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INMET: CURSO DE METEOROLOGIA SINÓTICA E VARIABILIDADE CLIMÁTICA CAPÍTULO 6 Frentes Frias sobre o Brazil: Aspectos Observacionais Iracema F.A. Cavalcanti e Vernon E Kousky Versão final publicada no livro: Tempo e Clima no Brasil, Oficina de Textos, 2009 Nota: Para mais informações, consulte o PowerPoint: Kousky-Lecture-8-air-masses-and-fronts.ppt

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INMET: CURSO DE METEOROLOGIA SINÓTICA E VARIABILIDADE CLIMÁTICA

CAPÍTULO 6 Frentes Frias sobre o Brazil: Aspectos Observacionais

Iracema F.A. Cavalcanti e Vernon E Kousky

Versão final publicada no livro: Tempo e Clima no Brasil, Oficina de Textos, 2009

Nota: Para mais informações, consulte o PowerPoint:

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CAPÍTULO 6: Frentes Frias sobre o Brazil: Aspectos Observacionais

2 V. Kousky

1. Introdução

As frentes frias afetam o tempo sobre a América do Sul durante todo o ano. Elas são facilmente identificadas

em imagens de satélite (Figura 1) e geralmente se deslocam de sudoeste para nordeste sobre o continente e

oceano Atlântico adjacente (Kousky 1979). Durante o inverno, esses sistemas são acompanhados de massas

de ar de latitudes altas que muitas vezes causam geadas e friagens em áreas agrícolas no sudeste e sul do

Brasil (Fortune e Kousky 1983). Algumas vezes as frentes frias alcançam latitudes muito baixas sobre o

oeste da Amazônia e também ao longo da costa nordeste do Brasil (Parmenter 1976; Kousky 1979).

Quando as frentes frias avançam para norte (em direção ao equador), durante a estação de verão, algumas

vezes elas interagem com o ar úmido e quente tropical e produzem convecção profunda e organizada e

chuvas fortes sobre o continente. (e.g., Kousky e Ferreira 1981; Kousky 1985; Oliveira 1986) causando

excessiva precipitação e inundações, deslizamentos de encostas, além de ventos fortes e granizos. Durante o

verão as frentes frias frequentemente se posicionam ao longo da costa do Brasil, entre São Paulo e Bahia, na

região da posição climatológica da Zona de Convergência do Atlântico Sul (ZCAS) (Casarin e Kousky 1986;

Kousky e Cavalcanti 1988), originando períodos prolongados de chuva forte, algumas vezes com ocorrência

de inundações e prejuízos materiais e humanos na região (Silva e Kousky 2001).

Estudos pioneiros sobre a climatologia de frentes frias no Hemisfério Sul incluem o trabalho de Taljaard

(1972) que apresentou a distribuição das frentes em superfície durante o ano de 1958, ano em que houve o

evento internacional IGY (International Geophysical Year). Para a identificação das frentes no período de

verão e inverno de 1958 foi utilizado o critério de baroclinia média da atmosfera, ou seja, a zona de máximo

gradiente horizontal de temperatura. Nota-se, naqueles resultados, uma freqüência maior de frentes sobre o

sul e sudeste do Brasil no inverno, comparado com o verão.

Uma climatologia dos sistemas frontais e da interação com convecção tropical, no período de 1975 a 1984

foi realizada por Oliveira (1986), utilizando imagens de satélite. Os sistemas foram identificados em 4

bandas latitudinais (40º-35ºS, 35º-25º S, 25º-20ºS e ao norte de 20º). Na banda de (40º-35ºS) foi notada a

penetração dos sistemas frontais durante todo o ano, no entanto o máximo de eventos ocorreu em julho. Na

faixa latitudinal de 35ºS-25ºS, houve uma redução do número de casos, mas o máximo também ocorreu em

CAPÍTULO 6: Frentes Frias sobre o Brazil: Aspectos Observacionais

3 V. Kousky

julho. A interação com a convecção tropical foi máxima nos meses de outubro e novembro nas bandas de

35ºS-25ºS e 25ºS-20ºS, respectivamente. A freqüência diminuiu ao norte de 20ºS, mas algumas vezes houve

associação com a convecção tropical na Amazônia, com o máximo ocorrendo em novembro.

A climatologia de passagens de frentes frias durante o período de 1980 a 2002, sobre várias áreas da América

do Sul, nas várias estações do ano, foi apresentada em Andrade e Cavalcanti (2004), utilizando dados de

reanálise NCEP/NCAR. O critério utilizado para a identificação automática dos sistemas frontais foi baseado

em aumento de pressão, queda de temperatura e mudança na componente meridional do vento em 925 hPa.

Critério semelhante foi utilizado por Cavalcanti e Kousky (2003) em uma análise climatológica para o

período de 1979 a 2002 em todos os pontos de grade sobre a América do Sul. Nos resultados de Andrade e

Cavalcanti (2004) e Cavalcanti e Kousky (2003) foi observada uma diminuição da frequência dos sistemas

das latitudes mais altas para as mais baixas. Kousky (1979) identificou uma maior freqüência de ocorrência

de sistemas frontais no sul da Bahia nos meses de março a dezembro para o período de 1961 a 1970. Notou

que havia uma tendência de anos com maiores totais de precipitações corresponderem a anos com maior

número de passagem de frentes. Nos resultados de Andrade (2004) foram identificadas algumas

características das condições sinóticas associadas ao deslocamento dos sistemas, sobre o continente, ou se

desviando para o oceano. Pressões mais altas sobre o continente, subsidência em 500 hPa, ventos intensos de

norte na região de confluência sobre o oceano, advecção de vorticidade positiva sobre a região sul foram

fatores associados ao deslocamento dos sistemas para o oceano. Além disso, a intensidade de cristas e

cavados e do jato subtropical também estava relacionada ao deslocamento das frentes.

Justi da Silva e Silva Dias (2002) também fizeram uma climatologia dos sistemas frontais para cada ponto de

grade, a partir de dados da reanálise do NCEP do período de 1981-1999 usando como critério de

identificação apenas a mudança no sinal da componente meridional do vento. Nas Regiões Sul e Sudeste do

Brasil, o vento em baixos níveis tem direção de nordeste, devido à influência da alta subtropical do Atlântico

Sul, e então numa situação pré-frontal o vento é tipicamente de noroeste depois gira de sudoeste e de sudeste

à medida que a frente se desloca. Naquele estudo foi encontrada uma alta freqüência de frentes em torno da

latitude de 300S, e valores mais altos no litoral comparado com o interior do continente. Notou-se também

uma semelhança entre os campos de freqüência de ocorrência para os anos La Nina de 83/84, 88/89, 95/96 e

98/99.

CAPÍTULO 6: Frentes Frias sobre o Brazil: Aspectos Observacionais

4 V. Kousky

Características típicas da circulação atmosférica associadas com incursões de ar frio que seguem a passagem

de frentes frias sobre a região subtropical da América do Sul incluem: 1) uma crista amplificada nos níveis

médios da troposfera e anticiclone em superfície sobre o Pacífico Sul Leste e 2) um cavado nos níveis

médios da troposfera, em intensificação, sobre a região central da Argentina (Fortune e Kousky, 1983;

Algarve e Cavalcanti, 1994; Kousky e Cavalcanti 1997; Vera e Vigliarolo 2000). Essa configuração

intensifica o escoamento de sul na média troposfera a leste dos Andes, o qual auxilia o avanço para norte do

ar frio e do anticiclone em superfície (Fortune e Kousky 1983; Garreaud 2000).

(a) (b) (c)

Figura 1. Imagens de satélite mostrando a ocorrência de sistemas frontais. (a) dia 05/05/2005 às 21:00

GMT; (b) dia 26/06/2006 às 13:30 GMT; (c) dia 28/11/2007 às 14:15 GMT.

2. Critérios para a determinação objetiva de frentes frias

Um método objetivo para determinar a passagem de um sistema frontal frio é baseado em variação de

pressão ao nível do mar, variação de temperatura em 925 hPa e força e sentido do vento em 925 hPa. O

seguinte critério pode ser aplicado a cada ponto de grade: 1) uma diminuição da temperatura em 925 hPa de

pelo menos 2ºC, 2) um aumento da pressão ao nível do mar de pelo menos 2 hPa, e 3) existência de ventos

de sul, de pelo menos 2 m s-1

.

Um exemplo da aplicação desse critério para a passagem de frentes frias em 30ºS, 52.5ºW (perto de Porto

Alegre, Rio Grande do Sul) para Junho-Agosto 1994 é mostrado na Figura 2, onde são apresentadas séries

temporais de temperatura e vento meridional em 925 hPa e pressão ao nível do mar. Nota-se uma excelente

CAPÍTULO 6: Frentes Frias sobre o Brazil: Aspectos Observacionais

5 V. Kousky

correspondência entre as passagens de frentes frias determinadas objetivamente e variáveis atmosféricas. As

frentes frias são seguidas por uma diminuição de temperatura em 925-hPa, um aumento de PNM e vento

meridional de sul. Adicionalmente existe uma boa correspondência com os eventos de precipitação, com

chuvas concentradas próximo dos períodos das passagens de frentes.

3. Climatologia da passagem de frentes frias para o período de 1979 a 2005

Dados de reanálise do NCEP/NCAR CDAS com resolução de 2.5 x 2.5 graus foram usados com o fim de

estabelecer uma climatologia para as frentes frias sobre a América do Sul utilizando o critério objetivo

descrito na seção anterior. O número médio de frentes frias por ano é mostrado na Figura 3 onde pode se ver

que esse número é maior no centro da Argentina, onde há passagem de cerca de 50 frentes frias por ano

(aproximadamente uma frente por semana). Um forte gradiente é evidente sobre a região sul e central do

Brasil, decorrente da diminuição de incursões de frentes frias em direção ao equador. Ao norte de 30ºS

existem duas regiões em que as passagens de frentes frias são mais freqüentes: Uma é ao leste dos Andes

entre o norte da Argentina e oeste da Bacia Amazônica. Na média, entre uma e cinco frentes frias chegam no

oeste da Amazônia a cada ano, com aproximadamente três frentes alcançando o equador. A outra região é ao

longo da costa leste do Brasil, onde na média 5 a 10 frentes chegam até 15ºS a cada ano.

CAPÍTULO 6: Frentes Frias sobre o Brazil: Aspectos Observacionais

6 V. Kousky

Figura 2. Série temporal de temperatura em 925-hPa (ºC), vento meridional em 925-hPa (m s-1

), pressão ao

nível do mar (hPa) em 30ºS, 52.5ºW, e precipitação média (mm) para a região 28ºS-31ºS, 51ºW-54ºW, no

período de Junho a Agosto de 1994. As passagens das frentes frias são indicadas pela seta no topo de cada

painel.

CAPÍTULO 6: Frentes Frias sobre o Brazil: Aspectos Observacionais

7 V. Kousky

Figura 3. Número médio por ano de passagens de frentes frias durante o período de 1979 a 2005. Áreas

onde a pressão em superfície é menor que 925 hPa nos dados das reanálises CDAS são mascaradas.

Existe uma sazonalidade na frequência de passagens de frentes frias, as quais são mais frequentes durante

Maio a Setembro e menos frequentes durante o verão do Hemisfério Sul (Dezembro a Fevereiro) (Figuras 4 e

5). As frentes ocorrem em maior número e durante todo o ano entre 25ºS e 30ºS, mas são mais numerosas de

maio a outubro. As frentes frias são mais raras ao norte de 20ºS durante o verão (Dezembro a Fevereiro).

Embora no verão ocorram passagens de frentes sobre o sudeste do Brasil que induzem convecção e

precipitação nas regiões tropicais e subtropicais da América do Sul (Garreaud e Wallace 1998) e que

alimentam a ZCAS, essas nem sempre satisfazem o critério considerado para a identificação de casos, que

leva em conta a queda de temperatura, aumento da pressão e mudança na direção do vento.

CAPÍTULO 6: Frentes Frias sobre o Brazil: Aspectos Observacionais

8 V. Kousky

Figura 4. Número médio de passagens de frentes frias por estação do ano durante o período 1979-2005.

Áreas onde a pressão em superfície é menor que 925 hPa nos dados das reanálises CDAS são mascaradas.

CAPÍTULO 6: Frentes Frias sobre o Brazil: Aspectos Observacionais

9 V. Kousky

Figura 5. Número médio de passagens de frentes frias por mês no período de 1979 a 2005 para as áreas

mostradas no mapa.

4. Características da circulação atmosférica associadas com as frentes frias

Nesta seção são apresentadas as características que normalmente acompanham as passagens de frentes frias

sobre o Brasil. Foram usados quatro pontos de referência para identificar a passagem de frentes em diversas

regiões do país, localizados no sul do Brasil (SBR, 30ºS, 52.5ºW), oeste do Amazonas (WBR, 10S, 65W),

sudeste do Brasil (SEBR, 22.5S, 45W) e nordeste do Brasil (NEBR, 15S, 40W) (Figura 6). Para cada

região foram feitos compostos de casos identificados de passagens de frentes para analisar as características

da circulação atmosférica.

CAPÍTULO 6: Frentes Frias sobre o Brazil: Aspectos Observacionais

10 V. Kousky

Figura 6. Pontos de referência para identificação de passagem de frentes e elaboração de compostos, para

cada região, da circulação atmosférica associada.

a). Sul do Brasil (SBR)

Como indicado na seção 3, as passagens de frentes frias ocorrem durante todo o ano sobre o sul do Brasil.

Contudo, as frentes frias são mais frequentes durante Junho a Setembro. Compostos de anomalia de

geopotencial em 500 hPa e Pressão ao Nível do Mar (PNM) associados com os 50 casos mais intensos de

passagens de frentes frias em Julho (1979 a 2005) são mostrados na Figura 7. Os casos foram selecionados

pela ordem decrescente da diminuição de temperatura em 925-hPa associada com cada evento, considerando

os casos com as maiores reduções. Antes da passagem da frente fria no SBR (tempo t), um cavado em 500-

hPa é observado ao longo da costa oeste da América do Sul (Figura 7, painel inferior, t-1) e um sistema de

baixa pressão (Baixa do Chaco) está localizado sobre o norte da Argentina (Figura 7, painel superior, t-1).

Temperaturas acima da média em 925-hPa são observadas sobre o norte da Argentina, Paraguai, Uruguai e

em quase todo o Brasil (Figura 7, painel intermediário). Temperaturas mais baixas do que a média em 925-

hPa ocorrem sobre o sul da Argentina. As anomalias nos campos de vento e temperatura em 925-hPa são

consistentes com uma frente fria localizada na região central da Argentina. No tempo t, o cavado em 500-

hPa avança para leste sobre a Argentina e a frente fria (eixo de anomalias negativas de SLP e mudança no

sentido do vento em 925-hPa) avança para norte em direção ao sul do Brasil. A frente fria continua a se

deslocar na direção nordeste durante os próximos 3 dias, ao mesmo tempo que o cavado em 500-hPa se

CAPÍTULO 6: Frentes Frias sobre o Brazil: Aspectos Observacionais

11 V. Kousky

desloca para leste cruzando a América do Sul em direção ao Oceano Atlântico. O sistema de alta pressão

atravessa os Andes no dia t+1 e daí se move para nordeste sobre o continente seguindo a frente no dia t+2.

Um cavado na pressão em superfície é evidente ao longo da costa do Chile nos tempos t+1 and t+2. Esta

característica tem sido associada à ausência de nuvens sobre o Pacífico Leste, observada em imagens de

satélite, o que é parcialmente devido ao movimento subsidente sobre o lado leste dos Andes e parcialmente

devido à subsidência de grande escala associada com o desenvolvimento da crista em 500-hPa sobre o

Pacífico Leste (Figura 7, painel inferior, tempo t+1).

b) Oeste da Amazonia (WBR)

As características da circulação nos compostos de 37 passagens frontais sobre o oeste da Amazônia em julho

são mostradas na Figura 8. A evolução das características da circulação é muito semelhante àquela discutida

para o sul do Brasil, com uma defasagem de 1 dia (comparar Figuras 7 e 8). Enquanto a frente fria e o

anticiclone em superfície avançam em direção ao equador entre os tempos t-1 and t+2, os ventos em baixos

níveis (925-hPa) mudam de noroeste para de sul e sudeste, com o mais forte escoamento de sul sobre a

região a leste dos Andes. Ventos de sul e temperaturas abaixo da média alcançam as vizinhanças do equador

sobre o oeste da Amazônia no tempo t+2. Ao longo da costa leste do Brasil a frente de desloca até próximo

de 20ºS.

As configurações da circulação para as frentes frias que ocorreram em Julho sobre o Sudeste e Nordeste do

Brasil (não mostradas) são muito semelhantes àquelas mostradas para o oeste da Amazônia. A única

diferença é que as configurações para as passagens frontais sobre o Nordeste se assemelham àquelas que

ocorrem um dia depois das passagens pelo sudeste e oeste da Amazônia.

CAPÍTULO 6: Frentes Frias sobre o Brazil: Aspectos Observacionais

12 V. Kousky

Figura 7. Evolução diária dos compostos, do tempo t-1 ao tempo t+3, de pressão ao nível do mar (PNM) e

anomalias (painel superior), vetor vento e anomalias de temperatura em 925-hPa (painel intermediário) e

altura geopotencial em 500-hPa e anomalias (painel inferior) para as 50 frentes mais fortes no sul do Brasil

(SBR) durante 1979 a 2005. A passagem frontal em 30ºS, 52.5ºW ocorreu no tempo t. Anomalias são

desvios da climatologia diária do período 1979 a 1995. Unidades para PNM, temperatura em 925-hPa e

altura geopotencial em 500-hPa height são hPa, ºC e m, respectivamente.

CAPÍTULO 6: Frentes Frias sobre o Brazil: Aspectos Observacionais

13 V. Kousky

Figura 8. Evolução diária dos compostos, do tempo t-1 ao tempo t+3, de pressão ao nível do mar (PNM) e

anomalias (painel superior), vetor vento e anomalias de temperatura em 925-hPa (painel intermediário) e

altura geopotencial em 500-hPa e anomalias (painel inferior) para as 37 frentes frias em julho, sobre o oeste

da Amazônia (WBR) durante 1979 a 2005. A passagem frontal em 10ºS, 65ºW ocorreu no tempo t.

5. Variabilidade Interanual da freqüência de frentes frias sobre o Brasil

A variabilidade interanual do número de frentes que passam sobre três regiões da América do Sul no período

entre 1980-2002, analisada por Andrade (2004), é mostrada na Figura 9. Na área 3, que compreende parte

CAPÍTULO 6: Frentes Frias sobre o Brazil: Aspectos Observacionais

14 V. Kousky

do sul do Brasil e Uruguai, o número de frentes frias variou entre 60 e 70 por ano, em grande parte do

período, com valor máximo de 80 em 1984 e mínimo de 51 em 2001. Na área 6, situada na região sudeste, a

freqüência de sistemas frontais foi de 50 a 60 na maioria dos anos. No ano de 1999 foi observado o maior

valor e em 2001 o menor. Para a área 11 localizada no centro-oeste da América do Sul, a maioria dos anos

apresentou entre 35 e 45 passagens de frentes. No entanto, a maior quantidade de sistemas frontais ocorreu

em 1982 e menos frentes atingiram essa área em 1980. Não foi observado um padrão para um número

máximo ou mínimo de sistemas frontais que atingem as regiões especificadas em eventos de El Niño e La

Niña. No entanto, observa-se que para a área 3, o máximo ocorre em 1984, ano em que inicia-se o fenômeno

La Niña. Para a área 6 não há muita diferença entre o número de sistemas frontais que ocorre em um ano de

El Nino ou La Nina. Entretanto, para a área 11, mais frentes frias foram identificadas em um ano em que o

fenômeno El Niño estava ativo (1982).

Fedorova e Carvalho (2000) apresentaram outro estudo observacional sobre a freqüência de zonas frontais

durante um ano em que ocorreu La Niña (julho de 1996 até março de 1997) e El Niño (julho de 1997 até

março de 1998), e os resultados mostraram que a ocorrência de frentes frias na faixa latitudinal entre 20ºS e

40ºS foi maior no ano de El Niño do que de La Niña quando estes fenômenos estavam em suas fases mais

ativas. Para os dois anos analisados, as frentes frias foram observadas mais ao sul da América do Sul, mas

em anos de El Niño, as frentes tiveram maior freqüência sobre o Rio Grande do Sul e Uruguai.

(a)

CAPÍTULO 6: Frentes Frias sobre o Brazil: Aspectos Observacionais

15 V. Kousky

(b)

(c)

(d)

Figura 9. (a) Mapa da América do Sul destacando as áreas analisadas para ocorrência de passagem de

frentes frias e frequência anual de sistemas frontais b) área 3, c) área 6 e d) área 11 para o período de 1980-

2002. (Fonte: Andrade 2004).

6. Efeitos das frentes frias na precipitação

As frentes frias têm um efeito na intensidade e distribuição da precipitação durante a passagem das frentes

frias sobre a América do Sul (Kousky 1985). Para ilustrar este efeito, foram feitos compostos de precipitação

CAPÍTULO 6: Frentes Frias sobre o Brazil: Aspectos Observacionais

16 V. Kousky

para todas as frentes frias que passaram pelo sudeste do Brasil durante 3 meses (Setembro, Outubro e

Novembro), Figura 10. A precipitação é maior ao longo e atrás da frente que passa no sudeste (SEBR) no

tempo t (compare a localização do ponto de referência para o SEBR na Figura 6 com a precipitação

mostrada na Figura 10). Nos 3 meses há um deslocamento para nordeste, com o tempo, da precipitação

máxima sobre o leste da América do Sul, indicando a influência do deslocamento do sistema frontal.

Também é evidente nos 3 meses, um aumento na intensidade da precipitação no oeste da Amazônia depois

da passagem das frentes no SEBR (tempos t+1 e t+2). A banda noroeste-sudeste de precipitação mais

intensa, evidente nos tempos t+1 e t+2, é frequentemente associada à Zona de Convergência do Atlântico

Sul (ZCAS), a qual tem sido bastante estudada desde os anos 1980 (por exemplo, Casarin e Kousky 1986;

Nogues-Paegle e Mo 1997; Silva e Kousky 2001; Liebmann et al. 2004; Carvalho et al. 2004, Cunningham e

Cavalcanti 2006).

Figura 10. Evolução dos compostos do tempo t-2 ao tempo t+2 dias de precipitação (mm/d) para passagem

de frentes frias no sudeste do Brasil (SEBR) durante 1979-2005. O número de frentes frias usado nos

compostos é de 46 para Setembro, 46 para Outubro e 36 para Novembro.

CAPÍTULO 6: Frentes Frias sobre o Brazil: Aspectos Observacionais

17 V. Kousky

As análises de precipitação foram realizadas com dados obtidos do NOAA/Climate Prediction Centers

disponíveis em

http://www.cpc.ncep.noaa.gov/products/precip/realtime/GIS/SA/SA-precip.shtml.

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CAPÍTULO 6: Frentes Frias sobre o Brazil: Aspectos Observacionais

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