Post on 14-Mar-2016
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PÉ NA ESTRADA MARIANA NO MUNDO, O MUNDO EM MARIANA
Nº 19 - Maio de 2014 Tiragem: 2000
Distribuição Gratuita
" R e s p e i t á v e i s o u t r a s
p e s s o a s ! E s t a v i d a d e
equilibrista é perigosa, mas
muito interessante. Por mim, fiz
o que podia e achei que valeu a
p e n a . A d e u s ! ”
Umas pessoas concordaram.
O u t r a s , n ã o .
' - Eu também acho mui to
interessante! Viva o equilibrista!
- Eu não acho graça nenhuma!
- Eu acho que vale a pena! Vale
m u i t o a p e n a !
- Não vale a pena nada! Eu acho
u m a b o a d r o g a ! '
O equilibrista deu um risinho:
'- Justamente o interessante é
que cada um acha o que quer!"
Trecho do livro O Equilibrista -
Fernanda Lopes de Almeida
DIVERSIDADE P.2 FESTIVAL DAS LÍNGUAS P.3 POESIA P.4 e 5 EDUCAÇÃO P.6 MEMÓRIA P.7 PROGRAMAÇÃO P.8
Imag. 1
Objetos voadoresBeau de L’air e
Por Pessoas Voadoras Laura Ralola
Nos primeiros sinais do outono o espírito de Madá
fica mais forte na cidade. É tempo de Na Boca do
Balão e para mim, que de Madá só pude sentir a
energia, é tempo de cortejo com objetos voadores
pelo percurso do Sagarana Café-Teatro até a
Praça da Sé. Os objetos voadores cruzam o ar num
show durante a homenagem à Magdalena Lana
Gastelois, que ocorre todos os anos na histórica
Mariana. Seus tamanhos, formas e cores são
múltiplos. Para ser o que eles são só precisam
estar no ar. Ninguém sai pelo cortejo marcando que
um é “assim” e o outro “assado”. Ao contrário, são
justamente as diferenças que transformam o todo
num espetáculo. Os objetos e suas singularidades
são percebidos ali como interdependentes e
mutuamente importantes para o cortejo. Ninguém
diz que um objeto voador é menos objeto voador do
que o outro. Bom mesmo seria se a estrutura social
em que vivemos pudesse olhar para as pessoas
como os tantos olhares que já acompanharam os
objetos durante o cortejo. Que a estrutura social
vigente não se empenhasse tanto em traçar, nas
pessoas, o que “é” e o que “não é”. Tal empenho
implica em classificações binárias que, nem de
l o n g e , d ã o c o n t a d e a b a r c a r n o s s a s
singularidades. Aproveita-se o momento, em dias
de Madá, para questionar a forma acimentada que
nossa sociedade busca se organizar: é necessário
fazer mais do que simplesmente celebrar as
diversidades, aprofundemos no motivo das
classificações binárias que implicam em inclusão
de uns e exclusão de outros. Quem sabe assim a
vida seria mais interessante... num mundo onde a
felicidade não giraria em torno de “enquadrar-se” e
sim, quem sabe, de, como os objetos de Madá, sair
voando por aí... "Suplicamos expressamente: não
aceiteis o que é de hábito como coisa natural, pois
em tempo de desordem sangrenta, de confusão
organizada, de arbitrariedade consciente, de
humanidade desumanizada, nada deve parecer
natural nada deve parecer impossível de mudar."
(Bertold Brecht)
Sagarana de Verso
Como um quebra-cabeça resolvido, o dia 31 de dezembro
se fez ponto de partida do recanto literário de Guimarães
Rosa. Sagarana é um lugar de bichos e árvores, de um
povo do interior, sem convenções e poses. Em palavras
trocadas, é lugar de se ver as grandes árvores estalarem
sob o raio, e cada talo do capim humano rebrotar com a
chuva ou se estorricar com a seca.
Feito para ver a cidade, o café-teatro abriu suas portas à
poesia e arte diária das almas, em 1998, iniciando o sonho
de um lugar para sorrir; música, poesia, dança, circo,
teatro, encontros e trocas! No dia 20 de Maio, aniversário
de Magdalena Lana Gastelois e de abertura ao público do
refúgio (dele, dela e nosso), brotou um lugar feito por
diversas nefesh. Da construção comunitária do espaço é
que se plantou a flor da devoção pela diferença. Sagarana
preza por todas as pessoas; diversidade é a linha que
equilibra e dá chão para se viver na Terra. “É um espaço
pra ser feliz, qualquer que seja a cor, a idade ou a
profissão”, nas palavras de Madá, bom mesmo é “amar o
amado e ser amado”.
Maio é, também, mês que cedia o dia Internacional de
Luta Contra a Homofobia (17/05). Por saber que a alegria
é um direto de todos, o Sagarana Café teatro demonstra
no impulso diário de memória à Madá o respeito a
diversidade e reconhece que na multiplicidade de
pessoas é que tornamo-nos apenas espírito em equilíbrio,
sem segregação de cor, sexo, classe e religião. Ser
equilibrista é viver diferente, construindo aquilo que se
pensa no fio da vida, ir desenrolando e se equilibrando
dentro do possível, saber que bom mesmo é ser muitos.
Vez ou outra, os desequilibristas tentarão mostrar outro
chão, remexer o fio da vida de cada um, julgar o diferente
como louco e rir. Os equilibristas tentarão se defender
dizendo que já nasceram assim, e os desequilibristas
dirão que não acreditam numa mentira dessas.
Na poesia de varal das frases soltas, Fenando Pessoa
revela que “só a loucura é que grande e só ela é que feliz”.
E no reino dos equilibristas essa conversa cerraria com
riso de Magdalena e sua tão formosa frase em vida: “a
alegria é alimento que nem semente: quanto mais se
espalha, mais colhe.”
Pedro Augusto Menegheti
Festival das Línguas
As Línguas e a Subversão
José Arnaldo Coêlho de Aguiar Lima
In Memoriam
É de fundamenta l impor tânc ia que a
comunidade acadêmica se expresse de
maneiras outras, que não a institucional,
material izada em provas, seminários e
relatórios. Como também é imprescindível que a
m e s m a r e c u p e r e u m e s p a ç o q u e ,
tradicionalmente, sempre lhe pertenceu. Refiro-
me ao espaço do riso, da alegria, e, porque não,
da inve rsão .Desde o su rg imen to das
universidades, na Europa medieval, parcelas
significativas de professores e alunos invadiram
as ruas das cidades, encenando espetáculos
que primavam pela inversão de valores e, por
isso mesmo, provocando o riso e a alegria. Basta
uma breve passada de olhos em Rabelais, para
ficar só em um exemplo, que tais afirmativas são
percebidas de imediato.
Mas é convincente atentar a um detalhe. Para
se inverte alguma coisa, é preciso, antes de mais
nada, dominar, no sentido do conhecer, o objeto
da inversão. Sem este conhecimento, tal
experiência perde o significado, por ser inócua e
destituída de sentido. Enfim, não alcança seu
objeto último que é a subversão.
Um bom exemplo do que estou afirmando foi o
festival das línguas, levando a efeito em meados
de janeiro do corrente ano. Com muita
tranquilidade, o classifico como um destes
eventos que subvertem a ordem estabelecida do
maçante cotidiano acadêmico, uma verdadeira
prova de que a produção e a divulgação do
conhecimento não precisam se prender aos
rígidos padrões estabelecidos. Cabalmente,
mostrou, e a todos que dele participaram, que
ainda é possível recuperar aquilo que de
saudáve l as p r im i t i vas un ive rs idades
dispunham.
Mariana, 1993
Imagens: A
rquivo
da fa
mília
Ter este momento
a chuva, o espaço, o vento
flores cores e pássaros voando
na aventura inconsequente
deste firmamento
sou gente.
Correndo pelo asfalto
lá vou eu com meu carro.
Por que não em priscas eras
mulher das cavernas
lutando pelo fogo
no meio das feras?
Ou mulher das Arábias
de pano na cara
ou cega ou louca ou loura
ou grega ou rude
ou pastora?
Maria Antonieta Helena de Tróia
ou negra ou Índia ou Leonora
Cleópatra ou cantora?
Sou parte integrante
da aventura estranha
no momento louco
do homem que se atiba
na pressa contínua
de acabar com a Terra.
Saber e continuar
cozinhando as raízes
costurando matizes
sofrendo mazelas
gritando pelas diretas
Bicho lúcido e impotente
Sou eu hoje aqui presente
sou mulher e professora
e vou tocando pra frente.
E neste momento exato
em que borboletas voam
estão brotando sementes
aranhas estão tecendo
frutos amadurecendo
enquanto muitos se matam
outros tantos passam fome
alguns
juntam
dinheiro no banco
outros trabalham que nem loucos
prá comprar roupa na moda
Uns estão chorando
outros rindo
Alguns indo outros vindo
pelejando, inventando
dormindo e acordando
como se fossem eternos.
Alguns tristes, outros ternos.
AventuraMagdalena Lana Gastelois
"As coisas não querem mais ser vistas por pessoas razoáveis:
Elas desejam ser olhadas de azul -Que nem uma criança que você olha de ave."
Manoel de Barros, O livro das ignorãças
Paulo
Mendonça
.
O OCO
"Um bando de loucosdebruçados na beira do oco
espiando, espiando.Um bando de loucos
debruçados da beira do ocoprocurando, procurandoprocurando explicação.
Enquanto issocome dorme,
levanta e deita.Tem dia que chove,
tem dia de sol. Tem também a preguiça comprida
boa, gostosa, pra ser vivida. Na beira do ocotem sol tem praia tem boa comida
tem uns beijos pra beijar. e um bando de loucos debruçados na beira do oco
procurando, procurando,procurando explicação.
Eu einh!Eu não!"
Magdalena Lana Gastelois
Ana: Poema primário.
Mamãe,quando não tinha nem um meninonem uma terranem uma florcomo é que nasceu?
Poemas de 3 anos
Ivan: Posse.
Mamãe, vai buscar uma escadae eu vou pegar a lua quebro a lua em pedaçose guardo na minha areia.
Borboleta.
Mamãe, olha uma cor passando aliparece um passarinho.
Pedro: Filosofia
Afinal, pra que essa nossa vidasaída da bunda docês?
Magdalena Lana Gastelois
Memória viva do Picapau Amarelo
“Se lembra da jaqueira
A fruta no capim
O sonho que você contou pra mim
Os passos no porão
Lembra da assombração
E das almas com perfume de jasmim
Se lembra do jardim ó maninha Coberto de flor”…
Recordando o tempo em que descobri que escola era lugar
de brincar, e que brincar era o maior aprendizado. Cedo me
arrumava, com a roupa mais confortável e rabo de cavalo, para subir em árvores e desbravar aquela
imensidão que era minha escola. O caminho até a escola era longo... um longo aprendizado.
Enquanto percorríamos o caminho, íamos cantando as músicas das lindas fitas do Ivan. Foi nesse
percurso que conheci um pouco mais do universo mineiro, acompanhada pelo Clube da Esquina e
Milton Nascimento.
Nessa escola viver e aprender eram sinônimos. O tempo, as regras, os encontros aconteciam de
forma orgânica. Não me recordo quando era hora disto ou aquilo.... Me lembro de aprender
matemática desenhando flores; de compartilhar o lanche entre os amigos, num grande piquenique;
de brincar de casinha nas copas das arvores; do grande balanço que era o galho da mangueira e de
correr livremente, sem muita intervenção adulta. O que sou e sinto se deve àquele ano vivido com
intensidade naquela escola.
Desde minha saída da escola, sempre sonhei voltar. Subir na mangueira, deitar nas
almofadas coloridas da casa de Madá e reconhecer cada canto daquele universo que era a escola.
Já se passaram 30 anos e ainda sonho com isso… apesar de saber que não encontrarei Madá, que
não terá escola… Mas quem sabe a mangueira ainda esteja lá? Quem sabe eu me reconheça em
algum vestígio? Hoje sou educadora e escritora de livros infantis, do jeito que eu profetizava para
minha professora Rosa e para Magdalena.
À Maria Magdalena Lana Gastelois, minha gratidão!
Ana Claudia Gondim Bastos
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Mosaicos Magdalenos
Pensar em Magdalena é coisa cotidiana pra nós. Como se debulha uma espiga de milho, pulam, aqui e ali, o tempo em grãos de saber-magdalena. Mais ela se distancia no tempo físico e mais presente na memória, em sua sabedoria lúdica e multifacetada que a gente vai entendendo cada vez melhor assim. Como olhar para um mosaico: construído a partir de pedacinhos multicoloridos, a forma se fazendo surpreendentemente, composição harmônica de partes tão diferentes...
Magdalena lembra o narrador benjaminiano, que devia viver para narrar. Sua vida era essa infinidade de retalhos de experiência tornada conhecimento. E a gente ia aprendendo o jeito, só de ver acontecer, de ouvir contar. Casos não faltam, como não faltavam grãos na espiga e cacos no mosaico. Hoje vamos narrando as coisas dela, como lições, como alegria de lembrar...
Daí que pra contar uma coisinha só, fica difícil demais! Tem a “teoria do buraco”, que achávamos muito bonita. Deveria ser escrita. Era algo assim: sempre existe um oco que nos ocupa e impulsiona, quando não o cobrimos de fantasia, com aparente satisfação ou pensada frustração. Um buraco é desejo que move ou se esconde para doer menos a vontade sentida. Madá, contudo, abria buracos, inspirava os desejos e removia as camadas de frustração que escondiam as aptidões. A um dizia, escreva esse poema, a outro, vai para o circo! Foi por lidar com os buracos, que plantou um circo no centro da cidade, que fez o “Festival das Línguas”, onde o povo provou do biscoito fino francês que ela oferecia - em formato saltimbanco, e o povo pedindo mais e comprovando que cultura pode ser consumida, basta oferecer. O buraco era o desejo que movia.
A ausência de Magdalena não deixa de fazer buraco, de falta, mas também de inspiração. Como ela dizia: “mais que a morte, importava saber viver”, mas do que a ausência importava a presença. Daí que ela ligava para os amigos queridos para um jantar, um carinho, um dedo de prosa.
Entre um gole e outro de café, vinho, cerveja, de inspiração vinham mil experiências, narrativas, aforismos: “casar você pode com qualquer um, mas pra ter filho, tem que escolher: porque filho é uma ligação pra vida toda”, “você é lindo, não lhe falta nada, tem pé, tem mão e mesmo que faltasse um dente ou uma perna, haveria coisa para compensar, alegria, coração”. Tudo embalado por músicas cantadas ou
traduzidas, como a tradução para o francês da música do Chico, que ela fez no colo, assim, só para existir.
Havia ainda as culinárias, o desprendimento e o calor humano de Magdalena, um sem fim de peças no mosaico.
Houve um tempo que sua casa ficou sendo conhecida como embaixada franco-baiana, devido às culturas frequentadoras mais assíduas. Mas a casa de Magdalena era mesmo isso, uma embaixada pra refugiar todas as nações, dores e criatividades.
Tão nômade fora ela e a casa era, no entanto, uma coisa muito importante. Os testes que ela foi fazendo em cada uma das suas moradas, sempre tão inspirados até chegar no Sagarana, que foi a obra da vida. O Sagarana é a representação física do espírito de Madá. Mas lembramos ainda com carinho de sua penúltima casa, que ela também transformou e que foi um espaço de muitas alegrias pra todos nós.
Chegamos lá e havia um jardim, no quintal, mas que era um jardim “suspenso”. Lá no fundo do quintal um pequeno platô, muradinho, de altura certa para um palco ao ar livre, cara de Madá. A inspiração veio logo – gente vamos fazer um espetáculo no quintal para o aniversário de Magdalena! Todos nós, tocados pelo seu condão artístico, insuspeitados cantores, atores, músicos, apresentamos pequenos números de musica tocada em pente, monólogo, coral, e etc. Estava inaugurada a casa de Madá! E, claro, a coisa aconteceu. E acontece de novo a cada encontro, em cada buraco aberto onde se planta o grão de saber-magdalena e, dali, cresce planta estranha, diversa, uma obra em mosaico, sempre incompleta, por se fazer de cada fragmento de lembrança, como a “Sagrada Família” de Gaudí. Uma incompletude linda!
por Maria Edith Maroca de AvelarÁlvaro de Araujo Antunes
Um jornal se faz com
ideias e atitudes. Assim tem sido
feito as edições do Pé na Estrada,
i dea l i zado po r Magda lena
Gastelois, a partir de 2000. É com
grande alegria que publicamos
mais uma edição deste jornal.
Editar, reunir, criar, improvisar e
incorporar o espírito de Madá,
para ver e fazer ver o Sagarana,
Festival das Línguas, Escola
Picapau Amarelo, l i teratura,
arquitetura, amigos, lembranças e
tanto mais!
Só foi possível fazer este
Pé na Estrada porque contamos
com a colaborações também dos
amigos, que de uma forma
singular e generosa encontraram
tempo para dedicá-lo a ela. Nosso
“muito obrigado”.
P R O G R A M A Ç Ã O :
8º NA BOCA
D O BALÃO
30.04 - 22h - Valerie Quartet Tributo à Amy Winehouse01.05 - 20h - Candonguêro02.05 - 22h - Encontro de Sanfoneiros03.05 - 16h - Objetos Voadores com-vida Praça Minas Gerais - 22h - Rua da Virada 04.05 - 13h - Feijoada com Choro
Jornal Pé na Estrada
Realização: Sagarana Café-teatro
Idealização: Magdalena Lana Gastelois
Coordenação: Ana Lana Gastelois
Editor de Redação: Pedro Menegheti
Diagramação: Tolentino Ferraz
Imagens: 2. tumblr.com
1.:favim.com/source/www.lookandlookagain.com
Produção: Sheyla Santos
Impressão: Gráfica Dom Viçoso
Contato: sagaranacafeT@gmail.com
sagaranacafeteatro.wordpress.com
EXPEDIENTE:
EDITORIAL
Ima
g. 2
Rua Frei Durão,114
Centro - Mariana31 - 3557-2233
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Rua Dom Viçoso Centro - Mariana31- 3557 - 3807
Mineirão LanchesRua Cônego Amando, 275
31- 3557 - 2789
Comercial MólRua Cônego Amando, 311
31 - 3557 - 3937
Barra LongaCasa de Carnes e Sacolão
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