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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ
Fernanda Ferro
ENSINO JURÍDICO: UMA ANÁLISE CRÍTICA QUANTO A PRÁXIS
DAS FACULDADES DE DIREITO
CURITIBA
2010
ENSINO JURÍDICO: UMA ANÁLISE CRÍTICA QUANTO A PRÁXIS
DAS FACULDADES DE DIREITO
Curitiba
2010
Fernanda Ferro
ENSINO JURÍDICO: UMA ANÁLISE CRÍTICA QUANTO A PRÁXIS
DAS FACULDADES DE DIREITO
Monografia apresentada ao Curso de Direito da
Faculdade de Ciências Jurídicas da
Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito
parcial para a obtenção do título de Bacharel
em Direito.
Orientador: André Peixoto de Souza.
CURITIBA
2010
TERMO DE APROVAÇÃO
FERNANDA FERRO
ENSINO JURÍDICO: UMA ANÁLISE CRÍTICA QUANTO A PRÁXIS
DAS FACULDADES DE DIREITO
Esta monografia foi julgada e aprovada para a obtenção do título de Bacharel em Direito no curso
de Direito da Universidade Tuiuti do Paraná, pela seguinte banca examinadora.
Curitiba, ___ de _______________ de 2010,
____________________________________________
Professor Dr. Eduardo de Oliveira Leite
Coordenador do Núcleo de Monografias
____________________________________________
Orientador: Professor André Peixoto de Souza Universidade Tuiuti do Paraná Curso de Direito ____________________________________________ Membro da Banca Universidade Tuiuti do Paraná / Curso de Direito
_____________________________________________ Membro da Banca Universidade Tuiuti do Paraná / Curso de Direito
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho de conclusão de curso
primeiramente a Deus quão bondoso foi ao
oportunizar uma vida incrível. Esta conquista
também é dedicada a minha mãe Marisbete
que se fez o impossível para que eu pudesse
me dedicar integralmente a esta graduação e
ajudou nos momentos de desânimo e cansaço,
ao meu pai Sizifredo que sempre me deu o
exemplo de caráter e acreditou em meu
potencial, aos meus irmãos Eduardo e
Leonardo por fazerem parte da minha vida
deixando-a mais alegre. E ao meu marido
Antonio, que com seu amor e carinho lutou e
me incentivou para a concretização desta
graduação.
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente ao meu Ilustre
orientador de monografia, Professor André
Peixoto de Souza, por me auxiliar
pacientemente neste processo de finalização de
curso, mostrando o verdadeiro sentido a palavra
professor. Sem o seu apoio, seria muito mais
árduo o desenvolvimento do trabalho de
conclusão de curso. Também agradeço a
Terezinha Irene Mossmann e Jocelaine Moraes
de Souza que acreditaram em meu potencial e
me oportunizaram atuar na área jurídica da
PMC.
RESUMO
A presente monografia expõe uma análise crítica quanto à expansiva crise no ensino jurídico brasileiro. Partindo de conceitos referentes à educação no Brasil e relato sobre o escopo das universidades fez-se um breve apanhado de como o ensino superior deve ser prestado. Na seqüência é explicitada uma retrospectiva do histórico do ensino de direito no Brasil e de como o direito é concebido pela sociedade atual. Também, é ponderado sobre a massificação do ensino jurídico, a capacitação precária dos docentes e o fraco embasamento dos educandos. Após, são discorridas propostas quanto a possibilidade de reestruturação na educação jurídica e consequentemente obter um novo foco na cultura jurídica brasileira. Palavras-chave: ensino jurídico; filosofia jurídica; direito; práxis.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ............................................................................................... 07 2 EDUCAÇÃO .................................................................................................... 11 2.1 CONCEITOS SOBRE A EDUCAÇÃO .......................................................... 12 2.2 AS UNIVERSIDADES........................................ .......................................... 15 3 ENSINO JURÍDICO BRASILEIRO ............................................................ 21
3.1 HISTÓRICO DO ENSINO JURÍDICO NO BRASIL....................................... 21 3.2 O ENSINO JURÍDICO .................................................................................. 26 4 E O DIREITO FICA COMO? ........................................................................... 31
5 A CRISE NO ENSINO JURÍDICO ................................................................... 36
5.1 MASSIFICAÇÃO DOS CURSOS DE DIREITO ............................................ 38 5.2 DILETANTISMO NO CORPO DOCENTE DAS INSITUIÇÕES DE ENSINO 41 5.3 EDUCANDOS COM BAIXO NÍVEL DE APRENDIZAGEM .......................... 46 6. PROPOSTAS PARA UMA NOVA CULTURA BRASILEIRA ....................... 49
7. CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................... 55
8. REFERÊNCIAS .............................................................................................. 58
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1. Introdução
Todo assunto abordado sobre as legislações e tribunais sempre foram
tratadas de maneira complexa e tradicional, onde os aplicadores da lei se focam
em cumprir o determinado pela legislação atuando de forma estanque da qual a
transformação da sociedade não tem importância nenhuma, mas sim o ponto
tratado pelos tribunais e lei.
O direito é visto sob um aspecto que não contribui para a modificação da
população, é aquele poderoso que fica acima de todas as pessoas, apresentando
um resultado negativo aos cidadãos que ignoram seus direitos se exilando dos
seguimentos da sociedade.
Segundo Paolo Grossi (2006, p.05): “O processo de involução do direito
foi inarredável: a lei é um comando, um comando com autoridade e autoritário, um
comando geral, um comando indiscutível, com sua vocação essencial de ser
silenciosamente obedecido (...)”.
É evidente que a sociedade encara qualquer assunto jurídico com
restrições e de forma negativa, onde para o cidadão comum quem conhece a lei
tem privilégios, pois a construção histórica jurídica foi realizada para a ocorrência
da mesma.
Faz se necessária uma análise crítica da cultura jurídica brasileira para
assim poder avaliar o porquê é apresentada está deformidade histórica na
formação jurídica entre as pessoas.
Sabemos que as universidades de direito tem o papel de alicerçar a
formação jurídica dos estudantes de maneira a desenvolver um saber crítico
voltado para a transformação social, ou seja, um direito acessível que se
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apresente a população. Os docentes deveriam ter o papel de transformadores do
saber jurídico, onde seus educandos teriam uma prática consistente e humanística
não resumida apenas ao ensino de normas.
O Professor Paulo Freire pontua:
“Minha presença de professor, que não pode passar despercebida dos alunos na classe e na escola, é uma presença política. Enquanto presença não posso ser uma omissão, mas um sujeito de opções. Devo revelar aos alunos a minha capacidade de analisar, de comparar, de avaliar, de decidir, de optar, de romper. Minha capacidade de fazer
justiça, de não falhar com à verdade. Ético, por isso mesmo “. (1999, p.110)
Portanto, podemos verificar que a função dos educadores é bem diferente do que
podemos observar pelas universidades e instituições de ensino.
Percebemos que o ensino jurídico no país vive uma crise estrutural,
operacional e funcional criando assim um exacerbado número de bacharéis onde
a formação é deficiente porque a prática de ensino é delimitada no estudo de
técnicas jurídicas e aplicações de textos legais não possuindo qualquer relação
política e conteúdo social, pela didática autoritária dos educandos e principalmente
pela proliferação das faculdades de direito onde não se verifica um controle desta
qualidade.
Nesta séria deficiência educacional que as faculdades de direito passam
observamos que as instituições apresentam um currículo falho, não
condescendente com a realidade jurídica, onde os professores pretendem atingir
um ótimo resultado em suas avaliações medianas e se contentam com as notas
100 (cem) de seus alunos que não passa de uma dissimulação, ou seja, provas
objetivas não representam o conhecimento adquirido por um educando. É
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perfeitamente cabível o aspecto levantado pelo professor SOUZA (2008):
“Normalmente as avaliações estão diretamente relacionadas com o adestramento
do estudante a questões já estabelecidas por um rito prático e comum às
Academias: os exames públicos, os concursos, a preparação para o mercado.”
Com a proliferação das faculdades de direito e a relação de cliente/aluno,
onde o que importa às instituições é a mensalidade em dia, é cada vez mais
comum deparar-se com “bacharéis” que apresentam pouco conhecimento jurídico
e principalmente sem formação de consciência crítica, portanto nos defrontamos
com os chamados “analfabetos funcionais”, que são as pessoas que possuem
algum conhecimento sobre o que foi instruído, mas não conseguem entender a
importância do que foi lhe “ensinado”.
É de fundamental importância que o modelo de ensino praticado nas
nossas faculdades de direito sejam repensados desde suas propostas
pedagógicas determinadas pelo MEC até a prática discente das faculdades.
Assim o assunto a ser abordado é a educação jurídica. E para que seja
possível estudar especificamente por que da crise no ensino do direito,
analisaremos a formação jurídica no Brasil, a deformidade social no direito, as
verdadeiras funções das universidades e dos seus docentes, o número
incontrolável de novos bacharéis em direito e quais problemas serão acarretados
pela desenfreada e deficiente formação dos “doutores da lei”.
O tema proposto será subdivido em três grandes partes: a primeira será a
análise da educação como um todo e o verdadeiro foco das instituições de ensino
superior, a segunda parte ressaltará sobre o ensino jurídico no Brasil
apresentando um pequeno resgate histórico e o ensino proposto nas faculdades
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de direito, e por último será apresentado os principais motivos da crise
educacional jurídica e uma análise crítica quanto a propositura de mudanças na
estrutura do ensino de direito.
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2. EDUCAÇÃO
Muitas são as referências para desenvolver um estudo sobre a educação
jurídica brasileira, uma vez que o assunto em destaque tem passado por uma
desmedida crise social.
Atualmente, as faculdades de direito no Brasil estão sofrendo uma
diminuição em seu grau de excelência científica, devido à massificação dos cursos
de direito e conseqüentemente de bacharéis em direito.
Neste sentido, COSTA aponta: “O curso do Direito no Brasil atravessa seu
momento mais problemático. Seja pela quantidade de formandos, seja pela
proliferação de Cursos de Direito, (...)” (2008, p.67)
Para que seja possível desenvolver uma análise sobre o ensino jurídico
brasileiro ocorra de forma integral devem-se abordar primeiramente alguns
conceitos sobre a educação, para então podermos refletir sobre a crise na
educação jurídica brasileira e discorrer sobre algumas possíveis mudanças
estruturais.
O locus da educação é exposto de maneira sábia pelo filósofo ESTEVÁN
MÉSZÁROS: “ (...) o significado real de educação, digno de seu preceito, é fazer
os indivíduos viverem positivamente à altura dos desafios das condições sociais
historicamente em transformação (...)” (2005, p.83), portanto o objetivo da
educação é emancipar, transformar; assim como esta análise que desenvolverá
reflexões sobre possíveis mudanças no ensino jurídico brasileiro.
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2.1 CONCEITOS SOBRE A EDUCAÇÃO
Segundo FRANCO:
“A educação é uma prática social humana; é um processo histórico, inconcluso, que emerge da dialeticidade entre homem, mundo, história e circunstâncias, (...) transforma-se pela ação dos homens e produz transformações nos que dela participam (...) e integram sempre um
sentido emancipatório às suas ações.” (2003, 72-75)
A partir da idéia da autora seguimos delimitando o conceito de educação
como sendo um objeto complexo que permeia toda sociedade humana com a
intenção de desencadear ações formadoras, onde a sua prática deve estar
pautada numa ação coletiva dialógica e emancipadora com função de transformar
democraticamente a realidade social.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 93.94/96)
estabelece que:
“Artigo 1º- A educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais. (...) § 2º A educação escolar deverá vincular-se ao mundo do trabalho e à prática social.
Sendo assim, toda ação educativa é intencionalmente responsável pelas
manifestações científicas e pela humanização do homem, não podendo sofrer
fragmentações ou reduções sob o risco de perder o seu foco, ou seja, é
necessário que o ensino seja multidisciplinar onde cada conteúdo se relacione e
transponha a uma compreensão ideologizada.
Verificado nas lições de FREIRE temos que: “Aprender para nós é
construir, reconstruir, constatar para mudar, o que não se faz sem abertura ao
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risco e à aventura do espírito.” (1999, p.77), por isso a aprendizagem é algo que
deve ser realizada com afinco por parte de todo o sistema educacional.
Ao conceituar a educação, automaticamente nos remetemos a infindáveis
reflexões onde podemos reavaliar o papel de todo o sistema educacional. É com a
educação que podemos reerguer toda a estrutura de um país, e transformar a sua
cultura. Quando o grande educador Paulo Freire afirma que: “A capacidade de
aprender serve não apenas para nos adaptar, mas, sobretudo para transformar a
realidade, para nela intervir, recriando-a(...)” (1999, p.76), temos assim, que o
educador possui uma imensa importância de revolucionar com a educação e que
consequentemente ela pode aprimorar uma nação.
O ensino deve ter essencialmente um caráter político, do qual o educando
poderá possibilitar desafios e desencadear ações sociais formadoras. É
importante ressaltar que a política da qual nos referimos não é politicagem
apresentada pelos nossos governantes, mas uma política onde os educandos
discutam mecanismos democráticos, participativos e inclusivos. Como afirma
DEMO: “Sem qualidade política, conhecimento é apenas arma, para o bem ou
para o mal. É essencial saber discutir a função social e política do
conhecimento(...) (2004, p.158)
São os ambientes educacionais que promovem o estímulo da inteligência,
exercitam e despertam a curiosidade dos indivíduos. Para MORIN: “Uma
educação só pode ser viável se for uma educação integral do ser humano. Uma
educação que se dirige a totalidade aberta do ser humano e não apenas a um dos
seus componentes.” (2007, p.11), ou seja, é de grande auxílio que as instituições
educacionais instiguem uma aprendizagem qualitativa dos seus educandos.
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Todo o sistema educacional deve lutar contra a alienação de seus
educandos e educadores, possibilitando assim mudanças positivas na sociedade
e permitindo suas transformações em cidadãos conscientes e ativos.
Dizemos que a educação:
“(...) é parte da sociedade e tem com todo uma relação dialética – há uma interferência recíproca que atravessa todas as instituições que constituem o social. Além disso, podemos verificar que a educação contraditória –ao mesmo tempo em que é fator de manutenção, ela
transforma a cultura.” (RIOS, 1997 p.38)
Sendo assim, uma educação é definida como emancipadora, quando
permite que os educandos participem de práticas voltadas para a transformação
social.
A educação brasileira passa por uma crise onde educar se tornou um
número a ser apresentado pelo governo, não concebendo uma aprendizagem
qualitativa e emancipadora, mais sim uma quantitativa estatística de educandos
matriculados.
Destarte, existe um outro problema educacional que é ignorado pela
sociedade, e que a cada dia fica mais sobressalente é a chamada “supremacia do
conhecimento fragmentado”, que segundo CHAUÍ: “(...) a fragmentação (...)
propõe a especialização como estratégia principal do ensino(...)” (2003, p.08),
permitindo nas instituições educacionais uma formação estreita.
Com o capitalismo tão priorizado pela sociedade, é deixada de lado a
educação de qualidade pelo foco no consumo. Mas tem-se consciência de que é
de interesse do governo que as pessoas sejam ignorantes e sem visão crítica,
para que todas as barbáries ocorridas não sejam nem ao menos notadas.
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Para MÉSZÁROS:
“A educação que poderia ser uma alavanca essencial para a mudança, tornou-se instrumento daqueles estigmas da sociedade capitalista: “fornecer conhecimentos e o pessoal necessário à maquinaria produtiva em expansão do sistema capitalista, mas também gerar e transmitir um
quadro de valores que legitima os interesses dominantes.” ( 2005, p. 15)
A citação do filósofo Esteván Mésáros expõe de forma clara que para a
sociedade a educação serve apenas para uma preparação ao mercado trabalho.
Infelizmente perde-se o verdadeiro sentido que é bem maior que a obtenção de
lucros, que é a preparação para a vida, ou seja, é a educação que possibilita a
transformação da sociedade de maneira positiva e não puramente a aquisição de
lucros e poder.
2.2 AS UNIVERSIDADES
As universidades são espaços do quais os educandos devem instruir-se
sobre diferentes aspectos da realidade em todas suas formas, construir um saber
sistemático e global, sendo capaz de ter uma compreensão geral sendo ela
histórica, política, e ética. São nestas instituições que educandos viram
transformadores sociais proporcionando mudanças positivas na sociedade.
Para a professora MARILENA CHAUÍ: “A universidade é uma instituição
social e como tal exprime de maneira determinada a estrutura e o modo de
funcionamento da sociedade como um todo.” (2003, p.5) Portanto, nas faculdades
observam-se diferentes opiniões, atitudes e o principal deparamo-nos com uma
verdadeira prática social.
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Segundo MACHADO: “(...) destaca-se como papel fundamental da
universidade o de promover a formação da cidadania contribuindo assim para o
desenvolvimento e a consolidação democrática da sociedade.”(2009, p.37), desta
maneira o escopo das faculdades é impulsionar o desenvolvimento científico tendo
como objetivo a construção da democracia e de uma sociedade politizada.
São as universidades que permitem a pluralidade do saber, onde são
possíveis questionar a respeito de tudo e todas as coisas. Nestes espaços se atua
com o chamado tripé: ensino, pesquisa e extensão de forma livre e social, onde é
dada a oportunidade ao educando de atuar como um emancipador, sendo aquele
que busca uma transformação efetiva na sociedade.
Sabemos que a educação é capaz de romper com a ignorância, mudar o
pensamento de uma sociedade. É com a idéia do professor PAULO FREIRE que
devemos refletir que: “A solidariedade social é a política de que precisamos para
construir a sociedade menos feia e menos arestosa, em que podemos ser mais
nós mesmos, tem na formação democrática uma prática de real importância.”
(1999, p.47), portanto é com um saber articulado que podemos buscar subsídios
para conseguir uma sociedade mais justa e humana.
A professora Marilena Chauí afirmou em “A universidade pública sob nova
perspectiva” (2003) que as instituições de ensino superior tem o propósito da
autonomia intelectual, sendo presumível que hajam conflitos sociedade/Estado
com as universidades, na medida em que a prática social adotada é oposta da
vivenciada pela sociedade.
Sob a égide da Constituição Federal, a educação brasileira tem como
escopo:
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“Artigo 205: A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o mercado de trabalho.”(grifo nosso)
Pelo fato do Estado não ter que ser o único responsável pelo ensino
superior, conta-se com o ensino privado que segundo a professora MARILENA
CHAUÍ: “(...) a educação deixou de ser concebida como um direito e passou a ser
considerada um serviço(...). A reforma do Estado definiu a universidade como uma
organização social e não como uma instituição social”. (2003, p.06)
A título de estabelecer, nas universidades em que há o cunho de
instituição social existe a chamada universalidade, onde há uma divisão social e
política, enquanto as nomeadas de organização não pretendem politizar seus
educandos, mas gerir a obtenção de lucros. (Marilena Chauí, 2003)
Sem sobra de dúvida que responsabilidade de educar a sociedade
deliberada ao Estado foi significativamente transferida aos entes particulares que
possuem uma visão de organizacional do ensino. Geralmente estas organizações
são regidas por estratégias e programas de eficiência, que determinam contratos
de gestão, avaliações de produtividade programas de eficiência organizacional.
As instituições privadas de uma maneira geral:
“(...) se entregaram a um projeto exclusivamente empresarial de obtenção de lucros, executando-se as universidades confessionais, será muito difícil, se não impossível ou até mesmo irracional, falar-se num ensino autônomo, crítico e de qualidade, comprometido com a formação da cidadania, com a pesquisa e com o objetivo de promover o
desenvolvimento do país.” (MACHADO, 2009, p.41)
Destarte, uma organização educacional não tem a finalidade de trabalhar
com seus educandos um saber crítico, reflexivo, que componham mudanças e
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superações sociais, uma vez que estas organizações são competitivas e cumprem
exigências de mercado delimitando a formação e prontamente lançando uma
fragmentação de conhecimento.
Através do bung do capitalismo e da tecnologia, a ciência educacional passou a ser tratada como uma força produtiva. Onde CHAUI expõe:
“A ciência deixou de ser teoria com aplicação prática e tornou-se um componente do próprio capital. Donde as novas formas de financiamento das pesquisas, a submissão delas às exigências do próprio capital e a transformação da universidade numa organização ou numa entidade
operacional.” (2003 p. 08)
Com esta nova faceta de ensino superior, a aprendizagem foi perdendo sua
função e se tornou um ilusório aprendizado cientifico. Onde as organizações
educacionais simulam todo um desenvolvimento para o educando que acredita
estar potencializando seu conhecimento através das aulas e conteúdos
fragmentados, simplesmente destinando a finalidade ao mercado de trabalho.
O professor GADOTTI aponta o seguinte pensamento:
“A integração entre ensino e trabalho constitui-se na maneira de sair da alienação crescente, reunificando o homem com a sociedade.” Sabemos então que tanto o trabalho como a educação são essenciais para a formação do homem, mas que está deve ocorrer de modo dialético, ou
seja, em constante modificações buscadas com qualidade. (1984, p. 54-55)
Porém, a única vinculação que o ensino está tendo com o trabalho são os
lucros para grandes organizações e mão-de-obra submissa capaz de desenvolver
apenas as competências que o mercado exige.
“O professor Cristóvam Buarque,(1994, citado por MACHADO, 2009, p.45) da UNB, refletindo acerca do papel e da função do ensino superior na sociedade industrial, em absoluta sintonia com os primeiros tempos da nova era moderna, considera que a
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universidade fora completamente aprisionada pelo mercado, transformada num elemento da produção – deixando seu mister fundamental de formar pensadores para formar profissionais teóricos nos moldes impostos pelo mercado-, com o destino específico de produzir apenas a mão-de-obra necessária à cadeia produtiva.”
Na medida em que destacamos a situação do ensino superior brasileiro,
percebemos que estamos no meio de uma estrondosa crise onde
conseqüentemente o mercado de trabalho está cercado de profissionais com uma
péssima formação universitária, em destaque a “despolitização dos bacharéis em
direito no Brasil.”
Em decorrência desta massificação do ensino e propensão das
organizações educacionais em aumentar seus lucros, tem-se observado nas
universidades a racionalização dos custos quanto a contratação de professores
sem qualquer preocupação com a qualidade de ensino, onde tem se preferido
educadores sem título de mestre ou doutor, algumas chegam até a demitir o
quadro de profissionais ou repreendendo a apresentação dos títulos adquiridos.
Sabemos que é necessário que o espaço universitário tenha como
proposta a formação político-crítico de seus educandos e não simplesmente o de
repassar conteúdos onde os alunos apenas decoram os conteúdos para as
avaliações e não assimilam seus conhecimentos criticamente. É necessário que o
educando tenha: “(...) uma compreensão geral, do ponto de vista histórico, social e
ético, acerca do próprio saber produzido na universidade, bem como a respeito da
utilização e do destino em que se dará esse saber.” (MACHADO, 2009, p. 35)
Em 2004, foi apresentado no Censo de Educação Superior, que entre
1995 e 2004 as instituições educacionais de 894 passaram a 2013, ou seja, houve
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um crescimento de 125%, e as vagas oferecidas de 610.355 aumentaram para
2320,421, totalizando um aumento de 280%.(MEC, 2004, Citado por Machado,
2009)
Estes dados servem para refletirmos de quantos por cento destas
faculdades oferecem um curso de graduação com qualidade, e que tipos de
profissionais sairão destes cursos. É uma constatação da qual presenciamos uma
séria crise na educação da qual precisamos refletir e procurar alternativas para
que a qualidade do ensino seja posto como prioridade na sociedade.
A professora MARILENA CHAUÍ ressalta o quão cuidadosos devemos ser
ao tratar do ensino superior e pontua:
“É preciso tomar a universidade do ponto de vista de sua autonomia e de sua expressão social e política, cuidando para não correr em busca de sempiterna idéia de modernização, que no Brasil, como se sabe, sempre significa submeter a sociedade em geral e as universidades(...) a critérios e interesses que servem ao capital e não aos diretos do
cidadão.” (2003, p.15)
Assim é necessário repensar qual o futuro que nossa sociedade terá e qual
a qualidade dos profissionais queremos no mercado de trabalho.
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3.0 ENSINO JURÍDICO BRASILEIRO
3.1 HISTÓRICO DO ENSINO JURÍDICO NO BRASIL
Segundo MACHADO (2009) o ensino jurídico brasileiro teve seu início
através da Faculdade de Direito de Coimbra. Até o início do século XIX, inúmeros
estudantes brasileiros tinham sua formação em direito por lá. Até que a Carta de
Lei de 11 de agosto de 1827 instituiu os cursos de direito nas cidades de São
Paulo e Olinda. Elas foram regidas por Luiz José de Carvalho e Melo conhecido
como Visconde de Cachoeira.
Os cursos de direito no Brasil iniciaram como parte das exigências culturais
e ideológicas de formação do Estado. Era tido como proposta estabelecer a
formação de uma elite intelectual capaz de guiar a nação do ponto de vista jurídico
e político.
Inicialmente o ensino foi influenciado em decorrência da Reforma
Pombalina, carregando ao Brasil toda a bagagem cultural ditada nos Estatutos de
1772. (Mello, 2007)
Em São Paulo, os bacharéis eram recrutados para importantes cargos do
Estado e consequentemente das áreas Legislativas e do Judiciário. E carregando
esta conotação de poder, que ainda hoje os bacharéis possuem uma referência de
vinculação de poder, onde há possibilidade de assumir postos relevantes na
burocracia estatal. Porém como afirma MARTINEZ: “As duas faculdades criadas
em 1827 não supriram a necessidade de profissionais, para atenderem os quadros
da recém-proclamada Republica (...)” (2003, p.29)
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O ensino jurídico no império permaneceu quantitativamente da mesma
maneira do que em 1827 e: “(...) pode-se afirmar com a consulta às fontes idôneas
dos biógrafos e dos memorialistas, às reminiscências dos estudantes, que
qualitativamente a situação também não se modificara” (VENÂNCIO FILHO, 1977
p.113), sendo assim a qualidade do ensino jurídico permaneceu baixa.
Inicialmente as instalações materiais das faculdades de direito no império
eram precárias como descreve Dr. Clemente Falcão Filho quando retrata da
faculdade de São Paulo (115): “O edifício em que trabalha as faculdades está em
ruínas! Nos dias de chuvas encontram-se grandes lagoas sobre os assoalhos e
nas paredes grande manchas de água, que côa pelos telhados”.
E quanto a atividade da docência neste mesmo período VENÂNCIO
aborda:
“O ofício de professor era uma atividade auxiliar no quadro do trabalho profissional. A política, a magistratura, a advocacia, representavam para os professores, na maioria dos casos, a função principal. E aqueles que a ela só se dedicavam por vocação ou por desinteresse de outras atividades sofriam na própria carne a conseqüência de sua
imprevidência.” (1977, p.119)
Porém, mesmo com estas deficiências as faculdades de direito tiveram
suas contribuições, que foram apontadas por Oliveira Viana,1827 (citado por
VENÂNCIO FILHO, 1982, p.162): “Fundadas em 1827, nelas se educaram e
formaram representantes dessa geração que sucedeu à da Independência, e cuja
ação começou a se fazer sentir nos primeiros decênios do II Império.”
Com a outorga da Constituição de 1924 demonstrou-se a importância da
educação no Império, que:
“(...) em seu artigo 179 estabeleceu a gratuidade da instrução primária e a criação de colégios e universidades”:
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Art 179 – A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Políticos dos Cidadãos Brazileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é garantida pela Constituição do Império, pela maneira seguinte. (...) XXXII – A Instrucção primária, e gratuita a todos os Cidadãos. XXXIII – Collegios, e Universidades, aonde serão ensinados os
elementos das Sciencias, Bellas Letras, e Artes.” (1824, citado por Miranda, 2002, p.75)
A formação nas faculdades de direito em São Paulo e Olinda começaram
a ficar muito escassa para suprir a necessidade de todo o país e devido a falta de
profissionais em direito, houve pressões sociais que levaram a uma reforma
educacional, onde os dois cursos de direito deixaram de ser os únicos permitiram
a criação de outras faculdades de direito no Brasil. Foi na Bahia a primeira dessas
faculdades a se instalar.
O curso de direito era centrado no dever-ser, sendo focado numa visão
una da qual vigorava apenas o direito positivo. Para MELLO: “Nessa evolução do
ensino do direito não se trabalhou de forma racional o modelo didático-pedagógico,
conservando-se os velhos padrões que vêm sendo obedecidos desde a
Universidade de Bolonha, adaptando-se aos nossos tempos.” (2007, p.61)
A primeira fase do ensino jurídico brasileiro esteve interligado a uma
“transição de bases curriculares” com foco nos conteúdos. Este foi um momento
de afirmação do Estado Liberal.
Segundo MARTINEZ:
“Desde seu marco inicial inspirado naquilo que já era idealizado em Coimbra, a academia jurídica brasileira tendeu para o afastamento total das influências eclesiásticas nas grades curriculares. (...) A ideologia do momento exigia a consolidação do poder da classe burguesa sobre a produção do conhecimento, como já ocorrera sobre as Ciências
Naturais.” (2003, p.31)
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Constatou-se neste período que o ensino jurídico ratificou o modelo liberal,
mantendo a formação direcionada dos bacharéis não produzindo avanços
pedagógicos.
Nos meados da década de 30, o ensino jurídico sofreu uma reforma
educacional chamada de “Reforma São Francisco Campos”, que foi responsável
por instituir nas Universidades, um novo currículo permitindo uma inovação
educacional. (MIRANDA, 2008)
Em 1961, houveram mudanças no currículo do curso de direito, onde se
dispunha um currículo mínimo e uma formação com qualidade. Porém, com o
Golpe Militar em 1964 houve um direcionamento quanto a grade curricular do
curso de direito.
Os cursos de direito tiveram uma modificação no seu currículo em 1972
quando houve a chamada Resolução 3, do Conselho Federal de Educação, que
tinha como pressuposto a substituição do bacharel tradicional por um advogado
prático, voltado para o desenvolvimento. Mas raras exceções cederam a está
modificação mantendo seu currículo tradicional.(MIRANDA, 2008)
Até meados de 1987 não houveram mudanças significativas no curso de
direito onde as reformas pedagógicas foram limitadas. Para MARTINEZ:
“Continuava-se a reprodução do discurso da fase imperial como expediente para a
manutenção do poder não só da academia jurídica, mas também das próprias
classes dominantes por ela representadas.” (2003, p. 39).
Infelizmente, o ensino jurídico não conseguiu construir uma nova função
social, foi delimitado pelo ensino conservador, não obtendo espaço para uma
transformação política-social.
25
Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, foi demonstrada
uma preocupação com o ensino como todo, nos artigos 205 (já mencionado acima)
e 206, que expõe:
“O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
(...)
II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o
saber;
III - pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas (...);”
A nossa constituição foi muito coerente quanto descreveu os princípios da
educação, porém sabemos que esta é uma realidade da qual não presenciamos
nas instituições de ensino.
Após a Constituição Federal de 1988, foram propostas algumas reformas
curriculares importantes no curso de direito como a Portaria 1886/94 que segundo
MIRANDA:
“A Portaria MEC nº 1886, de 30 de dezembro de 1994, com nova proposta curricular para os Cursos de Direito inovou, implementando as atividades complementares, a prática jurídica, esta muito mais ampla que a prática jurídica do que a prática forense, e por fim o trabalho de
conclusão de curso.” (2008, p.86) Mas mesmo com a aprovação desta Portaria pelo MEC, não houveram
mudanças significativas no curso, ou seja, as alterações no currículo das
faculdades aconteceram, porém a estrutura central do curso foi mantida com
fragmentação do ensino e o uso da pedagogia tradicional.
26
Com a implementação da Nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei
9394/96), houveram poucos avanços quanto os propostos pela Portaria 1886/94.
O Conselho Nacional de Educação editou a Resolução nº9 de 2004 que
institui Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Direito e descreve em seu
artigo 3º:
“O curso de graduação deve proporcionar ao bacharel uma formação humanística e axiológica, capacidade de análise, domínio de conceitos e da terminologia jurídica, adequada argumentação, interpretação e valorização dos fenômenos jurídicos e sociais, aliada a uma postura reflexiva e de visão crítica que fomente a capacidade e a aptidão para a aprendizagem autônoma e dinâmica, indispensável ao exercício da Ciência do Direito, da prestação da justiça e do desenvolvimento da
cidadania.” (2004).
Este artigo mostra o quão rico é a proposta para o currículo do curso de
direito, porém não é o que se tem observados nas cadeiras das faculdades onde
devemos refletir quanto o papel das instituições educacionais, de seus docentes e
principalmente de seus educandos quanto a que tipo de formação estão buscando.
O histórico do desenvolvimento curso de direito no Brasil ainda sofre
modificações, mas que vale pontuar que enquanto o pensamento do sistema
educacional não se transformar, não serão decretos e portarias que farão aulas
com qualidade.
3.2 – O ENSINO JURÍDICO
Após um breve relato sobre o histórico do curso de direito no Brasil, vamos
nos aprofundar de como deveriam (na teoria) ocorrer as aprendizagens nas
faculdades de direito, ou seja, de qual maneira as instituições, docentes e
educandos deveriam proceder para viabilizar a formação do bacharel em direito.
27
O ensino formal de direito no Brasil, ocorre nas faculdades que possuem
autorização para habilitar os estudantes em certas profissões, como as jurídicas
que exigem uma formação superior na área para poder atuar.
As universidades de direito tem como proposta uma aprendizagem
autônoma e dinâmica, onde os educandos adquirem um desenvolvimento crítico-
reflexivo buscando a transformação na sociedade e permitindo aos educandos a
obtenção de conhecimentos que viabilizem está função social da aprendizagem.
Para o professor PAULO FREIRE: “(..) na diretividade da educação, esta
vocação que ela tem, como ação especificamente humana, de endereçar-se até
sonhos, ideais, utopias e objetivos (...)” (1999, p.124) Sendo assim, os estudantes
de direito devem lutar por seus ideais, ou seja, a sua formação deve estar
objetivada na justiça e igualdade do país.
Sabemos que“ (...) as diretrizes curriculares para o curso de direito estão
previstas na Resolução da Câmara de Educação Superior do Conselho Nacional
da Educação nº 9, de 29 de setembro de 2004, fixando “eixos interligados de
formação fundamental e profissional.”(MIRANDA, 2008, p.87). São descritos nos
eixos de formação fundamental “estabelecer o direito com outras áreas do saber”
e no de formação profissional “abranger além do enfoque dogmático, o
conhecimento e a aplicação dos diversos ramos do direito”.
Então a formação em direito tem como escopo a transferência direta de
saberes jurídicos que interferem nas relações sociais, de modo que os bacharéis
utilizam seus conhecimentos adquiridos nas universidades para tornar cabível o
progresso social.
28
É necessário que os acadêmicos consigam: “Identificar o direito, no
universo das criações humanas, situando-o como ordem social dotada de coerção
e, ao mesmo tempo, fórmula de garantia da liberdade (...)” (NADER, 2005,),
cumprindo a carência da coletividade possibilitando o progresso social.
Os educandos aprendem sobre os direitos, deveres e principalmente
facilitam o relacionamento entre as pessoas e os grupos sociais. NADER coloca
sobre esta importância social de se cumprir o papel social do direito:
“A sociedade sem Direito não resistiria, seria anárquica, teria seu fim. O Direito é a grande coluna que sustenta a sociedade. Criado pelo homem, para corrigir a sua imperfeição, o Direito representa um grande esforço
para adaptar o mundo exterior às suas necessidades da vida.” (2005, p. 27).
Percebemos a grande necessidade do direito na sociedade e assim de
possuir pessoas com a formação na área jurídica possam auxiliar na manutenção
do equilíbrio e à justiça nas relações.
O objeto das universidades de direito deveriam estar pautada na formação
relatada acima, onde os acadêmicos teriam sua formação para o bem comum, e
não apenas para obter vantagens sob pessoas que não tem o conhecimento do
funcionamento da lei ou concorrer em concursos públicos com excelentes salários.
Até parece utopia quando falamos de um aprendizado emancipador,
principalmente se tratando da área jurídica, pois como já constatamos a teoria é
excepcional, mas a prática se apresenta com sérias deficiências. Mas como afirma
MÉSZÁROS “(...) desde o início o papel da educação é de importância vital para
romper com a internalização predominante nas escolhas políticas circunscritas à
29
“legitimação constitucional democrática” do Estado capitalista que defende seus
próprios interesses.” (2005, p.61).
Sabemos o ensino jurídico não é feito apenas de propostas pedagógicas e
pela instituição educacional, mas também por professores e educandos. São nas
salas de aula que devem ocorrer as trocas de aprendizagem, é lá que o professor:
“possa, mediante o exercício de sua função, estender essa consciência aos
educandos, dando-lhes uma dimensão coletiva e solidária. A substância de todo o
processo educativo é, com efeito, uma atividade de conscientização” (SEVERINO,
1991, p.33).Temos então o professor como co-responsável pela satisfatória
formação de seus educandos.
“O ensino de direito é mais do que proferir lições em torno de suas
disciplinas. É sobretudo, despertar a consciência jurídica em consonância com a
sociedade moderna.”(MELLO, 2007, p.67)
Sendo assim, ensino jurídico é muito mais que a transmissão técnicas de
um saber pragmático. As faculdades de direito tem como a incumbência de além
de ensinar técnicas profissionais, o pensamento crítico, político e contextual.
É preciso tem em mente que:
“(...) o ensino superior não se resume ao argumento de autoridade nem pode ser assim qualificado tão-somente pelas eventuais vinculações que um determinado campo do conhecimento mantém com o poder, ou pelo
fato de habilitar os formandos ao exercício de profissões nobres.” (2009, p.51)
Enfim, é fundamental que as faculdades de direito devem ter como locus,
que “(...) na medida em que se destina a ensinar, transmitindo o saber necessário
30
para direcionar sua inserção na sociedade, é preciso refletir sobre objetivos da
educação.” (MACHADO, 2009, p.40).
31
4. E O DIREITO FICA COMO?
Para poder compreender a crise no atual ensino jurídico brasileiro, é
necessário primeiramente fazer uma análise de todo o contexto do direito e assim
relatar conceitos de direito, sua função social, objeto e degradação.
Segundo SANTOS, o conceito de direito é:
“Direito – (Lat. directu.) Adj. Correto, não torto. SM. O Direito, estudo das leis; neste sentido, corresponde a jus dos romanos: Jus civile, Jus gentium, Jus romanum, Jus publicum etc.; aquilo que está de acordo com o que é reto, evoluindo de acordo com a lei, conjunto das leis e a ciência que estuda as leis; mesmo neste novo sentido, a palavra tem várias acepções, como diziam os romanos: Jus pluribus modis dicitur (a
Justiça tem muitos modos de ser dita).” (2001, p.76)
É evidente que com este conceito podemos ter uma idéia de que a
sociedade tem como visão que o direito é algo hostil que fica acima de todas as
pessoas, beneficiando apenas os cidadãos que possuem conhecimento amplo de
seus direitos e os que pertencem a uma classe privilegiada podendo contratar um
advogado para cuidar de seus interesses.
Também podemos ver que PAULO NADER define o direito científico como
aquele que: “(...) compõe-se de estudos e teorias, desenvolvidos pelos juristas,
com o objetivo de sistematizar e interpretar as normas vigentes e de conceber
novos institutos jurídicos, reclamados pelo momento histórico.” ( 2005 p.181)
Sabemos que o direito é muito mais do que institutos jurídicos e normas vigentes,
é preciso ter em foco que de nada adianta doutrinas se não existe uma
identificação das normas coma sociedade.
32
Já o professor PAOLO GROSSI faz uma análise em seu livro: “Primeira
Lição sobre Direito” e relata inicialmente sobre uma crise no direito onde para ele:
“O processo de involução do direito foi inarredável: a lei é um comando, um
comando com autoridade e autoritário, um comando geral, um comando
indiscutível, com sua vocação essencial de ser silenciosamente obedecido (...)”.
(2006, p.05)
O direito é definido para a sociedade como algo estagnado, imutável, que
mesmo com o passar dos anos, todos devem seguir da maneira em que ele foi
descrito, não importando se houveram mudanças sociais.
Podemos afirmar que um dos motivos pelo qual o direito é referido como
um patamar acima da sociedade é devido a história jurídica da Europa em que foi
conexo o poder político e o Estado ao direito. Como demonstra NADER: “O direito
não estava no alcance de todos, mas de uma classe especial: a dos juristas, que
zelavam pelo ordenamento jurídico.” (2005, p.187)
O poder político é maneira de controlar toda manifestação social da
população, e o Estado é marcado pelo poder e por uma organização autoritária.
Estas características acabam se confundindo com o conceito de direito, ficando
marcado mitologicamente como a lei que permanece completamente incólume ao
decorrer dos anos.
Confirmando a idéia de que o direito é possibilitado apenas para quem
tem uma condição financeira elevada: “para Stucka (1988, citado por Machado,
2009, p.17), por exemplo, um dos dois elementos característicos do direito (o outro
é a normatividade) é exatamente o fato de ser garantido pela classe dominante
por meio de um poder, normalmente exercido pelo Estado.”
33
O direito apresentado compõe a sociedade alocando seus ordenamentos
com a finalidade dos cidadãos respeitarem a “complexidade social”, impondo os
limites do ordenamento, delineando as valorações impostas e que nem sempre
representam a dimensão social apresentada, formando assim uma realidade
jurídica deformada pelas determinações legais. MACHADO comenta:
“(...), na Ideologia alemã, Marx e Engels demonstraram que a estrutura jurídica necessariamente legaliza as relações de produção espiritual na sociedade. Isto porque as idéias dominantes tendem a ser, na verdade, a expressão ideal das relações materiais dominantes tendem a ser, na verdade, a expressão ideal das relações materiais dominantes na base
material das sociedades capitalistas.” (2009, p.19)
Na medida em que constatamos as deformidades no direito, é reforçada a
necessidade de um resgate jurídico onde as distorções históricas ocorridas
possam se direciona a ponto do direito ser aberto e compreendido conforme a
sociedade, ou seja, que as deformidades sejam alinhadas.
“O absolutismo jurídico moderno nos habituou também a leis repugnantes
à consciência comum, provavelmente refutadas interiormente pelo homem de bom
senso, mas toleradas e observadas para evitar as reações do poder
constituído(...)” (GROSSI, 2006, p.15), mas a verdadeira ordem jurídica aborda
valores de uma sociedade pontuando unicamente uma convicção de valores sem
necessidade de haver repreensão.
A sociedade tem como idéia que o direito é uma regra imperativa que
possui domínio sobre determinada ordem social, porém como afirma GROSSI: “(...)
o direito não é direta e imediatamente um comando, porque reside naquele mundo
34
objetivo de posições, relações e coordenações fechado em si por um valor.”
(2006, p.20)
Um aspecto que deve ser interligado com o direito é “humanidade”. Uma
vez que ele está escrito na história da sociedade e inserido em diferentes pontos,
porém nem sempre conforme a necessidade dos homens. GROSSI pontua: “O
direito é de fato dimensão intersubjetiva é relação entre vários sujeitos (poucos ou
muitos) e é marcado pela sua essencial socialidade”. (p.08,2006). Logo o direito
deve se portar com referências da sociedade tendo que se adaptar conforme ela
se modifica.
Primeiramente para analisarmos um resgate do direito é fundamental que
avaliemos a sociedade, e assim possamos determinar dois fatores que são
primordiais para o início desta mudança que são: a forma de organização da
sociedade uma vez que ela ordena os conflitos sociais e a observação da às
regras a serem seguidas impedindo valorações meramente subjetivas. (Grossi,
2006)
Assim sendo, podemos definir o direito como a organização das relações
entre os indivíduos que respeitam a complexidade social e não impõe forças
coativas, ou seja, as relações do direito vão se modificando conforme as
alterações percebidas na sociedade e trilhando um caminho de transformação
social.
Para que o direito exerça o seu determinado fim de “prover o meio social
em segurança”, é necessário que exista uma conexão entre o desenvolvimento
social, o saber filosófico, científico e técnico.
35
É importante que o direito seja analisado pluristicamente, onde dê para
destacar seu caráter individual obtendo sua própria autonomia, não dominado pela
sombra do Estado.
O professor PAULO NADER aponta para que o direito é muito mais do que
uma imposição do Estado, mas sim:
“A formação e a evolução do direito não resutam da simples vontade do legislador, mas estão subordinados à realidade social subjacente, à presença de determinados fatores que influeciam fortemente à própria
sociedade, definindo suas diversas estruturas” (2005 p.51)
Então para que direito tenha eficácia, deve estar ligado a realidade,
modificando conforme as transformações sociais.
Em mais uma análise GROSSI aponta:
“O direito pode ornar o social porque é realidade com raízes profundas; seria um problema, se às tantas revelações no cotidiano - uso, leis, atos administrativos, sentenças, invenções práticas – nós não correlacionássemos a intensa e incessante atividade que se dá (...)” (2006,p. 69)
Para refletir sobre o direto de maneira ética-política, MACHADO pontua
que há necessidade de realizar:
“(...) uma abordagem crítico-dialética das questões enfrentadas seria capaz de permitir e justificar os questionamentos que se fazem necessários a respeito de todo e qualquer ordenamento jurídico, bem como acerca das conseqüências que uma cultura jurídica essencialmente formalista provoca na conduta daqueles que operam
esse ordenamento na sociedade.” (2009, p.11)
Deste modo, o foco do direito é de ser valorado conforme as mudanças
históricas da sociedade e de sua cultura, e deve ser visto como um meio de
proteção para a sociedade, indiferentemente de classe social ou nível de
conhecimento.
36
5. A CRISE NO ENSINO JURÍDICO
O ensino jurídico brasileiro de hoje demonstra aos poucos um
enfraquecimento quanto a excelência científica, social e técnica. Podemos citar
inúmeros fatores responsáveis pelo enfraquecimento do ensino das faculdades e
consequentemente do direito, a massificação do ensino, a proliferação das
faculdades de direito, relação de cliente/aluno das instituições universitárias,
formação inapropriada dos docentes e também pela pouca qualidade na formação
do ensino médio dos educandos. Como afirma MACHADO:
“A crise da universidade brasileira enquanto instituição, com repercussão direita no ensino jurídico tem suas raízes não apenas em problemas internos e organizacionais, mas, sobretudo, em fatores de fundo político, econômico e social que de resto marcam toda vida institucional brasileira. Trata-se, portanto de uma crise estrutural, cujo efeitos projetam no
tempo, como se ela fosse uma crise permanente” (2009, p. 42)
Infelizmente, vivenciamos nas faculdades de direito uma falha no
funcionamento, onde presenciamos um ensino jurídico precário que cumpre uma
representação do sistema vigente. Para tanto COSTA confirma:
“Assiste-se hoje à criação e manutenção de Faculdades de Direito que, a par de não cumprirem requisitos mínimos para a saudável existência, alicerçam-se em festejado material de propaganda e divulgação com induvidosa cacaptação de alunos, a quem começam a enganar agora e terminam no futuro, em que esse bacharel irá se deparar com um mercado competitivo, no qual somente se sobressaem os mais
preparados.” (2008, p.187)
Com o afloramento dessa crise educacional é acarretado um rebaixamento
do nível científico e intelectual dos novos profissionais, causando um impacto
negativo em todas as carreiras jurídicas de uma forma geral.
O ensino que deveria se apresentar a cada dia de uma forma mais crítica,
didática, segundo MACHADO:
37
“(...) segue assim de forma idealista, por meio de uma epistemologia que não responde satisfatoriamente aos requerimentos sociais e não permite a emancipação do jurista, porquanto não proporciona a este, fora do formalismo normativista, qualquer condição para discutir conscientemente os valores que permeiam os contextos político-sociais
onde se realiza o seu saber e a sua vivência profissional.” (2009, p.56).
Não almejando a sua finalidade, que é de proporcionar transformações positivas
na sociedade brasileira.
Para que possamos realizar uma análise crítica das deficiências no ensino
jurídico, deve ter como ideal que:
“(...) que o processo educativo é a passagem da desigualdade à igualdade. Portanto, só é possível considerar o processo educativo em seu conjunto como democrático sob a condição de se distinguir a democracia como possibilidade no ponto de partida e a democracia
como realidade do ponto de chegada.”( SAVIANI, 1991, p.87 )
E mantendo este foco será possível realizar uma verificação dos problemas
mais sérios no ensino jurídico brasileiro e possibilitar na sequência propostas para
solucionar o um dos bens mais preciosos da sociedade, a educação.
Para MIRANDA, “(...) a denominada crise do direito se traduz num
fenômeno multifacetado devendo ser vista e percebida melhor através da crise do
ensino do direito com toda complexidade que envolve o Governo, a Escola, o
Professor e as instituições mantenedoras e fiscalizadoras.” (2008, p.70) Sendo
assim, a responsabilidade da deformidade jurídica é de todo um sistema do ensino
jurídico.
Constatamos a existência de um grave colapso no ensino jurídico brasileiro,
onde em decorrência têm se apresentado seqüelas educacionais e principalmente
profissionais. E para tratar de maneira peculiar deste problema, serão
desenvolvidos tópicos quanto aos pontos específicos desta crise.
38
5.1 MASSIFICAÇÃO DOS CURSOS DE DIREITO
Um dos aspectos que desenvolve a crise no sistema educacional jurídico
é a descontrolada proliferação desses cursos onde este processo ocorre numa
velocidade vertiginosa sem qualquer responsabilidade de promover o ensino com
responsabilidade.
Segundo MACHADO:
“Não seria exagero dizer que o ensino jurídico no Brasil está praticamente entregue à lógica do lucro e da exploração econômica, levada a efeito pelos empresários da educação que passaram a enxergar neste filão de mercado um negócio extremamente lucrativo.” (2009, p.59)
A educação jurídica está sendo visualizada apenas como um negócio
lucrativo, onde a prioridade é manter as mensalidades e por segundo plano
ensinar os conteúdos fragmentados, onde a única aprendizagem do aluno é
“decorar”.
Muitas organizações de ensino realizam esta “super exploração” e
afirmam que é: “(...) em nome de uma suposta democratização da universidade e
do princípio da liberdade de empresa (...)” (id, p.59), para assim tentar desvirtuar o
papel negativo que está proliferação dos cursos está causando.
A sociedade capitalista faz com que a arte de se aprender seja vista como
uma mercadoria, onde o lucro é o objeto das instituições educacionais. A crise
educacional/social inicia a com esta concepção, uma vez que o sistema
educacional age como um comércio fazendo com que os educadores e alunos
concedam com este jogo de proveitos financeiros.
39
Numa pesquisa o MEC anunciou que: “O número de faculdades de direito
no Brasil, num período de apenas sete anos, entre 1995 e 2002, aumentou
154%.Atualmente, existem mais de 1009 cursos instalados no país.” (MACHADO,
2009, p.59) Este número estrondoso acaba por tornar quase impossível um
controle quanto a qualidade destes cursos.
Preocupada com está imensa demanda, o Conselho Federal da OAB criou
um tipo de avaliação para as instituições de ensino, onde no ano de 2007 de 215
cursos avaliados, somente 87 foram aprovados. E no Estado do Paraná foram
aprovados apenas 06 cursos. (Costa, 2008)
A confirmação do ensino de má qualidade do curso de direito é o índice de
reprovação da OAB. No ano de 2007 no estado de São Paulo, segundo COSTA:
“(...) o índice de reprovação (84,1%) geral do Exame 133, foi ainda maior do que o
registrado na 1ª fase de provas, quando 72,2% forma excluídos da avaliação e
somente 22,8% conseguiram ser aprovados.” (2008, p.62)
Esses dados servem para uma importante reflexão para saber que tipo de
formação a maioria destas organizações está promovendo aos seus educandos,
pois na medida em que o foco é a obtenção de lucro, a mais provável das
conseqüências será uma formação medíocre onde os educandos possuem
apenas conhecimentos fragmentados deixando de lado o mais importante que é a
“autonomia intelectual”.
Segundo MÉZÁROS: “Uma sociedade que impede a emancipação só pode
transformar os espaços educacionais em shopping centers, funcionais à sua lógica
do consumo e do lucro.” (p. 16) Então estas instituições educacionais costumam
tratar seus educandos como “clientes”, onde o tratamento deve ser de satisfação
40
dele, não importando se a função educacional foi cumprida ou não. O objeto da
educação é por inúmeras vezes deixadas de lado sendo colocada apenas a mera
função de repassar conteúdos, ou seja, de doutrinar os educandos numa
sociedade capitalista onde a emancipação educacional é completamente inviável.
Uma vez que o maior objetivo das organizações educacionais é lucrar,
passa-se a “(...) convocar profissionais atuantes no mercado, sem formação para
a docência, encarregando-os de transmitir aos alunos, pura e simplesmente, a
praxe cotidiana do foro” (MACHADO, 2009 p.60), permitindo uma formação
puramente dogmática, onde o ensino crítico, interdisciplinar e humanista é deixado
de lado.
Como serão os futuros profissionais do direito com uma formação
puramente dogmática, uma vez que “o direito autêntico e global não pode ser
isolado em campos de concentração legislativa, pois indica princípios e normas
libertadoras (...)” (LYRA FILHO, 1999). Como o autor afirma, o direito é muito
maior do que legislação, a formação voltada pura e simplesmente aos dogmas é
muito pequena deixando de lado a práxis do ensino.
Cada vez que as organizações educacionais transformam a transmissão do
conhecimento numa mercadoria, elas proporcionam o empobrecimento de cultura
em seus educandos, pois como define MACHADO: “(...) se o conhecimento segue
o destino fugaz das mercadorias em geral; trata-se de um bem comprado, mas
não para ser produzido pelo indivíduo; para ser usado momentaneamente, mas
não para se incorporar de modo definitivo à formação do sujeito.” (2009, p.63)
Um outro tipo de organização educacional jurídica que também se
apresenta numa proliferação exacerbada são os “cursinhos preparatórios” que
41
alegam especializar os bacharéis em direito para o exame da Ordem dos
Advogados ou concursos públicos. Esses tipos de cursinhos para Machado:
“(...) ao mesmo tempo em que reforçam também o modelo normativo e dogmático deste ensino, contribuindo para a difusão de uma cultura jurídica tecnicista, burocrática e completamente despolitizada, com
óbvios reflexos de modo alienado (...)” (id, p.64)
Portanto, podemos colocar muitas organizações educacionais de ensino
jurídico como co-responsáveis pela grande massa de bacharéis formados em
direito com uma formação superficial e dogmática. Lembrando ainda, muitos
desses profissionais atuarão no mercado de trabalho de forma medíocre, onde
não questionaram ou criticarão atitudes divergentes das suas.
5.2 DILETANTISMO NO CORPO DOCENTE DAS INSTITUIÇÕES DE ENSINO
Ensinar é um dom, uma arte. O professor PAULO FREIRE conceitua
perfeitamente tão bela prática:
“ (...) ensinar não é transferir conhecimentos, conteúdos nem formar, é ação pelo qual um sujeito criador dá forma, estilo ou alma a um corpo indeciso ou acomodado. Não há docência sem discência, as duas se explicam e seus sujeitos apesar das diferenças que o conotam, não se reduzem à condição de objeto, um do outro. Quem ensina aprende ao
ensinar e quem aprende ensina ao aprender.” (1999, p.25)
A docência é uma profissão que permite emancipar, transformar. A partir do
momento em que ela é realizada com afinco, é capaz de realizar incríveis
evoluções sociais. Assim como verificamos nas lições de GIROUX:
“(...) os professores precisam desenvolver um discurso e conjunto de suposições que lhes permita atuarem mais especificamente como intelectuais transformadores. Enquanto intelectuais, combinarão reflexão e ação no interesse de fortalecerem aos estudantes com as habilidades e conhecimento necessários para abordarem as injustiças e de serem
42
atenuantes críticos comprometidos com o desenvolvimento de um
mundo livre da opressão e exploração.” (1997, p.29)
Porém, a docência vivenciada nas faculdades de direito dificilmente são
como as propostas pelo educador Paulo Freire, pelo contrário geralmente os
professores são:
“(...) são contratados, na maioria das vezes, por apresentarem características condizentes às exigências positivistas, bastando formação específica na área, sucesso nas atividades profissionais e domínio de conhecimentos específicos, desconsiderando os aspectos
pedagógicos que constituem a profissão docente.” (MELLO, 2007, P.22)
Encontramos em muitas salas de aulas aqueles professores, que tem como
o magistério um complemento de renda e não uma profissão. Como descreve
MARILENA CHAUÍ: “(...) que a educação deixou de ser concebida como um direito
e passou a ser considerada um serviço.” (2003, p.06), permitindo que os
professores enxerguem as aulas como um mero auxílio no seu salário e não como
uma séria profissão.
Muitos dos docentes encontrados nas instituições educacionais são
relatados de maneira verossímil pela professora Marilena Chauí:
“O recrutamento de professores é feito sem levar em consideração se dominam ou não o campo de conhecimentos de sua disciplina e as relações entre ela e outras afins - o professor é contratado ou por ser um pesquisador promissor que se dedica a algo muito especializado, ou porque, não tendo vocação para pesquisa, aceita ser escorchado e arrochado por contratos de trabalho temporários e precários - ou melhor, ‘flexíveis’. A docência é pensada como habilitação rápida para graduados, que precisam entrar rapidamente num mercado de trabalho do qual serão expulsos em poucos anos, pois se tornam, em pouco tempo, jovens obsoletos e descartáveis; ou como correia de transmissão entre pesquisadores e treino para novos pesquisadores. Transmissão e adestramento. Desapareceu, portanto, a marca essencial da docência: a
formação.” (grifo nosso) (2003, p.07)
43
Com as características de alguns docentes acima descritas, verificamos
típicas situações nas salas de aula que são: professores autoritários sem permitir
que o educando critique, indague ou não concorde com o conteúdo transmitido em
sala, quadros negros cheios de anotações, carteiras enfileiradas onde única troca
entre os educandos são com suas nucas de seus colegas, e o pior, educandos em
total silêncio sem perceber que as trocas entre eles e os educadores são
essenciais para suas formações como cidadãos e profissionais.
Verificamos nas lições de MORETTO: “a relação professor-aluno (...), é
identificada como uma espécie de dominação, de autoritarismo, de submissão”. É
uma forma perniciosa no processo de formação para a cidadania. (2004, p.183)
Machado nos ensina que muitos educadores do curso de direito se
comportam em sala de aula com um:
(...) autoritarismo didático que sempre caracterizou e caracteriza ainda o ensino jurídico, quer porque reproduz apenas a idéia de direito que mais convém à previsão política das classes superiores e do mercado, quer porque o saber se transmite por meio da chamada aula-conferência com a metodologia centrada no professor que preside o lugar da fala, sem maiores questionamentos críticos e com pouca participação dialógica
dos estudantes no processo de aprendizagem.” (id, 55)
Porém, se não existem espaços para discussões o ensino de direito perde
seus locus. Conseguimos constatar a afirmação a partir da interlocução de
MACHADO:
“O ensino segue assim de forma idealista, por meio de uma epistemologia que não responde satisfatoriamente aos requerimentos sociais e não permite sequer a emancipação mesma do jurista, porquanto não proporciona a este, fora do formalismo normativista, qualquer condição para discutir conscientemente os valores que
permeiam os contextos político-sociais (...)” (2009, p.56).
44
Com isso percebemos que todo o formalismo gerado pelo docente e que a
transmissão do conhecimento jurídico tem como concepção se manter dentro de
limites dogmáticos, trabalhando de forma unidisciplinar, como se os fenômenos
jurídicos fossem separados da realidade social.
Por mais que as instituições educacionais e seus docentes afirmem que as
aulas estão modernizadas, onde os métodos de estudos são atuais, o que
verificamos é que:
“(...) a sistematização da ciência jurídica permanece ordenada nas cátedras segundo um modelo conservador que mantém o saber jurídico a sombra das relações de poder, projetando essas relações na forma de conceitos, categorias, normas e procedimentos vazios de qualquer
conteúdo sócio- econômico. (Machado,2009, 55) Portanto a relação de poder ainda é uma problemática que impede que o
educando realize uma troca de aprendizados com o professor.
As avaliações são um outro exemplo de como os professores ainda são
bem catedráticos, pois: “Os educadores, por vezes, atribuem à avaliação um
exagerado poder ou culpa diante da possibilidade de melhoria, que esta prática
tem(...)”(SAUL, 1992, p.24). Não tem sentido conceber uma avaliação onde o
educando simplesmente marca as respostas verdadeiras, sem questionar,
explanar ou criticar o que foi escrito.
Como afirma SAUL: “A principal atividade do avaliador consiste no
levantamento de concepções e reações acerca do programa estudado” (id, p.26).
Sendo assim, o que visualizamos nas salas de aulas, não são avaliações que
permitem ao educando refletir quanto ao que foi aprendido, mas sim uma cópia
literal do que foi transmitido em sala.
45
As avaliações são de extrema necessidade tanto, para a verificação de
quanto o educando está compreendendo em sala de aula como quanto o
professor está conseguindo ensinar. Para que estes objetivos sejam alcançados,
tanto do professor como do educando, é preciso propor uma avaliação
emancipatória, que segundo SAUL é: “(...) caracterizada como um processo de
descrição, análise e crítica de uma dada realidade, visando transformá-la.” (id,
p.29)
Um outro ponto a ser questionado é a questão da relação de que muitos
professores trabalham apenas com a teoria, deixando de lado uma prática tão
essencial para completar o ensino. MELLO a partir de estudos afirma: “Refletir e
investigar acerca de sua própria práxis também é uma necessidade urgente a ser
considerada pela universidade, por meio de compromisso e incentivo político-
institucional.” (2007, p.80)
Enquanto os professores de direito estiverem cedendo a imposições das
organizações educacionais ou então não priorizando a sua formação no
magistério superior, não haverá possibilidades de cumprir seu papel social. Neste
sentido vale se atentar ao que afirma MELLO: “O bom professor deve ter prazer
com o crescimento dos alunos, e este crescimento só acontecerá quando o
professor adotar métodos de ensino que desafiem o aluno a pensar, a ter paixão
por aprender e acima de tudo ser comprometido.” (2007, p.65)
46
5.3 EDUCANDOS COM BAIXO NÍVEL DE APRENDIZAGEM
Muitas deficiências apresentadas durante a formação superior, foram
adquiridas pelo educando durante toda sua vida escolar. Pois as escolas estão
com um baixo grau de exigências, as dificuldades dos educandos são ignoradas e
muitos professores trabalham desmotivados e com salas de aulas super lotadas.
Verificamos com DEMO:
“Olhando para a realidade brasileira, podemos já aceitar que o desafio quantitativo está razoavelmente dominado, porquanto quase todas as crianças em idade escolar chegam a escola.(...) porém as avaliações sobre proficiência escolar processadas pelo Sistema Nacional de Avaliação de Educação Básica atestam cifras baixíssimas de aproveitamento, que se posicionam entre as piores do mundo (...) (grifo
nosso) (2004, 157)
E uma vez que a qualidade do ensino escolar está muito fraca, como
conseqüência direta, o ensino superior será composto por alunos com muitas
dificuldades de ensino.
As instituições de ensino superior têm como critério de admissão de seus
educandos, uma avaliação que englobe os conteúdos adquiridos no ensino médio
e que de alguma maneira são necessários para a formação superior, o chamado
vestibular.
A Nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação em seu artigo 44º expõe:
“A educação superior abrangerá os seguintes cursos e programas:
(...)
II- de graduação, abertos a candidatos que tenham concluído o ensino médio ou
equivalente e tenham sido classificados em processos seletivos” (grifo nosso)
(1996)
47
O vestibular é uma maneira de classificar educandos que tenham o mínimo
de aprendizado para cursar o ensino superior, sendo esta a maneira em que as
faculdades selecionam o nível dos educandos.
Mas como o foco das organizações educacionais é a obtenção de lucros, o
que importa são as salas de aulas cheias de alunos, e para tanto, é realizado um
vestibular bem superficial do qual não são analisadas as mínimas condições para
seguir a um ensino superior.
Segundo RIBEIRO: “Se há falhas no ensino médio, não deve haver
complacência que permita o ingresso desqualificado no ensino superior. Conferir
um título a um sem-número de desqualificados é um desprestígio para aquele que
obteve o titulo com méritos.” (2008, p. 230)
Conseqüentemente, o ensino superior é composto por muitos educandos
que possuem muitas falhas na escrita, como a falta de concordância e erros
crassos. Este grupo terá muitas dificuldades para cumprir com excelência o ensino
superior. Como exemplifica DEMO: “(...) a própria realidade do fracasso escolar
majoritário fala por si.” (2004, p.164)
O curso de direito é um dos cursos em nível de graduação em que o
educando deve possuir uma escrita excepcional, uma vez a profissão na área
jurídica é completamente interligada a escrita e oratória.
Entretanto, muitas organizações educacionais em razão da relação
cliente/aluno, permitem que os educandos consigam finalizar o curso sem o
mínimo de condições de trabalhar na área jurídica.
Muitos educandos mantêm com professores a relação do “se você finge
que ensina, eu finjo que aprendo”. Sobre está visão WERNEK coloca:
48
“Geralmente quando o professor finge que ensina, os alunos fingem que
aprendem e nada falam.” ((2003, p.14).
Existe um grande número de educandos nos cursos de direito que tem a
única preocupação de conseguir o diploma de bacharel, não se importando com o
aprendizado. A respeito desta questão MACHADO aponta: “a questão do
diletantismo entre os bacharéis pouco ou nenhum interesse tem para os objetivos
propostos neste trabalho, que busca compreender apenas a atuação do
profissional do direito num contexto de crise (...)” (2009, p.94).
Sendo assim, há uma grande parcela de culpa nos acadêmicos de direito
que muitas vezes levam seus estudos sem esforço, não importando se as aulas
foram transmitidas com qualidade ou não.
Infelizmente, muito educando é responsável pelo seu fracasso educacional
e conseqüentemente fracasso profissional, pois na sua formação: “(...) o objetivo
mais visado pelo bacharel passa ser a obtenção de certa ascensão social por
meio do ingresso em carreiras jurídicas que ainda exibem um nostálgico
reconhecimento social (...)” (id, p.105)
Enfim, os educandos que ingressam numa instituição tanto com carência de
conhecimentos como de pensamento crítico, serão como afirma MACHADO:
“(...) o bacharel em direito, sem a formação adequada para proceder à crítica dos valores da sociedade, perdeu a sua função de construtor de uma consciência nacional, distanciando-se dos ideais iluministas de crítica, autonomia e liberdade, os quais foram aniquilados pouco a pouco pela hipertrofia do tecnicismo jurídico. A grande massa de bacharéis sucumbiu àquilo que Alain Touraine chamou de “apelo enganador da profissionalização” e passou a encarar o direito e sua ciência apenas como meios para a realização de um projeto pessoal de inserção no mercado de trabalho, onde cada bacharel é visto pelo outro como mais
um concorrente de trabalho.” (2009, p.105)
49
6. UMA NOVA CULTURA JURÍDICA
Através da análise realizada podem-se constatar os diferentes aspectos da
crise no ensino jurídico e que cada parte do sistema educacional é co-responsável
por este fracasso desmedido, ou seja, tanto as instituições educacionais, os
professores como os educandos têm sua parcela de responsabilidade.
Para tanto é necessário mudar esta realidade sendo então preciso repensar
diferentes propostas para melhora em toda a estrutura do ensino jurídico e
conseqüentemente do direito brasileiro.
Uma reestruturação no ensino jurídico implica inicialmente numa mudança
de comportamento social, ou seja, é preciso que toda a cultura jurídica brasileira
criada ao longo do tempo repense seu papel perante a sociedade. Mas a base
desta mudança está entrelaçada diretamente entre as instituições educacionais,
professores e principalmente com os educandos.
Devemos nos atentar em mudanças quanto:
A) as Instituições Educacionais:
As Instituições de Ensino devem ter como proposta “(...) elementos
essenciais na formação da consciência do povo; se ela trabalha num
direcionamento democrático, haverá mudança de comportamento. É preciso “(...)
adotar uma perspectiva crítica muito clara tanto sobre a idéia de sociedade do
conhecimento quanto sobre a de educação permanente, tidas como idéias novas
50
e diretrizes para a mudança da universidade pela perspectiva da
modernização.”( MARTINEZ,2003, 15).
Também é sugerido por MACHADO: “...) uma completa revisão do atual
ensino jurídico para que tenham: “(...) uma nova formação, agora de caráter
interdisciplinar, crítica, politizada e humanística, a fim de que possa fazer do
instrumental jurídico um meio conseqüente para a construção de uma sociedade
mais justa e sustentável, portanto, efetivamente democrática” (2009, p.163.) Com
esta proposta alcançar-se-á o verdadeiro sentido do ensino jurídico brasileiro, que
é o de formar cidadãos capazes de melhorar e transformar um país.
A mudança do ensino jurídico deve iniciar pelo pensamento, pois:
“O pensamento crítico supõe, naturalmente, um saber antidogmático em concreto diálogo com determinantes sociais do fenômeno jurídico.(...) É verdade que a postura antidogmática do jurista formado numa dialética, tal como proposta pela teoria crítica do direito, vai necessariamente admitir uma certa flexibilização da normatividade, ponto de justificar decisões praeter legem e até mesmo contra legem, mas sempre na perspectiva de uma sociedade mais justa e materialmente mais igualitária, em que as decisões possam levar em conta os profundos desníveis sociais que freqüentemente estão por trás de conflitos entre sujeitos apenas formalmente iguais, com a finalidade de concretizar a
igualdade material do processo decisório.” (MACHADO, 2009, p.29)
É necessário o alcance da chamada “autonomia universitária”,que segundo
a professora MARILENA CHAUÍ: “(...) a autonomia deve ser pensada como
autodeterminação das políticas acadêmicas, dos projetos e metas das instituições
universitárias (...) e a autonomia só será efetiva se as universidades recuperarem
o poder e a iniciativa de definir suas próprias linhas de pesquisa e prioridades(...)
(2003, p.13)
Outro aspecto a ser repensado é a massificação dos cursos de direito que
é algo a ser trabalhado em instância superior, ou seja, o MEC deverá criar
51
mecanismos de fiscalização quanto a qualidade do ensino, nível de exigência do
vestibular, postura das faculdades de direito como instituição e não uma
organização educacional. Sendo assim é preciso que haja uma constante
avaliação do curso de direito, como aponta MARTINEZ:
“(...) a mais importante é avaliação interna e contínua dos próprios cursos de Direito sobre a sua práxis pedagógica, pois somente das avaliações internas fidedignas externas, as quais passam a ter um papel consultor e retificador dos resultados obtidos nas mudanças postas em
prática.” (2003, p.95)
O sistema educacional deve ter em mente que “O dever principal da
educação é de armar cada um para o combate vital para a lucidez.”, (MORIN,
2007, p.33), ou seja, é com a formação de qualidade, transformadora que haverão
educandos voltados para a mudança positiva dentro da sociedade. E não tendo
alunos como clientes onde os que mantêm as mensalidades em dia podem
realizar as avaliações e não concordar com posturas diferentes apresentadas em
sala. A educação não é um serviço, mas uma atividade intelectual.
B) Educandos:
O baixo nível dos educandos que ingressam nos cursos só irá
modificar quando houver uma: “(...) reforma da escola pública de ensino
fundamental e médio para assegurar a qualidade e democratização da
universidade (...)” (CHAUÍ, 2003, p.13)
Os educandos devem adquirir conscientização da importância da educação
em suas vidas, sendo que uma vez denotado o foco do ensino, o educando irá
cobra qualidade do sistema educacional no intercurso de sua aprendizagem.
52
Podemos exemplificar uma verdadeira postura de educandos quando, em
1865, uma turma de direito da faculdade de São Paulo por não estarem satisfeitos
com os conteúdos apresentados por um professor, colocaram sobre a cadeira da
cátedra: “Queremos aprender Direito e nada de bagaceiras. V. Excia. estude para
nos ensinar, e não venha aqui encher lingüiça.” (NOGUEIRA, 1907-1912, citado
por VENÂNCIO FILHO, 1982, p.118). Este é um típico exemplo de como os
educandos deveriam agir em salas de aulas, ou seja, exigir dos professores um
qualidade no que está sendo ensino, e não simplesmente “engolir” muitas
besteiras apresentadas.
C) Professores:
É de suma importância que exista uma valorização da docência, como
coloca CHAUÍ as instituições devem:
“(...) oferecer condições de trabalho compatíveis com a formação universitária, portanto infra-estrutura de trabalho(...), garantir condições salariais dignas que permitam ao professor trabalhar em regime de tempo integral de dedicação e docência e à pesquisa, de maneira que ele tenha condições materiais de realizar permanentemente seu processo de formação e atualização dos conhecimentos e técnicas
pedagógicas(...)” (id, p.14) Assim, conseguiremos ter professores com foco na formação do educando.
Os professores no ensino jurídico devem reconhecer a necessidade da sua
função, uma vez que: (...) é imprescindível um maior cuidado e dedicação dos
educadores com relação ao tema direito, tão necessário para a formação dos
cidadãos de amanhã, principalmente se for predestinado a viver num mundo que
cresce a insegurança pública e jurídica. (COSTA, 2008, 68)
53
A partir do educador LIBÂNEO compreendemos que:
“A prática jurídica emancipatória requer, efetivamente, do educador, uma tomada de posição pela missão histórica consciente e conseqüente da humanidade, de destruir as relações de classe que sustentam a alienação e privam o homem de seu pleno desenvolvimento humano.
Mas a prática educativa é antes de tudo, profissional.” (1985 p.56)
Sendo assim, o educador deve dimensionar a função da política da
educação jurídica.
As avaliações do curso de direito também devem ser repensadas, uma vez
que as provas modelos de concurso públicos não permitem a evolução crítica do
educando. É necessário avaliar de forma emancipadora, que segundo SAUL, a
avaliação emancipatória é aquela que possui: “(...) uma perspectiva crítico-
transformadora da realidade educacional que se deseja, enquanto processo
avaliativo, uma prática democrática”. (1992, p.31)
D) Pesquisas e Projetos Universitários
Uma faculdade não se faz apenas de aula, mas principalmente de
pesquisas e projetos. A professora Marilena Chauí (2003) afirma a necessidade de
se valorizar a pesquisa buscando estabelecer condições de autonomia para sua
realização. Também expõe quanto a relevância social das pesquisas, estimulando
projetos com cunho social.
Como coloca o professor PAULO FREIRE: “Não há ensino sem pesquisa e
pesquisa sem ensino. Eis que fazeres se encontraram um no corpo do outro.”
(1999, p.32)
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Segundo MÉSZÁROS é preciso que as faculdades de direito possibilitem
“(...) uma didática libertária que possa compreender, como jurídicas, as
manifestações de condutas (...)” (2005, p.61), portanto toda a aprendizagem do
ensino jurídico deve ocorrer de forma interdisciplinar, sendo colocada as teorias
com as práticas e conseqüentemente os debates.
Enfim, existem inúmeras mudanças necessárias ao ensino jurídico, mas
basta dar o primeiro passo que os outros irão acontecendo, o importante é lutar
não permitir que as coisas fiquem como estão. Como o grandioso educador
PAULO FREIRE coloca: “Afinal, minha presença no mundo não é a de quem ele
se adapta mas a de quem nele se insere. É a posição de quem luta para não ser
apenas objeto, mas também ser sujeito da História.
55
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este trabalho teve em mira estudar o ensino jurídico em relação a crise
vivenciada nas faculdades de direito no Brasil. Voltado o estudo para uma
proposta de educação emancipatória, foi possível analisar o porquê dos
problemas apresentados na graduação de direito.
Partindo de conceitos educacionais básicos, foram expostos idéias da
importância e da necessidade de se objetivar a educação superior com qualidade
e de potencial crítico, uma vez que educação é para evoluir uma sociedade tanto
intelectualmente como criticamente.
Como já tratado durante o trabalho, a educação brasileira enfrenta uma
desenfreada crise que é decorrente da submissão de todo um sistema
educacional.
A base desta problemática se dá primeiramente com a transferência da
responsabilidade de educar do Estado passada as organizações educacionais, e
que num processo em cadeia, estas instituições se dispõem em proporcionar um
ensino que seja altamente lucrativo não se focando num ensino emancipador.
Como conseqüência dos altos lucros possibilitados as organizações é a
massificação do ensino do direito, ou seja, a explosão do número de faculdades,
onde na maioria na maioria das vezes são ofertados cursos sem qualidades.
Também constatamos que na continuidade desta cadeia deficitária se
encontram os docentes, que muitos não se encontram aptos a seguirem uma
carreira de magistério, uma vez que a graduação não oferece disciplinas de cunho
didático, transpondo em sala, aulas autoritárias com avaliações sem cunho
reflexivo.
56
A remuneração oferecida pelas instituições também fazem com que os
educadores não tenham a possibilidade de manter uma dedicação exclusiva no
magistério.
E no topo da cadeia da crise educacional jurídica encontramos os
educandos, onde muitos iniciam o ensino superior com pouca preparação do
ensino médio, dando pouca margem ao aprofundamento dos conteúdos
apresentados e não possuindo um olhar crítico-reflexivo ao que lhe é ensinado.
A crise é facilmente denotada pelo exacerbado índice de reprovação dos
testes da Ordem dos Advogados e pela quantidade de profissionais mal
qualificados.
A mudança na estrutura do ensino jurídico é urgente, onde assim como os
problemas apresentados também se devem iniciar pela base, onde o Estado deve
se preocupar em ofertar mais vagas nas universidades, as instituições de ensino
superior privadas não devem se focar em lucros, mas numa educação de
qualidade com cunho emancipador, os professores precisam se especializar para
ministrar aulas com qualidade e promover avaliações reflexivas, e principalmente
os educandos devem exigir uma educação de qualidade não fingindo que
aprendem. Eles devem atuar como um grupo de educandos que em 1865 deixou
sobre a carteira de um professor um bilhete onde dizia (já apresentado neste
trabalho mas que vale mais uma vez destacar) : “Queremos aprender Direito e
nada de bagaceiras. V. Excia. estude para nos ensinar, e não venha aqui encher
lingüiça.”
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Talvez com este tipo de exigência os educandos consigam cumprir o
verdadeiro intuito da educação, pois é somente com ela que teremos um país
evoluído e emancipador.
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4. Referências
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