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Acta boto bras. 2(1): 151 - 164 (1989) supl. CDD: 711.554 O PLANO DE PAISAGEM COMO PLANO DE USO DO SOW: TEMA DA DISCI- PLINA PLANEJAMENTO ARQUITETÔNICO VII-URBANISMO DO TERCEIRO ANO DA FACULDADE DE ARQUITETURA E URBANISMO DE FRANCA- UNIFRAN Introdução Paulo Celso Dornelles Del Picchia1 Neusa Maria Nogueira Rainho Ticianelli RESUMO -o objetivo do trabalho foi exercitar os alunos de um curso de arquitetura nas dire- trizes e critérios do planejamento paisagístico visando a um uso do solo que levasse em conta os dados ambientais, harmonizando a intervenção humana no meio ambiente numa aproxima- ção ecológica. Contávamos com a área de uma fazenda próxima a Franca, Estado de São Paulo, da qual tínhamos a planta planialtimétrica e o levantamento aerofotogramétrico. Nessa área, que- ríamos localizar três usos distintos: comercial, industrial e residencial e ainda determinar áreas verdes de recreação e preservação. Primeiramente foi feito o reconhecimento fisiográfico com a elaboração dos mapas necessários. Sobrepondo as informações dos mapas, dados climáticos e informações sobre desenho urbano e clima, além de legislação, as diversas eQuipes de alunos che- garam a propostas de uso do solo. Palavras-cbave: Planejamento, Paisagismo. ABSTRACT - The purpose of this work was to exerci se the students of aR architecture course in the guidelines and standards of landscape planning concerning the use of the land, considering environmetal data and harmonizing the human action with the environment trough an ecological approach. We reckoned with a farm site near the city of Franca in· the State of São Paulo on wich we had the planialtimetrical plan and aerial photography. We wished to locate these distinct uses in this site: commercial, industrial and residential ones, and furthermore to locate open spa- ces for· recreation and conservation. At first a physiographical reconnaissanee was done following by an elaboration of the necessary mapas. Combining maps information, climatic data, informa- tion about urban design and climate and also legislation, the various students teams presented proposals for the use of the land. Key words: Planning, Landsça!ie Planning. o planejamento no Brasil tem tidó grande dificuldade em absorver o conhecimento do meio ambiente físico em suas propostas. De maneira geral, pelo que se observa nos Planos Diretores que estiveram em grande voga na década de 60, os.cientistas do meio ambiente colaboram nesses planos elaborando inventários paisagísticos isoladamente dos outros membros das equipes não tendo esses inventários um rebatimento direto nas deci- sões de planejamento. Como os arquitetos estão intimamente ligados à execução de processos de planeja- mento em órgãos oficiais, nos pareceu importante que num curso de arquitetura os alu- nos tentassem uma interação entre os dados do ambiente físico com as necessidades da ocupação do solo pelo Homem e assim possibilitar-lhes uma melhor atuação em equi- pes multidisciplinares; abrindo-lhes a chance da interdisciplinaridade. Para tal, nos pa- receu interessante a idéia encontrada nos artigos de Reinhard Grebe na publicação "Bauleitplanung und Landschaftsplanung" do Uso do Plano de Paisagem como Plano de Uso do Solo (Grebe 1975) e a metodologia apresentada por Manuel Galvão Lucas na publicação "Arquitetura Paisagística no (paisagismo natural-urbano) Planejamento Físico-Territorial" (Lucas s/data) que nos facilitava desenvolver o trabalho com os alunos. 1 ProL da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo de Fanca - UNIFRAN. 151

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Acta boto bras. 2(1): 151 - 164 (1989) supl.

CDD: 711.554

O PLANO DE PAISAGEM COMO PLANO DE USO DO SOW: TEMA DA DISCI­PLINA PLANEJAMENTO ARQUITETÔNICO VII-URBANISMO DO TERCEIRO ANO DA FACULDADE DE ARQUITETURA E URBANISMO DE FRANCA­UNIFRAN

Introdução

Paulo Celso Dornelles Del Picchia1 Neusa Maria Nogueira Rainho Ticianelli

RESUMO -o objetivo do trabalho foi exercitar os alunos de um curso de arquitetura nas dire­trizes e critérios do planejamento paisagístico visando a um uso do solo que levasse em conta os dados ambientais, harmonizando a intervenção humana no meio ambiente numa aproxima­ção ecológica. Contávamos com a área de uma fazenda próxima a Franca, Estado de São Paulo, da qual tínhamos a planta planialtimétrica e o levantamento aerofotogramétrico. Nessa área, que­ríamos localizar três usos distintos: comercial, industrial e residencial e ainda determinar áreas verdes de recreação e preservação. Primeiramente foi feito o reconhecimento fisiográfico com a elaboração dos mapas necessários. Sobrepondo as informações dos mapas, dados climáticos e informações sobre desenho urbano e clima, além de legislação, as diversas eQuipes de alunos che­garam a propostas de uso do solo. Palavras-cbave: Planejamento, Paisagismo.

ABSTRACT - The purpose of this work was to exerci se the students of aR architecture course in the guidelines and standards of landscape planning concerning the use of the land, considering environmetal data and harmonizing the human action with the environment trough an ecological approach. We reckoned with a farm site near the city of Franca in· the State of São Paulo on wich we had the planialtimetrical plan and aerial photography. We wished to locate these distinct uses in this site: commercial, industrial and residential ones, and furthermore to locate open spa­ces for· recreation and conservation. At first a physiographical reconnaissanee was done following by an elaboration of the necessary mapas. Combining maps information, climatic data, informa­tion about urban design and climate and also legislation, the various students teams presented proposals for the use of the land. Key words: Planning, Landsça!ie Planning.

o planejamento no Brasil tem tidó grande dificuldade em absorver o conhecimento do meio ambiente físico em suas propostas. De maneira geral, pelo que se observa nos Planos Diretores que estiveram em grande voga na década de 60, os . cientistas do meio ambiente colaboram nesses planos elaborando inventários paisagísticos isoladamente dos outros membros das equipes não tendo esses inventários um rebatimento direto nas deci­sões de planejamento.

Como os arquitetos estão intimamente ligados à execução de processos de planeja­mento em órgãos oficiais, nos pareceu importante que num curso de arquitetura os alu­nos tentassem uma interação entre os dados do ambiente físico com as necessidades da ocupação do solo pelo Homem e assim possibilitar-lhes uma melhor atuação em equi­pes multidisciplinares; abrindo-lhes a chance da interdisciplinaridade. Para tal, nos pa­receu interessante a idéia encontrada nos artigos de Reinhard Grebe na publicação "Bauleitplanung und Landschaftsplanung" do Uso do Plano de Paisagem como Plano de Uso do Solo (Grebe 1975) e a metodologia apresentada por Manuel Galvão Lucas na publicação "Arquitetura Paisagística no (paisagismo natural-urbano) Planejamento Físico-Territorial" (Lucas s/data) que nos facilitava desenvolver o trabalho com os alunos.

1 ProL da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo de Fanca - UNIFRAN.

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Materiais

Para desenvolver o trabalho contávamos com a área de uma fazenda próxima à ci­dade de Franca, Estado de São Paulo, a Fazenda Santo Antônio, da qual tínhamos a planta planialtimétrica na escala 1:5000 e uma fotografia aérea. Uma bibliografia de apoio ao trabalho também foi fornecida. A área encontra-se numa região do relevo de cuestas, tratando-se do front, vale ortoclinal e anaclinal de uma cu esta conforme definições en­contradas em Penteado (1980).

Objetivo

Na área da Fazenda Santo Antônio deveriam os alunos determinar uma implanta­ção urbana, localizando no terreno três usos distintos: comercial, industrial e residencial e ainda determinar áreas verdes de preservação e recreação.

Desenvolvimento do Trabalho

Primeiramente os alunos fizeram o reconhecimento fisiográfico (Lucas s/ data) ela­borando os seguintes mapas: mapa das unidades paisagísticas, mapa de declividades, mapas das exposições solares e mapa da vegetação. Consideraram também a ventilação. Após o término desses estudos foi feita visita ao local. Finalmente elaboraram suas pro­postas.

Mapa das unidades paisagísticas (Figura 2)

Analisando a topografia, os alunos traçaram as linhas de cu meada, assinalando os cursos d'água. Essas linhas de cumeada definem as bacias hidrográficas e permitem uma compreensão dos processos de drenagem no terreno podendo então ser reconhecidos a bacia de captação, bacia de infiltração, bacia de adução e o leito de cheias (Lucas s/ da­ta). Essas linhas de cu meada orientarão também os futuros acessos à área urbanizada e orientarão a construção das visuais urbanas determinando o gabarito em altura das construções no sentido de se obter referências urbanas através dos edifícios e do relevo.

Mapa de declividades (Figura 3)

Os fenômenos de erosão, a circulação de veículos, os acessos em geral a áreas urba­nizadas, os movimentos de terra ligados à implantação urbana estão em estreita ligação com a declividade do terreno. O fato de não termos indicações das características do solo da área de estudo, nem da sua suscetibilidade à erosão e capacidade de carga tor­nou o estudo das declividades a única orientação para evitar esses inconvenientes.

Foram considerados os seguintes intervalos e as correspondentes vocações de uso: de O a 15%-maior potencialidade para áreas industriais; de 15 a 25%-malha urbana em geral; de 25 a 45%-ocupação habitacional e mesmo comércio, educação, cultura, lazer; acima de 45%-reserva permanente, áreas verdes (reservas naturais, biológicas e parques); topo 'l1e morro-preservação permanente (Lucas s/ data).

Para a confecção desta carta foi utilizado um peqUeno gabarito em papel transpa­rente, baseando-nos, para sua confecção, na "Tabela de Conversão de Vertentes" e no item c) -"Medida de Vertentes e Alturas" encontradas em Tricart et aI. (1970) «Figura 3) correspondentemente.

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Cf. INSTITUTO NACIONAL DE METEOROLOGIA

Figura 8

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o pia0 de paisagem como plano de uso do solo

Mapa das exposições solares (Figura 4)

Desde há muito a agricultura se vale da orientação de vertentes para aproveitar com eficiência a energia solar,sendo um exemplo os vinhedos alemães plantados em vertentes orientadas para a maior exposição solar. No Trópico Brasileiro, a influência das diversas exposições de uma vertente foi comprovada pelo Prof. Dr. José Roberto Tarifa que in­vestigou as variações de temperatura e umidade para as diversas orientações de vertente (Tarifa s/ data).

Na carta de exposições solares foram consideradas as vertentes Norte, Sul, Leste, Oeste, os topos de morro e as que pela declividade têm todas as exposições (Lucas s/ da­ta). Esta carta foi traçada empiricamente, porém, hoje conhecemos um método para "Construção de uma carta para determinação de orientação de vertentes" (Oliveira 1984).

Para o uso desta carta tínhamos como orientação um gráfico (Figura 7) que mostra as variações da insolação diária para fachadas de edificações nas diversas exposições: Norte, Sul, Leste e Oeste (Sá 1942). Esse gráfico foi elaborado para Belo Horizonte e podíamos usá-lo em Franca já que as duas cidades têm altitudes e latitudes próximas. Franca: latitude 20 graus 32 minutos Sul, altitude IOlOm; Belo Horizonte; 19 graus 55 minutos Sul, altitude 850m. Com os dados da Figura 8 que apresentam as Normais Me­teorológicas (1931-1960) do Instituto Nacional de Meteorologia, vemos que Franca tem invernos frios c secos e verões quentes. Olhando a Figura 4 vemos que a vertente Norte receberá a máxima energia do sol nos meses de inverno, decrescendo no verão. As ver­tenteS Leste e Oeste receberão insolação máxima nos meses de verão e mínima no inver­no. A vertente Sul nos meses de verão é mais insoIada, recebendo insolação direta até março, não a recebendo de abril a setembro e de outubro em diante volta a ser insolada atin­gindo o máximo em DezembrolJaneiro.

Do ponto de vista do conforto térmico, à vertente Norte é a mais satisfatória, pois nos meses mais frios receberá mais energia térmica do sol e nos meses mais quentes, me­nos (Figura 7,8). As vertentes Leste e Oeste receberão mais energia térmica nos meses quentes e menos nos meses frios, sendo, portanto, menos satisfatórias. A vertente Sul é ainda mais crítica, pois não recebe insolação direta nos meses mais frios, só recebendo­a nos meses quentes.

Do ponto de vista do conforto térmico, o uso residencial nos parece o mais frágil, pois corrio empreendimento individual é o que carece mais de recursos para construção e manutenção, devendo ser levada em conta na sua implantação a maior economia de energia, sendo, no caso, a vertente Norte a mais indicada, pois será mais fresca no verão e mais quente no inverno. Para o uso comercial, dado demandar um investimento maior e ter também rentabilidade, a escolha de uma vertente adequada diminuira seguramente os custos com materiais isolantes térmicos e com ar condicionado. O uso industrial, pe­las próprias características, pode localizar-se nas vertentes mais críticas do ponto de vis­ta do conforto térmico, pois, em indústrias, as próprias atividades geram calor e condições ambientais que exigem tratamentos especiais do ponto de vista do conforto.

Mapa da vagetação (Figura 5)

No mapa da vegetação foram representadas as manchas de vegetação que, segundo o Código Florestal, deveriam ser preservadas. Para a confeções desta carta, utilizamos a fotografia aérea e, para interpretá-Ia, valemo-nos do trabalho "Levantamento da co­bertura vegetal natural e do reflorestamento no Estado de São Paulo" «IBDF/ SAGRI­SP 1974) que reconhece os diversos tipos de cobertura vegetal pelos padrões da imagem fotográfica (textura e tonalidade).

Ventilação A ventilação foi uma das preocupações, principalmente na escolha da área para a

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implantação industrial. Como não pudemos fazer um estudo da ventilação local utiliza· mos as indicações da ventilação regional encontradas no Atlas do Estado de São Paulo, fascículo I. conforme a Figura 9. Sendo predominantes os ventos de Leste, deveríamos procurar a localização industrial de forma a evitar a dispersão dos poluentes advinhos dessa atividade sobre a área urbana.

Visita ao local

Após a execução desses mapas, foi feita uma visita ao local. podendo os alunos ve­rificar "in loco" todos os problemas levantados.

Propostas

Após a feitura de todos os mapas, os alunos, comparando os dados obtidos e den­tro dos critérios anteriormente expostos, chegaram a diversas propostas de uso do solo. Como ilustração se apresenta na Figura 6 uma dessas propostas, podendo-se notar aí o setor industri<~1 localizado a oeste dos demais usos em razão do vento dominante de Leste. Vemos as diversas áreas verdes, a rede de drenagem, as linhas de cu meada, acessos viários. A urbanização se afasta dos cursos d'água atendendo ao Código Florestal que preconiza a manutenção da vegetação ciliar. As áreas de mata densa permanecem tam­bém livres de ocupação, assinaladas como vegetação de preservação. Os setores de uso residencial, comercial e industrial foram localizados em áreas de declividade menos acen­tuada (de O a 45 graus) o que favorecerá também a implantação do sistema viário. Quan­do às exposições solares, esses setores foram localizados em áreas que predominantemente têm todas as exposições já que a vertente Norte, dada como ideal, situa-se fora da área de estudo, no reverso da cuesta. O Parque Urbano localiza-se em área onde predominam declividades suaves.

Considerações Finais

Neste trabalho se pressupôs que a decisão de urbanizar a área da Fazenda Santo Antônio fizesse parte de decisões tomadas a nível do planejamento nacional e regional como se faz nas nações desenvolvidas. Assim, por exemplo, não levamos em conta a fer­tilidade do solo, pois se pressupõe que o planejamento nos níveis acima referidos teria destinado a área para urbanização.

Este trabalho, dentro das limitações em que se desenvolveu, deixa grande espaço para outras propostas de abordagem do problema do uso do solo, sendo que a continua­ção dele como projeto de urbanismo traria problemas que talvez levassem a modificar algumas de suas premissas. Acreditamos que o método que usamos seria de grande utili­dade se, saindo de seu âmbito acadêmico, fosse aplicado no desenvolvimento das cida­des brasileiras, pois o uso de procedimentos semelhantes evítaria, a nosso ver, as catástrofes que assistimos neste verão de 1988 em Petropólis, Ubatuba, Acre, Manaus e Rio de Janeiro.

Bibliografia de Apoio

Para orientar os alunos nos problemas suscitados por este trabalho foi fornecida a seguinte bibliografia:

MEIO AMBIENTE/ ECOLOGIA AGUESSE, P. 1972. Chaves da Ecologia. Rio de Janeiro Civilização Brasileira. 139p. DORST, 1. 1973. Antes que a natureza morra. São Paulo, Edgar Bluecher 394p. FERRI, M. G. 1974. Ecologia; temas e problemas brasileiros. Belo Horizonte, Itatiaia,

188p. 162

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IBDF. 1972. Proteção à fauna. Rio de Janeiro. (Lei 5.197 de 3.1.197. Decreto Lei 68.5665 de 29.4.1971. Portaria 2.199 de 19.5.1971).

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1973. 308p. MOTA, Suetonio. Planejamento Urbano e Preservação Ambiental. Fortaleza, Edições

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Epu / Edusp/ Cetesb, 1978. 295p. SIMONDS, John Ormsbee. Earthscape; A manual of environmental planning. USA,

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Agradecimentos

Agradecemos ao Prof. Dr. Luis Carlos Chichierchio, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, o auxílio dado no uso dos diagramas sola­res. Agradecemos, também, ao Prof. Dr. Felisberto Cavalheiro, professor de Ecologia Urbana da Universidade Estadual Paulista "Julio de Mesquita Filho" Unesp-Campos de Rio Claro, pela orientação que deu na interpretação dos dados climáticos. Agradece­mos o empenho dos alunos do III ano da FAU-UNIFRAN, ano letivo de 1983, no desen­volvimento deste trabalho, em especial aos alunos cujos trabalhos serviram de ilustração a este texto:

Figuras 1 e 3 - Carlos Messias, Marcelo Jordão da Silva, Maria Amália S. Silva, Maria Beatriz Oliveira, Maria Luiza Zanetti.

Figuras 2, 5 e 6 - Cesar Khodor, Leila C. Ubbi, Mareio A. Andrade, Mareio A. Scott de Oliveira e Odilon C. Carneiro.

Figura 4 - Erlindo Cesar Morato, José Luis R. Alves, Luiz Carlos de Souza, Mag­da Belato de Freitas e Ricardo Barichelo Neto.

Referências bibliográficas

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Recebido em 10/09/88 Aprovado em 25/05/89