04_06_2011 1a. PENSAR_ET_Especial Tabloide_12

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12 Pensar AGAZETAVitória(ES),sábado,04dejunhode2011 Falecomoeditor: José[email protected] UMACARREIRABRILHANTE MESTRE. AntônioOlintoemdiferentesmomentosda carreira:acima,comCarlosDrummonddeAndrade;na AcademiaBrasileiradeLetras,comPauloCoelho;enoritual docandomblécomaesposa,Zora,eoamigoJorgeAmado INSTITUTOCULTURALANTÔNIOOLINTO

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12 Pensar A GAZETA Vitória (ES), sábado, 04 de junho de 2011Fale com o editor:José Roberto Santos Neves - [email protected]

LETRAS. Professor relata seu encontro com o imortal para quem----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------

“alegria” e “aurora” eram os mais belos verbetes do dicionário----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------

Com apalavra,AntônioOlinto

(...) Semrelutar,JorgeAmadoelegeusuapreferida:safada.Masmudoupara“saudade”a pedidodoencabuladoOlinto.

uando encontrei Antô-nioOlintopelaprimeira

vezeletinha89anosenenhumain-tençãodemorrer.Quemmuitopla-neja a vida, tem pouco tempo parapensarnaprópriamorte.Eprojetosnão faltavam para o escritor minei-ro.Umdeleserarepublicarumaen-quete que fez na década de 50 emsua coluna em “O Globo”: As 10 pa-lavras preferidas de 180 escritores.Sem relutar, Jorge Amado elegeusua preferida: safada. Mas mudoupara“saudade”apedidodoencabu-lado Olinto. Já Guimarães Rosa es-colheu “Urucututu”: “Veja, Olinto:U-ru-cu-tu-tu. Não é uma belezaumapalavracomcincoUs?”.Olintotevequeserenderaoargumentodoromancista.Paraele,noentanto,eraa “alegria” seguida de “aurora” quedesbancavam todas as outras pala-vras do dicionário.

Alegria era certamente a palavraquemaiscombinavacomoseumo-do de trabalhar. Certa vez, na reda-ção do “Última Hora”, Nelson Ro-drigues finalizava sua coluna “A vi-dacomoelaé”quandoochamaramparaatenderumtelefonema.Olintoespiouotexto inacabadodocolega:“Ele chegou e se olhou no espe-lho...”. Sem que Nelson percebesse,deucontinuidade:“...Abriuagaveta,pegou um revólver e não chegounem a pensar. Colocou a arma natesta,deuumtiroecaiu”.Voltandoàmesa, Nelson perguntou se alguémtinhamexidoemsuamáquina.Comanegativageral,continuoubatendo:

“O corpo caiu e quando Maria en-trou e viu o morto deu um grito”,aceitando assim a morte inexplicá-veldesuapersonagemsemsaberdaparticipação de Olinto na tragédia.

Como adido cultural nos anos60, divulgou com afinco a litera-tura brasileira na África e na Eu-

ropa. Jorge Amado o visitava naInglaterra justamente quandoOlinto faria uma palestra sobresua obra. Ao final da comunica-ção, quiseram saber como o autorera fisicamente e Olinto, olhandopara Jorge sentado à sua frente, odescreveu para o público. Quan-

INSTITUTO CULTURAL ANTÔNIO OLINTO

MESTRE. Antônio Olinto em diferentes momentos dacarreira: acima, com Carlos Drummond de Andrade; naAcademia Brasileira de Letras, com Paulo Coelho; e no ritualdo candomblé com a esposa, Zora, e o amigo Jorge Amado

O começo. Antônio Olinto nasceu emUbá (MG) em 1919. Estudou emSeminários católicos, onde já searriscava na escrita de alguns poemas.Abandonou o Seminário Maior de SãoPaulo e rumou para o Rio de Janeiro.O jornalista. Atuou como professor delatim nos anos 30, beneficiando-se dafalta de professores para a disciplinacom o novo currículo escolar da ReformaCapanema. Fundou o Grupo Malraux, quepromoveu a primeira exposição depoesias do Brasil. Tornou-se colunistaliterário, atividade exercida por toda avida em grandes jornais, como O Globo,Última Hora e Tribuna da Imprensa.O imortal. Foi adido cultural na África eInglaterra durante a década de 60,divulgando a literatura brasileira pelomundo. Apaixonou-se pela cultura africana,formando a maior coleção brasileira depeças daquele continente. Após ganhar oprêmio Machado de Assis, pelo conjunto desua obra, foi eleito em 1997 para a cadeira8 da Academia Brasileira de Letras,substituindo Antonio Callado. Publicou maisde 50 livros, traduzidos para vários idiomas.

UMA CARREIRA BRILHANTE

GabrielLabanca édoutorando emHistória,professor deComunicaçãoSocial e sócio doconglomeradoQuase [email protected]

Odo saíam, Amado teve apenasuma dúvida: “Você acha mesmoque estou gordo?”.

De volta a 2008 em seu aparta-mento em Copacabana, Olinto fa-lava orgulhoso de um livro sobre asua vida que seria lançado: “Brasi-leiro com alma africana”, de JoséLuis Lira. Já um pouco fraco, pediuque eu lhe alcançasse um volume.“A cabeça está boa, mas as perni-nhas são fracas”, disse risonho, eme pediu para ler o trecho de umpoemadeMaiakóvisk impressonaúltima página: “Dizem/que em al-guma parte/parece que no Bra-sil/existe/umhomemfeliz”,aoqueele mesmo completou, abaixo: “Eeuvosdigo/queéverdade:/eusouesse homem/ com meus/ oitenta eoito anos/ de plena felicidade”.Olinto parecia mesmo uma fon-te inesgotável de entusiasmo, oque levou Paulo Coelho, a quemdefendeu para que se tornasseseu colega na Academia Brasi-leira de Letras, a chamá-lo de“incansável”.

Incansável ou imortal, infeliz-mente os adjetivos que criamos pa-ra nos distanciarmos da morte nãonosfazemimunesaotempo.Emse-tembro de 2009, Antônio Olinto fi-nalmente descansou. Foi emboracheio de alegria antes mesmo dechegar a aurora. Deixou saudades.

Documento:Terceiro_04_06_2011 1a. PENSAR_ET_Especial Tabloide_12.PS;Página:1;Formato:(277.64 x 315.74 mm);Chapa:Composto;Data:03 de Jun de 2011 13:47:43