Post on 25-Oct-2020
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE FEIRA DE SANTANA
DEPARTAMENTO DE LETRAS E ARTES
CURSO DE LICENCIATURA EM LETRAS COM
ESPANHOL
SUSY MARA RIBEIRO CERQUEIRA PEREYRA
A VIDA NEGRA E AS NEGRAS METÁFORAS DE CAROLINA MARIA DE JESUS
NO QUARTO DE DESPEJO
FEIRA DE SANTANA
2018
SUSY MARA RIBEIRO CERQUEIRA PEREYRA
A VIDA NEGRA E AS NEGRAS METÁFORAS DE CAROLINA MARIA DE JESUS
NO QUARTO DE DESPEJO
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado
como requisito para a conclusão do Curso de
Licenciatura em Letras com Espanhol, do
Departamento de Letras e Artes, da
Universidade Estadual de Feira de Santana.
Orientador: Professor Mestre Antônio Anilson
Rodrigues da Silva
FEIRA DE SANTANA
2018
TERMO DE APROVAÇÃO
SUSY MARA RIBEIRO CERQUEIRA PEREYRA
A VIDA NEGRA E AS NEGRAS METÁFORAS DE CAROLINA MARIA DE JESUS
NO QUARTO DE DESPEJO
Monografia aprovada como requisito parcial para obtenção do Grau de Licenciada em
Letras,Língua Espanhola e Literaturas, da Universidade Estadual de Feira de Santana –
UEFS -, pela seguinte Banca Examinadora:
____________________________________________________________
Prof. Me. Antonio Anilson Rodrigues da Silva (Orientador) - UEFS
____________________________________________________________
Profa. Dra. Jolanta Rekawek (UEFS)
____________________________________________________________
Prof. Dr. Edson Oliveira da Silva (UEFS)
Feira de Santana __________de _____________________________de 2018.
DEDICATÓRIA
À minha família, meu porto seguro. E, em especial, à minha amada
mãe Carlinda, que, inconformada por eu ter abandonado, por longos
anos, meus estudos, teve a determinação e realizou minha matricula
em um colégio de curso supletivo.
À minha querida irmã Carla, que realizou minha inscrição para eu
prestar o vestibular e degustar desse mundo acadêmico.
Ao meu querido irmão pelo apoio. Um herói em nossa vida.
Ao meu marido Osvaldo Pereyra, e à minha filha amada Laura, por
tudo, e tudo.
Aos inesquecíveis em minha vida: meu pai Sinval e minha avó Isaltina
(em memória).
AGRADECIMENTOS
A Deus e a Nossa Senhora, sempre! Palavras nesse momento não conseguiriam
expressar o meu total agradecimento.
Aos meus pais, que souberam nos educar, que trabalharam com dignidade, sempre
direcionados a promover o melhor para mim e meus irmãos.
Ao meu amado e compreensivo marido e à minha amada e colaboradora filha.
Aos meus queridos irmãos Carla e Sandoval: minhas referencias.
À minha Cunhada Quezia e ao meu cunhado Adalberto, pela atenção e apoio.
Aos meus sobrinhos Keyse, Kathllyn, Kelven, Bryan e Robert, pelos momentos
compartilhados a cada conquista realizada.
Ao meu amado mestre, Antonio Anilson Rodrigues da Silva, professor exemplar,
pessoa de incrível sensibilidade, admirável inteligência, por sua amizade, partilha e por ter-me
apresentado a obra Quarto de despejo, no inicio do curso. E que hoje se torna objeto de estudo
para a realização deste trabalho. Cabe apenas esta palavra: gratidão.
À minha querida professora Jolanta Rekawek, por me ter mostrado o significado da
palavra “artes” em nome do Departamento do curso de Licenciatura de Letras com espanhol.
Por grandes momentos compartilhados de aprendizagem, de criatividade: uma inesgotável
inspiração.
Ao professor Edson, pela compreensão e dedicação. Um profissional competente e
com um diferencial próprio no ensinar.
Aos mestres Roberval Pereyr, Andréa Santos, Rosana Santos e Ana Jaci, pelo respeito
e dedicação, e por serem exemplos de professores ícones, de cujas imagens nós nunca
esquecemos. Profissionais por vocação.
À professora Milenna Brun, pelas orientações, informações e contribuição durante o
processo de elaboração do projeto de pesquisa.
Ao Programa Portal, na pessoa da professora Iranildes Oliveira, pela acolhida, pelo
aprendizado adquirido, pois é a mesma de grande relevância para minha vida acadêmica.
Ao coral UEFS, na pessoa da maestrina Rosa Eugenia, por todo o canto e encanto
proporcionados, momentos de prazer e alegrias.
Ao grupo de Leigos: Família Salvatoriana, pela compreensão, incentivo, partilha e
comunhão.
Às minhas amigas Eremita e Gleice, pelos momentos compartilhados, e a todos os
meus queridos colegas e professores que fizeram e fazem parte dessa conquista.
EPÍGRAFE
A vida é igual um livro. Só depois de ter lido é que sabemos o
que se encerra.
Carolina Maria de Jesus
RESUMO
O presente trabalho tem por finalidade discorrer sobre as estratégias de enfrentamento vividas
pela autora e protagonista Carolina Maria de Jesus, mulher negra, mãe solteira, favelada que
sobrevive em um quarto de despejo, nome dotado pela própria Carolina para assim batizar a
favela do Canindé situada na cidade de São Paulo. Em meados dos anos 1960, Carolina vê sua
vida mudar: por meio de seus escritos em cadernos encardidos encontrados no lixo, ela
relatava seu cotidiano de miséria. Tais registros vieram a público após o olhar do jornalista
Audálio Dantas, que buscava fazer uma reportagem sobre uma favela que se expandia às
margens do rio Tietê. O jornalista viu nos registros de Carolina tudo aquilo de que precisava
para a matéria que procurava produzir. Diante desse grande acontecimento literário, a obra
“Quarto de Despejo (Diário de uma favelada)” traz, em seu contexto, temáticas abordadas
pela autora que revelam fatos chocantes. Fatos que emocionam, denunciam e despertam
interesse em se saber sobre os fatores que contribuíram para a atividade literária dessa mulher,
que, diariamente, travava uma luta para derrotar a maior inimiga que a acompanhava
cotidianamente: a fome. Dessa maneira, ao analisarmos as temáticas: negro, favela e
sobrevivência, surgem várias possibilidades como respostas satisfatórias, de acordo com o
embasamento teórico apresentado neste trabalho.
Palavras-chave: Favela. Mulher negra. Estratégia. Sobrevivência.
RESUMEN
El presente trabajo tiene por finalidad discurrir sobre las estrategias de enfrentamiento vividas
por la autora y protagonista Carolina María de Jesús, mujer negra, madre soltera, favelada que
sobrevive en un cuarto de desalojo, nombre dotado por la propia Carolina para así bautizar la
favela del Canindé situada en la ciudad de São Paulo. A mediados de los años 1960, Carolina
ve su vida cambiar: por medio de sus escritos en cuadernos mugrientos encontrados en la
basura, ella relataba su cotidiano de miseria. Tales registros vinieron a público tras la mirada
del periodista Audalio Dantas, que buscaba hacer un reportaje sobre una favela que se
expandía en las orillas del río Tietê. El periodista vio en los registros de Carolina todo lo que
necesitaba para el reportaje que quería escribir. En el contexto de este gran acontecimiento
literario, la obra "Cuarto de Despejo (Diario de una favelada)" trae, en su contexto, temáticas
abordadas por la autora que revelan hechos chocantes. Los hechos que emocionan, denuncian
y despiertan interés en saber sobre los factores que habían contribuído a la actividad literaria
de esa mujer, que, diariamente, trababa una lucha para derrotar a la mayor enemiga que la
acompañaba cotidianamente: el hambre. De esta manera, al analizar las temáticas: negro,
favela y supervivencia, surgen varias posibilidades como respuestas satisfactorias, de acuerdo
con el fundamento teórico presentado en este trabajo.
Palabras clave: Favela. Mujer negra. Estrategia. Supervivencia.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 4
2. CAROLINA MARIA DE JESUS E A ESCRITA ............................................................. 9
2.1 FAVELA: VIVER OU SOBREVIVER? ....................................................................... 15
2.2 A ESCRITA, A DENÚNCIA: UM REGISTRO ............................................................ 16
2.3 FAVELA – QUARTO DE DESPEJO ........................................................................... 17
3 SERIAM MESMO ESCRITOS DA NEGRA CAROLINA? .......................................... 18
3.1 CAROLINA SAI DA FAVELA .................................................................................... 21
3.2 CAROLINA, AGORA: EX FAVELADA ...................................................................... 21
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................................. 27
REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 30
ANEXOS ................................................................................................................................. 32
4
1 INTRODUÇÃO
Em um ambiente onde predominavam: falta de condutas morais, fome, miséria,
desemprego, sexo na presença dos próprios filhos; roubos, injúrias, ofensas, desacatos,
violência a mulheres pelos próprios maridos, Carolina Maria de Jesus, mulher negra, mãe
solteira, três filhos, cada um com um pai, catadora de papelão para sustento do lar, lutava
contra todas as adversidades para educar os filhos e dar-lhes uma vida cidadã. E, mesmo com
tantas adversidades a que estava submissa, Carolina Maria de Jesus jamais se rendeu, jamais
se subjugou a um homem. Mantinha, ao contrário, uma consciência bastante critica e
analítica quanto aos mais diferentes tipos de violência, sobretudo da violência contra a
mulher. De fato, a miséria e a fome, mesmo sendo grandes mazelas sociais, podem provocar
ira em várias pessoas, quando as vitimas desse sistema não se corrompem e não se deixam
alienar.
A partir de cadernos encontrados no lixo, Carolina, ao anotar o cotidiano putrefato da
favela do Canindé, em São Paulo, produziu uma das mais importantes obras da literatura
brasileira: “Quarto de Despejo (Diário de uma Favelada)”.
A escrita, além de ser uma das tecnologias mais importantes criadas pelo homem,
pode contribuir eficazmente para se fazerem denúncias e levar à ascensão aqueles que a usam.
Carolina, sem duvida, através dessa mesma tecnologia da escrita, produziu um dos mais
importantes mosaicos da literatura brasileira, o que tem sido objeto de pesquisas de diversos
universitários brasileiros e dos mais diferentes países.
A obra literária “Quarto de Despejo (Diário de uma favelada)”, conhecida
mundialmente, apresenta-nos sua autora e protagonista Carolina Maria de Jesus, mulher
negra, mãe solteira e moradora da favela do Canindé, que, por volta dos anos de 1960, viu a
realidade de sua vida mudar, ao deixar de viver na favela, que era o seu maior desejo.
Carolina relatava sua historia de vida em cadernos encontras no lixo, e tal realidade
proporcionou que seus relatos viessem a público ao se tornarem uma obra conhecida. Diante
desse acontecimento literário, surgem os questionamentos: De que maneira as temáticas
negro, favela, sobrevivência são abordadas no livro Quarto de Despejo? Quais são as
estratégias de enfrentamento da autora? Como essas mesmas estratégias contribuíram para a
sua atividade literária?
5
Para desenvolvermos este trabalho, analisamos quais foram as estratégias de
enfrentamento utilizadas por Carolina Maria de Jesus para conseguir sobreviver em um
ambiente putrefato e de abandono que era o de se viver na favela do Canindé. E a favelada
autora chamava de Quarto de despejo a favela, quando comparava o centro da cidade como
uma sala de estar com os lustres de cristais, tapetes de veludo. No entanto, a favela era um
local que juntava tudo aquilo que era inútil, fora de uso, digno de estar em um “quarto de
despejo”.
Ao fazer uso dessa metáfora de “se viver em um quarto de despejo”, muitas vezes
citada por Carolina nos fragmentos do seu diário, esse desabafo contribuiu para que as
anotações de sofrimento, angústia, miséria se articulassem com uma palavra-chave: fome. “A
fome é amarela” (JESUS, 2014[1960]). E no livro da autora, é justamente essa palavra-chave
que ganha papel de destaque, assim como café, pão, água, feijão, gordura (toucinho), sabão,
sapato. E “sapato” é uma das “vaidades” de Vera Eunice, a filha mais nova de Carolina.
Os relatos de vulnerabilidade, miséria e fome abordados no livro Quarto de despejo,
na década de 1950, tornaram atemporal essa grande obra já traduzida para mais de catorze
idiomas. Tudo isso porque, com o passar dos anos, e com o crescimento das grandes cidades,
a realidade de quem vive na miséria e abandono ainda continua sendo feita com relatos
cotidianos da vida. E esses relatos assustam os que têm sensibilidade e senso crítico. E
justificam-se, pois, tais relatos, em virtude de muitas pessoas ainda viverem nesse cenário real
e desumano retratado por Carolina Maria em sua obra.
Ainda com base na vida de Carolina Maria de Jesus e sua obra Quarto de Despejo
(Diário de uma favelada), constata-se que a autora, através dos escritos em “seus diários”,
revela não somente o próprio cotidiano de sofrimento real, mas também o dos moradores que
sobrevivem em um ambiente desumano, marginalizado, em uma situação de miséria e
abandono.
Muitos relatos de indignação já se confirmaram através de diários que comprovam o
meio de vivência e de sobrevivência de seus autores. E, pois, bem diferente da história de vida
relatada em um diário com propósitos de um dia ser publicado, Anne Frank, assim como
Carolina Maria de Jesus, também compartilhou as próprias histórias de vida sofrida e
oprimida revelada nas páginas de um diário, que, por meio de publicação, foi possível se ter
conhecimento de todo um contexto histórico sofrido e real, com a relevância que o diário de
Anne Frank foi publicado após sua morte.
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Já o diário de Carolina Maria de Jesus fora publicado em vida, e a vida dessa mulher
foi transformada no momento em que o jornalista Audálio Dantas, repórter encarregado de
escrever uma matéria sobre uma favela que se expandia no rio Tietê, no bairro do Canindé,
declara: “Lá no rebuliço favelado, encontrei a negra Carolina, que logo se colocou como
alguém que tinha o quer dizer. E tinha! Tanto que, na hora, desisti de escrever a reportagem.
A história da favela que eu buscava estava escrita em uns vinte cadernos encardidos que
Carolina guardava no seu barraco”. (JESUS, 2014[1960])
Nossa pesquisa consolidou-se a partir da autobiografia “Quarto de Despejo (Diário
de uma favelada), publicado em 1960, e escrito por Carolina Maria de Jesus, onde
analisamos as temáticas: negro, favela e sobrevivência apresentadas na obra, assim
também como as estratégias de enfrentamentos vividas pela autora e que lhe serviram de
suporte para as atividades literárias.
Este trabalho de pesquisa é de natureza descritiva e abordagem qualitativa. Desse
modo, os dados coletados consistem de descrições de pessoas em situações reais, análise de
comportamento, sobrevivência; enfretamentos e estratégias adquiridas em um processo no
qual se mantêm a moral e pensamentos críticos, com citações diretas.
Trata-se, pois, de uma atividade de cunho bibliográfico, pois, para a realização da
mesma, fez-se necessária a utilização de livros, de artigos e dissertações que abordam sobre a
proposta e o objetivo do tema, que era justamente analisar as problemáticas aqui apresentadas.
Analisamos, então como essas mesmas estratégias contribuíram para esta atividade literária.
Para darmos embasamento a este trabalho, tivemos o seguinte suporte teórico: análise de
sobrevivência, por Silva (2007); fatores que possam ter contribuído para tal realidade quanto
ao surgimento da favela, por Costa Leite (1997); conceito de diário, por Andrade (2008); a
escrita como estratégia para se ultrapassarem fronteiras; pressupostos apresentados na obra
Quarto de despejo (Diário de uma favela), com o livro Quadros de Guerra (Quando a vida é
passiva de luto?); apresentado pela autora Judith Butler (2015); autenticidade da obra Quarto
de Despejo (Diário de uma favelada), afirmado por Audálio Dantas (1961); a forma da escrita,
por Patativa de Assaré (2003). Observamos, ainda, outras atividades artísticas desenvolvidas
por Carolina Maria de Jesus, bem como composição, interpretação, produção e lançamento de
um disco de vinil (1961), pela gravadora RCA Record; protagonizou um filme com produção
da alemã Christa Gottmann (1976), sob o titulo O despertar de um sonho, que, após
restaurado e legendado pelo (IMS), passou adotar o titulo de: Favela: A Vida na Pobreza.
Entre outras atividades de Carolina, destacamos o poema: Muitas fugiram ao me ver,
7
pertencente à Organização José Carlos Sebe Bom Meihy (1996). Ainda tratamos do desgosto
pela literatura, declarado por Carolina, em entrevista à Revista Escrita (1976); e, como forma
de mostrarmos que as escritas de Carolina continuam vivas, expressas na letra da musica:
Letras Negras, interpretada por Larissa Luz.
Nessa pesquisa, tivemos as seguintes etapas:
1ª - Análise da obra autobiográfica “Quarto de Despejo (Diário de uma favelada)”, que
aborda os relatos de vida de uma catadora de papel, negra, favelada e mãe solteira. Para
sobreviver na favela, Carolina valia-se da escrita como forma de enfrentamento para suportar
as condições de miséria e abandono. Tudo isso está documentado em relatos encontrados em
“cadernos encardidos” utilizados como diários e que deram, a essa mulher, suporte para ela
tornar-se mais um dos grandes nomes na literatura brasileira e internacional.
2ª - Como se trata de uma autobiografia, com relatos de uma moradora da favela do
Canindé, datada nos anos de 1960, que, ao utilizar-se de sua historia de vida na composição
da própria obra, analisamos os processos pelos quais alguns fragmentos deram-lhe condição
para se tornarem literários, já que o diário é uma escrita intima de registros, como afirma
Andrade (2008), que, ao serem expostos, podem provocar comoção com os registros de vidas
dos próprios autores.
Cabe aqui outra observação: as metáforas presentes nos escritos de Carolina são riquezas
literárias que podem ser vistas pelos leitores mais críticos como maquinas fotográficas que
registram para sempre todo o mosaico de fome e miséria do Canindé. Quanto a esse recurso
estilístico das metáforas, explica-nos: FERRAREZI (2008); Para esta etapa, buscamos
apresentar duas autobiografias, como o objeto de estudo, “Quarto de Despejo” (diário de uma
favelada), e assim também o “ Diário de Anne Frank”, pois essas autoras tiveram seus diários
transformados em literatura. Outra forma de se fazer tal registro é em copos de isopor,
atividade realizada por presidiários que, de alguma forma, queriam expressar suas vidas e
também obtiveram resultados com seus relatos apresentados por Judith Butler (2015), no livro
“Quadros de Guerra (Quando a vida é passível de luto?)”.
3ª - Analisamos a questão da sobrevivência e os possíveis indicadores apresentados na
obra “Quarto de Despejo (Diário de uma favelada)”, apresentado por Silva (2007).
4º- Tratamos da forma da escrita apresentada na obra, assim como a sua autenticidade
reconhecida por Manuel Bandeira, citada por Audálio Dantas (1961). Quanto a esse aspecto, é
fundamental não nos “assustarmos” com a escrita original de Carolina, em virtude do seu
nível de escolaridade sob esse aspecto é de suma relevância nos atermos a Sociolingüística,
que, segundo Ferdinand de Saussure (ELG 2002, p.241) “a língua é o palco de fenômenos
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relevantes”. Foi preservada quase toda a originalidade da obra, conforme Prefacio assinado
por Audálio Dantas em 1993 e publicado na edição 2014: “ A história da favela que eu
buscava estava escrita uns vinte cadernos encardidos que Carolina guardava em seu barraco.
Li, e logo vi: repórter nenhum, escritor nenhum poderia escrever melhor aquela historia – a
visão de dentro da favela.
Da reportagem – reprodução de trechos do diário – publicada na Folha do Norte,
1958, e mais tarde (1959) na revista o Cruzeiro, chegou-se ao livro, em 1960. Fui o
responsável pelo que se chama edição de texto. Li todos aqueles vinte cadernos que
continham o dia a dia de Carolina e de seus companheiros de triste viagem.
A repetição da rotina favelada, por mais fiel que fosse, seria exaustiva. Por isso foram
feitos cortes, selecionados os trechos mais significativos”.
No entanto, também é importante ressaltar tanto a riqueza de vocabulário de Carolina
quanto o emprego da ênclise em muitas passagens. Damatta (1996) também defende a escrita
original de “Quarto de Despejo” (1960). E, quanto ao fenômeno da hipertextualidade,
trouxemos, ainda, outro sucesso literário, cuja escrita é similar: Patativa do Assaré (2003).
5ª- Observamos que Carolina Maria de Jesus, enquanto artista, desenvolveu outras
atividades. Ei-las:
Em 1961, lança um LP (disco de vinil), intitulado sob a mesma temática da sua maior
obra literária “ Quarto de Despejo” com canções produzidas e interpretadas por Carolina, em
um total de doze faixas. Este LP pertence ao Acervo José Ramos Tinhorão, sob a guarda do
(IMS).
Em 1971, atua como protagonista em um documentário intitulado O despertar de um
sonho, que conta a historia de vida da própria autora e teve a exibição proibida aqui no Brasil,
por justamente mostrar a vida de miséria em que estava inserida Carolina. Documentário com
direção alemã por Christa Gottmann-Elter, tendo como roteirista e produtor Otto Engel e o
fotógrafo Ricardo Stein. Carolina também escreveu muitos poemas, entre eles trouxemos
Muitas fugiam ao me ver, que faz parte da Organização José Carlos Sebe Bom Meihy (1996).
Tivemos conhecimento dos “desgostos” que Carolina sofreu pela literatura, em
entrevista à Revista Escrita (1976)
Diante de tais investigações, utilizarmos as informações adquiridas com o propósito de
conseguirmos dar respostas aos nossos objetivos e conclusão deste trabalho.
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2. CAROLINA MARIA DE JESUS E A ESCRITA
Carolina Maria de Jesus (1914–1977), mulher negra, pobre, favelada e mãe de três
filhos, seria só mais uma mulher com o destino traçado pelo “azar”. Mas a escrita lhe foi fiel e
aliada no processo de transformar-lhe a vida em literatura.
Como forma de registrar suas mazelas diárias em pedaços de papel encardidos
encontrados em lixos, e na esperança de um dia deixar aquele lugar desumano - o qual
chamava de “quarto de despejo” -, Carolina escrevia repetidas vezes suas tarefas de
sobrevivência, todas datadas, e muitas, com os horários. (JESUS, 2014[1960])
15 de julho de 1955 Aniversário da minha filha Vera Eunice. Eu pretendia
comprar um par de sapatos para ela. Mas o custo dos gêneros alimentícios
nos impede a realização dos nossos desejos. Atualmente somos escravos do
custo da vida. Eu achei um par de sapatos no lixo, lavei e remendei para ela
calçar. (JESUS, 2014[1960], p.11)
20 de julho Deixei o leito as 4 horas para escrever. Abri a porta e contemplei
o céu estrelado. Quando o astro-rei começou a despontar eu fui buscar água.
Tive sorte! As mulheres não estavam na torneira. Enche minha lata e zarpei.
(...) Fui no Arnaldo buscar o leite e pão. Quando retornava encontrei o
senhor Ismael com uma faca de 30 centímetros mais ou menos. Disse-me
que estava a espera do Binidito e do Miguel para matá-los, e que eles lhe
expancaram quando ele estava embriagado. (JESUS, 2014[1960], p.21)
22 de julho...Tem horas que revolto com a vida atribulada que levo. E tem
hora que me conformo. Conversei com uma senhora que cria uma menina de
cor. É tão boa para a menina...lhe compra vestidos de alto preço. Eu disse:
- antigamente eram os pretos que criavam os brancos. Hoje são os brancos
que criam os pretos. (JESUS, 2014[1960], p.24 ).
25 de dezembro...O João entrou dizendo que estava com dor de barriga.
Percebi que foi por ele ter comido melancia deturbada. Hoje jogaram um
caminhão de melancia perto do rio[...] na minha opinião os atacadistas de
São Paulo estão se divertindo com o povo igual os Cesar quando torturava os
cristãos. Só que o Cesar da atualidade supera o Cesar do passado. Os outros
era perseguido pela fé. E nós, pela fome [...] naquela época, os que não
queriam morrer deixavam de amar a Cristo. Mas nós não podemos deixar de
comer. (JESUS, 2014[1960],p.146).
16 de junho...hoje não temos nada para comer. Queria convidar os filhos
para suicidar-nos. Desisti. Olhei meus filhos e fiquei com dó. Eles estão
cheios de vida. Quem vive, precisa comer. Fiquei nervosa, pensando: será
que Deus esqueceu-me? Será que ele ficou de mal comigo?(JESUS,
2014[1960], p. 174)
A vida de pobreza e miséria de Carolina na favela do Canindé não a tornou uma
pessoa passiva como a maioria daqueles que estavam sujeitos a viverem naquele ambiente.
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Carolina se negava a corresponder ao que se esperava dos que vivem/sobrevivem como
moradores de uma favela. Seu olhar consciente, suas letras negras denunciavam, criticavam e
opinavam soluções para o governo de Juscelino Kubitschek, presidente regente daquela
época.[...] “ 3 de novembro...catei uns ferros. Deixei um pouco no deposito e outro pouco eu
trouxe. Quando passei na banca de jornais li este slongan dos estudantes”: (JESUS,
2014[1960], p.132).
Juscelino esfola!
Adhemar rouba!
Jânio mata!
A camara apoia!
E o povo paga!
As escritas de Carolina foram capazes de sensibilizar todos aqueles que lhe viam a
angústia em não conseguir juntar dinheiro o suficiente para comprar alimento e levar para os
filhos. Muitas vezes Carolina dizia que a fome era amarela, e o mundo se lhe tornava triste e
amarelo, e ela critica os governantes. [...] “O Brasil precisa ser dirigido por uma pessoa que já
passou forme. A fome também é professora.” ( JESUS, 2014[1960],p. 28)
Com incomensurável riqueza na sua escrita, Carolina utiliza-se do recurso “poético”
das metáforas, através do qual convida o leitor a refletir quanto à relevância desses signos
linquíisticos. A autora expressa, por esse meio, o jogo polissêmico das palavras; contudo, os
vocábulos do universo lingüístico de Carolina não perdem o sentido do que se expressa no
vernáculo nas mais diferentes acepções dos verbetes.
O uso de metáforas é uma forma de deslocamento de um sentido para uma expressão,
como afirma (FERRAREZI, 2008, p.201)
Estruturalmente falando, a metáfora é associação de uma característica de
um elemento de um paradigma cultural a outro de outro paradigma, ou seja,
uma operação de analogia. [...] Entretanto, essa utilização, esse
deslocamento de um sentido para uma expressão, segue um critério que não
é estrutural ou lingüístico, mas cultural, que é a possibilidade de comparação
de características atribuídas aos referentes representados pelos dois sentidos
em questão, segundo a visão de mundo da comunidade que adota tal
metáfora. Isso é permitido no âmbito da nossa cognição porque essa
comparação e o decorrente cruzamento de características de referentes, ou
seja, essa forma de criar analogias, constitui-se numa das mais comuns
formas do pensamento humano.
Historicamente, conceitos como o de Aristóteles demonstram a importância das
metáforas para a retórica, como define MENDES (2010).
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Aristóteles foi o primeiro a abordar o tema da metáfora, identificando-a
como termo genérico que abarca todas as figuras retóricas em geral. Por
conseguinte, ao falar de metáfora, refere-se simultaneamente, e em sentido
lato, a toda a actividade retórica.
Nesta acepção, Aristóteles na Poética (capítulos 21-25) e na Retórica (livro
III) designa metáfora como “o transporte a uma coisa de um nome que
designa um outro, transporte quer do género à espécie, quer da espécie ao
género, quer da espécie à espécie ou segundo a relação de analogia”.
Segundo esta definição de Aristóteles, podem identificar-se diferentes traços
identificativos da metáfora, os quais influenciaram e regularam, até certo
ponto, a história poética e retórica da metáfora, pelo menos até ao século
XVIII.
Embriaguemo-nos, pois, nessa fonte inesgotável de sonhos e ideologias, em cujas
águas cristalinas a autora aspira por construir uma sociedade em que haja “Liberdade,
Igualdade e Fraternidade”, lema da Revolução Francesa (1789-1799). Uma sociedade em que
haja respeito, princípios éticos morais, solidariedade irrestritamente. Tudo isso embasado no
que afirma Renato Russo, da Banda Legião Urbana (álbum Quatro estações, gravadora EMI,
1989)), na música Pais e filhos: “É preciso amar as pessoas como se não houvesse amanhã”.
E esses sonhos – ou utopias? –, Carolina os idealiza e os alimenta com a intenção de
uma vida melhor fora da favela. De uma sociedade melhor. De um Brasil melhor. De, por
conseguinte, um mundo melhor.
Debrucemo-nos, então, nas metáforas carolinianas e degustemo-las como o néctar de
que também precisamos para a construção do universo acadêmico. E embriaguemo-nos como
deuses para assim construirmos esse capitel que a nós nos é inerente.
Em: atualmente somos escravos do custo de vida, (JESUS, 2014[1960], p. 11). Carolina
utiliza-se de tal metáfora, para demonstrar a sua escravidão atual, o sonho de se trabalhar para comer,
quando se poderia comer com o dinheiro que se conseguisse. A vontade de comprar um par de sapatos
para presentear a filha Vera Eunice era anulada no momento em que o mais importante naquela hora
era sanar a fome dos filhos. Realidade não só vivida por Carolina e seus filhos, mas por todos os
moradores da favela. Favela: nome adotado desde o período da Guerra de Canudos para classificar um
tipo de moradia, como nos explica: MOREIRA (2018)
[...] a nomenclatura proveniente do senso comum do vocabulário dos
habitantes de Canudos, que chamavam favela (uma pequena fava) as bagas
da fruta desta planta, é que deu origem aos conglomerados habitacionais nas
Periferias das cidades. Em canudos existe um morro que na época da
campanha de Canudos era denominado morro das favelas pela presença do
arbusto que produzem o fruto no local e depois da guerra um grupo de
soldados dispensados que lutaram no morro, foi localizado pelo Governo nas
imediações do hoje Morro da Providência, fato que deu origem ao indicativo
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Morro dos favelas em referência aos que haviam lutado no Morro das
Favelas, em Canudos
Em: quando o astro-rei começou a despontar, (JESUS, 2014[1960], p.21), e quando o
crepusculo vinha surgindo, (JESUS, 2014[1960]), podemos considerar como momentos em
que Carolina identifica o amanhecer e o anoitecer de uma forma poética para findar o inicio e
o fim de um dia de lutas, de sobrevivência. Muito mais de decepções do que de alegrias. De
fugazes alegrias.
Em: antigamente eram os pretos que criavam os brancos. Hoje são os brancos que
criam os pretos, (JESUS, 2014[1960], p.24)
Com essa metáfora, Carolina relembra o tempo em que os negros eram escravos dos
“brancos” e eram obrigados a prestarem-lhes serviços, como: lavar, passar, cozinhar, dar-lhes
banhos. Tudo isso, geralmente, como atividades feitas pelas mulheres que viviam na “casa
grande”. As demais atividades. aos homens que viviam nas senzalas, e cabiam também a eles
o trabalho braçal e as chicotadas levadas no “lombo”, quando não obedeciam às “regras” dos
seus senhores.
Podemos observar a essa “classe de escravo”, como explica SOUZA (2016).
Escravos domésticos: eram os que faziam os serviços da casa, convivendo
com a família senhorial. Eles arrumavam e limpavam a casa, cozinhavam,
serviam a mesa e carregavam bagagens, além de transportar os senhores e
sua família em liteiras.
Os escravos dormiam em senzalas [...] trabalhavam de sol a sol, em
condições extremamente duras, e sofriam castigos físicos. Praticamente não
tinham descanso [...] o trabalho nas fazendas era tão difícil que a vida útil de
um escravo não costumava ultrapassar dez anos, mas seus filhos o
substituíam desde cedo. (CHIANCA; SILVA, 2010, P.70-71apud SOUZA,
2016, P. 214-215).
Assim Carolina, de certa forma, ironiza tal situação - e, de certa forma, pensa,
aliviada, por alguns costumes terem sido mudados, e mudados para melhor. E Carolina afirma
isso ao em ver uma senhora provavelmente de cor “branca” criando com respeito, carinho e
comprando roupas de “alto custo” para uma menina “de cor.”
Em: a fome é amarela, (JESUS, 2014[1960], p. 44) e Em: preto é o lugar onde eu moro,
(JESUS, 2014[1960], p.167). Ao fazer uso dessas duas cores repetidamente, Carolina as
classifica como cores frias, mórbidas, cores indicadas para denominarem cada momento de
vida, cada situação no cotidiano. Muitas vezes a cor amarela enxergada nos momentos de
fraqueza de seu corpo só ganhava outras tonalidades no momento em que conseguia alimentar
o estômago, o que não durava muito tempo, e voltava a lhe emitir a indesejável cor amarela.
13
A cor preta, ora Carolina denominava a cor da sua pele, ora denominava a cor do mundo em
que vivia, sobrevivia.
Em: a língua delas é como os pés de galinha. Tudo espalha, (JESUS, 2014[1960],
p.14). Metáfora em que Carolina expressa seu desprezo pelos moradores da favela, em
especial às mulheres faveladas. Carolina, quando ouvia as mulheres falarem mal uma das
outras, e qualquer acontecimento se espalhava por toda favela com varias versões diferentes,
isso deixava Carolina irritada, quando se noticiou, por exemplo, que Carolina estava grávida,
a mesma se admirou por todos saberem que ela estava grávida, menos ela.
Em: a favela é o chiqueiro de São Paulo, (JESUS, 2014[1960], p.35) e a favela é o
gabinete do diabo, (JESUS, 2014[1960] ), já podemos imaginar o sentido para tais metáforas:
sabemos, pois, que Carolina classifica a favela como o quarto de despejo de uma cidade, onde
são jogadas as “coisas” sem serventia, as “coisas” velhas, os lixos da cidade. Admite-se,
então: se há lixo, torna-se, pois, lugar propício para moradia de algumas espécies, a exemplo
de porcos, ou seja, moradores do Canindé que vivem em chiqueiros. Lugar apropriado,
específico, melhor não há para o gabinete do diabo.
Entre outras metáforas encontradas na obra, em sua maioria com reflexões voltadas à
vida de miséria, Carolina denunciava e renunciava a continuar viver/sobreviver naquele
“quarto de despejo.”
Tome-se outro registro marcante em seus relatos como “não ter o que comer, não ter
um pedaço de pão para oferecer a um filho faminto”, realidade que comove e emociona o
leitor, assim também como há muita emoção quando se lê a trajetória de mais um dia como
catadora de papel. E constatamos que, quando Carolina consegue, raras vezes, levar para casa
pão, arroz, leite e feijão, existe muita alegria na vida dos filhos, que viam a mãe desembrulhar
aqueles pacotes. Eles sabiam que naquele dia teriam o que comer. Teriam um dia alegre.
Diante disso, a alegria para Carolina e sua família resumia-se em todos terem alimentos com
que pudessem alimentar-se, o que não era diferente entre os outros moradores.
Escrever a realidade sofrida de se viver em uma favela envolvia também denunciar
todo o meio, como violência contra a mulher, brigas entre vizinhos, desrespeito com as
crianças. Os filhos de Carolina eram alvo de perseguições dos vizinhos, muitas vezes
ameaçados e humilhados.
[...] A D. Rosa, assim que viu meu filho José Carlos começou impricar
com ele. Saiu com um pau para espancá-lo. Uma mulher de 48 anos
brigar com criança! As vezes eu saio, ela vem até a minha janela e
joga o vaso de fezes nas crianças. Quando eu retorno, encontro os
14
travesseiros sujos e as crianças fétidas. Ela odeia-me. Diz que sou
preferida pelos homens bonitos e distintos. E que ganho mais dinheiro
do que ela. (JESUS, 2014[1960], p.15-16).
Muitas vezes, em prol da própria defesa e da de seus filhos, Carolina ameaçava os
vizinhos ao lhes dizer que iria escrever um livro e citaria os nomes deles como forma de
amedrontá-los. [...] “Vou escrever um livro referente a favela. Hei de citar tudo que aqui se
passa. E tudo que vocês me fazem. Eu quero escrever o livro, e vocês com essas cenas
desagradáveis me forneceram os argumentos.”( JESUS, 2014[1960], p.20)
Nunca imaginaria que, de fato, um dia seus tristes registros em que revelara não ter o
que comer, suas denúncias políticas e sociais, sua comparação em chamar a favela de quarto
de despejo, um lugar onde se jogam as “coisas” que não prestam, que não têm mais utilidades,
dariam a Carolina Maria de Jesus, mulher negra, favelada, mãe solteira com baixa
escolaridade tanta notoriedade [...]” Tenho apenas dois anos de grupo escolar, mas procurei
formar meu caráter.” Aqui se nota a possibilidade de transformar em literatura suas negras
letras, ora próprias da sua fala coloquial, ora mais cheias de formalidades adquiridas diante
das muitas leituras que fazia. E, sob o olhar de Audálio Dantas, jornalista e “descobridor” de
Carolina Maria de Jesus, em uma matéria jornalística sobre a expansão que vinha acontecendo
na favela do Canindé, às margens do rio Tietê, o que não é diferente hoje, pois o número de
crescentes favelas – ou comunidades, como são chamadas hoje - só tende a aumentar em
vários estados do Brasil. No entanto, não fora esperado que, diante de um lamaçal que é viver
em uma favela, se pudesse encontrar algum elemento, ou alguém diferente de tudo aquilo que
já é rotineiro para aqueles que ali vivem.
Sim, Carolina, assim como a flor de Lótus, que nasce no meio da lama e destaca-se
pela própria resistência de sobrevivência e notável beleza, mostrou ao mundo que a escrita
tem o poder de eternizar os feitos grandiosos diante da pequenez de pensamentos contrários às
pessoas que estão sujeitas ao meio, mas nem sempre são sujeitos do meio. Com pensamentos
além de seu tempo, Carolina se fez história, tornou-se personagem principal, dividindo sua
titularidade muitas vezes com a fome, sua principal rival e coadjuvante. Juntas, elas ganharam
destaque, e, assim como muitas vezes o bem vence o mal, Carolina vence a própria fome.
Vence, sobretudo, a fome dos próprios filhos, e alimenta-os com a própria literatura real,
atemporal, em que muitos ainda vivem e viverão nestes eternos e “comuns” quartos de
despejo.
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2.1 FAVELA: VIVER OU SOBREVIVER?
O condicionamento de se viver em uma favela, com todas as precariedades que lhe são
inerentes é o foco principal abordado por Carolina na obra Quarto de Despejo, onde a autora,
em seus relatos literários, chama a atenção do leitor para a rotina de sobrevivência imposta
àqueles que habitavam na favela do Canindé. Apontando continuamente as mazelas de se
viver em uma favela, Carolina descreve os enfrentamentos diários, como a fome e a falta de
água, realidade decorrente e angustiante para ela, que, por ter que acordar às cinco horas da
manhã ter que esperar em uma fila a sua vez para encher a lata de água, irrita-se com todas
aquelas mulheres que ficam a falar mal da vida de outras mulheres. Parecia até que elas
esqueciam aquilo com que elas deveriam se preocupar: a condição de vidas expostas a
doenças, violências; a fome, a pobreza e a miséria. Esse tipo de condição de vulnerabilidade
era apresentado por Carolina como sobrevivência, pois na favela não se vive. Sobrevive-se. E
quando se sobrevive.
19 de julho Despertei as 7 horas com a conversa dos meus filhos. Deixei o
leito, fui buscar agua. As mulheres já estavam na torneira. As latas em fila.
[...] Chegou minha vez, pus a minha lata para encher. A Florenciana
prosseguiu elogiando o Janio. A agua começou a diminuir na torneira.
Começaram a falar da Rosa. Que ela carregava desde as 4 horas da
madrugada, que ela lavava toda a roupa em casa. Que ela precisava pagar 20
cruzeiros por mês. Minha lata encheu, eu vim embora. (JESUS, 2014[1960],
p.17-18).
Para tal, Carolina escrevia suas lutas diárias como estratégia de enfrentamento para
suportar o limite do extremo para o que é viver, ou melhor, sobreviver no abandono e
esquecimento, como afirma (SILVA, 2007)
Estratégias de recusa, silenciamento e indiferença, para aqueles que se
encontram nos limites da existência humana, sem apoios institucionais,
familiares ou coletivos, podem ser entendidos como formas solitárias de luta.
Este é um caminho possível para se entender a autora no enfrentamento do
racismo e da vida miserável que experimentou na favela do Canindé, cujo
realismo provocou um primeiro choque na consciência nas camadas
abastadas que viviam nos anos de 1960 embalados pela ideologia do
desenvolvimentismo e dos anos dourados (SILVA, 2007, pp.104-105).
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Por um lado, Carolina registra sua vida de miséria e atribui esse condicionamento ao
governo de Juscelino Kubitschek, que vivia a ideologia dos cinquenta anos em cinco e era
conhecido também pelos próprios planos de meta que tinha em vista para alcançar trinta
objetivos em diversos setores da economia e passou a incluir mais um objetivo: a construção
de Brasília. Por outro lado, a ideologia de Carolina era poder sair daquela favela e ter uma
moradia digna para ela e os filhos.
2.2 A ESCRITA, A DENÚNCIA: UM REGISTRO
“Escrever é uma cura para mim, minhas mágoas somem, minha coragem retorna, eu
quero viver para sempre, mesmo depois da morte”. (Anne Frank, 1947). A esse poder de cura
que a escrita proporciona, expressa por Anne Frank, e relatado no seu diário, também
Carolina descrevia diariamente as próprias dores, angústias de viver em tempos de guerra. Se
Anne Frank buscava abrigo nas páginas do diário que escrevia durante a Segunda Guerra
mundial, Carolina decretava guerra à fome que sentia com os filhos diariamente. Ambas
vivendo em tempos de Guerra, por batalhas e causas diferentes, porém, utilizando-se de um
mesmo tipo de armamento: a escrita. Essas duas personagens reais denunciavam, escreviam
as próprias vidas e registraram as próprias histórias.
Tais escritos em diários, por serem autobiográficos, ganham autenticidade e tornam-
se, pois, obras literárias.
No que se refere à pratica do uso de diários, Andrade (2008) ressalta:
Os diários são narrativas autobiográficas em que um eu de vida extratextual
comprovada (ou mesmo com vida apenas dentro do texto) registra, com
amparo de data, apoiado na clássica datação, anotações variadas, geralmente
sobre um passado recém acabado, fragmentando a suposta experiência de
vida (ANDRADE, 2008, p.80).
Andrade aponta também:
A história do gênero diário parece gerar um modo cristalizado de leitura que
exige do leitor uma posição particular, a de acreditar que está lendo toda a
verdade, segredos inconfessáveis, um texto fiel ao acontecimento.
(ANDRADE, 2008, p. 82)
Sendo assim, muitas obras escritas ganharam destaque, por serem histórias de vidas
reais que vieram a público por alguma forma de registro. Podemos observar a importância da
17
escrita como forma de registro ou denúncia, escrita por Judhit Butler (2015) no seu livro
Quadros de Guerra, em que a autora destaca os relatos de prisioneiros do Guantámo que
gravaram poemas curtos em copos que roubavam das próprias refeições.
Esses copos de isopor não só eram baratos – a própria representação do
baixo custo e da baixa qualidade -, mas também inofensivos, para que os
prisioneiros não tivessem acesso a copos de vidros ou de cerâmica que
poderiam facilmente ser utilizados como armas brancas. Alguns usavam
pequenas pedras para gravar suas palavras nos copos, passando-os de cela
em cela; às vezes, usavam pasta de dente para como instrumentos de escrita
(BUTlER,2015, p.89)
A necessidade de denúncia registrada por aqueles que sofrem algum tipo de violência,
negligência torna algum elemento fortalecedor e os impulsiona a acreditarem que uma
realidade poderá ser mudada a partir daquelas práticas criativas de denuncia.
2.3 FAVELA QUARTO DE DESPEJO
O termo Quarto de despejo, usado por Carolina para chamar à favela de lugar em que
morava, comparando-o a um quarto de despensa de uma casa, onde as pessoas colocam tudo
aquilo que já não lhes serve mais e fica lá despejado e esquecido, é o titulo escolhido para seu
livro: Quarto de Despejo (Diário de uma favelada).
Com relatos datados nos anos de 1950, não nos parecem estes ser tão distantes dos
anos atuais. Por ter-se tornado uma grande proporção, essa forma de moradia ainda assusta
por sua violência, precariedade, fome, miséria. Assim, tudo que já fora relatado por Carolina
ainda hoje é tão habitual, rotineiro, e é por esses fatores que a obra Quarto de Despejo (Diário
de uma favelada) tornou-se tão atemporal. As causas de enfrentamento vividas pela autora e
seus filhos são pontos que mais provocam angústia e tristeza durante a leitura, além de tudo
isso contribuir para que o leitor concorde com o termo usado por Carolina para chamar a
favela do Canindé.
Diante de toda essa realidade, Costa Leite (1997) responsabiliza a referida situação a
acontecimentos decorridos com a libertação dos escravos. E explica:
A libertação dos escravos no final do século XIX e a grande imigração de
europeus no começo do século XX foram responsáveis por uma demanda
por empregos que a conjuntura socioeconômica da época não conseguia
absorver. Os negros ex-escravos foram libertados sem nenhuma proposta de
18
inserção no mercado de trabalho; pelo contrário, foram colocados em
situação jurídica irregular com a criação da lei de repressão à ociosidade, um
mês após a promulgação da Lei Áurea. Essa população de escravos, somada
aos imigrantes que não conseguiam se adaptar aos padrões impostos pela
sociedade, formaram os contingentes de despossuídos que ocupavam as ruas
e os cortiços da cidade do Rio de Janeiro, vivendo em condições sub-
humanas (COSTA LEITE, 1997).
A mesma situação de realidade também se aplica à população das favelas de São
Paulo, que é retratada na obra de Quarto de despejo. Outra realidade descrita por Carolina se
refere ao tratamento que seus filhos recebiam, principalmente na ausência dela, com palavras
de humilhação e atos de crueldades, geralmente todas motivadas pelo racismo. Há muito
tempo a cor da pele negra vem sendo motivo de exclusão, discriminação na sociedade,
impiedosamente atingindo até mesmo crianças, como nos é apontado no livro Crianças
Invisíveis, que, para serem aceitas como empregadas domésticas, na década de 1990, teriam
que passar por um processo de” ritual de branqueamento”.
[...] chama de ritual de branqueamento da raça. Para penetrar no mundo da
casa, a “menina suja” deve se submeter a um verdadeiro rito de passagem, o
famoso banho e lavagem de roupas, cerimônia comandada pela patroa e pela
empregada doméstica adulta. “Além do esfregar, como se quisessem
eliminar o cheiro e desbotar ou branquear a cor da pele das meninas, suas
roupas também devem ser desinfetadas”. [...] a significação social do
comportamento da patroa nada mais é do que o horror a infecções que os
pobres e os negros podem trazer à suas casas, estratégias higienistas para
manter a separação de pessoas de classes diferentes. (VAZ, 2003, p, 74).
Em Quarto de Despejo, incansavelmente, Carolina descreve em seu diário a violência
em que viviam seus filhos. Crianças expostas à miséria, de pele negra, vivendo em um quarto
de despejo. Em um de seus relatos, Carolina destaca o racismo praticado até mesmo por um
negro.”[...] Quando eu passava perto do campo de São Paulo, varias pessoas saiam do campo.
Todas brancas, só um preto. E o preto começou insultar-me: - Vai catar papel, minha tia?
Olha o buraco, minha tia. (JESUS,2014[1960], p.14)
3 SERIAM MESMO ESCRITOS DA NEGRA CAROLINA?
Quando a vida de miséria de Carolina é impressa em papéis de qualidade, diferentes
daqueles pedaços de papel encardidos encontrados em lixos, os fragmentos escritos tornam-se
19
um grandioso mosaico que, selecionando “pedaços” de registros dos diários de Carolina,
Audálio Dantas (jornalista) a projeta para o mundo literário.
Carolina, que sonhara um dia deixar a favela do Canindé, vê a oportunidade bater-lhe
à porta: seus escritos, que contribuirão tanto para o seu enfrentamento como estratégia de se
manter ciente e não se deixar contaminar pelo meio. Carolina agora sai do “quarto de
despejo” e passa para a “sala de estar.” Alegria maior vivida por Carolina (2014[1960]) se
expressa em sua fala quando ela diz que ficara alegre olhando para seu livro. E afirma ainda
que o que ela sempre invejou nos livros foi o nome do autor. E ler seu nome na capa de um
livro, para sentir o que ela sentira ao ler seu nome e seu titulo em um livro, é só para quem
gosta de livros.
Com tamanho sucesso de divulgação, a autenticidade do livro Quarto de Despejo
despertou o interesse em se saber se tal alvoroço sobre a história de uma favelada realmente
era merecedor de tamanha comoção, e, desse modo, muitos se interessavam por conhecerem a
negra Carolina. Talvez esta fosse a grande dúvida: como uma mulher negra, favelada, mãe
solteira, de baixa escolaridade - o que se comprova através de suas escritas com falhas
gráficas, os quais foram mantidos nas edições, por garantirem a autenticidade e o realismo –
poderia escrever páginas que ora se entrelaçavam com palavras mais rebuscadas adquiridas
através das muitas leituras feitas por Carolina, garantiram tal sucesso na literatura brasileira?
Para responder a essa dúvida, nem mesmo a negra Carolina tinha resposta, já que a
mesma buscava compreensão para saber o tamanho sucesso que alcançara seu livro. Ela
mesma argumentara que não sabia o que as pessoas acharam naquele diário, e diz: “Eu
escrevo a miséria e a vida infausta dos favelados”. (JESUS, 2014[1960]).
Escrever a miséria. Escrever a vida de miséria. Foi isso o suficiente para que grandes
nomes da literatura, como Manuel Bandeira, identificassem passagens que autenticassem que
aquelas escritas eram pertencentes à negra Carolina.
Como ressalta Audálio Dantas:
O poeta Manuel Bandeira, em lúcido artigo, colocou as coisas no devido
lugar: ninguém poderia inventar aquela linguagem, aquele dizer as coisas
com extraordinária força criativa mais típica de quem ficou a meio caminho
da instrução primária. Exatamente o caso de Carolina, que só pôde chegar
até o segundo ano de uma escola primária do Sacramento, Minas Gerais.
(DANTAS,1961, p. 05)
Consideramos mais uma afirmativa no que se refere aos escritos de Carolina Maria de Jesus,
ditas pelo jornalista Roberto Damatta, que defende:
20
Esta pobre negra realizou um feito único na sociologia da pobreza mundial:
escreveu sobre o seu dia-a-dia, objeto miserável, cru, doente, louco,
marginal, revoltante e socialmente doentio. Esse cotidiano capitalista que
desde os escritos de Marx, se deseja inutilmente humanizar. (DAMATTA,
1996).
Um comentário fora registrado como marca autêntica dos escritos de Carolina,
quando a sua filha Vera Eunice recorda um momento, uma sessão de autógrafos em que
Clarice Lispector cumprimenta Carolina: "- Quando minha mãe foi apresentada a Clarice, ela
ficou meio intimidada e comentou: 'Nossa, você é uma escritora. Quem sou eu perto de você?
'. E a Clarice respondeu: 'Posso ser uma grande escritora, mas você é a única que conta a
realidade'“. Vera Eunice (2018).
Assim, também Patativa do Assaré, de vida literária similar à de Carolina, com baixa
escolaridade, teve a vida mudada por seus poemas, que passaram da oralidade para a escrita, e
trazem a linguagem simples, até hoje chamada de “matuta”. Assaré também sabia fazer uso de
uma escrita mais culta, mas sempre relatava a vida sofrida. A obra de destaque de Patativa é
Inspiração nordestina. (2003).
Leitô, caro amigo, te juro, não nego,
Meu livro te entrego bastante acanhado
Por isso te aviso, me escute o que digo,
Leitô, caro amigo, não leia enganado.
É simpre, bem simpre, modesto e grossêro,
Não leva o tempero das arte e da escola,
É rude poeta, não sabe o que é lira,
Saluça e suspira no som da viola.
Com abordagem também sobre a forma da escrita correta ou não, dona Irene,
personagem de um dos livros mais requisitados para estudos sobre as variações linguísticas, A
Língua de Eulália, escrito por Marcos Bagno (1997), traz.
No momento em que se estabelece uma norma-padrão, ela ganha tanta
importância e tanto prestígio social que todas as demais variedades são
consideradas “impróprias”, “inadequadas”, “feias”, “erradas”, “deficientes”,
“pobres”... E esta norma-padrão passa a ser designada com o nome da
língua, como se ela fosse a única representante legítima e legal dos falantes
desta língua. (BAGNO, 1997, P.24)
21
Do mesmo modo como mantém a originalidade da escrita de Carolina, trouxe a obra
aqui citada toda uma comunicação própria da autora: sua qualidade na escrita não alterou em
ponto algum o que realmente se queria ser constatado na obra. Suas atitudes, pensamentos e
sua historia.
3.1 CAROLINA SAI DA FAVELA
A tão esperada saída da favela, almejada por Carolina, quem diria que seria fruto de
seus enfrentamentos diários de sobrevivência, suas estratégias de equilíbrio de se manter
ciente e evitar desgraças maiores ao se limitar a não ser contaminada por fatores sociais,
econômicos e políticos que a fizessem acreditar que era só àquele mundo desumano que ela e
seus filhos deveriam pertencer, foi ledo engano.
Com o livro publicado, Carolina ganhou fama e algum dinheiro, que fora o bastante
para que deixasse a favela e se mudasse para um sítio na periferia de São Paulo, onde seguiu
até seus últimos dias de vida. Carolina “ganhou o mundo”, sua fama possibilitou-lhe
relacionar-se com pessoas intelectuais, políticos e demais pessoas influentes, e, pela primeira
vez, afirma que a sua cor preta não fora obstáculo para ela.
3.2 CAROLINA, AGORA: EX FAVELADA
Posteriormente ao seu apogeu com o livro Quarto de Despejo, Carolina é reconhecida
como escritora. Assim também como outras atividades artísticas desenvolvidas pela autora.
Ei-las:
Em 1961: lançamento de um LP (disco de vinil) intitulado de Quarto de Despejo, o
mesmo titulo de sua grande obra literária. O raro LP pertence ao Acervo José Ramos
Tinhorão, sob a guarda do (IMS). Esse LP foi lançando no ano de 1961 pela gravadora RCA
Records, com o conteúdo de dozes músicas, tendo o lado A as músicas: Ra, Re, Ri, Ro, Rua;
A Vedete da Favela; Pinguço; Acende o fogo; O pobre e o Rico; Simpliço. Já o lado B, com
as musicas: O Malandro; Moamba; As Granfinas; Macumba; Quem assim me ver cantando;
A Mara veio.
22
Compostas e interpretadas por Carolina Maria de Jesus, as músicas desse LP, bem
assim como seu livro, também retratavam a vida sofrida, as denúncias, as inquietudes e os
poucos e raros momentos de alegria.
Podemos observar esses traços na letra da música: O Pobre e o Rico. É notável a
presença de indignação da condição subalterna e humilhante do pobre e a honradez que é
depositada ao rico na letra da música O Pobre e o Rico, Carolina Maria de Jesus (1961)
Ohhh, ohhh, ohhh
(É triste a condição do pobre na terra)
É triste a condição do pobre na terra
Rico quer guerra
Pobre vai na guerra
Rico quer paz
Pobre vive em paz
Rico vai na frente
Pobre vai atrás
Rico vai na frente
Pobre vai atrás
Rico faz guerra, pobre não sabe por que (2x)
Pobre vai na guerra tem que morrer (2x)
Pobre só pensa no arroz e no feijão
Pobre só pensa no arroz e no feijão
Pobre não envolve nos negócio da nação
Pobre não tem nada com a desorganização
Pobre e rico vence a batalha
na sua pátria rico ganha medalha
o seu nome percorre o espaço
Pobre não ganha nem uma divisa no braço
Pobre não ganha nem uma divisa no braço
Pobre e rico são feridos
porque a guerra é uma coisa brutal
Só que o pobre nunca é promovido
Rico chega a Marechal
Rico chega a Marechal
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Em raros momentos de alegrias, Carolina Maria de Jesus cantava e sorria.
Cantarolava em meio ao seu barraco, com seus filhos João José, José Carlos e Vera Eunice,
mais um momento flagrado pelo jornalista Audálio Dantas, que mais uma vez reunira as
composições de Carolina e ajudou-a no lançamento do LP.
Há também tão sublimes momentos de alegria: observemos nos trechos da letra da
musica A Vedete da Favela, em que Carolina retrata a história de Maria Rosa, que se tornara
vaidosa após ter a sua foto estampada no jornal, o que não deixa de ser um pouco da própria
história de Carolina, quando seu livro vira um sucesso de vendas.
A vedete da favela
Carolina Maria de Jesus (1961)
Salve ela
(oi)Salve ela
Salve ela
A vedete da favela (bis)
Conhece a Maria Rosa?
Ela pense que é a tal
Ficou muito vaidosa,
Saiu seu retrato no jornal
Salve ela
(oi)Salve ela
Salve ela (bis)
A vedete da favela
Maria conta vantagem
Que comprou muitos vestido
Preparando sua bagagem
Vai lá pros Estados Unidos
Em 1971: lançamento do Filme O despertar do sonho, direção da alemã Christa
Gottman-Elter, fotógrafo Ricardo Stein, e do roteirista e produtor Otto Engel. Trata-se de um
documentário que teve Carolina Maria de Jesus como protagonista. Com duração de 16
minutos, foi impedido de ser exibido no Brasil, por mostrar a miséria que era a favela do
Canidé. E, algum tempo depois, em virtude do centenário de nascimento de Carolina, em
março de 2014, já tendo sido restaurado e legendado para o português pelo Instituto Moreira
Salles (IMS), enfim pôde ser exibido no Brasil, sob o titulo de Favela: a vida na pobreza.
24
Em entrevista ao jornalista Hamilton Trevisan para a Revista Escrita, quase 20 anos
depois do lançamento do Quarto de Despejo, Carolina revela que não gostara mais de
escrever, que havia perdido o ideal, perdido o deslumbramento.
Diante dessa revelação, o titulo da matéria da revista provoca uma preocupação, e
interroga-se-lhe: Vai silenciar a voz dos favelados?
Observemos alguns recortes da entrevista feita a Carolina. (TREVISIAN,1976)
“[...] Ao perguntarmos por que razão desistiu de escrever, ajoelha-se, ergue as mãos
para o alto e diz que no Brasil o escritor tem de implorar ao editor para ser publicado [...] só
tive desgosto com a literatura. Mesmo que quisesse voltar a escrever, não poderia. Meus
filhos me proibiram.
Segue-se a entrevista, e Carolina fala das pressões que sofria sempre que os jornais
noticiavam ter ela recebido algum dinheiro. Os pobres fazendo fila diante de sua casa; da
discriminação dos novos vizinhos, quando se mudou do barraco para uma casa da cidade; de
fortunas que deveria ter recebido como direitos autorais e que lhe foram sonegados. Não faz
acusações diretas [...] ela nos dá a impressão de que alguém a convenceu de que foi lesada.
Suas queixas vagas [...] visam, sobretudo, por justificar a recusa de escrever em obediência
aos filhos. Apesar dos mal-entendidos que a desencantam, faz questão de elogiar todos os que
a ajudaram desde o inicio: Audálio Dantas (moço bom, de maneiras graciosas, não bebe),
Paulo Dantas, Dr.Lélio[...].”
Percebemos, então, que a vida literária de Carolina teve seus momentos de desgosto,
talvez tudo isso visto como “normal” para aqueles que escrevem e esperam um retorno
positivo ao publicarem suas obras. Mesmo assim, em alguns fragmentos da entrevista, há
vestígios de sinais em Carolina de não haver perdido o gosto pela literatura, o interesse em
escrever. Mas há um desgosto pelas situações de ambição em que todos lhe queriam tirar
algum proveito.
A esse sentimento de exploração, também citado nas páginas finais de seu Best-seller,
em uma sessão com alguns depoimentos da autora ( JESUS, 2014[1960]), que revela:
Decepção. Pensei que houvesse mais idealismo, menos inveja. Mas aqui há
não só muita ambição, mas também o desejo de vencer a qualquer preço.
Mesmo que os meios empregados sejam podres. Quando matei um porco, lá
na favela do Canindé, alguns vizinhos exigiam um pedaço de carne.
Rondavam meu barraco feito bicho que fareja presa. Lá na favela era o
porco, aqui é o dinheiro. No fundo é a mesma coisa. “Lembrei do meu
provérbio: não há coisa pior na vida do que a própria vida.” (JESUS,
2014[1960], p.196).
25
Com o passar do tempo, a obra Quarto de despejo (diário de uma favelada) continua
sendo objeto de estudos em várias universidades pelo mundo. Diante disso, Instituições de
Ensino Superior, como: UFRGS – Universidade Federal do Rio Grande do Sul - e UNICAMP
- Universidade Estadual de Campinas - terão como bibliografia obrigatória a autora Carolina
Maria de Jesus, em 2019. Por Redação, Hypeness (2017).
Reconhecimento mais que merecido. Diante de uma história de vida que nos comove a
cada leitura de seus fragmentos, mesmo para aqueles que já o tenham lido, ainda assim se
torna uma leitura nova. Carolina é voz que não se cala. Carolina é o grito atemporal daqueles
que sofrem.
Com uma linha poética de seu expressar, pistas que nos levam a percebê-la também
como poetisa, Carolina Maria de Jesus, em o Quarto de Despejo, com seus pensamentos
metafóricos que não lhes seriam diferentes em seus poemas. Com o poema Muitas fugiram
ao me ver, Carolina nos conduz a pensarmos que ela deseja dar uma resposta a “aquelas
mulheres”, podemos considerar assim, já que ela utiliza a palavra “muitas”, no feminino, que,
talvez, por diversos motivos, não acreditaram nas escritas da negra Carolina.
MUITAS FUGIAM AO ME VER
(Carolina Maria de Jesus)
Muitas fugiam ao me ver
Pensando que eu não percebia
Outras pediam pra ler
Os versos que eu escrevia
Era papel que eu catava
Para custear o meu viver
E no lixo eu encontrava livros para ler
Quantas coisas eu quiz fazer
Fui tolhida pelo preconceito
Se eu extinguir quero renascer
Num país que predomina o preto
Adeus! Adeus, eu vou morrer!
E deixo esses versos ao meu país
Se é que temos o direito de renascer
Quero um lugar, onde o preto é feliz.
A grandeza da voz que não se cala, o grito da voz que aparece, principalmente na
mudez dos desesperançosos. Carolina é o pulsar social que jamais morrerá, porque ela
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continua a fazer-se presente nos mais diferentes contextos sociais e não apenas na tez negra,
mas nas formas multicores e em explosões de sons e luzes que se completam em todas as
imagens sinestésicas que se constroem e se perpetuam em todas as artes. Na própria vida.
A ideologia de Carolina não se cala. Veja-se, por exemplo, o que diz a cantora Larissa
Luz, com a música Letras Negras, que é uma homenagem poética a Carolina Maria de Jesus,
no álbum Território conquistado, ano 2016, pela gravadora Nzinga.
Letras Negras
(Larissa Luz/ Pedro Tie-2016)
Um amanhã
Possível realidade
Uma honestidade
Humanidade nua
Um despejo em papéis
Um pedaço da fome
Invadiu
Resistiu
Infiltrou
Corroeu um sistema e foi pra cima
Muito bem Carolina!!!
Pérola preta espelho da vida
Pé na porta de uma cidade letrada
Levantou a cortina da hipocrisia
Do monturo à alvenaria
E então o silêncio
A morte da poesia
Te escuto e te vejo
Dizendo e escrevendo
A favela, é um quarto de despejo
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4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Tivemos, pois, alguns pontos de suma relevância nessa pesquisa, uma vez que, no
ambiente acadêmico, pesquisar é um dos pontos-chave para a produção intelectual. Pesquisar
é, destarte, uma das formas de fomentarmos a epistemologia.
Quando nos propusemos a analisar a obra Quarto de despejo, fizemo-lo, em primeira
estância, por um conjunto de informações que nos chamaram a atenção e nos levaram às
seguidas reflexões: a vida, em todos os sentidos, de Carolina Maria de Jesus. Inquietamo-nos
e refletimos bastante, e seguidas vezes: como pôde uma mulher, nas condições de fome, e de
miséria, e de mãe solteira, e de semianalfabeta, de favelada, ter escrito uma obra que tem,
hoje, tanto valor literário nacional e internacional? Mas ratificamos a afirmação de Manuel
Bandeira: “Ninguém poderia inventar aquela linguagem, aquele dizer as coisas com
extraordinária força criativa mais típica de quem ficou a meio caminho da instrução primária.”
(BANDEIRA, 1961,Apud DANTAS, 1961, p.05).
E termos adentrado tanto na vida quanto na obra mais importante de Carolina Maria de
Jesus foi um dos maiores aprendizados que fizemos na graduação. E concluí-la depois de
termos visitado o Quarto de despejo e termos dialogado com a autora, termos vivido e
convivido com ela durantes meses será, indubitavelmente, uma das maiores dádivas para
nossa vida.
Em uma sociedade em que a língua também é instrumento tanto de inclusão quanto de
exclusão sociais, sobretudo, a língua padrão, pois quem a “domina” goza de privilégios, a
escrita de uma mulher semianalfabeta e que tanto chocou a sociedade, nos mais diferentes
segmentos e seguimentos, é altamente salutar e de bom grado para pesquisas acadêmicas.
Como vimos, a escrita caroliana vai de encontro à norma culta, apesar da riqueza de
ênclises encontradas. Deparar com uma escrita “grotesca, tosca”, do ponto de vista das
produções científicas poderia/poderá ser um choque, principalmente para os leitores mais
ávidos pelos clássicos da nossa literatura, por exemplo. No entanto, Carolina muito nos
engrandece ao escrever, mesmo com o pouco domínio que tinha sobre gramática normativa.
Por isso mesmo, comparamo-la com Patativa do Assaré. Entretanto, sabemos que existem
tantas Carolinas e tantos Patativas no anonimato, à espera de luzes que possam conduzi-los ao
caminho das letras. A escrita “rude” de Carolina é, sem duvida, uma dos objetos de estudo
para o mundo acadêmico, e ressalva-se: não somente para a área de Letras.
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Ao termos entrado na favela e termos conhecido o cotidiano dos moradores do
Canindé, não deixou de ser um choque. No entanto, foi-nos mais fácil entendemos as mais
diferentes situações ao nos valermos do que disse: LAVOISIE (1777) “ Na natureza nada se
perde, nada se cria e tudo se transforma”. Nesse aspecto, Carolina não se cria. Ela é. Diante
das putrefações e abusos os mais diferentes, Carolina não cede. Não se corrompe. Ela não se
perde. Carolina dá asas à imaginação. Carolina outra vez é. Em todo aquele ambiente cujas
tendências eram de as pessoas seguirem cada vez mais os caminhos do abismo, outra vez
Carolina não cede. Não se entrega. Não se integra. Carolina transforma-se. E transforma-se
no mais belo cisne. O cisne negro. O cisne da favela. Ou, como ela mesma diz em uma de
suas músicas: “A vedete da favela”.
Se observarmos atentamente, Carolina representa mais fidedignamente a oralidade na
escrita, embora , como já dissemos, ela não tenha domínio sobre as convenções ortográficas
estabelecidas pela NGB - Nomenclatura Gramatical Brasileira. Temos em sua obra essa
representação de forma bem mais literal.
Constatamos que Carolina, por inquietar-se com o abandono em que vivem os
habitantes da favela do Canindé, não se cala, apesar de seus gritos se perderem na escuridão
do descaso político. Carolina, em suma, não se inquieta diante dos erros, mas, põe-se como
verdadeira protagonista, a ponto de ter-se tornado a heroína, mesmo tendo sido abominada por
tantos vizinhos.
E quando se trata de denúncias, aqui se viu o porquê de ela chamar a favela de quarto
de despejo.
Cada metáfora de Carolina tem sabor inebriante e cintila como estrelas que encantam a
humanidade. Em cada metáfora caroliniana. sentimos o pulsar da vida. O pulsar do ir e vir nos
caminhos mais tortuosos. Para Carolina, no entanto, as metáforas são refrigérios. São
bálsamos intermináveis e inconfundíveis que ela usa como autodefesa para se manter pujante
e incólume diante das atrocidades. Em cada metáfora, uma lição de vida. Mecanismo de
defesa. Em cada metáfora, o alimento para saciar a fome. Primeiro, dos filhos. E, se sobrar,
também da mãe. Mãe catadora de papel. Em cada metáfora, o liquido mais puro, mais suave,
mais brando para saciar a família. Em cada metáfora, o modo de aprender a driblar a miséria,
o abandono, o esquecimento. Em cada metáfora criada, a renovação do quarto de despejo em
casa de alvenaria. Em cada metáfora entre as paredes sujas e rasgadas do quarto de despejo, a
vontade de tornar-se uma escritora conhecida. Nas metáforas, e com as metáforas, o apogeu.
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O reconhecimento para o Brasil e o mundo. Ou, simplesmente: Carolina Maria de Jesus:
negra, sim senhor. Semianalfabeta: a vida não lhe permitiu mais do que isso. Catadora de lixo
e papel para a sobrevivência sua e dos filhos: sim. As intempéries da vida fizeram-na assim.
Mãe solteira, com mais de um pai: “ela não foi a primeira e não será a ultima”. Em suma:
Carolina Maria de Jesus – tudo isso e muito mais: escritora consagrada, nacional e
internacionalmente.
Sabermos quanto Carolina Maria de Jesus é pesquisada hoje, mormente no ambiente
acadêmico, é muito significativo para a população brasileira, sobretudo para os mais carentes.
A projeção social que tem tido - e terá - Quarto de despejo leva-nos a parafrasear Manuel
Bandeira (1936) na obra “Irene no céu” / Irene preta/ Irene boa / Irene sempre de bom
humor. – imagine Irene entrando no céu: / - licença, meu branco! / e São Pedro bonachão: / -
entre, Irene. Você não precisa pedir licença.
E em nossas elucubrações, consiste nossa paráfrase em pensarmos em Carolina pedir
licença a nós leitores, para se instalar em nossas bibliotecas. Para entrar em nossas vidas. Para
fazer parte das nossas leituras cotidianas. Das nossas leituras acadêmicas. Mas nós,
principalmente nós, que formamos o mundo acadêmico, haveremos de dize-lhe: “Entra,
Carolina, você não precisa pedir licença”.
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ANEXOS 1 Referentes ao LP(disco de vinil) da Carolina, 1961
Encarte ( copia do original).
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2. Anexos ( entrevista a Revista Escrita)
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