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UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS
PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO
DEPARTAMENTO DE APOIO A PESQUISA
PROGRAMA INSTITUCIONAL DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA
O GÊNERO LITERÁRIO NOS LIVROS DIDÁTICOS: UM OLHAR
ORGÂNICO SOBRE O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA
EVANDRO OLIVEIRA REIS JUNIOR
MANAUS
2016
UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS
PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO
DEPARTAMENTO DE APOIO A PESQUISA
PROGRAMA INSTITUCIONAL DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA
RELATÓRIO FINAL:
PIB-H/0075/2015
O GÊNERO LITERÁRIO NOS LIVROS DIDÁTICOS: UM OLHAR
ORGÂNICO SOBRE O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA
ORIENTANDO: Evandro Oliveira Reis Júnior
ORIENTADORA: Prof.ª Dr.ª Fernanda Dias De Los Rios Mendonça
MANAUS
2016
RESUMO
Esta pesquisa consistiu na análise da abordagem do gênero literário em uma
coletânea de livros didáticos de língua portuguesa adotada em escolas da rede
pública de Manaus com base na perspectiva sócio-histórica e interacional do
Círculo de Bakhtin. O principal foco consistiu em descobrir se a metodologia
adotada no ensino da literatura fornece aos alunos subsídios necessários aos
propósitos deste gênero, nas três séries finais do ensino básico, considerando as
orientações vigentes para a educação básica no país. Os resultados apontaram
que já houve um avanço significativo nas elaborações didáticas, neste sentido,
mas que ainda há uma distância considerável entre a abordagem real e a que se
verifica nos materiais analisados.
PALAVRAS-CHAVE: Gênero Literário; Ensino, Livro Didático.
A inteligência é feita por um terço de instinto - um terço de
memória – e o último terço de vontade.
- Carlo Dossi
Para Juziléia Carvalho (mãe)
Evandro Reis (pai)
Amo vocês ∞
LISTA DE SIGLAS
LA – Linguística Aplicada
PCNEM – Parâmetros Curriculares Nacionais Ensino Médio
OCNEM – Orientação Curriculares Nacionais Ensino Médio
LD – Livro Didático
LP – Língua Portuguesa
PNLD – Plano Nacional do Livro Didático
MEC – Ministério da Educação
GLD – Guia do Livro Didático
QDCC – Quadro Demonstrativo do Componente Curricular
LISTA DE FFIGURAS
Figura 1 – Volume I: Português Linguagens e Conexão ................................... 4
Figura 2 – Volume II: Português Linguagens e Conexão .................................. 4
Figura 3 – Volume III: Português Linguagens e Conexão ................................ 4
Figura 4 – Ícones de Eixo de Aprendizagem .................................................... 4
Figura 5 – Exemplo de boxe “Na bagagem” ..................................................... 4
Figura 6 – Exemplo do Boxe “biográfico” ....................................................... 4
Figura 7 – Exemplo do boxe “Panorama”......................................................... 4
Figura 9 – Objetivos do QDCC 1º série ............................................................ 4
Figura 10 – Objetivos do QDCC 2º série ......................................................... 4
Figura 11 – Objetivos do QDCC 3º série .......................................................... 4
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ............................................................................................... 1
1. GÊNERO DISCURSIVO/TEXTUAL: MÚLTIPLOS CONCEITOS ........ 3
2. O GÊNERO LITERÁRIO E SUA REPRESENTAÇÃO PARA O
ENSINO MÉDIO ....................................................................................... 8
3. PERSPECTIVA METODOLÓGICA ....................................................... 10
4. ORIENTAÇÕES OFICIAIS PARA O ENSINO DE LÍNGUA
PORTUGUESA (E LITERATURA) NO ENSINO MÉDIO .................... 12
4.1 PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS ENSINO MÉDIO 12
4.2 ORIENTAÇÕES CURRICULARES PARA O ENSINO MÉDIO ...... 14
4.3 PROPOSTA CURRICULAR DE LÍNGUA PORTUGUESA PARA O
ENSINO MÉDIO ................................................................................ 16
5. PLANO NACIONAL DO LIVRO DIDATICO ENSINO MÉDIO ........... 18
6. BREVE DISCUSSÃO SOBRE O LIVRO DIDÁTICO DE
LITERATURA NO ENSINO MÉDIO ..................................................... 20
7. ANÁLISES DOS LIVROS DIDÁTICOS DE LITERATURA: UM
OLHAR ORGÂNICO DO ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA........ 23
7.1 CONHECENDO OS LIVROS ............................................................ 25
8. ANÁLISE: PORTUGUÊS LINGUAGENS EM CONEXÃO – VOLUME
1 ............................................................................................................... 29
9. ANÁLISE: PORTUGUÊS LINGUAGENS EM CONEXÃO – VOLUME
2 ............................................................................................................... 35
10. ANÁLISE: PORTUGUÊS LINGUAGENS EM CONEXÃO – VOLUME
3 ............................................................................................................... 36
11. APONTAMENTOS GERAIS DO LD A PARTIR DAS ANÁLISES ..... 45
CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................... 46
REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS ............................................................ 49
ANEXOS ....................................................................................................... 60
AGRADECIMENTOS ................................................................................... 64
1
INTRODUÇÃO
Esta pesquisa encontra-se inserida no âmbito da Linguística Aplicada (LA) e vincula-
se ao Grupo de Estudos e Pesquisas em Linguística Aplicada e Discurso – LADI, cadastrado
e certificado no Diretório de Grupos de Pesquisa do CNPq, sob a liderança da professora
Fernanda Dias de Los Rios Mendonça (UFAM/PPGL), cujos trabalhos desdobram-se na
investigação e elaboração de propostas acerca do ensino da língua materna nos diferentes
segmentos de ensino no país, na formação inicial e continuada docente, na análise e
elaboração de materiais didáticos e na análise de currículos.
Nesta perspectiva a pesquisa O Gênero Literário nos Livros Didáticos: Um Olhar
Orgânico sobre o Ensino da Língua Portuguesa envolve a investigação de livros didáticos
do ensino médio presentes nas aulas de língua portuguesa de escolas públicas da cidade de
Manaus. A verificação se apresenta para expor a didática ocorrida nesses livros, visando o
planejamento que estes apresentam em relação à abordagem do gênero literário ou literatura.
Ainda que o objetivo geral contemple principalmente os livros didáticos, foi compreendida a
necessidade de ser realizado um estudo prévio de teóricos e documentos que estão
diretamente ligados ao ensino de língua materna na atualidade. Assim sendo, a pesquisa é
construída em algumas seções que abordam temas específicos.
Na seção: Gênero Discursivo/Textual: Múltiplos Conceitos, encontramos uma
análise da teoria dos gêneros: como estes se apresentam e como são estudados atualmente. A
distinção entre a nomenclatura “Gênero Discursivo” e “Gênero Textual”. Em: O Gênero
Literário e sua Representação para o Ensino Médio, delineamos uma análise a respeito da
importância e da influência que o gênero literário possui na vida do estudante do ensino
médio. Teóricos como Todorov e Cândido são revisitados para compor as ideias e estruturar
os pensamentos relacionados ao verdadeiro papel que o gênero literário possui nesse estágio
do ensino básico, papel que não se baseia na historicidade e biografias de autores e sim no
contato através da leitura literária completa e na busca de produção de sentido e reflexão dos
textos.
As Orientações oficiais para o ensino de Língua Portuguesa (e Literatura) no
Ensino Médio compreendem uma seção dedicada à explanação dos documentos que regem a
o ensino de língua portuguesa no âmbito nacional. Esta análise documental é indispensável
para a introdução da pesquisa, pois são estes documentos que norteiam e idealizam o ensino
da literatura. Ambos os documentos contam como subsídios de pesquisa e propostas do
2
filósofo da linguagem Bakhtin, que em sua obra apresenta estudos relacionados às ciências
humanas e especifica a ação discursiva e dialógica presente nos textos. Essa perspectiva é
altamente contemplada nos materiais didáticos avaliados nesta pesquisa.
Breve discussão sobre o livro didático de literatura no ensino médio apresenta uma
análise sucinta do gênero discursivo livro didático, introduz a construção deste gênero e
sugere sua representação na dinâmica de sala de aula. A perspectiva utilizada foi a de que o
livro didático é um manual auxiliar do professor e partir do momento em que estes livros são
encarados dessa forma, o professor deve equilibrar seu uso nas necessidades da aula.
A seção Análises dos livros didáticos de literatura: Um olhar orgânico do Ensino de
Língua Portuguesa constitui tópico introdutório que aborda os objetivos gerais da análise
dos livros didáticos e apresenta quais serão os livros analisados revelando suas fichas
técnicas. Ainda nesta seção, aparece uma noção do que se entende por “olhar orgânico” da
língua portuguesa.
O subtópico Estrutura Geral dos Livros compreende a abordagem em que o livro
didático escolhido para a análise se apresenta. O esqueleto do livro é examinado de modo
geral, onde se apresentam, por exemplo, os “eixos de aprendizagens”, seus “boxes” e parte
de sua metodologia. Tudo sob a perspectiva do leitor.
Nas análises do LD já estão presentes as análises completas de cada volume (que
representa as três series do ensino médio). Nessas seções encontramos uma análise bem mais
minuciosa da estrutura do livro didático, a exemplo, suas sessões, seus questionamentos,
seus capítulos, dentre outros espaços, para analisar o discurso e reflexões propostas pelos
autores na abordagem do gênero literário.
O desfecho da pesquisa ocorre em Apontamentos Gerais do LD a partir das Análises
onde se apresentam visões conclusivas relativas às análises. Todos os apontamentos foram
propostos a partir da leitura de modo geral e da compreensão que se teve das abordagens
apresentadas nos livros didáticos.
A ideia deste trabalho consistiu ainda em propor possíveis subsídios tanto para o
ensino da literatura que está bem prejudicado ultimamente, como para orientar a seleção
livros por meio de critérios que considerem não somente a estrutura do LD, mas também sua
reflexibilidade e discursividade na abordagem da língua/linguagem em geral.
3
1 GÊNERO DISCURSIVO/TEXTUAL: MÚLTIPLOS CONCEITOS
Existem muitos estudos relacionados à conceituação dos gêneros e há também
diferenças em sua nomeação (discursivo/textual). Considerando a existência de diferentes
teorias sobre o “gênero” e seus múltiplos conceitos, nesta seção, abordaremos sobre sua
teoria e surgimento.
Os gêneros tornaram-se objeto de estudo bastante disseminado nas últimas décadas
principalmente no Brasil. Atualmente, há muitos estudiosos que apresentam teorias bem
diversificadas relacionadas ao seu conceito. No geral, os gêneros representam o uso da
língua em diversas formas de linguagem da vida humana, englobando aspectos textuais e
orais que se realizam por uma ação social. Esse funcionamento social está, por exemplo, nos
“anúncios de propaganda”, pois a estrutura deste gênero requer que ele seja produzido em
cima de verbos imperativos ou por adjetivos; percebemos que são recursos utilizados por
este gênero para causar a persuasão de quem o lê. Os leitores que por alguma razão tem
contato com esses anúncios serão de determinada forma influenciados, tanto pelo texto
verbal como o não verbal que ele apresenta, este é seu objetivo, se apresentamos um anúncio
de outra forma, mudará seu propósito. Percebemos que os gêneros possuem uma identidade
própria e, dependendo de seu objetivo, acarretará em uma variável diferenciada. “Os gêneros
são desiguais em certas funções e é por isso que eles se proliferam para dar conta das
variedades desenvolvidas no dia a dia” (MARCUSCHI, 2011, p. 22), razão pela qual os
gêneros estão presentes em todos os ambientes sociais: artigo de jornal; bilhetes; outdoors e
etc.
Em suma, falamos e escrevemos por meio de gêneros. É através dos gêneros que nos
comunicamos; transmitimos mensagens; pensamentos e nossos sentimentos; é através deles
que realizamos grande parte das nossas atividades. Marcuschi frisa: “Os gêneros são
atividades discursivas socialmente estabilizadas que se prestam aos mais variados tipos de
controle social e até mesmo ao exercício de poder” (MARCUSCHI, 2008, p. 161). Um
exemplo que ilustra o “exercício de poder” é um documento oficial da república ou um
discurso político, que requer o uso mais formal possível da língua. Toda esta complexidade
presente nos gêneros nos trouxe bastantes trabalhos relacionados a seu estudo. Isto é bem
perceptível, pois na educação o gênero consolidou-se tão fortemente, que todo o ensino e
aprendizagem giram em torno dele.
4
Sob uma perspectiva discursiva, os gêneros são apresentados como resultado dos
enunciados1, pois sob esta visão os gêneros apenas existem mediante os enunciados. Os
enunciados apresentam-se como unidades “reais da comunicação”, portanto, a base para o
estudo dos gêneros, sua produção implica na busca de sentido e provoca atitudes em quem o
recebe.
Após esta compreensão de que os enunciados são sociais e que produzem sentido nos
sujeitos, podemos propor que todo enunciado é destinado a alguém e é possuidor de uma
intenção de comunicação pré-existente. A intenção vai definir os usos linguísticos,
estruturais e temáticos que vão determinar o gênero, ou seja, os enunciados vão refletir em
uma esfera social e determinar qual categoria o gênero será produzido. E como foi
mencionado, sob esta perspectiva, o gênero será denominado Gênero Discursivo.
O termo para gêneros discursivos têm suas origens nos estudos de Mikhail Bakhtin,
filósofo russo, que juntamente a outros pensadores do chamado Círculo de Bakhtin,
desdobrou-se ao estudo da língua/linguagem numa perspectiva dialógica e sócio-histórica. A
partir da década de 1990 no Brasil, houve grande disseminação dessas teorias que
influenciaram diretamente os avanços da chamada Linguística Aplicada2 (LA) em território
nacional. Prova disto são as propostas e diretrizes curriculares que são fortemente baseadas
nas práticas discursivas, a exemplo dos Parâmetros Curriculares Nacionais, das Orientações
Curriculares Nacionais, dentre outros documentos oficiais que serão abordados nas próximas
seções.
Retomando nosso objetivo principal, que é o de apresentar os possíveis conceitos de
gênero, o livro Estético da Criação Verbal do autor Bakhtin, revela que: [...] “cada campo
de utilização da língua elabora seus tipos relativamente estáveis de enunciados, os quais
denominamos gêneros do discurso” (BAKHTIN, 2010, p. 262). Observamos que em todas
as instâncias da vida cotidiana ou social o discurso é manifestado através de gêneros.
Vejamos:
[...] nós falamos por gêneros diversos sem suspeitar de sua existência. Até
mesmo no bate-papo mais descontraído e livre nós moldamos o nosso
discurso por determinadas formas de gênero, às vezes padronizadas e
1 O enunciado não é uma unidade convencional, mas uma unidade real, precisamente delimitada da
alternância dos sujeitos do discurso, a qual termina com a transmissão da palavra ao outro [...].
(BAKHTIN, 2010, p. 275). 2 [...]ramo da linguística que se dedica ao estudo de vários aspectos relacionados a língua em
situações reais de comunicação e interação, tais como o ensino de língua materna e estrangeira, as
crenças, os valores e a questão do processo de construção de identidades em contextos institucionais
variados, entre outros aspectos (MARIANGELA E VICTORIA, 2011, p.235)
5
estereotipadas, às vezes mais flexíveis, plásticas ou criativas (a
comunicação cotidiana também dispõe de gêneros criativos). Esses gêneros
do discurso nos são dados quase da mesma forma que nos é dada a língua
materna, a qual dominamos livremente até começarmos o estudo teórico da
gramática. (BAKHTIN, 2010, p. 282).
Para Bakhtin, os gêneros discursivos estão extremamente ligados com as práticas
sociais e discursivas do nosso dia a dia, são como ele denomina “tipo relativamente
estáveis de enunciados” que estão nas várias instâncias da sociedade e que se modificam
constantemente:
A riqueza e a diversidade dos gêneros do discurso são infinitas porque são
inesgotáveis as possibilidades da multiforme atividade humana e porque
em cada campo dessa atividade é integral o repertório dos gêneros do
discurso, que cresce e se diferencia à medida que se desenvolve e se
complexifica um determinado campo. (BAKHTIN, 2010, p. 262).
Nos comunicamos, nos expressamos por meio deles e cada esfera ou campo social
reflete seus próprios gêneros, adequando a forma que melhor se expressa de acordo com a
situação.
Ainda abordando as teorias de Bakhtin nos são apresentadas duas modalidades de
gêneros discursivos: os primários e os secundários. Os gêneros primários
(...) se formam nas condições da comunicação discursiva imediata”
(BAKHTIN, 2010 p. 263), em suma os gêneros primários são os atos mais
simples de comunicação: conversas informais, saudações, bilhetes, são
exemplos. Já os gêneros secundários “(...) surgem nas condições de um
convívio cultural mais complexo e relativamente muito desenvolvido e
organizado (predominantemente o escrito) - artístico, científico,
sociopolítico, etc.” (BAKHTIN, 2010, p. 263)
Esses são as comunicações mais multiforme, regularmente compreende uma função
formal e oficial: o próprio gênero literário se encaixa nesse tipo de gênero discursivo,
também os trabalhos de conclusão de curso, os fichamentos, os boletins escolares e etc.
Tanto os gêneros primários como secundários fazem parte das esferas que constituem a
sociedade. Os gêneros ainda se organizam e se modificam em: estilo, conteúdo temático, e
na sua construção composicional:
Uma determinada função (cientifica, técnica, publicística, oficial,
cotidiana) e determinadas condições de comunicação discursiva,
6
especificas de cada campo, geram determinados gêneros, isto é,
determinados tipos de enunciados estilísticos, temáticos, e composicionais
relativamente estáveis. (BAKHTIN, 2010, p. 266)
Bakhtin propõe que o estilo corresponde às condições especificas em que
determinado gênero vai atuar, ou seja, para cada esfera social correspondem formas
peculiares. O conteúdo temático corresponde a todo o sentido ou ideia que o gênero carrega,
bem como equivale às intenções que o autor pretende passar. Por fim, a construção
composicional corresponde à composição da materialidade do gênero como este é
apresentado e estruturado. Nesse mesmo segmento Rojo e Barbosa comentam:
Dessa forma, tudo o que ouvimos e falamos se acomoda a gêneros
discursivos (preexistentes, assim como o que lemos e escrevemos). Nossas
atividades que envolvem a linguagem, desde as mais cotidianas – como a
mais simples saudação – até as públicas (de trabalho, artísticas, cientificas,
jornalísticas etc.) se dão por meio da língua linguagem e dos gêneros que
as organizam e estilizam, possibilitando que façam sentido para o outro.
(ROJO E BARBOSA, 2015, p. 18).
Podemos perceber a complexidade que os gêneros discursivos apresentam e em se
tratando do conceito bakhtiniano os gêneros vão muito além de apenas textos em si, um
analista do gênero discursivo deve estar atento a todas as nuances que o texto apresenta,
desde sua construção até os efeitos de sentido que o discurso proporciona, partindo do
aspecto verbal ao extra verbal de cada enunciado.
Sob uma perspectiva da textualidade encontramos outra nomenclatura para os
gêneros, nessa visão chamamos de Gênero Textual. Esta compreensão possui suas bases na
Linguística Textual 3 cujo olhar focaliza, sobretudo, a estrutura material do texto e as
relações linguísticas que lhes são internas e que determinam os processos de coesão e
gramática. Nessa perspectiva é importante que se garanta a condição de ser um texto. A
definição mais disseminada nos materiais didáticos sobre este conceito é a do teórico
Marcuschi, segundo ele:
Gênero textual refere os textos materializados em situações comunicativas
recorrentes. Os gêneros textuais são os textos que encontramos em nossa
vida diária e que apresentam padrões sociocomunicativos característicos
definidos por composição funcionais, objetivos enunciativos e estilos
concretamente realizados na integração de forças históricas, sociais,
institucionais e técnicas. (MARCUSCHI, 2008, p. 155)
3
7
Para Marcuschi os gêneros são entidades empíricas, ou seja, tudo o que é possível ser
observado em uma situação comunicativa, existindo tanto oralmente como através dos
textos. Um romance; um livro didático; um discurso jornalístico; um e-mail são exemplos
concretos de gêneros, mas assim como a linguagem os gêneros são vivos e estão suscetíveis
a mudanças. Eles se renovam, um desaparece e outro ocupa seu lugar de um modo diferente.
Exemplo disto é o gênero carta que nos dias atuais pode facilmente ser comparada ao envio
de um e-mail. A evolução dos gêneros depende da sua necessidade e também das atividades
sociais.
Em suma, enfatizamos a coexistência das divergentes nomenclaturas apresentadas no
decorrer da síntese dos gêneros: o Gênero Discursivo e o Gênero Textual. Apesar de ambas
tentarem nomear os mesmos segmentos, há uma possível diferença. Quando se quer utilizar
o termo Gênero Textual o que mais se apresenta é uma perspectiva analítica voltada para
estrutura do texto (vocabulário/coesão/gramática e etc.) e quando se quer utilizar o termo
Gênero Discursivo esta perspectiva não ficará voltada apenas para a estrutura textual, ainda
que necessite dessa parte, ela propõe outras possibilidades que envolvem a discursividade do
texto (intertextualidade/coerência/contexto e etc.). Podemos ainda conferir essa divergência,
ao fato que pesquisadores que têm seus estudos embasados na teoria de Bakhtin costumam
adotar o conceito Gênero Discursivo, enquanto aqueles que trabalham com um viés nas
teorias da linguística textual utilizam-se do termo Gênero Textual.
É possível afirmar que mais do que uma diferença de nomenclatura, esses conceitos,
conforme tentamos esclarecer, implicam numa concepção diferente acerca do objeto de
estudo. Ressaltamos que, para fins desta pesquisa, tomamos os gêneros sob o enfoque
bakhtiniano, o que implica no fato de que percebemos a língua/linguagem em sua dimensão
social, ideológica, histórica e discursiva, não apenas evidenciando o texto.
A breve reflexão sobre os gêneros realizada na presente seção converge para nosso
principal foco de trabalho, qual seja, analisar a abordagem dos Gêneros Literários - parte
essencial dos conteúdos de ensino voltados ao segmento Ensino Médio (EM), razão pela
qual a seção seguinte tratará mais especificamente desta categoria de gênero.
8
2 O GÊNERO LITERÁRIO E SUA REPRESENTAÇÃO PARA O
ENSINO MÉDIO
Muito se discute sobre a presença e a função do gênero literário nas aulas de Língua
Portuguesa (LP) do EM, consequentemente, surgem muitos desafios relacionados ao seu
ensino, pois é nessa etapa que este gênero se intensifica. Mas o que é o gênero literário (ou
simplesmente literatura) e o que o representa? Poderíamos considerar inúmeros aspectos
desse conceito, o mais pertinente para os fins desta pesquisa nos é dado pelo teórico Antônio
Candido que diz:
Chamarei de literatura, da maneira mais ampla possível, todas as criações
de toque poético, ficcional ou dramático em todos os níveis de uma
sociedade, em todos os tipos de cultura, desde o que chamamos de folclore,
lenda, chiste, até as formas mais complexas e difíceis da produção escrita
das grandes civilizações. (CANDIDO, 1988, p.174)
Esse olhar quase que histórico de Candido nos revela o imprescindível papel do
gênero literário para as aulas de língua materna, pois é a partir da literatura que temos acesso
a escritos de sociedades em épocas diferentes, é onde as civilizações são retratadas, seus
cultos, seu folclore e suas lendas e é através do gênero literário que conhecemos nosso
mundo. Sendo assim, é necessário também entender o que o gênero literário representa na
vida cotidiana do aluno. Tzvetan Todorov pode contribuir para esse entendimento. Para o
teórico, o gênero literário tem o poder de agir sobre os que têm acesso a ele, a literatura
estimula a criatividade, desperta sentimentos e, consequentemente, promove a constituição
de um ser humano crítico diante da sociedade.
A literatura pode muito. Ela pode nos estender a mão quando estamos
profundamente deprimidos, nos tornar ainda mais próximos dos outros
seres humanos que nos cercam, nos fazer compreender melhor o mundo e
nos ajudar a viver. Não que ela seja, antes de tudo, uma técnica de
cuidados para a alma; porém, revelação do mundo, ela pode também, em
seu percurso, nos transformar a cada um de nós a partir de dentro.
(TODOROV, 2010, p.76).
É bem perceptível que o principal objetivo do gênero literário é contribuir na
formação intelectual e, como diz Candido, na capacidade de humanização4 dos alunos. Um
4 Entendo aqui por humanização [...] o processo que confirma no homem aqueles traços que
reputamos essenciais, como o exercício da reflexão, a aquisição do saber, a boa disposição para com
9
dos objetivos do ensino de literatura no EM é a formação de leitores, então o que de melhor
a escola pode proporcionar aos seus alunos é levá-los a ser bons leitores. Isto só poderá
ocorrer através das leituras feitas em sala de aula. O teórico Luiz Carlos Cagliari frisa:
Ao contrário da escrita, que é uma atividade de exteriorizar o pensamento,
a leitura é uma atividade de assimilação de conhecimento, de interiorização
de reflexão. Por isso, a escola que não lê muito para os seus alunos e não
lhes dá a chance de ler muito, está fadada ao insucesso, e não sabe
aproveitar o melhor que tem a oferecer aos seus alunos. (CAGLIARI,
2009, p.132)
Esse olhar didático sobre a leitura demonstra seu importante papel nas escolas e a
grande responsabilidade não só dos professores e sua formação, mas da própria escola, em
incentivar o contato desses alunos com a leitura. E tratando-se das competências
relacionadas ao aluno egresso do ensino médio é necessário que ele desenvolva as
capacidades de:
[...] avaliar e interpretar os textos representativos das diferentes
manifestações de linguagem; saber julgar, confrontar, defender e explicar
suas ideias de modo a tomar uma posição consciente em relação ao ato
interlocutivo, que, no contexto do ensino de leitura, é a situação de leitura
do texto. (JURADO e ROJO, 2006, p. 39).
Percebemos que a leitura é fundamental para o desenvolvimento tanto social como
pessoal do aluno e que ele necessita de certas competências ao sair do EM. Sendo assim é
essencial o trabalho eficaz dos gêneros literários no EM, pois estes gêneros tornaram-se o
maior instrumento de leitura em sala e no incentivo da formação de leitores ativos,
reflexivos e críticos.
É possível afirmar que essa realidade, na maioria das vezes, não é a que se perpetua
nas escolas, principalmente nas da rede pública de ensino. Então, podemos indagar: qual a
representação do gênero literário no EM atualmente? Nas conhecidas “aulas de literatura”
não se tem encontrado um bom aproveitamento por parte dos alunos no que diz respeito ao
gênero literário. Essas deficiências vão desde a não leitura dos textos dentro de sala, que
quando lidos, são baseados em “resumos” da obra, até o fato de o ensino da literatura ser
o próximo, o afinamento das emoções, a capacidade de penetrar nos problemas da vida, o senso da
beleza, a percepção da complexidade do mundo e dos seres, o cultivo do humor. A literatura
desenvolve em nós a quota de humanidade na medida em que nos torna mais compreensivos e
abertos para a natureza, a sociedade, o semelhante. (CANDIDO, 1995, p.249)
10
pautado apenas em sua história, escolas literárias ou biografia de autores, abordagem
insuficiente para a compreensão dos textos desse gênero, o que acarreta em uma má
formação dos estudantes.
No ensino médio, a literatura continua sendo vítima de abordagens que
privilegiam a história da literatura, na medida em que parece haver uma
supervalorização das características estéticas e estilísticas presente nos
textos produzidos nos mais diversos períodos literários. O aluno não
consegue perceber a plurissignificação do texto literário, pois a
preocupação com identificação de características estéticas dos períodos
literários nos limites cronológicos dos rótulos barroco, árcade, romântico
etc. sufoca a leitura por prazer. (MARTINS, 2006, p. 101)
Martins desenvolve um pensamento bastante relevante pois, quando falamos na
representação do gênero literário no EM, entendemos que deva ir muito além de apenas
cronologia literária ou autores e seus respectivos movimentos. O gênero literário materializa
textos complexos capazes de produzir reações e visões diferentes que dependem da
perspectiva de quem os lê, por isso, é necessário rever muitos equívocos que se apresentam
na abordagem didática desse gênero, equívocos que colocam a literatura apenas como algo
que deve ser admirado ou que possui valores morais ou até mesmo como pretexto para
tópicos gramaticais.
Dada à essencialidade da leitura de textos do gênero literário em aulas de linguagem
do EM, é igualmente imprescindível que os professores possuam subsídios teórico-
metodológicos mínimos para a contemplação desse gênero nas aulas de LP para que ocorra
de maneira adequada os objetivos pontuados para essa disciplina na escola. Além da boa
formação do professor, estes subsídios podem ser encontrados nos manuais paramétricos e
diretrizes que regem a educação atualmente, deste modo, as seções seguintes abordam
breves análises documentais de textos oficiais que circulam no âmbito nacional e cujos
conteúdos contemplam a temática dos gêneros literários no processo de ensino, por meio das
práticas de leitura, escuta e produção textuais. Mas antes das análises documentais
explicitaremos a perspectiva metodológica que orienta as etapas da pesquisa e a análise de
seus dados centrais.
3 PERSPECTIVA METODOLÓGICA
O entendimento do encaminhamento dado à pesquisa e a inclusão da análise dos
documentos deriva da perspectiva metodológica que ancora os procedimentos adotados para
11
sua concretização. Inserida no âmbito das pesquisas de cunho qualitativo, o presente
trabalho consiste em pesquisa bibliográfica e documental de viés interpretativista. As
pesquisas qualitativas interpretativistas têm sido cada vez mais adotadas na área de estudos
da Linguística Aplicada, sobretudo quando o olhar direcionado aos textos de base incide em
seus aspectos discursivos.
Em consonância com as diretrizes das pesquisas interpretativistas, este trabalho
aporta-se metodologicamente nos pressupostos teórico-epistemológicos do chamado Círculo
de Bakhtin. As implicações derivadas dessa ancoragem consistem na adoção de uma postura
dialógica mediante os dados de análise. Em outras palavras, cabe ao pesquisador pôr-se em
diálogo com os dados tomados como discursos materializados aos quais subjazem
determinadas visões de mundo, ideologias, valores. Ademais, implica tal iniciativa
metodológica a consideração dos aspectos contextuais mais imediatos e, também, dos
mediatos na constituição dos sentidos produzidos no interior discursivo da materialidade
textual, razão pela qual as análises dos documentos ligados ao material didático foram
preliminarmente realizadas, uma vez que seus achados orientam a apreensão dos sentidos
materializados nos dados centrais (LD).
Embora em toda a obra bakhtiniana não haja, de fato, uma sistematização da
metodologia de pesquisa em ciências humanas, o estudo meticuloso do aporte teórico desse
grupo de pensadores da linguagem, permite-nos compreender a abrangência e, ao mesmo
tempo, a especificidade do fazer científico proposto em suas reflexões. Sucintamente
podemos elencar as etapas propostas pela ADD como: primeiramente, considerar o contexto
sócio-histórico e ideológico mais amplo em que se inserem os dados, em seguida os
elementos mais imediatos envolvidos em sua produção e, por fim, os elementos pertinentes à
sua própria materialidade textual. Tal procedimento encerra, segundo essa perspectiva, todas
as dimensões discursivas da materialização textual
Esclarecida a perspectiva de pesquisa adotada, passaremos, na seção a seguir, à
análise dos documentos que constituem dados periféricos da pesquisa que nortearam a
análise dos dados centrais.
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4 ORIENTAÇÕES OFICIAIS PARA O ENSINO DE LÍNGUA
PORTUGUESA (E LITERATURA) NO ENSINO MÉDIO
Com a evolução gradativa da educação brasileira, foram elaborados documentos com
a finalidade de nortear o avanço qualitativo da educação. Dentre esses, Os Parâmetros
Curriculares Nacionais do Ensino Médio foram divulgados nos anos 2000 em todo o
território nacional, posteriormente seguidos por outros também bastante importantes para a
educação no ensino médio como as Orientações Curriculares Para o Ensino Médio e,
também, a referência curricular que auxilia na educação regional do Amazonas, a Proposta
Curricular de Língua Portuguesa para o Ensino Médio.
Abordaremos, nas próximas seções, esses documentos que são essenciais para o
ensino de língua materna. O foco principal será na parte que envolve o ensino da literatura
para que compreendamos o que é necessário ser abordado em relação a esse gênero nas salas
de aula do segmento EM.
4.1 PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS ENSINO MÉDIO
Este é um dos primeiros documentos oficiais que auxiliam as aulas de língua/
linguagem no EM, apresentado aos professores no ano 2000. Este documento revolucionou
o EM nesse período, pois até então pouco se tinha ou nada de documentos escritos e a
proposta surgiu de questionamentos e reflexões acerca de melhorias que se faziam
necessárias a serem implementadas na educação brasileira. Estes parâmetros foram divididos
em quatro partes das quais nos focaremos na segunda intitulada Linguagens Códigos e suas
Tecnologias, que apresenta a seguinte base ideológica: “As diretrizes têm como referência a
perspectiva de criar uma escola média com identidade, que atenda às expectativas de
formação escolar dos alunos para o mundo contemporâneo.” (BRASIL, 2000, p. 4)
O referido documento veio subsidiar uma mudança efetiva no quadro de ensino que
já não atendia às demandas essenciais da sociedade brasileira da época, apresentando como
seu objetivo o desenvolvimento das habilidades comunicativas, linguísticas e discursivas do
aluno em diferentes instâncias de comunicação. Inaugurando esse novo olhar sobre o ensino
de língua no EM, os PCNEM apresentam conceitos de língua e linguagem, noções das
competências e habilidades necessárias aos alunos para os anos finais do ensino básico, isto
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é, um ensino que já considera questões sócio-culturais e a abordagem da linguagem
enquanto interação.
A relação inadequada entre a divisão do ensino de língua materna nos eixos
gramática, estudos literários e redação já são levados em consideração nas páginas dos
PCNEM. Percebe-se, assim, que a discussão sobre esse assunto já perdura há muitos anos e
alude à necessidade de mudança nas aulas de Língua Portuguesa (LP), conforme o trecho
abaixo:
Ao ler este texto, muitos educadores poderão perguntar onde está a
literatura, a gramática, a produção de texto, as normas. Os conteúdos
tradicionais foram incorporados por uma perspectiva maior, que é a
linguagem, entendida como um espaço dialógico, em que os locutores se
comunicam. Nesse sentido, todo o conteúdo tem seu espaço de estudo,
desde que possa colaborar para a objetivação das competências em
questão. (BRASIL, 2000, p. 23)
É perceptível essa divisão falha do ensino de língua, pois vemos que o texto como
centro do ensino consegue compreender todos os aspectos da linguagem, não apenas
importando o uso correto da língua, mas a necessidade de compreensão da linguagem como
um conhecimento cultural, ético e social. No tópico Conhecimentos de Língua Portuguesa
encontramos um resumo do que seria o ideal para o ensino de língua materna:
O processo de ensino/aprendizagem de língua portuguesa, no Ensino
Médio, deve pressupor uma visão sobre o que é linguagem verbal. Ela se
caracteriza como construção humana e histórica de um sistema linguístico
e comunicativo em determinados contextos. Assim, na gênese da
linguagem verbal estão presentes o homem, e seus sistemas simbólicos e
comunicativos, em um mundo sócio-cultural. (BRASIL, 2000, p. 18)
No que diz respeito à linguagem verbal, o próprio documento defende que sua
abordagem deve se dar de modo reflexivo, já contemplando uma percepção diferente da
língua no ensino e não apenas a gramática em sua acepção normativa. Por isso, “a unidade
básica de linguagem é o texto, compreendendo a fala do discurso que se produz, e a função
comunicativa, o principal eixo de sua atualização e a razão do ato linguístico” (BRASIL,
2000, p. 18). Vale ressaltar que essa visão de ensino de língua aparece contemplada nos
demais documentos oficiais desde os Parâmetros Curriculares Nacionais voltados ao
segmento fundamental e publicados em 1998. Ainda nos PCNEM, percebemos que as
concepções bakhtinianas de linguagem, língua e gênero já aparecem contempladas:
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Os gêneros discursivos cada vez mais flexíveis no mundo moderno nos
dizem sobre a natureza social da língua. Por exemplo, o texto literário se
desdobra em inúmeras formas; o texto jornalístico e a propaganda
manifestam variedades, inclusive visuais; os textos orais coloquiais e
formais se aproximam da escrita; as variantes linguísticas são marcadas
pelo gênero, pela profissão, camada social, idade, região (BRASIL, 2000,
p. 21)
Em relação aos gêneros literários no documento não são amplamente apresentados,
pois a proposta central é a linguagem verbal e sua comunicação. A menção que se tem sobre
o gênero literário aparece no tópico Competências e habilidades a serem desenvolvidas em
Língua Portuguesa, parte do documento que menciona alguns aspectos importantes da
literatura, como
Recuperar, pelo estudo do texto literário, as formas instituídas de
construção do imaginário coletivo, o patrimônio representativo da cultura e
as classificações preservadas e divulgadas, no eixo temporal espacial.
(BRASIL, 2000, p. 24.)
A partir dos PCNEM, que foi o documento inaugural voltado especificamente para o
segmento médio da educação básica, houve grande revolução para a melhoria do ensino e,
com este pensamento, surgiram, com o passar dos anos, outros manuais paramétricos que
também contribuíram fortemente para educação. Na seção seguinte abordaremos mais sobre
estes.
4.2 ORIENTAÇÕES CURRICULARES PARA O ENSINO MÉDIO
Em 2006 soma-se aos PCNEM as Orientações Curriculares Nacionais para Ensino
Médio (OCEM). Este documento nacional disponibilizado aos professores, no volume I:
Linguagens códigos e suas tecnologias apresenta o objetivo de “(...) contribuir para o
diálogo entre professor e escola sobre a prática docente” (BRASIL, 2006, p. 5) e possui uma
divisão estrutural em duas partes: Conhecimentos de Língua Portuguesa e Conhecimentos
de Literatura. Encontramos nessa proposta um estudo bem mais aprofundado dos
conhecimentos necessários para o EM e um diálogo maior com o professor no que tange ao
gênero literário. Essa nova proposta curricular apresenta um novo pensamento do já quase
“ultrapassado” PCNEM, visto que neste documento o ensino da literatura proposto não
promoveu sua verdadeira especificidade. O que se apresenta em relação ao ensino de língua
portuguesa nas OCEM diz o seguinte:
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[...] pode-se dizer que as ações realizadas na disciplina Língua Portuguesa,
no contexto do ensino médio, devem propiciar ao aluno o refinamento de
habilidades de leitura e de escuta. Isso implica tanto na ampliação continua
de saberes relativos a configuração, ao funcionamento e a circulação de
textos quanto ao desenvolvimento da capacidade de reflexão sistemática
sobre a língua e a linguagem. (BRASIL, 2006, p. 18)
As OCEM abordam também modelos relacionados à disciplina, ao texto como centro
do ensino, agora bem mais detalhado em relação ao documento anterior; às práticas de
ensino em sala de aula; à organização curricular; à leitura literária, dentre outros temas, além
de possuir uma seção apenas para o ensino do gênero literário, no qual se afirma que:
[...] o discurso literário decorre, diferentemente dos outros, de um modo de
construção que vai além das elaborações linguísticas usuais, porque de
todos os modos discursivos é o menos pragmático, o que menos visa a
aplicações práticas. Uma de suas marcas é sua condição limítrofe, que
outros denominam transgressão, que garante ao participante do jogo da
leitura literária o exercício da liberdade, e que pode levar a limites
extremos as possibilidades da língua. (BRASIL, 2006, p. 49)
No trecho acima, o supramencionado documento apresenta a função do gênero
literário no ensino médio, na tentativa de levar o aluno “(...) a um conhecimento dos gêneros
literários que deve ser considerado como base para a didática da literatura na escola e pode
contribuir para o planejamento de atividades de reorientação de leitura (...)” (BRASIL, 2006,
p. 71). Ou seja, a visão principal deste manual consiste em fazer com que o gênero literário
seja considerado uma prática social e interacional de leitura. E Assim como no primeiro
documento analisado as OCEM também criticam a realidade fragmentada do ensino de
língua:
Nesse contexto, a ênfase que tem sido dada ao trabalho com as múltiplas
linguagens e com os gêneros discursivos merece ser compreendida como
uma tentativa de não fragmentar, no processo de formação do aluno, as
diferentes dimensões implicadas na produção de sentidos. (BRASIL, 2006,
p. 28)
Vemos que a partir desse quadro relativo à fragmentação do ensino, a necessidade de
mudanças na prática escolar, vai desde as alterações dos currículos pedagógicos até a
mediação de professores pois, como sabemos, o trabalho pedagógico com o gênero literário
ou os textos de modo geral podem ser eficazes para abranger ambos os eixos de ensino:
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literatura, gramática e produção de textos. Essas reflexões transpostas neste documento são
de suma importância a professores neste período de ensino.
Os pensamentos apresentados tanto nos PCNEM como nas OCEM acabaram por
influenciar os estudos mais regionais, derivando, no âmbito da região Amazônica, a proposta
curricular que atende às demandas específicas desta região. Documento este que será
abordado na seção seguinte.
4.3 PROPOSTA CURRICULAR DE LÍNGUA PORTUGUESA PARA
O ENSINO MÉDIO
A Proposta Curricular de Língua Portuguesa para o Ensino Médio (PCLPEM),
baseada em parte nos documentos anteriores citados, é apresentada em 2012, a fim de
atender a uma demanda mais particular do estado do Amazonas e, consequentemente, dos
ambientes de ensino da cidade de Manaus. Afirma o documento que:
A ação política educacional de Reestruturação da Proposta Curricular do
Ensino Médio foi consubstanciada nos enfoques educacionais que
articulam o cenário mundial, brasileiro e local, no intuito de refletir sobre
os diversos caminhos curriculares percorridos na formação do educando da
Rede Estadual de Ensino Médio. (AMAZONAS, 2012, p. 15)
Vemos que a proposta surgiu da necessidade regional em refletir sobre novos
métodos de ensino e aprendizagem, não diferente dos outros manuais, entretanto mais
focada para a necessidade local de docentes e alunos da região. Nos Pressupostos Teóricos
dessa proposta curricular encontramos um breve histórico da educação tanto brasileira como
a do Amazonas e a apresentação de conceitos como a visão de gênero e
interdisciplinaridade, a produção textual, dentre outros temas, além dos estudos dos gêneros
literários. Levando em consideração as necessidades no ensino médio, o documento aponta
que:
A finalização do último segmento, o Ensino Médio, deve ser o parâmetro
geral que fornecerá as indicações que ajudarão a compor uma visão do
sujeito que se pretende formar – entretanto, há sempre uma visão de sujeito
que deve prevalecer em cada série, em cada segmento, pois o educando
vive o conhecimento de forma singular, engajando-se não em função de um
conjunto de requisitos para o futuro, mas em busca de um meio para
encontrar expressão para suas inquietações interiores do momento.
(AMAZONAS, 2012, p. 31)
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Para isto, “O ensino da Língua Portuguesa deve, então, possibilitar o
desenvolvimento das ações de produção de linguagem, em situações de interação, e de
abordagens interdisciplinares, não se limitando à decodificação e à identificação de
conteúdos [...]” (AMAZONAS, 2012, p.36). No que tange à literatura ou gênero literário, a
proposta apresenta uma temática bem humanística, levando em consideração sua
importância na formação intelectual do homem e na consciência crítica, a importância do
incentivo desta modalidade em sala de aula e do comprometimento do professor para com o
ensino produtivo.
Por isso, nesta Proposta Curricular de Língua Portuguesa é dado ênfase à
Literatura Regional, à Nacional e à Universal. E também, por se reconhecer
que a Literatura pode transformar a vida do homem, visto que ela lhe
oferece um mundo que ultrapassa o tempo e o espaço, possibilitando-lhe a
compreensão sob várias perspectivas do seu mundo e de si mesmo. Com
isso, pode-se dizer que aquele que lê, aquele que reflete, aquele que
necessita conhecer novos mundos, tornar-se-á um cidadão. (AMAZONAS,
2012, p. 38)
Ainda neste documento como proposta final é apresentado um Quadro
demonstrativo do Componente Curricular5 . Este quadro consiste em possibilidades dos
assuntos a serem abordados nas três séries do ensino médio, constando os objetivos, as
competências, as habilidades, os conteúdos e os procedimentos metodológicos a serem
avaliados pelo professor. Entendemos que, embora seja possível a utilização deste método
apresentado, o docente não deve limitar-se a ele, sob o risco de restringir as atividades
didático-pedagógicas a um modelo estrito e pré-existente. Porém, na tentativa de se ater ao
que propõe este documento e para fins de pesquisa, mais à frente utilizaremos este quadro
demonstrativo com vistas a verificar se os conteúdos de literatura são contemplados sob esta
perspectiva.
A retomada desses documentos norteadores da educação constata a busca por um
ensino mais eficiente, tendo em vista que existem ainda outros documentos6 que não foram
aqui citados (em razão da delimitação desta pesquisa), mas que certamente são sobremaneira
importantes para as mudanças que nas últimas décadas têm se tentado efetivar no âmbito da
educação. E, apesar das inúmeras críticas que são atribuídas a estes documentos
paramétricos, deve-se levar em conta o mérito de que cada uma dessas publicações
5 Para a verificação do quadro demonstrativo completo este, esta presente no anexo 1 da pesquisa. 6 A exemplo desses documentos estão os PCN+ ou o mais atual ainda que iniciou no ano de 2015 a
Base Nacional Comum que está englobando grande parte das instituições de ensino brasileira para
propor sugestões relacionadas ao ensino na construção deste novo documento nacional.
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fortaleceu o interesse nas discussões educacionais e na elaboração de propostas inovadoras
para o ensino no país. Deste modo, na seção seguinte, abordaremos mais um documento que
revolucionou a educação brasileira. O Plano Nacional do Livro Didático veio como proposta
para regulamentar os livros didáticos no ensino médio. A análise desse plano é de
fundamental relevância para a pesquisa, uma vez que apresentam os critérios de avaliação
dos materiais didáticos a serem adotados pelas escolas e que devem estar em consonância
com as diretrizes dos documentos até agora considerados para a pesquisa.
5 PLANO NACIONAL DO LIVRO DIDÁTICO ENSINO MÉDIO
O Plano Nacional do Livro Didático (PNLD) é um programa desenvolvido pelo
Ministério da Educação (MEC) e que possui o objetivo de distribuir Livros Didáticos (LD)
para as escolas públicas de todo o Brasil. Este programa teve início no ano de 1985 e as
análises de livros didáticos produzidas por este plano passou a orientar a seleção de livros
que devem ser adotados nas instituições escolares públicas. Nas avaliações deste plano são
considerados pontos relevantes que vão desde a didática pedagógica do livro, a qualidade
editorial, até o manual do professor, aspectos que veremos mais a diante. Com base nestes
critérios, são disponibilizados para os professores, o Guia do Livro Didático (GLD). Este
guia apresenta resenhas dos livros avaliados, o objetivo
[...] central deste Guia resenha todas as coleções didáticas de LP
aprovados pelo processo avaliatório oficial. Cada uma dessas coleções
pretende fornecer parte significativa daqueles recursos de que o docente
precisa nas series em que atua. (BRASIL, 2014, p.7).
E ainda:
Partindo desse pressuposto, o objetivo deste Guia é o de colaborar para que
nossas escolas promovam uma escolha qualificada do DLP, ou seja, uma
escolha motivada por um processo de discussão o mais amplo e criterioso
possível. E uma boa forma de dar início a esse processo é resgatar, em suas
linhas gerais, as características do EM e o papel especifico de uma
disciplina como LP nesse nível de ensino (BRASIL, 2014, P.7).
No GLD é apresentado no corpo das resenhas os pontos positivos e negativos do LD, a
visão geral de cada um, a descrição da coleção dentre outras coisas, para que o professor, a
partir dessas perspectivas, tenha conhecimento a respeito do livro que escolher e para que
possa adequá-lo ao que melhor se encaixa em cada etapa do processo de ensino e
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aprendizagem. Os Patamares de Qualidade da avaliação feita pelo GLD de 2015 avaliam
nas coletâneas apresentadas a leitura, a produção escrita, a linguagem oral e os
conhecimentos linguísticos de cada um dos livros didáticos.
Seguindo a perspectiva do GLD, toda a avaliação busca promover no aluno, através do
LD, a qualificação tanto da escrita como da leitura, a complexidade da língua portuguesa, o
desenvolvimento da oralidade, os meios que levam à produção de gêneros discursivos, a
reflexão dos conhecimentos, para garantir o exercício pleno da cidadania. O guia ainda
levanta debates relevantes à educação e à importância da língua portuguesa para o ensino
médio e também abre discussões sobre o ensino ser voltado apenas para vestibulares. Este
não deixa de ser um documento importante para o ensino e aprendizagem, pois apesar das
discussões serem menores propõe reflexões diretas ao professor. Os resultados do PNLD
2015 dão um claro testemunho do momento de transição em que se encontra o ensino de LP
no EM “e evidencia com nitidez o esforço de todas as coleções aprovadas em assumir esses
princípios...” (BRASIL, 2014, p. 15). Sendo assim, o principal foco das análises dos LD está
principalmente em suprir as necessidades requeridas para o EM:
Entretanto a tendência majoritária, nas coleções destinadas ao EM, tem
sido a de contemplá-los numa organização geral e num arranjo teórico-
metodológico próprio, ainda presos, até nas denominações utilizadas, a
práticas didáticas tradicionais: Literatura, Gramática e Redação
(evidentemente, com eventuais variações, tanto na denominação, quanto no
tratamento didáticos dos conteúdos). Na medida em que este Guia pretende
dar ao docente subsídios para um EM inovador compatível com as
tendências teóricas e as orientações oficiais contemporâneas, as resenhas
procuram explicitar como e em que momentos cada coleção trabalha, nas
partes, unidades e a reflexão sobre a língua e a linguagem, incluindo aí a
sistematização dos conhecimentos linguísticos/literários correspondentes.
(BRASIL, 2014, p. 16).
Levando em consideração a parte literária “Por isso mesmo, ainda que a literatura se
mantenha como um dos tópicos das resenhas, seus comentários sempre dizem respeito à
formação e à construção de conhecimentos linguísticos e históricos próprios dessa esfera”
(BRASIL, 2014, p. 16), mais uma vez percebemos que os conhecimentos literários são todos
voltados para um plano de leitura e formação do leitor que consiste no objetivo geral de sua
presença em sala de aula.
Em decorrência dos compromissos do EM com a literatura os fragmentos
ou excertos de obras literárias, em sua maioria de autores consagrados de
diferentes períodos históricos, no Brasil e em Portugal, compõem, em cada
coleção, coletâneas mais volumosas que as de outra natureza. Em ao menos
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três casos, acrescentam-se a esses acervos textos de escritores africanos de
língua portuguesa. Os autores e gêneros mais característicos de cada
período histórico se fazem presentes; em geral, no capitulo, unidade ou
seção em que esse período é estudado. (BRASIL, 2014, p. 19).
Grande parte das coleções é voltada para o cânone do gênero literário e por isso há
uma desvalorização das literaturas consideradas contemporâneas, fato observado pelo
próprio guia, mas que paradoxalmente é resultado do próprio processo de avaliação, pois
mesmo que as coletâneas apresentadas estejam suprindo os valores significativos para leitura
e o desenvolvimento do leitor, há poucas discussões sobre o texto de caráter literário e como
podem ser considerados cânones. Este é um problema identificado pelo próprio manual. As
resenhas das coleções apresentam alguns itens avaliativos. O primeiro deles é a Visão geral,
que apresenta um breve resumo dos livros; o segundo item é um Quadro esquemático, que
apresenta os pontos fortes e fracos da coleção; o terceiro item aborda a Descrição da
coleção, que condiz sobre a estrutura da LD; o item Análise da obra aborda pontos bem
mais apurados e específicos do livro; e, por fim, o item Em sala de aula que menciona os
recursos que o professores terão na escolha desta coleção.
O PNLD tem passado por um longo processo de melhorias, sempre em função das
Diretrizes Curriculares o que nos apresenta a busca para a solução de problemas no
complexo papel do LD no contexto educacional brasileiro. Sendo assim, a avaliação do
PNLD instiga que, na produção de material didático, as produtoras deste material
preocupem-se em adequar seus livros às exigências estabelecidas. Estes e alguns outros
critérios avaliativos subsidiarão nosso olhar no percurso das análises do LD, objeto desta
pesquisa. Os livros analisados nesta pesquisa participaram da avaliação para serem
utilizados nos anos de 2015-2017 e sua seleção deriva da contemplação no rol de livros
indicados ao PNLD 2015.
6 BREVE DISCUSSÃO SOBRE O LIVRO DIDÁTICO DE
LITERATURA NO ENSINO MÉDIO
O LD nos últimos anos tornou-se uma ferramenta bastante utilizada nas escolas
brasileiras por nossos professores e chegamos a um estágio em que as aulas de língua
portuguesa estão sendo voltadas por completo em sua leitura. É perceptível que este modo
de ensino ancorado no LD acarretou problemas bem complexos para o ensino e
21
aprendizagem, pois os suportes que estes livros proporcionam não dão conta do verdadeiro
sentido/objetivo e complexidade do ensino de língua portuguesa, nos anos finais do ensino
básico e, em relação ao gênero literário o modo como este ensino ocorre é bem mais grave.
Como foi abordado nas seções anteriores o objetivo principal da literatura no EM é a
formação de leitores que refletem e agem sobre a leitura produzida, ou seja, só é possível
essa formação através do que se lê dentro de sala de aula. Com isso, as aulas de literatura no
ensino básico não podem ser extremamente baseadas nas leituras do LD pois, como todo
professor deve saber, a maior vantagem encontrada na aprendizagem é ir direto às fontes,
que neste caso são os próprios textos literários. Não convém aqui dizer que o LD não possa
ser utilizado pelos professores ou muito menos que deixem de lado este recurso - que é uma
evolução para ensino - mas que o professor tenha um olhar mais crítico em relação a este
material didático e que a partir deste olhar possa refletir e interferir na verdadeira proposta
que o LD apresenta.
Não podemos impor ou culpar essas fragilidades no ensino diretamente ao professor,
pois como sabemos muitos destes fatos levam em consideração também outros fatores
como, por exemplo, a vida cotidiana do magistério, as grades curriculares, a excessiva carga
horária, dentre outros aspectos que acarretam as dificuldades no ensino.
O que realmente estamos abordando nesta seção é principalmente que o LD não
supre as necessidades exigidas no ensino do gênero literário, até pelo fato de não existir
neste material didático espaço suficiente para as análises tão complexas que o gênero
apresenta. Helder Pinheiro em suas reflexões aponta que
Os livros didáticos, nos últimos quinze anos, mudaram sensivelmente sua
apresentação. Estão maiores, bem mais coloridos, em papel de melhor
qualidade. O número de imagens é, talvez, a grande diferença. Há um lado
positivo nessa mudança. No plano do diálogo das artes, é interessante
apontar, por exemplo, a proximidade temática ou estilo entre um poema e
um quadro e uma escultura, por exemplo. (PINHEIRO, 2006, p.108 e 109).
Apesar de apresentarem muitos recursos bastante didáticos como o exemplo dado por
Pinheiro anteriormente, o LD não possui ainda uma abordagem que expõe suficientemente
os conteúdos de literatura, pois o que se espera de um manual de literatura é que se
predominem os textos literários, mas em grande parte dos livros isto não se apresenta.
Pinheiro ainda aborda sobre os conteúdos do LD:
22
“Quase todos estes livros apresentam um conteúdo comum: partem do
trovadorismo português (alguns se restringem à literatura brasileira) até as
tendências contemporâneas de nossa literatura. Alguns deles trazem
também pequenas súmulas de literatura portuguesa” (PINHEIRO, 2006,
p.106).
Podemos enumerar aqui algumas abordagens na utilização dos textos literários,
também citadas por Pinheiro sobre os LD:
1 – Há uma abordagem que se perpetua nos LD que é tratar o ensino como história
da literatura, em que se estudam os estilos de época de maneira cronológica, os textos são
simplesmente exemplos que expõem determinadas escolas literárias, são apresentadas as
obras principais dessas escolas e seus principais autores, o que é um equívoco;
2 – Há ainda a forma como são trabalhados os exercícios/atividade do LD que são
levados como pretexto para responder perguntas da gramática normativa ou que não conta
com nenhuma parte dialógica e reflexiva dos textos; e
3 – Apesar do LD apresentar alternativas dinâmicas de ensino ele não possibilita uma
experiência mais completa com os gêneros literários: contos, poesias, dentre outros gêneros
são apresentados de forma resumida o que interfere até mesmo na compreensão destes textos
por apresentarem apenas recortes.
Sendo assim, a educação baseada no LD compromete o ensino de LP e seu objetivo
para o EM, isto acaba por dificultar a evolução das aulas de literatura na atualidade, mas a
verdadeira questão é que o professor encare os livros didáticos como suporte para suas aulas,
algo que possa acrescentar. É necessário que se compreenda o verdadeiro sentido da
presença do LD na sala de aula e que o professor saiba adequar da melhor forma as
necessidades reais no ensino.
A reflexão produzida até o momento revelou a fragilidade do ensino em relação ao
LD, mas o que podemos ainda considerar é a representação e responsabilidade que este meio
didático apresenta para nossa educação. Os livros didáticos possuem na atualidade um
importante papel, pois esse material como já mencionado representa uma evolução para a
aprendizagem. O acesso do aluno ao LD e o suporte que ele transmite é para o ensino de
relevante importância tanto na formação do alunado como também na propagação mais
rápida a diferentes conhecimentos. Por isso, com tantos recursos que são utilizados para
trazer até o aluno o LD, faz-se necessário que os mesmos possuam o mínimo de subsídios
para que dentro das escolas, essa alternativa pedagógica possa auxiliar de forma positiva na
produção e do saber no âmbito escolar.
23
Sendo assim, é justificável a análise para comprovar ou não o que foi exposto nesta
seção em relação ao LD, a fim de verificar se os mesmos estão cumprindo seu papel no
ambiente escolar ou se perpetuam essas dificuldades apresentadas, assim, na seção seguinte,
iniciaremos as análises dos livros didáticos a que se propõe esta pesquisa.
7 ANÁLISE DOS LIVROS DIDÁTICOS DE LITERATURA: UM
OLHAR ORGÂNICO DO ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA
O foco principal da análise que apresentaremos nas seções seguintes está
precisamente voltado à abordagem do Gênero Literário, do qual já se vem tratando ao longo
deste relatório. Tal focalização pautar-se-á nos objetivos pontuados abaixo:
1 – Identificar a organização estrutural dos livros tomados como dados da análise;
2 – Verificar a adequação ou não dos materiais didáticos à proposta de ensino não
fragmentada da língua, apresentada nas diretrizes curriculares paramétricas da disciplina;
3 – Averiguar os critérios de seleção de textos;
4 – Verificar se os textos literários aparecem contemplados apenas como pretextos
para a abordagem de conteúdos de ordem gramatical ou se se orientam pela perspectiva
reflexiva da linguagem;
5 – Como são contemplados os diferentes tipos de gêneros literários (romance,
poesia, crônicas, contos, peças de teatro etc.);
6 – Averiguar se o ensino é voltado apenas para a história da literatura;
Os livros didáticos analisados pertencem ao quadro pedagógico de escolas públicas
de ensino da cidade Manaus atualmente e são pertencentes ao triênio 2015-2017 o que
significa que estão sendo utilizados nesta gestão e que possuem o selo de qualidade do
PNLD.
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Ficha técnica:
Titulo: Português Linguagens em Conexão
Autoria: Graça Sette
Márcia Travalha
Rozário Starling
Editora: Leya
Volumes: 3 volumes
Etapa: Ensino médio
Figura 1: Volume I: Português Linguagens e Conexão. Fonte: Evandro Reis, 2016.
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Figura 2: Volume II: Português Linguagens e Conexão. Fonte: Evandro Reis, 2016.
Figura 3: Volume III: Português Linguagens e Conexão. Fonte: Evandro Reis, 2016.
7.1 CONHECENDO OS LIVROS
A coleção de livros intitulada: Português Linguagens e Conexão apresenta-se
distribuída em três volumes, conforme ilustrado nas figuras 1, 2 e 3. Partindo de uma
abordagem geral dos livros, podemos fazer suposições a partir de suas capas que apresentam
três pinturas que levam-nos a inferir a inserção das artes representadas no conteúdo interno.
Nas páginas iniciais dos livros já encontramos diálogos propostos por seus autores que
preparam o aluno para o entendimento do que será apresentado no decorrer do volume. Não
muito diferente de livros considerados mais antigos, esta coleção possui a apresentação
destinada aos alunos, onde se apresenta um pequeno texto que convida o aluno a embarcar
em seus conhecimentos e se aponta os objetivos que obterão ao terminar a jornada.
Após a apresentação, é inserida a primeira seção que se intitula conheça seu livro.
Podemos afirmar que essa seção é fundamental para a compreensão da parte estrutural do
LD, pois é nela que encontramos a apresentação e metodologia dos capítulos e o que será
trabalhado em cada um deles. Nessa etapa são apresentados os eixos de aprendizagem:
Literatura e leitura de imagens, Gramática e estudos da língua e Produção de textos orais e
escritos. Esses eixos de aprendizagem comprovam os pensamentos já comentados nas
seções anteriores deste trabalho: a divisão do ensino de LP em três modalidades e que não
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leva em consideração o “olhar orgânico”7 do ensino de língua materna. Esses eixos nos
livros serão representados pelos seguintes ícones:
Figura 4: Ícones de Eixo de Aprendizagem. Fonte: Livro - Português Linguagens e Conexão.
Acesso: 2016.
Ainda nessa seção inicial do livro, é perceptível o comprometimento das autoras em
relação à compreensão dos alunos por meio dos boxes e dos ícones que aparecerão no
decorrer dos capítulos. As seções são as seguintes:
Na bagagem: item inicial dos capítulos onde encontramos questionamentos que fazem
com que o aluno interaja com o que será proposto mais à frente. Este boxe também
organiza os conhecimentos prévios dos alunos a partir de questionamentos que levam à
reflexão, tendo como possibilidade o trabalho com a oralidade;
Figura 5: Exemplo de boxe “Na bagagem”. Fonte: Livro - Português Linguagens e Conexão –
Volume 1. Acesso: 2016
7 Quando pensamos em “orgânico” no ensino de LP a noção que deve vir em mente é a de um
ensino sem divisões, como sendo um organismo em completo funcionamento que trabalha de forma
conjunta. Por exemplo, como vimos nos documentos paramétricos se pegamos um “texto literário”,
para trabalhar em sala de aula é possível encontrar nesse texto subsídios teóricos suficientes para
abordar temas literários, bem como temas da gramática normativa e também é possível contemplar
aspectos da produção textual, que diferentemente do ponto de vista tradicional seria visto de forma
individual.
27
Textos principais: neste item são apresentados os textos bases de leitura. É o texto que
norteia a abordagem do tema principal;
Boxe biográfico: este boxe apresenta sínteses biográficas de autores (tanto artistas como
escritores) e geralmente vem com caricaturas da pessoa. No final da leitura do boxe há
sugestões de links para pesquisas sobre os autores;
Figura 6: Exemplo do Boxe “biográfico”. Fonte: Livro - Português Linguagens e Conexão –
Volume 2. Acesso: 2016
Fique Ligado: o item tem o objetivo de apresentar alternativas (tantos filmes como sites
de pesquisa) para enriquecer os conhecimentos dos assuntos e autores estudados;
Nas trilhas do texto: seção para atividades de interpretação e construção de sentidos a
partir dos textos que foram lidos;
Palavras na lupa: outra seção que possui atividades de conteúdo linguístico e gramatical
dos textos;
Panorama: no panorama é apresentado os conceitos e características relacionados ao
período literário aos momentos históricos e etc.;
Figura 7: Exemplo do boxe “Panorama”. Fonte: Livro - Português Linguagens e Conexão –Volume
3. Acesso: 2016
28
Passos largos: boxe de atividades relacionadas ao tema estudado, porém voltada a
perguntas de vestibulares (principalmente ENEM);
Pesquisa: este boxe aparece em determinados capítulos para orientar pesquisas e
aprofundamento através de links de site que estão relacionados ao tema estudado;
Produção de texto: seção com sugestões de produção textual diversificada;
Boxes informativos ou de conceitos: boxe de informações adicionais que podem trazem
curiosidades.
Podemos averiguar que esta divisão em várias seções do livro demonstra um trabalho
bastante abrangente e complexo da língua em comparação a livros mais antigos nos quais
pouco se via divisões neste estilo. Há ainda uma relação bastante peculiar com o layout geral
do livro e até as cores que foram impressas. A nível histórico, a partir dessas considerações
feitas até o momento, é notória a evolução que os livros didáticos atuais sofreram se
comparamos, por exemplo, com exemplares didáticos da década de oitenta ou mesmo de
meados da década de 90. Toda a preocupação didática dos autores em detalhar de forma
minuciosa o que será apresentado no decorrer dos livros, aponta que os planos nacionais
como o que foi exposto em seções anteriores (ver seção sobre o PNLD), estão tendo forte
influência na elaboração dos LD.
Na compreensão geral dos assuntos, há certo diferencial na parte que tange aos
estudos da linguagem que já apresenta alguns temas bastante peculiares como, por exemplo,
as variações linguísticas, linguagem e interação, dentre outros. Utilizando-se da resenha
(Anexo 2) que se apresenta no GLD que corrobora fortemente para a parte avaliativa do
livro, encontramos alguns aspectos relevantes sobre esta coleção:
A articulação do trabalho de leitura aos outros eixos de ensino (produção
de textos e conhecimentos linguísticos) configura uma proposta pedagógica
bastante abrangente. As atividades da coleção tratam a leitura como um
processo63e colaboram para a formação geral do leitor, procurando
resgatar o contexto de produção do texto e levando o aluno a perceber e
refletir sobre a importância desse contexto na produção de sentidos. De
forma geral, os textos selecionados retratam adequadamente os conteúdos
tratados, e a coletânea é marcada pela excelência da qualidade do material
verbal e imagético. (BRASIL, p. 62, 2015).
Um marco característico dessa coleção é o envolvimento forte com as imagens em
consonância aos textos e aos temas que estão sendo apresentados. Sob uma visão geral, há
bastante desenvolvimento dos gêneros discursivos durante os volumes. Na visão que temos
na parte que condiz ao gênero literário, percebemos que a organização dos eventos literários
29
e suas épocas são apresentadas de maneira esquemática e cronológica. O GLD também
comenta:
O trabalho com a literatura se articula de forma acentuada com o eixo da
leitura, e é organizado, cronologicamente, em função dos movimentos
literários. O enfoque dado pela coleção busca compreender os movimentos
estéticos, não apenas como um fator constitutivo da cultura, mas como
resultado de contextos históricos, econômicos e sociais. A coleção colabora
significativamente para a formação do leitor literário, pois fornece uma
base conceitual consistente para o tratamento do fenômeno literário;
favorece a compreensão da literatura como campo de conhecimento; leva o
aluno a considerar a materialidade do texto na apreensão de efeitos de
sentido; disponibiliza atividades que estabelecem relações entre o texto
literário e o contexto histórico, social e político de sua produção; e coloca a
literatura brasileira em diálogo com outras literaturas de língua portuguesa,
sobretudo a produzida em Portugal. (BRASIL, p. 62, 2015).
Pelo que podemos perceber durante a leitura da resenha feita pelo GLD, as
articulações propostas nos livros proporcionam ao alunado diversificada abrangência da
literatura. Tendo em mente essas visões gerais dos livros, partiremos para uma visão mais
precisa dos livros didáticos. Assim, nas seções seguintes abordaremos de modo mais
investigativo a contemplação dos gêneros literários na coleção.
8 ANÁLISE: PORTUGUÊS LINGUAGENS EM CONEXÃO -
VOLUME 1
.
Nesta seção iniciaremos a análise mais aprofundada do LD, focalizando cada um dos
volumes que compõem a coletânea tomada para estudo. O volume 1, destinado a alunos do
primeiro ano do ensino médio, possui 14 capítulos que abordam o estudo literário, 12
capítulos que abordam os estudos da gramática e 8 capítulos que abordam o estudo do texto.
Reiteramos que as análises se aterão a contemplação do gênero literário. Abaixo, o quadro
que apresenta os objetivos específicos para a 1º série do EM descritos no “Quadro
demonstrativo do Componente Curricular”8 (QDCC) na página 40 da PCLPEM, vamos a
eles:
8 Durante a análise este “Quadro Demonstrativo do Componente Curricular” (QDCC) apresentado no documento Proposta Curricular de Língua Portuguesa para o Ensino Médio
(PCLPEM) servirá de base para as questões relacionadas às necessidades curriculares
exigidas para cada série do EM. O quadro completo pode ser verificado nos anexos da
pesquisa.
30
Figura 8: Objetivos do QDCC 1º série. Fonte: PCLPEM. Acesso: 2016.
Na leitura inicial deste volume, já podemos comprovar o que se especulava
anteriormente e que se tornou característica marcante da coleção, a existência de um forte
dialogismo com as “artes”, “figuras” e “textos” que contemplam a multidisciplinaridade para
introdução de seus temas. No primeiro capítulo, que possui o título: “Babel leitura de
imagens”, encontramos um exemplo dado a partir do texto bíblico para a possível origem
das diferentes línguas. Trata-se de um exemplo bem recorrente em livros para dialogar com
o surgimento das línguas, sendo essa a introdução inicial dos assuntos. A primeira pintura
que aparece é a do autor Pieter Bruegel, chamada de A torre de Babel, que faz referência ao
texto bíblico já mencionado. O boxe “Nas trilhas do texto” aparece no capítulo e vamos nos
ater aos questionamentos presentes nele:
1 – A torre de Babel é uma das pinturas de Bruegel que dialoga com a bíblia, a fim
de colocar esse livro sagrado ao alcance do povo. Como o pintor consegue isso por meio
dessa obra? p. 18.
2 – Observando os detalhes da imagem que você leu, em que você acha que Basquiat
se inspirou para criar está obra? p. 40.
Através desses questionamentos já averiguamos a perspectiva utilizada pelas autoras,
que buscam no texto uma compreensão discursiva, fazendo com que o aluno reflita tanto na
31
leitura do texto como na leitura da pintura que está em dialogo, por meio de reflexões que
ultrapassam uma abordagem estritamente textual.
No capítulo seguinte é destacado o tema texto literário e texto não literário, em
consonância ao que se pede no QDCC que diz: “compreender o que é a arte literária,
linguagem literária e não literária” (p.41). Esta proposta é construída a partir de textos que se
apresentam em diferentes gêneros discursivos, como crônica, gêneros jornalísticos,
depoimentos etc. Esses textos possuem diferentes autores tanto nacionais como estrangeiros.
A maneira como é trabalhado o conteúdo é bastante dinâmica, pois parte de uma tentativa de
construir um sentido junto com o aluno e, a partir de seus conhecimentos e do que foi
proposto, levá-lo a entender as peculiaridades e diferenças que existem entre o literário e o
não literário, na tentativa de defini-lo. Vale salientar que ainda nessa discussão há uma
abertura para os romances de ficção atual, que em determinados momentos são excluídos do
eixo de ensino (tendo o foco nos considerados clássicos). Fator relevante considerando o
público de leitores mais jovens que costuma ler livros mais contemporâneos como os best-
sellers. Essa estratégia aproxima os alunos a outros tipos de leituras. Ainda encontramos
sugestões para organizar as leituras feitas pelos alunos. Na página 23 deste volume há um
esquema retirado da revista VEJA, que exemplifica para o aluno que a partir dos livros da
série Harry Potter pode-se encontrar novas e diferentes leituras:
32
Figura 9: Esquema de leituras proposto pelo LD. Fonte: Livro - Português Linguagens e Conexão –
Volume 1. Acesso: 2016.
O capítulo quatro aborda o assunto “elementos da narrativa literária”, e esses
elementos são apresentados através do conto O homem nu de Fernando Sabino. O texto foi
reproduzido de forma completa o que contribuiu para seu entendimento. Após a leitura do
conto seguem alguns questionamentos e esclarecimentos sobre as características do gênero
conto e no boxe “Panorama” são apresentados os elementos que compõem as narrativas
literárias. Verificamos que essa sequência didática é bem possível, pois como já
mencionamos o LD está para o ensino como suporte ou complemento a algum assunto que o
professor já tenha abordado previamente. E em relação a forma como foi apresentado o
gênero conto, é possível captar seus objetivos comuns, apesar da possibilidade de maior
aprofundamento teórico. Nas páginas 50 e 51, por meio da apresentação do conto Circuito
Fechado de Ricardo Ramos, sugere-se a impossibilidade de fixar uma estrutura pré-
determinada que encerre o gênero, o que aponta uma perspectiva já subsidiada pela noção de
gênero discursivo e não do gênero como delimitação estrutural. Algo também que chamou a
atenção no livro é que em certos momentos as autoras dão sugestões de leituras para os
alunos, exemplo disso são os “boxes” que fazem sugestões de escrita e de produção de
textos.
No capítulo seis é abordado o tema “Intertextualidade”. Neste capítulo encontramos
certa relação com textos da teoria de Bakhtin, pois as autoras utilizam-se dos termos
“polifonia” e “vozes” para construir a definição da intertextualidade a partir dessa
perspectiva. O gênero discursivo que foi utilizado neste capítulo foram as tirinhas, mas nada
se comentou em relação a este gênero. Manteve-se a sequência ocorrida desde o início:
primeiramente o assunto proposto e em seguida os conceitos dos possíveis tipos de
intertextualidade com seus exemplos.
É notório que as autoras introduzem o aluno a alguns conceitos prévios relacionados
à literatura para, posteriormente, adentrar especificamente nos gêneros literários. Assim, os
primeiros itens relacionados à literatura (estilos literários) aparecem a partir do capítulo sete
com o tema “Trovadorismo”. Como foi descrito anteriormente, os LD de literatura possuem
uma estrutura física que se baseia nos estilos de época e em sua ordem cronológica. Esta
coleção não segue diferente critério.
33
O primeiro tema relacionado aos gêneros literários, já mencionado, foi o
trovadorismo. No boxe “Na bagagem” as autoras introduzem com os seguintes
questionamentos:
Como se originou a literatura portuguesa?
Você já ouviu falar em trovadores, menestréis, jograis e cantigas trovadorescas? O
que seria o trovadorismo?
Você sabe o que significa o amor cortês e vassalagem amorosa?
Você acha que as “declarações de amor” da época medieval eram feitas da
mesma forma que as de hoje?
Canções contemporâneas podem apresentar características medievais? Por que?
Percebemos algumas inadequações nestes questionamentos para a abertura do
assunto, pois para responder a primeira questão, por exemplo, o aluno no mínimo já teria
que ter lido algo a respeito do assunto, para poder minimamente comentar a questão. Écerto
que esse boxe tem o objetivo de retomar os conhecimentos prévios dos alunos, mas a
questão poderia ser melhor formulada. No decorrer do capítulo, há alguns exemplos de
cantigas e é importante frisar que elas foram apresentadas de forma completa com
vocabulários que apresentavam suas traduções quando necessário. Na exposição do gênero
literário “cantigas” as autoras utilizaram-se recursos de intertextualidade para exemplificá-
las (o que demonstrou relação com os assuntos anteriores), em outras partes, limitam-se
apenas à apresentar cantiga e seu conceito (exemplo essa das cantigas de amigo) e, ainda em
outros momentos, as cantigas são utilizadas para exercício de classificação. Vale
retomarmos os seguintes questionamentos que orientam a leitura das cantigas de escárnio e
de maldizer:
Qual é a importância histórica da poesia satírica produzida pelos trovadores
portugueses?
Qual é o objetivo das cantigas satíricas?
Contemporaneamente, são produzidas no Brasil letras de músicas que cumprem
objetivos semelhantes aos das cantigas satíricas. Explique essa alternativa e dê
exemplos.
34
Destacamos essas questões pelo valor reflexivo que elas possuem. Quando os alunos
têm contato com questionamentos desse tipo a compreensão é incentivada por meio da
reflexão sobre o sentido proposto no texto e seus objetivos. A discussão sobre o
trovadorismo aparece no QDCC que afirma ser vital abordar as “características das cantigas
trovadorescas” e “as novelas de cavalaria” que serão vistas mais à frente. Sob a perspectiva,
desse quadro vemos que há semelhanças na sequencia didática do livro, uma ordenação
lógica.
No capítulo oito são contemplados mais gêneros literários: “crônica histórica”,
“prosa doutrinaria e educativa”, “novelas de cavalaria”, “autos” e “farsas”, que são
mencionados, com ou sem exemplos na sequência, com o objetivo de apresentar o período
Humanismo. O destaque neste capítulo foi para o gênero auto e farsa, o livro apresenta Gil
Vicente como um autor representativo da escrita desses gêneros, dando como exemplo
trechos de sua obra. Em contrapartida, para propor uma intertextualidade com Gil Vicente
apresentam-se trechos dos autores Ariano Suassuna e Carlos Drummond. Um artifício usado
para deixar a sequência mais didática consistiu no diálogo entre esses autos e farsas com
acontecimentos atuais. A sugestão que destacamos para o capítulo seria que, já que foram
utilizados apenas trechos das obras em muitos momentos, que existisse ao menos um balão
de fala sugerindo ao aluno a leitura do texto integral, para que o mesmo seja estimulado ao
contato com a obra por completo, o que não houve nessa parte.
No capítulo nove se apresenta o período estético Renascimento. Toda a abordagem
está voltada para um contexto histórico e social e como essa nova estrutura refletiu para a
construção de produções literárias na época que gerou o Classicismo. Podemos verificar
mais uma vez a preocupação das autoras em preparar o aluno dessa vez com eventos
históricos para relacioná-los ao período que será estudado. Esta noção coincide com o
QDCC mais uma vez que revela a essencialidade de se “estabelecer relações entre o texto
literário e o momento de sua produção, situando aspectos do contexto histórico, social e
político” (p.42). O gênero literário exposto no capítulo foram os poemas e partiu-se
primeiramente de sua metrificação. Após essa compreensão inicial, o livro seguiu para a
construção dos poemas e suas características: o soneto, poesia épica e lírica. Houve destaque
para a obra épica e o exemplo utilizado foi a obra “Os Lusíadas” que, a partir de trechos,
foram elaborados questionamentos para a compreensão da obra e do gênero. O mais notável
da abordagem foi a tentativa bem sucedida de explorar este assunto através da música de
uma banda brasileira, pois a partir da letra da música houve uma reflexão do que estava
sendo estudado em relação a um gênero mais atual e da realidade dos alunos. O QDCC
35
também possui um tópico sobre este ponto: “dialogando entres as cantigas trovadorescas e a
MPB” (p.42). O gênero literário soneto também foi bastante trabalhado no livro. Nos
capítulos que se referem ao Barroco e ao Arcadismo há uma variedade de exemplos do
gênero, aproximando o aluno para a compreensão desses períodos literários e suas
respectivas estruturas.
Percebemos que, apesar do estudo do LD estar dividido em três vertentes, ainda há
exemplos do ensino pensado de maneira orgânica. Durante o primeiro eixo de aprendizagem
que aborda a literatura encontramos esses questionamentos na página 52:
Como você viu em “Circuito fechado”, os adjetivos e as locuções adjetivas modificam
o substantivo para:
(1) caracterizar os objetivos nomeados pelo substantivo;
(2) restringir, particularizar, limitar o sentido dos substantivos.
Em seu caderno, classifique cada um dos adjetivos ou locuções adjetivas a seguir,
marcando 1 ou 2.
a) Creme de barbear
b) Creme dental
c) Água fria
d) Água quente
e) Creme para cabelo
f) Xícara pequena
g) Maço de cigarros
h) Maço de guardanapos
i) Copo com lápis
j) Esboços de anúncios
k) Bloco de papel
l) Projetor de filmes
m) Caixa de fósforos
n) Escova de dentes
E na página 151:
Com relação ao trecho do sermão que você leu, responda:
a) A quem se refere o pronome eles?
b) A quem se refere o pronome nós?
34
Encontramos nessas questões aspectos relacionados ao uso da gramática normativa
em que são necessários conhecimentos prévios dos alunos para que se chegue à resposta. E
ainda apesar das perguntas serem voltadas para o aspecto gramatical não se utilizou, neste
momento, do texto como um pretexto, pois os alunos irão no primeiro caso, por exemplo,
tentar compreender os sentidos dos adjetivos e das locuções adjetivas através da perspectiva
que se apresentam na frase e, no caso do segundo questionamento, a partir da leitura do texto
eles devem inferir a quem se refere o pronome “eles” e “nós”. Seguem-se deste modo os
eixos de aprendizagem: Gramática e estudo da língua e a Produção de textos orais e
escritos, exemplos da organicidade que o ensino da linguagem possui. No capítulo 20, por
exemplo, é abordado o tema “Fonemas, letras e acentuação gráfica”. Para a compreensão
deste assunto utilizou-se “poemas concretos”. No eixo da produção de textos, o capítulo 29
aborda o tema “Crônica humorística com diálogo e antologia da turma” apresenta a
possibilidade de trabalho com produção de textos através do gênero literário crônica, que
mais uma vez demonstra a possibilidade do ensino de língua portuguesa no trabalho
conjunto.
Podemos inferir que o LD possui uma linha de pensamento bastante regular: segue-
se um exemplo de texto relacionado ao tema especifico, em seguida os questionamentos e,
por fim, as classificações e características. Há capítulos que agregam conhecimentos
multidisciplinares como exemplo a explanação dos temas Hip-hop e ainda sobre Arte
Conceitual e suas tendências como a Arte Povera. Vale ressaltar novamente a forte ligação
com as produções artísticas, como por exemplo, as obras de arte que retratam fatos
históricos no Brasil para introduzir a literatura brasileira e como os acontecimentos
históricos mundiais influenciam os acontecimentos no país. Grande parte dos exercícios são
voltados para a reflexão dos textos não apenas para sua estrutura e em muitos momentos
esses questionamentos são relacionados a aspectos mais atuais e da realidade do aluno.
Assim sendo é perceptível modificações na metodologia dos livros didáticos analisados,
apesar de ainda encontrarmos em determinados momentos o trabalho com fragmentos de
textos sem ao menos uma sugestão para leitura futura.
35
9 ANÁLISE: PORTUGUÊS LINGUAGENS EM CONEXÃO -
VOLUME 2
O volume 2, destinado a alunos do segundo ano do ensino médio, possui 12 capítulos
que abordam o estudo literário, 17 capítulos que abordam os o estudos da gramática e 8
capítulos que abordam o estudo do texto. Seguem os objetivos específicos para a 2º série do
EM descritos na PCLPEM página 62:
Figura 10: Objetivos do QDCC 2º série. Fonte: PCLPEM. Acesso: 2016.
A leitura de imagens abre mais uma vez o volume. O capítulo 1 possui o título: “Arte
e história no Romantismo brasileiro – Leitura de imagens”, o que segue o mesmo ritmo do
primeiro volume que é relacionar os momentos históricos através das obras de arte para
situar os alunos do que será proposto no interior da obra. O mesmo ocorre no capítulo 4 que
possui o título: “Iracema, personagem do romantismo” onde são abordadas as inspirações
dos artistas em suas produções que retratam a personagem do romance Iracema de José de
Alencar, demonstrando a possibilidade de inspiração dos artistas através da literatura. Os
capítulos 7 e 11 também retratam leituras de imagens que contam seus respectivos
momentos históricos através das obras de artes.
A dinâmica e a sequência de assuntos relacionados ao Romantismo estão divididas
em quatro capítulos, dois abordam o gênero literário poesia e dois a prosa literária
36
respectivamente, que acabaram por coincidir com o que se apresenta no QDCC, que afirma
ser preciso “pesquisar os poetas e os prosadores românticos” (p.63). No decorrer da
abordagem da poesia romântica foram apresentados os principais autores e suas principais
produções. Nos capítulos 2 e 3 estão presentes os primeiros momentos da escrita romântica
na poesia. A abordagem se constitui seguindo a sequência já utilizada no volume anterior
(segue um exemplo de texto seguido de questionamentos). Toda a perspectiva revela as
características principais das três gerações do romantismo brasileiro e da Europa dentro de
um contexto bastante social. O que mais chamou a atenção foi que temos mais uma vez
exemplos da abordagem do tema que fazem referências a produções contemporâneas. Duas
canções escritas por compositores brasileiros que dialogam bastante com a escrita
romântica. Na página 37 a primeira canção é de Vander Lee:
Leiam esta letra de canção de Vander Lee, cantor e compositor mineiro
contemporâneo:
Românticos
Românticos são poucos
Românticos são loucos
desvairados
Que querem ser outro
Que pensam que o outro é o
paraíso
Românticos são limpos
Românticos são lindos e pirados
Que choram com baladas
Que amam sem vergonha e sem
juízo
São tipos populares
Que vivem pelos bares
E mesmo certos que vão pedir
perdão
E passam a noite em claro
Conhecem o gosto raro
De amar sem vedo de outra
desilusão
Romântico é uma espécie em
extinção
Românticos são loucos
Românticos são poucos
Como eu
(Como nós)
(Vander Lee ao vivo (CD). Indie
Records, 2003).
a) Que marcas do movimento romântico dos séculos XVIII e XIX estão presentes na
letra dessa canção?
b) Que palavras e expressões da letra podem traduzir características do “mal do
século”?
c) Vocês também acham que “Romântico é uma espécie em extinção”? Conhecem
pessoas assim?
34
E na página 47 aparece a segunda canção que se constitui de um rap escrito por Slim
Rimografia que faz relação ao poema de Castro Alves: O navio negreiro:
Leia a letra do rap “O navio negreiro”, de autoria de Slim Rimografia, rapper,
grafiteiro e poeta do movimento hip hop paulista contemporâneo.
O navio negreiro
Estamos em pleno mar,
Embarcações de ferro e aço,
Onde pessoas disputam
Palmo a palmo por um espaço
Nesse imenso rio negro
De piche e asfalto,
Cristo observa tudo calado,
De braços abertos lá do alto.
Onde a lei do silêncio
Impede que ecoe o grito do morro,
Dos poetas em barracos sem forro,
Que clamam por socorro.
[...]
O navio hoje é barca
Sem velas, só sirene.
Navegando na estrada,
Hoje volantes, ontem lemes.
O porão do navio
Hoje é chiqueiro de camburão.
Os chicotes e açoites
Trocados pelo cacete e oitão.
A senzala virou presídio,
O quilombo é a favela,
Os zumbis pelo mundo
São Malcolm X, Luther King,
Zumbis ou Mandelas.
(SLIM Rimografia. O navio
negreiro. São Paulo: Panda Books,
2011, [s.p])
Todas as canções dialogam com a sequência da abordagem sobre a poesia romântica.
Analisando novamente o QDCC apreendemos que há um tópico que apresenta esse mesmo
procedimento metodológico que afirma ser possível: “Trabalhar por meio de música, as
características do romantismo”. (p.63). Deste modo encontramos semelhanças de currículo
identificado no livro.
Os capítulos 5 e 6 abordam o romantismo e sua prosa literária, apresentando como
subtemas o romance indianista, urbano, regionalista, histórico, o romance pré-realista, a
comédia de costumes e o romantismo em Portugal. Observamos que essa divisão escolhida
pelas autoras deixou a sequência didática ordenada, pois dessa forma trabalhou-se
automaticamente com os subgêneros da prosa, a exemplo: o gênero romance, o gênero
conto, o gênero novela dentre outros. Um recurso utilizado durante a abordagem do
34
romantismo e que aparece no capítulo cinco foi a presença de textos introdutórios não
literários, mas falas de críticos literários que comentam sobre o período em questão,
promovendo uma ambientação ao tema que será exposto. Os romances e os romancistas
relacionados na abordagem se correlacionam com as fases sofridas pelo romantismo, o que
apresenta continuidade da metodologia dos volumes e ainda no capítulo cinco aparecem
alguns questionamentos relacionados ao romance Iracema de José de Alencar que chamam
nossa atenção. Na página 69 e 70 vemos:
Releia os parágrafos 5 e 9 para responder:
a) Que características do Romantismo estão presentes nos parágrafos 5 e 7?
b) O que quebra a estabilidade inicial? Em que parágrafos isso acontece?
Como o guerreiro é descrito?
Do ponto de vista de quem é feita a descrição do guerreiro? Justifique.
O narrador parece querer aproximar o leitor da cena. Que recurso ele usa?
Identifique-o no primeiro parágrafo.
Identifique o tipo de narrador e justifique com passagens do capítulo?
Questionários desse tipo aguçam a noção de pesquisa e releitura dos alunos, pois
apesar dele já ter lido o texto, a pergunta direciona a um novo pensamento, ou seja, se o
aluno não tiver entendido algo na primeira leitura possivelmente na releitura há grande
possibilidade de compreensão. Os dois últimos autores relacionados no capítulo cinco
ficaram limitados a perguntas de vestibulares e consequentemente o trecho baseado na obra
teve uma abordagem simplificada. No capitulo 6 a abordagem de seus subtemas foram bem
simplificadas. Porém, o que sofreu destaque foi a proposta do exemplo do teatro romântico
ou comédia de costumes, em que se fez a leitura da peça teatral do período romancista. E
como um prelúdio para a próxima escola literária (Realismo), o capítulo já faz alusão
utilizando-se de um trecho da obra Memórias de um sargento de milícias, já sendo um
romance pré-realista.
Os capítulos 8 e 9 foram destinados à abordagem do período literário Realismo e
Naturalismo. Mas no capítulo 7 há uma introdução do tema geral, que ocorre através da
leitura de imagens, o que também se apresenta no QDCC na página 68 que indica a “leitura
de pinturas realistas e naturalistas. Na apreciação do capítulo oito o tema principal girou em
35
torno das particularidades naturalistas e realistas: um conto, um romance e um filme da
atualidade foram utilizados na abordagem. O destaque principal do capítulo foi a
apresentação do autor Herculano Marcos Inglês de Sousa, pois até este momento no LD não
se havia mencionado nenhum autor da região norte brasileira. Este, representando o estado
do Pará, aparece como um dos destaques na escrita naturalista, o que incita os alunos a
conhecer autores da nossa região. Sabemos que grande parte dos livros didáticos que
chegam nas escolas de Manaus pertencem a autores de outros estados (por exemplo, do eixo
Rio-SãoPaulo), ou seja, as produções literárias regionais geralmente não são contempladas
nesses livros e tudo o que se tem destas obras literárias fica a cargo do professor em abordá-
las em sala. Então foi bem positiva a sensibilidade das autoras em abordar no LD autores
que pertencem as várias regiões brasileiras.
O capítulo finaliza de forma bem didática, apresenta a obra Cidade de Deus de Paulo
Lins (trecho inicial da obra), que é um romance contemporâneo que reflete bem as
particularidades do naturalismo e no boxe “Fique ligado” ainda apresenta o filme que ajuda
a refletir ainda mais sobre este período literário. No QDCC menciona essa possibilidade
metodológica que diz: “Assistir filmes que retratam o Realismo e o Naturalismo” (p.68). No
capítulo nove que aborda ainda este mesmo tema, a proposta foi baseada em pequenos
trechos de romances realistas (novamente os trechos estavam muito fragmentados e em
outros momentos aparecem dentro de perguntas de vestibulares, deixando a abordagem de
leitura literária superficial). A despeito da abordagem geral, a apresentação e os exemplos
dos romances do autor Machado de Assis corroboraram para a compreensão do tema (no
QDCC há uma ênfase maior na escrita e reflexão desse autor). As autoras optaram por
apresentar a trilogia9 escrita por Machado (apresentou trechos de dois romances e sugestão
do terceiro), que mostra a possibilidade que a ficção literária têm de possuir uma
continuidade, mesmo sendo romances completamente independentes, não deixam de seguir
a mesma linha de pensamento e os efeitos de sentidos produzidos em cada uma são
parecidos. O capítulo fecha com uma breve análise do realismo em Portugal.
O estudo literário neste volume finaliza com duas escolas literárias: o Parnasianismo
e o Simbolismo (capítulos 10 e 12 respectivamente). Ambas possuem a abordagem através
do gênero literário poesia, por meio do qual são apresentados os principais escritores do
período e suas respectivas obras. Há uma seletiva de poemas que revelam as particularidades
9 A trilogia é composta pelos romances: Memórias Póstumas de Brás Cubas (1881), Quincas Borba
(1891), Dom Casmurro (1899).
36
dos dois movimentos literários e os questionamentos produzidos também vão ao encontro
dessa perspectiva.
Podemos inferir algumas ponderações relacionadas a este volume: em determinados
momentos os textos literários apresentados foram mais concisos comparados aos
apresentados no volume anterior e houve momentos em que a abordagem tornou-se
minimalista, podendo até serem retiradas por falta de profundidade no assunto. Em alguns
momentos, os textos apresentados surgiram como pretexto apenas para perguntas de
vestibular, o que comprometeu a sequência didática que desde o volume um vinha
corroborando para a dinâmica de sala. A divisão dos capítulos em prosa e poesia colaborou
para a sequência dos temas abordados, pois a partir dessa divisão os gêneros a serem
trabalhados foram delimitados em razão de melhor didaticidade. Diferentemente do
primeiro volume, neste não houve as sugestões de prática de produção dos gêneros literários
que estavam sendo apresentadas, a produção textual restringiu-se apenas ao eixo de Textos
Orais e Escritos que por sinal não podem deixar de ser mencionadas. Sob uma avaliação
linguística, os debates apresentados como sugestões de produção textos foram bem
diversificados e peculiares, pois são questões que pouco se vê nas aulas de produção. Alguns
temas foram: artigo de divulgação cientifica, artigo de opinião, júri simulado, reportagem,
recital etc. . As produções discutem os gêneros e apresentam sugestões para essa abordagem,
sendo meio caminho andado para boas discussões em sala de aula. Destes podemos destacar
a abordagem do Artigo de divulgação científica, cuja ideia consiste em produzir um artigo
sobre o tema: “Biopirataria no Brasil”, com breve explanação do assunto por meio de textos
relacionados a partir dos quais sugere-se a produção de um artigo.
10 ANÁLISE: PORTUGUÊS LINGUAGENS EM CONEXÃO -
VOLUME 3
O volume 3, destinado a alunos do terceiro ano do ensino médio, possui 16 capítulos
que abordam o estudo literário, 5 capítulos que abordam os o estudos da gramática e
linguagem e 8 capítulos que abordam o estudo do texto e sua produção. Percebemos que a
exceção do volume 2, a coleção possui maior parte para a abordagem dos estudos literários
ou seja a literatura guiou grande parte do planejamento didático proposto. A seguir os
objetivos específicos para a 3º série do EM descritos na PCLPEM na página 81:
37
Figura 11: Objetivos do QDCC 3º série. Fonte: PCLPEM. Acesso: 2016
A maneira como se deu a introdução deste volume foi bastante diferenciada: o
gênero discursivo utilizado no capítulo foi a charge. Podemos inferir sobre a escolha desse
gênero, pois sabemos que na construção das charges e em sua leitura é possível verificar
grande carga metafórica e crítica que geralmente envolve aspectos sociais. Assim vemos que
para dar continuidade à linha de pensamento dessa coleção que tenta refletir sobre a vida
social contemporânea, a utilização articula-se à proposta no sentido de nos alunos a noção
expectativas sobre discussões políticas e sociais. O título desse capítulo é “As revistas e as
charges contam a nossa historia – Leitura de imagens”. As autoras apresentaram a capa da
revista “Careta” (revista que circulava nacionalmente) do ano de 1922. Essa capa de revista
contém uma charge que reflete sobre a vida social desse período, relacionar e dialogar com a
realidade atual brasileira, aproximando o aluno a essa realidade. Recurso este utilizado
também no capítulo nove que tem como título “Imagens: registros, denúncias, emoção e
plasticidade” e que apresenta, dentre outras coisas, pinturas, capas de livros e fotos
jornalísticas, que retratam a vida de miséria e desolação vividas por parte da população.
Por ser o volume que trata do período moderno e contemporâneo, onde tudo o que
estava sendo produzido (na arte, na literatura e etc.) refletia no que estava acontecendo
socialmente, a relação a esta realidade e a estes gêneros discursivos foi propícia. O QDCC
dá ênfase a este respeito na página 82 onde consta que é necessário “identificar, nos
discursos literários e artísticos, indicativos das grandes revoluções que aconteciam no
mundo” e ainda “associar os temas do modernismo às manifestações político-ideológicas da
época”.
38
No decorrer dos capítulos que contemplam o período pré-modernista e modernista
brasileiro, o gênero poesia e os gêneros em prosa (conto e romance etc.) encontram-se
bastante diversificados. É perceptível que a seleção dos textos foram pensados de maneira
que as obras dos autores apresentados demonstrassem as características relacionadas a cada
uma das fases modernistas. Ressaltamos que em muitos momentos, escritores que
geralmente são esquecidos nos livros didáticos ou não são considerados para uma
explanação foram utilizados no volume além dos mais expressivos de cada período. O
estudo do modernismo foi dividido em seis capítulos, cinco para o modernismo brasileiro
que contém as diferentes gerações modernistas (três gerações) e seus estilos de escrita
(prosa, poesia e teatro). No quadro demonstrativo (QDCC) explicita-se que é relevante “ler e
interpretar autores das gerações modernistas” (p. 83). E, por fim, um capítulo para o
modernismo em Portugal. Apontaremos alguns aspectos relevantes para essa extensa
abordagem.
Os capítulos dois e três abordam o período literário Pré-modernismo: sendo que no
primeiro deste se apresentam as obras de prosa e no segundo as obras de poesia. Em relação
à abordagem do capítulo dois, que fora baseada no gênero literário romance, a sequência foi
voltada para a reprodução de trechos das obras de autores específicos (que foram três) e que
possuíam uma finalidade especifica para os questionamentos feitos. A obra analisada que
mais chamou a atenção foi a do romance Triste fim de Policarpo Quaresma de Lima
Barreto. Foram utilizados muitos trechos da obra; sendo que a escolha desses recortes
textuais e os questionamentos propostos em seguida foram moldando a apresentação e
descrição dos personagens e suas atitudes, consequentemente a compreensão da escrita pré-
modernista e como ela se construía. Na página 37 encontramos:
Leia este outro trecho:
Para Ismênia, era como se todos os rapazes casadoiros tivessem deixado de existir.
Arranjar outro, era trabalho acima de suas forças. Coisa difícil [...] Decididamente,
estava condenada a não se casar, e ser tia, a suportar durante toda a existência esse
estado de solteira que a apavorava [...]. Era um castigo. A Quinota ia casar-se, o
Genelício já estava tratando dos papéis; e ela que esperava tanto, e fora a primeira a
noivar-se, ia ficar maldita, rebaixada diante de todas.
(BARRETO, Lima. Triste fim de Policarpo Quaresma. 23 ed. São Paulo: Ática, 1999. P. 70)
Qual é a ideia central desse trecho da obra?
39
A partir do trecho proposto na questão e com a ajuda do professor, pode-se levantar
várias discussões sobre o papel social das mulheres nesse período, por exemplo, o modo
patriarcal que caracterizava a sociedade relatada, dentre outros assuntos. Isto torna o texto
vivo, pois os alunos já poderão inferir sobre estes aspectos sociais e que eram retratados na
escrita pré-modernista. Ou ainda na página 38:
Leia agora este outro trecho de Triste fim de Policarpo Quaresma:
Olga pôde ver tudo isso bem à vontade, andando de um para o outro lado [...]. O que
mais a impressionou no passeio foi a miséria geral, a falta de cultivo, a pobreza das
casas, o ar triste, abatido de gente pobre. Educada na cidade, ela tinha dos roceiros
ideia de que eram felizes, saudáveis e alegres. Havendo tanto barro, tanta água,
porque as casas não eram de tijolos e não tinham telhas? Era sempre aquele sapê
sinistro e aquele sopapo que deixava ver a trama das varas, como de um doente.
(BARRETO, Lima. Triste fim de Policarpo Quaresma. 23 ed. São Paulo: Ática, 1999. P.
102)
A que aspecto da realidade do povo brasileiro o trecho anterior faz referência?
Mais uma vez, a partir do trecho adquirimos muitas possibilidades de discussões em
sala. Toda análise apresentada no LD sobre esta obra foi voltada para esse seguimento. Essa
sequência didática deixou a obra em si mais atrativa para a possível leitura da obra completa
pelos alunos. No QDCC aparecem habilidades relativas a este aspecto: o aluno deve adquirir
competência em “compreender o texto literário como lugar de manifestação de ideologias” e
ainda enfatiza em seus procedimentos que “se debata em grupos as diferentes opiniões
apresentadas em textos literários”. No capítulo três o que mais chamou a atenção foi a
abordagem sobre a autora Gilka da Costa de Melo, normalmente não mencionada como
autora de referência ao pré-modernismo.
No capítulo quatro são abordadas as vanguardas artísticas em relação ao modernismo
brasileiro. O LD desde o início já organiza essa ideia da relação com a leitura de imagens e
este capítulo especificamente volta-se para essa abordagem. Seguindo esse modelo de
correlação entre a leitura de obras artísticas e a literatura os alunos perceberão o quanto o
mundo artístico e seus períodos influenciaram a literatura e seus autores. Este tópico também
é descrito no quadro demonstrativo que nos procedimentos salienta: “traçar o panorama
40
histórico, contemplando: o futurismo, cubismo, expressionismo, dadaísmo e surrealismo” e
também “identificar os traços vanguardistas nas artes plásticas” (p.82).
No capítulo cinco que abordou a poesia da primeira geração do modernismo no
Brasil, a proposta final no boxe “Produção de textos” fechou de maneira satisfatória o
capítulo. A proposta foi a produção de um poema dadaísta, de forma que os alunos não
fiquem apenas na teoria, mas experienciem a prática da produção de um gênero literário
específico. Esse método utilizado em todo o livro pelas autoras é bastante inovador,
demonstrando um cuidado não apenas com a maior quantidade de leituras feitas mas,
sobretudo, com a compreensão de cada uma delas.
No capítulo seguinte, que aborda o modernismo em Portugal, há um aspecto notável
na sequência didática do livro que desde o primeiro volume já aparecia e que se intensificou
no terceiro. As autoras trabalham com um recurso chamado “inferência textual”. Por
exemplo, na página 81 no boxe “Na bagagem” se apresentam os seguintes questionamentos:
Qual seria o tema de um poema que tem o seguinte título: “Fim”?
E na página 82:
Você conhece e o tema de um poema intitulado “Cântico Negro”?
Que pontos comuns haveriam entre a proposta poética de “Cântico Negro” e dos
modernistas brasileiros?
Colocando em foco essas questões vemos que as autoras chamam o aluno para
fazerem inferências e hipóteses sobre o texto que logo em seguida será lido. Apesar de ser
questionamentos até certo ponto simples, percebemos neste o chamamento ou a tentativa de
suposições pré-textuais que aguçam a imaginação dos alunos para o texto.
Em relação à estrutura das questões produzidas a partir dos textos lidos (até mesmo
nos outros volumes) podemos analisá-las seguindo alguns aspectos. As autoras apresentam
diferenciadas estruturas para pontuarem seus questionamentos, a exemplo, na página 142, no
41
boxe “Nas trilhas do texto” em que vemos questionamentos a partir do trecho do romance:
Vidas Secas de Graciliano Ramos:
Identifique o cenário e a situação das personagens descritos nesse trecho?
Explique o que as seguintes passagens do texto revelam sobre a personagem
Fabiano?
(a) “Tinha o coração grosso queria responsabilizar alguém pela sua desgraça”.
(b) “A seca parecia-lhe como um fato necessário [...]”
(c) “[...] e o vaqueiro precisava chegar, não sabia onde e”;“[...] coçou a barba ruiva e
suja, irresoluto, examinou os arredores”
(d) “- Anda, condenado do diabo [...]”, “[...] fustigou-o com a bainha da faca de
ponta”; “[...] ainda lhe deu algumas pancadas [...]”; “[...] zangado, praguejando
baixo.”; “[...] desejou matá-lo.”; “- Anda, excomungado.”; “Aí a cólera
desapareceu e Fabiano teve pena”.
Em sua opinião, é possível compreender a atitude desse pai em relação ao filho mais
velho?
Como você interpreta a preferência a “sons guturais”, “interjeição gutural” para se
referir à forma de se expressar de Sinhá Vitória?
Questionamentos que apresentam esta estrutura dão a oportunidade ao aluno de
desenvolver seu ponto de vista em relação à leitura e a não ser omisso no processo de
compreensão textual. Os termos como: “identifique”; “explique”; “em sua opinião” e “como
você interpreta” abre um leque de possibilidades ao qual o aluno pode desenvolver a
resposta sob sua interpretação pessoal. Para tornar mais eficaz a compreensão das perguntas,
a proposta surgere que se responda os questionamentos oralmente junto com a turma, assim
as respostas não ficariam restritas ao entendimento de cada aluno, sendo compartilhada e
complementada pelas leituras dos demais colegas.
Há ainda as questões de cunho mais conhecida dos alunos, que são as de “múltipla
escolha”, por exemplo, na página 169 que questiona sobre a leitura de um trecho do romance
Grande sertão: veredas de Guimarães Rosa:
42
Registre em seu caderno a alternativa correta a respeito do trecho que conta a
história de Maria Mutema.
(a) A experiência erótica e existencial de uma mulher constrangida pela cultura
sertaneja, mas movida por desejos e instintos.
(b) A trajetória de uma mulher com tendências para o crime, mas que luta
interiormente, com a ajuda da religião, para superar as tendências mórbidas de
seu caráter.
(c) A historia de uma mulher, apresentando mitos, lendas, a luta entre medo e
pecado, em que o mal prevalece sobre o bem.
(d) A historia de uma mulher que revela que o mal não tem face e que a palavra tem
poder.
(e) A experiência de uma mulher, revelando uma visão maniqueísta e simplificada
da realidade.
Explique em seu caderno a alternativa que não interpreta adequadamente o desfecho
da historia de Maria Mutema.
(a) Noção de justiça e honra, própria do sertão.
(b) Religiosidade: princípio cristão que oferece o perdão aos que se arrependem.
(c) Respeito as leis institucionalizadas pelo direito público.
(d) Solidariedade e compreensão do sofrimento humano.
(e) Reconhecimento da possibilidade de transformação do ser humano.
Ambas as questões acabam por proporcionar ao aluno a experiência em questões que
se apresentam em vestibulares, pois seguem a mesma dinâmica. Na segunda questão da
atividade acima, as autoras vão além, solicitando ao aluno a explicação para a alternativa
escolhida no caderno. Em questões nesse estilo já fazemos essas inferências mentalmente,
mesmo assim as autoras propõem que o aluno exteriorize através do texto escrito esses
pensamentos.
Há também uma terceira modalidade de questionamentos que se pode verificar na
página 179 relacionado ao romance A hora da Estrela de Clarice Lispector:
43
Leia o trecho de A hora da estrela em que Macabéa se olha no espelho após ser
despedida do emprego de datilografia.
[...] Depois de receber o aviso foi ao banheiro para ficar sozinha porque estava toa
atordoada. Olhou-se maquinalmente ao espelho que encimava a pia imunda e
rachada, cheio de cabelos, o que tanto combinava com sua vida. Pareceu-lhe que o
espelho baço e escurecido não refletia imagem alguma. Sumira por acaso a sua
existência física? Logo depois passou a ilusão e enxergou a cara toda deformada pelo
espelho ordinário, o nariz tornado enorme como o de um palhaço de nariz de
papelão. Olhou-se e levemente pensou: tão jovem e já com ferrugem. [...]
Registre em seu caderno a afirmativa que não interpreta corretamente o trecho lido.
(a) O emprego conferia a identidade de Macabéa.
(b) A ausência do reflexo de sua imagem conota a impossibilidade de existência
pessoal, física e social de Macabéa.
(c) Macabéa reflete sobre sua não existência
(d) Há uma analogia entre a miséria da personagem e a miséria do ambiente.
(e) Macabéa teve um delírio e perdeu a consciência.
Os questionamentos que apresentam este estilo, como no exemplo acima, vem
geralmente com outro trecho da obra ou com algum texto diferente, porém ambos os textos
estão inteiramente relacionados com o intuito de acrescentar ideias novas e compará-las ao
texto que já foi lido. Além de ter a mesma estrutura de perguntas dos vestibulares (e no caso
do terceiro ano do ensino médio é importante o contato com atividades desta construção),
quando as autoras utilizam o termo negação, já interfere no objetivo das questões. Ainda
houve momentos que outros recursos ou gêneros foram utilizados tais quais: tirinhas, fotos e
depoimentos para aprimorar a ideia nas questões. Aqui abordei apenas três estilos de
questionários, mas durante o LD há outros estilos e modalidades, além daquelas que
possuem o cunho da gramática normativa.
Os capítulos doze e treze contemplam a abordagem Prosa Contemporânea. A
abordagem é feita em torno do gênero literário crônica (que é abordado mais amplamente) e
há uma seleção de romances e contos para exemplificarem as escritas iniciais da realidade
contemporânea. O que chama a atenção no capítulo doze é a apresentação do contexto
literário conhecido como “realismo fantástico” ou “realismo mágico”. Por meio dos autores
44
citados e suas respectivas obras, o livro expõe esta modalidade de escrita que é pouco
conhecida e disseminada no ensino básico. Importa ainda destacar que foram considerados
tantos escritores brasileiros como da literatura mundial o que deixou bem mais abrangente o
assunto.
O boxe “Produção de textos” sugere uma atividade bastante colaborativa, que
consiste na leitura completa dos textos que foram lidos durante a explanação tentando focar
no que mais se tem sobre crítica social e, a partir dessa perspectiva, esboça uma imagem que
observasse o contexto da obra. Há um tópico que reflete sobre isto no QDCC que comenta
sobre “o dialogo por meio de desenhos com os prosadores” (p.86). Tem-se, assim, uma
atividade relevante, pois o aluno a partir da leitura criará imagens possíveis para representar
o que leu.
O capítulo treze que têm o subtítulo “Novos gêneros e diálogos” traz um assunto
bem diferente e que se concretizou na escrita contemporânea. O tema em questão são as
modalidades ou subtipos do conto: os minicontos, os microcontos e os nanocontos. As
autoras propuseram uma análise bem abrangente sobre esse tema que ainda rendeu mais um
capítulo neste volume no eixo de “Produção de texto”. A proposta feita no capítulo 28 foi
produção de um microcontos produzida pelos alunos, o que mais uma vez deixou os alunos
em contato com o gênero estudado.
Os últimos dois capítulos do LD fazem alusão às tendências literárias
contemporâneas. No capítulo quinze que possui o título “Poéticas brasileiras da segunda
metade do século XX ao século XXI” traz temas como o concretismo, a poesia de praxes e a
poesia-processo, dentre outras tendências que no quadro demonstrativo também são
mencionadas para o estudo. Podemos destacar dessa abordagem a menção ao autor
amazonense Thiago de Mello que foi apresentado no livro como um dos autores mais
reconhecidos da literatura amazonense. Assim como aconteceu no volume 2 dessa coleção,
mais uma vez apresentou-se um autor da nossa região e da nossa literatura, foi muito
importante que pelo menos um de nossos autores fora mencionado, pois como sabemos o
estudo da literatura regional fica inteiramente a critério do professor, o que mereceu
destaque para este trabalho.
Por fim, no capítulo dezesseis mais uma vez as autoras trouxeram uma discussão
bastante inovadora para assuntos estudados nesse nível da educação básica. O título do
capítulo é “Vozes femininas, afrodescendentes e africanas contemporâneas” e apresenta as
expressões da literatura feminista a nível mundial e nacional, sua importância para o
momento histórico e social, além da apresentação de autores negros da África e do Brasil.
45
Uma característica da coletânea foi a abertura para diferentes discussões que
raramente aparecem em livros didáticos. Assuntos neste estilo costumam ficar a critério do
professor e raramente são contemplados nos materiais didáticos. Nesse sentido, as autoras
foram bastante felizes nas escolhas dos assuntos que compuseram este volume.
Conseguimos perceber que a seleção de autores ocorreu de maneira bem diversificada e
também levou em consideração não apenas autores do chamado “cânone literário”, mas
também aqueles que possuem sua parcela na produção literária de diferentes momentos
históricos. Encontramos uma excelente seletiva dos textos abordados nos momentos de
leituras e, em continuidade às sugestões de produções textuais que colaboraram para que o
aluno não ficasse apenas na leitura das obras e sim agisse sobre o que estava lendo,
colocando em prática tudo o que era proposto. Por fim, a continuação da didática observada
ao longo dos três volumes segue a perspectiva do ensino atualmente defendida agregando,
inclusive, as produções artísticas dos momentos históricos vivenciados em cada período de
produção literária.
11 APONTAMENTOS GERAIS DO LD A PARTIR DAS ANÁLISES
A partir do que foi apresentado durante as análises dos livros didáticos, nesta seção
apontaremos algumas situações que durante a leitura dos livros chamou-nos de alguma
forma a atenção para a apresentação da sequência didática:
Observando a forma como são ambientadas as estruturas discursivas da leitura dos
livros, um recurso utilizado foi o uso de “vocabulários” que no decorrer da sequência
dos textos apareciam para “traduzir” uma palavra arcaica e desconhecida do texto. Isto
colaborou para a compreensão geral do que estava sendo estudado.
Uma característica que é também bastante diferenciada nesta coleção é a inserção de
epígrafes em cada início de capítulo. As epígrafes apresentam autores diferenciados que
em certo ponto podem influenciar o aluno a à partir da frase querer conhecer mais obras
desse autor.
46
Ao final de alguns capítulos foram propostas atividades possíveis para os professores:
Produção de texto oral: Sarau Literário e produção de textos trabalhando o gênero
discursivo “comentário”, “peça teatral” demonstrando que o LD quis ir além dos
conceitos e exemplos promover o desempenho efetivo do uso oral da língua.
As questões do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) que aprecem no final de
cada capítulo é uma proposta até certo ponto boa, apesar de ocupar muito espaço no
livro em que poderiam ser inseridos mais textos para a leitura.
Com relação aos boxes em geral podemos relacionar alguns. Os boxes que
apresentavam a vida dos autores com suas respectivas caricaturas permitiu a
aproximação dos alunos para com esses autores. Os boxes de “Produção de textos”
apresentavam fichas de leituras como sugestões, para organizar as leituras feitas pelos
alunos, o que colaborou com propostas para possíveis atividades feitas pelo professor.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
No decorrer desta pesquisa foram apresentadas perspectivas relacionadas aos gêneros
discursivos, em especial ao gênero literário. Buscamos refletir sobre o aspecto valorativo do
gênero literário para os anos finais do ensino básico, visto que é neste período que este
gênero se intensifica. Ainda consideramos as análises documentais dos parâmetros que
coordenam a educação atual e o ensino da literatura e focalizamos na abordagem do gênero
literário em livros didáticos do EM com vistas a verificar se estes possuem subsídios
mínimos para corroborar na dinâmica professor/aluno em sala de aula. A pesquisa pode ser
divida nesses três momentos, cada um destes itens com seu valor especifico que se
complementam. Dessa maneira podemos intervir e refletir sobre estes três tópicos que aqui
foram explanados.
Os gêneros discursivos, como abordado, possuem um estudo bastante amplificado na
atualidade, o essencial para entendê-lo é saber sobre sua natureza social e discursiva, este
tema foi amplamente discutido nas obras do Círculo de Bakhtin. Estes gêneros estão
presentes em todos os ambientes ao qual estamos inseridos, o que só demonstra sua grande
47
representação. A educação evoluiu em grandes proporções quando passou a utilizá-lo mais
abrangentemente, apesar de ainda existirem muitos equívocos relacionados ao seu ensino.
Os documentos paramétricos (PCNEM, OCEM e PCLPEM), que foram norteadores
de uma das ideias principais da pesquisa, revelam-se como subsídios para o ideal da
proposta de ensino e aprendizagem. No entanto, apesar de já existirem há muitos anos, ainda
não são aplicados nas escolas de maneira eficaz. Percebemos este fato até pela estrutura
apresentada nos livros didáticos que são construídos com base na tradição da literatura. As
discussões e debates relacionados a estes documentos precisam estar fortemente presentes
nos cursos de formação de professores e nas escolas, os professores necessitam dessa teoria
que é comum a todo o Brasil para que as aulas de literatura não estejam voltadas apenas para
os estudo dos períodos literários e sim em sua leitura e reflexão.
E, por fim, ao que foi descrito e lido nos livros didáticos, podemos apontar que ainda
aparece nesses materiais um ensino voltado para uma abordagem tradicional da literatura,
visto que toda a argumentação se baseia nos movimentos literários cronológicos onde são
apresentados características e autores mais influentes do período, ou seja, ainda subsiste
nesses materiais indícios de uma tradição do ensino estruturalista ou normativista que se
sobrepõe aos ideários de leitura e reflexão. Outro ponto que persiste são os eixos de divisão
do ensino de língua em: Literatura; Gramática e Produção Textual que persistem nos livros
didáticos denotando que a proposta veiculada nos PCNEM (2000) ainda não se apresenta
nesses materiais.
Em contraponto a essas questões, já é possível encontrar relevantes mudanças que
demonstram que nem tudo é insucesso. Nos livros analisados, por exemplo, é possível
averiguar muitos avanços em recursos didáticos que a princípio podem ser relevantes para o
ensino e a aprendizagem. Em propostas descritas no LD, por exemplo, nos boxes “Na
bagagem” as perguntas listadas em grande parte buscavam a leitura reflexiva do aluno a
partir de seus conhecimento, levando-os a produzir um sentido para o que seria lido e
discutido em sala de aula, a partir dos questionamentos apresentados, formando suas
próprias opiniões. Ainda que haja a divisão entre os eixos de estudo da língua portuguesa,
foi verificado que no boxe “Palavras na lupa”, encontram-se estudos relacionando textos
literários lidos com reflexões gramaticais pertinentes a eles, mesmo estando no “eixo”
estudo da literatura (e ainda as propostas de produção de textos presentes neste eixo). Por
fim, mas não menos importante apontamento, ressalta-se que o ensino da literatura
amazonense é praticamente desconsiderada nos materiais didáticos e, neste sentido, é
importante enfatizar o papel fundamental do professor de, por meio de uma elaboração
48
autônoma de aula, inseri-la no planejamento didático pedagógico uma vez que tal conteúdo
integra a Proposta Curricular do Estado do Amazonas para esse segmento de ensino.
49
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Médio. Manaus: Secretaria de Estado de Educação e Qualidade do Ensino, 2012.
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1999.
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oficiais e o que se faz? In: BUNZEN, Clecio e MENDONÇA, Márcia (Orgs.). Português no
ensino médio e formação do professor. São Paulo: Parábola Editorial, 2006.
50
PINHEIRO, Hélder. Reflexões sobre o livro didático de literatura In: BUNZEN, Clecio e
MENDONÇA, Márcia (Orgs.). Português no ensino médio e formação do professor. São
Paulo: Parábola Editorial, 2006.
51
ANEXOS
ANEXO I – Quadro Demonstrativo do Componente Curricular (QDCC)
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53
54
55
56
57
58
59
60
ANEXOS II – Resenha PNLD /2015
61
62
63
APÊNDICE
64
AGRADECIMENTOS
Este projeto de pesquisa surgiu a partir de uma proposta feita a mim, por uma
professora que se tornou muito querida durante meus últimos anos no curso de Letras. Ele
pode levar o nome de apenas um autor, mas este não teria produzido quase nada sem ajuda.
Obrigado:
A Deus, por sempre estar presente em minha vida, por cumprir suas promessas, por
me acolher em seus braços e por dar força de vontade.
A meus pais, mais que maravilhosos, que estão sempre ao meu lado, dando seus
conselhos e motivação necessária e por acreditar em mim quando até mesmo eu me esqueço
disso.
À minha orientadora Prof.ª Drª. Fernanda Dias de Los Rios Mendonça, por confiar a
mim essa pesquisa (espero ter suprido as expectativas) e, além disso, por acreditar em mim.
Obrigado por todas as orientações, pela dedicação depositada e por todos os ensinamentos
que levarei para o resto da vida. Formamos uma relação de amizade.
Ao professor Alexandre Figueiredo por ceder os livros didáticos e o guia do livro
didático 2015 analisados na pesquisa, sem o qual não haveria a produção.
À memória de Mikhail Bakhtin que através de sua obra inspira tantos pesquisadores.
Estou orgulhoso de ser mais um dos que não permitem que sua obra desapareça. E aos
demais teóricos e suas pesquisas que contribuíram para sustentar as ideias apresentadas
durante o trabalho.
Aos professores e professoras do curso de Letras Língua e Literatura Portuguesa da
Universidade Federal do Amazonas, que me apresentaram a Linguística e a Literatura, afinal
ambas aparecem em minha pesquisa. Sem dúvida suas vozes estão representadas em minha
escrita.
Ao Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC), que
proporciona essa oportunidade para o início da pesquisa e por não permitir que ela se
estagne.
Às colegas de pesquisa Ingrid Tamara e Danielle Serrão pertencentes ao grupo de
estudos LADI, por seu companheirismo e amizade.
E por último, porém não menos importante, a todos aqueles que não mencionei, mas
que de alguma forma colaboraram nessa jornada anual de pesquisa e por fazerem tudo valer
a pena.