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    I. O CONHECIMENTO EM CINCIAS SOCIAIS

    1 - INTRODUO AO ESTUDO DA SOCIEDADE TEORIA E MTODO A revoluo Industrial e o surgimento das cincias sociais As principais correntes tericas e as possibilidades de anlise cientfica dos

    problemas sociais. As Ciencias Socias no Brasil

    Sociologia o estudo do comportamento social das interaes eorganizaes humanas. Todos ns somos socilogos porque estamos sempreanalisando nossos comportamentos e nossas experincias interpessoais emsituaes organizadas. O objetivo da sociologia tornar essas compreensescotidianas da sociedade mais sistemticas e precisas, medida que suaspercepes vo alm de nossas experincias pessoais.

    A sociologiaestuda todos os smbolos culturais que os seres humanoscriam e usam para interagir e organizar a sociedade ; ela explora todas asestruturas sociais que ditam a vida social, examina todos os processos sociais, taiscomo desvio, crime, divergncia, conflitos, migraes e movimentos sociais, quefluem atravs da ordem estabelecida socialmente; e busca entender as

    transformaes que esses processos provocam na cultura e estrutura social.Em tempos de mudana em que a cultura e a estrutura esto atravessando

    transformaes dramticas. A sociologia torna-se especialmente importante(Nisbet,1969). Como a velha maneira de fazer as coisas se transforma, as vidaspessoais so interrompidas e, como conseqncia, as pessoas buscam respostaspara o fato de as rotinas e frmulas do passado no funcionarem mais. O mundohoje est passando por uma transformao dramtica: o aumento de conflitostnicos, o desvio de empregos para pases com mo-de-obra mais barata, asfortunas instveis da atividade econmica e do comrcio, a dificuldade de serviosde financiamento do governo, a mudana no mercado de trabalho, a propagaode uma doena mortal (AIDS), o aumento da fome nas superpopulaes, a quebrado equilbrio ecolgico, a redefinio dos papis sociais dos homens e dasmulheres e muitas outras mudanas. Enquanto a vida social e as rotinas dirias setornam mais ativas, a percepo sociolgica no completamente necessria.Mas, quando a estrutura bsica da sociedade e da cultura muda, as pessoasbuscam o conhecimento sociolgico. Isso no verdade apenas hoje foi a razoprincipal de a sociologia surgir em primeiro plano como uma disciplina diferente nasprimeiras dcadas do sculo XIX

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    1.1 - O SURGIMENTO DA SOCIOLOGIA

    No limiar do sculo XXI, estamos vivendo um momento da Histria que osespecialistas esto denominando de globalizao. Uma das caractersticasmarcantes da globalizao so os sistemas de comunicao que unem eaproximam os espaos. A televiso, por exemplo, coloca um fato de um pas

    distante dentro de nossa casa no mesmo momento em que ele est acontecendo,e tudo parece estar ocorrendo ali na esquina de nossa casa.

    A tecnologia da comunicao imprimiu maior velocidade ao mercadoeconmico, fazendo com que a mercadoria circulasse e fosse distribuda maisrapidamente. Utilizando a expresso deMcLuhan, o mundo se transformou emuma aldeia global . Ianni (1922) e Souza Neto (1998) constatam que aglobalizao no um fato acabado, mas um fenmeno em marcha, que destripossibilidades e, ao mesmo tempo, cria outras. um movimento que atinge todasas esferas da vida social, individual e coletiva.

    Em cada lugar ou cidade, a globalizao toma uma diferente fisionomia, ouseja, uma coisa a interface da globalizao com a cidade de so Paulo, outracoisa a mesma interface em Salvador, na Bahia. Na expresso de Castells(1999), a sociedade hoje a sociedade da informao, uma sociedade em rede,que conecta e desconecta em qualquer momento e lugar. Uma sociedade em redeultrapassa as relaes sociais e tcnicas de produo, atinge a cultura e asrelaes de poder.

    Rifkin (1995)caracteriza o movimento da globalizao como uma era demercados globais, de produo automatizada, o processo produtivo vistaquase sem a presena do trabalhador da forma pela qual estamosacostumados, as multinacionais buscando abrir as fronteiras etransformando a vida de bilhes de pessoas para conquistar os mercadosglobais. Ele constata que a dinmica da globalizao poder conduzir ahumanidade a um porto seguro ou a um terrvel abismo. Se de um lado o fim dotrabalho a sentena de morte da civilizao, poder sinalizar tambm algumasmudanas que provocaro um ressurgimento do esprito humano. Enfim, o futuroest em nossas mos.

    Atravs dos tempos, o homem pensou sobre si mesmo e sobre o universo.Contudo, foi apenas no sculo XVIII que uma confluncia de eventos naEuropa levou emergncia da sociologia . Quando os antigos sistemas feudaiscomearam a abrir caminho ao trabalho autnomo que promovia a indstria nasreas urbanas e quando novas formas de governo comearam a desafiar o poderdas monarquias, as instituies da sociedade - emprego e receita, planos debenefcios, comunidade, famlia e religio - foram alteradas para sempre. Como erade se esperar, as pessoas ficaram inquietas com a nova ordem que surgia ecomearam a pensar mais sistematicamente sobre o que as mudanassignificavam para o futuro (Turner, Beeghley e Powers, 1989)

    O movimento intelectual resultante denominado deIluminismo ou Sculodas Luzes , pois a influncia da religio, da tradio e do dogma no pensamento

    intelectual foi finalmente rompida. A cincia agora poderia surgir plenamente comouma maneira de pensar o mundo; j a fsica e, mais tarde, a biologia foi capaz de

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    superar a perseguio realizada pelas elites religiosas e estabeleceram-se comoum caminho para o conhecimento. Junto com o crescimento da influncia dacincia, veio uma avalanche de conceitos sobre o universo social. Muitos dessesconceitos, de carter especulativo, avaliavam a natureza dos homens e asprimeiras sociedades infiltradas pela complexidade do mundo moderno. Partedesses conceitos era moralista, mas no no sentido religioso. Com eles, o tipo

    adequado de sociedade e de relaes entre indivduos (uns com os outros e nasociedade) foi reavaliado com base nas mudanas econmicas e polticasocorridas com o comrcio e, em seguida, com a industrializao. Na Inglaterra,esse novo pensamento foi denominado de Era da Razo; e estudiosos, comoAdam Smith (1776), que primeiramente articulou as leis da oferta e da procura narea de mercado, tambm avaliaram os efeitos, na sociedade, do rpidocrescimento populacional, da especializao econmica em escala, da comunidadeem declnio e dos sentimentos morais debilitados. Na Frana, um grupo depensadores conhecido como filsofos das luzes tambm comearam a exporuma viso do mundo social que defendia uma sociedade em que os indivduoseram livres da autoridade poltica arbitrria e eram guiados por padres morais

    combinados e pelo governo democrtico.Ainda outrainfluncia por trs do surgimento da sociologia aRevoluo

    Francesa , de 1789 acelerou o pensamento sistemtico sobre o mundo social. Aviolncia da revoluo foi um choque para toda a Europa, pois, se tal violncia einfluncia puderam derrubar o velho regime, o que houve para substitu-lo? Como asociedade poderia ser reconstruda a fim de evitar tais eventos cataclsmicos? nesse ponto, nas dcadas finais do sculo XVIII e incio do XIX, que asociologia como uma disciplina autoconsciente foi planejada.

    1.2 PRINCIPAIS PENSADORES DA SOCIOLOGIA

    1.2.1 AUGUSTE COMTE - (1798-1857), o Fundador da Sociologia.

    A herana francesa do Iluminismo e as ondas de choque da RevoluoFrancesa levaram Auguste Comte em seu quinto volume doCurso de FilosofiaPositiva (1830-1842) a examinar a solicitao poruma disciplina dedicada aoestudo cientfico da sociedade . Comte quis chamar essa disciplina de fsicasocial para enfatizar que estudaria a natureza fundamental do universo social, masele foi praticamente forado a determinar o termo hbrido greco-latino, sociologia.

    As mltiplas controvrsias entre os socilogos praticamentedesaparecem quando se trata de determinar a paternidadeda sua disciplina. Quase todos eles concordam que aSociologia comea com a obra de Augusto Comte ( 798 1857). Alm de cunhar o nome da nova cincia, foi deComte a primeira tentativa de definir-lhe o objeto, seusmtodos e problemas fundamentais; bem como a primeiratentativa de determinar-lhe a posio no conjunto dascincias. (GALLIANO, 1981, p.30)

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    O problema central para a sociologia era aquele que tinha sido articulado pelospensadores mais antigos do Iluminismo: como a sociedade deve ser mantida unidaquando se torna maior, mais complexa, mais variada, mais diferenciada, maisespecializada e mais dividida? A resposta de Comte foi que as idias e as crenascomuns precisavam ser desenvolvidas para dar sociedade uma moralidade"universal. Essa resposta nunca foi desenvolvida, mas a preocupao com os

    smbolos e a cultura, como uma fora unificadora para manter a essncia doconceito sociolgico francs, existe at os dias de hoje.

    Uma ttica queComte empregou para fazer com que a sociologia parecesselegtima foi postular alei dos trs estados, na qual o conhecimento est sujeito,em sua evoluo, a passar por trs estados diferentes. O primeiro estado oteolgico, em que o pensamento sobre o mundo dominado pelas consideraesdo sobrenatural, religio e Deus; o segundo estado o metafsico, em que asatraes do sobrenatural so substitudas pelo pensamento filosfico sobre aessncia dos fenmenos e pelo desenvolvimento da matemtica, lgica e outrossistemas neutros de pensamento; e o terceiro estado o positivo, em que acincia, ou a observao cuidadosa dos fatos empricos, e o teste sistemtico deteorias tornam-se modos dominantes para se acumular conhecimento. E com oestado positivo o conhecimento pode Ter utilidade prtica a fim de melhora asvidas das pessoas.

    A sociedade como um todo, bem como o pensamento sobre cada domnio douniverso, evolui atravs desses trs estgios, mas em velocidades diferentes: aastronomia e a fsica, primeiro, depois a qumica e a biologia, e finalmente asociologia surge como o ltimo modo de pensar para entrar no estado positivo. Naviso de Comte, a anlise da sociedade estava pronta para ser reconhecida comocincia - uma reivindicao que era desafiada na poca de Comte, assim comoainda hoje. E como as leis da organizao humana eram desenvolvidas, Comte (1851-1854) acreditava que elas poderiam ser usadas para melhorar a condiohumana - novamente, um tema to controverso hoje quanto na poca de Comte.

    Uma segunda ttica legtima empregada por Comte foi postular ahierarquiadas cincias , na qual todas as cincias eram ordenadas de acordo com suacomplexidade e seu desenvolvimento no estado positivo. Na parte inferior dahierarquia estava a matemtica, a lngua de todas as cincias mais altas nahierarquia, e no topo, surgindo da biologia, estava a sociologia, que num momentode xtase Comte definiu como cincia da humanidade, coroamento de toda aformao cientfica. Pois, se a sociologia foi a ltima cincia a surgir, era tambm amais avanada em relao a seu assunto, como um modo legtimo dequestionamento.

    1.2.2 - HERBERT SPENCER: O Primeiro Socilogo Ingls: (1820-1903)

    Como Comte,Spencer acreditava que os agrupamentos humanos podiam serestudados cientificamente, e em seu notvel trabalhoOs Princpios daSociologia (1874-1896), ele desenvolveu uma teoria de organizao social do

    homem, apresentando uma vasta srie de dados histricos e etnogrficos parafundament-la. Para Spencer, todos os domnios do universo fsico, biolgico,

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    social - desenvolvem-se segundo princpios semelhantes. E a tarefa da sociologia aplicar esses princpios ao que ele denominou de campo superorgnico, ou oestudo dos padres de relaes dentre os organismos.

    Spencer retorna a questo de Comte: o que mantm unida a sociedade quandoesta se torna maior, mais heterognea, mais complexa e mais diferenciada? A

    resposta de Spencer em termos gerais foi muito simples: sociedades grandes,complexas desenvolvem: 1) interdependncias dentre seus componentesespecializados; e 2) concentraes de poder para controlar e coordenar atividadesdentre unidades interdependentes. Para Spencer a evoluo da sociedadeengloba o crescimento e a complexidade que gerenciada pela interdependncia epelo poder. Se os padres da interdependncia e concentraes de poder falhamao surgir na sociedade, ou so inadequados tarefa, ocorre a dissoluo, e asociedade se desmorona.

    Ao desenvolver resposta questo bsica de Comte, Spencer fez uma analogiaaos corpos orgnicos, argumentando que as sociedades, como organismosbiolgicos, devem desempenhar certas funes-chave se elas quiseremsobreviver. As sociedades devem reproduzir-se; devem produzir bens e produtospara sustentar os membros; devem prover a distribuio desses produtos aosmembros da sociedade; e elas devem coordenar e regular as atividades dosmembros. Quando as sociedades crescem e se tornam mais complexas, revelandomuitas divises e padres de especializao, estas funes-chave tornam-sedistintas ao longo de trs linhas: 1) a operacional (reproduo e produo), 2) adistribuidora (o fluxo de materiais e informao), 3) a reguladora ( a concentraode poder para controlar e coordenar).

    Spencer mais bem lembrado por instituir uma teoria na sociologia conhecidacomo funcionalismo. Essa teoria expressa a idia de que tudo o que existe emuma sociedade contribui para seu funcionamento equilibrado ; de que tudo oque nela existe tem um sentido, um significado . A sociologia funcionalistadessa maneira faz uma pergunta bsica e interessante: o que um fenmenocultural ou social faz para a manuteno e integrao da sociedade?

    1.2.3 - MILE DURKHEIM : A Tradio Francesa: (1858-1917)

    O que marca a contribuio de Durkheim sociologia o reconhecimento deque os sistemas de smbolos culturais - ou seja, valores, crenas, dogmasreligiosos, ideologias etc.- so uma base importante para a integrao dasociedade ( J. Turner, 1981). medida que as sociedades se tornam complexas eheterogneas, a natureza de smbolos culturais, ou o que Durkheim (1893)denominou de conscincia coletiva, muda. Em sociedades simples, todos osindivduos tm uma conscincia coletiva comum que regula seus pensamentos eaes, ao passo que em sociedades mais complexas a conscincia coletiva devetambm mudar se a sociedade deve manter-se integrada. Deve tornar-se mais

    generalizada e abstrata a fim de fornecer alguns smbolos comuns dentre aspessoas em atividades especializadas e separadas, ao passo que em outro nvel

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    se torna tambm mais concreta para assegurar que as relaes entre, einteriormente, as posies especializadas e organizaes nas sociedadescomplexas sejam reguladas e coordenadas. A condio social, entretanto, possvel em sociedades grandes, complexas quando h alguns smbolos comunsque todos os indivduos partilham, juntamente com grupos especficos de smbolosque guiam as pessoas em suas relaes concretas com os outros (J. Turner,

    1990). Se esse equilbrio observado entre os aspectos abstrato e especfico ou osgerais e concretos da conscincia coletiva no observado, ento vriaspatologias se tornam evidentes (Durkheim, 1893,1897).

    Durkheim (1912) estudou posteriormente a sociedade num nvel maisinterpessoal, procurando entender a formao daconscincia coletiva . Em seuestudo sobre a religio dos aborgines australianos, Durkheim estava menosinteressado na religio do que nos processos interpessoais que produzem aconscincia coletiva. O que ele descobriu foi o significado da interao entre aspessoas, como isso produzia o sentimento de que h uma fora sobrenaturalacima e alm delas. Ao compreender o poder dessa fora que nascia da animaoe energia das interaes, os aborgines construram totens e se engajaram emrituais para honrar as foras sobrenaturais, agora simbolizadas pelos totens. Dessaobservao, Durkheim concluiu que a adorao aos deuses e ao sobrenatural , narealidade, a adorao da prpria sociedade e dos vnculos gerados pela interaoentre as pessoas. Assim, a cola que mantm unida a sociedade sustentadapelas interaes concretas entre os indivduos.

    1.2.4 - KARL MARX (1818-1883)

    Marx sentiu que cada poca histrica era construda em torno de um tipoespecfico de produo econmica, organizao de trabalho e controle depropriedade, revelando, assim, sua prpria dinmica. Para Marx, a organizao deuma sociedade num momento histrico especfico determinada pelasrelaesde produo , ou a natureza da produo e a organizao do trabalho . Assim, aorganizao da economia o material-base, ou, em seus termos, a infra-estrutura,que descreve e dirige a superestrutura, que consiste de cultura, poltica e outrosaspectos da sociedade. O funcionamento da sociedade humana deve serentendido por sua base econmica (Marx e Engels, 1846).

    Para Marx (1867), h sempre o que ele denominou decontradies prpriasna estrutura da base econmica. Por exemplo, no capitalismo ele viu que aorganizao da produo ( em fbrica) se encontrava em contradio quanto propriedade privada de bens e obteno de lucro por poucos a partir do trabalhocooperativo de muitos. Quais sejam os mritos desse argumento, Marx tem comobase da contradio nas sociedades humanas as relaes entre aqueles quecontrolam os meios de produo e aqueles que no. Argumentando dessa forma,Marx tornou-se a inspirao para a linha de estudo da sociologia conhecida como ateoria do conflito ou a sociologia do conflito. Desse ponto de vista, todas

    as estruturas da organizao social revelam desigualdades que levam aoconflito, em que aqueles que detm ou controlam os meios de produo

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    podem consolidar o poder e desenvolver ideologias para manter seusprivilgios, enquanto aqueles sem os meios de produo eventualmenteentram em conflito com os mais privilegiados (Marx e Engels, 1848). Nomnimo, h sempre uma contradio ardente entre as relaes de produo nossistemas sociais, e essa luta de classes , ou seja, conforme a percepo deMarx quanto a essa questo, periodicamente explode esse conflito aberto e uma

    mudana social.A anlise sociolgica deve, portanto, concentrar-se nas estruturas de

    desigualdade e nas combinaes entre aqueles com poder, privilgio e bem-estar material, por um lado, e os menos poderosos, privilegiados ematerialmente abastados, por outro . Para Marx e as geraes subseqentes deestudiosos do conflito, a ao est dentro da organizao social humana.

    H ainda outra importante faceta do trabalho de Marx: a funo militante dosocilogo. O objetivo da anlise expor a desigualdade e a explorao emsituaes sociais e, assim fazendo, desempenhar papel militante para superaressas condies. Os socilogos no devem apenas ficar na platia; eles devemtrabalhar para mudar o mundo social de modo a reduzir as desigualdades e adominao de um segmento da sociedade pelo outro. Marx prope a superao domodo de produo capitalista e a uma nova forma de produo com base nocoletivismo. Esse programa permanece ainda como fonte de inspirao paramuitos socilogos que participam como militantes no mundo social.

    1.2.5 - MAX WEBER (1864-1920)

    Weber enfatizava que a desigualdade multidimensional e noexclusivamente baseada na economia, que o conflito contingente emcondies histricas e no o resultado inevitvel e inexorvel da desigualdade,e que a mudana poderia ser causada pelas idias assim como a base material eeconmica de uma sociedade. Ele tambm realou quea sociologia deve olhartanto para a estrutura da sociedade como um todo para os significados que osindivduos conferem para essas estruturas. Como Marx, ele duvidava de quehouvesse leis gerais da organizao humana, mas, ao contrrio de Marx, ele sentiaque necessrio que sejam isentas de juzos de valor, ou objetivas, na descrio eanlise dos fenmenos sociais.

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    2 - A SOCIOLOGIA HOJE

    A sociologia agora uma rea ampla e diversa que analisa todas as facetas dacultura, da estrutura social, do comportamento e interao e da mudana social.

    2.1 - AS PRINCIPAIS CORRENTES TERICAS E AS POSSIBILIDADES DEANLISE CIENTFICA DOS PROBLEMAS SOCIAIS.

    2.1.1 - TEORIZAO FUNCIONAL

    V o universo social como umsistema de partes interligadas (Turner eMaryanski, 1979)

    As partes so analisadas em termos de suas conseqncias, ou funespara o sistema maior;

    Uma parte examinada com respeito a como se preenche uma necessidadeou requisito do todo

    As teorias funcionalistas nos levam a ver o universo social, ou qualquerparte dele, como um todo sistmico cujos elementos constitutivos funcionamem conjunto; ou seja, o funcionamento de cada elemento temconseqncias sobre o funcionamento do todo.

    Problema: as teorias funcionalistas freqentemente vem as sociedades comodemasiadamente bem integradas e organizadas.

    2.1.2 - TEORIAS DO CONFLITO

    Expoentes: Karl Marx e Max Weber

    Vem o mundo social segundo suascontradies Vem os fatos sociais cheios de tenso e contradies (Collins , 1975)

    A desigualdade afora que move o conflito O conflito a dinmica central das relaes humanas As contradies se manifestam em formas distintas de conflito O conflito uma contingncia bsica da vida social

    2.1.3 - TEORIAS INTERACIONISTAS

    Os homens interagem emitindo smbolos palavras, expresses faciais,corporais ou qualquer sinal que signifique algo para os outros e para si

    mesmos (Goffman)

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    Atravs de gestos simblicos demonstramos nosso estado de esprito,intenes e sentido de ao; e contrariamente, pela leitura dos gestos dosoutros, obtemos um sentido do que eles pensam e como eles decomportaro.

    a vida social est mediada porsmbolos e gestos ; Usamos esses gestos para nos entendermos uns com os outros, para

    criarmos imagens de ns mesmos e das situaes e construirmos uma idiade situaes futuras ou desejadas. Para os interacionistas, a explicao da realidade social deve emanar da

    investigao meticulosa do micro mundo dos indivduos que mutuamenteinterpretam os gestos, que constroem as imagens de si prprios e definem asituaes segundo certos princpios.

    As macros ou grandes estruturas da sociedade o Estado, a economia, aestratificao e similares so construdos e sustentados por microinteraes.

    Para os interacionistas seria impossvel entender o mundo social seminvestigar esses encontros no micro nvel.

    2.1.4 - TEORIAS UTILITARISTAS

    Vem os homens como racionais at o ponto em que eles tm objetivos efinalidades;

    Calculam os custos das vrias alternativas para atingir esses objetivos eescolher a alternativa que maximize seus benefcios (ou o que oseconomistas chamam de utilidade e minimizar seus custos).

    Para os tericos utilitaristas, todas as relaes sociais so, em ltimaanlise, trocas entre atores que incluem custos a fim de obter benefciosuns dos outros, ou seja, que calculam a relaocusto benefcio.

    A interao, a sociedade e a cultura so criadas e sustentadas porque elasoferecem bons resultados para indivduos racionais.

    Esses resultados raramente so monetrios; em geral, eles so possesmenos tangveis sentimentos pessoais, afeio orgulho, estima, poder, controle eoutras moedas suaves que estruturam a sociedade.

    II. RELAO HOMEM/NATUREZA: A QUESTO DOTRABALHO NA PERSPECTIVA ANTROPOLGICA E

    SOCIOLGICA

    1 - A RELAO ENTRE O HOMEM E A NATUREZA NAS VRIASSOCIEDADES DA PERSPECTIVA DO TRABALHO E DA CULTURA.

    A questo do trabalho e as diversas sociedades. As vrias formas de trabalho: escravo, servil e assalariada. As transformaes recentes no mundo do trabalho.

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    1.1 - A QUESTO DO TRABALHO E AS DIVERSAS SOCIEDADES.

    A palavra trabalho vem do latimtripalium :

    Tripalium era um instrumento feito de trs paus aguados, algumas vezes aindamunidos de pontas de ferro, no qual os agricultores bateriam o trigo, as espigasde milho, para rasg-los, esfiap-los. A maioria dos dicionrios, contudo, registratripalium apenas como instrumento de tortura, o que teria sido originalmente, ouse tornado depois. Atripaliumse liga o verbo do latim vulgartripaliare , quesignifica justamente torturar.

    Essa uma faceta da realidade evocada no termo trabalho, aquela que revela dureza, a fadiga, a dificuldade, irreversivelmente constitutiva da vida humana.Talvez por isso no seja incomum encontrar no repertrio simblico de diversasculturas tal percepo do trabalho como pena.

    O nico ser vivo capaz de agir alm daquilo que seu equipamento biolgicopermite de imediato o homem. Ele no provido de asas e de estruturassea favorvel ao vo, mas voa inventando um avio. Ele no est equipadopara retirar oxignio diretamente da gua, mas isso no o impede de descerao fundo dos mares, seja em submarinos, seja por intermdio deequipamentos apropriados como tanques de oxignio, escafandros, mscaras,etc. Tudo isso indica que o homem um animal mpar. Embora permanecendoanimal, livra-se dos laos que o prendem natureza.

    O trabalho um fazer exclusivo do ser humano. Determinado materialmentecomo corpo, como organismo, ele dotado de vida. E a vida humana suplanta asua dimenso biolgica, corprea, orgnica e deixa de ser somente fato para sertambm um valor.

    Os gregos dados s mincias da intuio e aos refinamentos da razo,deixaram reflexes argutas sobre a questo do trabalho e parecem menosingnuos do que os contemporneos. freqente encontrarmos, nos textos daGrcia clssica, formulaes em que aparece o desprezo pelo trabalho e o culto danica atividade digna do homem livre: o cio dos filsofos. Embora tais idiasexpressem verdades, vale a pena tomar conhecimento das reflexes de umacategorizada autora contempornea, Hannah Arendt (1897:94-5), historiadora

    norte-americana de origem alem: Ao contrrio do que ocorreu nos tempos modernos, a instituio daescravido na Antigidade no foi uma forma de obter mo-de-obrabarata nem instrumento de explorao para fins de lucro, mas sim atentativa de excluir o labor das condies da vida humana. Tudo oque os homens tinham em comum com as outras formas de vida animalera considerado inumano. (Essa era tambm, por sinal, a razo da teoriagrega, to mal-interpretada, da natureza inumana do escravo. Aristteles,que sustentou to explicitamente a sua teoria para depois, no leito demorte, alforriar seus escravos, talvez no fosse to incoerente comotendem a pensar os modernos. No negava que os escravos pudessemser humanos; negava somente o emprego da palavra homem paradesignar membros da espcie humana totalmente sujeitos

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    necessidade.) E a verdade que o emprego da palavra animal noconceito de animal laborans, ao contrrio do outro uso, muito discutvel,da mesma palavra na expressoanimal rationale , inteiramente

    justificado. Oanimal laborans , realmente, apenas uma das espciesanimais que vivem na Terra - na melhor das hipteses a maisdesenvolvida.

    Percebe-se que, para os antigos gregos, no estava presente a adesoirrefletida escravido e uma rejeio dotrabalho como algo indigno em simesmo . A se crer nas advertncias de Hannah Arendt, eles produziram talinterpretao da realidade humana do trabalho que o problema da tensoentre liberdade da razo e a necessidade do labor se exprimia nacontradio entre oanimal laborans e o animal rationale.

    1.1.1 - AS VRIAS FORMAS DE TRABALHO: ESCRAVO, SERVIL E

    ASSALARIADA.A justificativa da escravido , feita por Aristteles em sua Poltica ,

    mais que exprimir a apologia da ascendncia de uma homem sobre outro,de um homem que se apropria de outro para explor-lo, para auferir lucro,aponta a percepo de uma contradio que perpassa todas as dimensesda vida humana e que, no caso do trabalho, apresenta-se sempre como umdesafio entre liberdade e necessidade.

    Os historiadores modernos, assumindo muitas vezes acriticamente osreparos e as acusaes que os renascentistas faziam Idade Mdia,

    generalizaram a concepo de que foi um perodo de trevas. Com talafirmao queriam indicar que, entre os sculos V e XV, o pensamento naEuropa ficou enclausurado pela necessidade que a Igreja tinha de submetero conhecimento f, de modo que o uso do argumento de autoridadegeneralizou-se, impedindo que se pensasse em direo no-autorizada poressa mesma f.

    O trabalho , que durante a Antigidade grega se realizava sob forma geralda escravido, assume, na Idade Mdia, a forma geral da servido . A quedado Imprio Romano provocou mudanas na vida das cidades, com o conseqenteenfeudamento. Por toda a Europa desenvolveu-se uma sociedade ondecontingentes populacionais punham-se sob a proteo de senhores da terraprestando-lhes homenagem (promessa de fidelidade do vassalo ao senhor feudal).As condies gerais dos exerccios da atividade produtiva eram, portanto,anlogas, isto , sob certos aspectos, semelhantes s da Antigidade grega.

    Do ponto de vista intelectual, o panorama medieval foi dominado pelas duassnteses filosficas das verdades crists elaboradas porSanto Agostinho , nosculo V, e por Santo Toms de Aquino , no sculo XIII. Essas sntesestraduziam o credo cristo utilizando as referncias filosficas dos gregos,respectivamente Plato e Aristteles . Elas influenciaram as reflexes sobre ohomem, incluindo aquelas sobre o fazer humano, sobre o trabalho.

    Durante a Antigidade grega a preocupao em reafirmar a liberdade do

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    homem no mbito da necessidade levou a uma viso do trabalho que oconsiderava indigno e servil, medida que atava o homem ao reino danecessidade.

    Na Idade Mdia permanece a influncia terica de Plato e Aristteles e, porisso o problema pensado mais ou menos nos mesmos termos, mas j com uma

    diferena marcante.Santo Toms de Aquino considera o trabalho um bem . Um bem rduo,

    mas um bem. Tanto que o papa Joo Paulo II utilizou o texto do telogo medievalcomo fonte de inspirao para fazer uma veemente e explcita afirmao daintrnseca dignidade do trabalho humano.

    Com o fim da Idade Mdia, irrompeu oRenascimento. Esse complexomovimento de natureza filosfica, cientfica e artstico-cultural, ocorrido nossculos XV e XVI, revolucionou a Europa medieval e lanou as bases de umanova concepo do trabalho. Inaugurou uma era de inverso das concepes

    sobre o trabalho humano que chegou ao auge nas proposies deglorificao do trabalho prprias da modernidade.

    Tal trajetria teve muitas fases diferenciadas, muitos meandros, muitosdesdobramentos, e se manifestou em diversos mbitos da vida humana. Issodesde o filosfico-cultural at o poltico-econmico e religioso, formando ummosaico rico, variado e complexo e deixando suas marcas tambm na dimensotcnico-cientfica. Isso se explica pelo fato de que a partir da revoluo cientfica doRenascimento e com uma retomada de mpeto naRevoluo Industrial, astransformaes sociais e econmicas foram cada vez mais cleres e amplas,espalhando-se por todo o mundo e atingindo direta ou indiretamente umcontingente populacional maior.

    Essas transformaes encontram uma expresso vigorosa e diversificada noplano religiosos a partir do desenvolvimento de uma tica religiosa do trabalhona Reforma Protestante. Sua expresso mais forte est no calvinismo queentende o sucesso no trabalho e nos negcios como provvel ndice dapredestinao para a salvao e, portanto, como sinal dabeno divina . ParaJoo Calvino (1509-1564), o homem se salva independentemente de suas obras, edeve viver o cristianismo no mundo atravs de uma moral rgida da simplicidadedo trabalho e da honestidade.

    No que diz respeito ao campo econmico, o momento marcante dessainverso, cuja trajetria analisa-se agora, encontra-se nos sculos XVII e XVIIIcom o desenvolvimento daeconomia poltica .

    Os fisiocratas deslocaram o eixo da investigao econmica, pondo emevidncia a produo dos bens, e atriburam, a criao denovos valores agricultura [Franois Quesnay ( 1694 1774) e Anne Robert Jacques Turgot ( 1727-1781)].

    Os principais representantes da escola clssica sedimentaram uma

    viso da economia segundo a qual o valor se identificava unicamente notrabalho em geral, fosse agrcola ou industrial [William Petti ( 1623-1697),

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    Adam Smith (1723-1790) e Davi Ricardo (1772-1823)]. Posteriormente,KarlMarx (1818-1830 foi alm dos economistas clssicos quando elaborou ateoria da mais-valia e identificou no trabalho no s afonte de todovalor, mas principalmente o seucarter social atravs de uma minuciosarede de conceitos e distines.

    No terreno filosfico, a mais alta contribuio para a reviravolta naconcepo acerca do trabalho se exprimiu na filosofia de Georg W. FriedrichHegel ( 1770-1831). Eled ao trabalho uma importncia capital noprocesso pelo qual o homem toma conscincia de si mesmo, pois essaconscincia apenas se desenvolve quando o homem se encontra com osdemais no processo de criao do prprio mundo . O trabalho aparece,ento, como lugar da conquista da subjetividade, da conscincia em si.

    Porm, antes que o homem chegasse ao mundo contemporneoostentando uma nova concepo do trabalho, orgulhoso de sua obra dedomnio das foras naturais, embevecido com as maravilhas que ele vinha

    alcanando e com o futuro de progresso e conforto que se avizinhava,soaram alguns alarmes.

    Explorao ou libertao

    O rudo mais forte foi produzido por Karl Marx, que, ao analisar o modo deproduo capitalista, encontra um de seus fundamentos na alienao dotrabalho umbilicalmente ligada existncia da propriedade privada. Eledenuncia o fetichismo da mercadoria, o alheamento do homem diante do queproduz, o fato de que as relaes entre os homens se do como relaesmateriais entre coisas, enquanto as relaes entre coisas se do comorelaes sociais entre pessoas.

    Mas, desde o sculo XV e at o sculo XIX, sculo em que Marx viveu eescreveu, vrias obras e reflexes, tanto quanto tentativas de ao,problematizaram a questo do trabalho e da vida humana, de modo arevelarem as contradies que dilaceravam os homens, enquanto estesproduziam suas prprias condies de vida na sociedade que semodernizava.

    Tommaso Campanella (1568-1639), Thomas Morus (1478-1535), ossocialistas utpicos, Franois Marie Charles Fourier (1772-1837), Pierre JosephProudhon ( 1809-1865), Claude Henry de Rouvroy Saint-Simon ( 1760-1825),Robert Owen (1771-1859), o igualitarista Franois Noel Babeuf ( 1760-1797) foramhomens cujas aes e escritos agitaram o tempo em que viveram, tratando daquesto do trabalho, do poder, da vida social e econmica. Suas atividadesintelectuais e aes tragicamente crticas exprimiram a crena no trabalhocomo lugar de libertao e no de alienao e explorao.

    Como se v, a concepo de trabalho desde os gregos at a Idade Moderna bastante diversificada. Aqui aparecem apenas algumas breves indicaesdessa trajetria.

    A partir da modernidade, passando tambm pela valorizao das artes

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    mecnicas consagradas pelos enciclopedistas, pela crena na razo comoinstrumento de domnio da natureza e como construtora da liberdade, doprogresso e da felicidade, chega-se ao mundo contemporneo.

    Mas, nem bem o homem havia vislumbrado um futuro promissor durante ofinal do sculo XIX, pois tinha, ento, diante de si, o horizonte do progresso e

    do conforto que o trabalho criara, o incio do sculo XX encarregou-se de dar-lhe um grande susto. A cincia, cuja aplicao prometia um mundo em que ohomem caminharia a passos firmes para reduzir o mbito da necessidade eaumentar o espao de liberdade ,transformou-se em arma mortal. Veio aPrimeira Guerra Mundial, a crise de 1929, outra guerra mundial e, refeita dosusto, mas ainda temerosa, a humanidade no ps-guerra recuperou aesperana de viver num mundo de estabilidade e progresso.

    1.1.2 -AS TRANSFORMAES RECENTES NO MUNDO DO TRABALHO.

    Hoje, (...), a humanidade encontra-se no meio de outra grande crise.Um se seus aspectos mais preocupantes a ameaa de desempregoestrutural. Enquanto o homem avana para uma situao sempre toalmejada, de Ter disposio meios de reduzir a fadiga e esforo notrabalho, vive a contradio de reduzir postos de trabalho numa velocidademaior do que talvez as sociedades possam suportar sem criar sriosdesequilbrios. Assim, a questo de se saber que direo dar a esse processoe de encontrar uma adequada forma de ordenamento da vida , do trabalho eda apropriao de seus frutos, obriga o homem a pensar na problemtica dasrelaes humanas, que se tornam cada vez mais conflituosas.

    medida que se relaciona com os outros homens e com a natureza, ohomem constri o seu mundo histrico e produz a sua existncia. neste aspectoque ele se diferencia dos outros animais, ao adaptar a natureza s suasnecessidades, ou seja, diferencia-se pelo trabalho. Portanto, para o homemcontinuar existindo, ele precisa produzir continuamente atravs do trabalho; assim,a sua vida passa a ser dominada pelo modo como produz sua existncia.

    Com a consolidao do capitalismo no sculo XVIII, mais uma veztornou-se necessrio dominar a natureza a favor do homem. E na indstria quedever ser investido. Ser preciso ento incorporar a cincia no processoprodutivo.

    Ainda durante o sculo XVIII, o movimento histrico imps umrompimento com a organizao da sociedade baseada nos privilgios denascimento, em que a nobreza e o clero viviam, custa de cargos doaparelho do Estado. Para estas classes, especialmente para a nobreza, o trabalhoera indigno. O envolvimento em atividades mercantis e industriais significaria a

    perda dos seus privilgios.Neste sentido, medida que a sociedade capitalista se desenvolve, rompe-se

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    com a estratificao social e com a idia de servido, at ento dominante. Ohomem passa a ser livre para dispor , como quiser, da sua propriedade, quesignificava, segundo o liberalismo nascente, a sua vida, a sua liberdade e osseus bens. Assim, o trabalhador do campo, ainda preso terra, pode considerar-se proprietrio da sua fora de trabalho e vend-la aos donos dos meios deproduo (proprietrios); pois a sociedade que estava se consolidando era uma

    sociedade de proprietrios livres.A sociedade se organizava a partir da indstria e incorporava a cincia

    ao processo produtivo. A burguesia, ento, procurava constituir-se como classehegemnica. Defendia uma sociedade igualitria, com escolarizao obrigatria,gratuita e universal, uma vez que a escola correspondia s necessidades doprogresso e formao do cidado. At ento, a educao era privilgio depoucos.

    Alguns tericos perceberam o avano para a modernidade.Adam Smith (1723-1790), economista que viveu no sculo XVIII, foi um deles. Ele procurou

    romper com o mercantilismo ( poltica econmica que norteava o comrcio),ainda predominante nesse sculo. Mostrou que a riqueza no se originava docomrcio , mas do trabalho. Contrariou desta forma, os privilgios do clero eda nobreza, que desprezavam o trabalho. Afirmou tambm que, para otrabalhador possuir um pensamento mais gil e dar conta do processoprodutivo que a modernidade exigia, era necessria a educao bsica paratodos, instruo para os trabalhadores, porm, em doses homeopticas. Ouseja, 0trabalhador precisava somente de um mnimo de instruo para quepudesse produzir de forma eficiente, mas sem ultrapassar este mnimo.

    Como estabelecer o limite deste mnimo que o trabalhador devedominar? Frederick Winslow Taylor (1856 1915) vai se ocupar destaquesto. Sua preocupao centrou-se em detectar um mtodo cientfico paraaumentar a produtividade do trabalho, evitando a perda de tempo da produo.Nas suas investigaes, Taylor percebeu que, na fbrica, mesmo havendo aseparao entre o saber e o fazer, o trabalho era ensinado oralmente, pelosprprios operrios. Considerou, ento, fundamental tornar cientfica esta prtica.Acreditava que cada movimento do operrio possua uma cincia que deveriaser estudada por cientistas do trabalho, separando as fases de planejamentoe de direo da produo da execuo. Ou seja, o saber do trabalhador deveriaser apropriado pelo capital, garantindo a eficincia no processo de produo eimpondo ao operrio o tempo e o ritmo do seu trabalho.

    Taylor props que se tornassem cientficos os movimentos do trabalhador,controlados pela gerncia. Henry Ford (1886-1947) avana as inovaestayloristas , introduzindo as linhas de montagem nas quais a esteira e ossistemas automticos impem o ritmo da produo.

    O trabalhador no precisava se locomover, pois as peas iam at ele. Ooperrio se confundia com a prpria mquina. Esse mtodo exigia apenas umaatividade motora e dispensava qualquer iniciativa prpria.

    O homem foi reduzido a gestos mecnicos. Charles Chaplin faz, no seu filmeTempos Modernos , uma crtica aos mtodos pensados por Taylor e Ford.

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    1.1.3 - O TRABALHO NA POCA CONTEMPORNEA

    Hoje, com a construo de um mundo sem fronteiras e com aglobalizaoda economia, impe-se, revolucionariamente, a microeletrnica e a robticatrazendo inovaes a uma velocidade meterica. Porm, ainda vivemos umatransitoriedade para as novas tecnologias, pois o mundo da produo aindaconvive com os paradigmas tradicionais dotaylorismo /fordismo. Por outrolado, vivencia tambm a automao, a flexibilizao e a integrao.

    De qualquer maneira, o que se verifica que dos anos 70 ( sc. XX) emdiante, uma inovao tecnolgica possua uma durao de dois anos, hoje,no dura seis meses e, dependendo da rea do saber, dura alguns dias, ou,s vezes, horas.

    A cincia, que era dissociada do trabalho, torna-se fora produtiva com asnovas tecnologias. Vrias empresas, nos dias atuais, exigem que seusfuncionrios leiam os jornais diariamente, justificando que quem no seinforma no consegue acompanhar ou resolver os problemas colocados pelocotidiano.

    A bagagem de conhecimento que um profissional recm formado adquiriuna universidade estar defasada se ele no estudar constantemente. Emoutras palavras, o mundo do trabalho s absorver quem for capaz de aprenderconstantemente.

    Perfil exigido do profissional hoje: Saber trabalhar em equipe; Ser estudioso; Ter uma viso global das coisas; Saber liderar mudanas; Ser flexvel; Busca aprendizado contnuo

    De uma poca em que se cultuou o trabalho como meio pelo qual ohomem afirmava sua soberania perante a natureza, dominando-a econstruindo um novo mundo a poca moderna -, chegou-se a um tempo emque o culto no mais o do trabalho, mas o do lazer, do tempo livre a pocacontempornea.

    Tudo agora interpretado em termos de eficincia, de eficcia, deprodutividade. O ideal de qualidade total, que se tornou uma das divisas dacontemporaneidade, significa exatamente isto: nenhuma atitude, nenhuma ao,nenhum gesto que possa ser substitudo por um outro em que a relao entre

    esforo despendido versus resultado alcanado mais favorvel, devepermanecer.

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    Doravante todas as escolhas, seja a de uma opo de investimento, seja ada escola de um filho, seja a de um mdico, seja a de uma namorada, ou deuma religio, ou mesmo de um representante no Congresso Nacional, devemseguir o mesmo critrio que orienta a escolha de um detergente ou saboem p nas gndolas de um supermercado, isto , a relao custo/benefcio.

    Isso aconteceu e acontece, entre outros motivos, pelo transbordamento daracionalidade tcnica do mundo da industrializao para todas as outrasinstncias da vida. No mundo moderno, o homem potencializou o rendimento dotrabalho pelo aprendizado, pelo conhecimento das foras naturais e pelamultiplicao da capacidade de uso dos recursos que a natureza lhe oferece.Mas os problemas da advindos so as campainhas de um alarme que nocessa de soar, indicando que o sucesso obtido pela humanidade no plano desua ao material de transformao da natureza no pode se dissociar dareflexo sobre o homem e sobre as circunstncias e a finalidade de suaao.

    A experincia tem chamado a ateno para o fato de que , talvez, tentaralcanar o objetivo da maximizao do rendimento do trabalho em detrimentoda reflexo sobre o contedo humano desse processo pode levar ahumanidade a um malogro que, contraditoriamente, efetuar-se-ia exatamenteno momento em que ela chegasse ao ponto mais alto de domnio da naturezavivenciado em sua histria.

    2- EVOLUO DO TRABALHO

    Texto para Refletir

    ALENCASTRO

    A origem da palavra trabalho deriva do latim vulgartripalium , que era onome de um instrumento formado por trs paus aguados, com o qual osagricultores batiam o trigo, as espigas de milho, o linho, para rasg-los, esfiap-los.

    A maioria dos dicionrios, contudo, registratripalium como um instrumento detortura, o que teria sido no incio ou se tornado depois. O fato que este termoest ligado idia de tortura e sofrimento, sentido esse que se perpetua at hoje,principalmente nos povos de lngua latina.

    De uma forma muito simplificada, podemos entender o trabalho como sendoa aplicao da energia humana (fsica e mental) em uma atividade determinada etil. Pelo trabalho, como j dissemos, o homem se torna capaz de modificar aprpria natureza, colocando-a a seu servio.

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    O trabalho exercido de forma qualificada, mediante um preparo tcnico-cientfico, especfico para determinada atividade comumente chamado deprofisso. A profisso supe continuidade e no uma atividade ocasional e tambmstatus social. A atividade de um engenheiro, por exemplo, uma profisso, poisexigiu a capacitao de algum para exerc-la.

    Na linguagem bblica, a idia de trabalho tambm est ligada a do

    sofrimento e de punio:"Ganhars o seu po com o suor de seu rosto"(livro doGnese). Assim, por um esforo doloroso que o homem sobrevive na natureza.Os gregos consideravam o trabalho como a expresso da misria do homem, oslatinos opunham ootium (lazer, atividade intelectual) ao vilnegotium (trabalho,negcio). Mas ser que sempre foi assim? Podemos dizer que, considerado o "potencial de mo-de-obra" de uma sociedade,ou seja, suas foras produtivas, o trabalho usa para o desempenho de seu papelelementos materiais como a terra, animais, metais, ferramentas, energia, mquinase outros insumos, tambm conhecidos como meios de produo. De acordo com aestruturao da propriedade e da manipulao desses meios de produo nasociedade em cada etapa histrica, configura-se o seu modo deproduo , que, emoutras palavras, se funda no tipo de relacionamento ou relaes de produoexistentes entre o trabalho e os detentores dos meios de produo.

    J nas sociedades primitivas o homem sentiu necessidade de lanar mo dotrabalho que, em sua funo mais primordial, era a defesa da unidade do cl, numaluta constante contra os perigos oferecidos pela natureza, seu clima hostil e osanimais selvagens.

    Foi pelo trabalho, ainda na era Neoltica, que o homem descobriu que agiamelhor em comunidade do que sozinho ou em seu pequeno grupo familiar.Constatou que era um ser social, e adotou um estilo de vida comunitrio, comfortes reflexos sobre a vida moral da poca.

    H milnios, desde o surgimento da propriedade privada dos meios deproduo, a prtica dominante nas relaes de trabalho ocidentais foi oescravismo, ou seja, o emprego do trabalho escravo na agropecuria, extraomineral e comrcio.

    Os gregos antigos, desprezavam o trabalho, deixando-o para os escravos,valorizando a nica atividade considerada digna de um homem livre, que era o ciodos filsofos. Buscavam inclusive inmeras justificativas ticas para a escravido.

    Para Aristteles a diferena entre os homens era natural, no havendoqualquer contradio na diviso existente, entre o trabalho manual e as atividadesintelectuais e polticas. Segundo o filsofo a superioridade dos cidados explicava-se pelo fato de que eles definiam o sentido das coisas, fossem elas econmicas,sociais ou polticas. O cidado grego no exercia o trabalho braal pois tinha de tertempo livre para se dedicar filosofia e ao exerccio da cidadania. Para que issofosse possvel os escravos executavam todas as atividades inferioresdeterminadas pela vontade das classes superiores.

    Durante cerca de mil anos, perodo que foi da desagregao do ImprioRomano Idade Mdia, as relaes de produo na Europa Ocidental evoluramdo escravismo puro ao servilismo, ou seja abrandava-se a sujeio homem-homem, passando-se a outra menos direta, transformadora do homem em "servode gleba", virtual prisioneiro da terra em que vivia, consumindo quase tudo queproduzia, e produzindo por suas prprias mos quase tudo de que necessitava. AIgreja Catlica, pregando a adorao a Deus defendia o desapego s riquezasterrenas. Preocupada em organizar e manter seu poder temporal, ela condenava otrabalho como forma de enriquecimento. O trabalho era visto apenas como meio de

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    subsistncia, de disciplina do corpo e purificao da mente. Assim servia comoinstrumento de dominao social e de condenao a qualquer rebeldia contra aordem estabelecida.

    A ociosidade entre as classes senhoriais, assim como ocorrera na Grciaantiga, no era sinnimo de preguia, mas de absteno s atividades manuaispara se dedicarem a funes mais nobres como a poltica, a guerra, a caa, o

    sacerdcio e o exerccio do poder.A partir do sculo XI a sociedade medieval europia sofreu profundastransformaes. O renascimento do comrcio e das cidades afetou e foi afetadopelas transformaes do trabalho e das relaes de produo. Da at os sculosXVI e XVII a economia ampliou-se sucessivamente do restrito mbito local aoregional, deste ao nacional (com a formao dos chamados estados nacionaismodernos) e ao internacional: do quase nenhum mercado e escassa circulaomonetria da Idade Mdia, chega-se a economia do dinheiro e dos mltiplosmercados dos sculos XVII-XVIII, com base no crescimento agrcola, naexplorao colonial da Amrica-frica-sia e na diversificao do artesanato, cadavez mais se diferenciando em indstria.

    A crise da ordem feudal, fundada na subsistncia e na servido, e odesenvolvimento do comrcio e das atividades manufatureiras deu origem a umanova estrutura social: a sociedade capitalista.

    O crescimento do mercado no s ir conviver por algum tempo com antigasformas de servido, como far renascer a escravido: o trabalho compulsrio deafricanos nas colnias da Amrica.

    Mas, para as elites que comandavam a implantao desse sistema, otrabalho livre era a forma ideal.

    Essa por excelncia a concepo burguesa da liberdade individual dohomem: ele livre para usar a fora de seu corpo como uma mquina natural epara escolher de forma soberana o que deseja para si mesmo. Se ao escravo naAmrica no era dada a oportunidade da escolha, ao trabalhador europeu eraconcedido o direito soberano da liberdade.

    Porm a busca da produo de excedentes para a troca no mercadomediante a introduo de novas tcnicas de produo e de organizao dotrabalho fazia desaparecer a propalada livre escolha. Afinal, como seria possvel otrabalhador sobreviver numa economia de mercado, seno submetendo-se simposies de quem detinha os recursos que o sistema exigia? Aquele arteso,que na manufatura medieval detinha as ferramentas e uma autonomia no uso deseu tempo, desaparece, submetendo-se ao capital.

    Ocorre, portanto, a separao entre o trabalhador e a propriedade dos meiosde produo (capital, ferramentas, mquinas, matrias-primas, terras). Dessemodo, podemos afirmar que a essncia do sistema capitalista encontra-se naseparao entre o capital e o trabalho.

    Essa separao criou dois tipos de homens livres: o trabalhador livreassalariado, que vive exclusivamente de seu trabalho, ou seja, da venda de suafora de trabalho, e o burgus, ou capitalista, proprietrio dos meios de produo.A novidade em relao aos modelos anteriores de sociedade que, ao conceder aliberdade para todos os indivduos, a sociedade estabeleceu uma espcie decontrato social, em que ficavam definidos os direitos e deveres de cada parte.

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    2.1 -A TICA CAPITALISTA DO TRABALHO

    Se o trabalho como fator de enriquecimento pessoal era proibido na IdadeMdia, legitima-se agora, na tica da sociedade capitalista, como tbua desalvao divina. A riqueza no mais vista como pecado, mas como estando de

    acordo com a vontade de Deus. Trata-se de uma vontade que se confunde com osinteresses do mercado e do lucro, e que valoriza o trabalho enquanto forapassvel de gerar riqueza. Ele deixa de existir apenas para atender snecessidades humanas bsicas. Sua finalidade principal produzir riquezaacumulada.

    Max Weber, em sua"tica Protestante e o Esprito do Capitalismo" diz queesta necessidade de acumulao de riquezas ultrapassou os limites do bom sensocomercial e passou a ser um fim em si mesmo, uma concepo de vida, umethos. Deixemos que ele fale:

    De fato, o summum bonumdesta "tica", a obteno de mais e mais dinheiro,combinado com o estrito afastamento de todo gozo espontneo da vida , acima detudo, completamente destitudo de qualquer carter eudemonista ou mesmohedonista, pois pensado to puramente como uma finalidade em si, que chega aparecer algo de superior "felicidade" ou "utilidade" do indivduo, de qualquer formaalgo de totalmente transcendental e simplesmente irracional. O homem dominadopela produo do dinheiro, pela aquisio encarada como finalidade ltima de suavida. A aquisio econmica no mais est subordinada ao homem como meio desatisfazer as suas necessidades materiais. Esta inverso do que poderamoschamar de relao natural, to irracional de um ponto de vista ingnuo, evidentemente um princpio orientador do capitalismo, to seguramente quanto ela estranha a todos os povos fora da influncia capitalista. Mas, ao mesmo tempo, elaexpressa um tipo de sentimento que est inteiramente ligado a certas idiasreligiosas. Ante a pergunta: Por que se deveria "fazer dinheiro do ganho doshomens?" o prprio Benjamim Franklin, embora fosse um desta pouco entusiasta,

    responderia em sua autobiografia com uma citao da Bblia, com que seu pai,intransigente calvinista, sempre o assediou em sua juventude: "Se vires um homemdiligente em seu trabalho, ele estar acima dos reis". (WEBER, 1974, p.187)

    A ociosidade, mesmo entre as classes abastadas, passou a ser sinnimo denegao de Deus. S se mostrava a verdadeira f pelo trabalho incessante eprodutivo. O trabalho era a orao moral burguesa e capitalista. Quem seresignasse pobreza no merecia a salvao divina.

    Tericos do novo sistema descobriram no trabalho a fonte de toda riquezaindividual e coletiva. Em 1776, Adam Smith (1723-1790), afirmava que a riqueza deuma nao dependia essencialmente da produtividade baseada na diviso dotrabalho. Por essa diviso, as operaes de produo de um bem, que antes eramexecutadas por um nico homem (arteso), so agora decompostas e executadaspor diversos trabalhadores, que se especializam em tarefas especficas ecomplementares.

    Com a produo mecanizada, o trabalho glorificado como a essncia dasociedade do trabalho. No se concebe mais a possibilidade de existir ordem socialfora da moral do trabalho produtivo.

    Segundo Adam Smith, uma das caractersticas do ser humano, capaz dediferenci-lo dos outros animais uma certa propenso para trocar coisas. Essapropenso torna necessria a diviso do trabalho.

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    Outra diferena apontada por Adam Smith que o homem, contrariamente amaioria dos animais, que ao se tornarem adultos ficam auto-suficientes, muitodependente de seus semelhantes.

    Existindo a necessidade de cooperao, mas tendo de conviver com seus

    impulsos egostas, as sociedades elaboraram regras e leis morais para regular asaes humanas. As bases para a construo dessas regras so criadas a partir deuma espcie de "jogo de interesses". Ou seja, se necessitamos da ajuda dasgrandes multides para vivermos e impossvel fazer amizade com todos elespara obter sua benevolncia, podemos ento mostrar ao outro que lhe vantajosonos dar o que precisamos, num sistema de trocas.

    A tica capitalista defende a idia de que o bem estar da coletividade melhor obtido se apelarmos no ao altrusmo das pessoas, mas defesa de seusinteresses em relaes de mercado. Desta forma o egosmo (defesa do interesseprprio) apresentado como a melhor forma de solucionar os problemas de um

    grupo social.A eficcia econmica do sistema de mercado passou a ser o critrio

    supremo para todos os juzos morais. A eficcia (critrio tcnico) passou a ser ocritrio tico fundamental. A tica capitalista uma "tica" reduzida a uma questopuramente tcnica.

    Tambm fica claro, que a revoluo tecnolgica dos sculos XVIII e XIX, mais doque um progresso, significou a generalizao de um projeto de controle social. Asteses das classes dominantes revelam que o desejo de expanso de mercado e deaumento de suas riquezas passava pela necessidade da universalizao dessanova ordem social.

    O que estava em jogo era o fim da autonomia do trabalho artesanal e areunio e domesticao dos trabalhadores na fbrica. A diviso do trabalhodefendida por Adam Smith teria a funo de destruir o saber-fazer do arteso,subordinando-o nova tecnologia da maquinofatura.

    Para que essa sociedade voltada para o trabalho se viabilizasse, houvenecessidade de construir um corpo disciplinar que envolvesse todos os indivduosdentro e fora da fbrica. A ordem burguesa da produtividade tornava-se a regraque deveria gerir todas as instncias do social. Para isso, instituiu-se um discursomoralizante que visava cristalizar no conjunto da sociedade a tica do tempo til.

    O tempo til do trabalho produtivo deveria funcionar como um "relgio moral"que cada indivduo levaria dentro de si.

    O uso do tempo que no de forma til e produtiva, conforme o ritmo impostopela fbrica, passou a ser sinnimo de preguia e degenerao. S o trabalhoprodutivo, fundado na mxima utilizao do tempo dignificava o homem.

    A empresa dos dias atuais um imenso cosmos, no qual o indivduonasce, e que se apresenta a ele, pelo menos como indivduo, comouma ordem de coisas inaltervel, na qual ele deve viver. Obriga oindivduo, na medida em que ele envolvido no sistema de relaes

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    de mercado, a se conformar s regras de ao capitalistas. Ofabricante que permanentemente se opuser a estas normas sereconomicamente eliminado, to inevitavelmente quanto o trabalhadorque no puder ou no quiser adaptar-se a elas ser lanado ruasem trabalho. (WEBER, 1974, p.188)

    Para tornar vitoriosa a nova ordem, procurou-se eliminar qualquer forma deresistncia. Imps-se um modelo de sociedade em que s o trabalho produtivofabril imperava. Quem se encontrasse fora desse modelo era expurgado dasociedade. A grande massa de europeus que imigraram para Amrica no sculoXIX pode ser tomada como exemplo desse expurgo.

    Fonte: ALENCASTRO, M.A Importncia da tica na Formao de Recursos Humanos . Fundao Biblioteca Nacional, 1997

    III. INDIVDUO, IDENTIDADE E SOCIALIZAO.

    1 - A QUESTAO DA IDENTIDADE: INDIVIDUALISMO E SOCIALIZAAO.

    A questo da identidade nas vrias sociedades A emergncia do indivduo/individualidade e do individualismo A diversidade do processo de socializao A questo da famlia e da escola na formao do indivduo

    1.1 - A QUESTAO DA IDENTIDADE NAS VARIAS SOCIEDADES.

    1.1.1 O INDIVDUO

    Indivduo ou ser individual significa oportador ousujeito concreto de uma essncia em suapeculiaridade no comunicvel. De indivduo derivaindividuao, termo que designa a determinabilidadeindividual, ou seja, aquilo que faz com que esteindivduo seja precisamente este e se distinga de todosos outros, por exemplo, este determinado ser - Pedro.(BRUGGER,1977, p. 230)

    Durkheim em termos de representaes coletivas e instituies tratam deseparar o social doindividual como duas esferas independentes da realidade humana. Para ele,a sociedade no merasoma de indivduos; ao contrrio, o sistema formado por sua associao representa uma realidadeespecfica que tem suas prprias caractersticas , e na natureza dessa individualidade (...) que sedeveriam buscar as causas imediatas e determinantes dos fatos que l aparecem. A referncia aosfenmenos desntese criadora na natureza serve-lhe para comprova, por analogia, a separao entre osdois nveis de realidade.

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    1.1.2 - INDIVIDUALISMO

    De acordo com BRUGGER, este termo designa:

    1. A acentuao do valor da personalidade do homem , o cultivo e desdobramento da mesma, emoposio ao gregarismo humano, massificao; e isto entendido em sentido lato, isto , no s

    da personalidade individual, mas tambm de famlias e de outros grupos valiosos, nos quais secultiva e frutifica a conscincia da prpria classe e do prprio valor;

    2. A superacentuao do indivduo ou de grupos particulares;

    3. uma concepo de sociedade que reala o indivduo a o ponto de reduzir a sociedade a uma somade entes individuais.

    1.1.3 - IDENTIDADE

    A identidade passa a ser qualificada como identidade pessoal (atributosespecficos do indivduo) e/ou identidade social (atributos que assinalam apertena a grupos ou categorias). (Jacques,1998, p. 161).

    Os termos identidade e social sugerem, respectivamente, um conceito que"explique, porexemplo, o sentimento pessoal e a conscincia da posse de um eu..."(Brando, 1990p.37) privilegiando, de um lado, o indivduo, e de outro lado, a coletividade, resultando numaconfigurao na qual se capta o homem inserido na sociedade, bem como dinmica dasrelaes sociais. A importncia dessa relao pode ser mais bem compreendida nessa citaode Marx (1978a, p.9)A sociedade , pois, a plena unidade essencial do homem com anatureza, a verdadeira ressurreio da natureza, o naturalismo acabado do homem eo humanismo acabado da natureza.

    Hamelink (1989) refere que a identidadediz respeito a uma cultura determinada e ope este conceitoao de identidade cultural. A identidade de uma cultura referir-se- s caractersticas que se podem atribuir auma cultura determinada, enquanto a identidade cultural so as caractersticas que um indivduo ou grupoatribui pelo fato de sentir que pertence a uma cultura definida.

    Ibez (1990) considera a identidade a nvel individual. Assima identidade pessoal basicamenteproduzida pela cultura ou sub-culturasque nos socializam enquanto aidentidade cultural estabelecida combase no sentido de pertena comunidade .

    A investigao sobre a identidade revela uma forma de conhecimento de ns prprios querepousa sobre a interpretao da imagem que os outros tm de ns e que serve para consolidar a quens fazemos de ns prprios

    1.1.4 - SOCIALIZAO

    A socializao um tipo especfico de interao - que molda a natureza da personalidade humanae, por sua vez, o comportamento humano, a interao e a participao na sociedade. Sem socializao,nem os homens sem a sociedade seriam possveis.

    So facilmente perceptveis as diferenas de costumes que existem de umasociedade para outra. Os primeiros pensadores sociais apontaram, com certarazo, que estes costumes so diferentes em parte por causa da prpria diferenaentre os meios fsicos em que se encontram as sociedades: em um ambiente declima frio, as pessoas usaro mais roupas e provavelmente ficaro menos tempofora de suas casas; em um local com alimentos abundantes elas podero trabalharmenos e no tero de competir por comida. Mas como explicar, atravs desta idiade determinismo fsico, que em certos lugares a manipulao da comida seja feitacom dois pauzinhos, em outros com diversos talheres e ainda em outros com as

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    a) As estratificaes so universais e representam a distribuio desigual dedireitos e obrigaes na sociedade.

    b) A principal necessidade funcional da estratificao a exigncia de situar emotivar os indivduos na estrutura social.

    c) A desigualdade social no um artifcio desenvolvido inconscientemente. Sua

    funo estimular as pessoas a exercerem os diversos papis necessrios sobrevivncia da sociedade. (Ex: os requisitos para ser presidente so maioresdo que para ser carteiro, logo, a sociedade determina como justo o salrio deum ser maior que o do outro).

    Fatores que determinam estratificao.

    a) Importncia funcional diferencial: importncia do cargo (mdico, jurista)b) Escassez diferencial de pessoal: treinamento e talento demandados pela

    sociedade (empresrios, cientistas)

    2.1.3 - MOBILIDADE SOCIAL

    um movimento significativo na posio econmica, social e poltica de um indivduo ou de umestrato . Mas o que mais se estuda a individual, j que a de estrato tem mais a ver com mobilidade social.Com isto, o conceito de mobilidade tende a mostrar que na sociedade ocidental o conflito de classes foisuprimido.

    Perguntas para reflexo:

    1- Essas hierarquias existem realmente ou so construes abstratas?2- Quais os critrios utilizados para estabelecer a estratificao? Qual o peso de

    cada critrio? Quais esto relacionados com a estrutura da sociedade?3- Qual a unidade de estratificao: o indivduo ou o grupo?

    Posio de conflito: a sociedade de classes

    a) As classes sociais constituem categorias analticas, e os estratos constituemcategorias derivativas e estticas.

    b) As classes sociais mudam no decorrer da histria e surgem a partir dedeterminadas condies estruturais.

    c) Definem-se as classes sociais pela relao dos homens com os meios de

    produo.d) As classes no existem isoladas, mas como sistema de classes: as relaesentre as classes so relaes de oposio.

    e) Os conflitos so expresses das contradies de sistemas scio-econmicosdeterminados.

    2.2 AS DESIGUALDADES SOCIAIS

    2.1.1 - DESIGUALDADES SOCIAIS A desigualdade em uma sociedade gira em torno da distribuio diferenciada de recursos de

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    valor s variadas categorias de indivduos - sendo as de classe, tnica e gnero as trs maisimportantes.

    A estratificao de classe existe quando a renda, poder, prestgio e outros recursos de valorso dados aos membros de uma sociedade desigualmente e quando, com base nessa desigualdade,variados grupos tornam-se cultural, comportamental e organizacionalmente distintos.

    O grau de estratificao est relacionado ao nvel de desigualdade, distino entre as classes em nvel de mobilidade entre as classes e durabilidade das classes.

    2.1.2 - DESIGUALDADES SOCIAIS: EXPLICAES TERICAS

    Existem vrias propostas para o estudo da estratificao:

    a. Proposta Marxista: enfatiza que a propriedade dos meios de produo a causa daestratificao de classe e mobilizao para o conflito, com subseqente mudana nos padres deestratificao;

    b. Proposta Weberiana : enfatiza a natureza multidimensional da estratificao (que gira em tornono apenas da classe, mas de partido e grupos de status tambm);

    c. Proposta Funcionalista : argumenta que a desigualdade reflete o sistema de recompensa paraencorajar os indivduos a ocupar posies funcionalmente importantes e difceis de preencher;

    d. Proposta Evolucionista : argumenta que, a longo prazo, partindo das sociedades de caa e coleta, as desigualdadesaumentaram, como refletem as sociedades modernas.

    A estratificao nos Estados Unidos e no Brasil marcada por altos nveis de desigualdade com respeito a bem-estar material e prestgio. A desigualdade na distribuio de poder mais ambgua. Fronteiras obscuras entre as classessociais prximas existem nos Estados Unidos. A mobilidade freqente, mas a maioria das pessoas no consegue grandemobilidade durante sua vida.

    Estratificao tnica

    Etnia a identificao de um grupo como distinto em termos da biologia superficial,recursos, comportamento, cultura ou organizao; e a estratificao tnica existe quando algunsgrupos tnicos conseguem mais recursos de valor em uma sociedade do que outros grupostnicos .

    A estratificao tnica criada e sustentada peladiscriminao que legitimada pelas crenaspreconceituosas. A discriminao e o preconceito so embasados pela ameaa ( econmica, poltica, social) apresentadade forma real ou imaginria por um grupo tnico-alvo e so ainda sustentados pelos ciclos de reforo que giram emtorno da identificao tnica, ameaa, preconceito e discriminao.

    Estratificao de gnero

    O gnero a diferenciao entre homens e mulheres em termos de caractersticasculturalmente definidas e status na sociedade. A estratificao de gnero existe quando os homense as mulheres em uma sociedade recebem efetivamente parcelas desiguais de dinheiro, poder,prestgio e outros recursos. A estratificao de gnero sustentada pelos ciclos de socializao, que se reforam mutuamente pela identidadede gnero e por crenas relacionadas ao gnero, que, por sua vez, se tornam a base para discriminao ecrenas preconceituosas, frutos da ameaa ressentida pelos homens.

    As relaes de gnero esto mudando nos Estados Unidos, visto que essesciclos esto sendo quebrados pela participao das mulheres no trabalho ena poltica e pelos ataques s crenas que colocam as mulheres emdesvantagem. Nosso pas tambm marcado por uma grande desigualdade social:

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    poucos tm muito, muitos tm pouco.

    Uma sociedade visivelmente heterognea, onde nos vidros de carrosimportados, crianas passando fome se refletem. Os problemas so muitos, masas solues so quase inexistentes.

    O desemprego no Brasil, uma das grandes causas dessa desigualdade vemaumentando. De acordo com o IBGE o ndice que em dezembro de 99 era de 6,3%comeou o ano 2000 em 7,6% . Muitos dos que j se encontram no mercado detrabalho se submetem a salrios de verdadeira misria. O salrio mnimo que nesseano de 2000 completa 60 anos um dos mais baixos do Mercosul, pois seus R$136,00 s ficam a frente dos salrios do Uruguai e Bolvia. Vinte por cento dostrabalhadores e sessenta por cento dos aposentados recebem somente um salriomnimo por ms. Enquanto o governo estuda um irrisrio aumento para o mnimo, oteto salarial dos funcionrios pblicos chega s alturas, aumentando as diferenassociais j existentes.

    Somam-se a estes fatores o enorme descaso com as crianas que emgrande nmero trocam as salas de aula pelo subemprego, segundo o IBGE

    92,18% destas crianas no recebem nenhum rendimento. S em Santa Catarina j so 99 mil menores entre 10 e 14 anos trabalhando na produo de calados,olarias e madeireiras. Sabendo que 2,9 milhes de crianas entre 9 e 14 em todo oBrasil trabalham para ajudar a famlia o governo criou o PETI (Programa deErradicao do Trabalho Infantil) onde cada famlia que retirar sua criana daatividade e levar escola recebe R$40,00. Felizmente vem ocorrendo uma quedado anafalbetismo no pas, mas no nordeste, onde as desigualdades so maiores,40% dos adolescentes na faixa de 15 a 17 anos tm menos de 4 anos de estudo.

    3 - TODOS OS HOMENS SO IGUAIS

    Texto para reflexo :

    Dimas Floriani

    O grande debate que os padres dominicanos espanhis travavam entre si,durante o sculo XVI, era se os indgenas da Amrica possuam ou no alma.Rei Bartolomeo de las Casas, apelidado de defensor dos povos indgenas,apoiava fervorosamente o princpio de Direito Natural que afirmavaseremtodos os homens iguais perante Deus. Ora, este princpio era umadeclarao de importncia fundamental para proteger os indgenas da matanaindiscriminada praticada pelos espanhis e portugueses; reconhecia, assim,que os povos indgenas pertenciam espcie humana e eram, portanto,portadores de uma alma. Nesse sentido, poderiam ser catequizados em nome daverdade divina e da f crist e eram reconhecidos como humanos,contrariamente s teses de outros telogos que no reconheciam neles umacondio humana, no sendo pecado escraviz-los nem extermin-los.

    O princpio da igualdade dos seres humanos, perante Deus, foi um

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    importante passo para que dois sculos aps se declarasse comoinalienvel, inegocivel e fundamental o princpio da igualdade entre oshomens. As revolues norte-americanas (1778) e francesa ( 1789) consagrariamesse princpio nos termos da Declarao Universal dos Direitos Humanos.Apenas substituram o argumento de fundo, que dava suporte e legitimidade aoprincpio , isto , humanizando a referncia da igualdade, no mais em nome

    de Deus, mas em nome da Lei (todos os homens so iguais perante alei). E esta lei deveria ser garantida pelo Contrato Social que os homensselariam entre si, em sociedade, abdicando parcialmente de sua liberdade, emnome da proteo e da segurana das instituies pblicas, ou seja, do Estadode Direito.

    Devemos distinguir, portanto, dois aspectos ligados questo da igualdade:o primeiro, de carter poltico-filosfico; o segundo, de natureza socioeconmica.

    No se pode deixar de mencionar uma dimenso histrica, como pano defundo, em relao a princpio de igualdade. No se deve esquecer de que a

    emergncia da sociedade industrial foi impulsionada pelo surgimento de uma novaclasse social, a burguesia, defensora de valores e princpios, tais como:

    A liberdade de pensamento, de credo e de filiao poltica (a filosofia iluministae o racionalismo eram os principais apoios);

    A liberdade de comercializar, de trabalhar, de vender e comprar a fora detrabalho no mercado;

    A liberdade de ir e vir; O direito igualdade social, sem distino de origem social, e crtica ao

    privilgio social que diferenciava os homens em funo de pertencerem auma elite.

    Do ponto de vista socioeconmico, porm a sociedade de classes dificulta,concretamente, a realizao da igualdade entre os indivduos de uma mesmasociedade que se rebelou, justamente, contra a desigualdade social? Porque, doponto de vista do acesso aos bens materiais, h uma srie de facilidades paraalguns indivduos ( dotados de capital, de poder e de ttulos escolares) e dedificuldades para outros alcanarem o topo do sistema ( uma vez que noso detentores de capital, nem de poder e de ttulos escolares).

    A contradio entre a declarao terica da desigualdade e as dificuldadesprticas, de realizao para todos, est presente ainda nas atuais sociedades declasse. A frase de George Orwell, em seu livroA Revoluo dos Bichos,no apenasvlida para as sociedades socialistas, mas igualmente para as capitalistas, a saber:Todos so iguais, mas alguns so mais iguais do que outros.

    (Dr Dimas Floriani professor da UFPR)

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    IV. MUDANA/TRANSFORMAO SOCIALMOVIMENTOS SOCIAIS/ DIREITOS/ CIDADANIA

    1 MUDANA SOCIAL E MOVIMENTOS SOCIAIS

    1.1 MUDANA SOCIAL E AS DIFERENTES ABORDAGENS TEORICAS

    Mudana social e revoluo: diferentes abordagens tericas. Mudana tecnolgica e mudana social. Movimentos Sociais. Os direitos civis, polticos e sociais. Os direitos e a

    Democracia. Os novos movimentos sociais contemporneos.

    1.1.1 - MUDANA SOCIAL

    O ritmo da mudana social vem se acelerando dramaticamente no ltimosculo. A mudana pode ser cumulativa, mas a histria das sociedadeshumanas revela repentinas inverses. Esse foi, particularmente, o caso na eraagrria.A mudana pode se originar de causas culturais, particularmente de:

    a. Inovaes tecnolgicas;b. Novas crenas ou expectativas;c. Difuso de sistemas de smbolos.

    Tais mudanas culturais esto intimamente ligadas s mudanas nasestruturas, servindo para iniciar as mudanas na estrutura ou, no mnimo,acelerando as mudanas j iniciadas.

    As estruturas sociais revelam diversas fontes importantes de mudana,incluindo:

    a. Desigualdade e o conflito sobre os recursos;b. Subculturas que buscam superar desvantagens; ec. Instituies que revelam processos que geram suas prprias

    transformaes.

    Processos demogrficos so tambm um impulso para a mudana,especialmente transformaes no tamanho de uma populao, nos padres demovimento populacional e em sua estrutura etria.

    O estudo da mudana est no centro da anlise sociolgica, desde o incio dadisciplina at o presente. Teorias e anlises foram propostas para explicar amudana, incluindo:

    a. Teorias cclicas que enfatizam o movimento de sociedades entre os plos opostos; b. Anlise dialtica, que demonstra a dinmica das mudanas inerentes s

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    desigualdades; c. Anlises funcionalistas, que enfatizam a evoluo das formas societrias simples

    para as mais complexas como um esforo correspondente para preenchernovas necessidades e requisitos;

    d. Perspectiva evolucionista, para a qual a desigualdade a fora motriz daevoluo e mudana social; e

    e. Crticas, quer ps-industrial quer ps-moderna, sobre as influncias datecnologia e sistemas de informaes de ponta, na transformao da sociedade.

    1.1.2 - MOVIMENTOS SOCIAIS CONTEMPORNEOS

    De acordo com Ilse Scherer-Warren em seu artigo Associativismo civil e interculturalidade na sociedade global, na dcada de 1960 a 1980 uma srie de novos movimentos sociais - de gnero, ecolgicos, regionais, tnicos e outros -organizaram-se a partir da afirmao de identidades coletivas auto-construdas e de projetos especficos de auto-defesa. Emnome destas especificidades se exigia reconhecimento, respeito s diferenas culturais e defendiam-se novos direitos. Noscampos da pesquisa e educacional, novas reas de conhecimento desenvolveram-se: estudos degnero, negros, tnicos,ecolgicos e similares.

    A partir da segunda metade da dcada de 1980, e, sobretudo na dcada de 1990, h uma crescente interao destesmovimentos entre si, ou uma penetrao de seus ideais em movimentos mais clssicos, como osindical e o de moradores .As chamadas lutas especficas, contra a discriminao de gnero, racial, cultural, contra a degradao ambiental, aexcluso social, econmica e poltica , como, por exemplo, ascampanhas contra a pobreza ou pela qualidade de vida,passam a ser consideradas relevantes no interior dos mais diversos movimentos sociais e organizaes da sociedade civil.Portanto, as lutas identitrias e pela autonomia cedem lugar aosmovimentos sociais solidarsticos , onde a cooperao ea complementaridade passam a ser palavras de ordem. Estes princpios remetem tambm para o iderio de construo deuma esfera pblica democrtica, ampla, conectando iniciativas locais com outras mais globais. neste contexto que a idiade parcerias se legitima.

    No plano poltico, as ONGs passam a lutar por um lugar de participao nagesto da coisa pblica. Surge nos cenrios locais, estaduais, nacionais einternacionais um grande nmero deparcerias entre organizaes dasociedade civil e organismos governamentais , como nos Conselhossetoriais, Fruns especializados, Agendas 21, etc.

    No plano da cultura , para alm da defesa das identidades, passa-se avalorizar a abertura alteridade e reciprocidade nas trocas. Duaspossibilidades se colocam neste processo interativo: a da hibridao cultural,atravs de sincretismos, ecumenismos, etc.; a de formao de um movimentocidado sob a forma de redes e parcerias , onde a complementaridade seconstri a partir do respeito s diferenas, no se impondo uma uniformizaono trabalho cooperativo.

    M onoculturalismo: tem uma viso essencialista acerca da identidade dossujeitos coletivos . Os negros , ndios e demais minorias tm suas identidadesdeterminadas objetivamente numa realidade especfica.

    Multiculturalismo: as identidades so construdas historicamente . Ex.: Muitomais do que se nascer mulher ou com cor negra, torna-se mulher ou negra.

    O que se denomina "construo da cidadania", um valor cultural damodernidade, que tem uma dimenso tica e poltica.

    Na dimenso tica encontram-se os princpios da responsabilidade e da

    solidariedade. Ainda que as desigualdades e as injustias sejam legados histricos,sua reproduo no presente pode ser assumida como uma responsabilidade da

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    humanidade.

    As injustias do passado chegam at ns na forma de herana [...]no herdamos a culpa de quem originou a injustia, porm sim aresponsabilidade de fazer frente injustia passada [...]Nossaresponsabilidade no se circunscreve s desigualdades de nossoEstado, mas as da humanidade".(Reys Mate, 1997, p.170).

    O corolrio daresponsabilidade a solidariedade . atravs dela que se efetiva a responsabilidade pelo outro, em umacomunidade local ou global. Nos movimentos sociais, a solidariedade tem sido utilizada amplamente como uma interpelaoaos indivduos ou grupos para a ao comunitria ou de responsabilidade cidad. Estesprincpios ticos operam para aconstruo de uma cidadania plena quando se associam a um conjunto de princpios de ordem poltica, a seremincorporados nas prticas associativistas.

    Na dimenso poltica merecem ser resgatadas as noes de reconhecimento, integrao, participao e a conseqenteidia de constituio de uma esfera pblica.

    A negao mais absoluta destes princpios a"excluso" (social, cultural ou poltica). Muitos indivduos ou grupos vivemnuma situao deapartheid sem o reconhecimento pblico de si ou do grupo como parte integrante da comunidade.

    A construo da cidadania, somente poder ser concretizada na medidaem que se associarem os princpios de responsabilidade e de solidariedade com os princpios de integrao social de todos os tipos de minorias, dereconhecimento pblico das diversidades culturais e de legtima e igualitriapossibilidade de participao de todos nas esferas pblicas referentes quelhes dizem respeito.

    2 A QUESTAO DA POLITICA/ESTADO E A RELAAO COM O PODER

    2.1 -POLTICA E PODER

    O campo da poltica se configura na exist6encia do conflito entre adimenso privada e a pblica, na medida em que o homem um sersocial. Essa configurao inclui a realidade da intersubjetividade, posto que asociablidade no apaga a subjetividade , o carter individual dassingularidades.

    A ao desse homem, a um s tempo pblica e privada, social e individual,particular e comum, se exerce por meio de condutas no-naturais. Ao contrrio,regular a ao humana obra do homem racional , consciente e livre.

    2.1.1 - A QUESTO DO PODER

    Em seu significado mais geral, a palavra poder designa a capacidade ou apossibilidade de agir, de produzir efeitos. Tanto pode ser referida aindivduos e a grupos humanos como a objetos ou a fenmenos naturais (como nas expresses poder calorfico , poder de absoro)

    Se o entendemos em sentido especificamente social, ou seja, na sua relaocom a vida do homem em sociedade, o poder torna-se mais preciso, e seu

    espao conceitual pode ir desde a capacidade geral de agir, at capacidade do homem em determinar o comportamento do homem: poder

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    do homem sobre o homem. O homem no s o sujeito, mas tambm oobjeto do poder social. poder social a capacidade que um pai tem para darordens a seus filhos ou a capacidade de um Governo de dar ordens aoscidados. Por outro lado, no poder social a capacidade de controleque o homem tem sobre a natureza nem a utilizao que faz dosrecursos naturais. (...)

    O poder social no uma coisa ou a sua posse : uma relao entrepessoas ( Stoppino, 1986: 933-4)

    impossvel estudar uma sociedade sem fazer referncia poltica que aorganizou e a manteve. Da mesma forma, no existe a possibilidade de discorrer arespeito da poltica sem esbarrar no conceito de poder.

    Ter o poder dispor de autoridade para governar . O poder supeconsequentemente, a existncia de dois elementos: de quem tem a autoridadepara exercer o poder e daquele sobre o qual se exerce o poder; do governante

    e do governado; de quem manda e de quem mandado; de quem d asordens e de quem as cumpre. Assim, quem detm o poder poltico decide, emltima instncia, a vida da coletividade, a nossa vida, a sua vida.

    Segundo Georg W. F.Hegel (1770 1831) , o que leva o ser humano a desejaro poder no apenas a vontade de dominar os outros homens , mastambm a vontade de ser amado e reconhecido.Hegel, em seu livroFenomenologia do Esprito , nos ensina que o homem s se torna realmente humanoquando, alm de satisfazer os desejos puramente animalescos - comocomer e beber - , lana-se luta pela conquista do pode r. O animal tempor preocupao mxima a sobrevivncia biolgica; o homem, para conquistar aliberdade (para no viver escravizado) luta pelo poder e coloca a sua vidabiolgica em risco. A condio humana pressupe dominar e ser reconhecidocomo dominador.

    A luta pelo poder tem sido, de uma forma ou de outra, amola propulsora dahistria das civilizaes. A histria dos povos determinada pelos grupos, pelasclasses, pelos partidos, pelas personalidades que exerceram o poder.

    Importante dizer aqui que o poder no nos dado gratuitamente: ele tem de serconquistado. E aps a sua conquista, a luta continua para que ele seja mantido.Toda sociedade abriga interesses diversos e nela h governantes ( que jamais renunciam ao poder espontaneamente) e governados ( entre eles,muitos lutam para assumir o poder). Por decorrncia, a luta pelo poder sempreexistir.

    A luta pela conquista do poder nos tem levado, ao longo da histria, as duasdimenses do ser humano: a animalidade (quando h violncia) e aracionalidade ( quando a conquista se d por meios pacficos).

    Quando h violncia na luta pelo poder, o homem se equipara aos animais quese entredevoram para continuar sobrevivendo. Os assassinatos, as revolues,

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    os golpes de estado, as guerras (internas e externas) tm constantementemanchado de sangue as pginas da histria da humanidade.

    John Fitzgerald KennedyKennedy foi o primeiro presidente catlico dos Estados Unidos da Amrica.

    Foiassassinado em Dallas, Texas, no dia 22 de novembro de 1963.Martin Luther KingLuther King foi um dos principais dirigentes da campanha a favor doreconhecimento dos legtimos direitos dos negros nos Estados Unidos.Aconselhou a luta dentro da dignidade e da disciplina. Ganhou o Prmio Nobelda paz em 1964. Foi assassinado em 1968.

    Mahatma GandhiGandhi foi a alma do movimento da independncia da ndia, pregando a aobaseada no princpio da no violncia. Foi assassinado em 1948.

    Jlio CsarCsar, clebre general romano, foi um dos mais ilustres homens de guerra daAntigidade. Foi assassinado por seu filho Brutus nos idos de maro de 44a.C.

    A dimenso racional do ser humano se coloca em evidncia nosprocessospacficos da luta pelo poder. Se at se pode justificar a necessidade de exercer aautoridade, colocando as tropas na rua para que se mantenha a ordemsocial, no essa a condio para que o poder seja duradouro. Muito maisimportante que a fora fsica e violenta, para haver poder - poder legtimo hnecessidade de consentimento.

    A luta sem violncia para conquista do poder ocorre nos regimes livres -democrticos - , em que todos os homens, em princpio, so consideradosiguais e, portanto, todos tm condies de participar do exerccio do poder.

    Apesar das deficincias que possam apresentar, as eleies so o processo maisracional de luta pacfica pela conquista do poder. Pressupondo a liberdade dadefesa de ideais, do debate , da crtica, da oposio ... as eleies excluem aviolncia. Pela manifestao livre da vontade do povo, o voto assegura alegitimidade do poder.

    Pelas ele