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NICOLAU SEVCENKOé professor de História daCultura do Departamento deHistória da FFLCH-USP.

NICOLAU SEVCENKO

A cidademetástasis eo urbanismoinflacionário:incursõesna entropiapaulista

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REVISTA USP, São Paulo, n.63, p. 16-35, setembro/novembro 200418

Qual a ruamais representativa deSão Paulo? A resposta aessa pergunta depende,obviamente, do mo-mento que se consideree da perspectiva que seassuma. No início do sé-culo XX, quando foiinaugurado o modernourbanismo da capital,provavelmente se toma-ria a Rua Direita ou,mais amplamente, oconjunto integrado doTriângulo Central – Di-reita, 15 de Novembro e São Bento –, comoo núcleo articulador da vida da cidade emprocesso rápido de remodelação. Com odesdobramento da área urbanizada para olado oposto do Vale do Anhangabaú e orápido crescimento do que passou então aser chamado de Cidade Nova, vieram aassumir destaque predominante a Rua SãoJoão e a Rua Ipiranga. O deslocamento doeixo de investimentos para o espigão cen-tral, a sudoeste, projetaria a primeira e maismoderna das grandes avenidas, a Paulista,tornada desde os seus primórdios até hojeno principal cartão-postal da cidade. Acontínua migração da fronteira de investi-mentos imobiliários na direção sudoestegeraria, porém, uma rápida sucessão denovas vedetes urbanas, a Faria Lima, aBerrini, a Águas Espraiadas e, mais re-centemente, o complexo Avenida dasNações Unidas-Nova Faria Lima. Como

se vê, não faltam candidatas competindopela honra de responder à pergunta acima.

Se me fosse dado responder àquela ques-tão, no entanto, diria que a rua mais emble-mática da cidade é a Rua São Paulo. Claro,muitíssimo pouca gente sabe, soube ou ja-mais saberá onde fica a Rua São Paulo. Ela,portanto, e com mais justiça, talvez deves-se figurar no rol das vias mais obscuras,desconhecidas e irrelevantes desta metró-pole de mais de 100 mil ruas. Em que sen-tido então ela pode ser emblemática? Essaé a questão na qual pretendo me concentrarneste ensaio de reflexão sobre a urbaniza-ção paulista.

Quando se elege alguma via em parti-cular como a mais representativa de umacidade, o que se leva em consideração, emgeral, é seu potencial de polarização derecursos, centralidade orgânica, articula-ção de fluxos, referência espacial, simbo-

Este texto foi originalmente apre-sentado no 2o Curso de História deSão Paulo, organizado pelo Cen-tro de Integração Empresa-Escola(CIEE), sob a coordenação da pro-fessora Ana Maria de AlmeidaCamargo, sob o título ligeiramentediferente de “A Cidade Vertigem eo Urbanismo Inflacionário: Incur-sões na Entropia Paulista”.

Apresentei este texto no CIEE naquinta-feira, dia 19 de agosto de2004. No dia seguinte, ao abrir ojornal da manhã, as manchetesanunciavam o espancamento bru-tal de 11 moradores de rua naregião da Glória e da Sé. Nodomingo, dia 22, mais seis mora-dores de rua foram cruelmente ata-cados, dentre os quais uma mulhermorreu. Das vítimas só se sabe, atéo momento em que redijo esta nota,os nomes de Ivanildo Amaro daSilva, Cosme Rodrigues Machadoe a mulher identificada apenascomo Maria. A eles, aos outrosquatro mortos anônimos e às de-mais vítimas dessa horrenda desu-manidade dedico este artigo, paraque a lembrança da sua dor e daliminaridade da sua existência ilu-mine mais uma dimensão da me-mória pesarosa do Distrito da Gló-ria e da Liberdade.

“Eu durmo e vivo ao sol como cigano,Fumando meu cigarro vaporoso;Nas noites de verão namoro estrelasSou pobre, sou mendigo e sou ditoso!

Ando roto, sem bolso nem dinheiroMas tenho na viola uma riqueza:Canto à lua de noite serenatas,E quem vive de amor não tem pobreza. […]

Tenho por meu palácio as longas ruas;Passeio a gosto e durmo sem temores […]O degrau das igrejas é meu trono,Minha pátria é o vento que respiro […]

Escrevo na parede as minhas rimas,De painéis a carvão adorno a rua […]Sinto-me um coração de lazzaroni;Sou filho do calor, odeio o frio […]”

(Álvares de Azevedo, Lira dos Vinte Anos,São Paulo, 1853).

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lização e visibilidade. Ou seja, o que defineo seu papel e identidade é a sua condição aomesmo tempo de núcleo da cidade-centrí-fuga, vitrine da cidade-mercadoria, de pas-sarela da cidade-desfile, de palco da cida-de-espetáculo e de pódio da cidade-poder.Evidentemente a Rua São Paulo não seenquadra em nenhuma dessas categorias,muito pelo contrário. Mas, então, talvezcoubesse perguntar se essa é a única ma-neira pela qual se pode definir a fisionomiae a substância de uma cidade. Ou será quetambém se pode tentar compreendê-la poraquilo que ela oculta, pelo que relega, peloque escamoteia? Há desvãos, espaços epresenças que são como que resíduos var-ridos para debaixo do tapete vistoso dapaisagem urbana. São seus pontos-cegos,justamente porque revelam seu avesso ousuas vísceras. Eles são o contraponto daidentidade pretendida, são a sua mais com-pleta negação, mas por isso mesmo tam-bém são a revelação daquilo que ela maisteme revelar: não a máscara exuberante,mas o rosto nu por trás da fantasia.

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A Rua São Paulo, originalmente cha-mada de Rua dos Ingleses, não fica em ne-nhum ponto remoto da capital. Bem aocontrário, ela está ligada ao coração do co-ração da cidade, no contexto da colina his-tórica em que foi fundada. Fica a uns 500metros do marco central da cidade, na Pra-ça da Sé e, portanto, a uns 700 metros doseu marco de fundação, no Pátio do Colé-gio. Ela fica no então chamado Distrito doSul da Sé, depois denominado de Distritoda Glória e hoje conhecido como Bairro daLiberdade. Até meados do século XIX oDistrito da Glória assinalava o limite sul dacidade, compreendendo o Caminho do Car-ro de Santo Amaro (hoje Avenida da Liber-dade), até o Largo da Pólvora, e se estenden-do pelas duas baixadas, a do Tamanduateíao leste (chamada de Caminho do Mar, atualGlicério) e a ribanceira do Anhangabaú aoeste. Como um espaço tão próximo, tãocentral e tão histórico pode se tornar invisí-vel, abandonado e desconhecido?

A resposta é que aquele era o espaçomaldito da cidade. A presença sinistra quegalvanizava o Distrito da Glória por muitotempo foi a de um monte saliente, comouma gigantesca verruga geológica em meioà crista elevada do Caminho do Carro deSanto Amaro, conhecido pelo nome som-brio de Morro da Forca. O patíbulo fora aliestabelecido, desde 1775, por ordem ex-pressa do vice-rei, o Marquês de Lavradio.Aquele espaço estava portanto longe de serinvisível. Ele fora deliberadamente esco-lhido por ser visível de praticamente todosos quadrantes da cidade, expondo assimcruamente a todas as gentes a força da jus-tiça implacável de Sua Majestade Imperialpairando sobre todos os seus súditos esupliciando exemplarmente os réprobos, re-calcitrantes e insubordinados, mas sobre-tudo intimidando os escravos rebeldes.Mesmo porque, a poucos metros dali, naconexão do Caminho de Santo Amaro como Largo de São Gonçalo (atual Praça JoãoMendes), ficava o Largo do Pelourinho(atual Largo Sete de Setembro), ao lado daCadeia, símbolo do poder municipal, ondeos escravos eram açoitados aos olhos dopúblico.

No espaço circunjacente a oeste doMorro da Forca se estendia o CemitérioGeral ou Cemitério dos Aflitos, o primeirocemitério público da cidade (1779), desti-nado ao enterro dos condenados, dos indi-gentes e dos soldados. As sepulturas rústi-cas levavam apenas uma cruz de pau, semnomes, datas, bênçãos ou encomendações.Era o cemitério dos anônimos, dos despre-zíveis e dos indignos. Naturalmente eratambém o cemitério dos escravos. Como,dentre os africanos – fossem eles bantus ouiorubas e jeje-nagôs subsaarianos –, o ful-cro da tradição religiosa se concentra noculto dos antepassados, toda a região, oredor da forca e do cemitério, cercou-se daaura da mais elevada sacralidade. A capelado cemitério, chamada de Igreja dos Afli-tos, tornou-se um centro devocional da re-ligiosidade popular.

Mas, naturalmente, era o contexto es-pacial do Morro da Forca que catalisava asimaginações e as mais fortes cargas emo-

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cionais. Daí o hábito de fincar cruzes e acen-der velas naquele espaço. Dele derivaria aquintessencial Santa Cruz dos Enforcados.Criou-se uma tradição lendária a respeitodesse monumento crucial na história dacidade, que deve ser redimensionada emfunção da sacralidade intrínseca adquiridapelo local. A lenda gira em torno da figura

do cabo Francisco José das Chagas, umhomem negro. Em 1821, um ano antes daIndependência, ele e o praça Joaquim JoséCotindiba, também negro, encabeçaram ummotim pelo pagamento de soldos atrasa-dos, no 1o Batalhão de Caçadores aquarte-lado na cidade de Santos. Tendo sido pre-sos e condenados à morte, o soldado foiexecutado primeiro. Mas quando procede-ram ao enforcamento do cabo Chagas, diza lenda, a corda se rompeu por três vezesseguidas, o mesmo ocorrendo após umaúltima tentativa com um laço de couro. Avítima foi então executada diretamente nochão, pelas mãos de seus algozes, para re-volta dos populares presentes, que exalta-vam o milagre da intervenção divina atra-vés das cordas rompidas e exigiam a comu-tação da pena capital.

Chagas teria se tornado então um mártire um santo na devoção da população local.Um beato, Olegário Pedro Gonçalves, e umnegro, Chico Gago, teriam erguido um cru-zeiro aos pés do Morro da Forca, em frenteao qual teriam posto uma mesa para ofe-rendas. Diz a lenda que velas acesas naque-le altar improvisado jamais se apagavam,mesmo sob os mais fortes ventos daquelesaltos de morro ou sob as tempestades maistorrenciais, confirmando a santidade domártir Chagas. Multidões acorriam paracultuar o que passou a ser chamado de aSanta Cruz dos Enforcados. Criou-se umafesta anual, com grande afluxo popular,

Igreja daSanta Cruz dos

Enforcadosem 2004

Cristina Carletti

Morro daForca e Santa

Cruz dosEnforcados em

1874. Desenhode Pedro

AlexandrinoBorges

(1864-1942)

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exacerbando o prestígio do culto e alarman-do as autoridades.

Em meados do século XIX a forca foidesativada e o nome do local mudado, em1851, para Praça da Liberdade, por sua li-gação com o Chafariz da Liberdade, loca-lizado junto ao Largo do Curso Jurídico(atual São Francisco). Aquele chafariz, porsua vez, fora assim denominado em 1832,numa homenagem da Câmara Municipal àrevolta popular que culminara, no Rio deJaneiro, no ano anterior, com a queda dogoverno absolutista de D. Pedro I e seuretorno a Portugal. A homenagem assina-lava assim a vocação liberal da elite paulis-ta e o papel-chave que vinha assumindo nagestão da jovem nação independente. Dochafariz, o nome se estendeu à praça, de-pois à rua que os ligava e finalmente pas-sou a abranger toda a área do que fora oDistrito da Glória.

Com o declínio da forca e a nova cono-tação liberal, o motim comandado porChagas foi sendo interpretado crescente-mente, dentre os círculos dirigentes, comouma resistência ao jugo português, já pre-conizando a jornada heróica da luta dospaulistas pela Independência, cujo gestodecisivo haveria de ocorrer em seu territó-rio, no Ipiranga, em área vizinha ao Distri-to da Glória, ou melhor, a essa altura, daLiberdade. O Cemitério dos Aflitos foidesativado e loteado (1885), assim como oMorro da Forca foi arrasado e o paiol dapólvora demolido, sendo a área em seguidarepartida em lotes para a venda. A popula-ção, contudo, reerguia a Santa Cruz dosEnforcados em pontos cada vez mais dis-tantes, toda vez que as obras chegavam aela. Essa situação perdurou, até que em 1891foi construída uma capela, a qual, diante docontínuo afluxo de multidões, teve que sersucessivamente ampliada, culminando nareforma final, em 1917, que resultou na atualIgreja da Santa Cruz dos Enforcados. Oempenho das autoridades e da Cúria per-sistiu no sentido de vinculá-la à figura doChagas e não às tradições rituais afro-bra-sileiras. Uma breve visita àquele temploporém – local de intensa vibração místicaespecialmente às segundas-feiras, com a

oferta ritual de pipocas, velas e floresdedicadas às Almas – comprovará a vitóriado sentimento popular e, em particular, dacomunidade negra.

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Que a Glória tinha uma presença e sig-nificados peculiares para as comunidadesnegras ficou atestado pelo fato de que asfiguras mais populares e conhecidas daregião, conforme testemunhos de cronistase memorialistas, eram negros como o Chi-co Gago, o Preto Badaró, o Baduíra (PaiZarabinda) e o Chico Mimi. Sobre o pri-meiro, o Chico Gago, já vimos que erahomem de sólidas convicções devocionais,sempre ativo na organização das celebra-ções, festividades e rituais relacionadostanto ao cemitério e à Igreja dos Aflitos,quanto ao cruzeiro e depois à Capela e àIgreja da Santa Cruz dos Enforcados. Já oPreto Badaró era uma criatura caminhante,sempre errando pelas ruas, becos e desvãosda Glória, do Bexiga, do Lavapés, doCambuci e do Morro do Piolho. Veteranoda Guerra do Paraguai, dotado de extraor-dinária cultura oral e contador de casosirresistível, esse rapsodo tornava suas nar-rativas sobre as peripécias dos batalhõesnegros nas guerras do Prata numa autênticaepopéia afro-americana. Já o Baduíra erababalorixá respeitadíssimo, com tenda nosbaixos do Lavapés, no então chamado Ca-minho do Cambuci. Visitado pelo espíritodo Pai Zarabinda, um negro morto no su-plício do tronco, ele dispensava conselhos,curas, orientações, bênçãos e profecias.Apegado a convicções cristãs, identifica-va-se como espírita. Seu prestígio era semigual e sua reputação atravessava toda acidade. E também todas as classes. As crô-nicas confirmam que era visitado por se-nhoras e cavalheiros da mais alta elite pau-lista. As damas se achegavam à sua tendacom a identidade discretamente encoberta,tal como, aliás, as senhoras e cavalheirosque visitavam os babalorixás do Morro doCastelo, marco fundador do Rio de Janei-ro, arrasado no começo do século XX. Nessesentido, ressalte-se de passagem a extraor-

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dinária homologia que há em se vislumbrara história do Rio sob a perspectiva do Morrodo Castelo e a de São Paulo pelos relevosacidentados da Glória.

O caso do Chico Mimi não é menosinteressante. Sua fama se devia à sua des-treza na produção artesanal de bainhas parafacas e facões por um lado e petecas pelooutro. A importância das lâminas, com suainfinidade de formas, tamanhos e usos, ates-ta os hábitos mateiros e a grande importân-cia para as classes populares da caça, dapesca e da coleta na natureza ainda abun-dante dos arredores da capital. As petecasconstituem outro elemento interessantíssi-mo. A peteca é ao mesmo tempo uma brin-cadeira e um esporte, sendo o mais auten-ticamente americano dos folguedos. A pa-lavra é tupi e assinala o modo específico deos indígenas baterem as petecas com asmãos. Já os africanos e afro-brasileiros,quando a adotaram, introduziram o uso,concomitante ou exclusivo, dos golpes comos pés na brincadeira. Ainda está para seravaliado o impacto que essa tradição teveno desenvolvimento da paixão e do estilobrasileiro de jogar futebol.

As petecas do Chico Mimi ajudam alembrar que a Rua São Paulo conectava oalto do Morro da Forca – onde ele tinha suaoficina ribanceira abaixo – com o Morro doTabatingüera, área em que se estabelecera,desde a fundação da cidade, a comunidadetupi do cacique Caaubi. A evocação é im-perativa, já que foram ele e seus bravosguerreiros que salvaram São Paulo da ex-tinção, em 1562, quando a aldeia foi inva-

dida, justamente pelo flanco sul, sua zonamais vulnerável, por uma legião enfurecidade guaianás, tamoios e carijós confedera-dos. Foi Anchieta em pessoa quem relatoua coragem e determinação cega com que ostupis defenderam a vida dos padres e doscolonos, rendendo-lhes a mais exaltadahomenagem. Já no século XIX o quadroera bem diverso, mas a molecada aindadescia a Rua São Paulo para ir nadar e sedivertir, jogando peteca pelados nas águasdo Tamanduateí, na altura do Porto dosIngleses. A brincadeira era proibida e apolícia da cidade, os Urbanos, tentava cer-car a garotada pelas duas margens, mas elesescapuliam, caçoando da guarda, os “es-panta-gatos”, nadando até desapareceremnas matas densas rio abaixo.

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Mas nem só negros, índios e seus des-cendentes rondavam pela Rua São Paulo epelas adjacências da Glória. Também osmetecos eram convenientemente induzidosa se estabelecerem ali. Como vimos, origi-nalmente ela se chamava Rua dos Ingleses.A bem da verdade, ela apresentava umadescontinuidade de nome, embora não decurso, chamando-se Rua dos Ingleses até àaltura da Rua da Glória e a partir daí assu-mindo o nome de Beco do Rath. Como sesabe, desde a vinda da Corte Imperial Por-tuguesa para o Brasil, sob a proteção daflotilha britânica, e por decreto depois con-firmado pelo Tratado de Abertura dos Por-tos e mantido após a Proclamação da Inde-pendência, estrangeiros passaram a seradmitidos em todas as partes do Brasil. Mas,se não fossem católicos, só poderiam pra-ticar seus credos e cerimônias na intimida-de dos lares, sem qualquer sinal externoidentificador de suas convicções heterodo-xas, mantidas sob a máxima discrição, so-briedade e recato. Não poderiam ademaisser enterrados em campo-santo, consagra-do pela Igreja Católica. Razão pela qualmuitos estrangeiros, especialmente os donorte da Europa e de filiação protestante,tendiam a se sentir mais à vontade às mar-gens do contexto urbano.

Templo chinêsna Rua

ConselheiroFurtado, ondeantes ficava o

Casarão dosIngleses

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Assim se deu com o coronel JohnRademaker, que adquiriu a quinta de Fran-cisco José Machado, instalando-se numcasarão no Largo da Glória (depois Largodos Ingleses, Largo São Paulo e atualmen-te Praça Almeida Junior). Desde então avia íngreme, que dava acesso direto ao so-lar Rademaker, passou a ser chamada deRua dos Ingleses. Seu vizinho em direçãoao alto da Glória era o alemão dr. KarlJoseph Fredrich Rath, médico, naturalista,cartógrafo, escritor e pintor, que ao morrerlegou sua rica coleção de história natural,de arte e de mapas da cidade para se tornaruma das bases do acervo do futuro Museudo Ipiranga. A extensão da mesma viamudava de nome para Beco do Rath (hojeRua Américo de Campos) ao adentrar emsua propriedade. A futura Rua São Paulo setornou assim uma via que conectava o con-texto afro-brasileiro do alto da Glória como contexto indígena-brasileiro do Taba-tingüera, através de um eixo anglo-germâ-nico. Com o posterior arrasamento doMorro do Tabatingüera para a criação doaterro do Glicério, a Glória se conectou como Bexiga, abrindo um novo flanco italianode convívio, marcado pela pequena eelegantíssima Igreja de Nossa Senhora daPaz. Depois vieram os migrantes de Minas,do Norte e Nordeste, os japoneses, os co-reanos, os chineses, os bolivianos, osnigerianos…

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O casarão dos ingleses tem também umahistória interessantíssima. Com a morte docoronel John Rademaker ele foi vendidono início de 1820 para o coronel João deCastro Canto e Melo, cuja filha, Domitila,futura Marquesa de Santos, se tornariaamante do primeiro imperador. Foi portan-to para visitá-la na Glória que D. Pedro su-biu a Serra do Mar em direção a São Paulo,emancipando de passagem o país do esta-tuto colonial, no célebre episódio do Ipi-ranga. A situação marginal da Glória tam-bém servia para essas indiscrições. E paraoutras. Em 1824 o casarão foi vendido paraa Santa Casa de Misericórdia, que ali ins-

talou, no ano seguinte, seu hospital e, apedido das autoridades, uma Roda dosEnjeitados, para aliviar crescentes tensõessocioconjugais dentre as elites. Para fazeras vezes de amas-de-leite dos órfãos dainstituição, as irmãs apelaram para as ín-dias do aldeamento de Santo Amaro. Comooutros indígenas foram incorporados paraatividades diversas, houve um como quesegundo repovoamento indígena dos bai-xos da Glória. A propósito, o local bem quecomportaria um monumento à mãe-índia,semelhante àquele dedicado à mãe-negrano Largo do Paissandu. Um personagemafinal, menos conhecido, mas não menosrelevante das histórias paulista e brasileira.

Em 1840 a Santa Casa de Misericórdiateve que mudar para um prédio maior naRua da Glória, esquina com a Rua dos Es-tudantes, e o casarão se tornou uma turbu-lenta república de estudantes, onde, entremuita esbórnia e bandalheira, brilhou a maisfina flor da juventude romântica da cidade,encabeçada por Bernardo Guimarães eÁlvares de Azevedo. Alguns de seus textosclássicos foram escritos ali mesmo. No seu

Igreja de NossaSenhora daPaz, erguidaentre 1940 e1943 na Ruado Glicério. Aolado, modelo doprojeto originale, em cima, oprédioefetivamenteconstruído

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transgressivo Noites na Taverna, quandoÁlvares de Azevedo revela o endereço dodemônio, ele não poderia ser outro senão oinsólito solar da Chácara dos Ingleses, nosaltos da Glória. Revela Satã, para o sobres-salto dos seus leitores: “– Tenho uma casaaqui na entrada da cidade. Entrando à direi-ta, defronte ao cemitério…”

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Como se vê, a Glória, quando não era oinferno, era o purgatório. A cidade empur-rava para lá tudo aquilo que percebia comoameaçador, desagradável, tumultuário, des-prezível, repugnante ou indigno. Em dife-rentes épocas e distintos locais, foram ins-taladas lá instituições as mais problemáti-cas. Em primeiro lugar, como vimos, aForca e, ao seu lado, o arsenal e depósito depólvora da cidade, razão pela qual o morroe o largo ora eram referidos como “da For-ca”, ora como “da Pólvora”, nome quepermaneceu atualmente para o largo rema-nescente, ao sul da antiga praça. Adjacenteestava o cemitério dos supliciados e dosindigentes. Vieram depois o hospital, aRoda dos Enjeitados, o Asilo dos Aliena-dos e o Asilo de Mendicidade. No início daRua da Liberdade (antigo Caminho doMorro da Forca), ficavam a Cadeia Públi-ca, a Casa de Correição e Trabalho e o pe-lourinho. Nos limites da Boa Morte se ins-talou o quartel da Milícia. Com a boemia

dos estudantes, vieram o pequeno teatroRath, depois o Colombo (onde, aliás, D.Pedro foi declarado o primeiro rei do Brasilindependente, na noite do dia 7 de setem-bro de 1822) e o São Paulo. As salas deespetáculos por sua vez atraíram as tascas,as bodegas ratés e as casas de moças ale-gres, que viriam a dar um ar de festa àsnoites da Glória.

Quando se criaram as feiras livres, umadas primeiras foi instalada no Distrito daGlória, na baixada da Rua São Paulo, ondeestá até hoje, em plena vitalidade. As pen-sões, cortiços, freges, zungas e moquiçosse apertavam disputando as ladeiras emdireção às várzeas, recebendo a multidãode migrantes e imigrantes que buscavamaquela área, ao mesmo tempo central e depassagem. Dentre as habitações populares,entremeadas com elas, concentravam-seinúmeras cocheiras, abrigando os contin-gentes de cavalos, burros e carroças querodavam pela cidade. Naquele contexto,mas na vertente do Anhangabaú, ficavamtambém o matadouro e o Curtume e, maistarde, no próprio Largo São Paulo, insta-lou-se um mercado de carnes verdes. Astropas de gado, vindas do sul e invernadasnos campos, capoeiras e alagados do Ibira-puera, desciam em longas caravanas diári-as, troando em passo cadenciado pelo cal-çamento de pedra da Rua da Liberdade,tangidas para o seu destino final. Pelasencostas da Glória ecoavam os gemidos dos

Chácara dosIngleses em

1823, aquarelade Edmund

Pink. O casarãoera voltado parao Cemitério dos

Aflitos e Beco doRath, tendo aofundo a várzea

do Tamanduateí

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animais sacrificados, tingindo as águas docórrego de um vermelho encarnado e sinis-tro. O cheiro do Curtume e do Depósito deOssos criava uma atmosfera mefítica, mór-bida e macabra. A Glória era o fundunço, olumbambo, o sarrabulho e a trabuzana deSão Paulo.

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O boom da cafeicultura transfigurou acidadela provinciana desde o terço final doséculo XIX, desencadeando um processode reforma urbana que se estende até hoje.Essa primeira fase do processo de urbani-zação moderna, assinalada pela atualiza-ção em sintonia com os padrões cosmopo-litas do mercado capitalista internacional,definiu já o que seria o caráter disfuncionaldo desenvolvimento da cidade. A aversãodas novas elites em relação aos rios, àsvárzeas e à natureza exuberante da Pirati-ninga, que faziam justamente dessas asáreas sagradas para os índios e as mais atra-entes para os negros e seus descendentes,secretou um pendor deletério das camadasdirigentes para estabelecer os referenciaisda cidade na sua própria área construída,nos portentos da engenharia, nas dinâmi-cas dos fluxos de mercadorias, finanças ecomunicações, nos processos de valoriza-ção cumulativa pela concentração de rique-zas, nos nichos de segregação social eassepsia ambiental.

O surto de prosperidade, coincidindocom uma reconfiguração do mercado demão-de-obra em escala mundial, atraiu paraa região paulista gentes dos diversos can-tos do mundo, particularmente do sul ecentro da Europa, do Oriente Médio e doExtremo Oriente, em sucessivas ondasmigratórias. Destinados em especial paraas lavouras, com o progressivo declínio dospreços do café nas três primeiras décadasdo século XX, esses grupos foram buscan-do refúgio e novas oportunidades na cres-cente economia urbana da capital do esta-do, atraídos pelo crescimento das ativida-des industriais e comerciais. A pressãodemográfica logo se tornou tão intensa que,já por volta das primeiras décadas do sécu-

lo, a atividade mais rentável passou a ser aespeculação imobiliária, para a qual mui-tos cafeicultores decadentes passaram adesviar seus recursos. A perpetuação dessasituação se tornou o problema crônico dacidade, com uma demanda de imóveis sem-pre exponencialmente maior do que a ofer-ta. Era esse o quadro expresso pelo sloganpífio, porém dramaticamente verdadeiro,louvando São Paulo como “a cidade quemais cresce no mundo”.

A Crise de 29 e depois a Segunda Guer-ra Mundial tenderam a reduzir a imigraçãoestrangeira, que foi no entanto compensa-da por um intenso movimento migratóriointerno, principalmente encabeçado pelosestados de Minas Gerais e do Nordeste,acentuando um grave padrão de desnívelregional. O resultado é que o crescimentovertiginoso da cidade prosseguiu, assumin-

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Asilo deMendicidade naRua da Glória,em 1910, ondehoje se encontrao Colégio SãoJosé. Embaixo,Mercado decarnes do LargoSão Paulo, nofinal do séculoXIX. Em 1904seria construído oTeatro São Paulono seu lugar

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do proporções ainda mais alarmantes entreas décadas de 1940 e 1980 (ver quadros 1e 2). Só recentemente, a partir dos anos 90,a população urbana de São Paulo tendeu aalguma estabilidade, com um crescimentomais acentuado, se não explosivo, concen-trando-se nas áreas ao redor do município,que com ele constituem uma zona de amplaconurbação, normalmente referida comoRegião Metropolitana.

De fins do século XIX até o final dadécada de 1920, a expansão da manchaurbana se concentrou sobretudo nos cha-mados bairros centrais. A norma consagra-da foi a de as camadas dominantes se esta-belecerem nos terrenos mais altos da topo-grafia, relegando as baixadas, as várzeas edemais zonas alagáveis ou vizinhas às es-tradas de ferro para as fábricas, armazéns,oficinas e populações operárias. No casoda Glória, o arrasamento do Morro doTabatingüera e a retificação do curso doTamanduateí abriram amplas áreas nosbaixos do Glicério, atraindo fábricas, de-pósitos, pequenas lojas, oficinas e manufa-

QUADRO 2EVOLUÇÃO DA POPULAÇÃO NA CIDADE DE SÃO PAULO E REGIÃO METROPOLITANA ENTRE 1872 E 1996

Ano São Paulo Taxa de Outros Taxa de Região Taxa decrescimento municípios crescimento Metropolitana crescimentoanual (%) da RM anual (%) Total anual (%)

1872 31.385

1890 64.934 4,121900 239.820 13,96

1920 579.033 4,511940 1.326.261 4,23 241.784 1.568.045

1950 2.198.096 5,18 464.690 6,75 2.662.786 5,441960 3.781.446 5,58 957.960 7,50 4.739.406 5,931970 5.924.615 4,59 2.215.115 8,74 8.139.730 5,56

1980 8.493.217 3,67 4.095.508 6,34 12.588.725 4,461991 9.646.185 1,16 5.798.756 3,21 15.444.941 1,88

1996 9.839.436 0,40 6.743.798 3,07 16.583.234 1,43

Fonte: Para 1872-1991, IBGE, Censo Brasileiro; para 1996, IBGE, Contagem 1996.Obs.: A Região Metropolitana de São Paulo é formada pelo município (cidade) de São Paulo e outros 38 municípios adjacentes (OM).

QUADRO 1CURVAS DE CRESCIMENTO DA POPULAÇÃO DO BRASIL, DO ESTADO

DE SÃO PAULO E DA CAPITAL PAULISTA (1872-1950)

7.000

6.000

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4.000

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1950

CAPIT

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ESTADOBRASIL

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turas. De entremeio, difundiram-se conjun-tos homogêneos de habitações populares,geralmente em sobrados geminados, de trêspavilhões, que eram repartidos internamen-te, sendo então alugados e compartilhadospor várias famílias. Até os porões, em geralcom janela ou saída direta para a rua, eramalugados e compartilhados. Paradoxalmen-te, a parte mais elevada da Glória foi alvode uma reurbanização exuberante pelo en-tão prefeito, o Conselheiro Antônio Prado,que transformou a agora Avenida da Liber-dade num elegante bulevar arborizado.

O sinal maior de distinção foi a mudan-ça para aquela área do escritório do maisprestigioso arquiteto do período, Ramos deAzevedo, que edificaria várias mansões eresidências de alto padrão na região. Oproprietário de uma dessas residências lu-xuosas foi Manuel Joaquim de Albuquer-que Lins, presidente (governador) do Esta-do de São Paulo, de 1908 a 1912, períodoem que transferiu a sede do governo para oLargo São Paulo, despachando direto docasarão elegante que ainda está lá, no altoda praça e a cavaleiro da Radial Leste, ocu-pado atualmente pelo Primeiro DistritoPolicial. O contraste entre os altos da Li-berdade e os baixos do Glicério definiaagora o retrato acabado da nova segrega-ção social que marcaria a cidade.

Nesse primeiro período da urbanizaçãode São Paulo, o bonde fora o vetor básicode transporte na capital. Pelo alto custo dainstalação de suas linhas e porque o serviçoera monopolizado por uma única compa-nhia, a Light & Power, a rede de integraçãourbana era estreita e limitada, promovendoo adensamento da população nos bairroscentrais e arredores imediatos. De 1930 a70, porém, coincidindo com dois períodosautocráticos, o de Vargas e o da DitaduraMilitar, os recursos básicos de transporteurbano se tornaram os veículos automo-tores, ônibus e carros particulares. O plane-jador e depois prefeito Prestes Maia defini-

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Rua da Glóriaem 1862, apartir do Largodo Pelourinho,atual Largo7 de Setembro

Antigaresidência dafamíliaAlbuquerqueLins no LargoSão Paulo,ocupadaatualmentepelo 1o DistritoPolicial

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ria o Projeto Avenidas como o novo mode-lo para a expansão da cidade, mudandoradicalmente a lógica do desenvolvimentourbano paulista. Dada a sua maior flexibi-lidade e a possibilidade de transitar em ruasde terra e a longas distâncias sem grandescustos, os ônibus promoveram uma amplaexpansão da malha urbana, com as áreas deloteamentos se multiplicando caoticamen-te, conforme a ganância desenfreada e asestratégias manipulatórias mais delirantesdos agentes especuladores.

Assim, o padrão predominante até en-tão, do aluguel de casas ou aposentos naárea central, concentrando a população naregião, foi substituído pela nova tendência,a da compra de lotes nas periferias, ondeaos poucos se construiria a casa própria,dispersando as populações pelos subúrbiosdistantes. Bairros surgiram ao deus-dará,sem conexão uns com os outros, fora dosparâmetros e gabaritos legais, sem quais-quer recursos de infra-estrutura básica, emterrenos grilados ou irregularmente demar-cados. A São Paulo original, já suficiente-mente anárquica, desdobrou-se em váriasSão Paulos precárias, distantes, isoladas,paupérrimas e ilegais. Foi a origem do ne-fasto modelo centro-periferia.

Do ponto de vista da área central, essefoi o momento da grande verticalização.Para as camadas mais abonadas, não basta-va mais residir nas áreas mais elevadas, adistinção agora obrigava a residir em pré-

dios de apartamentos ou, a partir dos anos70, nos chamados condomínios fechados.De certa forma, o processo tumultuoso deverticalização das áreas centrais era o con-traponto da expansão horizontal caóticadas periferias. Essa combinação exóticade compactação no centro e dispersão nasmargens atribuiu um papel decisivo aosveículos automotores. A rarefação da ocu-pação periférica e a falta de conexão entreseus bairros – a qual tenderia sempre a sermediada pelos terminais no centro – tor-navam limitado, precário e sacrificado otransporte coletivo. Por outro lado, com oveículo particular se tornando um recursoimprescindível, ademais de prestigioso,para os grupos privilegiados das áreascentrais, as sucessivas administrações daprefeitura passaram a planejar o espaçourbano em favor dos carros, promovendoa proliferação feérica de vias expressas,corredores de circulação, pontes, túneis,viadutos, rótulas, passarelas, grades, fai-xas, faróis, sinais, mãos e contramãos, ter-minais gigantescos e extensos estaciona-mentos. A área urbana foi retalhada emtodos os quadrantes e direções, e tornadaainda mais fragmentada, inorgânica e inós-pita, via de regra às expensas dos espaçospúblicos, além de transformar num autên-tico inferno a vida dos transeuntes. Nessemomento, a baixada da Glória (ou do Gli-cério) praticamente sumiu, submersa pelamassa dos viadutos do complexo do extin-

RuaPirapitingui.

O sobrado, de1891, foi a

residência doarquiteto

Ramos deAzevedo

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to Parque D. Pedro I e do Minhocão, e pelasvias expressas às margens e sobre o Ta-manduateí.

Dos anos 80 aos nossos dias, as tendên-cias dominantes foram outra vez contradi-tórias. Por um lado tivemos a organizaçãoe politização das comunidades dos bairrosperiféricos, pressionando as autoridadespela legalização das propriedades e forçan-do investimentos em transporte, serviços einfra-estrutura. Pelo outro, o surgimentode lobbies de planejadores e incorporadores,empenhados na alteração de códigos, es-tatutos e gabaritos, de forma a capitalizarmegaprojetos privados, criando áreas deexclusividade, privilégios de circulação ese especializando na arte da utilização deáreas e equipamentos públicos para fins es-peculativos, promocionais e privativos. Pa-radoxalmente, enquanto as populações ca-rentes lutam por direitos, pela legalizaçãode suas posses e propriedades e por novosespaços públicos, os grupos privilegiadosse empenham pela “flexibilização” das leise normas, assim como pela apropriação pri-vada dos espaços e bens públicos. A marcadesse novo momento na Glória (ou na Li-berdade) foi a expansão predatória das “uni-versidades” privadas, dos bingos e diver-sões eletrônicas, de estabelecimentos ban-cários multinacionais, de lojas de fast-food,dos megaestacionamentos, dos blocos bu-rocráticos de repartições públicas e mega-templos pentecostais, proliferando em pa-

ralelo a um grau jamais visto de depredaçãodo patrimônio urbano, de degradação am-biental, de miséria, privação e abandono dasáreas carentes. Vae victis!

• • •

Eis a lógica, ou antes o desvario, do ur-banismo inflacionário, sua intrínseca ten-dência entrópica. Ele decorre, em primeirolugar, de uma tibieza crônica da instânciapública, da ausência ou insuficiência daação interveniente da autoridade urbana,da abdicação de qualquer sentido de orien-tação, controle, fiscalização ou moderaçãoda disputa desigual pelo espaço e pelo di-reito à cidade, permitindo aos agentes maisfortes e organizados que submetam a urbeà vertigem caótica de seus interesses e dasua ganância. Destituída assim de um nexoorgânico, seja ele de sentido histórico, cul-tural ou racional, a cidade se torna numamálgama amorfo e disfuncional, impossí-vel de ser incorporado como uma experiên-cia traduzível num vernáculo compartilha-do como o patrimônio espiritual de toda acomunidade dos cidadãos. Retalhada pe-los impulsos e lapsos esquizóides da vora-cidade especulativa, ela incorpora e refleteessa condição dilacerada nos seus compo-nentes heteróclitos, nas partes disparata-das, conexões inconclusas, articulaçõesesclerosadas, fluxos desencontrados e pre-senças esvaziadas.

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Rua AnitaFerraz. Osrestos de umacasa servem demoradia afamílias quevivem dodepósito de lixoao redor

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A percepção dos seus habitantes ficatolhida pela ausência de algum princípioorgânico, de pontos focais ou de diretrizesgerais. Passam a prevalecer então os impe-rativos da topografia; das contingênciasaleatórias de uma história marcada por fa-tores externos e inexoráveis; das pressõeseventuais dos setores mais prósperos e maisorganizados da sociedade ou, sobretudo ecada vez mais, pelos marcos efêmeros dasondas especulativas e das proezas domarketing político, cultural ou imobiliário.A conseqüência mais direta dessa prolife-ração aleatória de ações de construção, deapropriação dos espaços e de multiplica-ção de referências simbólicas alheias aoconvívio coletivo, é a impossibilidade daconsolidação de qualquer configuração dememória capaz de gerar algum sentido deidentidade comum. A ocorrência, em para-lelo, dessa fragmentação do espaço e dadilaceração da memória se manifesta reite-rada na indefinição arquitetônica, urbanís-tica e paisagística da cidade. Eis a dispa-

ridade básica: por um lado a proliferaçãocaótica de ações, presenças e circuitos; deoutro a dissipação de sentidos e nexoscognitivos, dos investimentos afetivos damemória e da experiência compartilhada,assim como dos laços de pertencimento edos espaços de participação.

A história do crescimento explosivo deSão Paulo não decorre de seus potenciaisintrínsecos, como sempre pretende fazercrer a propaganda populista, nem tampou-co comporta alguma gênese orgânica oualguma diretriz estruturadora. Ela manifestaos profundos desequilíbrios econômicos,sociais e regionais, característicos do sub-desenvolvimento do país. O crescimentodesmesurado da cidade compõe assim a afli-ção crescente de gentes deslocadas com-pulsoriamente de suas origens rurais e ar-rastadas para o destino imprevisível daprecariedade das periferias e da inconsis-tência do mercado de trabalho. As altasexpectativas que essa aflição coletiva gera,entretanto, deflagram as energias tanto daspráticas especulativas quanto da manipu-lação política, formas gêmeas de rapinagemque se nutrem do desespero, usando comoisca, naturalmente, a esperança.

Prevalecem como receitas para oequacionamento desse quadro tumultuosoas fórmulas da engenharia e da gestão esta-tística. Não que elas resolvam, mas aomenos fornecem a cenografia da interven-ção pública e da racionalidade inclusiva domercado, ao mesmo tempo em que circuns-crevem as decisões em círculos técnicosaltamente especializados, cujo jargão e cujaoperação tecnológica estarão sempre aci-ma e fora da possibilidade de ser interpeladopelas pessoas comuns. Tudo assim tende aser planejado e conduzido em grande esca-la, sobrepondo níveis os mais complexos decompetência técnica para ser sequer com-preendido, quanto mais contestado. Sóquem está no centro desses círculosdecisórios sabe avaliar quais as conseqüên-cias a médio e longo prazo dessas ações, oque lhes garante para sempre a informaçãoprivilegiada e a conseqüente vantagem naação especulativa. Como as necessidades eas expectativas são imensas e como a sua

Sob o Viadutodo Glicério,

invisível para osmotoristas que

trafegam naRadial Leste, a

Cidade daInformalidade

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exploração política e mercantil as acompa-nha na mesma escala, tudo é desmesurado.Preponderam o quantitativo, o superlativo,o monumental, o acelerado, o maciço, oconcentrado, o volátil e, como é inevitávelpara essas instâncias, o descartável.

São Paulo inclui, nesse sentido, váriasdinâmicas concorrentes, mas também con-vergentes, que se alimentam reciprocamen-te. Em primeiro lugar está a Cidade Espe-culação, estabelecendo as fronteiras sem-pre voláteis do mercado de valorização imo-biliária e dos espaços urbanos de excelên-cia e de exclusividade. Em paralelo se ar-ticula a Cidade Cooptação, acenando coma “possibilidade”, sempre a “possibilida-de”, das legalizações, das anistias, das isen-ções, dos serviços básicos, dos direitos ele-mentares, das “megaunidades” de atendi-mento, dos “auxílios”, da “participação”,das “decisões”, tudo negociado em funçãodas contrapartidas eleitorais. O nexo maisrecentemente planejado para se cruzar en-tre a Cidade da Especulação e a daCooptação é a ponte das PPPs, as chama-das “parcerias público-privado”. Conviven-do com ambas está a Cidade da Informali-dade, a da imensa população que sobrevivesem bases fixas, sem fundamentos legais,sem vínculos institucionais, sem amparo,sem proteção e sem garantias, sem identi-dade e sem reconhecimento. Se a primeirafor a cidade da luz, a segunda será a dolusco-fusco e a terceira a das sombras.

Evidentemente essas três dimensões dacidade estão representadas na Rua SãoPaulo. Nos seus altos (a secção, aliás, de-nominada Rua Américo de Campos) – vin-culada ao contexto do Bairro da Liberdade,que foi transformado em área de caracteri-zação exótica e destinação turística, por suatradicional associação com colônias doExtremo Oriente, região já valorizada des-de a grande reforma do Conselheiro Antô-nio Prado, como vimos – estão os emble-mas da Cidade Especulação. Lá estão osestabelecimentos de ensino e medicina pri-vados, as agências bancárias e de viagenstransnacionais, os bingos e palácios de di-versões eletrônicas, os lançamentos imo-biliários e os megaestacionamentos. Na

outra extremidade, nos baixos do Glicério,insinua-se a Cidade Cooptação, os com-plexos de burocracia pública na várzea ar-rasada, nomes de candidatos políticos bor-rados vandalicamente nos muros e pare-des, entre belíssimas imagens de grafitepopular e a eventual faixa anunciando uma“rua de lazer” nas cercanias.

Mas o que prepondera na Rua São Pau-lo, sem dúvida, é a Cidade Informal. Doantigo Largo São Paulo até as ribanceiras,hoje concretadas, do Tamanduateí, local do

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Nesta página enas seguintes,diferentestrechos da RuaSão Paulo

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antigo Porto do Tabatingüera (ou Porto dosIngleses), onde a molecada pelada jogava apeteca do Chico Mimi, habita toda umacomunidade que mantém uma identidadehistórica com o contexto social da Glória.Gente de todos os cantos e todos os ofícios,relegada a um vácuo da cidadania, a umhiato sombrio entre a Cidade Especulaçãoe a Cidade Cooptação. O tipo de lugar queem língua inglesa tende a ser chamado deno-man’s land ou no-go area. Zona proibi-da, interdita pelo estranhamento absoluto,pela impossibilidade de classificação, em-bora seja tão central e tão intimamente parteda memória desta cidade. Apesar da gran-de concentração de crianças brincando nasruas (elas não têm mais o rio, nem espaços

públicos acessíveis), os motoristas de car-ros, vindos do complexo do Minhocão,inseguros naquele ambiente que assumemameaçador, a atravessam em grande velo-cidade, acelerando ansiosos rumo à Liber-dade e ao Paraíso.

Toda aquela população da Rua SãoPaulo e adjacências tem um modo peculiare diferente de se inserir e conviver com acidade, prospectando seus desvãos, suas do-bras, seus lapsos, seus interstícios e suassobras. Aliás essa é a atividade que se des-taca ali, a coleta de sobras. Sob toda aintrincada rede de viadutos, passagens ele-vadas, alças e pontes que compõem o com-plexo de distribuição viária da Várzea doCarmo, o atual Parque D. Pedro I (em que

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outro espaço da cidade a autoridade públi-ca teria se atrevido a um delírio tão desen-freado de depredação urbana e ambiental?),espalha-se uma enorme população viven-do das várias atividades de reciclagem. Osvãos sob os prodígios da engenharia doselevados estão todos ocupados como de-pósitos e também como moradia desse povoincansável. Como sua extensão natural, aRua São Paulo também inclui áreas de de-pósitos, moradias de reciclantes e popula-ção de rua. As antigas cocheiras e oficinasestão hoje em dia ocupadas pelas carroçassuperlotadas puxadas por essas criaturaspelas vias e caminhos de São Paulo, acom-panhados, não raro, de suas crianças e deseus cachorros.

A melhor metáfora para entender a RuaSão Paulo e por que ela é tão significativatalvez seja a da metástasis. A palavra é deorigem grega e conota o sentido de um pro-cesso contínuo de deslocamento, mobili-dade, transporte e comunicação entre con-textos diversos. E assim é. Tomando osdiversos rumos a que os levam os inúmerosviadutos sob os quais se alocam, os reci-clantes alcançam todos os quadrantes dacidade, percorrendo-a em busca de seusresíduos descartáveis. Eles estão por todaparte, é impossível virar uma esquina, qual-quer esquina da cidade, sem se deparar comalgum deles, com suas crianças e seus ca-chorros. Em geral as pessoas não apreciamcruzar com eles, com suas crianças e seus

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cachorros, ou porque eles atrapalham otrânsito, ou porque a imagem daquela cria-tura frágil puxando aquele peso descomu-nal seja ingrata (não é bem assim como alocomotiva São Paulo puxando os “vagõesvazios” da Federação), ou porque a ativi-dade em si não tenha a dignidade da pro-fissão reconhecida.

Como quer que seja, eles estão lá, portoda parte, por toda a cidade. Eles sãopropriamente uma cidade dentro da ou-tra. Uma cidade que recebe tudo aquiloque a outra rejeita. Uma cidade que reto-ma tudo aquilo que foi abandonado pelaoutra e lhe dá uma vida nova. Algo muitoparecido com a vocação que a Glória

sempre teve para a aceitação do que fos-se condenado, abandonado, renegado ouproscrito. Impossível não sentir, naquelelocal, o poder de ressurreição latentenuma comunidade que incorpora o opos-to da prodigalidade e o avesso do consu-mo como desígnios. Como metástasis,não há parte de São Paulo que não convi-va, admita ou não, queira ou não, gosteou não, com a comunhão errante da RuaSão Paulo. Onde quer que você esteja,olhe para o lado, olhe para a sombra e aRua São Paulo estará lá, com suas crian-ças e seus cachorros. Olhe bem para ela,talvez você descubra ali algo que vocêperdeu, algo que todos nós perdemos.

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Rua São Paulocom RuaSinimbu

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