio pensamento deve ser
manifestado, para professores surdos ocorrer uma auto identificação
como professor surdo, valorizando a sua construção histórica dos
valores culturais. É necessário esclarecer a importância da prática dos
professores surdos vivenciada e surgida dentro do povo surdo. Ser
diferente significa produzir a partir da história, do conhecimento
próprio, e compartilhado uns com os outros com o objetivo de ter mais
experiência dessa prática pedagógica. Nesse processo identificatório
65
cultural prosseguem as inovações, as transgressões vão ocorrendo,
buscando, fazendo acontecer as múltiplas experiências de que é o seu
próprio fazer pedagógico. (REIS, 2007, p. 96).
A construção da imagem do professor surdo e ouvinte na relação com o aluno
surdo constitui uma condição de sentido como um todo. A dialogia é o princípio
constitutivo da linguagem.
Vale ressaltar que o Decreto n° 5.626 de 2005 também dispõe sobre a formação
do tradutor e intérprete de Libras/língua portuguesa; e o direito dos surdos de ter acesso
às informações em Libras e à educação bilíngue” (LACERDA; ALBRES; DRAGO,
2013, p. 03). Enquanto a política educacional insiste na educação inclusiva, muitas
crianças estão sem direito de ter acesso à sua língua, o direito linguístico. Muitas
escolas ainda não têm uma estrutura de ensino bilíngue. Muitos professores ouvintes
não sabem Libras, ainda não há intérpretes e muito menos a presença do professor surdo
na sala de aula. Se há intérpretes inseridos em sala de aula, a criança está inserida em
um ambiente em que não há trocas entre seus pares, com pouco acesso à língua que
possibilite uma real aquisição da linguagem.
Nascimento e Souza (2016), a partir dos estudos vygotskyiano, ressaltam e
indicam a necessidade da educação bilíngue de surdos
Se levarmos à radicalidade as ideias de Vygotsky sobre a íntima
implicação entre língua e comunidade, entre sociedade, cultura e
existência humana, certamente, a demanda dos surdos receberia do
psicólogo russo completo apoio e ele seria, quem sabe, um dos
fervorosos defensores da principal demanda dos surdos: a expansão e
a consolidação da Educação Bilíngue de/para Surdos. Talvez por isto,
Vygotsky inspire pesquisadores que, apoiando-se nele, produzem
pesquisas e participam de ações para que a educação bilíngue saia do
reino das leis e se consolide, materialmente, em escolas públicas e de
qualidade em todo o território brasileiro (NASCIMENTO; SOUZA,
2016, p. 119).
Finalizo este capítulo com uma apresentação de uma tirinha para suscitar a
reflexão e discussão acerca da formação do profissional surdo. Até este momento,
descrevi a trajetória de minha vivência com a instrutora surda, a base de formação
docente, a falta de profissionais de Libras (professor bilíngue, intérprete, professor
surdo), a análise e discussão dos editais de concurso para cargo de professor e instrutor.
66
Figura 01: Tirinha de Carlos Ruas
Esta tirinha foi elaborada pelo ilustrador Carlos Ruas28
em homenagem ao dia do
professor. Pode se observar que a criança recebe um balãozinho colorido de cada
professor.
No entanto, podemos fazer uma reflexão sobre os conceitos de dialogismo e de
polifonia utilizados por Bakhtin (1981). A dialogia é entendida como um todo discurso
que ocorre na interação entre os sujeitos. Já a polifonia remete aos muitos sons, as
diferentes vozes que formam o discurso de cada ser humano.
Segundo a teoria do dialogismo bakhtiniano, todo discurso é constitutivamente
polifônico e se caracteriza por um jogo de vozes, de discursos, num permanente diálogo.
Bakhtin considera o dialogismo o princípio constitutivo da linguagem que é, para ele,
por constituição, dialógica, num cruzamento constante de discursos.
Enquanto as escolas brasileiras falham na educação dos alunos surdos, há
pesquisadores e profissionais que precisam ser vistos e ouvidos (polifonia), o que
28
Fonte: http://www.umsabadoqualquer.com/obrigado-professor/
67
contribuem com suas produções na qualidade de Educação Bilíngue, nos Estudos
Surdos e na questão da identidade.
A política educacional voltada para a área de educação de surdo deve levar em
consideração a formação do profissional surdo, pois esta permite a interação ativa entre
professor e alunos surdos, o que abre horizontes para novos conhecimentos, habilidades,
atitudes, convicções, a pesquisa, a vida acadêmica e as lutas pela cidadania dos surdos
na sociedade.
68
CAPÍTULO IV
MÉTODO DE PESQUISA
Minayo (1994) define que a pesquisa é de suma importância como uma
ferramenta fundamental no sentido de pensar a realidade. O debate em torno da pesquisa
está longe de ser homogêneo, pois envolve realidades sociais, circunstâncias cotidianas
e ideologias distintas. No entanto, segundo a autora, a pesquisa
[...] é a atividade básica da Ciência na sua indagação e construção da
realidade. É a pesquisa que alimenta a atividade de ensino e a atualiza
frente à realidade do mundo. Portanto, embora seja uma prática
teórica, a pesquisa vincula pensamento e ação. Ou seja, nada pode ser
intelectualmente um problema, se não tiver sido, em primeiro lugar,
um problema da vida prática. (MINAYO, 1994, p. 17).
O objetivo geral dessa pesquisa é compreender o perfil do profissional surdo e a
sua função no ambiente educacional, observando sua formação técnica pedagógica e
refletir sobre sua atuação na formação dos alunos surdos.
A partir desse objetivo geral, delinearam os objetivos específicos, a saber:
Descrever o perfil de profissionais surdos que atuam ou atuaram na
esfera educacional, buscando compreender suas percepções sobre suas próprias
práticas pedagógicas;
Identificar a função do profissional surdo;
Verificar como se inserem os profissionais surdos no sistema educacional
a partir das denominações instrutor e professor;
Descrever a metodologia utilizada, a didática, o comprometimento com o
ensino, uso de materiais adaptados e o conhecimento do docente surdo em
situações de ensino;
Analisar como a formação dos sujeitos participantes interfere na sua
prática docente.
A fim de atender a esses objetivos, foram definidos dois corpora de pesquisa, na
busca de se caracterizar os modos de compreensão da função do professor surdo dentro
da educação bilíngue. O primeiro corpus foi constituído por um questionário com 26
69
perguntas. O segundo corpus foi obtido a partir de uma pesquisa de cunho descritivo
com método observação interpretativista dos profissionais em sala de aula. Minayo e
Sanches (1993) descrevem sobre o método quali-quantitativo:
A relação entre quantitativo e qualitativo (...) não pode ser pensada
como oposição contraditória (...) é de se desejar que as relações
sociais possam ser analisadas em seus aspectos mais "concretos" e
aprofundadas em seus significados mais essenciais. Assim, o estudo
quantitativo pode gerar questões para serem aprofundadas
qualitativamente e vice-versa (MINAYO; SANCHES, 1993, p. 247).
Para a construção do questionário, de acordo com Aaker (2001), não existe
procedimentos exatos que garantam que seus objetivos de mediação sejam alcançados
com bons resultados. Conforme experiência de cada participante, podem ocorrer
respostas ambíguas. No entanto, o trabalho do pesquisador para desenvolver o
questionário passa por algumas etapas: a) planejar e formular as perguntas para obter as
informações necessárias; b) definir a quantidade das perguntas; c) testar o questionário;
d) corrigir o problema e fazer o pré-teste. Essas etapas compuseram uma parte do
trabalho dessa pesquisa.
A escolha do formato das respostas foi feita com perguntas abertas em que os
participantes puderam responder de forma livre com suas próprias palavras sem ter um
limite de escolha entre um rol de alternativas e também perguntas fechadas, ou seja, de
múltipla escolha em que os participantes optavam por uma das alternativas ou por
determinado número permitido de opções. A questão da amostragem das respostas do
questionário é importante para obter conjunto de respostas com amostra válida para
atingir o objetivo.
Com o caráter quantitativo da pesquisa, temos as traduções em números dos
resultados das opiniões dos participantes. O questionário viabiliza a exatidão no
conhecimento do perfil e o papel do profissional surdo entre os participantes. Já o
método qualitativo foi útil e necessário para identificar e descrever os perfis e papel dos
profissionais surdos no ambiente educacional em quatro escolas do Estado de São Paulo
de diferentes tipos de ensino (público, privado). Essas observações possibilitaram
verificar as interações que se estabelecem no ambiente escolar, permitindo compreender
as funções dos profissionais e as formas de atuação. Ou seja, a pesquisa qualitativa
interpretativista permitiu compreender de maneira mais aprofundada como as
estratégias e condições pedagógicas destes profissionais interferem em seu cotidiano e
70
em sua percepção no ato de ensinar. Por isso, foi também importante refletir sobre as
diferenças nas formas de atuação desses profissionais em cada instituição de ensino.
O questionário foi desenvolvido no programa Lime Survey29
por meio da
internet, com temáticas sobre a atuação do educador surdo. O sistema on-line foi
desenvolvido junto com o Departamento de Informática da Faculdade de Educação da
UNICAMP. Os participantes foram convidados por meio de redes sociais, WhatsApp, e-
mail e a partir de contatos da própria pesquisadora. Os sujeitos que responderam ao
questionário foram trinta participantes, todos são surdos, com idade entre 25 e 58 anos e
são residentes nos diversos Estados do Brasil. O critério de participação do questionário
foi: a) ser surdo; b) atuar ou já ter atuado como docente no ensino de Libras e/ou outras
disciplinas.
Para a realização da pesquisa do questionário, foram formuladas vinte e seis
perguntas dividindo em quatro blocos para a categorização das perguntas: 1) Perfil do
participante; 2) Formação escolar e acadêmica; 3) Experiência profissional; 4) Visão
sobre atuação profissional. O último bloco consiste em perguntas abertas com objetivo
de cada participante relatar suas opiniões e experiências profissionais. O questionário
contém 16 questões fechadas para posterior análise quantitativa e 10 abertas para
posterior análise qualitativa e quantitativa. Uma vez que o participante aceitasse
participar da pesquisa, deveria assentir sua participação entrando em acordo por um
termo de consentimento feito pelo próprio link. Assim que ele concordava em
responder, seguiam as perguntas. Com vinte e seis perguntas, para a análise e discussão
do questionário, foram selecionadas as catorze seguintes perguntas mais relevantes,
sendo nove perguntas fechadas e seis abertas:
29
Segue o link do programa Lime Survey: https://www.limesurvey.org/
71
1) Idade; 2) Em que Estado do Brasil você mora; 3) Com quantos anos começou
aprender a Libras; 4) Onde aprendeu a Libras; 5) Onde estudou na educação básica; 6)
Tem formação de graduação; 7) Nas instituições em que você trabalha ou trabalhou,
você era contratado como; 8) Qual a sua formação em nível superior; 9) Porque você
escolheu a profissão; 10) Pelo fato de você ser surdo, a escolha da sua profissão foi por
causa da facilidade da vaga no mercado de trabalho; 11) Você acredita que a profissão
de professor é a que mais “valoriza” e respeita para pessoa surda no mercado de
trabalho; 12) Ao longo da experiência profissional, o que você sente falta e precisa para
melhorar a proposta educativa bilíngue dentro da escola; 13) Para você, qual a
diferença entre professor e instrutor; 14) Você já foi contratado como instrutor, mesmo
depois de ter concluído sua formação como professor? Como você se sentiu?
Quadro 07: Perguntas relevantes para análise do questionário
As respostas foram armazenadas em Excel, procedimento orientado pelo técnico
de informática da Faculdade da Educação (FE), o que deu formato para a análise e
discussão referente às questões.
Os sujeitos participantes da pesquisa da observação em sala de aula foram
escolhidos de acordo com os seguintes critérios: a) atuar em sala de aula na educação
básica; b) atuar com alunos surdos, podendo também atuar com alunos ouvintes c) ser
docente da disciplina de Libras ou outras do currículo escolar. São oitos sujeitos
participantes em três escolas no Estado de São Paulo.
Todos os participantes tanto do questionário quanto da observação assinaram o
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) solicitado pelo Comitê de Ética
em Pesquisa em Seres Humanos, aprovado com o CAAE: 57649416.1.0000.5404
Com o intuito de não identificar os sujeitos da pesquisa, os nomes são fictícios,
assim como os nomes das escolas.
Para a investigação da pesquisa em observação, foram selecionadas três escolas
que foram visitadas e observadas pela pesquisadora em local previamente agendado. A
observação em sala de aula foi realizada por dois dias em cada escola, a fim de observar
os participantes durante diferentes atividades escolares. A seguir, apresento um quadro
com descrição dos locais da pesquisa de observação:
Escola Local Tipo de instituição Quantidade e cargo
de profissionais
Disciplina que o
profissional
72
surdos ministra
Cravo São Paulo/SP Escola Bilíngue
Municipal
Um instrutor e um
professor
Libras e
Matemática.
Tulipa São Paulo/SP Escola Polo
Municipal
Dois instrutores Suporte do
professor bilíngue
em todas as
disciplinas
curriculares e
ensino de Libras
Girassol São Paulo/SP Particular Cinco professores Libras, Artes,
Contação de
história, Jardim I.
Tabela 07: Descrição dos locais da pesquisa de observação
O propósito da pesquisa em sala de aula era observar o profissional surdo,
analisando aspectos da metodologia utilizada por ele e sua didática, o comprometimento
com o ensino, o uso de materiais adaptados, o conhecimento, a interação e relação com
os envolvidos no ambiente escolar.
Quanto ao procedimento desta pesquisa para o registro dos dados foi utilizado
anotações no diário de campo, o que possibilitou a análise do processo da observação.
Para o questionário, foi feito pelo programa Lime Survey disponibilizado de forma
direta, sem interferência da pesquisadora. Os dados quantitativos foram analisados
estatisticamente e apresentados em gráficos e posteriormente análise e discussão.
A análise e discussão do questionário e da observação encontram-se nos
próximos capítulos, respectivamente, cinco e seis. A análise do questionário foi feita a
partir da quantificação de respostas dos participantes, sendo que alguns cruzamentos de
dados foram realizados para produzir uma discussão sobre os mesmos. Para melhor
visibilidade dos achados as respostas foram apresentadas em gráficos. Já os dados das
observações foram analisados seguindo os critérios citados anteriormente.
73
CAPÍTULO V
ANÁLISE DOS QUESTIONÁRIOS:
O QUE DIZEM OS EDUCADORES SURDOS SOBRE SUA
FORMAÇÃO E ATUAÇÃO
Este capítulo traz os resultados e as discussões a partir das respostas dos trinta
sujeitos que participaram do questionário no modelo Survey. Como descrito no capítulo
anterior, participaram dessa etapa da pesquisa educadores surdos convidados pela
pesquisadora pessoalmente e por meio de redes sociais, e-mail ou WhatsApp. De acordo
com Gil (1999), Survey pode ser entendido como uma pesquisa que tem o objetivo de
investigar a
Interrogação direta das pessoas, cujo comportamento se deseja
conhecer. Solicita-se informações a um grupo significativo de
pessoas acerca do problema estudado para, em seguida,
mediante análise quantitativa, obter as conclusões
correspondentes dos dados coletados (GIL, 1999, p.70).
A nomenclatura Survey vem da palavra inglesa traduzida como levantamento de
dados, e também pode ser considerada como um "método para coletar informação de
pessoas acerca de suas ideias, sentimentos, planos, crenças, bem como origem social,
educacional e financeira" (FINK e KOSECOFF, 1985, p. 13).
As principais características da pesquisa Survey de acordo com Pinsonneault e
Kraemer (1993) são:
a) descrição quantitativa de aspectos da população e informações padronizadas
sobre os objetos de estudo, sejam eles indivíduos, grupos, organizações, comunidades,
projetos, aplicações ou sistemas;
b) coleta de informações por meio de perguntas estruturadas e pré-definidas;
c) a informação é normalmente coletada sobre uma amostra da população;
As respostas foram registradas pelo sistema informatizado e depois analisadas
para essa pesquisa. As perguntas fechadas e algumas das abertas foram apresentadas em
forma de gráfico, a fim de proporcionar uma melhor visualização dos dados. As duas
últimas questões não são apresentadas em gráfico, uma vez que trazem respostas
subjetivas, com grande diversidade de opiniões, o que impossibilitou a categorização
74
das mesmas. Estas são discutidas a partir dos próprios enunciados. Iniciamos o primeiro
bloco de respostas analisando o perfil dos participantes:
Gráfico 01: Idade dos participantes
Fonte: Dados coletados pela pesquisadora
A maioria dos respondentes é jovem, com menos de 40 anos, perfazendo
86,6% do total. Esse fato reflete a inserção recente desse profissional – o educador
surdo – no mercado de trabalho da área educacional. Se levarmos em conta o tempo de
promulgação do Decreto n° 5.626 de 2005, que ocorreu há dez anos, percebe-se que
houve um significativo aumento de pessoas surdas que se interessaram pela formação na
área educacional desde então.
Segundo dados do INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais
Anísio Teixeira) de 2013, o número de surdos que se matricularam no ensino superior
nos últimos 10 anos vem aumentando consideravelmente, como é possível visualizar no
gráfico a seguir:
25 a 30 31 a 35 36 a 40 41 a 45 46 a 50 51 a 55 56 a 60
7
10
9
2
1
0
1
Idade dos participantes - Total: 30
75
Gráfico 02. Alunos matriculados na Educação Superior com surdez, deficiência
auditiva e pessoas com deficiência no Brasil (2003-2013)
Fonte: MEC/INEP (2013).
O dado acima do INEP não se restringe a estudantes matriculados na área
educacional (Pedagogia e Licenciaturas), mas ao ensino superior de modo geral (todos
os cursos de graduação). O aumento geral de matrículas também é um reflexo do
Decreto n° 5.626 de 2005, uma vez que este obriga a presença de intérpretes no
processo educacional de alunos surdos, o que tem possibilitado seu acesso e
permanência no ensino superior.
Diante dos números apresentados pelo Censo de Educação Superior
de 2003 a 2013, é possível notar que houve um expressivo
crescimento do acesso da população com deficiência a esse nível de
ensino (século XX), porém, ainda é incipiente quando comparado com
o total de matrículas existentes. A matrícula de surdos e deficientes
auditivos também trilhou nessa linha de crescimento exponencial, e,
apesar de timidamente, avançou percentualmente mais que o total
geral de matrículas e de pessoas com outras deficiências (ROCHA,
2015, p. 29).
Outra inferência que podemos fazer sobre a faixa etária preponderante entre os
participantes é de que por terem sido convidados pela pesquisadora, a maioria deles faz
parte do grupo de contato ou convivência da mesma, tendo, portanto, uma idade
semelhante. O mesmo fato pode explicar a predominância de sujeitos residentes no
Estado de São Paulo (43%), local onde reside a pesquisadora. Esse dado pode ser
visualizado no gráfico a seguir:
76
Gráfico 03: Estado em que residem os participantes
Fonte: Dados coletados pela pesquisadora
Ainda no bloco de questões sobre o perfil, foi questionado aos participantes, em
que idade aprenderam Libras.
Gráfico 04: Idade em que aprendeu Libras
Fonte: Dados coletados pela pesquisadora
O gráfico revela um importante dado: dos participantes da pesquisa, 63%
aprenderam Libras na infância, até os 9 anos. Diversos pesquisadores (SACKS, 2010;
MG PE PR RJ RS SC SP
6
1 3
1
4 2
13
Estado de residência Total: 30
1 a 3 4 a 6 7 a 9 10 a 12 13 a 15 16 a 18 Acima de19
8
6
5
0
3 3
5
Idade em que aprendeu Libras - Total: 30
77
SKLIAR, 1997; MOURA, 2000; LODI e LACERDA, 2009; SOUZA, 1998;
QUADROS, 1997; entre outros) têm apontado a importância da aquisição da Libras o
mais cedo possível pela criança surda, uma vez que é a língua que pode possibilitar o
desenvolvimento social e cognitivo da criança.
Num contexto de interlocução favorável, a criança descobre a palavra
e vai percebendo a linguagem como um processo dinâmico, pleno de
múltiplos sentidos e significados. Assim, muito nova a criança ouvinte
é colocada na “ordem do discurso”. O interlocutor adulto colabora
para que a linguagem da criança flua e lhe permita atitudes discursivas
que a levem a aprender a identificar aspectos importantes da língua
que ela irá se apropriar. Contudo, os surdos, em geral, têm pouca
oportunidade para este aprendizado, já que, na maioria das vezes, não
têm acesso à língua utilizada por seus pais (ouvintes), e têm seu
contato com a língua de sinais, em geral, bastante postergado. Assim
sendo, a criança surda vai interagindo, no decorrer de sua infância,
com inúmeras pessoas, buscando diferentes modos de comunicação.
Ela se comunica basicamente com ouvintes, porém, mais cedo ou mais
tarde, acaba surgindo uma possibilidade de interação com um surdo
que utiliza a língua de sinais e a criança surda, então, entra em contato
com essa língua. A língua de sinais permite a ela significar o mundo e
a si própria, já que essa tem papel constitutivo na subjetividade. Nesse
sentido, quanto mais tardia a aquisição, mais comprometido pode ficar
o desenvolvimento do sujeito (LACERDA, 2004, p 67).
Chama a atenção o fato de se ter nesse grupo um predomínio de sujeitos que
adquiriam a Língua de Sinais na infância, pois muitos estudos apontam que a aquisição
da Libras ocorre em idade tardia no Brasil (LACERDA, 1998; QUADROS, 2005;
NADER e NOVAES-PINTO, 2011). O que, então, ocorre de singular nesse grupo de
sujeitos? Teria a experiência de aquisição da Libras na infância mobilizado esses
sujeitos a escolher a profissão de educadores? Podemos inferir que a incorporação da
Língua de sinais ainda quando criança fez com que realmente essa fosse sua língua
natural na qual as significações sobre o mundo foram tecidas e, portanto, suas relações
afetivas se desenvolveram a partir dessa língua visual, direcionando seu desejo para a
escolha profissional.
Já o outro bloco de sujeitos que diz ter aprendido a língua tardiamente, são 11
sujeitos. Desses, 6 disseram que aprenderam Libras na adolescência, entre 13 e 18 anos.
A adolescência é o momento em que os indivíduos adquirem autonomia e passam a
buscar outras figuras identitárias fora do espaço familiar. É muito comum que os jovens
surdos encontrem grupos de surdos sinalizantes, mesmo quando a família escolheu o
modelo de educação oralista, e nunca tivessem tido contato antes com outros surdos. A
78
pesquisa de Dalcin (2006) mostra que as pessoas surdas que aprenderam a Libras
tardiamente encontram nessa língua, por meio de grupo de surdos, uma sensação de
libertação da mente que estava aprisionada. A autora relata:
A vida mudou para Pedro, Maria e Janice depois que eles iniciaram o
contato com a comunidade surda e com a língua de sinais. Relataram
que ficaram muito “emocionados” ao descobrir que havia outros
surdos além deles, pois acreditavam que eram os únicos no mundo.
Afirmaram que, antes de adquirir a Libras, não sabiam de nada, não
compreendiam nada, eram “zero” como expressam através da Libras.
Após a entrada na comunidade surda, o mundo se abriu, eles
começaram a interagir com a sociedade através da escola, do trabalho
e dos contatos sociais. Passaram a ter acesso às notícias do mundo,
bem como a conhecê-lo (DALCIN, 2006, p. 205).
Essa história é muito comum na vida dos surdos devido à falta de escola bilíngue
ou família que escolhe a abordagem oralista.
Quando questionados sobre o lugar onde aprenderam Libras, obtiveram-se as
seguintes respostas:
Gráfico 05: Local em que aprendeu Libras
Fonte: Dados coletados pela pesquisadora
Alguns participantes responderam a essa questão com mais de uma resposta,
como por exemplo: “família e escola” ou “escola e família”, e por essa razão o número
de respostas excede o número de participantes. Entre aqueles que responderam “outros”
Amigos Família Escola Igreja Outros
9
6
13
1
6
Local onde aprendeu Libras
79
encontramos as seguintes respostas: fonoaudióloga (2 respostas), cursos (2), televisão -
janela de Libras (1) e centro de reabilitação (1).
Fazendo um refinamento dos dados, separamos em dois grupos:
a. Aqueles que adquiriram a Libras até os 9 anos
b. Aqueles que adquiriam a Libras após os 9 anos
Nesses dois subgrupos, cruzamos os dados da questão sobre a idade de aquisição
linguística com o dado sobre o local em que aprendeu (família, escola, amigos, igreja e
outros). O resultado desse cruzamento apontou que aqueles que aprenderam Libras em
idade inferior a nove anos tiveram essa aquisição, em sua maioria, dentro da família e
da escola. Por outro lado, aqueles que adquiram Libras em idade posterior aos nove
anos, o processo ocorreu com amigos, em sua maioria, devido ao encontro e contato
com os outros surdos, que se identifica e tem afinidade pelo sentimento e pela sensação
de pertencimento. Como define Strobel (2007), o encontro entre surdos é como se fosse
um “jogo de espelhos”. Esses dados podem ser visualizados nos gráficos a seguir:
Gráfico 06 – Local de aquisição da Libras Gráfico 07 – Local de aquisição de Libras
(< 9 anos) (> 9 anos)
Fonte: Dados coletados pela pesquisadora Fonte: Dados coletados pela pesquisadora
Muitos surdos relatam que quando descobrem a Libras, começam a
aproximação de contato com os amigos e se “afastam” da família. Na pesquisa de
Dalcin (2006), já citada anteriormente, a pesquisadora afirma
Escola 52%
Família 22%
Outros 13%
Amigos 9%
Igreja 4%
LOCAL DE AQUISIÇÃO DA
LIBRAS (< 9 ANOS) Escola
8% Família
8%
Outros 25%
Amigos 59%
LOCAL DE AQUISIÇÃO DA
LIBRAS (> 9 ANOS)
80
Além de exaltarem a língua de sinais, os sujeitos pesquisados
relataram a importância da comunidade surda em suas vidas. Todos
preferem estar entre os surdos a estar com os ouvintes (mesmo os
familiares), pois dizem que surdo com surdo “combina mais”. As
horas de lazer e as festas comemorativas são vivenciadas em geral,
com os amigos surdos. Embora se sintam dessa maneira, há o
reconhecimento da importância da família quando relatam que passam
a festividade do Natal com ela por acharem que essa comemoração é
familiar. Entretanto, passam o Ano Novo e outras festividades com os
amigos surdos. As festas dos ouvintes são descritas como “chatas”,
pois não conseguem participar das conversas (DALCIN, 2006, p.
209).
Passemos, agora, ao processo de formação educacional desses sujeitos.
Gráfico 08: Local em que estudou na educação básica
Fonte: Dados coletados pela pesquisadora
O gráfico 8 teve mais de trinta respostas porque os participantes estudaram em
diversos tipos de escolas, sendo que 21 participantes estudaram em escola regular na
maior parte do tempo de sua vida acadêmica. Dos participantes, oito responderam que
estudaram em escola inclusiva, e que tinham intérpretes de Libras em sala de aula.
Somando os participantes que responderam que estudaram em escola especial e
bilíngue, temos 20 respostas. Muitas escolas que eram denominadas de escola
“especial” tiveram suas nomenclaturas modificadas a partir da década de 90 para escola
bilíngue porque a abordagem bilíngue começou a ganhar força no Brasil. Exemplos
dessas mudanças ocorreram em escolas como Hellen Keller, DERDIC, Santa Teresinha
Regular Inclusiva Especial Bilingue
21
8
11 9
Tipo de escola em que estudou na educação básica
81
e outras. Essas mudanças, por exemplo, foram oficializadas no município de São Paulo
com o Decreto n° 52.785 de 201130
.
Art. 1º. Ficam criadas as Escolas Municipais de Educação Bilíngue
para Surdos – EMEBS na Rede Municipal de Ensino, vinculadas à
Secretaria Municipal de Educação, destinadas acrianças, jovens e
adultos com surdez, com surdez associada a outras deficiências,
limitações, condições ou disfunções, e surdo-cegueira, cujos pais do
aluno, se menor, ou o próprio aluno, se maior, optarem por esse
serviço (SÃO PAULO, 2001, s/p).
Este decreto também criou duas escolas pólos no município de São Paulo.
Art. 11. Além das escolas existentes, a Secretaria Municipal de
Educação poderá instituir Escolas Municipais de Educação Bilíngue
para Surdos em Unidades-Polo, de acordo com as demandas regionais.
Parágrafo único. A organização das Unidades-Polo observará as
normas estabelecidas pela Secretaria Municipal de Educação (SÃO
PAULO, 2011, s/p).
Assim, muitas pessoas que responderam podem ter se referido a escolas
especiais que se transformaram em bilíngues na atualidade. Embora tenham aqui sido
apresentadas as legislações da cidade de São Paulo, muitas mudanças também
ocorreram em outros Estados do Brasil como Rio Grande do Sul, Minas Gerais,
Pernambuco e outros.
As questões seguintes são direcionadas à formação profissional. Sobre a
formação em nível superior, obtivemos as seguintes respostas:
30
Disponível no link: https://servidoresjt.wordpress.com/2011/11/11/decreto-n%C2%BA-52-785-de-10-
de-novembro-de-2011/
82
Gráfico 09: Formação em nível superior
Fonte: Dados coletados pela pesquisadora
O gráfico 9 sobre a formação aponta que 90% dos participantes possuem
formação em nível superior, ou seja, apenas um participante tem formação até o ensino
médio. Este participante fez também um curso de formação para instrutor de Libras.
Quando questionados sobre qual cargo ocupam nas instituições de ensino que
trabalham, os participantes apresentaram as seguintes respostas:
Gráfico 10: Cargo
Fonte: Dados coletados pela pesquisadora
Não Sim Não respondeu
1
27
2
Formação em nível superior - Total: 30
Professor Instrutor Outros
19
12
2
Cargo
83
Os dois gráficos acima apontam para uma contradição: Se 90% tem formação
superior, o que justificaria serem contratados como instrutores?
Cruzamos estes dados do cargo de professor com o nível escolar de atuação
dos educadores e chegamos à seguinte constatação: Dos 14 participantes que
responderam que foram contratados como “professores”, 11 deles atuam no ensino
superior (exclusivamente ou em dois empregos, sendo no ensino superior e também na
educação básica). Apenas 3 participantes que trabalham exclusivamente na educação
básica foram contratados com a nomenclatura de professores.
Gráfico 11: Cargo de professor
Fonte: Dados coletados pela pesquisadora
Já aqueles que foram contratados como instrutores, a maioria (5 entre os 7 que
apresentaram essa resposta) atua na educação básica, como podemos verificar no
gráfico abaixo:
Educação Básica +Superior
Educação Superior Educação Básica
4
7
3
Cargo de professor
84
Gráfico 12: Cargo de instrutor
Fonte: Dados coletados pela pesquisadora
Há ainda aqueles que responderam que são contratados nos dois cargos
(professor e instrutor), como se pode visualizar no gráfico abaixo. Nessa resposta é
possível inferir para a maioria dos respondentes que o cargo de professor se dá no
ensino superior e de instrutor na educação básica.
Gráfico 13: Cargo de professor + instrutor
Fonte: Dados coletados pela pesquisadora
Educação Básica +Superior
Educação Superior Educação Básica
1 1
5
Cargo de instrutor
Educação Básica +Superior
Educação Superior Educação Básica
3
1 1
Cargo de professor + instrutor
85
A que conclusões chegamos na análise dos três gráficos anteriores. Ainda é
frequente a contratação na educação básica de profissionais surdos graduados na função
de “instrutores”. Essa situação é muito grave e revela uma desqualificação do
profissional surdo em relação aos colegas ouvintes. Assim como já discutido no capítulo
3, há uma descaracterização da figura do docente surdo. Embora as instituições de
ensino contratem esse profissional, por determinação do Decreto n° 5.626 de 2005 ou
por considerar que esse facilita o trabalho com as crianças surdas, o nome que lhe é
atribuído o coloca sempre em uma situação de subalternidade em relação ao ouvinte.
Ressaltamos que a nomenclatura ‘instrutor’ raramente é utilizada na contratação do
profissional surdo no Ensino superior (1 caso entre os participantes), provavelmente
porque esse cargo não exista entre o corpo docente de uma faculdade ou universidade.
Sobre a formação em nível superior obtivemos as seguintes respostas:
Gráfico 14: Curso de formação em nível superior
Fonte: Dados coletados pela pesquisadora
Observamos que 10 participantes responderam que se formaram em Letras
Libras, o que representou um empate com as respostas dos participantes que formaram
em outras áreas, como matemática, serviço social, psicologia, ciências biológicas.
Observamos também que 26% dos participantes responderam que se formaram em
pedagogia e dois participantes não responderam por não possuir graduação. O que se
destaca é que há um número significativo de profissionais que não tem formação
Pedagogia Letras Libras Outros Não respondeu
8
10 10
2
Curso de formação em nível superior Total: 30
86
específica para ministrar a disciplina de Libras e nem para atuar no ensino na educação
básica. Cruzando os dados da resposta sobre o curso em que se formou com o de nível
em que os participantes lecionam, observa-se que 18 participantes responderam que dão
aula em ensino superior. Isso significa que não apenas aqueles que formaram em Letras
Libras (que totalizam 10 sujeitos) lecionam no ensino superior, mas graduados em
outros cursos também. Quando dizem que formaram em Letras Libras, estes estudaram
em pólo com parceira da UFSC, já que o Estado de São Paulo não possui universidade
de graduação própria. Cruzamos com o gráfico de Estados dos participantes, observa-se
que a maioria dos participantes que não são do Estado de São Paulo responderam que
formaram em Letras Libras devido à localização de polo com a parceira da UFSC. Já no
Estado de São Paulo, pode-se também observar que os cursos de Letras e Pedagogia são
da área de licenciatura, que são perfis dos profissionais formados para a docência, como
definem Dall’Alba e Sarturi (2014):
O Curso de Letras/Libras foi o pioneiro, que se expandiu desde 2006
nas regiões brasileiras, sendo um destaque da comunidade surda
brasileira em suas bravas lutas histórica, políticas e culturais. Portanto,
o movimento surdo alcançou inúmeras conquistas importantes após a
Lei nº 10.436/2002, como a aprovação da Graduação em
Letras/Libras, implementada pela UFSC. Outro fator relevante que
ainda requer novos movimentos é a ampliação de vagas nas
Universidades Federais para o cargo de professor da disciplina de
Libras, sendo a exigência mínima a formação na Licenciatura em
Letras/Libras, os quais habilitam o profissional na Língua de Sinais e
seus elementos constitutivos de gramática (DALL’ALBA, SARTURI,
2014, p. 11).
Percebe-se, então, o crescimento gradativo do número de surdos formados em
nível superior, o que traz aspectos positivos para a comunidade surda e para a sociedade
brasileira. De acordo com Albres (2014), no início da década de 90, a ampliação das
instituições de ensino que começaram a adotar a educação bilíngue impulsionou a
necessidade de formação de profissionais para ensinar Libras. No entanto, essa
formação só se consolidou com a promulgação da Lei n° 10.436 de 2002 e do Decreto
n° 5.626 de 2005
Então, ser surdo e fluente era o requisito indispensável, mas a
ampliação dos interessados e a percepção de que a Libras merecia ser
ensinada de maneira mais adequada fez emergir o PNAES do MEC
em 2001, visando formar um grupo com preparo mais específico.
Estas experiências ajudam os surdos a terem mais clara a necessidade
de formação e fomentam a inserção deste tema no Decreto no
87
5.626/2005 (sobre a formação em nível superior e que aponta para a
obrigação do estado em fomentar isso) resultando em curso de
formação superior (Letras Libras). O que antes era falado,
reivindicado, se torna real. As novas experiências geram o aumento
das exigências. Assim, um movimento político e ideológico vai
compondo suas marcas na história pela participação social e pela
expressão na vida real (ALBRES, 2014, p. 54).
A partir disso, cresce de forma gradativa o número de surdos que tem acesso ao
ensino superior, trazendo aspectos positivos. Desse fato decorrem fatores como o
reconhecimento do status de língua para a língua de sinais, o desenvolvimento de
propostas de educação bilíngue de qualidade para surdos e "um momento histórico no
qual políticas públicas de inclusão vêm aos poucos aumentando o acesso e a
participação ativa de pessoas com necessidades especiais em diferentes contextos
sociais" (BISOL et al., 2010, p.2).
Com base no gráfico a seguir analisamos as respostas as perguntas abertas.
Nessas questões os participantes foram perguntados sobre suas experiências
profissionais. Para a análise das questões abertas, criamos uma categorização das
respostas, a partir de temáticas comuns. Cada participante foi designado com uma letra
maiúscula. Nem todos responderam a todas as perguntas. Sobre o motivo da escolha da
profissão de educador, obtivemos as seguintes respostas:
Gráfico 15: Escolha da profissão
Fonte: Dados coletados pela pesquisadora
Por que gosto
Por que sou surdo
Vocação e oportunidade
Ajuda e preocupação com pessoas surdas
Sem resposta
10
3
6
8
3
Escolha da profissão - Total: 30
88
De forma geral, os participantes responderam que gostam da profissão devido à
sua formação. Algumas das respostas foram selecionadas para mostrar a explicação do
motivo da escolha da profissão:
Participante A: “Porque é uma profissão no qual me identifiquei, trabalhar
com arte e cultura, além de instrutor de Libras. No qual eu valorizo muito a Libras
em todos lugares e luto para comunidade surda”.
Participante B: “Sempre gostei da área educacional e pelo fato de ser surda
filha e sobrinha de surdos me motivou aprofundar os conhecimentos sobre a
surdez, a libras e o universo psicossocial da pessoa surda, com isso veio o meu
desejo de pesquisa, divulgação e apoio no entendimento da sociedade em relação à
pessoa surda e sua língua”.
A categoria de “ajuda e preocupação com pessoas surdas” tiveram oito respostas
pelos participantes surdos, o que caracteriza o altruísmo, isso explica a vontade de
ajudar as pessoas e que não tiveram acesso à língua de sinais quando eram crianças na
educação escolar. Goés (1999) enfatiza a importância da construção de subjetividade na
criança surda quando esta tem contato com a língua de sinais. Essa interação é
importante para a sua aquisição da língua que ocorre no processo dialógico, trocando
ideias, sentimentos, compreendendo o que se passa ao seu redor.
Participante C: “Pela falta professora usuária de Libras e tive dificuldade nas
aulas com ouvintes então decidi ser professora e motivadora para crianças surdas
que precisam muito de professores surdos”.
Esse sujeito relata sua história de sofrimento da educação, por isso ele quer
passar o seu modelo para as outras crianças surdas. Muitas pessoas surdas passaram por
experiências de sofrimento no seu processo educacional, como relata Strobel (2008):
[...] Uma criança surda sentada de frente para o professor com os
olhos atentos a qualquer movimento dos lábios, ansiosa e preocupada
sem entender o professor, que muitas vezes fazia exercícios
fonoarticulatórios exaustivos na tentativa ansiosa de realizar de uso da
língua de sinais, ela era como uma marionete do professor, um
verdadeiro estresse e perda de motivação para a aprendizagem real e
participação ativa (STROBEL, 2008, p.53)
89
A preocupação e cuidado com a nova geração de surdos é um sentimento
comum entre surdos adultos, que buscam evitar que essas crianças vivenciam as
angústias, medos e sofrimentos pelos quais passaram. Quadros (2006) diz
Desse modo, só surdos sonham com espaços em que a língua de sinais
seja a língua de instrução, em um ambiente cultural e social que
favoreça o fortalecimento das heranças surdas para a consolidação de
um grupo que se diferencia a partir da experiência visual
(QUADROS, s/d, p. 4).
Esse fator leva a consideração de que muitos adultos surdos que não tiveram
acesso à língua de sinais salientarem a importância da presença do professor surdo em
sala de aula, como afirma Quadros (1997)
A presença de surdos adultos apresenta grandes vantagens dentro de
uma proposta bilíngue. Primeiro, a criança, tão logo tenha entrado na
escola, é recebida por um membro que pertence à sua comunidade
cultura, social e linguística; assim, ela começa a ter oportunidade de
criar a sua identidade. Segundo, essa criança começa a adquirir a sua
língua natural. Tais vantagens são imprescindíveis para o sucesso da
proposta bilíngue. Assim, tornar-se-á possível o ensino de uma
segunda língua, caso contrário, a criança não terá chances de
apresentar um domínio razoável da língua portuguesa (QUADROS,
1997, p.30).
Participante D: “Eu ensinei Libras no ensino fundamental e eu adoraria ver os
alunos surdos e ouvintes Libras aprendizagem. Eu também gosto de influenciá-
los a compreender a cultura surda e história. Quero mostrar-lhes que os surdos
é capaz de qualquer coisa, exceto ouvir. Uma vez que, eu sou Surdo e eu quero
ser os seus modelos”.
A categoria de “ser surdo” nos incita algumas reflexões. O fato de ser surdo não
significa ser da mesma “cultura surda”, já que há diferentes experiências de ser surdo.
Segundo Bastos (2013, p. 43): “[...] não existe surdez, mas surdezes; não há um surdo
universal, mas pessoas surdas com suas experiências e subjetividades forjadas a partir
de diferentes processos de interiorização” A resposta do participante pode ser entendida
como um espaço de movimentos e lutas entre diferentes grupos sociais. Embora haja
diferentes vivências de ser surdo, algo os une: a experiência visual. Quadros (2003)
esclarece a questão da cultura surda quando diz que:
90
Essa cultura é multifacetada, mas apresenta características que são
especificas, ela é visual, ela traduz-se de forma visual. As formas de
organizar pensamento e a linguagem transcendem as formas ouvintes.
Elas são de outra ordem, uma ordem com base visual e por isso tem
características que podem ser ininteligíveis aos ouvintes. Ela se
manifesta mediante a coletividade que se constitui a partir dos
próprios surdos (QUADROS, 2003, p.6).
Portanto, a resposta do participante pode ser relacionada à afinidade que tem
com a experiência visual e da própria vida do sujeito surdo.
Uma das questões abertas perguntou se o participante escolheu a profissão de
educador devido à facilidade de encontrar vagas no mercado de trabalho. Vejamos as
respostas:
Gráfico 16: Facilidade de vaga no mercado de trabalho
Fonte: Dados coletados pela pesquisadora
As respostas para “sim” e “não” encontram-se empatadas em relação à facilidade
de vaga no mercado de trabalho. Alguns participantes manifestaram suas impressões de
que a educação de surdos teve uma “melhora” após a criação da Lei Federal n° 10.436
de 2002 e do Decreto n° 5.626 de 2005 quando expandiu a oferta de curso de graduação
de Letras Libras, Pedagogia Bilíngue, aumentando de forma gradativa o mercado de
trabalho para surdos, como afirma o participante E:
Sim Não Depende Sem resposta
12 12
2
4
Facilidade de vaga no mercado de trabalho - Total: 30
91
Participante E: “Para mim foi tranquilo, mas hoje em dia melhorou muito o
mercado de trabalho para os surdos porque na época era muito difícil para os
surdos”.
Os participantes que responderam “não”, disseram que não houve melhora no
mercado de trabalho, mesmo com as legislações vigentes. Outros relatos também
mostram que há “ocupação” dos ouvintes no espaço de mercado de trabalho de ensino
de Libras.
A seguir, algumas das respostas dos participantes que responderam “não”:
Participante B: “Não, não acredito na facilidade pois a sociedade
prefere o ouvinte intérprete ao professor/surdo devido a comunicação”.
Participante F: “O mercado de trabalho é ainda muito pequeno,
insignificante e não valoriza o profissional surdo”.
Participante D: “Sim, mas grande problema com as ouvintes fará de
tudo para levar a nossa profissão de distância. Se as ouvintes respeitar profissões
surdos no mercado de trabalho, então as pessoas surdas podem ver a sua melhor
oportunidade e seu futuro também”.
Participante G: “Eu acho que não, não vejo nenhuma vaga no mercado
de trabalho. Muito pouco que tem vaga”.
Participante H: “Depende, tem vagar ou não... pois aumento surdos quer
ser professores e o problema os ouvintes entrar do nosso lugar dos surdos”
Na pergunta a seguir, os participantes responderam se percebem uma maior
valorização profissional do surdo na atualidade:
Gráfico 17: Valorização da profissão
92
Fonte: Dados coletados pela pesquisadora
Os participantes revelaram que perceberam uma melhoria significativa na
valorização profissional devido à expansão do curso de graduação de Libras e ao
reconhecimento da profissão, o que passou a ser um marco histórico para a comunidade
surda, porém ainda há obstáculo. As pessoas que responderam sim acreditam na
valorização do trabalho do surdo. Mesmo com a expansão de cursos de graduação e pós
em Libras, ainda se encontram falhas e barreiras na profissão da pessoa surda.
Participante A: “Acredito que sim. Penso que qualquer surdo que tenha
pelo menos um título de graduação seja contratado como professor em
qualquer instituição e não como instrutor ou monitor como acontece em
alguns casos que presenciei”.
Uma participante alerta que a visibilidade ainda é pouca e que até para ouvinte a
valorização também é pouca.
Participante C: “No papel sim, porém as pessoas não levam a sério”.
Participante B: “Em parte sim, porém é recente a visibilidade do professor
surdo, há obstáculos a serem enfrentados, o primeiro dele é desmitificar as
ideias que os ouvintes ainda têm em relação ao professor surdo e o segundo
a barreira comunicacional no quesito adaptação a qual a maioria das
escolas/instituições preferem surdo oralizados e não sinalizante”.
Sim Não Nem sempre Sem resposta
16
7
4 3
Valorização da profissão - Total: 30
93
Participante J: “Depende local, pois tem um monte ouvinte esta usando
profissional dos surdos”.
Participante K: “Está sendo difícil ultimamente, pois até para ouvintes,
este cargo de professor não está sendo muito valorizada socialmente,
imagine então para pessoa surda no mercado? É triste ver que ainda
estamos sendo vista como "incapacidade" para dar aula. Devemos ser
tratadas iguais na sociedade, tanto para ouvinte quanto para surdo. Além
disso, é através da educação que nós aprendemos, assim devemos valorizar
a profissão de professor mesmo que o professor seja surdo, ou seja,
igualdade”.
Quando questionados sobre quais as melhorias que almejam para a educação
dos surdos, os participantes responderam:
Gráfico 18: Melhoria na educação de surdos
Fonte: Dados coletados pela pesquisadora
Pelo gráfico podemos perceber que as categorias “estrutura curricular,
metodologia e formação” e a de “falta de escola bilíngue” estão próximas em número de
respostas, o que significa há falta de estrutura para atender a demanda dos alunos. Há
crítica sobre a escassez de formação, inclusive para ouvinte, pois muitos não sabem
Libras. Se estes profissionais não sabem, que falta fazem os professores surdos? Quanto
Estruturacurricular,
metodologia,formação
Falta de escolabilíngue
Política Sem resposta
12 10
5 3
Melhoria na educação de surdos - Total: 30
94
a categoria de “política”, há forte tendência à educação inclusiva, o que leva à evasão e
ao fracasso escolar por parte de alunos que não conseguem acompanhar as aulas,
mesmo tendo intérprete de Libras na sala de aula. Fernandes (2006) denuncia essa
situação:
O que temos observado é que a proposta de educação bilíngue em
curso é desenvolvida apenas no contexto das escolas especiais, pois as
escolas regulares sequer cogitam a diferença linguística dos surdos e,
quando o fazem, a única preocupação efetiva que se manifesta é a
ausência de intérpretes, já que acreditam ser delas a responsabilidade
da educação dos alunos surdos (FERNANDES, 2006, p. 4).
Participante B: “Estrutura curricular, metodologia adequada e regulamentada,
pois não basta ser bilíngue a proposta, é preciso reformular o pensamento
educacional como todo e estar bom senso com a política da inclusão e assim
ambas caminhem juntas: escola bilíngue para surdos e escola inclusiva.
Qualificar o professor ou instrutor surdo reconhecendo que parte dele a
premissa da qualidade do ensino-aprendizagem do alunado surdo”.
Participante L: “Principalmente aos professores ouvintes que dominam pouco
ou mal na instrução em libras para surdos”.
Participante K: “Abrir mais escolas bilíngues para surdos, está na lei, por
tanto ainda é fraca e é por isso estamos lutando. Sinto falta também de por mais
professores SURDOS nas escolas bilíngues”.
Participante M: “Sim experiência profissional, 3 anos atrás proposta educativa
bilíngue de Escola Municipal Osvaldo Veloso, responsabilidade CAEE (Centro
atendimento Educacional de Especializado) de Sul orientam todos profissionais
(servidor, professores, orientadores e diretores. Mas SEE muito difícil, é
política. A favor inclusão. Tenta negociar proposta bilíngue”.
Participante N: “Primeiramente falta muita coisa para melhorar, não só com a
educação, também com a comunicação e interação com os alunos surdos. E
essa comunicação e interação não é somente com os alunos ouvintes, mas
também com os professores que leciona a cada disciplina com os seus alunos.
Melhorar também a metodologia de aula para alunos surdos, porque o ensino é
completamente diferente a dos alunos ouvintes”.
95
Participante O: “Precisa melhorar muito, adaptar os materiais pedagógicos e
os professores ouvintes fazerem mais cursos para aprofundar mais sobre libras
e como ensinar os surdos”.
Participante F: “Precisa melhorar a proposta educativa bilíngue, a
qualificação dos profissionais para sejam fluentes em Libras e ausência de
materiais didáticos”.
Participante P: “Eu trabalho dentro na escola, quase 4 anos, eu sinto falta que
preciso aumentar professores surdos trabalhar juntos. Acredito os alunos
surdos são fortes e aprenderam rápido”.
Uma vez que muitos dos participantes são contratados como instrutores, apesar
de serem graduados, questionamos qual seria, para eles, a diferença entre instrutor e
professor, ao que responderam:
Gráfico 19: Diferença de professor e instrutor
Fonte: Dados coletados pela pesquisadora
A categoria “formação” foi a mais citada em termos diferença da profissão de
professor e instrutor. Isso pode se referir ao acesso à informação que se obtém nas
formações seja em pedagogia ou licenciaturas. A categoria “didática” foi citada, talvez
por perceberem a diferença de conhecimento didático que tinham antes de se graduar e a
que adquiram depois de se graduar. Os participantes que responderam à essa pergunta
com a resposta “é mesma coisa” são os não possuem graduação, por isso desconhecem
Formação Didática emetodologia de
ensino
Mesma coisa Sem resposta
19
5 2 4
Diferença de professor e instrutor - Total: 30
96
os benefícios e conhecimentos significativos que uma graduação pode oferecer. Veja as
respostas semelhantes:
Participante Q: “Professor é para ser formado em ensino superior. Instrutor é
para ser formado em ensino médio”.
Participante R: “SIM, É DIFERENÇA. O professor possui o diploma
universitário, e o instrutor não”.
Participante I: “Para mim, a função de professor é mais valorizada que a de
instrutor, pois geralmente professor possui graduação e às vezes pode ter mais
preparo e segurança no ensino em relação ao instrutor. Além disso, parece que
instrutor é contratado a qualquer momento sem maior preocupação com a sua
formação e experiência (apenas verificar se é surdo e sabe Libras com
fluência), enquanto as do professor são analisadas e avaliadas para posterior
ser aprovado a dar aulas”.
Participante B: “Nada mais do que status, já que a definição professor é para
os graduados e para o instrutor até ensino médio, porém ressalto na
importância da experiência teórica e prática independe do termo assim como é
para o intérprete cuja lei define livre atuação a partir do ensino médio e o que
vale é a fluência na Libras. Portanto digo que o Surdo para dar aula de libras
deve ter qualificações, conhecimentos da área em que atua ou vai atuar.”
Participante K: “Professor é aquele que já pode dar aula em todos os níveis de
educação, possui diploma de graduação e instrutor não pode dar aula em todos
os níveis, apenas cursos livres, empresas e entre outras instituições, possui
certificado de instrutor”.
Participante S: “Diferença Professor já estudou pedadogia. Instrutor ja
estudou proprio libras, curso, prova de Libras e estudar simples”.
Participante T: “Instrutor é para ajudar os alunos entender o significado dos
sinais, coisa básica. Professor é para explicar melhor, mais experiencia das
disciplinas e ajudar a desenvolver o aprendizado dos alunos”.
Participante H: “Eu era instrutor para ensinar crianças surdas porque eu não
aprendi ser profissional como eu sei como ensinar melhor para eles porque é
minha experiencia! depois eu me formei letras libras é mais experiencia
significa é já sou professor!”.
97
Participante D: “Professor ensinar todos os cursos e instrutor ajudou o
professor. Instrutor também se concentrar em uma área. Os instrutores também
não foram autorizados como professores têm”.
A última questão que analisamos refere-se ao sentimento dos participantes em
relação ao fato de terem sido contratados como instrutores, mesmo após terem se
formado no nível superior. O gráfico mostra a resposta se sentiram inferiorizados.
Vejamos as respostas:
Gráfico 20: Contratado como instrutor
Fonte: Dados coletados pela pesquisadora
A maioria respondeu que se sentiu inferiorizada quando foi contratada como
instrutor, isso mostra a desvalorização da profissão. Percebem a diferença no ambiente
do trabalho, principalmente quando se relaciona com os outros profissionais.
Participante Q: “Sim, trabalhei no CAS e depois passei no concurso federal, é
muito diferente porque dei aulas para surdos na escola e dou aulas para
ouvintes no ensino superior. Agora tem uma aluna surda que estuda no curso de
Letras-Libras onde trabalho”.
Sim Não Nunca fuicontratado
Depende Sem resposta
16
5
1 3
5
Contratado como instrutor - Total: 30
98
Participante V: “Após formação de Letras-Libras, sou professora e me sinto
mais preparada para dar respostas correta aos alunos e ministrar aula bem
estrutura. Como instrutor, me sinto mais despreparada”.
Participante T: “Sim, isso foi umas 2 vezes, me senti como se nao fosse feito a
faculdade. Tem as pessoas acham que a profissão instrutor é como professor,
infelizmente! Eles precisam entender que são 2 coisas diferentes”.
Participante F: “Sim, me senti sem valorização. Tanto esforço para me
preparar profissionalmente e depois não ter a oportunidade adequada de
trabalho”.
Participante H: “sim foi, e depois fiquei feliz e senti bem palavra ser
professora”.
As respostas dos participantes vão ao encontro do que vem sendo discutido nos
capítulos anteriores dessa pesquisa. Embora haja um aumento de possibilidades de
trabalho na esfera educacional para profissionais surdos, isso não revela uma real
mudança de paradigma. O período de hegemonia da abordagem oralista ficou para trás e
os atuais modelos preconizam o uso da língua de sinais na educação das crianças surdas.
Essas mudanças se constituem rupturas com um modelo educacional que gerou tanto
sofrimento ao povo surdo, e só foram possíveis devido às lutas dos próprios surdos.
Porém o que se vislumbra na atualidade é uma mudança de formato das propostas
educacionais sem uma valorização do surdo como educador. A manutenção do
qualificativo instrutor na contratação de profissionais graduados e pós-graduados revela
essa desqualificação.
99
CAPÍTULO VI
ANÁLISE DAS OBSERVAÇÕES:
O QUE É POSSÍVEL AFIRMAR SOBRE AS PRÁTICAS DOS
EDUCADORES SURDOS EM SALA DE AULA
Para a pesquisa de observação em sala de aula, foi utilizado o método qualitativo
de cunho interprepretativista a fim de entender, descrever e explicar, a partir dos
fenômenos sociais e culturais, o processo de formação do profissional surdo. Segundo
Spradley (1980), esse método se baseia na análise de grupos e/ou indivíduos e contribui
para o aperfeiçoamento das teorias que buscam compreender os fenômenos sociais. Para
a realização do método, a observação tem um papel fundamental no processo de registro
dos dados. Ela pode ser feita por meio de diário de campo na forma de relato, que
favorece a base para uma descrição e interpretação daquele contexto em que está
inserido. O pesquisador pode, ainda, utilizar outros instrumentos de pesquisa como
entrevista, questionário, gravação em vídeo e áudio, documentos e relatos para a
interpretação da observação em diversos ângulos. No caso dessa pesquisa, o
instrumento utilizado foi a observação e registro em diário de campo, seguindo os
princípios definidos por Trivinõs (2008), a saber: o ambiente natural como fonte direta
de dados e o caráter descritivo.
Moita Lopes (1996), explica que o interesse pela pesquisa interpretativista tem
sido cada vez maior, não só por representar um foco de investigação, mas por avançar
no tipo de método de pesquisa que pode ser mais apropriado à natureza subjetiva do
objeto das ciências humanas.
Logo, podemos considerar a necessidade de valermo-nos dos paradigmas
interpretativistas ao nos propormos focar a formação do profissional surdo no contexto
da sala de aula, ação que implica a pesquisa qualitativa.
Nesse sentido, Bortoni-Ricardo (2013 p. 34) expõe que:
Na pesquisa qualitativa trabalha-se com variáveis procurando
estabelecer uma relação entre elas. A variável dependente é a que é
explicada; a independente é a explicação. O pesquisador está
interessado em um processo que ocorre em determinado ambiente e
quer saber como os atores sociais envolvidos nesse processo o
100
percebem, ou seja, como o interpretam (BORTONI-RICARDO, 2013,
p. 34).
Ancorado na citação da página anterior, Trivinõs (2008) define que os elementos
principais a serem considerados na pesquisa de cunho qualitativo-interpretativista são o
ambiente natural como no caso, a sala de aula, uma forma direta de coleta de dados e o
pesquisador como instrumento fundamental no processo de análise e reflexão. Desse
modo, a análise buscou interpretar os dados colhidos nas aulas de diversas disciplinas
que tinham a presença do profissional surdo (FLICK, 2009).
O relato e a análise da observação em sala de aula têm como objetivo analisar o
perfil do profissional surdo atuante em sala de aula, sua relação com os alunos e outros
profissionais e quais as estratégias utilizadas pelo mesmo. Pretendeu-se também refletir
sobre os reflexos de sua atuação na formação dos alunos surdos e ouvintes. Foram
considerados como critério de análise para a descrição: a) metodologia utilizada; b)
didática; c) comprometimento com o ensino; d) uso de materiais adaptados; e)
conhecimento.
Como se trata de pesquisa qualitativa, procurei estar em contato direto e
prolongado com o ambiente e a situação a ser investigada, realizando um delicado
trabalho de campo que totalizou 12 horas aproximadamente em cada escola presenciada.
Cada aula durava em média duas horas (das 8h às 10h).
Para seguir a esses pressupostos, procurando entender o contexto sócio histórico,
de abordagem interpretativista. Busquei interpretar os significados que os atores sociais
envolvidos no processo de formação, professor e alunos, conferem às suas ações.
A análise buscou interpretar os dados colhidos nas aulas de diversas disciplinas
que tinham a presença do profissional surdo: instrutor ou professor. As observações
foram realizadas no segundo semestre de 2016, quando assisti às aulas, anotando os
detalhes de cada uma e considerando as ações desenvolvidas pelos profissionais, pelos
alunos em cada contexto: espaço da sala de aula, participação de todos os alunos, ações
desenvolvidas pelos sujeitos participantes do processo e colaborações do ambiente
físico, humano, material.
Nesta etapa, procurei interpretar as ações ocorridas em sala de aula, levando em
conta o que presenciei, senti e compreendi nos contextos educacionais observados.
Os sujeitos participantes diretamente da pesquisa são os profissionais surdos na
área de diversas disciplinas de Libras, artes, contação de histórias e brincar de aprender.
Essa última disciplina é uma orientação de estudo dirigida por um professor surdo.
101
Outros sujeitos, porém, foram analisados indiretamente, uma vez que a prática educativa
só pode ser observada na relação entre os atores educacionais. Portanto, são também
sujeitos indiretos da pesquisa: a) os alunos surdos do Ensino Fundamental I das escolas
privadas e públicas; b) os alunos ouvintes do Ensino Fundamental I; c) os profissionais
ouvintes que entram em cena para a docência no ensino bilíngue em algumas disciplinas
presenciadas pela pesquisadora.
Para a realização da observação, realizei dois encontros em cada escola,
previamente agendado com a coordenação da escola.
O principal material de análise desta pesquisa constituiu-se do conjunto de
anotação no campo de diário, das enunciações produzidas em sala de aula. Nesse
sentido, esse "olhar" investigativo atentou-se para os processos e as dinâmicas de
interações ocorridas na sala de aula.
A pesquisa de observação foi feita em três escolas, sendo duas públicas e uma
privada no Estado de São Paulo, em que estão inseridos os profissionais surdos.
Abaixo, segue o quadro descritivo dos sujeitos da pesquisa, sendo seis homens e duas
mulheres com nomes fictícios.
Sujeitos Função Formação Escola Disciplinas
João Instrutor Design e Pedagogia Tulipa Libras, suporte do professor
bilíngue;
Pedro Instrutor Letras Libras Tulipa Libras, suporte do professor
bilíngue;
Maria Professora Artes Visuais Girassol Artes;
José Professor Letras Libras Girassol Libras;
Francisco Professor Pedagogia Girassol Contação de história;
Ana Professora
auxiliar
Pedagogia Girassol Informática e Jardim I e II;
Joaquim Professor Desenho Industrial e
Pedagogia
Girassol Brincar de aprender;
Paulo Instrutor Letras Libras Cravo Libras, suporte do professor
bilíngue;
102
Quadro 08 – Sujeitos da pesquisa de observação em sala de aula
A descrição e o perfil de formadores de profissionais surdos encontram-se
abaixo com as caracterizações de cada instituição e de cada profissional.
1) Caracterização das instituições:
a) Escola Cravo;
Escola Municipal de Educação Bilíngue para Surdos. Essa escola oferece
Ensino Fundamental I e II e conta com dois profissionais surdos e os demais
são profissionais ouvintes bilíngues. Um dos profissionais surdos é professor
de matemática e o outro é contratado com instrutor. O professor de
matemática não foi observado, pois no período da pesquisa estava de licença
médica. O outro profissional surdo participou como sujeito dessa pesquisa.
b) Escola Tulipa;
Escola Municipal de Educação Infantil, Ensino Fundamental I e II,
considerada escola polo. Atende a alunos ouvintes e também a alunos
surdos. Nessa escola, os alunos surdos da Educação Infantil e Fundamental I
estudam em salas distintas às dos ouvintes, com dois docentes: um professor
bilíngue ouvinte e um instrutor surdo. Apenas as aulas de artes, educação
física e informática e atividades comemorativas e de passeio são realizadas
em conjunto entre alunos surdos e ouvintes.
c) Escola Girassol;
Escola bilíngue privada que possui professores surdos e ouvintes bilíngues
na Educação Infantil e no Ensino Fundamental I e atende apenas a alunos
surdos. No ensino fundamental II, esses alunos são inseridos em sala de aula
com ouvintes e com a presença de intérprete de Libras.
2) Sujeitos da pesquisa: formação dos profissionais surdos
a) O instrutor João é formado em desenho industrial e pedagogia. Exerce a
docência no ensino de Libras há mais de quinze anos, já trabalhou em diversas
escolas de surdos incluindo que já foi professor da escola Girassol e da Cravo.
103
b) Pedro formou-se como professor de Libras no curso de Letras Libras pela
Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) no polo de Vitória/ES. Está na
escola Tulipa há dois anos;
c) Maria cursou graduação em Artes e leciona essa disciplina há mais de dezesseis
anos na instituição Girassol. Seu primeiro emprego foi no banco, e insatisfeita com
o emprego, abandonou-o quando estava no último ano de graduação para trabalhar
na escola Girassol, mas naquela época era estagiária e depois foi promovida a
professora;
d) José tem formação em Letras Libras, possui pós na área de psicopedagogia.
Trabalha na instituição Girassol há quatro anos. Também ministra aula de Libras em
outras instituições;
e) Francisco trabalha na instituição Girassol há mais de dezoito anos. É formado
em pedagogia e tem pós-graduação em nível de especialização;
f) Ana é professora auxiliar da escola Girassol. Sua função é dar suporte aos
professores. É novata, está na instituição há quatro meses, pois se formou há pouco
tempo no curso de Pedagogia;
g) Joaquim possui graduação de desenho industrial e pedagogia. É professor há
mais de nove anos na escola Girassol. Na época da graduação era contratado como
instrutor e depois que se formou passou a ser professor. Ministra Libras em outras
instituições.
h) Paulo é formado em licenciatura de Letras Libras. É contratado como instrutor
há dez meses pela prefeitura de São Paulo. Antes de ingressar na escola Cravo,
trabalhou em outras escolas polos no Estado de São Paulo;
3) Observação em sala de aula:
a) Prof. João. Escola Tulipa.
A relação do profissional surdo com os alunos e a professora bilíngue foram
fontes de dados utilizados. Nesta escola, há três salas com alunos surdos do primeiro,
segundo, quarto e quinto ano, sendo que os dois primeiros anos do ensino fundamental
são inseridos na mesma sala (turma multisseriada).
Ao chegar à escola Tulipa, fui apresentada à coordenadora pedagógica, que me
explicou um pouco sobre o trabalho desta escola. Foi esclarecido para a coordenadora
pedagógica e aos professores o que seria a pesquisa, o que seria observado e as
anotações que seriam feitas no caderno de campo como observadora sem nenhuma
104
intervenção nas aulas. A pesquisa iniciou-se no segundo semestre de 2016. Iniciei a
observação na aula de Libras para alunos ouvintes, pois havia a presença do instrutor
naquele momento. Além dessa, os instrutores surdos também exercem atividade de
apoio docente ao professor bilíngue nas salas de aula do Ensino Fundamental I e dão
aula de Libras para a comunidade (profissionais da escola, família e outros
interessados). Vale relembrar que o foco da escolha foram os profissionais surdos.
Neste dia, a pesquisadora se apresentou e explicou aos alunos que estava fazendo uma
pesquisa, que iria observar nas aulas e que iria sempre anotar as observações em um
caderno.
A observação iniciou às 07h30min na sala de alunos ouvintes em que o instrutor
João dá aula de Libras. O objetivo da aula é que os ouvintes aprendam a se comunicar
com os alunos surdos. Ele apresentou um desenho da Discovery sobre Olimpíadas,
sinalizou alguns vocábulos e utilizou classificador de Libras para encenar algumas
partes do desenho. O uso da imagem é essencial para crianças ouvintes para incentivá-
las no aprendizado da língua de sinais. Essa estratégia é essencial para ensinar aos
alunos ouvintes. Ao término do desenho, os alunos fizeram o uso de palmas em Libras.
O professor começou a fazer algumas perguntas sobre o desenho, e sinaliza para um
aluno:
Quadro 09 – Trecho de diálogo entre professor e aluno
A análise desse momento discursivo permite identificar alguns pontos de
enunciação surgidos na aula de Libras que transparecem no discurso mantido entre o
professor (P) e o aluno (A), possibilitando a visibilidade de algumas questões
importantes para a compreensão das relações dialógicas. Na concepção de Bakhtin, a
enunciação não pode ser entendida como expressão da consciência individual interior,
mas sim como produto da interação entre indivíduos socialmente organizados. Desse
modo, foi possível perceber nesta aula que o ensino de Libras está ocorrendo em
contexto dialógico e não por uma lista de vocábulos descontextualizados, como é
- P: Você gosta de futebol?
- A: Gosto sim.
E seguida, o professor pergunta novamente.
- P: Qual o time que torce.
- A: Corinthians.
O aluno pergunta para o instrutor o time que ele torce.
- P: Também;
105
comum ocorrer. O professor atesta sua capacidade de ensinar uma língua em situação
real de comunicação, enfatizando o diálogo como material de aprendizagem, além de
utilizar recursos visuais de temática de interesse dos alunos da faixa etária trabalhada. A
apresentação de alguns sinais combinada à expressão corporal, facial e uso de
classificadores permitiu que se estabelecesse uma comunicação real entre os
interlocutores durante a aula. O episódio reforça a ideia de que para ensinar Libras, ou
qualquer língua, não basta ser falante dessa, “é necessário ao professor um amplo
conhecimento de diversos aspectos: da língua e suas características (linguísticas e
gramaticais), de metodologias de ensino e, principalmente, das práticas pedagógicas a
serem desenvolvidas” (SANTOS, LOPES, LACERDA e OLIVEIRA, 2016, p. 128).
Logo após o termino da aula do segundo ano, o instrutor pega seus materiais e
segue para outra sala, onde ficaria com alunos surdos no trabalho de suporte à
professora bilíngue.
A professora bilíngue passa a tarefa na lousa e pede para os alunos responderem
o que anotaram no caderno. Alguns alunos não entenderam e confundem “gostar” e
“não gostar” e o instrutor imediatamente ajuda a professora a explicar aos alunos.
Observa-se nesse momento que, mesmo a professora sendo fluente em Libras, a
explicação do instrutor foi fundamental. Nesse sentido, verifica-se que “a presença do
instrutor surdo no contexto educacional é de suma importância, assim como o
desenvolvimento de práticas que favoreçam o desenvolvimento de linguagem, sua
constituição e identidade, além do aprendizado da LIBRAS” (SANTOS, LOPES,
LACERDA e OLIVEIRA, 2016, p. 129).
Logo em seguida uma aluna respondeu “não gosto de demorar”, a professora
pede para a aluna completar a palavra que ela havia dito da frase na lousa e ela tira suas
dúvidas com o instrutor e pergunta se deve escrever em português da norma culta para
que os alunos aprendam da forma que o professor ensina. O instrutor afirma que é
melhor primeiro escrever o português com marcas de Libras e depois a norma culta para
que os alunos perceberem a diferença entre essas línguas. Percebe-se que há interação e
parceria entre esses profissionais, o que favorece a cooperação e parceira de trabalho
com qualidade com afirma a citação de Bakhtin (1999) a seguir
A verdadeira substância da língua não é constituída por um sistema
abstrato de formas linguísticas nem pela enunciação monológica
isolada, nem pelo ato psicofisiológico de sua produção, mas pelo
fenômeno social da interação verbal, realizada através da enunciação
106
ou das enunciações. A interação verbal constitui assim a realidade
fundamental da língua (BAKHTIN, 1999, p. 123).
Em uma conversa informal com o instrutor, ele relata que a relação com a
professora bilíngue é recíproca, porém não são todos os professores que o procuram
para tirar dúvidas, fazer perguntas para o maior aproveitamento e acompanhamento das
aulas. Quando ocorre essa troca, o trabalho se torna mais produtivo, também no ensino
da Língua Portuguesa. “El trabajo colaborativo entre un adulto sordo y un profesor
oyente tiene el potencial de enriquecer el proceso de aprendizaje de la segunda lengua
para los estudiantes sordos” (LISSI, SVARTHOLM, GONZÁLEZ, 2012, p. 317)31.
Na minha observação, pude perceber que esse instrutor traz em sua atuação
docente o diálogo e o comprometimento. Diálogo que permite a oposição de ideias e a
comunicação efetiva. Apresenta comprometimento com sua responsabilidade de
educador e de formador, da qual não se exime.
Uma das observações relevantes na sala de aula foi o modo como os alunos
surdos fazem uso do celular e do tablet. Para o instrutor surdo, essas tecnologias digitais
são ferramentas importantes tanto como instrumento para os alunos aprenderem a usá-
las de modo independente, quanto para o auxílio na compreensão dos conceitos. O
instrutor João me informou que quando desconhecem a palavra, os alunos passaram a
ter o hábito de usar essas ferramentas, consultando aplicativos de dicionários Português
- Libras.
Outra estratégia que os alunos surdos utilizam, segundo o instrutor, é a busca no
site do Google Imagens ou de vídeos. Essas pesquisas permitem que o aluno faça uma
associação das imagens e dos vídeos com os conceitos. O instrutor complementa a
explicação dos conceitos realizando, também, a instrução em Libras. De fato, a
tecnologia digital tem sido um importante recurso na vida dos surdos:
Através da internet os surdos vêm se apropriando da escrita da Língua
Portuguesa e desenvolvendo com sucesso o papel que até agora foi delegado
à escola. O que se tem hoje, em termos tecnológicos, é algo que possibilita
aos surdos uma independência quase que total em relação ao ouvinte. Esta é
uma característica extremamente positiva para os surdos, uma vez que
diminui a sua dependência em relação ao ouvinte, começando a desenvolver
de forma determinada, os ditames de sua própria consciência. (COSTA,
2011, p.110)
31
Tradução livre da autora: “O trabalho colaborativo entre um adulto e um professor surdo ouvinte tem o
potencial para enriquecer o processo de aprendizagem da segunda língua para alunos surdos”.
107
Os recursos visuais para os alunos surdos, elaborados como uma metodologia
reflexiva para a construção de seus conhecimentos, contextualizada no ensino de
português, é essencial para a apropriação e entendimento dos conceitos e conteúdos
presentes durante as aulas. Campelo (2007) define a importância do recurso visual em
sala de aula.
A pedagogia visual direciona práticas docentes para uso das imagens
que visem às experiências adaptadas a quem não dispõe da audição.
Possui uma forma estratégica de transmitir a representação de objetos,
de imagem e de língua, cuja natureza e aspecto são precisamente de
aparato visual (CAMPELLO, 2007, p.113).
Destacamos que os alunos não possuem tablet para a consulta de dicionários,
como a Libras é uma língua visual, o que necessita de recursos para o uso em sala de
aula. O instrutor explica que quando quer trabalhar com o dicionário online, os alunos
utilizam os aplicativos ProDeaf32
e Hand Talk33
no tablet do próprio instrutor.
É importante ressaltar a presença da professora bilíngue que faz mediação com o
instrutor, assim dando um trabalho bilíngue. Isso favorece uma valorização da
concepção de mundo constituído por meio da subjetividade e da objetividade com as
experiências visuais (PERLIN, 2000) dos alunos surdos.
b) Prof.ª Maria. Escola Girassol
A professora Maria foi receptiva, me explicou sobre o Programa de Estimulação
Dinâmica (PED)34
, que trabalha com a estimulação da linguagem da criança a partir de
sete e oito meses até três anos de idade. O programa consiste em atividades
desenvolvidas com as crianças surdas por profissionais com a presença dos pais. O tema
da aula foi sobre o desenvolvimento da lagarta. Os pais participam das atividades
simultaneamente com os profissionais e as crianças. A professora cola purpurina na
folha dos alunos para representar a comida da lagarta. Ela usa várias cores para
estimular a criatividade dos alunos.
32
O ProDeaf é um software de tradução de texto e voz na língua portuguesa para Libras - a língua
brasileira de sinais (www.prodeaf.net). 33
O aplicativo Hand Talk é uma ferramenta gratuita, para Android e iOS, desenvolvida para conversão de
áudios e textos fotografados para a língua de sinais (https://handtalk.me/app). 34
O PED viabiliza-se o contato da criança com adultos usuários da Libras, motivando a comunicação,
propiciando o desenvolvimento da linguagem compatível com a faixa etária e favorecendo a futura
escolarização.
108
Nessa aula, foi interessante ver como a professora surda estimula a interação
entre os pais e as crianças em Libras. A interação entre pais e filhos possibilita o uso da
linguagem na produção dos sentidos - as trocas de forças entre os interlocutores.
Bakhtin (1999) define uma concepção de interação verbal através das relações que se
estabelecem entre o eu e o outro nos processos discursivos instaurados historicamente
pelos sujeitos. Segundo o autor, as interações se instauram pelo discurso, ou seja, o uso
da linguagem em qualquer contexto social manifesta-se através da interação verbal entre
os sujeitos.
Após o PED, a professora se dirige à sala de artes onde trabalharia com os
alunos do quarto ano. O tema abordado nessa turma foi a pintura de Van Gogh. Cada
aluno fez suas atividades e as realizou sem dificuldades. A professora ensina as cores,
temperatura (quente e frio). A professora faz diversas observações sobre arte, explica
cada detalhe e afirma que cada aluno deve fazer de seu jeito. A professora Maria sentou-
se à mesa, dando liberdade para que cada aluno mostrasse em exposição para classe o
que havia feito a partir do desenho de Van Gogh. A partir da exposição, a professora
pediu que cada um avaliasse e desse sua opinião sobre os demais trabalhos.
Posteriormente, um aluno questionou sobre as cores fortes do desenho e sobre as
possíveis escolhas de cores. Os colegas participaram da atividade em sala aula, em uma
atividade coletiva e prazerosa pautada em uma relação dialógica. Essa interação
comunicativa só é possível porque a Libras flui espontaneamente entre todos os
interlocutores na sala de aula. As discussões sobre o tema arte, cores, Van Gogh são
construídas em uma rede discursiva, em consonância com o que propõem Bakhtin
(1999):
Toda enunciação é uma resposta a alguma coisa e é construída como
tal. Não passa de um elo da cadeia dos atos de fala. Toda inscrição
prolonga aquelas que a precederam, trava uma polêmica com elas,
conta as reações ativas da compreensão, antecipa-as (BAKHTIN,
2006, p. 98).
Bakhtin (2009) afirma que “a língua se apresenta como uma corrente evolutiva,
ininterrupta”, ou seja, ela é viva e se modifica de acordo com os falantes, tempo e
discursos. O enunciador, ao constituir um discurso, contempla “o discurso do outro” que
está presente no seu discurso. O dialogismo constitui-se nas relações de sentido que se
estabelecem entre dois enunciados, contraditórios, divergentes ou convergentes.
Segundo aquele autor que o dialogismo acontece quando
109
(...) existem as trocas harmônicas entre sujeitos comunicantes, pondo
em foco os processos de negociação de significados, de cruzamento de
referentes culturais e de reinvenção da linguagem que atravessam
todos os atos linguísticos (BAKHTIN, 2003, p. 270).
A observação nessa aula de artes permitiu visualizar a importância fundamental
do profissional surdo como um interlocutor em Libras, na construção de conhecimentos
dos alunos, não só sobre o conteúdo da aula, mas, principalmente, como construtor ativo
da língua de sinais para aqueles alunos e ponte para a inserção nas culturas surdas em
que o sujeito está inserido, como afirma Reis (2007):
Minha reflexão sobre a realidade do acontecimento da existência da
identificação que se dá na relação entre os alunos e professores, quer
acreditar que a postura do professor surdo permite a identificação à
cultura surda. A cultura surda permite fazer emergir a identidade;
permite vincular valores para se construir, ou seja, adquirir língua de
sinais; permite identificar os valores surdos. A importância da
identificação é que ela nos faz entender as diversas posições
assumidas pelo sujeito para se identificar aos outros para valorizar o
seu ser. A partir daí o sujeito surdo inicia a produção cultural. (REIS,
2007, p. 91)
c) Prof. José. Escola Girassol
Na aula de teatro, o professor chega na sala para o ensaio sobre 30 de
setembro35
. Ao chegar na sala, o professor observou que alguns alunos não tinham
realizado a atividade solicitada anteriormente. Ele questiona o aluno e o aconselha.
Explica a importância de ter responsabilidade e compromisso, de se lembrar das tarefas.
O professor seleciona os alunos para escolher os personagens. Ele relata uma história
em que os personagens foram criados por ele. O aluno grita pelo nome do professor e
ele “ignora”. Ele adverte que é surdo, e que, portanto, “não precisa gritar”: “Para que
gritar?”. O professor explica as regras do teatro: pergunta para os alunos se podem
sinalizar de costas para o público e fala sobre o momento de apresentação dos
personagens.
Nessa observação, pude verificar a habilidade do professor de dirigir o processo
discursivo em sala de aula, o que tem grande influência no ato de aprender do aluno e
repercute no processo de ensino-aprendizagem.
35
Nessa data é comemorada o Dia Internacional do Surdo.
110
Na sala do quinto ano, o professor chega na sala e pergunta para os alunos se
lembram do vídeo “Slam36
”. Um aluno perguntou se o vídeo seria para ensaiar, o
professor responde “não, espera, quando acabar”. Após o fim da apresentação, ele
pergunta aos alunos o que perceberam no vídeo. O professor destaca que a “rima” em
Língua de Sinais é realizada com a realização de sinais com uma mesma configuração
de mãos37
. O professor pede para que os alunos criem duplas e façam a atividade de
modo semelhante à do vídeo, ou seja, que eles produzam uma poesia com sinais que
tenham a mesma configuração de mão. O professor explica novamente para que os
alunos possam entendem melhor. A contextualização, conforme Almeida (2007), é o
que “estabelece a margem e delimita os caminhos a serem percorridos” no trabalho do
professor. Nesse sentido, logo que deu início à aula, o professor fez uma
contextualização do trabalho desenvolvido na disciplina, discutindo com os alunos
sobre as atividades que haviam sido desenvolvidas até aquele momento e sobre os
trabalhados que seriam realizados “garantindo o comprometimento do aluno com o
futuro dele em relação ao conteúdo e, portanto, em relação à aprendizagem”
(ALMEIDA, 2007, p, 39).
O professor utilizou outro vídeo “Le Sign et le crocodil”38
na aula, para
exemplificar como a poesia em Língua de Sinais faz uso de repetição de uma mesma
configuração de mãos.
No dia seguinte, continuei a observação do professor José. Às oito horas da
manhã, teve início a aula de Libras para famílias. O professor deu boas-vindas aos
familiares. Pergunta a eles se trouxeram fotos da família para a aula. Com a ajuda dessa
foto, cada pai ou mãe apresentou sua família, utilizando os sinais em Libras. Quando
eles não se lembravam de determinado sinal, o professor pedia para imaginarem e
fazerem como pensarem. Ao final das apresentações, o professor explica a atividade que
deveriam realizar em casa sobre a cultura de um estado brasileiro (comidas típicas,
danças, costumes, clima, etc.) Ele pede que cada participante do curso traga uma
atividade de um estado do Brasil para exposição. Cada família deve tirar fotos e colocar
no cartaz para seus filhos verem.
Após a aula de Libras para as famílias, o professor se dirige para o segundo ano.
Na sala do segundo ano, o professor José ministra disciplina de Libras. Ele prepara as
36
Slam é uma batalha de poesia em Libras, semelhante ao “repente” em Línguas Orais. 37
Configuração de mãos é um dos parâmetros da língua de sinais, a qual compõe a estrutura do sinal. São
as diversas formas que uma ou as duas mãos tomam na realização do sinal. 38
https://www.youtube.com/watch?v=CMw_dAaID_g
111
atividades para os alunos surdos. A proposta dessa aula é que os alunos busquem sinais
que usem a configuração da mão correspondente à letra inicial do próprio nome ou sua
idade. Cita um exemplo: como a configuração de mão em F, que é a letra inicial do de
Felipe há os sinais de: feliz, férias, futuro, família, faculdade. Outro exemplo: com a
configuração de mão do numeral “5” há os sinais de: cobra, vampiro, inteligente,
perceber.
Desse modo, percebe-se que o professor busca ensinar a Língua de Sinais
enfatizando seus aspectos gramaticais e não somente oferecendo uma lista de vocábulos.
Na observação do professor José, pude verificar em dois momentos o ensino de
Libras: para os familiares e para a crianças surdas. Cabe destacar que essa é uma das
mais significativas funções do profissional surdo, embora não a única, como já apontada
nesse capítulo.
“O instrutor surdo é um educador que deve trazer para o espaço
escolar os valores, aspectos culturais, emoções e percepções da ótica
da pessoa surda; além de disso, ele é o representante da língua, da
cultura e da identidade surda no espaço escolar” [...] (SANTOS,
LOPES, LACERDA e OLIVEIRA, 2016, p. 129).
d) Prof. Francisco. Escola Girassol
O professor explica um pouco sobre a disciplina de contação de história. Nessa
disciplina, o professor realiza quatro etapas: primeiro o professor conta a história em
Libras. Em segundo momento, os alunos veem os livros e usam a imaginação para
inventar, complementar a história. Na terceira etapa é o próprio aluno que conta a
história em Libras. Essa contação realizada pelos alunos é registrada em vídeo. Por
último, o professor apresenta o vídeo para toda a classe. Nesse momento, cada um faz
sua crítica, dá sua opinião. O professor comenta o que precisa ser melhorado e
posteriormente ele faz um vídeo mais “formal” para os alunos aprenderem e entenderem
melhor a história. Depois de discussão, os alunos desenham sobre a história. O
professor explica para os alunos que eles têm meia hora para desenhar e depois iria
mostrar o vídeo dos alunos contando a história. Em seguida, após os alunos concluírem
os desenhos, formam uma rodinha e, com o tablet, o professor mostra para os alunos o
vídeo produzido por eles. Durante a discussão entre alunos e professor, ele ensina que
deve evitar a repetição do sinal “depois”. Os alunos avaliam e percebem que precisam
melhorar. Eles riem por repetir os sinais “depois”. Segundo o professor, um aluno fez
112
certo, e o restante repetiu. Eles pedem para filmar de novo, porém ele disse que
precisariam treinar primeiro e depois filmar.
Esse trabalho, segundo a perspectiva do professor, permitiria atitudes
responsivas ativas e contribuiria para a ampliação do repertório de informações
necessárias à compreensão da turma do segundo ano, prezando assim as relações
dialógicas em que devem se efetivar as práticas de linguagem em sala de aula,
ampliando o repertório, o que se preserva a linguagem, sua função de despertar a
imaginação e sentimentos, bem como sua possibilidade na construção de significados,
da forma que alia ao contexto da história, além de enriquecer o vocabulário.
Na perspectiva histórico-cultural, segundo Vygotsky (1998), a educação tem
como princípio a valorização o contexto histórico social do aluno. Evidencia-se a
necessidade de adaptar os métodos educacionais à realidade do aluno, uma vez que,
quando desvinculadas de seu contexto, as palavras tornam-se ocas, vazias de
significado, alienantes. Daí a necessidade de presença do profissional surdo na sala de
aula considerando as experiências concretas do cotidiano do aluno.
Nesse sentido, de acordo com a concepção de linguagem bakhtiniana, o sujeito
não se expressa apenas, ele age, atua com seu interlocutor, esperando deste uma
resposta. Assim, cada ato enunciativo, integra diversas vozes, ou seja, a presença do
profissional surdo acontece quando há interação com outros sujeitos, levando em
consideração o fato de que a língua é dialógica.
e) Prof.ª Ana. Escola Girassol
A professora Ana é auxiliar e fica na sala do Jardim I com outra professora
bilíngue ouvinte. Há cinco alunos de idade entre quatro e cinco anos na sala de aula. No
momento da observação, a atividade da professora foi a organização da rotina do dia. A
Professora Ana utilizou plaquinhas que continham gravuras das diversas atividades
daquele dia: chegada, banheiro, brincar, aula do Prof. Francisco (conto de história),
lanche, educação física, escova de dente, registro (desenho), hora do filme e saída.
Nessa atividade de organização da rotina, a professora ouvinte bilíngue ajudou a
executar a tarefa dos alunos, organizando as plaquinhas.
Como são bem pequenos, a presença da professora surda nessa sala possibilita a
aquisição da Libras em momento oportuno, sem que haja atrasos na aquisição
linguística, como define a proposta de educação bilíngue para surdos. Segundo Santos,
Lopes, Lacerda e Oliveira (2016)
113
[...] este tipo de educação visa oferecer as condições de aprendizado
necessárias ao alunado surdo por meio da língua de sinais – língua
esta que deve ser oferecida desde a mais tenra idade por meio do
contato com interlocutores surdos e usuários desta. Esta proposta
contempla o direito linguístico da pessoa surda e possibilita o acesso
ao conhecimento, à cultura e às relações sociais por meio de sua
língua de domínio, respeitando ainda suas condições diferenciadas de
aprendizado (metodologia própria) e os aspectos culturais e sociais
inerentes à surdez. (SANTOS; LOPES; LACERDA; OLIVEIRA,
p.128 – grifos meus, 2016).
f) Prof. Joaquim. Escola Girassol
O professor Joaquim ministra uma disciplina denominada “Brincar de
Aprender”. Essa é uma disciplina complementar desenvolvida para o Ensino
Fundamental em que os alunos desenvolvem atividades multidisciplinares com o
objetivo de retomar os conteúdos das aulas de modo lúdico. A disciplina ocorre em uma
sala multisseriada com alunos do quarto e quinto ano. O professor utilizou o aplicativo
“Edmondo” 39
como atividade no dia da aula. Ele pede aos alunos para pegarem o iPad
para utilizar na aula. Os alunos interagiram e ajudaram um ao outro, tiraram dúvidas
com o professor. Nesse aplicativo, os alunos registravam as atividades que tinham
realizado no dia da escola, como um diário. O objetivo dessa atividade é estimular a
escrita do português. Os alunos devem desenvolver suas atividades autonomamente com
a orientação do professor. Como cada aluno escrevia suas vivências diárias, ficava fácil
lembrar o que deveriam registrar, porém a escrita do português é sempre um processo
difícil para alunos surdos. Com a interação com o professor e os colegas iam tirando as
dúvidas e construindo seus registros. A interação e diálogo entre os alunos e o professor
surdo é uma valiosa oportunidade de aprendizagem das formas e modos de escrever em
português.
La actividad de producción de textos escritos se ve enriquecida
cuando existe la oportunidad de que el profesor y los alumnos
conversen acerca de lo que posteriormente van a escribir. La LS se
utiliza así para hablar antes de escribir, compartir ideas y crear
estímulos para el texto. A partir de una comunicación fluida en LS, el
profesor puede saber con detalle qué es lo que los niños desean
escribir. Esto ayuda a entender y corregir el texto producido por el
alumno, de manera que lo que el profesor sugiere refleje lo que los
39
Link do aplicativo Edmondo: https://www.edmodo.com/?language=pt-br
114
niños realmente quieren decir (LISSI, SVARTHOLM, GONZÁLEZ,
2012, p. 315)40
g) Instrutor Paulo. Escola Cravo
No curso de Libras para a comunidade externa, pessoas interessadas em
aprender Libras, mas sem nenhum vínculo com a escola. O professor inicia a aula
avisando que se esqueceu de trazer material para aula. Ele usaria um DVD, mas o iPad
estava sem bateria. O instrutor pergunta aos alunos o que fizeram no final de semana.
Pede que sinalizem o mês que nasceram e o dia também. No papel que ele distribuiu aos
alunos tinha em datilologia o sinal do numeral “um” com configuração de mão usando o
polegar, mas o professor avisa e diz que a configuração correta é com o dedo indicador
para utilizar a referência de quantidades. Ele alerta que o uso de ano por extenso tem
que ser soletrado com os números completos (exemplo 1986) e não os dois últimos
números. Faz jogo de pergunta: semana, cada aluno sinaliza a mesma coisa que o outro
sinalizou. O professor fez uma atividade para explicar o uso dos numerais em Libras.
i) Instrutor Pedro, instrutor da escola Tulipa.
O instrutor Pedro ministra aula de Libras para funcionários e comunidade
externa. O tema da aula foi sobre expressão facial, o instrutor utilizou a lousa como
recurso para ministrar a aula e ele próprio fez desenhos. Estes alunos que acompanham
não conseguem entender as palavras que o aluno sinaliza. Um aluno surdo oralizado
tentou explicar para os alunos, mas o professor interviu e alertou a não traduzir para os
alunos para que eles não ficassem dependentes do português e esquecessem a Libras. O
instrutor pediu para sinalizar novamente para cada aluno. Observei que esse profissional
surdo compreende que o educador precisa contextualizar a sua prática docente,
considerando o aluno como um sujeito integral e concreto. Segundo Vygotsky (1998),
cada indivíduo é historicamente situado, isto é, a partir da sua história de vida, tem um
capital cultural construído na interação com o meio em que está inserido. Os seres
humanos têm uma identidade que vai além de individual, é também coletiva e que o liga
40
Tradução livre da autora: A atividade de produção de textos escritos é enriquecida quando há a
oportunidade para o professor e os alunos conversarem sobre o que vão escrever posteriormente. As LS
(Língua de sinais) é, assim, usada para falar antes de escrever idéias compartilhar e criar incentivos para o
texto. A partir de uma comunicação fluida em LS, o professor pode conhecer em detalhe o que as crianças
querem escrever. Isso ajuda a entender e corrigir o texto produzido pelo estudante, de modo que o
professor sugere e reflete sobre o que as crianças realmente querem dizer.
115
aos grupos sociais com os quais convive. Para que haja a compreensão deste processo, é
necessário que o professor crie vínculos afetivos com seus alunos. Ele precisa ter em
mente que o seu aluno é um ser cheio de ideias, experiências próprias que precisa ser
escutado para a construção de seu conhecimento.
No processo de observação e intervenção em sala de aula, percebemos que um
dos fatores que interferem na produção de uma atitude responsiva ativa (BAKHTIN,
1999) não é apenas a limitação de conhecimentos anteriormente adquiridos, é também a
capacidade de identificação de informações implícitas, que, em alguns casos, fica a
depender de experiências de leitura e do uso corrente da língua. Nesse sentido, o
professor exerce um significativo papel.
4) Reflexões sobre as observações:
Nesse capítulo, busquei refletir sobre as práticas de educadores surdos a partir da
observação de suas atuações em quatros escolas diferentes. Os critérios utilizados para
essa análise foram: a) metodologia utilizada; b) didática; c) comprometimento com o
ensino; d) uso de materiais adaptados; e) conhecimento.
Entre as escolas observadas, a que tinha uma metodologia mais adequada ao
alunado surdo foi a Girassol. Nessa escola havia professores surdos que utilizavam
materiais adaptados para o ensino, tais como uso de tablet, exposição de vídeos, aulas
com muitas imagens com auxílio de datashow. Também nessa escola, os educadores
surdos tinham mais autonomia em preparar suas aulas, utilizando uma metodologia
própria e atividades com recursos preparados por eles. Também posso afirmar que a
didática, na escola Girassol, era mais adequada às especificidades das crianças surdas,
dentro de uma proposta bilíngue, em relação às outras escolas. Na escola Tulipa, o
profissional surdo tinha uma didática adequada para ensinar, mas em nenhum momento
pude observar que havia um planejamento prévio de atividades das aulas com o
professor ouvinte bilíngue. Embora houvesse uma boa parceria, me pareceu que o
educador surdo era mais um coadjuvante, ou seja, não tinha uma participação efetiva no
planejamento das aulas. O professor da escola Cravo não tinha nenhum
comprometimento com o ensino. Isso se deve de ele não se sentia convidado a participar
das reuniões escolares, como HTPC, conselho de classe, ou mesmo de colaborar com o
planejamento das aulas. É nítida a postura dele quando relata que os profissionais
ouvintes só o procuram para tirar dúvidas ou perguntar de um determinado sinal, o que
116
ele sentia como um “dicionário ambulante”. Em relação às escolas Girassol e Tulipa,
pude observar que muitos professores têm comprometimento com o ensino, não pela
questão de autonomia de dar aula, mas pelo fato de ter consciência plena de ensinar aos
alunos. Quanto ao uso de materiais adaptados observados em sala de aula, a escola
Girassol possui uma estrutura com recursos acessíveis para alunos surdos tais como
filmes, desenho, livros, tablet, entre outros. Já nas escolas Cravo e Tulipa, alguns
instrutores carregam seus tablets oferecidos pela secretária da educação e também
faziam desenhos na lousa como recurso para um entendimento maior. Quando
questionados sobre o conhecimento, pude observar que a formação não interfere o
conhecimento, já que todos possuem um conhecimento amplo na sua área de formação,
mas a atuação enquanto docentes difere de um para o outro. Pude constatar que há
diferença em relação com o cargo que o profissional surdo exerce nas escolas. Não há
diferença em relação ao conhecimento entre os educadores surdos observados. Mesmo
com o cargo de instrutor nas escolas Cravo e Tulipa, o conhecimento é o mesmo dos
professores da escola Girassol. No entanto, autonomia dos profissionais na docência,
planejamento e execução de atividades mostra-se distinta nas diferentes escolas, o que
determina o modo como o profissional se coloca em relação ao aluno surdo e ouvinte, o
que se faz notar na dinâmica de sala de aula. O posicionamento dos docentes permite
estabelecerem relações concretas de interação com os alunos que facilitem os processos
de aprendizagem.
117
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A pesquisa aqui descrita teve como objetivo compreender o perfil do
profissional surdo e sua função no ambiente educacional, destacando sua formação
técnica pedagógica e refletir sobre os reflexos de sua atuação na formação dos alunos
surdos. Para tal, utilizamos dois corpora de pesquisa: questionário online e observação
em sala de aula.
Com base nas análises dos questionários associadas às observações em sala de
aula, pode-se constatar que há diferenças na função do profissional surdo em diferentes
contextos educacionais.
Nos questionários, 19 respondentes disseram que são contratados como
professores e 12 como instrutores, sendo que há sujeitos que são contratados com as
duas denominações, pois trabalham em mais de um local. Dos respondentes, 90% tem
formação em nível superior, o que se configura como uma contradição, pois, mesmo
sendo graduados, são ainda contratados como instrutores.
Observa-se que dos que são contratados como professores, a maioria está em
instituições de Ensino Superior. Na educação básica, os surdos são, em sua maioria,
contratados na função de instrutores. Somente 3 profissionais surdos que responderam
ao questionário disseram que são contratados como professores na educação básica.
Essa realidade revela uma subordinação do profissional surdo em relação ao
profissional ouvinte dentro das escolas, ou seja, ainda se mantém uma lógica ouvintista
na educação dos surdos. Mesmo que haja profissionais surdos dentro dos espaços
escolares, o saber legítimo é o do profissional ouvinte. Esse sim é denominado
“professor”.
O problema é que ainda não estamos conseguindo considerar o Outro
através de sua alteridade. Não nos preocupamos em escutar o que nos
dizem. Tratamos suas falas como produções marginais e
desarticuladas. (No caso dos surdos, essa desarticulação é entendida
literalmente.) Silenciamos a eles para que possamos continuar a falar
por eles (SKLIAR e SOUZA, 2004, p.16).
Seria importante que os professores bilíngues ouvintes realizassem o
planejamento das aulas com o professor surdo de forma que o currículo fosse
organizado partindo de uma perspectiva visual e espacial para que o processo
educacional ocorra mediante a interação linguística, tendo a Libras como língua de
118
instrução. O professor surdo é peça fundamental na organização e planejamento
curricular, ou seja, ele não deve ser o profissional de apoio, ou aquele que tira dúvidas
do professor ouvinte sobre algum sinal ou sobre o melhor procedimento para ensinar
algum conteúdo, mas ao contrário, ele deve ser parceiro na elaboração das atividades
acadêmicas, pensando junto com o professor ouvinte e toda a equipe docente o trabalho
pedagógico.
Da mesma forma quando comparadas as diferentes escolas onde se realizaram as
observações, percebe-se diferentes funções atribuídas aos profissionais surdos.
Enquanto a escola Girassol possui professores que exercem a docência com autonomia,
ou seja, os próprios professores são responsáveis pelas disciplinas da grade curricular do
Ensino Fundamental, nas escolas Cravo e Tulipa, o profissional surdo acompanha o
professor ouvinte bilíngue nas disciplinas da grade curricular. Apenas o curso de Libras
para a comunidade é exercido pelo instrutor surdo de modo autônomo, sem a parceria
do professor ouvinte. É notável o cenário que vem acentuando as ambiguidades, uma
vez que, nos espaços escolares em que os profissionais surdos não têm autonomia como
docentes junto aos alunos surdos, sua denominação é de “instrutor”. Já em uma escola
(Girassol) em que os profissionais surdos trabalham autonomamente com os alunos
surdos, sua denominação é “professor”. Cabe destacar que os instrutores e os
professores têm os mesmos conhecimentos embora o regime de trabalho e as condições
salariais sejam bastante diferentes.
Ser denominado “professor” como o docente ouvinte estabelece uma igualdade
desde o modo como são designados até as funções e responsabilidades pelo processo
pedagógico e pela aprendizagem do aluno. Terem a mesma designação os coloca em pé
de igualdade.
No processo de observação em sala de aula, pude perceber que um dos fatores
que interferem na produção de uma atitude responsiva ativa não é apenas a limitação de
conhecimentos anteriormente adquiridos, é também a capacidade de identificação de
informações implícitas, que, em alguns casos, fica a depender de experiências do
indivíduo e do uso corrente da língua.
A interação dialógica dos alunos surdos com o professor surdo permite atitudes
responsivas ativas e contribuiria para a ampliação do repertório de informações
necessárias à compreensão da turma do ensino fundamental I em que atua como docente
Além disso, na relação com o professor, a compreensão ativa pode ser efetivada nas
aulas, e as reflexões sobre os fenômenos linguístico-discursivos, utilizadas como
119
recurso para a promoção da interação, logo, da dialogicidade, ou seja, a própria língua
de sinais pode ser refletida e analisada pelos processos metalinguísticos como
observados na aula dos professores José e Francisco. Essas produções representam
manifestações de compreensão ativa que integram o ato comunicativo como ordem
natural do diálogo e se estabelece nas relações sociais. Entretanto, sob nossa
perspectiva, ela constitui-se como posições dialógicas e responsivas ativas que são
elaboradas. Essas experiências de interação do profissional surdo confirmam o papel
decisivo dos profissionais surdos nas orientações das atividades no ensino para que os
alunos desenvolvam uma posição de dialogicidade nos diferentes contextos
interlocutivos de que participam, seja na escola ou em outros de seu cotidiano. Nesse
sentido, o professor exerce significativo papel como interlocutor na aquisição e
desenvolvimento da língua de sinais, bem como na consolidação de conceitos pelos
alunos surdos. A importância do professor surdo na educação pode ser corroborada pela
citação de Bakhtin: “O homem é ser essencialmente social e histórico que, na sua
relação com outros, em uma atividade prática comum, intermediado pela linguagem, se
constitui e se desenvolve enquanto sujeito” (BAKHTIN, 1999).
Bakhtin (1999) redefine o papel dos principais componentes da interação verbal.
Para ele, não existe o ouvinte e o entendedor, porém existe o falante e o ouvinte, e este
último, ao perceber o significado do discurso, ocupa uma ativa posição responsiva. Isso
ocorre a partir da mobilização de uma atividade mental com os signos envolvidos na
interação verbal que, em diálogos com outros anteriores, promovem outros discursos.
Nessa pesquisa, a prática de observação foi de fundamental importância para
compreender a realidade da formação do profissional surdo e, principalmente, os
aspectos que o professor encontra ao ministrar as aulas, considerando que a formação e
o cargo possuem diferentes realidades tipo de contratação e da instituição. O instrutor
não é enquadrado como professor, mas deveria ser, uma vez que sua prática é de
docente.
O que pôde ser percebido nos dados coletados com a pesquisa é que há
profissionais surdos de diversos perfis atuando nas escolas, e que adotam, modos de
atuação distintos na sua prática docente, tentando de alguma maneira solucionar os
problemas. Os alunos apresentam necessidades em comum, porém, os professores
divergem em algumas questões, mas parecem buscar por um mesmo objetivo: aulas
produtivas.
120
No processo de observação em sala de aula, percebe-se que um dos fatores que
interferem na produção pedagógica não é apenas a limitação de conhecimentos
anteriormente adquiridos, metodologia, didática, é também a limitação da autonomia em
exercer a docência que, em alguns casos, fica dependente dos professores ouvintes
bilíngue. Os dados da análise apontam que a função do profissional surdo dentro da
escola interfere de uma forma diferente no trabalho pedagógico. Essa diferença se
expressa na autonomia ou não para a docência, sejam nos conteúdos ensinados, nos
acontecimentos em sala de aula, na aprendizagem dos alunos e também com o modo
como o professor lida com as situações que ali encontra. Sob essa ótica, essa
organização não se reduz à aplicação de métodos e à realização de prescrições e, nem
tão pouco, se esgota no desenvolvimento de habilidades para o desempenho de seu
trabalho.
Neste sentido, a pesquisa realizada permite identificar três momentos claramente
definidos e datados que passamos a aprofundar.
O primeiro momento foi a fase de lutas, dúvidas, incertezas e confusões. Em
1999, após o congresso, a formação do professor surdo começou a ganhar força. A
FENEIS passou a se posicionar e questionar sobre a formação do professor surdo,
ganhando destaque o início do curso de formação organizado pela instituição. O curso
de formação de instrutores em parceira com o MEC e o CORDE41
tem grande
divulgação com matérias no portal da FENEIS nas quais se destacam os surdos
formadores.
Consta-se que a análise dos materiais coletados revela que a formação se
encontrava de forma tímida, uma vez que não existia formação específica no ensino
superior que possibilitasse um modelo referencial que apontasse definitivamente para a
formação profissional qualificada. Por outro lado, começa a reivindicação e o
posicionamento de novas profissões na época do congresso, como mostra a revista
FENEIS com uma matéria intitulada "as comunidades surdas reivindicam por novas
profissionais: instrutor de Libras e intérprete de Libras” posicionado pelos membros do
Grupo de Pesquisa de Língua Brasileira de Sinais e de Cultura Surda Brasileira, que
pedem o reconhecimento dessas duas novas profissões (FENEIS, 1999). O segundo
momento inicia a construção da visibilidade na formação do docente surdo, após o
Decreto n° 5.626 de 2005. A problemática da formação por meio de decreto ganha
41
CORDE (Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa com Deficiência).
121
projeção nacional ao ser objeto de respeito à formação docente. Por sua vez, o Letras
Libras ganha destaque na formação do profissional surdo. O curso de graduação foi o
fato principal que viabilizou a atuação do docente dando maior reconhecimento à
profissão do ensino da língua de sinais e, consequentemente, a visibilidade de uma
pedagogia construída por e pelos surdos. O terceiro momento é o de valorização,
visibilidade e reconhecimento da profissão a serem enfrentados como desafio em busca
de questões centrais da política educacional brasileira, evidenciando uma ruptura e
distinção entre professor surdo e instrutor surdo. Constata-se o consenso existente no
cenário educacional em torno da legibilidade da formação do docente, uma vez que as
instituições adotam esse sistema para manter o empoderamento da formação. A
formação docente será o objeto mais específico dos estudos e de pesquisa no próximo
capítulo. Requer, assim, que se encontre um sentido e uma forma de organização social
que, assegurando o respeito à profissão do docente surdo, solucione divergências,
viabilize um fim comum: uma educação de qualidade e de identidade para os surdos.
A proposta da formação do profissional surdo se configura ainda como uma
nova concepção da docência. A construção da concepção de profissional surdo
certamente se apresenta em sua constituição histórico-social como processo advindo do
desenvolvimento das diversas abordagens na área da surdez, tendo se iniciado no
movimento da comunidade surda desde o pré-congresso em Porto Alegre (RS)42
e que
repercutiu sobre a realidade brasileira. No Brasil, a formação do professor surdo é algo
que está ainda longe de ser considerada ideal, portanto muito ainda deve ser estudado,
discutido e construído. Como diz Martins (2010), a identidade do docente surdo ainda
está constantemente em construção em busca de uma formação sólida, uma vez que as
produções teóricas mostram o quanto as temáticas vão demarcando alguns avanços no
campo linguístico e educacional.
A cada passo conquistado pela proposta da formação do docente surdo como
uma garantia de direito de uma carreira digna, observou-se a incidência dos reflexos
dessas medidas sobre as produções teóricas, assim como, o desenvolvimento teórico a
partir das pesquisas realizadas sobre a formação do profissional surdo pode ter
subsidiado a elaboração de documentos que mostram cada vez mais fundamentos mais
aprofundados e comprometidos, ao menos em seu texto teórico, com o rompimento de
paradigmas, de concepções e de práticas que revelam a discriminação na formação do
42
V Congresso Latino Americano de Educação Bilíngue para Surdos, realizado em Porto Alegre no salão
de atos da reitoria da Universidade Federal de Rio Grande do Sul nos dias 20 a 24 de abril de 1999.
122
docente surdo. Isso indica que a formação do profissional educador surdo necessita de
uma identidade sólida. Aponta-se a relevância de iniciativas no sentido de compreender
a formação do profissional surdo como uma característica de marca histórica, como diz
Machado (2010), de educação especial para inclusiva e de inclusiva para a bilíngue.
Esse “mergulho na docência” permitiu que se identificasse a ampliação de
sentidos e significados da prática docente dos profissionais surdos. A partir da reflexão
mediada e compartilhada sobre a prática docente e o que pensamos sobre o papel desses
profissionais e sobre as concepções de conhecimento, aprendizagem, ensino,
metodologia evidenciadas nas interações discursivas expressas nos episódios é que
notamos como eles foram ampliando os sentidos e os significados da prática docente.
A mediação, além de pedagógica, pode ser concebida como facilitadora das
trocas dialógicas entre os professores que se materializam nos modos de elaboração de
conhecimento pelo sujeito.
Essa pesquisa dá visibilidade a algumas necessidades prementes:
- Abertura de novas escolas bilíngues ou classes bilíngues que contratem
profissionais surdos em seu quadro docente como professores, gestores e monitores;
- Revisão dos contratos de profissionais surdos nos serviços públicos com
concursos que tenham em seu edital a nomenclatura “professor de Libras” com
prioridade para pessoas surdas;
- Promoção de autonomia para os professores surdos nos espaços escolares, de
modo que possam assumir a docência sem a tutela dos profissionais ouvintes.
- Revisão e reestruturação do Decreto n° 5.626 de 2005, modificando os termos
que indicam o termo “instrutor”, para “professor”, no caso de profissionais graduados.
Faz-se cada vez mais evidente pensarmos sobre as necessidades de se construir
uma prática educativa inovadora, pautada na construção e reflexão da formação do
profissional surdo, que possibilite agir, transformar e refletir na prática educativa dos
docentes. É preciso pouco a pouco, através dos desafios do contexto em que se vive
olhar e perceber os obstáculos como possibilidades de construção do novo. Para que
essas mudanças aconteçam e a escola consiga exercer seu papel, é necessário que todos
caminhem juntos, surdos e ouvintes, para a construção de uma educação de qualidade
para crianças, jovens e adultos surdos com professores, diretores, pesquisadores surdos.
É necessário criar condições e visibilidade para o profissional educador surdo.
123
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133
ANEXOS
134
COMPROVAÇÃO DO TERMO DE CONSENTIMENTO PARA PESQUISA DO
QUESTIONÁRIO E DA OBSERVAÇÃO
135
136
TERMO DE CONSENTIMENTO ON-LINE DO QUESTIONÁRIO
Pesquisadora responsável: Daniele Silva Rocha.
Orientadora: Prof.ª. Dra. Lilian Cristine Ribeiro Nascimento.
“A inserção do profissional surdo na docência do ensino fundamental dentro da proposta educativa
bilíngue termo de consentimento livre e esclarecido a inserção do profissional surdo na docência do
ensino fundamental dentro da proposta educativa bilíngue”.
Você está sendo convidado (a) a participar como voluntário (a) de um estudo. Este
documento, chamado Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, visa assegurar seus direitos
como participante. Se quiser, pode imprimir uma via. Esta via impressa deverá ficar com você e
outra online ficará com a pesquisadora.
Por favor, leia com atenção e com calma, aproveitando para esclarecer suas dúvidas. Se
houver perguntas antes ou mesmo depois de assiná-lo, você poderá esclarecê-las com a
pesquisadora. Se preferir, consulte seus familiares ou outras pessoas antes de decidir participar. Se
você não quiser participar ou retirar sua autorização, a qualquer momento, não haverá nenhum tipo
de penalização ou prejuízo.
Justificativa e objetivos: A pesquisa “A inserção do profissional surdo na docência do ensino
fundamental dentro da proposta educativa bilíngue” tem por objetivo compreender a presença do
profissional surdo na sala de aula de escolas públicas e privadas no Estado de São Paulo, observando
a formação técnica-pedagógica desse educador e com vistas a refletir sobre os reflexos de sua
atuação na formação dos alunos surdos. Também irá refletir sobre o diferencial de um professor
surdo em sala de aula e no sistema de ensino que atua em relação aos sistemas que não incluem esse
educador e elencar estratégias de ensino utilizadas (e que vierem a se mostrar válidas) pelo professor
surdo com os seus alunos surdos. Assim, acreditamos o que o projeto se propõe a dar visibilidade à
atuação de professores surdos, à sua formação e à relevância da presença desse profissional para os
alunos surdos, prevista em lei e não cumprida pelos sistemas escolares, pois existem poucos
professores surdos nas instituições de ensino.
Procedimentos: Participando do estudo você está sendo convidado (a) a responder a um
questionário com perguntas abertas e fechadas. O tempo necessário para se responder a essas
questões pode ser de quinze a trinta minutos. Os dados obtidos no questionário serão analisados
constituindo parte dos resultados dessa pesquisa
137
Desconfortos e riscos: A participação na pesquisa não trará nenhum risco para o participante e nem
prejudicará quaisquer atividades que você já realize na instituição.
Benefícios: A participação na pesquisa não trará benefícios diretos para o participante. No entanto,
você poderá ser beneficiado de maneira indireta, uma vez que as reflexões que serão feitas na
pesquisa contribuirão para o aprofundamento das discussões já existentes sobre a formação de
professor surdo.
Sigilo e privacidade: Você tem a garantia de que sua identidade será mantida em sigilo e nenhuma
informação será dada a outras pessoas que não façam parte da equipe de pesquisadores. Na
divulgação dos resultados desse estudo, seu nome não será citado.
Ressarcimento: Não haverá ressarcimento de despesas (por exemplo, transporte, alimentação), pois
o estudo será feito durante sua rotina habitual de participação das atividades desenvolvidas na
instituição que você já frequenta.
Contato: Em caso de dúvidas sobre o estudo, você poderá entrar em contato com a Daniele Silva
Rocha por e-mail danirocha20@gmail.com, da Faculdade da Educação – Departamento de
Psicologia Educacional/ FE - UNICAMP – Rua Bertrand Russell, 801. Cidade Universitária
Zeferino Vaz, Campinas-SP, CEP: 13083-865. Em caso de denúncias ou reclamações sobre sua
participação e sobre questões éticas do estudo, você pode entrar em contato com a secretaria do
Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da UNICAMP: Rua: Tessália Vieira de Camargo, 126; CEP
13083-887 Campinas – SP; telefone (19) 3521-8936; fax (19) 3521-7187; e-mail:
cep@fcm.unicamp.br (mailto:cep@fcm.unicamp.br).
Consentimento livre e esclarecido: Após ter sido esclarecimento sobre a natureza da pesquisa, seus
objetivos, métodos, benefícios previstos, potenciais riscos e o incômodo que esta possa acarretar,
aceito participar.
Responsabilidade do Pesquisador: Asseguro ter cumprido as exigências da resolução 466/2012
CNS/MS e complementares na elaboração do protocolo e na obtenção deste Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido. Asseguro, também, ter explicado e fornecido uma cópia deste
documento ao participante. Informo que o estudo foi aprovado pelo CEP perante o qual o projeto foi
apresentado. Comprometo-me a utilizar o material e os dados obtidos nesta pesquisa exclusivamente
para as finalidades previstas neste documento ou conforme o consentimento dado pelo participante.
Há 26 perguntas no questionário.
Uma observação sobre privacidade: O questionário é anônimo. O registro de suas respostas não
contém nenhuma informação de identificação sobre você, a não ser que uma pergunta específica da
pesquisa explicitamente solicitou. Se você usou um código de identificação para acessar esta
138
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respostas. Ele é armazenado em uma base de dados separada e será atualizado apenas para indicar se
você completou (ou não) a pesquisa e não há nenhuma maneira de relacionar os códigos de
identificação com suas respostas.
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QUESTIONÁRIO ON-LINE
1) PERFIL DO PROFISSIONAL SURDO
1) Idade?
A sua resposta deve ser entre 15 e 99
Somente um valor inteiro pode ser informado neste campo.
2) Em que Estado do Brasil você mora?
Escolha uma das seguintes respostas:
Por favor, selecione...
3) Com quantos anos começou a aprender a Libras?
A sua resposta deve ser entre 1 e 99
4) Onde aprendeu a Libras?
Escolha a(s) que mais se adeque(m)
Amigos
Família
Escola
Igreja
Outro
Outros:
2) FORMAÇÃO ESCOLAR E ACADÊMICA
5) Onde estudou na educação básica (fundamental e médio)?
Escolha a(s) que mais se adeque(m)
Comentar apenas quando você selecionar uma resposta.
Regular (sem intérprete). Quantos anos?
Inclusiva (com intérprete). Quantos anos?
Especial. Quantos anos?
Bilíngue. Quantos anos?
6) Tem formação de graduação?
Sim
Não
Sem resposta
7) Se responder sim, qual a sua formação?
Escolha uma das seguintes respostas:
Pedagogia
Letras Libras
Outros:
8) Sua graduação foi em universidade / faculdade:
Escolha uma das seguintes respostas:
Pública
Particular
Sem resposta
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9) Durante sua graduação, você teve intérprete?
Escolha uma das seguintes respostas:
Sim
Não
Só em parte do tempo
Sem resposta
10) Informe os cursos complementares que você fez.
11) Informe os seus cursos de pós-graduação.
3) EXPERIÊNCIA PROFISSIONAL
12) Em quantas instituições já deu aula?
Somente um valor inteiro pode ser informado neste campo.
13) Quais disciplinas?
Escolha a(s) que mais se adeque(m)
Libras na educação básica
Ensino fundamental I (1º ao 5º ano)
Ensino fundamental II (6º ao 9º ano)
Ensino médio
Libras no ensino superior
Outros:
14) Duração de experiência em docência?
Escolha uma das seguintes respostas:
1 a 3 anos
4 a 7 anos
Mais de 8 anos
Sem resposta
15) Nas instituições em que você trabalha (ou trabalhou), você (era) contratado
como?
Escolha a(s) que mais se adeque(m)
Professor
Instrutor
Outros:
16) No seu emprego atual, qual o tipo de contrato?
Por favor, selecione uma resposta
Celetista
Temporário
Contrato
Efetivo
Outros:
4) VISÃO SOBRE ATUAÇÃO PROFISSIONAL
17) Por que você escolheu a profissão?
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18) Por que trabalha em uma escola para surdos?
19) O que levou a escolher essa profissão? Justifique.
20) Pelo fato de ser surdo, a escolha da sua pro�são foi por causa da facilidade
da vaga no mercado de trabalho?
21) Você acredita que a profissão de professor é a que mais "valoriza" e respeita para
pessoa surda no mercado de trabalho?
22) Ao longo da experiência profissional, o que você sente falta e precisa para melhorar a
proposta educativa bilíngue dentro da escola?
23) Qual sua função na escola? Que atividades você realiza?
24) Como é sua relação com a equipe docente e gestora da escola?
25) Para você, qual a diferença entre professor e instrutor?
26) Você já foi contratado como instrutor, mesmo depois de ter concluído suaformação
como professor? Como você se sentiu?