02 - Fontes Do Direito Penal

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FONTES DO DIREITO PENAL (Rogério Greco, Julio Fabbrini Mirabete, Damásio de Jesus) 1) CONCEITO E ESPÉCIES Fonte quer dizer lugar de procedência, de onde se origina alguma coisa. O Direito Penal, como não poderia deixar de ser, tem suas fontes. Quando falamos em fontes do Direito Penal, estamos estabelecendo de onde se originam as normas jurídicas penais. Podemos dividir as fontes do Direito Penal em fontes de produção (ou materiais) e fontes de conhecimento (ou formais). Além disso, as fontes de conhecimento podem ser subdivididas em imediata (ou direta) e mediatas (ou indiretas). As fontes de produção nos informam por quem é produzido o Direito Penal, ou seja, o órgão responsável pela elaboração do Direito Penal. Já as fontes de conhecimento são os meios pelo quais o Direito Penal é exteriorizado, ou seja, se faz conhecer. O Estado é a única fonte de produção do Direito Penal, por força do inciso I do artigo 22 da Constituição da República. Afinal, cabe tão-somente à União, como única fonte de produção, criar normas jurídicas penais, proibindo ou impondo determinadas condutas, sob a ameaça de sanção. A Constituição prevê a possibilidade de lei complementar autorizar os estados-membros a legislar sobre matérias específicas relacionadas no artigo 22 da Carta Política. Dentre tais matérias encontra-se o Direito Penal. Assim, ao menos em tese, existe a possibilidade de um estado-membro, como é o caso do Rio de Janeiro, produzir Direito Penal, tornando-se fonte de produção. Para que o Estado possa exteriorizar sua vontade, necessita se valer de algum instrumento. Tal instrumento é a lei. A lei seria, portanto, a única fonte de cognição ou de conhecimento do Direito Penal, eis que somente ela

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Fontes do Direito Penal Brasileiro

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FONTES DO DIREITO PENAL(Rogério Greco, Julio Fabbrini Mirabete, Damásio de Jesus)

1) CONCEITO E ESPÉCIES

Fonte quer dizer lugar de procedência, de onde se origina alguma coisa. O Direito Penal, como não poderia deixar de ser, tem suas fontes. Quando falamos em fontes do Direito Penal, estamos estabelecendo de onde se originam as normas jurídicas penais.

Podemos dividir as fontes do Direito Penal em fontes de produção (ou materiais) e fontes de conhecimento (ou formais). Além disso, as fontes de conhecimento podem ser subdivididas em imediata (ou direta) e mediatas (ou indiretas).

As fontes de produção nos informam por quem é produzido o Direito Penal, ou seja, o órgão responsável pela elaboração do Direito Penal. Já as fontes de conhecimento são os meios pelo quais o Direito Penal é exteriorizado, ou seja, se faz conhecer.

O Estado é a única fonte de produção do Direito Penal, por força do inciso I do artigo 22 da Constituição da República. Afinal, cabe tão-somente à União, como única fonte de produção, criar normas jurídicas penais, proibindo ou impondo determinadas condutas, sob a ameaça de sanção. A Constituição prevê a possibilidade de lei complementar autorizar os estados-membros a legislar sobre matérias específicas relacionadas no artigo 22 da Carta Política. Dentre tais matérias encontra-se o Direito Penal. Assim, ao menos em tese, existe a possibilidade de um estado-membro, como é o caso do Rio de Janeiro, produzir Direito Penal, tornando-se fonte de produção.

Para que o Estado possa exteriorizar sua vontade, necessita se valer de algum instrumento. Tal instrumento é a lei. A lei seria, portanto, a única fonte de cognição ou de conhecimento do Direito Penal, eis que somente ela exterioriza a proibição ou a imposição de determinadas condutas, sob a ameaça de pena (art. 5.º, XXXIX da CRFB/88).

A doutrina, entretanto, subdivide as fontes de cognição ou de conhecimento em imediata e mediatas. A fonte de conhecimento imediata seria a lei. Já os costumes e os princípios gerais do Direito são fontes de conhecimento mediatas.

1.1) O COSTUME

O costume é uma regra de conduta respeitada de modo geral, constante e uniforme, com a consciência de sua obrigatoriedade. Portanto, estaremos diante de um costume quando observarmos uma norma de comportamento a que as pessoas obedecem de maneira uniforme e constante por terem convicção de sua obrigatoriedade. O nascimento do costume exige o reconhecimento geral da regra de conduta respeitada (elemento objetivo do costume) e a vontade geral de que tal regra atue como Direito vigente (elemento subjetivo do costume).

Discute-se, comumente, se os costumes têm o poder de revogar as leis, ou melhor dizendo, se a prática reiterada de determinadas condutas teria o condão de afastar a aplicação de lei penal. O jogo do bicho é o exemplo clássico daqueles que defendem a tese dessa possibilidade. Em que pesem algumas posições contrárias, o pensamento que prevalece, tanto na doutrina quanto em nossos tribunais, é no sentido da impossibilidade de

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se atribuir essa força aos costumes. Isso porque, segundo Rogério Greco, o artigo 2.º da Lei de Introdução ao Código Civil, de forma clara e precisa, preconiza: “Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a modifique ou revogue.” Este também é o fundamento legal invocado por Damásio de Jesus para defender a impossibilidade do costume revogar norma penal. Julio Fabbrini Mirabete destaca que o princípio da legalidade impede que se criem infrações penais por meio dos costumes ou revoguem-se normas jurídicas que consagram infrações penais por intermédio dos costumes. Além disso, sobre o jogo do bicho, afirma que não há a vontade geral de que tal regra de conduta atue como Direito vigente, mas sim mera tolerância ou omissão de algumas autoridades.

Todavia, não se pode negar a influência dos costumes na elaboração e na interpretação das leis penais. Ex.: Somente por meio dos costumes poderemos descobrir o exato significado do termo ato obsceno, consagrado no artigo 233 do Código Penal. Afinal, segundo os costumes brasileiros, o marido não pratica ato obsceno ao beijar sua própria esposa em público. Já segundo os costumes indianos, tal prática configuraria ato obsceno. Ademais, a evolução dos costumes conduziu o ordenamento jurídico a revogar normas jurídicas que consagravam o adultério (art. 240 do CP) e a sedução (art. 217 do CP) como infrações penais. Embora não possam revogar a lei penal, os costumes fazem com que os elaboradores da lei repensem sobre a necessidade ou não da permanência, em nosso ordenamento jurídico, de determinada infração penal.

Damásio de Jesus sustenta a possibilidade dos costumes ampliarem o alcance de dispositivos penais que consagram causas excludentes da ilicitude ou da culpabilidade, isto é, causas que transformam uma conduta que, a princípio, configuraria uma infração penal em conduta que não viola o Direito Penal. Isso porque o princípio da legalidade determina que não haverá infração penal sem lei que a consagre, mas não diz que as causas excludentes da ilicitude ou da culpabilidade tenham que estar consagradas em lei.

1.2) OS PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO

Quanto aos princípios gerais do Direito, Norberto Bobbio preleciona serem eles “normas fundamentais ou generalíssimas do sistema, as normas mais gerais. Frederico Marques, por sua vez, aduzia: “No campo da ilicitude do ato, há casos onde só os princípios do Direito justificam, de maneira satisfatória e cabal, a inaplicabilidade das sanções penais. É o que ocorre nas hipóteses onde a conduta de determinada pessoa, embora perfeitamente enquadrada nas definições legais da lei penal, não pode, ante a consciência ética e as regras do bem comum, ser passível de punição.” Ex.: Ao furar a orelha da filha recém-nascida, a mãe, em princípio, praticaria o crime de lesão corporal (art. 129 do CP). Entretanto, tal conduta, embora enquadre-se perfeitamente na definição legal do artigo 129 do Código Penal, não pode ser passível de punição, pois não fere a consciência ética e as regras do bem comum.

1.3) A DOUTRINA E A JURISPRUDÊNCIA

A doutrina é formada pelas opiniões e as ideias emitidas pelos juristas ou escritores do Direito, que interpretam os dispositivos legais, sistematizando o Direito,

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extraindo princípios do ordenamento jurídico, aconselhando reformas legislativas e guiando a jurisprudência.

A jurisprudência é a repetição constante de decisões no mesmo sentido em casos idênticos. Ela se forma no trabalho interpretativo dos juízes e tribunais, realizado no exercício da função jurisdicional.

A doutrina e a jurisprudência, segundo a doutrina tradicional, não são fontes do Direito Penal, posto que não o criam tampouco o exteriorizam. Contudo, colaboram com a interpretação dos dispositivos legais. Caso queiramos alargar o conceito de fontes do Direito, como fazem determinados autores, para afirmar que tais fontes não somente criam e exteriorizam o Direito, mas também o interpretam, poderemos dizer que a doutrina e a jurisprudência são fontes do Direito. Entretanto, tal posição não é sustentada por nenhum autor relevante que se dedique ao estudo do Direito Penal.