01 LinguisticaTextual Temp

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LINGÜÍSTICA TEXTUAL 1ª Edição - 2007

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  • LINGSTICATEXTUAL

    1 Edio - 2007

  • Sociedade Mantenedora de Educao Superior da Bahia S/C Ltda.Gervsio Meneses de Oliveira

    Presidente

    William OliveiraVice-Presidente

    Samuel SoaresSuperintendente Administrativo e Financeiro

    Germano TabacofSuperintendente de Ensino, Pesquisa e Extenso

    Pedro Daltro Gusmo da SilvaSuperintendente de Desenvolvimento e Planejamento Acadmico

    Faculdade de Tecnologia e Cincias - Ensino a DistnciaReinaldo de Oliveira Borba

    Diretor Geral

    Marcelo NeryDiretor Acadmico

    Roberto Frederico MerhyDiretor de Desenvolvimento e Inovaes

    Mrio FragaDiretor Comercial

    Jean Carlo NeroneDiretor de Tecnologia

    Andr PortnoiDiretor Administrativo e Financeiro

    Ronaldo CostaGerente Acadmico

    Jane FreireGerente de Ensino

    Luis Carlos Nogueira AbbehusenGerente de Suporte Tecnolgico

    Romulo Augusto MerhyCoord. de Softwares e Sistemas

    Osmane ChavesCoord. de Telecomunicaes e Hardware

    Joo JacomelCoord. de Produo de Material Didtico

    EquipeAntonio Frana Filho, Anglica de Ftima Jorge, Alexandre Ribeiro, Bruno Benn, Cefas Gomes,

    Cluder Frederico, Danilo Barros, Francisco Frana Jnior, Herminio Filho, Israel Dantas, John CasaisLucas do Vale, Marcio Serafim, Mariucha Ponte, Tatiana Coutinho e Ruberval da Fonseca

    ImagensCorbis/Image100/Imagemsource

    Produo AcadmicaJane Freire

    Gerente de Ensino

    Ana Paula AmorimSuperviso

    Jussiara GonzagaCoordenao de Curso

    Andr Luiz Gaspari MadureiraAutor(a)

    Produo TcnicaJoo JacomelCoordenao

    Carlos Magno Brito Almeida SantosReviso de Texto

    Antonio Frana de S. FilhoEditorao

    Antonio Frana de S. FilhoIlustraes

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    proibida a reproduo total ou parcial, por quaisquer meios, sem autorizao prvia, por escrito, da FTC EaD - Faculdade de Tecnologia e Cincias - Educao a Distncia.

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    SOMESB

    FTC - EaD

    MATERIAL DIDTICO

  • SUMRIO

    ESBOO HISTRICO DA LINGSTICA TEXTUAL ______________ 7

    DA RUPTURA ESTRUTURALISTA LINGSTICA TEXTUAL _____________ 7

    ESTRUTURALISMO: UM PASSO PARA A LINGSTICA CONTEMPORNEA _______________ 7

    OS ESTUDOS GERATIVISTAS __________________________________________________10

    A NECESSIDADE DE RENOVAO DO HORIZONTE LINGSTICO _____________________12

    DAS GRAMTICAS DE FRASE S GRAMTICAS DO TEXTO ___________________________15

    ATIVIDADE COMPLEMENTAR _________________________________________________18

    OS PRIMEIROS PASSOS DA LINGSTICA TEXTUAL ____________________19

    A CONCEPO DE SUJEITO E DE LNGUA _______________________________________19

    A IDIA DE TEXTO __________________________________________________________23

    O CONTEXTO NA LINGSTICA TEXTUAL ________________________________________25

    COMPREENDENDO AS ESTRUTURAS COGNITIVAS ________________________________27

    ATIVIDADE COMPLEMENTAR _________________________________________________30

    PRINCPIOS E PROCEDIMENTOS DA LINGSTICA TEXTUAL __31

    ALGUNS ELEMENTOS BSICOS DA LINGSTICA TEXTUAL ____________31

    A COERNCIA TEXTUAL _____________________________________________________31

    A COESO TEXTUAL ________________________________________________________36

    A RELAO ENTRE A COERNCIA E A COESO TEXTUAL ___________________________41

    A POLIFONIA TEXTUAL _____________________________________________________43

    ATIVIDADE COMPLEMENTAR _________________________________________________49

    A LNGUA ESCRITA E A LNGUA FALADA ____________________________52

  • SUMRIO

    PENSANDO A ORALIDADE E O LETRAMENTO ____________________________________52

    CARACTERSTICAS DA LNGUA ESCRITA _________________________________________53

    CARACTERSTICAS DA LNGUA FALADA ________________________________________55

    O TEXTO CONVERSACIONAL _________________________________________________57

    ATIVIDADE COMPLEMENTAR _________________________________________________59

    GLOSSRIO _____________________________________________________________61

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS __________________________________________63

  • Ol, pessoal!

    Ao pensarmos a questo da linguagem, por vezes a tomamos como um elemento presente em nossas vidas, elegendo para ela um lugar privilegia-do no cotidiano. Alm do mais, no processo comunicativo, seja atravs da linguagem escrita ou falada, no difcil nos flagrarmos com uma certa pre-ocupao, j que, de um modo ou de outro, nessa situao ns expomos o que realmente somos (ou o que achamos que somos).

    No entanto, o que nos d segurana tem a ver, alm de outros fatores, com uma formao slida. Porm, para erguer um edifcio firme, inabalvel, primordial que se tenha uma base firme, propensa a suportar o peso de vrios andares. Se tomarmos esse prdio como uma metfora da condio humana, veremos que o alicerce para a construo do saber est na compre-enso dos princpios bsicos. Tais princpios se revelam como a base, o pr-requisito que poder nos proporcionar compreender relaes mais comple-xas, representadas por cada um dos andares. esse processo que tambm nos faz ter a confiana necessria para tomarmos as melhores decises, para expormos com propriedade os nossos pensamentos acerca de um dado as-sunto, as nossas concepes, principalmente no ambiente acadmico.

    Neste mdulo, o que proponho justamente a sedimentao do alicerce com o desenvolvimento de nossos estudos acerca da Lingstica Textual. Mas para compreender sua histria, assim como as condies que propi-ciaram seu surgimento no cenrio lingstico, torna-se imprescindvel viajar por um universo que nos leve a atingir tal objetivo.

    Nesse sentido, convido a todos para viajarmos juntos pelo universo do co-nhecimento. Vamos observar o que propiciou o surgimento da Lingstica Textual, bem como analisar os princpios bsicos que norteiam os trabalhos da aludida disciplina. Enfim, vamos mergulhar no mundo do saber e conhe-cer mais uma importante vertente dos estudos lingsticos do sculo XX.

    Esto preparados? Ento apertem os cintos e vamos l!

    Bons estudos!

    Professor Andr Luiz Gaspari Madureira

    Apresentao da Disciplina

  • Lingstica Textual 7

    ESBOO HISTRICO DA LINGSTICA TEXTUAL

    DA RUPTURA ESTRUTURALISTA LINGSTICA TEXTUAL

    No momento em que se pra com o intuito de observar o desenvolvimento da lingstica na his-tria, possvel identi car que vrios estudos foram se modi cando com o passar do tempo. Segundo Hilrio Bohn, da mesma maneira como a morte do indivduo no signi ca o seu desaparecimento, ele continua na memria coletiva ou familiar, continua gerando sentidos depois que sai do convvio social, assim com os paradigmas, somente depois de muitos anos da sada do palco dos auditrios cient cos que se podem avaliar os efeitos que produzem sobre a viso de mundo e as pessoas que o habitam.

    Dessa forma, no universo da cincia da linguagem, principalmente no sculo XX, modelos ling-sticos sofreram in uncias e/ou in uenciaram outros estudos. Seja para rati car ou negar, a lingstica apresentou esse movimento entre identidade e alteridade. As correntes lingsticas tiveram in uncia de idias, concepes anteriores e apontaram para futuros posicionamentos. E justamente por isso que inicialmente vamos rever alguns conceitos principais que marcaram a lingstica no sculo XX, no intuito de compreendermos o que levou ao surgimento de uma importante vertente da cincia da linguagem: a Lingstica Textual. A nal, para se compreender o presente fundamental conhecer o passado, saber quais foram as condies de existncia que propiciaram a cristalizao de um determinado movimento, e no de outro em seu lugar.

    ESTRUTURALISMO: UM PASSO PARA A LINGSTICA CONTEMPORNEA

    Se possvel considerar o sculo XIX como a poca do estudo histrico e comparativo das lnguas, o sculo posterior marca uma importante ruptura na lingstica. No raro se ouviu que a lingstica era uma disciplina predominantemente histrica. Diante de tal a rmao, o que aconteceria se algum dis-sesse o contrrio? Qual seria a conseqncia de se negar o que at ento se rati cava? Bem, no precisa de muito esforo para pelo menos se achar que causaria muito rebulio, no ?! Pois foi justamente isso que aconteceu no sculo XX com o advento do estruturalismo saussuriano, que vocs j devem conhe-cer. Porm, para que se possa compreender o processo histrico que levou ao surgimento da Lingstica Textual, torna-se importante relembrar alguns pressupostos bsicos de um movimento que balanou os pilares dos estudos da linguagem.

    Inicialmente, podemos apontar como marco do estruturalismo saussuriano o lanamento pstumo do livro de Ferdinand de Saussure intitulado Cours de Linguistique Gnrale (Curso de lingstica geral), publicado em 1916. A existncia da referida obra se deu graas contribuio de trs de seus discpulos, a partir de rascunhos feitos nas aulas do grande mestre genebrino.

  • FTC EaD | LETRAS8

    No se esquea:

    O estruturalismo se fez presente em vrias reas das cincias humanas. Por esse motivo, po-demos dizer que existem estruturalismos, e no apenas um estruturalismo. No entanto, lembre-se de que estamos tratando, nesse momento, do estruturalismo saussuriano, ok?!

    Uma das preocupaes de Saussure foi dar uma nomenclatura inequvoca para que se pu-desse analisar melhor os fatos da lngua. Essa era uma carncia que at ento havia nos estudos lingsticos. A respeito disso, tomemos como exemplo a palavra LNGUA. Anteriormente, esse termo poderia ter um conceito diferente, a depender do pesquisador que o iria utilizar. J deu para perceber que essa questo deveria causar muita confuso, vez que o sentido mobilizado por LN-GUA poderia variar, o que logicamente atrapalhava a compreenso de vrios trabalhos.

    Nesse sentido, Saussure deu uma importante contribuio para os estudos da linguagem. Vamos ver como ele sistematizou a lngua, tomando-a como seu objeto de estudo:

    Ateno

    A lngua (langue) passou a estabelecer uma oposio fala (parole). Isso se deu porque a lngua passou a ser vista como homognea e abstrata, podendo ser sistematizada e estudada. J a fala era tida como homognea e concreta, no sendo possvel, portanto, ser sistematizada nem, por conseguinte, estudada. Visualize abaixo como se podem observar esses pontos de convergncia, nesse primeiro momento em que se separam a lngua da fala, segundo o estruturalismo:

    Ateno

    LNGUA: sistemtica; homognea; abstrata; estudvel

    FALA: assistemtica; heterognea; concreta; no-estudvel

    Ateno

    No momento em que, a exemplo da prtica escolar, numa poca na qual se estudar uma lngua signi cava estudar textos, os seus sentidos, inclusive a partir de disciplinas intituladas compreenso de texto, Saussure apresenta uma nova abordagem lingstica. Ele prope no mais se ater funo signi cativa de texto, prtica da linguagem, e sim ao seu funcionamento, a sua teoria. Com o referido deslocamento, separa-se, portanto, a prtica da linguagem de sua teoria. Nesse sentido, a lngua passa a ser pensada como sistema de signos e a fala ca excluda dos estudos cient cos da linguagem.

  • Lingstica Textual 9

    Para saber mais.

    Muitas disciplinas reconhecem o deslocamento conceptual de Saussure, da FUNO para o FUNCIONAMENTO, como um marco do nascimento da lingstica enquanto cincia.

    Ateno

    Lembra de que a lingstica no sculo XIX era histrica e comparativa? Pois ! Por conta dos estu-dos de Saussure, a lingstica no sculo XX deixa de ser histrico-comparativa. O motivo da mudana se baseia na idia do mestre genebrino de que no havia sentido estudar a lngua em sua historicidade (ou diacronia), mas mediante o seu vis descritivo (sincrnico). Diante disso, podemos dizer que ele prefere,

    ento, estudar o estado da lngua, e no sua evoluo.

    No intuito de tornar a referida questo mais clara, Saussure compara a lngua em seu estado com um jogo de xadrez.

    Sua tese de que, assim como num jogo de xadrez, o jogo da lngua apre-senta um sistema de valores. Bem, vamos ver o que ele prprio diz sobre isso:

    Por isso que, para Saussure, o lingista proposto a compreender o esta-do da lngua deve analis-lo em um dado momento, descrevendo-o, e ignorar sua evoluo, ignorar sua histria, ignorar sua diacronia.

    A lngua uma forma e no uma substnciaNo estruturalismo, a lngua ser vista como forma, e a fala, substncia.

    Nesse sentido, forma deve ser compreendida como essncia, em seu sentido -los co. A forma constante, como a lngua. J a substncia circunstancial como a fala , tida como aparncia, e no como essncia. No jogo de xadrez, por exemplo, as regras esto para a forma, j as peas do jogo, para a substncia.

    Se transferirmos essa lgica para a linguagem, poderemos fazer a seguinte associao a partir da frase abaixo:

    Nis compr a rpa.O que importa para o estruturalismo ao estudar a lngua a forma, as regras, no a substncia, a

    aparncia. Assim, temos a seguinte regra de constituio da frase:

  • FTC EaD | LETRAS10

    Pronome + verbo + objeto

    Os desvios ortogr cos, por exemplo, esto ligados aos traos da fala. Esses traos, para Saussure, so de ordem individual, ou seja, peculiar a determinados falantes, e no social, geral como o a regra. Os traos podem variar, a depender do falante, do momento em que se emite a frase. Portanto, um ato individual. Assim, apesar do desvio norma culta, sua estrutura continua a ser de uma frase da lngua portuguesa.

    Bem, agora, no quadro abaixo, vamos visualizar algumas dessas diferenas estruturalistas apresentadas:

    A partir de nossos estudos, foi possvel perceber que h muitas oposies no estruturalismo. Por isso, podemos dizer que o estruturalismo tem a caracterstica de se ocupar das diferenas. por isso que Saussure props suas dicotomias, como lngua (langue) X fala (parole), sincronia X diacronia. Existem mais dicotomias saussurianas, porm nosso objetivo agora compreender as motivaes histricas e lin-gsticas para a constituio da Lingstica Textual. Esses princpios bsicos trabalhados j servem para o nosso propsito nesse mdulo. Por isso, importante internalizar tudo o que foi at agora trabalhado aqui, t?!

    OS ESTUDOS GERATIVISTAS

    Agora que j vimos certos pontos bsicos do estruturalismo, vamos relembrar alguns pressupostos de um estudo que tambm teve muita importncia no sculo XX, por volta do nal da dcada de 50, e que in uenciou muito o pensamento lingstico: O gerativismo. Esse movimento lingstico vai, em um momento, in uenciar a Lingstica Textual. Por isso, prestem bastante ateno, meus amigos!

    Quando falamos em gerativismo, um nome fundamental vem mente: Noam Chomsky. Ele foi o criador do gerativismo, estudo que prope uma gramtica gerativa (doravante GG) que passou a ser co-nhecida a partir da obra de Chomsky, Syntactic structures, publicada em 1957. Ela prope principalmente que a gerao dos enunciados seja, pelo menos parcialmente, determinada pelo estado da mente/crebro. O referido autor v o crebro como um rgo do corpo humano que deve ser estudado como se estuda o corpo humano. Para ele, cada parte teria sua funo. Portanto, uma parte do crebro seria responsvel pela linguagem.

  • Lingstica Textual 11

    Bem, se a linguagem vista como uma propriedade da mente/crebro do falante, ca fcil comear a entender a a r-mao de que a linguagem inata. Essa idia difere do estru-turalismo americano, o qual v a aquisio da linguagem como resultado de repetio, estmulo/resposta, a partir da experi-ncia, sendo, assim, um constructo social, e no mental.

    Lembre-se:Para o gerativismo, aquisio da linguagem inata, portanto,

    j nascemos com ela.

    Outro ponto importante tra-tado pelo gerativismo a existncia de uma gramtica universal (GU). A partir dessa concepo, todas as

    lnguas tm pontos em comum, tm princpios gerais. Diante disso, ca clara a a rmao de que, diferente dos estudos estruturalistas, os quais se baseavam nas diferenas, nas dicotomias, o gerativismo vai se voltar para as semelhanas, para os princpios universais existentes em todas as lnguas.

    Ao trabalhar com a GU, Chomsky tambm vai se ocupar, a despeito do estruturalismo, que efetu-ava uma atividade descritiva em suas pesquisas - em explicar esses fenmenos lingsticos ligados a um conjunto de princpios gerais. Por esse motivo, no h problema em dizer que nesse sentido a prioridade torna-se mais terica que emprica. E no intuito de descrever o conhecimento implcito do falante mediante um quadro terico-explicativo que Chomsky elabora a teoria da gramtica gerativa. De acordo com Jos Borges Neto, o trabalho do lingista, nesse momento, passa a ser dividido em dois grupos:

    1. Construir gramticas destinadas a lnguas particulares.

    2. Construir princpios gerais para a capacidade da linguagem (princpios universais lingsticos).

    Ateno

    Nos estudos de Chomsky, a sintaxe ganha um lugar de destaque. Dessa forma, ele mesmo diz o seguinte:

    Uma lngua um conjunto ( nito ou in nito) de oraes, cada uma delas de tamanho nito e construda a partir de um conjunto nito de elementos.

    Assim, a sintaxe ganha uma autonomia, j que, a partir dela, so geradas as oraes gramaticais coerentes.

    O conhecimento que os falantes possuem de uma lngua em suas mentes chamado de competncia lin-gstica. A competncia, ento, justamente o conhecimento lingstico internalizado que permite ao falante ter a propriedade de utilizar o conjunto de regras que se encontram presentes em sua mente. A competncia possibilita que o falante faa uso da linguagem e a adquira na infncia, vez que a linguagem uma propriedade inata.

    preciso distinguir a competncia lingstica da performance. A performance se refere ao modo com que o falante vai utilizar a linguagem. A esse fator so incorporadas questes extralingsticas, en-volvendo o ambiente, a sociedade, os interlocutores.

    Nesse momento importante deixar bem claro que a teoria gerativa centra-se na competncia, que de carter universal, e est relacionada mente/crebro do falante. A isso se pode dizer que a preocupa-o central da teoria gerativa a aquisio da linguagem. Se fssemos buscar uma pergunta fundamental que pudesse resumir o propsito da teoria gerativa seria a seguinte:

  • FTC EaD | LETRAS12

    Como conseguimos falar?

    Portanto, no esquea:

    O objeto de estudo do gerativismo a competncia.

    Para entender a possvel existncia de uma gramtica universal, comum a todas as lnguas, ns pode-mos pensar na seguinte situao: Ao ouvir a frase Eu comi um bolo, possvel que uma criana diga Eu vi um cachorro. Bem, mesmo que ela nunca tivesse ouvido tal enunciado, no deixou de conjugar correta-mente o verbo. Para Chomsky, essa propriedade inata. O que tambm auxilia no processo de produo de enunciados inditos a criatividade lingstica. Podemos, ento, conceitu-la da seguinte forma:

    Entende-se por criatividade lingstica a capacidade que o falante tem de compor e com-preender sentenas s quais ele nunca foi exposto.

    E a? Conseguiram compreender alguns dos pontos bsicos do gerativismo? Agora vamos per-ceber, de forma mais sintetizada, certas diferenas que podem ser estabelecidas entre o gerativismo e o estruturalismo, no quadro abaixo:

    A NECESSIDADE DE RENOVAO DO HORIZONTE LINGSTICO

    Nos itens anteriores, ns pudemos rever algumas caractersticas bsicas de dois importantes movi-mentos lingsticos do sculo XX. Lembramos de certos conceitos principais, alm de acompanharmos como se cristalizaram diferenas que marcaram tanto o estruturalismo quanto o gerativismo. Tais diferen-as tambm zeram essas duas vertentes muitas vezes percorrerem em suas pesquisas caminhos opostos (a comear da escolha do objeto de estudo) e dividirem a ateno de lingistas e pesquisadores.

    No entanto, apesar de falarmos das diferenas entre o estruturalismo e o gerativismo, isso no sig-ni ca que esses dois movimentos sejam totalmente opostos, que no tenham pontos em que se tocam. Nesse sentido, faremos umas consideraes aos momentos em que se aproximam para, a partir de singu-laridades entre eles, ser possvel compreender melhor o surgimento do que nos primordial discutir nesse tema: a constituio histrica da Lingstica Textual. Mas para isso tambm necessrio fazer algumas consideraes a respeito do formalismo e do funcionalismo.

  • Lingstica Textual 13

    Semelhanas entre estruturalismo e gerativismoSe analisarmos a proposta de Saussure, veremos que ele se volta para o trabalho descritivo da lngua

    (langue). A partir da, segundo a viso de lngua como sistema, esses estudos lingsticos giram em torno desse sistema, ou seja, das regras do jogo. Isso acarreta em no se considerar como principal o aspecto da comunicao, e sim a estrutura em si.

    A comunicao no estruturalismo tratada como emisso e recepo de mensagens. Diante desse processo, a mensagem enviada, recebida e de-codi cada. D para perceber que, mediante tal processo, a comunicao hu-mana no se diferencia da comunicao entre mquinas, no ?!

    Ao observarmos o gerativismo, perceberemos que ele toma como ob-jeto de estudo a competncia lingstica, que tem carter universal e se insere

    na mente/crebro. J a performance deixada de lado. Bem, como a comunicao tem a ver com o uso da lngua em situaes determinadas, ela se insere no plano da performance, do desempenho lingstico do falante. Dessa forma, possvel compreender que, como a comunicao est no plano da performan-ce, ela deixada de lado pelos estudos gerativistas.

    Lembre-se:

    Em um determinado momento, o gerativismo procura destinar parte de seus estudos se-mntica, porm tenta formaliz-la.

    Diante do que foi exposto, os limites do gerativismo e do estruturalismo se do principalmente por idealizarem e formalizarem o objeto de estudo, por tratarem a orao como a unidade mxima de estudo e por considerarem de modo insatisfatrio o aspecto da comunicao em suas teorias.

    Em termos gerais, no raro vemos tanto o movimento estruturalista como o gerativista se-rem classi cados como estudos formalistas da linguagem. Para compreender melhor essa questo, vamos ver como se pode caracterizar um estudo formalista.

    Ateno

    Os estudos formalistas

    J vimos que nos estudos formalistas da linguagem se enquadram o estruturalismo e, de certo modo, o gerativismo. Eles so chamados de formalistas porque vem a lngua em sua forma, como um objeto descontextualizado. O formalismo preocupa-se bastante com as caractersticas internas da lngua, relegando a um outro lugar a lngua em seu uso. Quanto a este tipo de estudo, Dillinger salienta:

    O formalista estuda uma lngua em termos de suas partes e os princpios de sua organizao, sem considerar suas relaes com o meio ou contexto em que se situa.

    Ateno

    Ento, deu para perceber que o formalismo vai analisar a lngua em sua forma.

  • FTC EaD | LETRAS14

    O funcionalismoDiferente do formalismo, o funcionalismo vai procurar estudar a linguagem em sua funo. Assim,

    para o funcionalismo, o estudo da funo das formas lingsticas predominante. As caractersticas inter-nas da lngua, bastante estudadas pelos formalistas, no funcionalismo no sero to importantes quanto as relaes entre a lngua e a interao social, a lngua e o contexto social, a lngua e a comunicao.

    Voc se lembra que falamos sobre a atitude de Saussure de pro-por o estudo do FUNCIONAMENTO da linguagem e no de sua FUNO? Pois ! Ao fazer isso, ele acabou deixando um campo descoberto, que viria a chamar a ateno de lingistas. Ora, vrios pes-quisadores da linguagem acharam que no se poderia deixar de lado a FUNO da lngua na sociedade, a nal, somos seres comunicativos. Utilizamos a lngua para nos comunicarmos, para construirmos sen-tido a partir do momento em que h uma interao. Mais uma vez,

    vamos ver o que Dillinger tem a nos dizer, agora sobre o funcionalismo:

    Em geral, portanto, o funcionalismo se preocupa com as relaes (ou funes) entre a lngua como um todo e as diversas modalidades de interao social e no tanto com as caractersticas in-ternas lngua. Assim, os funcionalistas frisam a importncia do papel do contexto, em particular o contexto social na compreenso da natureza das lnguas.

    Ateno

    Bem, nos estudos funcionalistas j podemos destacar alguns, como a sociolingstica, a lingstica an-tropolgica, a anlise do discurso, a lingstica textual (este ltimo, foco de nossos estudos neste mdulo).

    Para resumir algumas caractersticas do formalismo e do funcionalismo, acompanhe a tabela abaixo com idias apresentadas por Dik e adaptadas por Maria Helena de Moura Neves:

    Portanto, vocs puderam entender o que motivou a existncia da Lingstica Textual no cenrio da cincia da linguagem no sculo XX. Agora j estamos prontos para avanarmos mais e adquirirmos mais conhecimento acerca desse assunto.

  • Lingstica Textual 15

    Agora, vamos tratar de uma questo que muito interessa Lingstica Textual: a passagem da gra-mtica de frase gramtica de texto. Preparados? timo! Ento vamos l!

    DAS GRAMTICAS DE FRASE S GRAMTICAS DO TEXTO

    A partir do Curso de lingstica geral, de Saussure, a gramtica se tornou o centro da re exo ling-stica contempornea. Nesse sentido, passou a ser papel da lingstica construir teorias sobre a gramtica das lnguas naturais. De acordo com essa idia, podemos de nir gramtica da seguinte forma:

    Um sistema de regras que tem a capacidade de efetuar a descrio de um sistema lingstico.

    Portanto, tem-se essa gramtica como descritiva. Assim, no confunda a gramtica descritiva com a gram-tica com a qual ns temos contato na escola: a normativa. Para isso, vamos ver como elas se diferenciam ok?!

    A gramtica descritiva se ocupa a descrever um sistema lingstico, a nal de contas a lingstica prope ser a cincia da linguagem e, como cincia, fundamentalmente descritiva, e no normativa.

    J a gramtica normativa visa prescrever normas do bom falar, ou do falar correto. No entanto, ela se limita, por considerar mais as normas acadmicas que o uso inovador da lngua, o qual provoca uma ruptura que vem a extrapolar o estudo gramatical.

    Ateno

    Ora! sabe aquelas palavras ou estruturas que, em um momento de descontrao (ou de descuido), ns utilizamos e que algum sempre aparece para dizer Essa palavra no existe, ou Voc falou erra-do? Pois , essas questes que extrapolam o uso gramatical (alm de outras) no so valorizadas devida-mente pela gramtica normativa.

    A gramtica descritiva, dentro dessa viso estruturalista, vai ver a lngua como um sistema opositivo. Para se realizar a anlise, parte-se de unidades menores para unidades maiores que justi cam ou englobam as anteriores.

    Assim, o primeiro nvel de anlise o fonolgico. Como se trabalha a partir de uma viso dicot-mica, opositiva, possvel perceber que o nvel fonolgico no signi cativo, porm, permite distinguir signi cados. Como exemplo, podemos observar que a diferena fonolgica entre /BATA/ e /PATA/ (/B/ e /P/) su ciente para distinguir os signi cados.

    Bem, j deu para perceber que o nvel fonolgico se integra a um nvel maior e signi cativo, que o morfolgico, certo?! Podemos ento de nir a morfologia da seguinte maneira:

    Morfologia: Parte da gramtica que se prope a descrever formas que constituem as palavras, os morfemas.

    Para diferenciar o nvel morfolgico do fonolgico, podemos dizer que:

    O fonema a unidade mnima no signi cativa.O morfema a unidade mnima signi cativa.

    O morfema tambm considerado a base do nvel seguinte: o sinttico. A sintaxe, ento, a parte da gramtica que se prope a analisar as relaes que os morfemas e as oraes mantm entre si. Nessa perspectiva, pode-se tomar a orao a partir da de nio abaixo:

    A orao a unidade mxima de estudo.

  • FTC EaD | LETRAS16

    Portanto, nessa perspectiva, parte-se da anlise da unidade mnima no signi cativa, que o fone-ma, e se estende at unidade mxima de anlise: a orao.

    Agora que j foram apresentadas algumas caractersticas das gramticas, principalmente na viso estruturalista, vamos ver quais foram as mudanas que ocorreram na Lingstica Textual desde a sua constituio, bem como o momento em que as gramticas de texto entram nesse cenrio. Para tanto, preciso distinguir trs fases de constituio de tal disciplina.

    As fases de constituio no devem ser vistas, em relao da passagem de uma para a outra, de forma cronolgica. Muitos autores destacam que esses movimentos se deram simultaneamente, de forma independente.

    Ateno

    1 FASE transfrstica.

    Anteriormente, foi possvel observar que as gramticas de frase, at mesmo por ter como unidade mxima de estudo o enunciado, apresentavam limitaes. Essas limitaes tambm se estabeleceram por no se contemplar, nas aludidas gramticas, fatores que ultrapassavam o limite das frases e que s pode-riam ser analisadas no interior do texto, como o caso da co-referncia. Nessa fase, muitos estudiosos apresentaram conceitos sobre o texto. Harweg, por exemplo, de nia o texto como uma seqncia pro-nominal ininterrupta. J Isemberg o de niu como sendo uma seqncia coerente de enunciados.

    No esquea:

    O desenvolvimento da Lingstica Textual data por volta da dcada de sessenta. Ele se deu principalmente na Alemanha.

    Ateno

    Ao analisarmos a frase

    Joo saiu correndo. Ele estava com muito medo.veremos que h uma ligao entre o pronome ELE e o referente (Joo). Esta ligao estabelecida

    entre Joo e o pronome ELE (co-referente de Joo) se d principalmente pela predicao desses dois ele-mentos, e no somente por questes de concordncia. S que esse elemento coesivo por si no garantiria, ao longo de uma seqncia, a existncia de um texto.

    A questo da presena de elementos coesivos, como as conjunes, tambm foi tema dos estudos na fase transfrstica. O que chamou a ateno, tambm, foi o fato de que um trecho, mesmo sem a pre-sena de conjunes, poderia ter coerncia.

    Ora! na frase

    Pedi por voc; ningum me ouviu.no difcil perceber a relao de adversidade, mesmo sem a presena do conectivo mas.

    J deu para perceber que a idia de um texto se constituir apenas pela soma de frases no estava dando certo, no ?! Essa questo abriu espao para a necessidade de uma outra forma de tratar o texto. a partir da que vrios estudiosos se voltam para a criao das gramticas textuais. justamente por isso que se diz que:

    A fase transfrstica abriu espao para a constituio das gramticas textuais.

  • Lingstica Textual 17

    2 FASE As gramticas textuaisNos primeiros assuntos deste bloco temtico ns revisamos, alm de outros, conceitos bsicos do

    gerativismo. Vimos que Chomsky visou elaborar uma gramtica gerativa de sentido. Para tanto, procurou se voltar para a competncia lingstica do falante, levando em considerao que o falante tem a proprie-dade inata da linguagem e capaz de produzir enunciados in nitos e inditos em uma dada lngua.

    De forma anloga, esta segunda fase da lingstica textual, recebendo in uncias do gerativismo, passou a levar em considerao a COMPETNCIA TEXTUAL do falante.

    Vamos compreender melhor essa questo. A passagem da fase transfrstica para a elaborao da gramtica textual se deu principalmente porque se pde perceber que, alm de muitos textos no apre-sentarem o fenmeno da co-referenciao, indispensvel para a compreenso de diversos textos levar em considerao o conhecimento intuitivo do falante.

    A partir da, preconizou-se que todo falante de uma lngua capaz de produzir textos inditos, bem como de ter a propriedade de elaborar parfrase. Alm disso, seria possvel ao falante reconhecer os diversos tipos textuais (narrativo, descritivo, dissertativo).

    Essas capacidades textuais so, respectivamente, intituladas de CAPACIDADE FORMATIVA, CAPACIDADE TRANSFORMATIVA e CAPACIDADE

    QUALIFICATIVA.J que todos os falantes teriam essas capacidades, a gramtica textual, nesse sentido, deveria se

    voltar para as seguintes questes:

    1. O que faz com que um texto seja um texto, isto , como se do os elementos constituido-res da textualidade.

    2. Como se pode delimitar um texto. Como se pode considerar completo o texto.

    3. De que forma os textos podem se diferenciar.

    Mesmo com o empenho em desenvolver uma gramtica textual, tais itens no puderam ser con-templados devido impossibilidade de se chegar aos devidos objetivos.

    Desse jeito, em lugar de procurar descrever a competncia textual do falante, como pregava a gra-mtica textual, tornou-se mais vivel analisar de que forma se constituem, funcionam os textos em uso, bem como o modo que se d sua compreenso. Assim, surge a 3 FASE da constituio da Lingstica Textual: a elaborao de uma teoria de texto. A referida teoria ir tomar o texto no mais como um pro-duto acabado, e sim como um processo que resulta de questes sociocognitivas, interacionais, comunica-tivas. Mas dessa ltima fase, que nos interessa bastante, ns trataremos mais adiante.

    Depois de observarmos a constituio da Lingstica Textual, de vermos os movimentos que a in uen-ciaram e o que motivou sua existncia no cenrio lingstico no sculo XX, agora a hora de testarmos nossos conhecimentos. Vamos ver se tudo o que foi apresentado at aqui est fazendo sentido? Ento vamos l!

  • FTC EaD | LETRAS18

    Aponte algumas diferenas existentes entre: Lngua X Fala

    De na a diferena existente entre a Sincronia e a Diacronia

    Aponte algumas caractersticas presentes nos estudos funcionalistas.

    Explique, com suas palavras, de que forma o gerativismo in uenciou a Lingstica Textual.

    Saliente algumas diferenas existentes entre o formalismo e o funcionalismo

    1.

    2.

    3.

    4.

    5.

    Atividade Complementar

  • Lingstica Textual 19

    OS PRIMEIROS PASSOS DA LINGSTICA TEXTUAL

    A CONCEPO DE SUJEITO E DE LNGUA

    Agora vamos comear a compreender algumas questes fundamentais da lingstica textual. Va-mos comear, ento, pela concepo de sujeito e de lngua.

    Quando falamos em sujeito, o que vem mente em primeiro lugar? A que ns associamos tal pa-lavra? Lembrou? Bem, para ajudar, vou convocar um personagem muito simptico, criado por Maurcio de Souza. Acompanhem um trecho da historinha abaixo e vejam os signi cados do sujeito que foram mobilizados pela professora e por Chico Bento.

  • FTC EaD | LETRAS20

    Observe que a professora trata da questo do sujeito gramatical, ao passo que Chico Bento associa a palavra sujeito a pessoas. A historinha se desenvolve dessa forma at o final. Nesse momento, ao dar um exemplo na lousa Chove l fora , a professora trata do sujeito ine-xistente. Logo depois o sinal bate e ela libera os alunos. No entanto, Chico Bento apresenta a impossibilidade de sair da escola devido ao fato da presena do sujeito inexistente. Como isso ocorre? Ora, estava chovendo!

    E a, se divertiram com a historinha? Alm do humor, ela tambm nos traz a idia de sujeito gramatical, aquele que a gente aprende nas gramticas e que nos acompanha por v-rios anos letivos nos colgios. Sempre que se fala em sujeito, principalmente com estudantes, no raro vem a lembrana das subdivises entre os sujeitos da gramtica: simples, composto, oculto, entre outros. , mas no se esqueam, a partir de agora, que ns no iremos tratar desse tipo de sujeito.

    Quando tratarmos de sujeito em Lingstica Textual, vamos nos remeter a um outro tipo, que no o gramatical, apresentado pela professora na historinha acima, certo?!

    Vamos tratar de um sujeito chamado de psicossocial. Mas, para isso, antes vamos compreender como ele passou a existir. Ento, preciso observar as concepes clssicas do sujeito e atentar para as mudanas que ocorreram at se chegar referida concepo de sujeito.

    As concepes clssicas do sujeito

    Segundo Ingedore, a concepo de sujeito vai variar de acordo com a concepo de lngua que se adote. Dessa forma, ao tratar a lngua como expresso de pensamento, teremos a con gurao de um sujeito individual, consciente.

    Uma caracterstica fundamental desse sujeito que ele se apresenta como o dono do seu dizer. Para ele, tudo o que diz fruto exclusivo dele mesmo. Entende-se o sujeito consciente como um sujeito admico

    J sacaram que admico vem de Ado, que, de acordo com a Bblia, foi o primeiro homem a existir no paraso, no ? De maneira similar, o discurso desse sujeito tido como nico, produto nico e exclusivo dele.

    O receptor, de acordo com essa concepo, apresenta uma postura passiva, vez que a ele passada a mensagem da mesma for-ma como se processou na mente do falante, cabendo apenas com-

    preender a referida mensagem dessa maneira. A lngua, a partir da, vista como um produto mental do falante. Por isso que se diz que essa uma viso mentalista do sujeito.

    Depois do sujeito consciente, dono do seu dizer, surge a idia de sujeito assujeitado. Nessa perspectiva, a lngua passa a ser tida como es-trutura. Bem, diferente do sujeito consciente, o assujeitado no produz o seu dizer. Na verdade, ele reproduz discursos da estrutura social.

    Apesar disso, o sujeito assujeitado muitas vezes acha que dono de seu dizer, isto , no percebe que est sendo assujeitado, mas o que faz apenas reproduzir discursos sociais. Ele, portanto, apresenta-se como um ser que no tem conscincia de seu assujeitamento ideolgico.

  • Lingstica Textual 21

    Para compreendermos melhor esse item, vamos ver o que Marilena Chau nos apresenta sobre a ideologia:

    A alienao social se exprime numa teoria do conhecimento espontnea, formando o senso comum da sociedade. Por seu intermdio, so imaginadas explicaes e justi cativas para a realida-de tal como diretamente percebida e vivida. (...)

    Esse senso comum social, na verdade, o resultado de uma elaborao intelectual sobre a rea-lidade, feita pelos pensadores ou intelectuais da sociedade (...), que descrevem e explicam o mundo a partir do ponto de vista da classe a que pertencem e que a classe dominante de sua sociedade. Essa elaborao intelectual incorporada pelo senso comum social a ideologia. Por meio dela, o ponto de vista, as opinies e as idias de uma das classes sociais a dominante e dirigente tornam-se o ponto de vista e a opinio de todas as classes e de toda a sociedade (Chau, 1997, p. 174).

    Segundo Chau, a principal funo da ideologia ocultar a diviso social, dissimular essa diviso. Nesse plano, a ideologia busca fazer com que cada qual aceite a posio social em que est. Todos ns j ouvimos por a que SOMOS TODOS IGUAIS, que TEMOS OS MESMOS DIREITOS. Bem, quanto a essa idia de igualdade, vamos ler um texto de Manuel Bandeira e atentar para seu contedo:

    O bicho

    Vi ontem um bichoNa imundcie do ptioCatando comida entre os detritos

    Quando achava alguma coisaNo examinava nem cheirava:Engolia com voracidade

    O bicho no era um co,No era um gato,No era um rato.

    O bicho, meu Deus, era um homem.

    Ns claramente percebemos que aquilo que prega a ideologia no con-diz com a realidade, no ?! A nal de contas, o que mais percebe-mos no dia-a-dia so as diferenas sociais, econmicas, culturais existentes em nossa sociedade.

    Voc percebeu que o assujeitamento est ligado ideologia? Jia! Agora vamos conhecer os estudos de Louis Althusser. No

    se deve, nesse contexto, falar de ideologia sem mencionar os trabalhos realizados por ele acerca dos ARE e dos AIE. Voc no sabe o que signi cam? Ento acompanhe a de nio:

    ARE Aparelhos Repressores de EstadoAIE Aparelhos Ideolgicos de EstadoOs ARE teriam por funo reprimir a sociedade, primeiramente pela violncia e secundariamente

  • FTC EaD | LETRAS22

    pela ideologia. Exemplos de ARE so a polcia, o exrcito...

    Os AIE, ao contrrio dos ARE, agiriam primeiro pela ideologia, depois pela violncia. Como exemplo podemos citar a escola, a famlia, a igreja.

    Assim, podemos dizer que os AIE representam o lugar das lutas de classes.

    Chegamos, ento, terceira con-cepo de sujeito: o psicossocial. Vimos

    que o primeiro, o consciente, apresenta-se como dono do seu dizer. J o segundo, ao contrrio, apenas repete discursos sociais. Portanto, o pri-meiro produz seus discursos e o segundo reproduz discursos da estrutura social. possvel perceber que os dois primeiros situam-se em extre-mos: ou consciente ou assujeitado.

    O sujeito psicossocial vai galgar um equilbrio em relao aos pri-meiros. Ele tem noo de que possui a propriedade de elaborar seu discurso, escolher suas palavras, mas tambm tem conscincia de que est inserido em uma sociedade. Portanto, podemos dizer que o psicossocial (re)produz discursos.

    Uma importante caracterstica desse sujeito que ele s se con gura como sujeito na inte-rao com o outro. Nos dois primeiros, o papel do ouvinte passivo, vez que ele recebe as mensagens como foram passadas e/ou as decodi ca. Nessa terceira concepo, ele vai ter um papel fundamental: o de interagir e se constituir como sujeito nessa interao.

    O sentido vai ser produzido nesse processo e sero levados em considerao fatores cognitivos e extralingsticos, dos quais tra-taremos mais frente.

    A lngua, nesse sentido, passa a ser o lugar de interao, de pro-duo de sentidos. O texto aqui no mais tido como um produto acabado, e sim como parte desse processo interativo.

    Agora, vamos sintetizar esses tipos e sujeito em um quadro resumitivo!

    O SUJEITO PSICOLGICO, INDIVIDUAL Caracteriza-se por ser o dono do seu dizer. Dessa forma, utiliza a linguagem a partir do predomnio de sua conscincia individual. O texto, por sua vez, tido como um produto da mente do autor, atribuindo, assim, um posiciona-mento passivo ao leitor/ouvinte, vez que seu papel o de captar essa representao mental. Nesse sentido, a lngua se torna um mero instrumento a servio dos indivduos, que ter a funo de atingir o ouvinte o qual, por sua vez, dever compreender o sentido como foi emitido. Ela adquire a propriedade de ser instrumento a servio da expresso de pensamento. A a lngua aparece como se no tivesse histria, pois, diante dessa concepo, a histria o sujeito que a faz. O sujeito, por-tanto, dono de suas palavras e de suas vontades.

    O SUJEITO ASSUJEITADO aquele que no dono do seu dizer, do seu discurso. A concepo de lngua referente a esse sujeito como cdigo, estrutura, correspondendo a um sujeito assujeitado pelo sistema. A produo de sua conscincia, quando o caso, se d de fora, possibili-tando que o sujeito no tenha conscincia do que diz, nem do que faz. Nesse caso, quem fala um discurso anterior. O sujeito assujeitado ideologicamente pela instituio, mesmo sem ter noo. Acha que dono do seu dizer, mas se encontra condicionado a reproduzir um discurso anterior.

  • Lingstica Textual 23

    Diferente do sujeito psicolgico, consciente, quem fala, nesse caso, o inconsciente. Como ele assujeitado pelo sistema, o texto apresenta-se como o resultado de uma codi cao. Ao leitor/ou-vinte basta ter o conhecimento do cdigo para compreend-lo. A posio do locutor/ouvinte, do decodi cador aqui permanece passiva, j que o sentido torna-se explcito ao ser decodi cado.

    O SUJEITO COMO ENTIDADE PSICOSSOCIAL A se tem a idia de lngua como lugar de interao social, visto que h um carter ativo do sujeito, tornando-o capaz de interagir socialmente com o outro, ao mesmo tempo que (re)produz discursos presentes na sociedade. Portanto, o sujeito se constitui na interao com o outro. Essa teoria tambm ps em xeque a concepo de um sujeito admico, fonte nica do seu dizer. Por isso, o discurso constitudo com e pelos sujeitos, num movimento de identidade e alteridade. No texto encontra-se o local de intera-o entre interlocutores que constituem juntamente o seu sentido. A compreenso revela-se como uma atividade interativa. O sentido, ento, constitudo histrica e socialmente na interao entre os sujeitos. Diante dessa concepo de sujeito como entidade psicossocial, estabelece-se um equilbrio em relao s duas primeiras concepes, agregando o sistema produo social.

    A IDIA DE TEXTO

    A nal, o que texto? Como ele se caracteriza? Bem, antes de responder essas perguntas, vamos rever algumas questes tratadas anteriormente neste mdulo.

    Voc se lembra de que o desenvolvimento da Lingstica Textual compreende trs fases e que a concepo de texto por vezes variou? Pois bem, nas duas primeiras fases, a transfrstica e a da elaborao de gramticas textuais, presenti caram-se as concepes de texto e de no-texto. Nessa perspectiva, o texto era visto como seqncia lingstica coerente em si e o no-texto como seqncia lingstica incoerente em si.

    J d para perceber que, nesse primeiro momento, o texto era visto como um produto acabado, enfatizando, assim, a materialidade lingstica, o aspecto formal do texto.

    Depois disso, passou-se a pensar o texto no mais como um produto acabado, mas como um pro-cesso de produo e recepo comunicativa. Dessa forma, o estudo sobre o texto passou a analis-lo a partir de sua elaborao, de sua verbalizao, de seu planejamento.

    Portanto, tendo o texto como uma atividade verbal, chega-se elaborao de uma teoria do texto.

    As aes que desenvolvem a atividade verbal, segundo Leontev, tm uma motivao social. Dessa forma, a atividade verbal teria uma motivao, uma nalidade e se daria sua realizao. O que ca eviden-te diante dessa questo que a forma de se estudar e de encarar o texto como processo social e interacio-nal mobiliza uma estrutura mais complexa.

    Assim, Ingedore salienta que a teoria da atividade verbal a adaptao ao fenmeno linguagem de uma teoria da atividade de carter los co, articulada com uma teoria da atividade social (humana), que se especi ca em uma teoria da atividade (comunicativa) verbal.

    A citao acima evidencia que, para a elaborao da teoria da atividade verbal, houve um encontro de duas outras teorias: a de carter los co e a da atividade humana. Nesse sentido, parte-se da motiva-o de se pensar a linguagem em sua funo social, como prtica social, como meio de interao.

    A partir da teoria da atividade verbal, voc pde perceber que o texto passou a ser tratado no como um produto acabado, e sim em seu processo de constituio. Dessa forma, o carter apenas formal

  • FTC EaD | LETRAS24

    sai de cena e entram, tambm, questes extralingsticas, sociais, cognitivas.

    Para visualizar melhor a teoria da atividade verbal, acompanhe o esquema abaixo e perceba as relaes estabelecidas entre outras teorias, bem como a articulao delas com a linguagem. Depois, observe como se poderia compreender os anseios da teoria da atividade verbal a partir de alguns questionamentos.

    TEORIA DA ATIVIDADE VERBAL

    Diante disso, possvel levantar algumas questes fundamentais para o estudo propriamente lingstico:

    COMO SE CONSEGUEM REALIZAR DETERMINADAS ACES OU INTERAGIR SO-CIALMENTE ATRAVS DA LINGUAGEM?

    COMO A LINGUAGEM SE ORGANIZA PARA A REALIZAO DE FINS SOCIAIS?

    Para a realizao do ato verbal, segundo Ingedore, antes o sujeito idealiza um plano geral do texto a partir dos seguintes fatores:

    MOTIVAO H, ENTRE OUTROS, UM MOTIVO CENTRAL.

    SITUAO LEVA EM CONSIDERAO INFLUNCIAS INTERNAS, DETERMI-NANTES DAS ESCOLHAS A SEREM REALIZADAS, BEM COMO O AMBIENTE EXTERNO (A SITUAO PROPRIAMENTE DITA).

    PROVA DE PROBABILIDADES EFETIVA UMA TRIAGEM DAS AES POSSVEIS PARA DETERMINAR QUAIS SO AS MAIS EFICAZES PARA ATINGIREM OS OBJETIVOS PRETENDIDOS.

    TAREFA-AO A ESCOLHA EFETIVA, BASEADA NAS PROBABILIDADES, DA AO PARA A ARTICULAO DA ATIVIDADE.

    ...........................................................................................................................

    Ingedore salienta os seguintes aspectos super ciais apresentados por Leontev, que determinam a realizao verbal da inteno verbal:

    A LNGUA PARTICULAR;

  • Lingstica Textual 25

    O GRAU DE DOMNIO DA LNGUA;

    O FATOR FUNCIONAL-ESTILSTICO;

    O FATOR AFETIVO, EXPRESSIVO;

    AS DIFERENAS INDIVIDUAIS EM EXPERINCIA VERBAL ENTRE FALANTE E OUVINTE;

    O CONTEXTO VERBAL, NO SENTIDO DE CONTEXTO LINGSTICO;

    A SITUAO COMUNICATIVA.

    Observe que, nesse ponto de vista apresentado, h vrias situaes in uenciando na realizao verbal. O texto no simplesmente o produto pronto, acabado. Podemos, a partir da, ter o texto como uma produo verbal que se constitui na atividade comunicativa a partir da interao social. Nas palavras de Ingedore, a Lingstica Textual trata o texto como um ato de comunicao uni cado num complexo universo de aes humanas.

    Bem, como o texto no mais visto como um produto acabado, nalizado, pronto, j possvel perceber que o sentido de um texto no est nele, mas se constri a partir dele. certo que as marcas lingsticas auxiliam na produo de sentido, porm, importante tambm voltar nossas atenes para o contexto em que se deu a produo lingstica.

    Vocs puderam perceber o que foi dito anteriormente a respeito do sentido do texto (construdo a partir dele), bem como sobre a questo da in uncia do contexto na anlise textual, certo?! Do sentido textual ns trataremos no prximo bloco, ao abordarmos a coeso e, principalmente, a coerncia. Mas o contexto ns iremos abordar agora, ok?! Ento vamos l, pessoal!

    O CONTEXTO NA LINGSTICA TEXTUAL

    Ao tratar de texto, vimos que, tendo-o como um processo interativo de construo de sentido, necessrio, para sua compreenso, mobilizar conhecimentos lingsticos e extralingsticos. Assim, torna-se importante levar em considerao o contexto.

    Bem, como os conceitos, principalmente no mbito da cincia, so propensos a mudana, nesse sentido, no complicado admitir que o conceito de contexto varia de acordo com o autor que o utilize, bem como do momento em que utilizado.

    Vrios autores j se ocuparam em elaborar teorias acerca do contexto. Hymes (1964) foi um deles. Ele desenvolveu um esquema (SPEAKING) no qual procurou caracterizar o contexto. Ingedore nos apresenta esse esquema, apontando a caracterstica referente a cada uma das letras da palavra apresentada entre parnteses. Podemos, portanto, visualizar, a partir de Ingedore, o esquema de Hymes da seguinte forma:

    S SITUAO

    P PARTICIPANTES

    E FINS, PROPSITOS

  • FTC EaD | LETRAS26

    A SEQNCIA DE ATOS

    K CDIGO

    I INSTRUMENTAIS

    N NORMAS

    G GNEROS

    Alm de Hymes, outros autores, como Goodwin & Duranti, procuraram elaborar suas teorias acer-ca do contexto. Dessa forma, suas pesquisas contemplavam principalmente fenmenos como o ambiente

    em que se d o texto, o contexto social e cultural, os conhecimentos pr-vios, o co-texto.

    Voc se lembra?Ao tratarmos da fase transfrstica, voc pde perceber que o con-

    texto era tratado apenas como ambiente verbal. Assim, levava-se em considerao apenas sua natureza lingstica. Pois , esse entorno verbal intitulou-se CO-TEXTO. No se esquea disso, ok?!

    A pragmtica tambm marcou presena ao tratar, principalmente me-diante estudos acerca da teoria da atividade verbal e dos atos da fala, da questo

    do contexto. Nesse sentido, atestou a importncia de se descrever as aes em um momento de interlocuo.

    Assim, a linguagem se viu marcada pela INTERATIVIDADE, bem como por uma caracterstica de atividade SOCIAL. Bem, j que a linguagem apresenta-se como sendo utilizada em um ambiente social, constituindo-se na relao entre interlocutores, natural entendermos que a utilizamos com uma determinada nalidade. Ns nos munimos da linguagem com uma inteno. justamente por isso que a linguagem ganha uma outra caracterstica: a INTENCIONALIDADE.

    Porm, s as relaes entre interlocutores, bem como a descrio de suas aes pura e simples-mente, no se fazia su ciente. Ora, sabemos que em uma outra cultura vrias expresses, vrias atitudes podem apresentar conotaes diferentes, podem produzir efeitos de sentido variado. Pensando nisso, uma outra teoria passou a se destacar no cenrio da Lingstica Textual justamente por contemplar essas questes que foram apresentadas. Assim, o contexto sociocognitivo entra em cena.

    Observe as frases abaixo e procure responder de acordo com seus conhecimentos:

    Para voc, o que representa a cor branca?

    E a cor preta?J respondeu? Certo! Agora, observe a citao abaixo,

    retirada do dicionrio de smbolos, de Herder Lexikon:

    O branco muitas vezes utilizado nos ritos de nas-cimento, casamento, iniciao e morte; era a cor do luto, por exemplo, nos pases eslavos e na sia, e tambm na corte francesa.

    E agora? Ser que com a informao complemen-tar voc conseguiu apontar mais uma representao cor branca? Se no conseguiu, signi ca que j deveria conhecer essa informao, certo?

  • Lingstica Textual 27

    Quando ns conversamos ou lemos algum texto, entramos em um processo de construo de sen-tido. Ns nos propomos, nesse momento, a participar do jogo da linguagem e a interagir. Nesse proces-so, mobilizamos bem mais do que nosso conhecimento lingstico e nosso conhecimento a respeito do momento da interlocuo. Alm disso, fazemos valer nosso conhecimento prvio, nosso conhecimento do mundo, mobilizamos conhecimento acerca da sociedade, acerca da histria.

    No entanto, para que possa haver interao e os sentidos possam brotar durante esse jogo, ne-cessrio que todo esse conhecimento de mundo seja semelhante. Ora, como temos vidas diferentes (muitas vezes podem ser at parecidas, mas no so iguais), os conhecimentos de mundo devem ser semelhantes.

    Diante do exposto anteriormente, imagine uma conversa entre um brasileiro e um alemo, ambos sem saber a lngua do outro. A comunicao, nesse caso, ca complicada, no ? Agora, mesmo com interlocutores que conheam a lngua do outro, mas que desconheam os aspectos culturais um do ou-tro, a comunicao tambm no se daria de forma satisfatria, principalmente se utilizarem, entre outras expresses, grias e regionalismos. Pois exatamente nesse conhecimento de mundo similar que se baseia o contexto sociocognitivo. As estruturas cognitivas so importantes para esse contexto.

    Muitos autores, ao falar em contexto e, conseqentemente, busca de sentido, apresentam a met-fora do iceberg.

    A exemplo do iceberg, a ponta que est exposta representaria a materialidade lingstica, parte evidente do texto. O resto do ice-berg, todo o gelo submerso, representa uma parte importante do texto. Mas, para se chegar at l, necessrio mergulhar, ir em busca dos sentidos encobertos. Para tanto, no basta somente conhecer a estrutura lingstica. preciso mobilizar tambm os conhecimentos prvios, os conhecimentos de mundo, as estruturas cognitivas. As-sim, se pode penetrar no texto e descobrir sua riqueza, seus segre-dos, seus sentidos.

    Agora podemos ver a linguagem no como trans-parente, a partir da qual possvel extrair toda a sua essncia, e sim como opaco. A forma que temos de ilumin-la e torn-la claro utilizando as estratgias apresentadas.

    J vimos, ento, do que trata o con-texto sociocognitivo e o que ele prope. No entanto, para compre-endermos melhor alguns elementos importantes para a Lingstica Textual, que tal conhecermos agora as estruturas cognitivas? Ok, ento vamos nessa, turma!

    COMPREENDENDO AS ESTRUTURAS COGNITIVAS

    Muitas vezes no temos conscincia da utilizao de estratgias cognitivas, porm esses mecanis-mos fazem parte do nosso relacionamento com a linguagem. Sem eles, seria complicado preencher certas lacunas deixadas. Ora, se j sabemos que o texto no transparente, e sim opaco, podemos concluir que o texto se apresenta INCOMPLETO. Se fosse completo, teramos que ser, ao mximo, minuciosos,

  • FTC EaD | LETRAS28

    colocar todas as informaes para que a mensagem pudesse ser compreendida. Imagine o trabalho que daria, hein?!

    Porm, graas s estruturas cognitivas, torna-se possvel preencher as lacunas textuais. Assim, no necessrio tentar preench-las atravs das palavras, da materialidade lingstica, no sentido de apresen-tar exaustivamente explicaes ou fazer a todo momento consideraes a respeito do que se diz. Ns prprios j nos incumbimos disso no momento em que mobilizamos nosso conhecimento prvio, seja a respeito da cultura, da sociedade, dos interlocutrores e/ou da prpria lngua. Bem, melhor observarmos a utilizao dessas estratgias para compreendermos com propriedade essa questo. Para isso, a partir de agora sero apresentados alguns tipos de estratgias cognitivas. Ento, acompanhe a apresentao de tais elementos e preste bastante ateno, ok?!

    FRAMES So estruturas cognitivas globais armazenadas na memria. Essas estruturas so ati-vadas diante de um conceito primrio, mobilizando elementos que individualmente constituem tambm conceitos, mas em conjunto representam um frame. Observe, por exemplo, que, ao pensar a palavra NATAL, outros elementos so mobilizados:

    NATAL

    RVORE PAPAI-NOEL

    BRINQUEDOS

    Perceba que no h uma ordem ou seqncia na disposio desses elementos. Assim, a palavra BRINQUEDOS poderia ter surgido primeiro, ou RVORE por ltimo, no esquema acima. Se pensarmos nas palavras que surgiram a partir da palavra NATAL, individualmente so conceitos, mas, em conjunto, como aparece-ram, representam um frame.

    Os frames tambm se adequam s circunstncias. Ora, a mes-ma palavra apresentada, dita por um professor, poderia desencadear um frame diferente. Quer ver?

    NATAL

    NOTAS FINAIS

    FINALIZAO DO ANO LETIVO

    RECUPERAO

  • Lingstica Textual 29

    T vendo?! Agora vamos conhecer mais uma estrutura cognitiva.

    ESQUEMAS Assim como o frame, o esquema tambm uma estrutura cognitiva global; no entanto, diferentemente daquele, este segue uma ordem ou seqncia e leva em considerao as relaes temporais e causais.

    Para melhor compreender essa estrutura cognitiva, observe o exemplo abaixo apresentado por Fvero acerca de uma comunicao feita por um marido sua esposa:

    H um acidente grave na esquina, pois uma ambulncia e um carro da polcia esto parados l.

    Bem, diante do referido exemplo, o conhecimento prvio mobilizado a partir de esquemas, que fazem com que possamos compreender a mensagem. Nesse sentido, sabemos que num acidente gra-ve h ambulncias para assistir as vtimas, bem como policiais para fazer a ocorrncia e registrar o(s) responsvel(eis) pelo acidente.

    Todas essas informaes se encontram em nossa mente e preenchem as lacunas deixadas. Isso se d porque, ao falar sobre a ocorrncia de um acidente, ns conseguimos visualizar este evento e, a partir de esquemas, compreend-lo. Assim, no precisamos perguntar Pra que a ambulncia? ou Pra que policiais no local?.

    PLANOS Estruturas cognitivas que mantm uma ordem; porm, diferente dos esquemas, o leitor/ouvinte percebe a inteno do locutor/falante. O plano, assim como o prprio nome designa, efetuado por um planejador. Isso pode ocorrer em vrios momentos de nossa vida. Veja como exemplo um namorado que traceja um plano para pedir a sua amada em casamento. Que romntico, no?! Ou um lho que planeja pedir ao pai um aumento na mesada. Nesses exemplos, foram utilizados planos para se alcanar um objetivo. Com isso, percebe-se o plano utilizado para se chegar ao objetivo.

    SCRIPTS Os scripts se diferenciam dos frames principalmente pela sua dinamicidade. Voc se lembra de que o frame um conjunto de elementos que se voltam a um conceito primrio? Pois bem, o script vai incorporar uma sucesso de aes que envolvem uma determinada situao. Repare no texto abaixo e na situao descrita.

    E o tempo deu-lhe de presente as mos trmulas. J no enxerga mais como antes. As amiza-des da infncia se foram e agora no se separa da velha lupa, companheira el, amiga querida que lhe traz de volta parte da noo da beleza da vida, e de suas agruras. Andar j no pode mais. Aco-metida por um problema de coluna, no consegue mais car de p. Alm do mais, os ossos frgeis poderiam se esfacelar apenas com uma tentativa. O certo que, at para os longevos, a ddiva do tempo torna-se implacvel e, com o seu passar, se transforma num pesar por sua cruel lentido e in ndvel eternidade.

    Andr Luiz.G.Madureira

    Nesse texto, as aes remetem a uma fase espec ca da vida: a velhice. Os scripts evidenciam, no texto, essa sucesso de aes: J no enxerga mais como antes, andar j no pode mais, Acometida por um problema de coluna. Conhecemos esse script vez que temos conscincia dessa seqncia estere-otipada das aes que remetem velhice.

    Vocs puderam ter contato, nesse momento, com algumas estruturas cognitivas. No se esqueam de que as estruturas no se encerram aqui. H muito mais que essas. Quem quiser se dedicar ao estudo da Lingstica Textual, poder consultar a bibliogra a apresentada no nal do mdulo e conhecer mais dessas estruturas cognitivas. Agora hora de testarmos os nossos conhecimentos. Vamos ver o que con-seguimos compreender do assunto apresentado?

  • FTC EaD | LETRAS30

    Levando em considerao o contexto (a posio dos interlocutores, o conhecimento de mundo, as marcas lingsticas etc), analise a tirinha abaixo e seu(s) efeito(s) de sentido.

    Com base no que voc depreendeu dos assuntos estudados, apresente as concepes clssicas do sujeito, fundamentando-as.

    Agora, indique a concepo de sujeito com a qual a Lingstica Textual se identi ca, salientando alguns pontos de imbricamento entre a Lingstica Textual e o referido sujeito que expliquem tal identi cao.

    Tendo como base o assunto apresentado anteriormente, faa algumas consideraes a respeito da importncia das estruturas cognitivas para a Lingstica Textual.

    Apresente sua viso a respeito de como se pode de nir um texto.

    1.

    2.

    3.

    4.

    5.

    Atividade Complementar

  • Lingstica Textual 31

    PRINCPIOS E PROCEDIMENTOS DA LINGSTICA TEXTUAL

    ALGUNS ELEMENTOS BSICOS DA LINGSTICA TEXTUAL

    Como uma metfora da condio humana, Leonardo Boff utiliza a guia e a galinha como guras representativas da vida do ser humano. A galinha representa o ser arrai-gado, limitado; a guia apresentada como a transcendncia, o ilimitado. Com isso, Boff sugere a unio entre esses dois elementos como meio ideal para a condio humana. A respeito desses smbolos, o referido autor salienta:

    Recusamo-nos a ser somente galinhas. Queremos ser tambm guias que ganham altura e que projetam vises para alm do galinheiro.

    Acolhemos prazerosamente nossas razes (galinha), mas no custa da copa (guia) que mediante suas fo-lhas entra em contato com o sol, a chuva, o ar e o inteiro universo. Queremos resgatar nosso ser de guias. As guias no desprezam a terra, pois nela encontram seu alimento. Mas no so feitas para andar na terra, seno para voar nos cus, medindo-se com os picos das montanhas e com os ventos mais fortes.

    Tomado pelo esprito de guia, proponho sairmos do cho para utilizar nossa capacidade ilimitada de conhecer, de descobrir novos horizontes. Agora o momento de mais uma vez levantarmos vo e descobrirmos os elementos bsicos da Lingstica Textual. Ento, no percamos tempo. Vamos bater asas e decolar!

    A COERNCIA TEXTUAL

    Leia o texto abaixo:

    O amor por entre o verdeVinicius de Moraes

    No sem freqncia que, tarde, chegando janela, eu vejo um casalzinho de brotos que vem namorar sobre a pequenina ponte de balaustrada branca que h no parque. Ela uma menina de uns treze anos, o corpo elstico metido num blue jeans e um suter folgado, os cabelos puxados para trs num rabinho de cavalo que est sempre a balanar para todos os lados; ele, um garoto de, no mximo, dezesseis, esguio, com pastas de cabelo a lhe tombar sobre a testa e um ar de quem descobriu a frmula da vida. Uma coisa eu lhes asseguro: eles so lindos, e cam montados, um em frente ao outro, no corrimo da colunata, os joelhos a se tocarem, os rostos a se buscarem a todo momento para pequenos segredos, pequenos carinhos, pequenos beijos.

    So, na sua extrema juventude, a coisa mais antiga que h no parque, incluindo velhas rvores que por ali espapaam sua verde sombra; e as momices e brincadeiras que se fazem dariam para escrever todo um tratado sobre a arqueologia do amor, pois tm uma tal ancestralidade que nunca se h de saber a quantos milnios remontam.

  • FTC EaD | LETRAS32

    Eu os observo por um minuto apenas para no perturbar-lhes os jogos de mo e misteriosos brinquedos mmicos com que se entretm, pois suspeito de que sabem de tudo o que se passa sua volta. s vezes, para descansar da posio, encaixam-se os pescoos e repousam os rostos um sobre o ombro do outro, como dois cavalinhos carinhosos, e eu vejo ento os olhos da menina percorrerem vagarosamente as coisas em torno, numa aceitao dos homens, das coisas e da natureza, enquanto os do rapaz mantm-se xos, como a perscru-tar desgnios. Depois voltam posio inicial e se olham nos olhos, e ela afasta com a mo os cabelos de sobre a fronte do namorado, para v-lo melhor e sente-se que eles se amam e do suspiros de cortar o corao. De repente o menino parte para uma brutalidade qualquer, torce-lhe o pulso at ela dizer-lhe o que ele quer ouvir, e ela agarra-o pelos cabelos, e termina tudo, quando no h passantes, num longo e meticuloso beijo.

    -Que ser pergunto-me em vo dessas duas crianas que to cedo comeam a praticar os ritos do amor? Prosseguiro se amando, ou de sbito, na sua jovem incontinncia, procuraro o contato de outras bo-cas, de outras mos, de outros ombros? Quem sabe se amanh quando eu chegar janela, no verei um rapazi-nho moreno em lugar do louro ou uma menina com a cabeleira solta em lugar dessa com cabelos presos?

    -E se prosseguirem se amando pergunto-me novamente em vo ser que um dia se casaro e sero feli-zes? Quando, satisfeita a sua jovem sexualidade, se olharem nos olhos, ser que correro um para o outro e se da-ro um grande abrao de ternura? Ou ser que se desviaro o olhar, para pensar cada um consigo mesmo que ele no era exatamente aquilo que ela pensava e ela era menos bonita ou inteligente do que ele a tinha imaginado?

    um tal milagre encontrar, nesse in nito labirinto de desenganos amorosos, o ser verdadeiramente amado ... Esqueo o casalzinho no parque para deter-me por um momento na observao triste, mas fria, desse estranho baile de desencontros, em que freqentemente aquela que deveria ser daquele acaba por bailar com outro porque o esperado nunca chega; e este, no entanto, passou por ela sem que ela o soubesse, suas mos sem querer se tocaram, eles olharam-se nos olhos por um instante e no se reconheceram.

    E ento que esqueo de tudo e vou olhar nos olhos de minha bem-amada como se nunca a tivesse visto antes. ela, Deus do cu, ela! Como a encontrei, no sei. Como chegou at aqui, no vi. Mas ela, eu sei que ela porque h um rastro de luz quando ela passa; e quando ela me abre os braos eu me cru-ci co neles banhado em lgrimas de ternura; e sei que mataria friamente quem quer lhe causasse dano; e gostaria que morrssemos juntos e fssemos enterrados de mos dadas, e nossos olhos indecomponveis cassem para sempre abertos mirando muito alm das estrelas.

    E a, voc gostou do texto? Conseguiu entender o que ele expressa? Foi difcil?

    Bem, no decorrer do texto de Vinicius de Moraes, voc deve ter percebido a existncia de termos que remetem a outros (ele, ela, eles, este...) ou que relacionam partes do texto (mas, e, pois...). Esses ter-mos so chamados de elementos coesivos e podem auxiliar na compreenso do texto. J deu para perce-ber que a coeso encontra-se na materialidade lingstica, vez que os elementos coesivos so elementos textuais explcitos, ou seja, se estabelecem na linguagem, marcam-se no texto.

    Nos estudos realizados acerca dos mecanismos de coeso textual, podem-se destacar os de Halliday & Hassan, que dividiram os elementos coesivos em: referncia, substituio, elipse, conjuno e coeso lexical.

    REFERNCIAO mecanismo de referncia remete a um termo do texto (endofrico) ou externo a ele (exifrico).

    Referncia exofrica Quando remete a um elemento exterior ao texto, ou seja, fora dele.

    Na frase:

    Adorei a mensagem desse outdoor.

    a referncia (desse) exofrica, vez que remete a algo que est fora do texto (no caso, o outdoor)

  • Lingstica Textual 33

    Referncia endofrica A remisso feita a um termo que se encontra dentro do texto.

    Em:

    Bruna uma excelente aluna. Ela tirou dez mais uma vez.

    o termo ELA remete a um outro termo do texto (Bruna).

    Assim, a referncia endofrica pode ser:

    ANAFRICA: quando remete a um termo anterior. No caso da frase apre-sentada anteriormente, a referncia anafrica, j que o termo remetente (Bruna) encontra-se antes do termo remissivo (ela).

    CATAFRICA: quando o termo remetente se segue no texto. Dessa forma, na frase

    Gosto de todos os seus planos, menos este: o de parar com os estudos.

    o termo remissivo (este) vem antes do trecho remetente (o de parar com os estudos).

    Podemos sintetizar a referncia da seguinte forma:

    SUBSTITUIOA substituio parecida com a referncia, mas Halliday & Hassan a distinguem. Para eles, na subs-

    tituio, diferentemente da referncia, o elemento remissivo no o mesmo que o referente. Observe o seguinte enunciado:

    Jorge comprou um carro vermelho, mas Jos resolveu comprar um preto.

    Desse jeito, o referente sofreu uma rede nio. O carro pretendido por Joo tem uma caracterstica diferente do de Jos. A a cor vermelha repudiada.

    ELIPSE

    A elipse consiste na supresso de um termo que pode ser facilmente identi cado a partir do con-texto. Assim, substitui-se um lxico, uma orao, um enunciado por zero ( ).

    - Marta saiu cedo?

    - Saiu .

    No exemplo acima, no foi preciso, na resposta, dizer Marta saiu cedo. Apesar da supresso de MARTA e de CEDO, a mensagem pde ser facilmente compreendida. O prprio contexto da situao comunicativa foi capaz de propiciar a compreenso da resposta dada. Portanto, as lacunas deixadas no prejudicaram a mensagem.

    CONJUNOA conjuno (ou conexo) tem a propriedade de relacionar as partes de um texto (elementos ou

    oraes). Estas relaes tm uma especi cidade. Veja o exemplo abaixo:

    Mrcio correu bastante, mas no conseguiu pegar o nibus.

    Pode-se observar que a relao existente na frase apresentada de adversidade. Se MRCIO COR-REU BASTANTE, a expectativa que ele conseguisse PEGAR O NIBUS. Como essa expectativa

  • FTC EaD | LETRAS34

    frustrada pela segunda orao, NO CONSEGUIU PEGAR O NIBUS, estabelece-se uma relao espec ca de adversidade.

    COESO LEXICALA coeso lexical caracteriza-se a partir de dois mecanismos: a reiterao e a colocao.

    REITERAO Consiste na repetio do referente ou por meio de sinnimos, hiperni-mos, nomes genricos.

    Gosto muito de viajar de avio. O aparelho mesmo muito seguro e bastante e ciente.

    No trecho acima, APARELHO hipernimo de AVIO. Nesse caso, temos um exemplo de coe-so lexical por reiterao.

    Em

    Morri de medo quando vi o machado. Aquela coisa me fez passar mal.

    temos tambm um exemplo de coeso lexical por reiterao. Dessa vez, ocorre pela presena de um termo genrico (coisa). O mesmo tipo de coeso se v na frase

    O menininho saiu correndo. O garotinho realmente estava com pressa.

    S que, dessa vez, a coeso se d a partir de um sinnimo de menininho (garotinho).

    COLOCAO (OU CONTIGIDADE) Consiste na disposio de termos, no decorrer do texto, com mesmos traos semnticos.

    No trecho

    Houve um acidente na estrada. Logo depois chegaram as ambulncias para transportar os pacien-tes at um hospital prximo.

    pode-se perceber que ACIDENTE, AMBULNCIAS, PACIENTES e HOSPITAL so facilmen-te relacionados por ns, no ?! Assim, elas pertencem a um mesmo campo signi cativo.

    A coeso lexical pode ser visualizada a partir do seguinte esquema:

    A esses estudos de Halliday & Hassan, acerca dos mecanismos coesivos, vrios autores zeram suas ressalvas, teceram suas crticas. H pontos importantes em relao s divergncias existentes, como a no aceitao da diferena entre a referncia e a substituio. Alm disso, muitos autores no vem a coeso lexical como um mecanismo independente.

    Por conta dessas e de outras questes, Fvero prope o estabelecimento de trs formas de coeso textual: a referencial, a recorrencial e a seqencial.

    COESO REFERENCIALEsse tipo de coeso se d no momento em que um elemento faz referncia a

    outro. Dessa forma, pode-se perceber que o elemento remissivo deve ser interpre-tado no em seu sentido prprio, e sim no sentido do termo referido.

    Vamos ver melhor como se d esse processo?! Ok! Ento, preste ateno.

  • Lingstica Textual 35

    A coeso referencial pode se apresentar de duas formas: por SUBSTITUIO ou por REITERAO.

    SUBSTITUIO: Como o prprio nome nos adianta, esse tipo de coeso ocorre com a substi-tuio do termo referente por um outro termo. Dessa forma, o sentido do termo referente retomado por uma outra forma, a chamada pro-forma, a qual se caracteriza principalmente por apresentar baixa densidade de sentido. Repare como esse processo funciona:

    Comprei uma televiso. Ela enorme.

    Na frase acima, temos a retomada de TELEVISO pela pro-forma pronominal ELA. O termo remissivo passa a abarcar, nessa frase, o sentido contido em televiso. Como o pronome vem depois do referente, essa coeso tambm tida como anafrica.

    A substituio tambm pode se dar por (zero). o caso da elipse, que passa a se encaixar aqui:

    -Voc vai agora?

    - Vou .

    Houve, no exemplo acima, a substituio do pronome EU e do advrbio AGORA por .

    REITERAO: Na reiterao h, ao longo do texto, a repetio de expresses que tm a mesma referncia.

    CURIOSIDADE!

    A palavra REITERAR vem do latim reiterare, que signi ca REPETIR.

    Voc sabia?

    Essa repetio pode se dar das seguintes formas:

    Por repetio do mesmo item lexical: Ana chorou muito. Ana est triste.

    Por sinnimos: -A criana agitada caiu. Tambm o menino s vive correndo!.

    Por hipernimos: Gosto muito de frutas. Adoro principalmente as bananas.

    Por hipnimos: Os macacos so muito espertos. Os animais vivem se divertindo, pulando de galho em galho.

    Por expresses nominais de nidas: Admiro muito Castro Alves. O poeta dos escravos ainda vive em minha memria.

    Por nomes genricos: Vi no cu a coisa mais linda. Um cometa rasgou o espao.

    RECORRNCIA

    A recorrncia, ao contrrio do que muita gente imagina, no uma repetio. Quando repetimos algo, signi ca que fazemos uma retomada, de forma que a idia passada seja reproduzida com o mesmo sentido. Na recorrncia, o termo recorrente no aparece novamente da mesma forma, com o mesmo sentido. O discurso no mantm aquela idia inicial. Ele, ao contrrio, progride. A recorrncia faz com que o discurso possa uir, possa se desenvolver, caminhe, no que esttico, da mesma forma. Em Irene no Cu, de Manuel Bandeira, h uma recorrncia, e no simplesmente uma repetio:

    Irene pretaIrene boaIrene sempre de bom humorRepare que no trecho acima o discurso progride, a recorrncia faz com que o texto caminhe, se

  • FTC EaD | LETRAS36

    desenvolva. A recorrncia um recurso que no raro encontramos em poemas e msicas. Ela tambm pode destacar nos textos a propriedade rtmica, a entoao, entre outras.

    SEQENCIAO

    A coeso seqencial se parece bastante com a recorrencial, que ns vimos anteriormente. Porm, h uma diferena entre as duas: a seqenciao no retoma termos ou estruturas. Ela pode ser temporal ou pode se dar por conexo.

    TEMPORAL Quanto coeso temporal, Fvero salienta que embora todo texto coeso tenha uma seqenciao temporal (j que a coeso linear), uso o termo em sentido restrito: para indicar o tempo do mundo real.

    Assim, essa questo de temporalidade e, conseqentemente, de coeso temporal, pode ser obser-vada na seguinte frase:

    Ele levantou da cama, escovou os dentes, tomou caf e foi trabalhar.

    Observe que houve uma seqncia estabelecida em relao ao mundo real. A coeso seqencial temporal tambm pode ser marcada por partculas temporais:

    S irei viajar amanh.

    SEQENCIAO POR CONEXO Como o prprio nome j nos adianta, esse tipo de co-eso se d a partir da conexo de partes de um texto, de sentenas, de frases, principalmente mediante conectivos:

    Maria ou Fernanda jogar hoje.

    Se ela gostasse de mim, eu seria o homem mais feliz do mundo.

    Bem, vocs puderam acompanhar alguns tipos de coeso textual. preciso lembrar que a coeso no se esgota diante do que foi abordado nesse mdulo. H mais elementos coesivos, porm, como in-troduo, esses tipos apresentados j nos so su cientes para ter uma idia da relao coesiva em textos, um dos pontos principais da Lingstica Textual. Agora vamos passar para um outro item que tambm importantssimo para os estudos da referida disciplina: a coerncia textual.

    A COESO TEXTUAL

    Em algum momento de sua vida voc ou uma pessoa que voc conhece j deve ter se deparado com um texto e, aps fazer uma leitura, ter dito: No entendi esse texto. Para mim, no est coerente, ou O que o texto apresenta est totalmente incoerente. Pois . Muitas vezes no conseguimos compreender a mensagem de um determinado texto, caracterizando-o como um texto incoerente. Mas voc sabe por que isso acontece? Bem, a resposta para essa pergunta ser dada a partir de agora. Mas no se preocupe. Prome-to tentar ser muito coerente, t?!

    Primeiramente, podemos dizer que a coerncia o que d textualidade a uma determinada seqncia lingstica. mediante a coerncia que uma seq-ncia lingstica pode se tornar um texto.

    Agora, voc deve estar se perguntando:

  • Lingstica Textual 37

    Ou

    Lembra de que, quando estudamos as caractersticas de um texto, conclumos que ele deve ser visto no como um produto acabado, nalizado, mas como um processo interativo, dinmico? Alm disso, percebemos que o sentido textual produzido na interao entre texto e leitor/ouvinte. Pois a est! A coerncia situa-se justamente nesse processo, que envolve tanto o texto e o contexto quanto os interlocutores.

    Agora, vamos ver alguns fatores que contribuem para a constituio da textualidade, ou seja, para que a coerncia se con gure, proporcionando, assim, a compreenso textual.

    CONHECIMENTO DE MUNDOO que aconteceria se voc tivesse que ler um artigo de fsica quntica? ,

    acho que, assim como muitos, voc no entenderia muita coisa. A no ser que tenha um conhecimento sobre esse assunto. Pois justamente o conhecimento que ns temos sobre as mais variadas questes que o conhecimento de mundo, ou conhecimento enciclopdico.

    Esse conhecimento se encontra armazenado em nossa mente, mas no de qualquer forma. H uma estruturao cognitiva. Desta forma, podemos rever al-gumas estruturas cognitivas auxiliadoras nesse trabalho de organizao mental:

    FRAMES

    ESQUEMAS

    PLANOS

    SCRIPTS

    CONHECIMENTO PARTILHADOEm uma situao comunicativa, para que se compreenda uma determinada mensagem, importan-

    te que os interlocutores tenham um conhecimento parecido. Perceba que impossvel o fato de interlocu-tores terem o mesmo conhecimento, vez que as duas vidas, mesmo que tenham uma rotina parecida, so diferentes. Alm das experincias, das situaes pelas quais passam no poderem ser idnticas, a forma de absorver ou perceber tais situaes seria desenvolvida por vises particulares, individuais. Mas eles devem ter conhecimentos em comum. Vamos entender melhor essa questo. Fique de olho na seguinte frase:

    Detesto quando ele acende o cigarro. A fumaa me incomoda bastante.

    Para ns, no difcil perceber que a fumaa citada na frase acima produzida pelo cigarro. Con-seguimos compreender o exemplo citado porque temos esse conhecimento compartilhado. Por isso, no foi preciso explicar que a fumaa sai do cigarro.

    INFERNCIASAs inferncias se assemelham a dedues possveis de serem feitas a partir de nosso conhecimento

    de mundo. Veja a frase abaixo:

    Pedro adquiriu uma linda manso em um excelente bairro!

  • FTC EaD | LETRAS38

    Diante dessa frase, ns podemos fazer as seguintes inferncias:

    Pedro tem uma casa nova.

    A nova casa de Pedro uma manso.

    Pedro tem dinheiro para comprar uma manso.

    Pedro rico.

    Pedro um timo partido!

    claro que as inferncias dependem tambm do contexto. Se uma me tiver o propsito de arru-mar um marido rico para sua lha, a ltima inferncia estaria bem direcionada. Porm, nesse caso, todas as inferncias seriam vlidas.

    FATORES DE CONTEXTUALIZAOOs fatores de contextualizao tambm so bastante importantes para direcionar uma situao de

    comunicao. Esses fatores fazem com que a perspectiva na comunicao seja direcionada, no intuito de imprimir a coerncia, o entendimento. Eles podem ser:

    TTULO

    NOME DO AUTOR

    CARIMBO

    DATA

    ASSINATURA

    Entre outros

    SITUACIONALIDADE

    Imagine uma pessoa indo praia vestida com um palet e uma gravata, e outra em um casamento, vestida apenas com uma sunga.

    Essa cena vai se tornar estranha, no ? Isso ocorre porque essas pessoas no adequaram a roupa ao local. No contexto social, h regras bsicas de con-duta que devemos seguir. Assim tambm acontece com a lngua. Temos que adequ-la ao ambiente, situao comunicativa, situao esta que vai determinar as nos-

    sas escolhas em relao forma de dizer, forma de falar.

    No prudente, por exemplo, utilizar grias na linguagem durante uma entrevista de emprego, a no ser que o trabalho seja direcionado para uma situao comunicativa em que se precise utilizar grias ou algo parecido. Porm, no mais, no se faz conveniente o uso da respectiva linguagem em uma entre-vista de emprego. Assim, ca claro que a situao comunicativa, e tambm scio-cultural, determinante para a coerncia na produo textual.

    INFORMATIVIDADE

    De certa forma, a informatividade est ligada ao grau de previsibilidade. Diante disso, quanto mais

  • Lingstica Textual 39

    previsvel for o texto menor ser seu grau de informatividade. Para ilustrar essa questo, Beaugrande & Dressler apresentam os seguintes casos:

    1. O oceano gua.

    2. O oceano gua. Mas ele se compe, na verdade, de uma soluo de gases e sais.

    3. O oceano no gua. Na verdade, ele constitudo de gases e sais.

    No primeiro exemplo, o grau de informatividade muito pequeno. Isso porque todos ns sabemos que o oceano constitudo de gua.

    No segundo, o grau de informatividade aumenta, j que mais informaes, nesse caso em relao composio do oceano, so apresentadas.

    J no terceiro, h um grau altssimo de informatividade. Em um primeiro momento, a a rmao de que O oceano no gua pode chocar as pessoas e se tornar incoerente para elas. Porm, mais adiante, apresenta-se a explicao para tal a rmao: Na verdade, ele constitudo de gases e sais.

    A partir desses exemplos, foi possvel observar que um texto pode ter um grau mnimo de infor-matividade, por ser previsvel demais, ou at chegar a um grau mximo de informatividade, pela ausncia de previsibilidade.

    FOCALIZAO

    A focalizao est intimamente ligada ao conhecimento de mundo e ao conhecimento comparti-lhado. Na verdade, a focalizao a concentrao de uma parte desses conhecimentos em um determi-nado momento comunicativo.

    Imagine a anlise que um psiclogo faria de um casamento. Agora, imagine a anlise feita sobre o mesmo evento, mas dessa vez por um crtico de teatro. No difcil perceber que o FOCO das anlises no ser igual. Cada um observar o casamento de acordo com sua viso de mundo, buscando nele os aspectos que lhes interessam. Agora, observe as frases:

    Preciso de mais mangas.

    A focalizao poder, em casos como esse, evitar a incoerncia. Essa frase poderia ser dita em contextos, tais como:

    Uma costureira solicitando mangas para a confeco de camisas;

    Um feirante necessitando de colocar mangas em sua barraca para serem vendidas.

    Isso acontece pela propriedade da palavra (no caso acima, MANGA) ser POLISSMICA, ou seja, ter mais de um sentido.

    INTERTEXTUALIDADE

    Pode-se dizer que a intertextualidade a relao de um texto com outros textos. Vamos ver como o processo de intertextualidade se d, na prtica. Para isso, observe a fbula abaixo, atribuda a Esopo e traduzida por Neide Smolka:

    O lobo e o cordeiroUm lobo, ao ver um cordeiro bebendo de um rio, resolveu utilizar-se de um

    pretexto para devor-lo. Por isso, tendo-se colocado na parte de cima do rio, co-meou a acus-lo de sujar a gua e impedi-lo de beber. Como o cordeiro dissesse que bebia com as pontas dos beios e no podia, estando embaixo, sujar a gua que vinha de cima, o lobo, ao perceber que aquele pretexto tinha falhado, disse: Mas, no ano passado, tu insultaste meu pai. E como o outro dissesse que ento nem estava vivo, o lobo disse: Qualquer que seja a defesa que apresentes, eu no deixarei de comer-te.

  • FTC EaD | LETRAS40

    A fbula mostra que, ante a deciso dos que so maus, nem uma justa defesa tem fora.

    Agora, acompanhe a fbula de Millr Fernandes com o mesmo ttulo:

    O LOBO E O CORDEIROEstava o cordeirinho bebendo gua, quando viu re eti-

    da no rio a sombra do lobo. Estremeceu, ao mesmo tempo que ouvia a voz caver-nosa: Vais pagar com a vida o teu miservel crime. Que crime? perguntou o cordeirinho tentando ganhar tempo, pois j sabia que com lobo no adiantava ar-gumentar. O crime de sujar a gua que eu bebo. Mas como posso sujar a gua que bebes se sou lavado diariamente pelas mquinas automticas da fazenda? indagou o cordeirinho. Por mais limpo que esteja um cordeiro sempre sujo para um lobo retrucou dialeticamente o lobo. E vice-versa pensou o cordei-rinho, mas disse apenas: Como posso eu sujar a sua gua se estou abaixo da cor-rente? Pois se no foi voc foi seu pai, foi sua me ou qualquer outro ancestral e vou com-lo de qualquer maneira, pois como rezam os livros de lobologia, eu s me alimento de carne de cordeiro nalizou o lobo preparando-se para devorar o cordeirinho. Ein moment! Ein moment! gritou o cordeirinho traando l o seu alemo kantiano. Dou-lhe toda razo, mas fao-lhe uma proposta: se me deixar livre atrairei pra c todo o rebanho. Chega de conversa disse o lobo Vou com-lo logo, e est acabado. Espera a falou rme o cordeiro Isso no tico. Eu tenho, pelo menos, direito a trs perguntas. Est bem cedeu o lobo irritado com a lembrana do cdigo milenar de jungle. Qual o animal mais estpido do mundo? O homem casado respondeu prontamente o cordeiro. Muito bem, muito bem! disse o lobo, logo refreando, envergonhado, o sbito entusiasmo. Outra: a zebra um animal branco de listras pretas ou um animal preto de listras brancas? Um animal sem cor pintado de preto e branco para no passar por burro respondeu o cordeirinho. Perfeito! disse o lobo engolindo em seco. Agora, por ltimo, diga-me uma frase de Bernard Shaw. Vai haver eleio em 66 respondeu logo o cordeirinho mal podendo conter o riso. Muito bem, muito certo, voc escapou! deu-se o lobo por vencido. E j se ia preparan-do para devorar o cordeiro quando apareceu o caador e o esquartejou.

    MORAL: QUANDO O LOBO TEM FOME NO DEVE SE METER EM FILOSOFIAS.

    Agora, observe uma fbula, com o mesmo ttulo, mas com sua produo datada por volta do sculo VII a.C.

    O lobo e o cordeiro

    Um lobo, que j havia comido saciedade, viu um cordeiro cado no cho. Compreendeu que ele cara de medo, aproximou-se para tranqiliz-lo, e disse que apenas deveria lhe apresentar trs proposi-es verdadeiras para ir embora so e salvo. E o cordeiro disse, em primeiro lugar, que gostaria de no t-lo encontrado; segundo, que esperava que o lobo no zesse nada contra ele, porque era cego; e, por m, em terceiro lugar, que possam todos os abominveis lobos morrer da pior morte, pois nos fazem uma guerra sem quartel sem nada terem sofrido de nossa parte. E o lobo teve de reconhecer a verdade do que ele dissera, devolvendo-lhe a liberdade.

    Moral: A fbula mostra que, muitas vezes, a verdade tem seus efeitos at sobre os inimigos. ESO-PO, 2006, p.119 120)

    Perceba que a intertextualidade est vinculada ao conhecimento prvio. Ora, quem conhece a fbu-

  • Lingstica Textual 41

    la O lobo e o cordeiro, de Esopo, ir naturalmente relacion-la de Millr. Isso porque elas tm uma relao de intertextualidade, ou seja, um texto remete a um outro texto. Nesse caso, a fbula de Millr re-meter de Esopo. Porm, para reconhecer a intertextualidade, primordial que se tenha conhecimento da estrutura textual a que o outro texto remete.

    INTENCIONALIDADEJ vimos que, ao produzir um texto, h um objetivo, uma inteno a ser alcanada com isso. O pro-

    cesso da intencionalidade diz respeito justamente a essa inteno. As estratgias de produo textual vo girar em torno de uma determinada inteno. Ora, quem nunca imitou ou viu algum imitar um discurso sem nexo, aparentemente incoerente, para se fazer de bbado ou para tentar sugerir que no estivesse em seu juzo total?

    Pois . At em lmes podemos ver esse tipo de cena, principalmente quando tratam de estratgias jurdicas para inocentar um acusado.

    ACEITABILIDADE

    Quando ac